Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | LINA BAPTISTA | ||
Descritores: | INSOLVÊNCIA EXONERAÇÃO DO PASSIVO RESTANTE PEDIDO DE APOIO JUDICIÁRIO | ||
Nº do Documento: | RP20180206749/16.6T8OAZ.P2 | ||
Data do Acordão: | 02/06/2018 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º809, FLS.39-46) | ||
Área Temática: | . | ||
Sumário: | I - No processo de insolvência, e por aplicação do disposto no art.º 248.º do CIRE, o Devedor, com a apresentação do pedido de exoneração do passivo restante, beneficia do diferimento do pagamento das custas do processo. Por outro lado, com a apresentação do mesmo pedido, fica impedido de apresentar incidente do apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo. II - O regime geral da oportunidade do pedido de apoio judiciário, previsto no art.º 18.º da Lei n.º 34/2004, de 29/07, tem que ser conjugado com este regime especial introduzido no CIRE. III - Estando o devedor, nesta situação específica, impedido de apresentar incidente do apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, ter-se-á que lhe conceder essa possibilidade no momento em que essa impossibilidade desaparece. Ou seja, no momento de indeferimento liminar do incidente ou no momento da revogação da exoneração. Apenas com esta interpretação fica assegurado o fim do apoio judiciário, de proteger que o requerente não fique impedido de litigar por insuficiência económica. | ||
Reclamações: | |||
Decisão Texto Integral: | Processo n.º 749/16.6T8OAZ.P2 Comarca: [Juízo de Comércio de Oliveira de Azeméis (J1); Comarca do Porto] Relatora: Lina Castro Baptista Adjunto: Fernando Samões Adjunto: Vieira e Cunha * ..........................................................SUMÁRIO .......................................................... .......................................................... .......................................................... * B…, residente na Rua …, n.º …, …, Oliveira de Azeméis, veio apresentar-se à insolvência e requerer a exoneração do passivo restante.Acordam no Tribunal da Relação do Porto I - RELATÓRIO Por sentença proferida a 02/03/2016, a Requerente foi declarada insolvente. O Administrador Judicial nomeado veio apresentar o respetivo Relatório, nos termos e para os fins previstos no art.º 155.º do Código da Insolvência e da Recuperação da Empresa[1] e realizada a Assembleia de Credores. Com data de 23/11/16, foi proferido despacho a declarar encerrado o processo por insuficiência da massa insolvente. Por subsequente despacho de 05/06/17, indeferiu-se liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante formulado pela devedora. A Devedora veio recorrer desta decisão de indeferimento liminar, informando que havia requerido a concessão do benefício do apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo. Entretanto, com data 17/10/17, a Segurança Social veio informar que foi concedido à Devedora o Apoio Judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo. Com data de 24/10/17, foi proferido despacho a admitir o recurso interposto pela Devedora, como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo. Subindo os autos a este Tribunal, o Relator a quem foi distribuído o recurso proferiu despacho a determinar que os autos baixassem à 1ª instância para que fosse resolvida a situação da relevância do apoio judiciário que veio a ser concedido à Recorrente, designadamente para se decidir da necessidade de pagamento da taxa de justiça devida pela interposição do recurso. Baixando os autos à 1ª Instância, foi proferido despacho, com data de 15/11/17, com o seguinte teor: “Conforme dispõe o artigo 18.º, n.º 2, da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho (…). Não tendo sido alegada, nem comprovada, uma situação de insuficiência económica superveniente, declara-se ineficaz a decisão proferida pela SS no que à obrigação de pagar a taxa de justiça devida pelo recurso respeita. Acresce que a recorrente, notificada do teor da promoção do Ministério Público de 05/09/2017, nada disse. Pelo que se concede à recorrente o prazo de cinco dias para demonstrar ter pago a taxa de justiça devida pela interposição de recurso sob pena de, não o fazendo, não ser o mesmo admitido.” Inconformada com este despacho, a Insolvente veio interpor recurso, rematando com as seguintes CONCLUSÕES: A. A insolvente quando solicita o benefício de apoio judiciário nestes autos, fá-lo numa nova qualidade, ou seja na de insolvente, tendo no requerimento de apoio judiciário que juntou aos autos, identificado como finalidade do pedido “recorrer processo de insolvência 749/16.6T8OAZ, Tribunal de Oliveira de Azeméis, na qualidade de Insolvente”.B. A qualidade de insolvente da Recorrente surge no decurso deste processo, por si só configura uma alteração superveniente com repercussões, objectivas, na sua situação económica. C. O apoio judiciário requerido foi concedido para os autos de insolvência deste processo. D. A necessidade de recurso da Insolvente e a sua actual situação de insolvente é que motivaram a apresentação do pedido de apoio judiciário E. Situação que foi reconhecida à Insovente, por quem de direito, ou seja a SS, mediante a apresentação da sua situação económica (art. 20º LAJ). F. O cancelamento da proteção jurídica é admissível nas situações previstas no art. 10º da LAJ. G. A situação invocada pela Meritíssima Juiz para “declarar ineficaz” a decisão de deferimento de apoio judiciário à Insolvente não se enquadra em nenhuma das alíneas deste preceito (art. 10º da LAJ) nem decorre do art. 18º da LAJ H. A Recorrente solicitou o apoio judiciário e concretiza no formulário apresentado a oportunidade e finalidade do seu pedido. I. O benefício do diferimento do pagamento das custas previsto no art. 248º, n1 do CIRE, em casos de formulação do pedido de exoneração do passivo restante, além de poder abarcar a taxa de justiça devida pela apresentação do processo de insolvência (vide AC STJ 1617/11.3TBFLG.G1.S1, de 15.11.2012), abrange as taxas de justiça que sejam devidas até à decisão final do pedido de exoneração do passivo, benefício que afasta a concessão de qualquer outra forma de apoio judiciário ao devedor – que não a nomeação e pagamento de honorários a patrono. J. O diferimento do momento do pagamento das custas devidas no processo de insolvência, sem discriminação, é o que melhor se compagina com o escopo de protecção do devedor, tanto mais que fica numa situação de inabilidade legal para a prática de atos que atinjam o seu património, passando este a ser gerido pelo administrador de insolvência. K. A ora recorrente, seja, porque beneficia de uma decisão de deferimento de apoio judiciário válido que se encontra junta aos autos, L. Seja, porque o preceituado no art. 248º, nº 1 do CIRE, especialmente prevê o diferimento do pagamento do pagamento da taxa de justiça e demais encargos na situação específica dos autos, M. Não tem de pagar, neste momento, taxa de justiça, N. O que também se aplica ao recurso, por si apresentado, sobre a decisão que indeferiu liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante formulado pela devedora. O. A decisão de que ora se recorre, a manter-se, é violadora do regime jurídico da LAJ, art. 10º, 18º, 20º e art. 235º do CIRE. O Ministério Público veio apresentar contra-alegações pugnando que o despacho que determinou o pagamento da taxa de justiça pela interposição do recurso seja parcialmente substituído por outro que aplique o art.º 248.º, n.º 1, do CIRE e, consequentemente, defira o pagamento dessa taxa até à decisão final a proferir em sede de exoneração, mantendo-se o demais decidido quanto à ineficácia da decisão proferida pela Segurança Social no que concerne ao requerido e concedido benefício do apoio judiciário à Recorrente, terminando com as seguintes CONCLUSÕES: 1) Ao contrário do que se passava na vigência da Lei nº 30-E/90, de 20-12 e o DL nº 387/87, de 29-12, em que o apoio judiciário podia ser requerido “em qualquer estado da causa” – artº 17º, nº 2 – a actual lei de apoio judiciário – Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, dispõe que o apoio judiciário “deve ser requerido antes da primeira intervenção processual (artº 18º, nº 2)”, salvo se ocorrer facto superveniente.2) Para justificar o requerimento do benefício de apoio judiciário na pendência do actual processo, a Recorrente alegou que o facto superveniente que justifica a aplicação do benefício de apoio judiciário em apreço é o de ter sido requerido após a mesma adquirir a qualidade de insolvente. 3) Dúvidas não subsistem, que o benefício de apoio judiciário requerido pela Recorrente nos presentes autos teve o intuito exclusivo de a eximir ao pagamento de custas judiciais em que foi anteriormente condenada, justificando-se/impondo-se, por isso, a impossibilidade de aplicar o benefício de apoio judiciário a todo o processo. 4) O artº 248º do CIRE dispensa, temporariamente, o devedor de suportar certos encargos judiciários relacionados com o pedido, concessão e revogação da exoneração do passivo restante, diferindo o seu pagamento para o momento da decisão final a proferir acerca destas questões. 5) Estando em causa o recurso da decisão proferida acerca do pedido de exoneração do passivo, deverá ser diferido o pagamento da taxa de justiça devida até à decisão final a proferir em matéria de exoneração. Foi proferido despacho a admitir o recurso como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo. Cumpre decidir. * A questão a apreciar, delimitada pelas conclusões do recurso, consiste em saber se a Insolvente terá que pagar a taxa de justiça devida pela interposição do recurso tendo por objeto a decisão de indeferimento liminar da exoneração do passivo restante.II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO * III – PAGAMENTO DA TAXA DE JUSTIÇA DEVIDA PELA INTERPOSIÇÃO DO RECURSO TENDO POR OBJETO A DECISÃO DE INDEFERIMENTO LIMINAR DA EXONERAÇÃO DO PASSIVO RESTANTEA Insolvente/Recorrente sustenta que lhe foi reconhecido o benefício do apoio judiciário, atenta a sua atual situação de insolvente, tornando-se imediatamente aplicável aos autos. Mais sustenta que o benefício do diferimento do pagamento das custas previsto no art. 248º, n1 do CIRE, em casos de formulação do pedido de exoneração do passivo restante, além de poder abarcar a taxa de justiça devida pela apresentação do processo de insolvência, abrange as taxas de justiça que sejam devidas até à decisão final do pedido de exoneração do passivo, benefício que afasta a concessão de qualquer outra forma de apoio judiciário ao devedor – que não a nomeação e pagamento de honorários a patrono. Defende que, seja porque beneficia de uma decisão de deferimento de apoio judiciário válido que se encontra junta aos autos, seja, porque o preceituado no art. 248º, nº 1 do CIRE, especialmente prevê o diferimento do pagamento do pagamento da taxa de justiça e demais encargos na situação específica dos autos, não tem de pagar, neste momento, taxa de justiça. O Ministério Público veio apresentar contra-alegações pugnando que o despacho que determinou o pagamento da taxa de justiça pela interposição do recurso seja parcialmente substituído por outro que aplique o art.º 248.º, n.º 1, do CIRE e, consequentemente, defira o pagamento dessa taxa até à decisão final a proferir em sede de exoneração, mantendo-se o demais decidido quanto à ineficácia da decisão proferida pela Segurança Social no que concerne ao requerido e concedido benefício do apoio judiciário à Recorrente. Cumpre decidir. Está em situação de insolvência aquele que se encontra impossibilitado de cumprir pontualmente as suas obrigações. Explica-se, de forma mais completa, no Acórdão de 26/02/2015 da Relação de Évora, tendo por Relator Mário Serrano[2], que "O conceito básico de insolvência é traduzido pela impossibilidade de cumprimento, pelo devedor, das suas obrigações, correspondendo os factos-índice ou presuntivos da insolvência a situações cuja ocorrência objetiva pode, nos termos da lei, fundamentar o pedido e que se prendem com a circunstância de, pela experiência da vida, manifestarem a insusceptibilidade de o devedor cumprir as suas obrigações." O mecanismo de insolvência judicial tem por propósito o de se obter a satisfação, pela forma mais eficiente possível, dos direitos dos credores do insolvente, através da repartição dos bens do insolvente ou da aprovação de um plano de insolvência. O processo de insolvência trata-se de um processo sujeito a custas, designadamente a pagamento de taxa de justiça inicial (cf. art.º 17.º e 302.º e ss. do CIRE e 1.º e 14.º do Regulamento das Custas Processuais[3]). Em tese geral, a taxa de justiça inicial deve ser paga pelo Requerente e junto o respetivo documento comprovativo do seu prévio pagamento no requerimento inicial (cf. art.º 552.º do Código de Processo Civil[4]). Este regime é, no entanto, inaplicável sempre que o Requerente formule pedido de exoneração do passivo restante, nos termos regulados nos art.º 235.º e ss. do CIRE. A exoneração do passivo restante trata-se, como se sabe, de uma medida especial de proteção do devedor pessoa singular e traduz-se esquematicamente na desvinculação dos créditos que não forem integralmente pagos no processo de insolvência ou nos cinco anos posteriores ao encerramento deste. Assim, e no que concerne a este específico aspeto do pagamento das custas, o art.º 248.º do CIRE determina, sob a epígrafe “Apoio judiciário”, que “1. O devedor que apresente um pedido de exoneração do passivo restante beneficia do diferimento do pagamento das custas até à decisão final desse pedido, na parte em que a massa insolvente e o seu rendimento disponível durante o período da cessão sejam insuficientes para o respetivo pagamento integral, o mesmo se aplicando à obrigação de reembolsar o Cofre Geral dos Tribunais das remunerações e despesas do administrador da insolvência e do fiduciário que o Cofre tenha suportado. 2 - Sendo concedida a exoneração do passivo restante, é aplicável ao pagamento das custas e à obrigação de reembolso referida no número anterior o disposto no artigo 33.º do Regulamento das Custas Processuais é aplicável ao pagamento das custas e à obrigação de reembolso referida no número anterior. 3 - Se a exoneração for posteriormente revogada, caduca a autorização do pagamento em prestações, e aos montantes em dívida acrescem juros de mora calculados como se o benefício previsto no n.º 1 não tivesse sido concedido, à taxa prevista no n.º 1 do artigo 33.º do Regulamento das Custas Processuais. 4 - O benefício previsto no n.º 1 afasta a concessão de qualquer outra forma de apoio judiciário ao devedor, salvo quanto à nomeação e pagamento de honorários de patrono”. Tal como se refere no Acórdão da Relação de Guimarães de 17/05/12, tendo por Relator Manso Raínho[5] que “O art.º 248.º, n.º 1 do CIRE concede ao devedor que requeira a exoneração do passivo restante um automático benefício ao diferimento do pagamento das custas. Tal benefício implica que o devedor, goze ou não do apoio judiciário nos termos da legislação respetiva, não tenha que proceder ao pagamento prévio da taxa de justiça.” Por referência à mesma questão concreta, explica-se a razão de ser deste regime especial, que prevalece sobre o regime da Lei do Apoio Judiciário, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15/11/12, tendo por Relator Abrantes Geraldes[6] “Neste contexto, o deferimento do momento de pagamento das custas devidas no processo de insolvência, sem discriminação, é o que melhor se compagina com o escopo de proteção do devedor, tanto mais que com a declaração de insolvência o devedor fica numa situação de inabilidade legal para a prática de atos que atinjam o seu património, passando este, com o seu ativo e passivo, a ser gerido pelo administrador de insolvência, nos termos do art.º 81.º do CIRE, a quem competirá, além do mais, proceder ao pagamento das dívidas (artº. 55º, nº 1, al. a)).” No caso em apreciação, a Recorrente veio apresentar-se à insolvência e requerer a exoneração do passivo restante. Foi declarada insolvente e, posteriormente, foi proferido despacho a declarar encerrado o processo por insuficiência da massa insolvente, com custas a cargo da massa insolvente. Por subsequente despacho, indeferiu-se liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante formulado pela devedora. A Devedora veio recorrer desta decisão de indeferimento liminar, informando que havia requerido a concessão do benefício do apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo. Entretanto, a Segurança Social veio informar que foi concedido à Devedora o Apoio Judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo. Posteriormente, foi proferido despacho a admitir o recurso interposto pela Devedora, como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo. Por aplicação do regime acima exposto, a Recorrente/Devedora, com a apresentação do pedido de exoneração do passivo restante, beneficiou do diferimento do pagamento das custas do processo de insolvência. Por outro lado, com a apresentação do mesmo pedido, ficou impedida de apresentação de incidente do apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo. Em face da decisão de indeferimento liminar da exoneração do passivo restante e da subsequente fixação de efeito meramente devolutivo ao respetivo recurso interposto, o benefício do diferimento do pagamento das custas do processo de insolvência deixou de produzir efeitos, ficando as custas devidas imediatamente devidas. Assim, e em concreto, a Recorrente/Devedora estaria obrigada a pagar a taxa de justiça devida pela interposição de tal recurso. Assim, podemos, desde já, concluir que discordamos da posição defendida pelo Ministério Público, nas respetivas contra-alegações, no sentido de que o despacho que determinou o pagamento da taxa de justiça pela interposição do recurso deverá ser parcialmente substituído por outro que aplique o art.º 248.º, n.º 1, do CIRE e, consequentemente, defira o pagamento dessa taxa até à decisão final a proferir em sede de exoneração. Aqui chegados, importa ponderar da relevância do benefício do apoio judiciário concedido pela Segurança Social à Devedora, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo. O tribunal recorrido decidiu, por despacho, que “Não tendo sido alegada, nem comprovada, uma situação de insuficiência económica superveniente, declara-se ineficaz a decisão proferida pela SS no que à obrigação de pagar a taxa de justiça devida pelo recurso respeita.” e fixou o prazo de cinco dias para o pagamento da taxa de justiça devida pela interposição do recurso. Não sufragamos esta fundamentação jurídica, pelos motivos que passamos a expor. O sistema de acesso ao direito e aos tribunais destina-se, tal como se refere no art.º 1.º da Lei n.º 34/2004, de 29/07, a assegurar que a ninguém seja dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência de meios económicos, o conhecimento, o exercício ou a defesa dos seus direitos. O atual regime do apoio judiciário determina, tal como se refere na decisão recorrida, que “O apoio judiciário deve ser requerido antes da primeira intervenção processual, salvo se a situação de insuficiência económica for superveniente (…).” (cf. art.º 18.º da Lei n.º 34/2004, de 29/07). Este dispositivo legal surgiu em evolução do regime anterior da Lei n.º 30.E/2000, de 20/12, no âmbito do qual se discutia nos Tribunais Superiores a possibilidade de formulação do pedido de apoio judiciário em qualquer estado da causa, designadamente depois da decisão final. Tal como refere Salvador da Costa[7], “Com a lei atual algo mudou em relação ao regime de pretérito, como logo decorre do disposto no normativo em análise. A regra de o pedido de apoio judiciário dever ser formulado antes da primeira intervenção no processo, seja na posição de autor ou de requerente, ou de réu ou de requerido, de interveniente, de assistente, de embargante de terceiro ou de opoente, assume-se como razoável e não afeta desproporcionalmente o direito das pessoas ao acesso ao direito e aos tribunais.” No entanto, há que conjugar este regime geral da oportunidade do pedido de apoio judiciário com o regime especial introduzido no CIRE, designadamente na situação de pedido de exoneração do passivo restante. Isto é, estando o devedor, nesta situação específica, impedido de apresentar incidente do apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, ter-se-á que lhe conceder essa possibilidade no momento em que essa impossibilidade desaparece. Ou seja, no momento de indeferimento liminar do incidente ou no momento da revogação da exoneração. Por inerência, no caso concreto, deve entender-se que o pedido de apoio judiciário foi apresentado tempestivamente, por ter sido apresentado no momento em que foi legalmente exercitável. Bem como que, sendo tempestivo, é imediatamente eficaz no processo, a partir do momento da sua concessão. Apenas com esta interpretação fica assegurado o fim do apoio judiciário, de proteger que não se fique impedido de litigar por insuficiência económica. A conclusão final é, pois, a da total procedência do recurso, revogando-se o despacho recorrido e decidindo-se pela aplicabilidade e eficácia do benefício do apoio judiciário nos presentes autos após a sua concessão à Recorrente/Devedora, designadamente quanto ao pagamento da taxa de justiça devida pela interposição do recurso interposto tendo por objeto o indeferimento liminar da exoneração do passivo restante. * Pelo exposto, acordam os Juízes que constituem este Tribunal da Relação em julgar procedente o recurso, revogando-se o despacho recorrido e decidindo-se, em substituição, pela aplicabilidade e eficácia do benefício do apoio judiciário nos presentes autos após a sua concessão à Recorrente/Devedora, designadamente quanto ao pagamento da taxa de justiça devida pela interposição do recurso interposto tendo por objeto o indeferimento liminar da exoneração do passivo restante.IV - DECISÃO * Custas a cargo da massa insolvente (art.º 527.º do C.P.Civil e 304.º do CIRE).* Notifique e registe.* Após trânsito, remeta os autos ao Ex.mo Colega a quem, nesta Relação, foi distribuído o recurso tendo por objeto a decisão de indeferimento da exoneração do passivo restante.* Porto, 06 de fevereiro de 2018(Processado e revisto com recurso a meios informáticos) * Lina Castro Baptista Fernando Samões Vieira e Cunha _________ [1] Doravante designado apenas por CIRE. [2] In Coletânea de Jurisprudência Ano XL, Tomo I, pág. 246. [3] Doravante designado apenas por RCP. [4] Doravante designado apenas por C.P.Civil. [5] Proferido no Processo n.º 1617/11.3TBFLG.G1, disponível em www.dgsi.pt na data do presente Acórdão. [6] Proferido no mesmo Processo e disponível em www.dgsi.pt na data do presente Acórdão. [7] In O Apoio Judiciário, 2013, 9ª Edição, Almedina, pág. 121. |