Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1429/18.3T8VLG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RITA ROMEIRA
Descritores: DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO
DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO
REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ACTO INÚTIL
JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO
Nº do Documento: RP202007141429/18.3T8VLG.P1
Data do Acordão: 07/14/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE, CONFIRMADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - O dever de fundamentação da decisão de facto, exige actualmente a indicação do processo lógico – racional que conduziu à formação da convicção do julgador, relativamente aos factos que considerou provados ou não provados, de acordo com o ónus de prova que incumbia a cada uma das partes, conforme dispõe, no que concerne à sentença, o artº 607º, nº 4 do CPC, segundo os diversos critérios legais e jurisprudenciais, tendo em conta que, na formação da convicção do julgador rege o princípio da livre apreciação das provas, excepto nos casos previstos no nº 5 do artº 607 do C.P.C.
II - Não há lugar à reapreciação da matéria de facto quando o facto concreto, objecto da impugnação, não for susceptível de, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, ter relevância jurídica à luz das diversas soluções plausíveis da questão de direito, sob pena de se proceder à prática de um acto inútil, proibido por lei, art. 130º do CPC.
III - Para que se verifique a justa causa de despedimento decorrente da violação de deveres impostos ao trabalhador (nos termos do art. 128º, do CT) ou do disposto nas al.s a) e d) do nº 2 do art. 351º do CT, há que demonstrar, a existência de um comportamento culposo do trabalhador, que pela sua gravidade e consequências torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral.
IV – Mas, previamente, há que demonstrar que o trabalhador cometeu as condutas que se integrem naquelas.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. nº 1429/18.3T8VLG.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto - Juízo do Trabalho de Valongo - Juiz 2
Recorrente: B…, S.A.
Recorrido: C…
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto
I - RELATÓRIO
O A., C…, intentou, mediante o formulário a que aludem os art.s 98º-C e 98º-D, do Código de Processo do Trabalho, a presente acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, contra B…, S.A., requerendo que seja declarada a ilicitude ou irregularidade do despedimento, com as legais consequências.
Frustrada a conciliação na audiência de partes, conforme decorre da acta datada de 20.07.2017, foi a empregadora notificada para, querendo, apresentar articulado a motivar o despedimento e apresentar o procedimento disciplinar, o que veio a fazer, nos termos que constam dos autos, fundamentando-o, em síntese, nos factos constantes da decisão disciplinar que, em seu entender, constituem justa causa de despedimento do trabalhador (autor), e que contendem fundamentalmente com a alegada apropriação pelo autor de bens pertencentes à ré.
Mais, alega e conclui que com o comportamento que lhe é imputado, o Autor violou, de forma culposa, os deveres de respeitar e tratar o empregador e as pessoas que se relacionem com a empresa com probidade, de realizar o trabalho com zelo e diligência, de cumprimento de ordens e instruções da entidade empregadora no que diz respeito à execução e à disciplina do trabalho e ainda os deveres de guardar lealdade ao empregador, de velar pela conservação e boa utilização de bens relacionados com o trabalho que lhe forem confiados pelo empregador e de executar os atos tendentes à melhoria da produtividade da empresa, todos previstos nas alíneas a), c), e), f), g) e h) do n.º 1 do artigo 128.º do Código do Trabalho.
Alega, ainda, que a conduta do Autor fez com que a Ré perdesse a sua confiança nele, tornando imediata e impossível a subsistência da relação laboral, comportando os factos praticados pelo Autor ao serviço da Ré, nos termos e para os efeitos do disposto nos nºs 1 e 2, alíneas a), d) e e) do artigo 351º do Código do Trabalho, justa causa de despedimento.
Conclui que dever-se-á considerar regular e lícito o despedimento do a., por se encontrarem preenchidos todos os requisitos materiais e formais do despedimento que lhe foi efectuado.
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Notificado o A. contestou e deduziu reconvenção, defendendo-se por excepção e impugnação e, nessa sequência, invoca a nulidade do procedimento disciplinar, a prescrição e caducidade do processo disciplinar, nega a prática de quaisquer factos susceptíveis de constituírem justa causa de despedimento, sustenta a ilicitude do despedimento e conclui, sustentando, que não violou qualquer dever laboral a que se encontrava adstrito perante a ré.Declarou, logo, neste articulado, nos termos que constam do mesmo, optar pela indemnização em substituição da reintegração, caso venha a ser declarada a ilicitude do despedimento.
Alegou, também, que prestou trabalho suplementar que a ré não lhe pagou, nem proporcionou o competente descanso compensatório, e passou a exercer (em acumulação com as funções que já tinha, de vendedor) funções correspondentes a uma categoria superior (KAM) nunca lhe tendo a ré pago a retribuição correspondente a esta categoria (sem prejuízo de por via desse exercício de funções a ré lhe ter entregue algumas quantias, que especifica).
Termina que deve o despedimento ser considerado ilícito, com as respectivas consequências legais daí resultantes, designadamente condenando-se a Ré no pagamento do seguinte:
a) 54.548,58€ a título de indemnização calculada a 45 dias de retribuição por cada ano de antiguidade;
b) 2.673,95€ a título de proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de natal respeitantes ao ano do despedimento;
c) 2.139,16€, a título de férias vencidas e não gozadas;
d) 15.887,59€ a título de trabalho suplementar prestado nos anos de 2013, 2014, 2015, 2016 e 2017 e respectivo descanso compensatório, no valor de 1.105,98€
e) 9.854,04€ a título de diferenças salariais respeitantes ao período em que exerceu funções distintas das suas sem o respectivo acréscimo salarial.
f) 1.955,28€ a título de diferenças salariais respeitantes aos subsídios de férias e de natal do período referido na alínea anterior.
g) Ao montante correspondente aos salários que deixou de receber desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que vier a julgar a presente acção.
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A ré apresentou articulado de resposta suscitando a questão da litispendência, parcial, entre este processo e o instaurado, anteriormente, Proc. Comum n.º 965/18.6T8VLG e, em síntese, pugna pela improcedência da reconvenção, argumentando, de novo, no sentido da validade do procedimento disciplinar e da aplicação da sanção disciplinar de despedimento. Sustenta a sua tese, em primeiro lugar e pelas razões que aduz, em que não se verifica nenhuma das excepções deduzidas pelo autor, reafirma a factualidade tendente a demonstrar a justa causa de despedimento e impugna, por outro lado, diversa matéria de facto alegada pelo autor.
Termina concluindo que deve ser considerado lícito e regular o despedimento do trabalhador, não tendo este direito a qualquer compensação ou indemnização pela cessação do contrato de trabalho; deve a empregadora ser absolvida da instância dos créditos peticionados a título de alegado trabalho suplementar prestado nos anos de 2013 a 2017 e respectivos descansos compensatórios, a título de diferenças salariais respeitantes ao período em que, alegadamente, exerceu funções distintas das suas sem o respectivo acréscimo salarial; e a título de diferenças salariais respeitantes aos subsídios de férias e de natal, tudo no montante global de €28,802,89, por litispendência; e,
- se assim não for entendido, por mera cautela de patrocínio devem ser considerados improcedentes todos os créditos peticionados por indevidos e/ou não provados, nada devendo a empregadora ao trabalhador pelo contrato de trabalho ou pela sua cessação.
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Nos termos que constam do despacho proferido, em 30.10.2018, com fundamento em que os “pedidos formulados em d), e) e f) do pedido reconvencional correspondem eles qualitativamente e até quantitativamente, respectivamente, aos formulados sob as alíneas b), d) e e) do pedido inserto na acção comum, sendo certo que a causa de pedir que lhes subjaz é também essencialmente a mesma que nestes autos de acção especial o trabalhador alegou” e no entendimento de que nada impede que, “a acção inicialmente proposta seja apensada aos presentes autos, cuja tramitação prevista é mais célere e no âmbito da qual, em princípio e em sede de pedido reconvencional, sempre poderia o autor (caso assim tivesse optado) deduzir todos os pedidos em causa (tanto numa como noutra acção)”, foi ordenada a apensação aos presentes autos do Processo n.º 965/18.6T8VLG.
O que não mereceu oposição das partes.
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Naquele processo comum o trabalhador autor, para além dos pedidos repetidos neste processo especial, formulou os seguintes:
1. Ser declarado que a Ré praticou assédio moral contra o Autor e, em virtude disso, deve ser condenada a:
a) pagar ao A. quantia de 50.000,00 Euros a título de indemnização por danos não patrimoniais causados pela prática de assédio moral no local de trabalho;
Em simultâneo, independentemente da procedência do peticionado em 1., deve a Ré ser condenada a pagar ao Autor:
c) a quantia de 4.624 Euros a título da privação da utilização do veículo automóvel;
f) juros vincendos até efectivo e integral pagamento (também sobre as quantias reclamadas sob as alíneas b) d) e e) ).
Quanto a esta parte do pedido, em síntese, o autor alega factualidade que no seu entender constitui assédio moral por parte da ré e, ainda, que esta lhe atribuiu um veículo automóvel que podia utilizar na sua vida pessoal, que lhe foi ilicitamente retirado pela mesma.
Tendo a ré apresentado contestação, onde impugnou a essencialidade da matéria de facto em que o autor assenta a sua pretensão. E pede que o autor seja condenado como litigante de má-fé.
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Realizou-se uma audiência preliminar, nos termos que constam das actas lavradas de 05.12.2018 a 05.04.2019, no âmbito da qual, frustrada a tentada conciliação das partes, foi proferido saneador, julgando verificados os necessários pressupostos processuais e improcedente a excepção da caducidade do procedimento disciplinar deduzida pelo A., admitida a reconvenção e procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e à organização da base instrutória, não tendo havido qualquer reclamação.
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Nos termos documentados nas actas datadas de dia 29.10.2019 a 14.11.2019, realizou-se a audiência de julgamento e conclusos os autos para o efeito, em 27.12.2019 foi proferida sentença, terminando a parte decisória, com o seguinte dispositivo:
Nos termos e pelos fundamentos expostos, declara-se ilícito o despedimento do autor, promovido pela ré, e condeno a ré:
A pagar ao autor uma indemnização, em substituição do direito à reintegração, no valor de €27.201,24 (vinte e sete mil duzentos e um euros e vinte e quatro cêntimos)(sem prejuízo da ulterior actualização do valor da pensão em razão da data do trânsito da decisão final);
A pagar ao autor a importância correspondente às retribuições que deixou de auferir desde trinta dias antes da data da instauração da acção até ao trânsito da decisão final, deduzida das quantias que o autor recebeu e/ou venha a receber a título de subsídio de desemprego, importância essa a liquidar através do competente incidente;
A pagar ao autor a quantia (global) de €2.352,63 (dois trezentos e cinquenta e dois euros e sessenta e três cêntimos), a título de férias não gozadas e de proporcionais de férias e de subsídios de férias e de Natal;
A pagar ao autor a quantia que vier a apurar-se, através do incidente de liquidação, a título de retribuição por trabalho suplementar, nos termos supra delimitados (trabalho que o autor prestou para além do respectivo horário por força de participar nas reuniões e evento identificados).
São devidos juros de mora como peticionado, à taxa legal, sobre as retribuições que o autor deixou de auferir a partir da data em que cada uma deveria ter sido paga, e sobre o valor de €2.352,63 e o valor que vier a apurar-se a título de trabalho suplementar desde a data da cessação do contrato de trabalho.
Relativamente ao mais peticionado, julgo improcedentes a acção/reconvenção.
Valor da acção: €141.682,60.
Custas pelo autor e pela ré, na proporção do respectivo decaimento.
Registe e notifique.
Transitado comunique à Segurança Social.”.
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Inconformada a Ré interpôs recurso, nos termos das alegações juntas, que terminou com as seguintes CONCLUSÕES:
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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No despacho proferido em 18.03.2020, o Mº Juiz “a quo”, pronunciou-se quanto à arguida nulidade da sentença, nos seguintes termos:
«Tomando posição quanto à arguida nulidade da sentença (art.s 641.º/1 do CPC e 1.º/2 a) do CPT):
Efectivamente considerou-se provado:
“57 – do quesito 23 – A referida mercadoria tem um valor global de €10.242,02 e não de €10.058,57 como é referido na acusação, na medida em que a guia de devolução de mercadoria emitida pela D… com o nº …….. continha um erro porque não reflectia qualquer valor de IVA.”.
E consignou-se na motivação da matéria de facto:
“Não se provaram outros factos com interesse para a boa decisão da causa, designadamente dos alegados pelas partes nos respectivos articulados, nomeadamente não se provou, dos levados à BI, a matéria do quesito 18 (A mercadoria identificada na guia de devolução rubricada pelo autor foi por ele levantada nos armazéns da D… e não deu entrada em nenhum dos estabelecimentos da B…) nem do quesito 19 (Relativamente à mercadoria identificada nas restantes duas guias de devolução, o autor também procedeu ao seu levantamento nos armazéns da D…, não tendo a mesma dado entrada em nenhum dos estabelecimentos da B…), estando consequentemente prejudicadas as respostas aos quesitos 22 e 23, sempre não provados.”.
Donde, a contradição verifica-se.
Isto posto:
O quesito 23.º tem a seguinte redacção:
“23 – A referida mercadoria tem um valor global de €10.242,02 e não de €10.058,57 como é referido na acusação, na medida em que a guia de devolução de mercadoria emitida pela D… com o nº …….. continha um erro porque não reflectia qualquer valor de IVA?”.
E dos quesitos 18.º e 19.º, por sua vez, consta:
“18 – A mercadoria identificada na guia de devolução rubricada pelo autor foi por ele levantada nos armazéns da D… e não deu entrada em nenhum dos estabelecimentos da B…?
19 – Relativamente à mercadoria identificada nas restantes duas guias de devolução, o autor também procedeu ao seu levantamento nos armazéns da D…, não tendo a mesma dado entrada em nenhum dos estabelecimentos da B…?”
Ora, como decorre do contexto da motivação da matéria de facto, a relação de prejudicialidade existe (com referência aos quesitos 18 e 19) relativamente ao quesito 22 (22 – A B… desconhece o paradeiro e o destino que o autor deu a toda a mercadoria por ele levantada no armazém da D…?), mas já não quanto à matéria do quesito 23, porquanto, independentemente de ter o autor praticado ou não a conduta que a ré lhe imputa, a mercadoria em questão tem o seu valor (que resultou provado ser aquele quesitado).
Ante o exposto, e sanando-se a nulidade arguida, na motivação da matéria de facto no excerto supra citado, onde diz “estando consequentemente prejudicadas as respostas aos quesitos 22 e 23, sempre não provados.” passa a constar “estando consequentemente prejudicada a resposta ao quesitos 22, sempre não provado.”.».
O recurso foi admitido na 1ª instância, como apelação, com subida nos próprios autos e efeito suspensivo, considerando a caução validamente prestada pela ré/recorrente.
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Neste Tribunal a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, no essencial, porque deverá manter-se inalterada a matéria de facto e a decisão recorrida.
Notificadas as partes não responderam a este.
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Cumpridos os vistos, nos termos do disposto no art. 657º, nº 2, do CPC, há que apreciar e decidir.
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Questão Prévia
Com as suas alegações vem a apelante, anexar um documento.
O que, atento o disposto nos art.s 423º e ss. e 651º, do CPC, importaria que se tecessem algumas considerações, nesta fase processual.
No entanto, como a própria apelante teve, desde logo, o cuidado de referir, trata-se de um documento (cópia da acusação proferida contra o, aqui, A.), “já junto aos autos laborais por requerimento em 6 de junho de 2019” e que é anexado, agora, “para facilidade de consulta”.
Sendo deste modo, mostra-se prejudicada a pronúncia que se imporia, neste momento processual, quanto à admissibilidade ou não do mesmo.
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É sabido que, salvo as matérias de conhecimento oficioso, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, não sendo lícito a este Tribunal “ad quem” conhecer de matérias nelas não incluídas (cfr. art.s 635º, nº 4, 639º, nº 1 e 608º nº 2, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável “ex vi” do art. 1º, nº 2, al. a), do CPT aprovado pelo DL 295/2009, de 13.10).
Assim, as questões suscitadas e a apreciar consistem em saber:
- se ocorre a invocada nulidade da sentença;
- da prova e do erro na formação da convicção do Tribunal “a quo” (arts. 413.º, 607.º/4 e art.º 607.º do CPC, aplicáveis “ex vi” o art.º 1º/2-a) do CPT;
- se a matéria de facto deve ser alterada nos termos impugnados;
- se ocorre justa causa de despedimento e foi lícito o despedimento do A., como defende a recorrente, ou tal não acontece como se considerou na decisão recorrida.
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II - FUNDAMENTAÇÃO
A) - Os Factos
“ – Factos Provados:
(da selecção da matéria de facto assente)
1 - a) O autor/trabalhador é funcionário da ré desde 01/02/2002, reportando-se a sua antiguidade a essa data.
2 - b) O autor tem a categoria profissional de vendedor/técnico de vendas desempenhando as suas funções na zona norte do país.
3 - c) Não existe, desde a data da contratação, qualquer registo de infracções disciplinares do autor.
4 - d) No desenvolvimento da sua actividade, o autor detém uma carteira de clientes que vai gerindo na zona norte do país, desempenhando as suas funções nos distritos de …, …, …, …, …, …, … e ….
5 - e) O autor é auxiliado por E…, Key Account Manager, que coordena os clientes acompanhados/geridos por aquele.
6 - f) Sendo seu superior hierárquico F…, responsável do departamento comercial e director de unidade de negócio da B….
7 - g) O autor gere uma carteira de clientes e, entre eles, a D…, S.A.
8 - h) O cliente D…, S.A. é uma empresa que se dedica ao comércio por grosso de produtos alimentares desenvolvendo a sua actividade essencialmente no norte do país.
9 - i) O cliente D… é associado da G…, mantendo, há muitos anos, uma relação comercial com a B….
10 - j) Há mais de 10 anos que o autor acompanha/gere o cliente D….
11 - l) Neste contexto, sempre que há necessidade de tratar de algum assunto relativamente a este cliente é solicitada a intervenção do autor.
12 - m) No dia 30/10/2017 foi enviado por H… (departamento de contabilidade da B…) um email para I… (D…), dando conhecimento, entre outros, a F…, E… e C…, pedindo as segundas vias dos documentos nºs …/……, …/…… e …/…… que suportam devoluções de mercadoria no valor global de €10.058,57 (dez mil e cinquenta e oito euros e cinquenta e sete cêntimos).
13 - n) Em 31/10/2017, foi enviado pela B… novo email à D…, com o conhecimento, entre outros, a F…, E… e C…, pedindo os documentos de transporte, porque as guias de devolução não tinham qualquer “assinatura legível, nem carimbo do transportador”, o que dificultava a verificação de entrada das mercadorias em causa no armazém.
14 - o) Em 03/11/2017, F… envia um email para o autor, reencaminhando os emails trocados com o cliente D… no dia 30/10/2017, solicitando que este o ajude a perceber a razão destes débitos que o cliente afirma serem devolução de mercadoria.
15 - p) Nesse momento e considerando os esclarecimentos prestados pela D…, F… precisava que o autor o ajudasse a esclarecer o assunto, porque apesar do eventual levantamento para entrega noutro cliente não ter sido autorizado pelo próprio, essa situação poderia ainda assim ter existido.
16 - q) No dia 08/11/2017, F… enviou novo email para o autor, insistindo na necessidade de esclarecimento sobre esta matéria por parte deste.
17 - r) Foi enviado em 23/11/2017 novo email para o autor, insistindo na necessidade deste prestar os esclarecimentos necessários relativamente a este tema (alegado desaparecimento de mercadoria).
18 - s) Em resposta, em 06/12/2017, o autor informa por email através do seu endereço profissional C…@B….pt, que não conseguia ajudar o seu superior hierárquico, porque não tinha acesso às encomendas nem aos ficheiros da B…, uma vez que não tinha computador.
19 - t) Ainda em 06/12/2017, o autor informa J… (responsável informático) e F… (director da unidade de negócio) que não tinha computador porque o mesmo tinha sido entregue na B… uma vez que só funcionava ligado à corrente.
20 - u) Terminada a análise referida, F… enviou em 12/12/2017 um email para o autor com o seguinte conteúdo: “Boa tarde C…, por forma a facilitar e tornar célere a tua análise sobre este assunto, envio-te em anexo as cópias das encomendas realizadas nos meses relativos aos débitos de devolução do cliente D…. Envio-te também os respectivos débitos de devolução.
Queria ainda informar-te do seguinte:
Confrontámos o cliente com o facto de 2 dos 3 débitos não terem a tua habitual assinatura tendo o cliente esclarecido que só tu tinhas autorização para levantar produto;
Confrontámos igualmente o cliente com o facto das quantidades enviadas a bónus nas encomendas dos meses a que os débitos dizem respeito terem a mesma quantidade dos produtos devolvidos nas guias de devolução, acreditando que poderia tratar-se do mesmo produto. Contudo, o cliente afirmou que se trata de assuntos distintos já que os bónus enviados serviram para pagar acções de sell-out combinadas antecipadamente connosco.
Realmente, tendo em conta o texto que colocaste na encomenda, confirma-se que informaste internamente que estes bónus seriam para pagar acções de ……. e de Aniversário.
Face ao exposto, solicito que nos digas onde está o tal produto devolvido pelo cliente.
Se necessitares de mais alguma informação/documento para poderes esclarecer o que se está a passar, agradeço que me digas já que no nosso sistema, temos o registo de toda a operação.
Aguardo a tua resposta muito urgente.”
21 - v) A este email, o autor respondeu através do email profissional C…@B….pt, em 15/12/2017, informando que já se tinha passado muito tempo, pelo que não se recordava do assunto, mas que era quase impossível ter sido ele a “trazer tanta caixa”, levantando a hipótese de ter sido transportado pela K….
22 - x) F… enviou, em 12/12/2017, um email ao autor com o seguinte conteúdo:
“Bom dia C…,
Relativamente ao computador da empresa, resumo-te os factos que apurei:
1º No dia 07/03/2014 foi-te entregue um computador portátil HP … com o nº de série ………… e com o nº interno de imobilizado .......;
2º Até à data, nos registos internos da empresa, o aparelho continua registado como estando na tua posse;
3º Até á data, não existe qualquer registo de reclamação ou defeitos relativamente a este computador;
3º o aparelho não se encontra fisicamente na empresa.
Tendo este imobilizado sido entregue à tua responsabilidade, necessito com urgência que me digas onde é que ele está.
Esta resposta carece de máxima urgência.
Aguardo.”
23 - z) Em resposta, o autor enviou através do email profissional C…@B….pt para F…, em 15/12/2017, um email com o seguinte conteúdo:
“Boa tarde F…,
Relativamente ao computador, e se não existe registo de reclamações ou defeitos, foi porque foram feitas verbalmente, como em muitas outras situações.
Foi-lhe trocado a bateria, e formatado. Na altura, era um rapaz novo que estava na informática, não me recordo o nome (ainda no escritório antigo) que me formatou o computador sem me fazer cópia de segurança, levando a que perdesse muitas informações.
Deixei o mesmo na empresa, porque não se arranjou solução para a lentidão do mesmo.
Comecei a usar o meu pessoal por iniciativa própria. Só que infelizmente, como tens conhecimento “verbalmente”, foi-me assaltado o carro e roubaram o meu computador, tendo estado a trabalhar no da minha irmã desde então.
Se não há registo da entrega do computador, eu pago, sem problema algum. Não sou, nem nunca fui pessoa de criar problemas. Eu não o tenho, isso é certo.
Relembro, que quando deixei a pen de dados, quando nos foi solicitado há pouco tempo atrás, também não assinei nenhum documento que a mesma tinha sido entregue. O mesmo se passou com a entrega da minha viatura, do meu tablet e cartão de dados ao L….
Estando ao dispor para qualquer esclarecimento.”
24 - aa) Reanalisados todos os registos e documentos da empresa sobre os instrumentos de trabalho afectos e à guarda do autor apurou-se que o último equipamento atribuído ao autor foi um computador portátil da marca e modelo HP …, com o número de série …………., adquirido pela empresa em 19/02/2014, entregue ao autor no dia 07/03/2014 e com registo interno de imobilizado nº ……
25 - bb) O valor em euros do computador em causa é de €200,00 (duzentos euros).
26 - cc) As funções de comercial implicam deslocações a vários clientes, com a entrega e manuseamento de diversa mercadoria.
27 - dd) O autor desempenhava as suas funções inserido numa equipa.
28 - ee) O autor encontrou-se de baixa médica entre 24-07-2017 a 26-03-2018.
29 - gg) No dia 07/02/2018 foi recebida na morada da sede da B… uma carta registada com aviso de recepção com o número de registo RH…….PT remetida por “M…, …, …, …. - … Valongo” que continha, pelo menos:
i. Uma carta manuscrita com o seguinte teor “Exmos. Senhores venho por este meio colocar esta carta que erradamente colocaram na minha caixa de correio. Cumprimentos”
(assinatura ilegível);
ii. A comunicação da instrutora datada de 01/02/2018 de fls. 101 e 102, que agora foi anexada a fls. 130 e 131 do PD.
iii. O envelope da B… dirigido ao trabalhador arguido, contendo a comunicação de instauração de processo disciplinar e a respectiva nota de culpa.
30 - hh) O trabalhador arguido não procedeu à consulta do procedimento disciplinar.
31 - ii) Nem tão pouco apresentou defesa escrita ou manifestou vontade de apresentar defesa oral.
32 - jj) O trabalhador arguido também não juntou qualquer documentação, nem arrolou quaisquer testemunhas e/ou requereu a realização de quaisquer diligências probatórias.
33 - ll) A decisão de despedimentos foi comunicada ao trabalhador no dia 31-05-2018.
34 - mm) O autor à data da cessação do contrato auferia a retribuição base mensal de 1.511,18€.
35 - nn) O horário de trabalho do autor, pelo menos até 31-10-2013, era de Segunda a Sexta feira, das 9 horas às 17 horas, com intervalo para almoço das 13 horas às 14 horas.
36 - oo) A empresa fazia mensalmente (excepto mês de Agosto) reuniões de vendas, na sede da empresa sita em Lisboa.
37 - pp) O autor vive (com referência à data dos factos), em Valongo (Praceta …, …, …, Valongo).
38 - qq) O autor trabalhou no dia 21 de Maio de 2017 (domingo), numa convenção organizada por um cliente, em Santa Maria da Feira, tendo o aqui autor recebido instruções para estar presente.
(das respostas à base instrutória)
39 - do quesito 1 – Como é procedimento da empresa, sempre que existe alguma divergência nos movimentos em aberto da conta corrente de um cliente, o Departamento de contabilidade o solicita a colaboração do Departamento comercial para a resolução do problema ou envia uma comunicação directamente ao cliente, pedindo os documentos e/ou informações necessárias para a regularização da divergência, dando conhecimento ao departamento comercial das comunicações trocadas.
40 - do quesito 2 – Procedimento, de enviar directamente a comunicação ao cliente, que foi seguido no dia 30/10/2017 relativamente a três documentos da D… relativos a alegadas devoluções de mercadoria que motivaram o desconto dos respectivos valores nos pagamentos de facturas relativas a fornecimentos de produto da B….
41 - do quesito 3 – Em resposta ao email referido em m) e no mesmo dia (30/10/2017), a D… envia os documentos solicitados por H…,
Devolução de mercadoria …/…… datada de 30/03/2016, de 100 caixas de 25 unidades de atum N… com o valor líquido de €3.057,69 (três mil e cinquenta e sete euros e sessenta e nove cêntimos),
Devolução de mercadoria …/……. datada de 27/04/2016, de 108 caixas de 25 unidades de atum N… com o valor líquido de €3.500,44 (três mil e quinhentos euros e quarenta e quatro cêntimos),
Devolução de mercadoria …/…… datada de 27/05/2016, de 108 caixas de 25 unidades de atum N… com o valor líquido de €3.500,44 (três mil e quinhentos euros e quarenta e quatro cêntimos).
42 - do quesito 4 – Considerando que o autor se encontrava de baixa médica, assumiu a responsabilidade pela resolução do problema, o seu coordenador operacional E….
43 - do quesito 5 – Na ausência de resposta que a ré considerasse esclarecedora por parte da D…, E… estabeleceu contacto telefónico directamente com O…, responsável de compras da D… para esclarecer o assunto.
44 - do quesito 6 – Nessa sequência, em 02/11/2017, E… enviou um email para O…, responsável de compras da D… questionando-o sobre quem levantava mercadoria no armazém da D…, qual a razão invocada para fazer os levantamentos e quem era o autor das assinaturas constantes das guias de devolução de mercadoria.
45 - do quesito 7 – No mesmo dia – 02/11/2017 – O… respondeu por email a E…, informando-o do seguinte:
a) após questionar o seu departamento de recepção de mercadoria foi informado que se tratavam de devoluções feitas a fornecedores e que “apenas o Sr. C… procedia ao levantamento”;
b) o autor pedia autorização ao responsável de compras da D…, O… para levantar mercadorias com a justificação de que necessitava de “desenrascar” outros clientes que não tinham atum N…;
c) reconhecia a assinatura do autor numa das devoluções.
46 - do quesito 8 – Nos procedimentos internos do departamento comercial da B… o levantamento de mercadoria junto de clientes depende de autorização prévia da Direcção, com o conhecimento do Key Account Manager respectivo.
47 - do quesito 9 – Uma vez que o cliente D… apenas identificava a assinatura do autor numa das guias de devolução de produto, mais precisamente na guia nº …/…… das guias de devolução de produto, E… enviou em 03/11/2017 novo email para O… (D…) questionando-o sobre a autoria/identidade das rubricas/assinaturas que constam das restantes duas guias.
48 - do quesito 10 – Em resposta e no mesmo dia (03/11/2017, a O… enviou um email para E…, dizendo “Não sei. Questionei a recepção de mercadorias que só tem memória de ser o C… a levantar”.
49 - do quesito11 – Destes emails, E… dá conhecimento a F….
50 - do quesito 12 – F… estabeleceu contacto telefónico com o responsável de compras da D…, O… para esclarecer quem havia levantado dos armazéns da D… aquela exacta mercadoria identificada nas guias de devolução.
51 - do quesito 13 – Durante esse contacto telefónico e com o telefone em alta voz, O… da D… chamou o seu chefe de armazém que confirmou que esses levantamentos tinham sido efectuados pelo autor, com a justificação de que “precisava de desenrascar outros clientes”.
52 - do quesito 14 – Ainda nessa conferência telefónica F… perguntou ao referido responsável de compras da D… sobre a “possibilidade dessa mesma mercadoria corresponder aos bónus de “sell-out” que, nos mesmos meses, foram “pagos” através de envio sob a forma de “oferta” nas encomendas efectuadas nos meses a que os débitos/devoluções dizem respeito (Março, Abril e Maio de 2016), uma vez que se tratavam das mesmas quantidades.
53 - do quesito 15 – Em resposta o responsável de compras da D… informou F… que se tratavam de “assuntos distintos, uma vez que os bónus enviados serviram para “pagar” acções “sell-out” acordadas antecipadamente com a B… e não para pagar os levantamentos efectuados por colaboradores da B… no seu armazém”.
54 - do quesito 16 – Não obstante os esclarecimentos prestados pelo responsável da D…, foram tomadas por F… outras providências para confirmação daquelas informações.
55 - do quesito 17 – Na sequência do descrito em s), foi enviado email para o responsável da informática da empresa J…, pedindo que ajudasse o autor a ter condições para prestar informações urgentes sobre o assunto.
56 - do quesito 20 – O produto mencionado nas guias de devolução não estava em rutura de stock na B… naquelas datas.
57 - do quesito 23 – A referida mercadoria tem um valor global de €10.242,02 e não de €10.058,57 como é referido na acusação, na medida em que a guia de devolução de mercadoria emitida pela D… com o nº …….. continha um erro porque não reflectia qualquer valor de IVA.
58 - do quesito 24 – O mencionado erro foi corrigido aquando da emissão pela B… em 11/12/2017 das notas de crédito nºs …/………., …/………. e …/………. respeitantes às guias de devolução de mercadoria juntas aos presentes autos.
59 - do quesito 25 – Valor que a D… não pagou.
60 - do quesito 26 – Na sequência do email do autor de 06/12/2017, referido em t), foi feita uma análise aos computadores e restantes equipamentos da B… que estavam afectos ao autor e à sua guarda.
61 - do quesito 27 – O computador referido em aa) não se encontra na empresa.
62 - do quesito 28 – Existem registos de reclamações sobre a bateria e lentidão apresentadas pelo autor relativamente ao seu anterior computador (… …p com o número de série ………. e com o número de imobilizado …..), reclamações estas que também estiveram na origem da decisão de substituição de computador no ano de 2014.
63 - do quesito 29 - O departamento de recursos humanos tem registos das ferramentas/instrumentos de trabalho de todos os trabalhadores, sendo que o departamento informático também tem registos relativamente às ferramentas de trabalho de natureza informática.
64 - do quesito 30 – Existe ainda uma pen de dados que foi entregue pela ré ao autor e que este nunca entregou na empresa.
65 - do quesito 31 – Não há registo da entrega do computador que lhe estava afecto (desde 07.03.2014) e lhe foi entregue pela empresa para o desempenho das suas funções.
66 - do quesito 33 – Não obstante lhe ter sido entregue o referido computador, o autor trabalhou com o seu computador pessoal, o que era do conhecimento da ré.
67 - do quesito 34 – Poucos meses antes de o autor ficar de baixa médica, o seu veículo foi vandalizado, tendo-lhe sido furtados alguns bens pessoais que lá se encontravam, onde se incluía o computador (pessoal) do autor.
68 - do quesito 35 – Com o aludido furto, o autor viu-se forçado a trabalhar com o computador de um familiar, que lhe emprestou até que a situação estivesse definitivamente resolvida.
69 - do quesito 36 – No momento em que foram tomadas todas estas diligências no sentido de perceber o que teria sucedido, o autor, além de se encontrar de baixa médica, encontrava-se, ainda, com o computador desse familiar, que não estava sempre disponível para o efeito.
70 - do quesito 37 – A baixa médica do autor, desde 24-07-2017 até 26-03-18 era psiquiátrica.
71 - do quesito 38 – O autor sofria entre outros sintomas, de ataques de pânico, e já antes do Natal de 2017 foi viver com a sua mãe, inclusive por indicações médicas, pelo que não estava a viver em sua casa, e ali permaneceu durante algum tempo.
72 - do quesito 39 – Desde o início das suas funções, o autor utilizava uma viatura da empresa, sendo que a última que lhe estava adjudicada, era da marca Opel, modelo …, …, cinco lugares, carrinha.
73 - do quesito 40 – Viatura esta que – não obstante as normas de atribuição e utilização e política de utilização das viaturas referidas nas respostas aos quesitos 117 e 120 - o aqui autor levava para sua casa, utilizando a mesma aos fins de semana, férias e outros dias festivos, com quilómetros ilimitados, sendo o gasóleo suportado pela empresa aqui ré, o que era do conhecimento e autorizado por esta.
74 - do quesito 42 – Em meados de Agosto de 2017, e bem sabendo que a viatura entregue ao autor é por este usada na sua vida particular, não dispondo este de qualquer outro carro, recebeu uma chamada da Dr.ª P… e ordenar-lhe a entrega do carro.
75 - do quesito 45 – Foi ordenado ao autor que fosse ele a levar o carro até ao seu colega L…, em Matosinhos
76 - do quesito 46 – O autor pediu a um cunhado para o ir buscar a tal lugar, mesmo tendo que passar pela vergonha de a empresa onde trabalhava há tantos anos lhe estar a retirar o carro que sempre teve.
77 - do quesito 47 – Desde essa data – meados de Agosto de 2017 – ficou sem carro.
78 - do quesito 48 – O autor, sente-se constrangido, humilhado pela empresa sempre que precisa de se deslocar de transportes públicos.
79 - do quesito 51 – O preço de aluguer por mês, por uma viatura similar à utilizada pelo autor é de cerca de 500€.
80 - do quesito 52 – O valor litro do gasóleo era de cerca de 1,30€.
81 - do quesito 53 – Foi entregue ao aqui autor um telemóvel da empresa, para uso profissional e pessoal, com chamadas ilimitadas.
82 - do quesito 54 – Foi-lhe ainda afecto, o acesso a internet no telemóvel, sendo que nos últimos tempos correspondia a 8gb.
83 - do quesito 55 – Cumulativamente, foi-lhe entregue um computador da empresa, para uso, pelo menos, profissional, podendo levá-lo para casa, em conjunto com um cartão de dados, para acesso à internet, ilimitado.
84 - do quesito 56 – E ainda um tablet.
85 - do quesito 57 – O autor não gozou em 2018 quaisquer férias, designadamente as reportadas ao trabalho prestado em 2017.
86 - do quesito 58 – Desde 01-02-2013 até final do contrato, o horário de trabalho do autor também foi de segunda a sexta feira das 9 às 17 horas com intervalo para almoço das 13 às 14 horas.
87 - dos quesitos 59 e 60 – Em 01/02/2013 para todos os comerciais que desempenhavam funções na zona norte do país (escritórios do Porto) foi estabelecido que o cumprimento do horário de trabalho seria feito de forma flexível com uma plataforma fixa obrigatória das 10h às 12h e das 15h às 17h com um mínimo de 1h para almoço, que também seria flexível, de forma a assegurar 7h diárias e 35 semanais.
88 - dos quesitos 61, 62, 63 e 64 – O autor era, por norma, obrigado a sair de casa pelas 6h/7h da manhã, usualmente ia buscar uma sua colega de trabalho Q… e em algumas outras vezes com S… e T…, e nos últimos tempos – desde Agosto de 2016 – L… – o que fazia a pedido da empresa – para assim conseguir cumprir com as indicações recebidas e chegar a Lisboa à hora marcada para o início das reuniões referidas em oo), que começavam por regra por volta das 10h mas que, pontualmente, começavam mais tarde, e que acabavam a horas variáveis, por regra depois das 16h, mas por vezes só cerca das 18/19 horas, precisando o autor de cerca de 3/4 horas para fazer o trajecto de regresso a casa.
89 - dos quesitos 67 e 68 – No início de 2014 ao autor foram atribuídas algumas tarefas de key account/controler de contas para o autor, cumulando com as que já tinha (de vendedor), passar a executar sob a supervisão do director F…, com vista à avaliação da sua capacidade para o exercício das funções de key account e à sua eventual promoção a essa categoria.
90 - do quesito 71 – O autor não veio a ser promovido à categoria de key account.
91 - do quesito 72 - O vencimento base mensal dos trabalhadores da ré com as funções de key account era de cerca de 1.600,00€, a que acrescia o valor mensal de cerca de € 400,00 a título de subsídio por isenção de horário.
92 - do quesito 73 – Em Junho de 2015 informaram o autor que, afinal não iria ser promovido a key account.
93 - do quesito 74 – O motivo para tal, segundo avançou F…, seu chefe, era de que o aqui autor era do Porto e como era responsável por uma facturação da empresa de cerca de 6.500,000 euros anuais (nas suas funções de vendedor), ou seja, bastante importante na facturação da zona Norte, e também porque entendia que o autor não reunia as condições inerentes à categoria profissional de KAM.
94 - do quesito 75 – Tal decisão abalou profundamente o autor, que tudo apostou para crescer na sua empresa e carreira.
95 - do quesito 76 – Face a tal posição do F… e à insatisfação manifestada pelo autor, o autor foi chamado a Lisboa para conversar com a Directora de Recursos Humanos Dr.ª P… e com a Dr.ª U… – assistente da administração.
96 - dos quesitos 77, 78, 79, 80, 81, 82 e 83 – Em razão do dissabor criado ao autor, que tudo apostou para aquela promoção e que se queixava de ter suportado custos e de trabalho acrescido por causa disso, a administração da ré decidiu compensar o autor entregando-lhe, pelo menos uma vez, uma quantia em dinheiro, cujo concreto montante se não apurou.
97 - do quesito 84 – A emissão pela D… das guias de devolução de mercadoria originou a emissão das correspondentes notas de crédito pela empregadora.
98 - do quesito 85 – Quando se procedeu à notificação da nota de culpa, o autor não levanta a correspondente carta do correio, que foi devolvida por “não reclamada”.
99 - do quesito 86 – Em 26/01/2018 foi enviada para a morada da residência do trabalhador, por correio registado, a respectiva Nota de Culpa.
100 - do quesito 87 – Considerando que em 31/01/2018 a carta registada com aviso de recepção enviada para o trabalhador, ainda não tinha sido por este levantada junto dos correios, foi solicitado ao trabalhador L… que se deslocasse à morada da residência do trabalhador, no dia 01/02/2018, para proceder à entrega, em mão, de cópia da comunicação de instauração de processo disciplinar anexando a nota de culpa junta a fls. 103 a 112 v. e ainda da comunicação junta a fls. 114 v. a 115 dos autos.
101 - dos quesitos 88, 89, 90, 91, 92, 93 e 94 – Em cumprimento da solicitação feita pela instrutora do procedimento disciplinar, no dia 01/02/2018, o trabalhador L… deslocou-se ao prédio onde se situa a morada da residência do trabalhador sita na Praceta …, …, …, em Valongo, para lhe entregar cópia da comunicação da nota de culpa junta a fls. 103 a 112v. e da comunicação junta a fls. 114v. a 115 dos autos, tendo deixado pelo menos a nota de culpa numa das caixas de correio do prédio, não se apurando em concreto se a correspondente à residência do autor se a correspondente à residência de um seu vizinho.
102 - do quesito 95 – Atendendo a que o trabalhador comunicava frequentemente com a empregadora através do seu email profissional C…@B….pt, em 02/02/2018 foi enviado um email para o trabalhador anexando cópia de todos os documentos depositados na caixa de correio do trabalhador, junto a fls.117v. a 127 dos autos.
103 - do quesito 96 – Em 02/02/2018, foi recebido um recibo de leitura do email referido em 95.
104 - do quesito 97 - O envelope referido em gg) foi recebido no estado de aberto.
105 - do quesito 98 – Na sequência da recepção destes documentos, mais precisamente em 08/02/2018, foi enviado novo email para o trabalhador, informando que se considerava notificado em 01/02/2018 (ou mesmo que assim não se entenda em 02/02/2018) da nota de culpa e reiterando que dispunha de 10 dias úteis para consultar o processo, podendo caso assim o entendesse, apresentar resposta à nota de culpa.
106 - do quesito 99 – Em anexo ao email referido no ponto anterior, foram enviados para o trabalhador os comprovativos de entrega e leitura do email da instrutora datado de 01/02/2018.
107 - do quesito 100 – Em 09/02/2018 foi recebida na morada da sede da B… a carta enviada para o trabalhador em 26/01/2018 devolvida pelos correios, com a indicação de “objecto não reclamado”.
108 - do quesito 101 - O trabalhador não comunicou à empregadora outras moradas ou qualquer outro facto impeditivo do recebimento de qualquer das cartas.
109 - do quesito 102 – A existência de desconformidades na conta corrente de clientes como a D…, produto de devoluções ou outras situações, é ocorrência relativamente corrente na actividade comercial da empregadora, por vezes só detectada e resolvida algum tempo depois.
110 - do quesito 103 – Há uma instrução de trabalho relativamente às devoluções, reduzida a escrito, cuja versão (em vigor desde 15/01/2013) é a que consta do documento 1 da resposta no proc. 1429/18.3T8VLG, a fls. 240v. e 241, e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
111 - do quesito 104 – Os trabalhadores têm todos conhecimento disso.
112 - do quesito 106 – As funções exercidas por C… eram as seguintes:
- gestão e acompanhamento de uma carteira de clientes, de venda directa, inserida dentro da área geográfica do norte do país e enquadrados num rooting de visitas pré-definido;
- cumprimento da política comercial definida para os produtos e para os clientes;
- cumprimento do orçamento de vendas que lhe está atribuído;
- negociação, implementação e controlo de acções de comércio integrado;
- controlo de acções de destaque acordadas com clientes;
- controlo de stocks da sua carteira de clientes;
- acompanhamento dos PVP´s em mercado;
- acompanhamento das acções da concorrência no mercado;
- ter sempre a preocupação de salvaguardar a rentabilidade do negócio;
- assegurar a boa cobrança dos produtos vendidos.
113 – do quesito 107 – As funções definidas pela ré para a categoria profissional de KAM foram e são as seguintes:
- colaborar na concepção do plano estratégico do cliente e assegurar a sua implementação;
- contribuir para o atingimento das metas da empresa: vendas em valor e volume, “market share” e rentabilidade;
- acompanhar a negociação dos acordos anuais;
- conhecer e compreender aprofundadamente os seus clientes (histórico, estrutura, …, estratégia dos clientes, etc.);
- manter/desenvolver/estreitar relacionamento profissional com todas as pessoas relevantes dentro da organização do cliente (desde as centrais às lojas e com todos os departamentos influentes – compra, vendas, logística, marketing e financeira);
- contactar de forma permanente com o comprador e em complementaridade, realizar “Business Reviews” periódicos com ele e/ou com outros departamentos do cliente, a fim de optimizar a compreensão do cliente e a antecipação de oportunidades e promover a comunicação;
- analisar dados de mercado (…) e comunicar/apresentar as principais conclusões aos seus clientes;
- garantir que os investimentos promocionais nos seus clientes são optimizados;
- gerir e acompanhar a implementação das actividades promocionais (topos, folhetos, expositores, ilhas) e desenvolver acções tailor made;
- analisar continuamente o actual sortido de modo a garantir a introdução das inovações, e a conquistar distribuição numérica e ponderada;
- apoiar os departamentos de marketing e planeamento com feedbacks atempados;
- implementar e acompanhar projectos específicos relacionados com os seus clientes;
- analisar, implementar e realizar a gestão do placement nos seus clientes;
- acompanhar as lojas que lhes estão afectas, garantindo a minimização de ruturas e boa visibilidade e comunicação dos seus produtos e marcas, acompanhando e apoiando o trabalho realizado pela equipa de merchandisers nas lojas dos seus clientes;
- representar adequadamente as empresas do grupo em todas as ocasiões.
114 - do quesito 110 – Após o exercício de 2014 iniciou-se um processo de reestruturação organizacional, tendo sido decidido contratar e/ou promover 3 (três) trabalhadores para desempenharem funções de KAM – Key Account Manager – e mais 1 ou 2 vendedores/técnicos de vendas para a zona norte do país.
115 - do quesito 111 – Terminado o período de análise acima referido, foi decidido promover unicamente E… a KAM, uma vez que o director F… entendeu que o C… ainda não reunia as condições para o desempenho das funções inerentes a essa categoria profissional, na medida em que no entender daquele director não revelou capacidades estratégicas e analíticas essenciais para o desempenho das mesmas nem capacidade para trabalhar com a autonomia requerida para a função, contrariamente ao que sucedeu com E…, e também porque entendia que o autor fazia falta como vendedor.
116 - do quesito 112 – Assim, com efeitos a partir de 1 de Julho de 2015, o trabalhador E… passou a exercer funções de KAM.
117 - do quesito 113 – Passando a auferir uma retribuição mensal fixa de €1.600,00 e ainda uma retribuição especial mensal por isenção de horário de trabalho de €400,00.
118 - dos quesitos 108, 114 e 115 – Atendendo ao volume de trabalho e peso de facturação para a B…, a partir de 10 de Agosto de 2015 foi contratado L… e repartida a zona geográfica e clientes pelos 2 (dois) vendedores/técnicos de venda.
119 - do quesito 109 – A necessidade de 2 (dois) técnicos de venda/vendedores na zona Norte do país prendeu-se com o seguinte:
- perda de negócio no canal cash no ano de 2014 por falta de cobertura dos clientes de grande dimensão;
- incapacidade para conquistar novos clientes, uma vez que o vendedor existente não conseguia dar resposta sequer aos clientes existentes.
120 – do quesito 116 – A B… facultou ao então trabalhador C… a utilização de bens considerados necessários ou convenientes para o exercício das suas funções, a saber:
- computador portátil marca … com número de série ………. entregue em 07/03/2014;
- pen USB – IMEI modelo …… com o número de série …………;
- cartão V… telemóvel com ICCID …………, sendo que o equipamento por opção do trabalhador era pessoal;
- veículo automóvel da marca Opel modelo … com a matrícula .. – SH - .. devolvido em 21/08/2017, para uso em serviço;
- cartão de combustível W… com o nº ……………….. devolvido em 21/08/2017;
- tablet marca Samsung … com o nº de série ………… devolvido em 30/10/2017;
- cartão V… tablet com ............ devolvido em 02/11/2017;
- identificador Via Verde modelo ……… suspenso em 21/08/2017, sendo que o identificador não foi devolvido pelo trabalhador;
- fundo de maneio de €1.000,00 (€500,00 entregue em 13/02/2001 e €500,00 entregue em 16/03/2004).
121 - do quesito 117 – Desde 01-07-2009 que existiam normas de atribuição e utilização de viaturas reduzidas a escrito e do conhecimento de todos os trabalhadores.
122 - do quesito 118 – Dessas normas internas constavam as seguintes:
- a viatura é colocada à disposição do colaborador com a finalidade exclusiva da sua utilização ao serviço da empresa;
- entre o termo do dia de trabalho e o início do trabalho do dia seguinte, a B… autoriza o colaborador a utilizar a viatura em regime de comodato;
- para pagamento do combustível utilizado em serviço da empresa é sempre obrigatória a utilização do cartão de combustível que para o efeito será entregue pela empresa ao colaborador;
- entre o termo do dia de trabalho e o início do trabalho do dia seguinte, o colaborador deverá utilizar o cartão de abastecimento de combustível com probidade;
- em caso de suspensão de contrato de trabalho, a viatura deverá ser colocada nas instalações da empresa.
123 – do quesito 119 – A viatura de serviço utilizada pelo trabalhador arguido foi solicitada pela B… ao então trabalhador C… em 06/11/2017, uma vez que o mesmo se encontrava de baixa não necessitando por essa razão da mesma para trabalhar.
124 – do quesito 120 - Nos termos do “ponto 11” da política de utilização das viaturas, que é do conhecimento do trabalhador, nos seguintes termos:
“Em caso de suspensão do contrato de trabalho, quer por suspensão preventiva em processo disciplinar, quer por aplicação de sanção disciplinar, quer ainda por impedimento prolongado por parte do colaborador, a viatura deverá ser colocada nas instalações da empresa.”.
125 – do quesito 121 – Quando o trabalhador arguido entra de baixa, os quilómetros do carro do colega L…, vendedor também da zona Norte, tinha excedido os quilómetros contratados e a empregadora estava a pagar um valor muito elevado à X… pelos quilómetros a mais que o veículo de serviço do trabalhador L… tinha.
Não se provaram outros factos com interesse para a boa decisão da causa, designadamente dos alegados pelas partes nos respectivos articulados, nomeadamente não se provou, dos levados à BI, a matéria do quesito 18 (A mercadoria identificada na guia de devolução rubricada pelo autor foi por ele levantada nos armazéns da D… e não deu entrada em nenhum dos estabelecimentos da B…) nem do quesito 19 (Relativamente à mercadoria identificada nas restantes duas guias de devolução, o autor também procedeu ao seu levantamento nos armazéns da D…, não tendo a mesma dado entrada em nenhum dos estabelecimentos da B…), estando consequentemente prejudicadas as respostas aos quesitos 22 e 23, sempre não provados.”.
*
Previamente, a prosseguirmos com a análise das questões colocadas pela apelante no recurso, por o julgarmos relevante para apreciação da questão principal a decidir, com o teor da Nota de Culpa, adita-se, em síntese, o seguinte facto:
“126 - NOTA DE CULPA
A) O presente processo disciplinar foi ordenado no dia 20 de Dezembro de 2017 pelos administradores dos pelouros jurídico e de recursos humanos da B…, S.A. (adiante designada por B…), para apurar e esclarecer um conjunto de factos relatados na comunicação interna datada de 18/12/2017 e respetivos anexos que indiciam a prática de infracções disciplinares muito graves por parte do trabalhador C…, com a categoria profissional de Vendedor, adiante designado por trabalhador-arguido ou C….
B) No âmbito do processo disciplinar e de forma a fundamentar a elaboração da Nota de Culpa, foi recolhida a seguinte documentação:
i. Comunicação interna do Diretor de Unidade de Negócio F… datada de 18/12/2017 e respetivos anexos:
a. Email de H… (Departamento de contabilidade da empresa) para I… (D…), com conhecimento, entre outros, a C…, datado de 30/10/2017;
(...).
D) Com base nos factos apurados no decurso do processo e na documentação junta aos autos, elabora-se a presente Nota de Culpa, nos termos do previsto no art. 353.s do Código do Trabalho, imputando-se ao trabalhador-arguido, os seguintes comportamentos:
ENQUADRAMENTO
1.2 O trabalhador arguido é funcionário da empresa desde 01/02/2002, reportando-se a sua antiguidade a essa data.
2.2 O trabalhador arguido tem a categoria profissional de Vendedor - Gestor de Zona.
3.2 Não existe, desde a data da contratação, qualquer registo de infracções disciplinares do trabalhador arguido.
4.2 o Key Account Manager que coordena os clientes acompanhados/geridos pelo trabalhador arguido é E….
5.2 O responsável do departamento comercial e superior hierárquico do trabalhador arguido é F…, Diretor de Unidade de Negócio da B….
6.2 O cliente D…, S.A. (adiante designado por D…) é uma empresa que se dedica ao comércio por grosso de produtos alimentares desenvolvendo a sua atividade essencialmente no norte do país.
7.2 O cliente D… é associado da G… mantendo, há muitos anos, uma relação comercial com a B….
8.2 O cliente D… integra a carteira de clientes acompanhados/geridos pelo trabalhador arguido.
9.2 Há mais de 10 (dez) anos que o trabalhador arguido acompanha/gere o cliente D…
10.3 Neste contexto, sempre que há necessidade de tratar de algum assunto relativamente a este cliente é solicitada a intervenção do trabalhador C….
ll. Como é procedimento da empresa, sempre que existe alguma divergência nos movimentos em aberto da conta corrente de um cliente, o Departamento de Contabilidade envia uma comunicação diretamente ao cliente, pedindo os documentos e/ou informações necessárias para a regularização da divergência, dando conhecimento ao departamento comercial das comunicações trocadas.
DA MERCADORIA MELHOR IDENTIFICADA NAS GUIAS DE DEVOLUÇÃO DE FLS. 14, 15, 17, 46, 47 E 48 DOS AUTOS
12.2 Procedimento que foi seguido no dia 30/10/2017 relativamente a três documentos O da D… relativos a alegadas devoluções de mercadoria que motivaram o desconto dos respetivos valores nos pagamentos de faturas relativas a fornecimentos de produto da B….
(...)
Assim,
39.2A mercadoria identificada na guia de devolução rubricada pelo trabalhador arguido e melhor identificada a fls. 17 foi por ele levantada nos armazéns da D… e não deu entrada em nenhum dos estabelecimentos da B….
40.2Relativamente à mercadoria identificada nas guias de devolução constantes de fls. 14 e 15, o trabalhador arguido também procedeu ao seu levantamento nos armazéns da D…, não tendo a mesma dado entrada em nenhum dos estabelecimentos da B….
41.2A justificação apresentada pelo trabalhador arguido à D… para efetuar os 3 (três) levantamentos de mercadoria não corresponde à verdade, porque o produto em causa não estava em rutura de stock na B… naquelas datas.
42.2Apesar das quantidades entregues pela B… ao cliente D… no denominado "bónus de "selí-out" serem coincidentes com as quantidades de produto levantado pelo trabalhador arguido no armazém da D…, as primeiras foram entregues ao cliente D… em data imediatamente posterior a cada um dos levantamentos, não se tratando por isso do mesmo produto.
43.2A K… não transportou o produto identificado nas guias de devolução de mercadoria de fls. 14,15 e 17 dos presente autos.
44.2Não é impossível que a mercadoria em causa fosse transportada pelo trabalhador arguido utilizando o veículo automóvel que lhe estava afecto para o desempenho das suas funções de Vendedor.
45.2Na medida em que, à data, o veículo era uma carrinha da marca Opel, cfr. fls.63 dos autos.
46.2A B… desconhece o paradeiro e o destino que o trabalhador arguido deu a toda a mercadoria por ele levantada no armazém da D….
47.2A referida mercadoria tem um valor global de €10.058,57.
48.9 Valor que a D… descontou ao pagamento de faturas da B… relativas a fornecimento de conservas de peixe, na medida em que entregou ao trabalhador todo o produto melhor identificado nas respetivas guias de devolução.
49.2Com a adoção dos comportamentos acima descritos, o trabalhador arguido causou prejuízos à B… no montante de €10.058,57.
50.2Para além dos prejuízos causados à imagem, bom nome e marcas da empresa junto do seu cliente D….
DO COMPUTADOR DA MARCA HP PROBOOK … COM O N2 DE SÉRIE …………. E COM O N2 INTERNO DE IMOBILIZADO .......
51.2 Na sequência do email do trabalhador arguido referido em 332, f0j feita uma análise aos computadores e restantes equipamentos da B… que estavam afectos ao trabalhador arguido e à sua guarda.
(...).
54.2Reanalisados todos os registos e documentos da empresa sobre os instrumentos de trabalho afectos e à guarda do trabalhador arguido apurou-se que,
55.20 último equipamento atribuído ao trabalhador arguido foi um computador portátil da marca e modelo …, com o número de série …….., adquirido pela empresa em 19/02/2014, entregue ao trabalhador arguido no dia 07/03/2014 e com registo interno de imobilizado n2 …...
56.2Não existe qualquer registo de entrega feita pelo trabalhador arguido relativamente a este equipamento, nem mesmo da entrada do mesmo no Departamento Informático.
57.20 referido computador não se encontra na empresa.
58.2Não existe qualquer registo de reclamação apresentada pelo trabalhador arguido relativamente a este computador (HP ProBook …, com o número de série ……..);
(...)
61.2Existe ainda uma pen de dados que está na posse do trabalhador arguido e que este nunca entregou na empresa.
62.2Tal como também tem, em seu poder ou pelo menos sabe do paradeiro, do computador melhor identificado em 539.
63.20 valor em euros do computador em causa é de €200,00 (duzentos euros).
64.2Prejudicando a empresa nesse valor.
CONCLUSÕES
65.2Com a adoção dos comportamentos supra descritos, o trabalhador C… violou os seguintes deveres laborais:
- Respeitar e tratar o empregador, os superiores hierárquicos e os companheiros de trabalho com urbanidade e probidade;
- Realizar o trabalho com zelo e diligência;
- Cumprir as ordens do empregador e superiores hierárquicos respeitantes à execução e disciplina no trabalho;
- Guardar lealdade ao empregador;
- Velar pela conservação e e boa utilização de bens relacionados com o trabalho que lhe forem confiados pelo empregador;
- Promover ou executar os actos tendentes à melhoria da produtividade da empresa.
66.2 Encontrando-se assim indiciado pela prática de comportamentos que consubstanciam a violação de deveres dos trabalhadores previstos nas alíneas a), c)/ e), f), g) e h) do n.e 1 do art. 128.º do Código do Trabalho.
67.2 Para além da adoção dos comportamentos relativos às devoluções de mercadorias consubstanciarem a prática de um ilícito de natureza criminal.
68.2 Os comportamentos supra foram adotados pelo trabalhador arguido de forma totalmente consciente e voluntária, sendo que, mesmo quando confrontado com eles, o trabalhador arguido decidiu não os reconhecer.
69.2 Denotam ausência de sentido de responsabilidade e causam descredibilidade no seu trabalho.
70.2Revelam desleixo total e falta de cuidado, no que à matéria relativa ao computador, diz respeito.
71.2implicam perda total de confiança no trabalhador atendendo ao posto que ocupa - Vendedor, na medida que acompanha e gere uma carteira de clientes que representa 11,4% da faturação anual da B….
72.2 Geram mal estar na equipa de trabalho.
73.2Revelam mau exemplo para os demais trabalhadores e colegas.
74.2 Afetam a imagem da empresa junto de um cliente tão importante como a D….
75.2 0s comportamentos supra revelam também uma atitude irresponsável e censurável, quebrando de forma irremediável a necessária confiança que existe na sua relação laboral.
76.2Neste contexto, considera-se que os comportamentos do trabalhador-arguido constituem um ilícito de natureza criminal e ainda uma infracção disciplinar muito grave, porquanto, a confirmarem-se, constituem uma violação grave dos deveres laborais acima referidos, que afetam e tornam imediata e praticamente impossível a manutenção da relação laboral e são passíveis de justificar a aplicação da sanção disciplinar prevista no art. 3289 n.2 1 alínea f) do Código do Trabalho, face ao disposto nos n.os 1 e 2 do art.2 351.2 do Código do Trabalho.
77.2Assim, deverá remeter-se uma cópia da presente nota de culpa ao trabalhador arguido, com a menção expressa de que é intenção da empresa proceder ao seu despedimento se se confirmarem as acusações que lhe são dirigidas, dispondo o trabalhador C…, nos termos do disposto no art. 3552 n.s 1 do Código do Trabalho, "de dez dias úteis para consultar o processo e responder à nota de culpa, deduzindo por escrito os elementos que considere relevantes para esclarecer os factos e a sua participação nos mesmos, podendo juntar documentos e solicitar as diligências probatórias que se mostrem pertinentes para o esclarecimento da verdade".
Lisboa, 26 de janeiro de 2018
A Instrutora,”.
*
B) O DIREITO
- Da nulidade da sentença
A primeira questão a apreciar, consiste em apurar da arguida nulidade da sentença, o que a apelante faz, nos termos e para os efeitos do art.º 615.º/1-c) do CPC, aplicável “ex vi” o art.º 1.º do CPT, alegando que o “douto Tribunal dá, simultaneamente, como “provado” e “não provado” o mesmo facto.
Assim é porque, na resposta à matéria de facto, inclui a factualidade do quesito n.º 23 como provada (facto 57). No entanto, em sede de fundamentação das suas respostas, no final da pág. 22 da sentença, refere que dá o mesmo quesito 23 como não provado, por efeito de dar como não provados os quesitos 18 e 19.
Representa uma contradição expressa entre as respostas aos quesitos e a sua fundamentação, uma ambiguidade e obscuridade,”.
Vejamos.
As causas de nulidade da sentença ou de qualquer decisão são as que vêm taxativamente enumeradas no nº 1 do art. 615º do CPC (diploma a que pertencerão os demais artigos a seguir mencionados, em outra indicação de origem).
Nele se dispõe que, é nula a sentença quando: “a) não contenha a assinatura do juiz; b) não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) o juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.”.
Em anotação ao art. 668º do CPC de 1961, que corresponde ao actual art. 615º, refere (Abílio Neto, in “Código de Processo Civil Anotado”, 23ª ed., pág. 948), que “os vícios determinantes da nulidade da sentença correspondem a casos de irregularidades que afectam formalmente a sentença e provocam dúvidas sobre a sua autenticidade, como é a falta de assinatura do juiz, ou ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduz, logicamente, a resultado oposto do adoptado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender conhecer questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões de que deveria conhecer (omissão de pronúncia). São, sempre, vícios que encerram um desvalor que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutilizam o julgado na parte afectada.”.
Como concluem (Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in “Manual de Processo Civil”, 2ª Edição Revista e Actualizada, Coimbra Editora, Limitada, 1985, pág. 686) entre as causas de nulidades da sentença enumeradas, taxativamente, no nº1, do art. 615º, não se incluem o “chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário”
Analisando, o caso.
Através do presente recurso, pretende a recorrente que se declare a nulidade da sentença recorrida, com o argumento de que a decisão proferida pelo Tribunal a quo enferma de nulidade nos termos do disposto na al. c), daquele art. 615º invocando que, a mesma, se verifica uma vez que ocorre uma contradição expressa entre as respostas aos quesitos e a sua fundamentação, uma ambiguidade e obscuridade.
Ora, como decorre dos autos e se deixou exposto no relatório deste acórdão, a análise desta questão, quanto à invocada nulidade da sentença mostra-se prejudicada, porque resolvida.
Verifica-se que o Mº Juiz “a quo”, oportunamente, antes de admitir o recurso e ordenar a subida daqueles a esta Relação, nos termos do art. 617º, apreciou esta questão e resolveu-a, como bem referiu, “sanando-se a nulidade arguida, na motivação da matéria de facto no excerto supra citado, onde diz “estando consequentemente prejudicadas as respostas aos quesitos 22 e 23, sempre não provados.” passa a constar “estando consequentemente prejudicada a resposta ao quesitos 22, sempre não provado”.
Pelo que, no que concerne à, alegada, existência de contradição entre as respostas aos quesitos e a fundamentação - que, sempre com o devido respeito, em bom rigor não se trata de nulidade da sentença, já que, o que a apelante deveria ter feito era formulado pedido de alteração da decisão quanto à matéria de facto por contradição entre dois dos factos (dado como provado e como não provado ao mesmo tempo) - tendo em conta o despacho proferido pelo Tribunal “a quo”, relativamente à invocada nulidade da sentença, nada mais há a referir quanto a tal questão tendo em conta que o Mº Juiz “a quo” sanou a invocada contradição.
*
Passemos, agora, à apreciação da questão que a recorrente designou “da prova e do erro na formação da convicção do Tribunal “a quo” (art. 413.º e nº 4 do art. 607.º do CPC, aplicáveis “ex vi” o art.º 1º, nº 2-a) do CPT”.
Nos termos que sintetizou, na conclusão 2ª da sua alegação, por entender, que a decisão do Tribunal “a quo” quanto à matéria de facto, “não obedeceu ao regime jurídico dos arts. 413.º e 607.º nº 4 do CPC, aplicáveis “ex vi” o art.º 1º/2-a) do CPT”, vem a apelante, tecer diversas considerações, como reflectem as al.s b) a h), daquela conclusão 2ª, sempre com o devido respeito, sem que identifique quaisquer factos que na, eventual, procedência do que invoca, viessem a ser alterados e relevantes para a decisão. Limita-se a tecer considerações genéricas, acompanhadas de citações doutrinárias, para justificar o que apelida de, “conclusões sobre a prova e a forma como o Tribunal “a quo” formou a sua convicção, para a Recorrente ilógicas, subjetivas e desconformes com as regras da experiência comum e do direito probatório”.
No fundo, a recorrente limita-se a discordar da convicção do Tribunal “a quo”, mas, sem que lhe assista razão, como demonstra a motivação da decisão recorrida, que se transcreve: «A nossa convicção baseou-se na análise crítica e conjugada de toda a prova produzida.
Assinala-se que de uma forma geral as testemunhas depuseram por forma que não se nos afigurou espontânea, antes de molde que nos pareceram com a lição estudada, «preparadas» (com isto não querendo dizer ou insinuar que o fossem pelos Exm.ºs mandatários das partes, antes que estamos convencidos que as testemunhas meditaram bem, mais do que sobre o que na realidade se passou, sobre o que queriam ou não dizer), querendo realçar o que no seu entender era favorável à parte que, por regra e respectivamente, a indicou, sendo que quando comuns, enfatizando o que mais se coadunava com a tese da ré (caso da testemunha F…, AC… e E…) omitindo, estamos convencidos, o que entendiam ser desfavorável à parte que «defendiam», excepção feita, na nossa análise, às testemunhas J… e Y…, Q…, S… e Z… – esta apesar do nervosismo que evidenciou - e cujos depoimentos se nos afiguraram isentos e, por isso, credíveis, e também nada a apontar à credibilidade da testemunha AB…, mas sendo que esta, também, de relevante nada mostrou saber.
Consigna-se que, não obstante as apontadas reservas, de uma forma geral as testemunhas tinham razões de ciência bastantes para poderem, mais ou menos aprofundadamente, ajudar a esclarecer a factualidade a que foram indicadas, sendo que a maior parte das testemunhas são, ou já foram, trabalhadores da ré – a testemunha F… é director de unidade de negócio da B… desde finais de 2014, a testemunha AC… é directora de recursos humanos do Grupo AD… (que inclui a ré/B…) desdeAgosto de 2014, a testemunha E… trabalhou para a ré (1.º como vendedor, e depois como key account manager) desde 2002 até finais de Setembro de 2018, a testemunha L… trabalhou para a ré, como vendedor, desde Agosto de 2014 até Maio de 2019, a testemunha J… trabalha para o Grupo AD… (por isso gerindo também o sistema informático da B…), a testemunha AB… trabalha para o Grupo AD…, sendo desde inícios de 2017 o responsável pela logística, a testemunha O… trabalha para a D…, empresa cliente da ré, desde 2004 como director comercial -, a testemunha AE… foi vizinho do autor, segundo disse durante cerca de 15 anos até há alguns meses atrás, as testemunhas Q…, S… e Z… trabalham para a ré, todas há vários anos e sempre há mais de 10, como marchandising, a testemunha Y… é tio do autor, e a testemunha AF… é amigo do autor desde que trabalharam juntos, o que aconteceu desde cerca de 1998 até 2001/2002. Por isso que, ainda assim, tivemos em consideração - conquanto de forma muito crítica, e valorizando o que foi não só consensual nos depoimentos recolhidos, como o que teve prova documental adjuvante - a prova testemunhal. Procuremos especificar as razões do nosso convencimento. Quanto à matéria de facto relacionada com a factualidade respeitante à invocada justa causa do despedimento, ou com ela conexionada (v.g. matéria dos quesitos 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 20, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 84, 102, 103 e 104): No que tange à matéria do quesito 1.º, resultou consensual dos depoimentos que incidiram sobre essa factualidade, tendo o próprio autor, e na medida em que a consideramos provada admitido, no âmbito do seu depoimento de parte, a veracidade dessa factualidade. Também a matéria do quesito 2.º foi consensual nos depoimentos que sobre a mesma incidiram, estando junto aos autos – corroborando aqueles depoimentos, diga-se -, um email enviado pela ré (que integra o denominado Grupo AD…), na data em questão, para a D… – cf. fls 65.
Outrossim no que se reporta à matéria do quesito 3.º, constando o email enviado pela D… à ré a fls 70 v. dos autos.
Também no que tange à matéria dos quesitos 4.º e 5.º foi consensual nos testemunhos que sobre a mesma incidiram, v.g. as testemunhas F… e E…, e o próprio autor, no seu depoimento, confirmou a factualidade que do quesito 4.º consideramos provada.
Quanto à matéria dos quesitos 6.º a 16.º, foram igualmente importantes os depoimentos das testemunhas F… e E… e, na medida em que está em causa factualidade em que o mesmo directamente interveio, o depoimento da testemunha O…, sendo que os emails referidos em 6.º, 7.º e 10.º estão juntos aos autos – cf. fls 69 v. e fls 69 – assinalando-se ainda que o autor, e de uma maneira geral, admitiu, no decurso do seu depimento, a veracidade da matéria constante dos quesitos 8, 10 e 11, e sendo que valoramos ainda, para a resposta ao quesito 8.º, o conteúdo do doc. junto a fls 240/241 (Instrução s/ Devoluções). No que concerne à matéria dos quesitos 23.º, 24.º e 25.º, tivemos particularmente em conta os depoimentos das testemunhas F…, E… e O….
No que tange à matéria dos quesitos 17, 26, 27, 28, 29, 30 e 31, tivemos também em consideração os depoimentos das testemunhas F…, E…, P… e, em particular, da testemunha J….
Também relativamente aos instrumentos de trabalho disponibilizados pela ré ao autor, e regras quanto à sua utilização, v.g. se pessoal, pelo autor – designadamente quesitos 33, 39, 40, 53, 54, 55, 56, 116, 117, 118 e 120 -, tivemos em particular consideração os depoimentos das testemunhas F…, E…, P… e J…, tendo-se também em conta, nomeadamente, os doc.s de fls 91 v. (lista das “Ferramentas de Trabalho” atribuídas ao autor) de fls 264 a 268 e 269 a 273 (doc.s 11 e 12 da resposta) e o de fls 31 do processo comum (Declaração emitida pela ré em 28.10.2016).
Quanto à matéria dos quesitos 34, 35, 36, 37, 38, 46, 47, 48, 51 e 52 foram de um modo especial importantes para a convicção que formamos os depoimentos das testemunhas Y… e AF….
No que tange à matéria dos quesitos 42, 45, 119 e 121 valorizamos em especial os depoimentos das testemunhas AC… e L…, assim como o auto de entrega junto aos autos (doc. 13 da resposta).
Que o autor não gozou férias no ano da cessação do contrato (matéria do quesito 57) decorre da seguinte factualidade, afigura-se que incontroversa (cf. depoimento da testemunha AC…): nesse ano o autor encontrou-se de baixa médica até que – apresentando-se – foi suspenso preventivamente, até que lhe foi comunicado o despedimento.
Quanto à matéria reportada ao horário de trabalho/trabalho suplementar – quesitos 58, 59, 60, 61, 62, 63 e 64 -, foram mais importantes quanto à matéria daqueles três primeiros quesitos os depoimentos das testemunhas F… e AC…, assim como os documentos de fls 241 e ss (registos de entradas/saídas do autor) e de fls 252 v. (Horário de Trabalho), e relativamente às «janelas» em que consideramos provado ocorrerem as reuniões (a que se referem os quesitos 61 e ss) e o tempo despendido nos trajectos de ida e volta para a residência do autor, baseamos a nossa convicção também nos depoimentos das testemunhas que abordaram essa matéria, vg. as testemunhas F…, E…, Q…, S… e Z…, que também participavam – e até, a primeiramente referida, agendava - em tais reuniões.
Tivemos também em consideração a documentação junta aos autos referente a essa matéria (v.g. fls 261 e 262 dos autos; doc.s 9 a 9-c) da resposta), mas com a convicção de que têm de ser lidos não como retratando fielmente a realidade, mas como indicativos, principalmente o de fls 262 v. pois, como notou a testemunha E… trata-se de uma planificação que pode bem ter sofrido alterações.
Em particular no que tange à matéria em geral reportada às funções do autor – v.g. quesitos 67, 68, 71, 72, 73, 74, 75, 76, 77, 78, 79, 80, 81, 82, 83, 106, 107, 108, 109, 110, 111, 112, 113, 114 e 115 – tivemos em especial consideração para a convicção que formamos os depoimentos prestados pelas testemunhas F…, E…, AC… e L…, todos convergentes quanto à matéria que em comum abordaram, e bem assim os documentos de fls 169 v./170 e 254 v. a 257 (descrição de funções de vendedor e de KAM), assim como a “ficha de funcionário” do autor que consta de fls 88.
Uma última referência em particular quanto à matéria de facto, na restrita medida em que também consideramos provada, e relacionada com as diligências tendentes à notificação da nota de culpa ao autor – v.g. quesitos 85, 86, 87, 88, 89, 90, 91, 92, 93, 94, 95, 96, 97, 98, 99, 100 e 101 – para assinalar que tivemos particularmente em consideração os depoimentos das testemunhas L…, e também das testemunhas F… e AC…, e bem assim os diversos documentos que atinentes a essa factualidade constam dos autos – cf. designadamente doc.s de fls 113 v. (talão de registo dos CTT), email da Instrutora do PD para o autor de 02.02.2018 e comprovativo de leitura desse email a fls 127 v., carta da ora testemunha AE… para a ré a acompanhar a devolução de carta contendo a comunicação da NC ao autor e que foi devolvida por aquele AE… com a informação que tinha sido colocada na sua caixa de correio, a fls 128 v., email da Instrutora do PD para o autor, de 08.02.2018, a fls 132, e, a fls 136 v., devolução pelos CTT da carta que a ré enviou para o autor a comunicar a NC com a anotação “não reclamado”.
Relativamente aos factos que não consideramos provados, tal ficou a dever-se à falta de prova com um mínimo de credibilidade e consistência que a factualidade em questão se verificou, como também decorre já relativamente a alguma dessa factualidade, e concomitantemente, da motivação supra.
Tentando também particularizar as razões das respostas (na totalidade ou parcialmente) negativas, em primeiro lugar, e no que tange à matéria que, reportada à questão da justa causa, não consideramos provada, cumpre dizer:
Desde logo, afigura-se, no mínimo, estranho, que uma discrepância da gravidade da que aqui está em causa – que, alegadamente, acarreta para a ré um prejuízo superior a €10.000,00 – só seja, digamos, valorizada (no sentido de merecer diligências para o seu esclarecimento) pela ré mais de um ano depois de ser, pelo menos, evidenciada na conta corrente da ré: as notas de devolução em questão (cf. fls 83, 83 v. e 84 dos autos) são de Março, Abril e Maio de 2016, e a primeira diligência que (pelo menos directa e expressamente referida) se reporta ao esclarecimento da situação é de finais de Outubro de 2017 (email de 30.10.2017). É certo que algumas testemunhas, como o próprio legal representante da ré nos esclarecimentos que prestou, procuraram justificar a pretensa «normalidade» dessa décalage com o facto de a D… efectuar os pagamentos através de um organismo de que faz parte, a “G…”, o que acarreta que só se detetem esse tipo de problemas muito tempo depois se as discrepâncias na realidade ocorrerem.
Mas não se afigura verosímil que isso seja uma justificação, muito menos plausível.
A ré só vem a levantar o problema cerca de um ano e meio depois, quando, parece certo, logo nos meses imediatamente seguintes aos da emissão das notas de devolução necessariamente tinha conhecimento do problema, não tanto em razão dessa emissão (porquanto, na verdade, desconhece-se se as ditas notas de devolução foram remetidas à ré logo nessa altura; a diligência da ré de 30.10.2017 faz supor que não, ou que todas se extraviaram, o que já de si parece estranho) mas porque isso se reflectia na correspondente falta de pagamento dos valores em questão - como explicitou a testemunha O… - tudo espelhado na conta corrente…se o assunto levantava desconfianças, e aparentemente tão dignas de preocupação e esclarecimento urgente, porque não levantou mais cedo?
Ademais, temos de ter presente que estava instalado um mal estar entre o autor e a ré, em razão de o autor não ter sido promovido a key account manager, que certamente se veio a agudizar…
Depois, embora tudo isso permaneça nubloso, assinala-se a coincidência, que não podemos deixar de reputar de muito estranha – as próprias testemunhas que a propósito depuseram acabaram por reconhecer a peculiaridade da situação, ora dizendo que acontecer tal coincidência é quase tão difícil como sair o euromilhões, ora, como disse a testemunha E…, que “é uma coincidência terrível” – entre o tipo de produto e as quantidades (absolutamente iguais) entre as ditas notas de devolução e aos bónus de “sell out” que nos mesmos meses foram entregues à D… a título de oferta.
Uma coisa e outra não terão mesmo nada a ver? É pelo menos razão de perplexidade.
Por outro lado, e não menos importante, a testemunha que aparentemente podia lançar alguma luz sobre a matéria, e a nosso ver, não o fez, sendo o seu depoimento, a propósito, ambíguo e na linha do «é assim porque é assim».
Com efeito, na própria perspectiva da ré, já vinda mesmo das diligências que antecederam o procedimento disciplinar, a grande base do convencimento da ré é a testemunha O….
Mas esta testemunha, em boa verdade e na avaliação que fazemos, nada – nada de concreto – sabe sobre o assunto das devoluções que aqui estão em causa.
Diz que era só o autor que procedia aos levantamentos de mercadoria, que só o autor estava por si autorizado a faze-lo, que o autor lhe pedia para levantar mercadoria para desenrascar outros clientes da ré, ora porque esta não tinha mercadoria em stock ora porque os clientes não tinham plafond que lhes permitisse obter da ré o fornecimento de mais mercadoria, e que tudo o que aqui está em questão (reportado às três guias de devolução) se passou nesse âmbito.
Mas perguntado se, relativamente a alguma das três concretas situações, tem presente, de concreto, o que quer que seja, nada mostrou saber, aliás, tendo-lhe sido perguntado que se em vez de terem sido emitidas e juntas as três guias de devolução aqui em causa tivessem sido emitidas pela D… 4, 5 ou 6 e estivessem essas 4, 5 ou 6 aqui em questão o que diria, respondeu que diria então que o autor levantara a mercadoria de todas essas guias.
Realmente não viu o autor carregar qualquer mercadoria, não concretizou qualquer data, nem por aproximação, em que tenha autorizado o autor a levantar mercadoria, não tem explicação para, pelo menos aparentemente, o autor só ter assinado uma das guias em causa e, digamos, diz que está absolutamente convencido que foi autor a levantar a mercadoria que as guias referem mas, convenhamos, e olhando para os emails e conversas que com os funcionários da ré foi mantendo a propósito, não deixava de então alicerçar o seu convencimento no que outros lhe terão dito: por ex., “Após questionar a minha recepção de mercadorias que trata das devoluções aos fornecedores, apenas o Sr. C… procedia ao levantamento.” (email de 02.11.2017); “Não sei. Questionei a recepção de mercadoria que só tem memória de ser o C… a levantar” (email de 03.11.2017).
Ademais, afigura-se que ficou claro – particularmente depoimentos das testemunhas F… e E… – que no período abrangido pelas ditas guias de devolução não havia ruptura de stock da mercadoria a que se reportam e, quanto à outra explicação adiantada pela testemunha O… como sendo dada pelo autor para levantar a mercadoria – os clientes já não terem plafond – afigura-se assaz incongruente: então o autor ia “contornar” as normas da ré, entregando mercadoria ao cliente quando este já não tinha plafond, sabendo de antemão que tudo iria chegar ao conhecimento da ré pois que obrigatoriamente levaria à emissão de notas de devolução e consequente não pagamento pela D… dos correspondentes valores à ré?! Não é crível.
Por outro lado, parece que o autor chegou mesmo a levantar mercadoria na D… para “desenrascar” um cliente numa altura em que a ré tinha falta de determinado produto, mas em ocasião diversa daquelas em causa nas notas de devolução em apreço – a própria testemunha F… o referiu, e que tal foi por si autorizado – e, por outro lado ainda, a possível explicação adiantada pelo autor para a sua assinatura constar de um dos documentos não parece de afastar liminarmente, quedando plausível.
Com efeito, adiantou o autor, como hipótese (uma vez que diz não ter a certeza) para ter aposto a sua assinatura numa das guias de devolução, tê-lo feito a pedido da D… como “garantia” de que iria ser entregue a mercadoria em falta respeitante a acções promocionais (sell-out).
As testemunhas F… e E… negaram que ocorressem atrasos na regularização de acções promocionais, mas a testemunha O… mencionou que houve grandes atrasos no pagamento dos bónus, que houve um ano em que por causa desses atrasos tiveram de “fazer um débito”, que emitiram uma nota de débito para garantia do pagamento dos bónus, que “o Sr. C… foi liquidando o débito até perfazer o valor da nota” e que a nota de débito foi então anulada.
Diga-se também que ficamos convencidos, atentos os depoimentos das testemunhas F… e E…, que algumas outras diligências fez a propósito a ré, mas ficando dúvidas em que consistiram e o respectivo âmbito em concreto e bem assim o que de específico foi eventualmente apurado.
Em suma, não ficamos convencidos de que o autor trouxe qualquer da mercadoria a que se reportam as notas de devolução em causa, e em boa verdade não sabemos se os ditos documentos titulam verdadeiras devoluções de mercadoria ou se a sua existência se deve a alguma outra razão.
Por uma questão de sequência lógica, uma nota sobre a razão de termos respondido restritivamente ao quesito 31.º: ficamos convencidos que o computador em questão, entregue pela ré ao autor, não se encontra na empresa nem há registo da sua devolução, todavia, não ficou para nós claro se em algum momento o autor o entregou, como disse, a algum funcionário da ré, sem que tenha sido efectuado qualquer registo, e tenha entretanto levado descaminho – a testemunha J… apesar de se mostrar convencida que, ante a falta de registo, o autor efectivamente não entregou o computador, concedeu não poder ser peremptório nessa afirmação, admitindo poder ter acontecido uma entrega não documentada.
Quanto à matéria que contende com a notificação/não notificação da nota de culpa e que não consideramos provada:
As duas testemunhas que a propósito foram inquiridas e que se disseram intervenientes directas em – alguns – dos factos em causa, L… e AE…, não nos mereceram credibilidade.
A testemunha L… não obstante apresentar um discurso aparentemente coerente, teve algumas imprecisões ou até contradições que nos deixam na dúvida se aconteceram como uma normal contingência a que está sujeito quem conta um acontecimento por diversas vezes ao longo do tempo ou se, ao invés, revelam os normais deslizes de quem repete uma narrativa estudada e vai esquecendo um pormenor ou outro da narrativa. Por ex., referiu a testemunha que lhe disseram para ir entregar uma carta registada que tinha sido devolvida, mas é claro que não era disso que se tratava, como disse a testemunha que o autor abriu a porta da sua habitação e que entrou para o hall dizendo-lhe ao que ia, e que acto contínuo o autor desviou-se, fez um telefonema, e disse então à testemunha que não ia aceitar os documentos pedindo-lhe para dizer que não estivera com ele, mas sendo que no email junto ao PD (fls 116 dos autos) expressamente refere “Quando cheguei ao 3º piso o C… já estava ao telefone supostamente com um advogado e quando o informei que tinha um envelope com documentação para lhe entregar e assinar a sua receção, tal situação foi recusada por ele (por indicação da pessoa que estava ao telemóvel com ele)”, versão esta que também terá dado em inquirição no âmbito do procedimento disciplinar (cf. fls 163 dos autos; “Ao abrir a porta, o colega C… estava ao telefone e pediu à testemunha para entrar (…)”.
Ficamos convencidos que se deslocou ao prédio onde o autor tinha a sua residência – apesar de ter ficado para nós claro (nesse sentido, por ex., o depoimento da testemunha Y…, já deixamos dito para nós convincente) que, ao tempo, o autor lá não residia, mas em casa da mãe, mas diga-se o que por si só também não inviabiliza um encontro entre o autor e a dita testemunha nos termos por esta referidos, pois sempre poderia o autor, como se afigura natural, ter-se deslocado à sua casa e encontrar-se lá na ocasião – e que numa das caixas de correio desse prédio colocou o expediente em causa.
Mas que teve um encontro com o autor nos termos que explanou, deixou-nos, pelas ditas razões, muitas dúvidas.
Por outro lado a testemunha AE… também teve um depoimento que não nos mereceu credibilidade, porquanto se nos afigurou descrever um comportamento que vai contra a ordem natural das coisas, desprovido de razoabilidade.
Efectivamente, disse a testemunha que os documentos em questão – uma carta dirigida ao autor (tendo ideia que “tinha uma folha agrafada na frente”), que supôs ser proveniente da entidade empregadora do autor (embora não soubesse como se chamava a entidade empregadora do autor!) e tratar de assunto importante - foram colocados na sua (da testemunha) caixa de correio, que fica por cima da caixa de correio do autor, e que como não via o autor há cerca de dois meses e não o conseguiu encontrar para lhe entregar a dita carta, enviou-a para a remetente, no estado de fechada.
Ora, para além de a carta ter sido recebida na ré no estado de aberta, diríamos que é pouco normal que, havendo uma relação de vizinhança de cerca de 15 anos entre a testemunha e o autor, aquela, tendo uma coisa importante para dizer-lhe, não tenha forma de chegar à fala com este, como, mais inconcebível nos parece, o facto de a testemunha, como anuiu, sequer ter procurado saber junto dos outros vizinhos de um contacto, v.g. n.º de telemóvel, do autor.
Por tudo, não nos convenceu.
Explicitemos agora porque também não consideramos provada grande parte da matéria levada à base instrutória e concernente ao alegado assédio moral.
Tal ficou a dever-se, fundamentalmente, a que as testemunhas que depuseram sobre tal matéria não a corroboraram – em particular as testemunhas F…, AC…, E… e L…, em cujos depoimentos não confirmaram a actuação persecutória/discriminatória imputada pelo autor à ré -, à excepção da testemunha AF…, que asseverou, por ex., que a ré prometeu ao autor promove-lo a kei account manager e que o autor desempenhou efectivamente funções de kei account manager, mas assim convencido fundamentalmente com base no que o autor lhe dizia, como afunilando todos os problemas do autor, como a doença e o próprio divórcio, como decorrentes apenas dos seus problemas laborais, sendo mais crível o que a propósito referiu a testemunha Y…, de que a baixa médica do autor, por doença do foro psiquiátrico, e a sua retirada para casa da mãe, se deveu a um conjunto de situações, “foi tudo junto”, foram os problemas no trabalho mas o casamento dele também estava mal, tendo-se o autor separado da mulher em Dezembro de 2017.
Nomeadamente, a testemunha F… referiu que quando entrou na empresa ré lhe disseram que o autor e o E… estavam “pensados” para virem a exercer as funções de key account manager, que havia essa possibilidade mas que não estava nada implementado nem decidido, que depois esses dois vendedores estiveram, durante alguns meses, a ser “testados” para essas funções sob orientação da testemunha, nunca de forma autónoma, e que findo esse período a testemunha entendeu que apenas deveria ser promovido a key account manager o E… porque, por um lado, o autor não tinha demonstrado possuir as competências para passar a exercer essas funções e, por outro lado, porque entendia que ele fazia falta como vendedor, tal falta de autonomia durante o “regime experimental” foi confirmada pela testemunha AC…, que referiu que durante 6 meses o F… foi dando tarefas aos dois trabalhadores para, com o acompanhamento dele, ver se tinham ou não perfil para o cargo de key account manager, e pela testemunha E…, que disse que “passava sempre pelo F…, pela sua validação”, que continuaram a exercer as funções de vendedor, mas que as alterações foram mais “em termos qualitativos” e não de acréscimo de tempo, que por causa das tarefas de key account manager de que o F… os incumbia às sextas – feiras ele e o autor ficavam nas instalações da empresa, não saindo para as vendas.
Disse também a testemunha F…, no que foi corroborado pela testemunha AC…, que não obstante as directrizes escritas da empresa quanto à devolução das viaturas quando os trabalhadores a quem estão atribuídas se encontram de baixa médica prolongada, só solicitam a devolução da viatura caso a mesma esteja a fazer falta, doutra forma, mesmo que o contrato de trabalho esteja suspenso, a empresa não solicita a devolução, indo também nesse sentido o depoimento da testemunha L…, que disse que o carro em que andava tinha excesso de quilómetros, que o tinha entregado uns dias antes da devolução pelo autor da viatura que lhe estava distribuída, e que na altura lhe disseram que ia ficar com o carro do C… que estava disponível.
No que tange à factualidade, na parte que não consideramos provada, que se reporta ao alegado trabalho suplementar, diremos que os depoimentos a propósito recolhidos foram no sentido da versão trazida aos autos pela ré e não pelo autor, destacando-se, pela proximidade de trabalho com o autor o depoimento da testemunha E…, e sendo que os documentos juntos aos autos com relação com esta matéria – particularmente registos de fls 241 v. a 252 e fls 252 v. (doc.s 2 a 2-u , e doc. 3, da resposta – mais se afeiçoam à prática do horário propugnado pela ré.
Uma nota para referir que os emails – recebidos e enviados – juntos pelo autor (cf. Fls 32 e ss do processo comum) e que supostamente atestam que trabalhou até aquelas horas (em que são expedidos) a nosso ver, e com o devido respeito, não o demonstram, por um lado, e quanto aos emails recebidos, sequer sabemos se o autor os leu nas respectivas ocasiões e quanto aos enviados só provam que, pontualmente, o autor os enviou, mas desconhecemos se isso no decurso de uma jornada de trabalho ou se, por ex., estava em casa e dispôs de uns poucos minutos do seu tempo para os redigir e enviar.».
Da análise da exposição que antecede, efectuada pelo Tribunal “a quo”, é manifesta a falta de razão da recorrente, quando sem quaisquer argumentos válidos e susceptíveis de afastar, a convicção firmada na decisão recorrida, invoca a violação do disposto nos art.s 413º (dever da aquisição processual) e 607º nº4 (dever de fundamentação).
Decorrendo daquela, precisamente o contrário, que o Mº Juiz “a quo”, fez uma análise crítica de toda a prova produzida, além se ser manifesto o empenho do mesmo em busca da verdade, no modo como orientou o julgamento e activamente inquiriu e confrontou as testemunhas no objectivo, julgamos, conseguido de alcançar a solução justa do caso.
Acrescendo que, como se verifica das alegações e conclusões da recorrente, não indica, ela, que outras provas deveriam ter sido feitas e não o foram, que factualidade e pontos estruturantes da sua posição ficaram por averiguar, ou que outros meios de prova, eventualmente, requereu e lhe tenham sido negados ou não considerados, de forma a poder, este Tribunal, considerar que não lhe foi concedido um processo equitativo, não foi observado o contraditório, ou permanecem por apurar factos essenciais à decisão da causa, eventualmente, em violação daqueles dispositivos que invoca.
Por outro lado, ao contrário do referido pela recorrente, não se mostra igualmente violado o dever de fundamentação previsto no artº 607 nº4, tendo aliás a R. acompanhado e percebido o bem fundamentado raciocínio lógico-racional do Tribunal “a quo”, tendo-o apreendido e manifestando com ele não concordar como, aliás, decorre do seu pedido de reapreciação da matéria de facto.
A forma genérica e conclusiva, como coloca a questão, acompanhada de transcrições doutrinárias, aliás, doutas, referindo que, “a decisão sobre a matéria de facto está eivada de juízos puramente subjetivos e imotivados, razão pela qual se pede a sua sindicância pelo douto Tribunal da Relação do Porto.
Traçando os contornos gerais do regime de apreciação da impugnação ampla da matéria de facto dir-se-á que existem dados objetivos que imporiam diversas conclusões, tendo ocorrido violação de princípios para a aquisição desses dados objetivos, previstos nos arts. 413.º do CPC”, nada mais é e releva que não seja a sua discordância com o que foi a convicção do Tribunal “a quo”, como bem termina, dizendo que, “não pode aceitar a Recorrente a forma como se formou a convicção do Tribunal “a quo”, ainda que sustentada na livre apreciação da prova, não se apoiou nas regras da experiência e não está alicerçada em fundamentos objetivos.”,
Mas, não é do modo que o faz que pode pôr em causa a convicção do Mª Juiz do Tribunal “a quo” já que, esta, só é susceptível de ser atacada e posta em causa, através da impugnação da matéria de facto, respectivamente, fazendo-o facto a facto.
Improcede, assim, esta questão da apelação.
*
Vejamos, agora, - se a matéria de facto deve ser alterada nos termos impugnados
Não que, sem antes, porque o consideramos de extremo relevo, para o que se vai decidir quanto a esta questão, se transcreva o modo como a apelante, antes de formular as conclusões do seu recurso, supra transcritas, terminou a motivação do mesmo, consignando: “Em conclusão,
Face à matéria de facto provada, a decisão do Tribunal “a quo” de que não estarmos em presença de comportamentos do trabalhador que consubstanciam violações muito graves de deveres nucleares do seu contrato de trabalho, suscetíveis, pela sua gravidade e consequências, de fundamentar o seu despedimento com justa causa, assenta em notórios erros de julgamento.
Assim, em sede do recurso, vem a Recorrente solicitar a apreciação superior desta decisão e requerer que a mesma seja revogada e substituída por outra que considera adequada e proporcional a sanção disciplinar de despedimento com justa causa do trabalhador, ora Recorrido, à luz do conceito explanado no art.º 351.º/1 e 3 do CT, face aos deveres laborais previstos nos arts. 126.º/1 e 128.º/1, alíneas c), e), f), g), h), do CT, tal como referidos na nota de culpa, de forma dolosa, quando confrontados com a factualidade provada, e considerado regular e lícito o despedimento do trabalhador.”.
Ou seja, a recorrente discorda da decisão recorrida, em que se concluiu pela ilicitude do despedimento do A., por considerar que, “face à matéria de facto provada, a decisão do Tribunal “a quo” de que não estarmos em presença de comportamentos do trabalhador que consubstanciam violações muito graves de deveres nucleares do seu contrato de trabalho, suscetíveis, pela sua gravidade e consequências, de fundamentar o seu despedimento com justa causa, assenta em notórios erros de julgamento”, os quais aponta, desde logo, à decisão de facto, pretendendo a sua alteração por considerar que foram incorrectamente julgados, os quesitos 18, 19 e 21, com o argumento que deviam ter dados como parcialmente provados, nos termos que indica na conclusão 3ª da sua alegação, ou seja, que: “18 - A mercadoria identificada na guia de devolução rubricada pelo Autor não deu entrada em nenhum dos estabelecimentos da B…”
19 – A mercadoria identificada nas restantes guias de devolução também não deu entrada nos armazéns da B…”
21 - Apesar das quantidades entregues pela B… ao cliente D… no denominado “bónus de sell-out” serem coincidentes com as quantidades de produto constante das guias de devolução da D…, as primeiras não foram objeto de qualquer ação de “sell-out”.
Que a resposta ao quesito 16, que originou o facto provado n.º 54, deve ser acrescentada, como provada com a matéria que indica na conclusão 5ª da sua alegação, ou seja, que: “a)- Foram analisados pelo Diretor Comercial todos os documentos relativos aquela mercadoria (encomendas, faturas, guias de devolução e conta corrente do cliente);
b)- Foram analisadas todas as encomendas de atum N… 120 gramas, realizadas por outros clientes da mesma carteira acompanhada/gerida pelo Autor e respetivas contas correntes, no período de tempo compreendido entre a data da primeira devolução e o último dia do mês da última devolução;
c)- Foram analisados os níveis de stock daquela referência no período de tempo acima referido;
d)- Foram confirmadas as receções de produto Atum N… 120 gramas, no armazém da B…, naquele período de tempo;
e)- Foi reanalisada toda a correspondência trocada com o Autor no primeiro semestre do ano de 2016 sobre devoluções de produto e sobre eventuais bónus acordados com os clientes.”, pelo que requer seja a totalidade do quesito 16 dado como provado, (veja-se conclusão 6ª).
E, considera que deve ser dada como provada a totalidade da matéria de facto constante dos quesitos 88 a 94, na sua totalidade requerendo, em consequência, que à matéria provada seja aditada ao facto provado n.º 101, a totalidade da factualidade constante dos quesitos 88 a 94., a seguinte: “88 – Em cumprimento da solicitação feita pela instrutora do processo disciplinar, no dia 01/02/2018, pelas 16h00, o trabalhador L… deslocou-se à morada da residência do trabalhador sita na Praceta …, …, …, em Valongo, para lhe entregar cópia da comunicação da nota de culpa
89 – Nesse dia 01/02/2018 o trabalhador, apesar de ter aberto a porta da sua residência ao trabalhador L…, recusou-se a receber a documentação referida e a assinar o comprovativo da recepção dessa documentação
90 – E transmitiu ao colega L…, à porta de sua casa, após leitura da comunicação, “fui aconselhado a não assinar esta carta e a não receber este envelope, por isso levas de volta e dizes à empresa que não me encontraste nem estiveste comigo, porque tenho de ter tempo para pôr um processo contra a empresa. Se disseres o contrário é a minha palavra contra a tua”
91 – Em face dessa recusa e após contacto telefónico com a instrutora do presente processo, o trabalhador L… voltou à morada da residência do trabalhador, sem que este, desta feita, lhe tivesse aberto a porta
92 – O trabalhador L… depositou na caixa do correio do domicílio do trabalhador, … do prédio sito na Praceta …, n.º …, em Valongo (morada de residência do trabalhador), a comunicação da instauração do processo e respetiva nota de culpa, bem como a comunicação de fls. 114v.,115, 126v. e 127 dos autos
93 – O trabalhador L… apôs, pelo seu punho, na comunicação que o trabalhador se recusou a receber, “uma vez que o C… recusou receber em mão coloquei na caixa de correio do … andar, …, em 1de fevereiro de 2018”
94 – Mais colocou, também pelo seu próprio punho, nessa comunicação, “foi também deixado na caixa de correio comunicação e nota de culpa”, conforme refere nas conclusões 7ª a 14ª.
Quanto àqueles factos que impugna, indica os elementos probatórios, depoimentos e documentos, constantes do processo que, em seu entender, justificam a alteração daqueles nos termos que peticiona. E, por essa via, consideramos que estavam reunidas as condições para que este Tribunal “ad quem”, procedesse à reapreciação daquela matéria de facto, eventualmente, alterando a decisão proferida sobre a mesma, ao abrigo do disposto no nº1 do art. 662º.
No entanto, previamente, à apreciação desta questão de saber se deve a matéria de facto ser alterada, nos termos referidos pela recorrente, impõe-se-nos proceder à análise da decisão recorrida, em concreto, atentos os fundamentos que determinaram a procedência parcial da acção e a condenação da Ré, nos termos dela constantes e analisar se a, eventual, alteração daquela implicaria a revogação do que foi decidido relativamente à declarada ilicitude do despedimento, com a consequente absolvição daquela.
Analisando.
Da fundamentação da sentença verifica-se que, após a enunciação teórica sobre a justa causa do despedimento e ilicitude do mesmo, não existindo aquela, apreciando o caso concreto, o Mº Juiz “a quo” fundamentou a sua decisão, nos seguintes termos que, diga-se, subscrevemos:
“Será ilícito o despedimento por inexistência de justa causa?
De harmonia com o disposto no art. 351.º, n.º 1, do CT, constitui justa causa de despedimento “o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.”
Exige-se, pois, a verificação, cumulativa, de um requisito de natureza subjectiva – traduzido num comportamento culposo do trabalhador – e um requisito de natureza objectiva – que se traduz na impossibilidade de subsistência da relação de trabalho - e, ainda, existência de nexo de causalidade entre aquele comportamento e esta impossibilidade de subsistência da relação laboral.
Como decorre do art. 342.º, n.º 2, do C.C. e 387.º, n.º 3, do C.T., é sobre o empregador que recai o ónus de alegar e provar a factualidade que esteve na base do despedimento, a culpa do trabalhador e a impossibilidade prática de manutenção do vínculo laboral.
E nos termos do art. 351.º, n.º 3, do C.T., “Na apreciação da justa causa, deve atender-se, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso sejam relevantes”.
Como tem sido reafirmado pela jurisprudência do nosso mais alto tribunal (STJ), verifica-se a impossibilidade prática da subsistência da relação laboral, quando se esteja perante uma situação de absoluta quebra de confiança entre a entidade patronal e o trabalhador, susceptível de criar no espírito do empregador a dúvida sobre a idoneidade futura do trabalhador.
Atentemos ainda que segundo o disposto no 126.º, n.º 2, do C.T., “Na execução do contrato de trabalho, as partes devem colaborar na obtenção da maior produtividade, bem como na promoção humana, profissional e social do trabalhador”;
E o art.º 128.º do C.T. prevê deveres a que está sujeito o trabalhador, designadamente prevê no seu n.º 1, e nas diversas alíneas, os deveres a que alude a ré – a ré invoca os deveres expressamente elencados na al.s a), c), e), f), g) e h) do art. 128.º/1 do CT, mas afigura-se que não tem, ou só residualmente pode ter-se como pertinente para a análise do caso presente, a alusão às al.s a) e h) - como tendo sido violados (cumpre ao trabalhador, nomeadamente (e por mais de perto contender, pois, com a questão em análise), “realizar o trabalho com zelo e diligência”, “cumprir as ordens e instruções do empregador respeitantes a execução ou disciplina do trabalho”, “guardar lealdade ao empregador”, “velar pela conservação e boa utilização de bens relacionados com o trabalho que lhe forem confiados pelo empregador” (cf. alíneas c), e), f) e g) do n.º 1 do art. 128.º do CT).
Compreende-se, e concorda-se, em que, atentas as funções do autor – funções de vendedor, exercendo funções numa vasta área geográfica -, e para que possa subsistir a relação laboral, a ré tem de poder confiar no autor, nomeadamente quanto à lisura de procedimentos.
Crê-se pacífico o entendimento – a que já acima se fez referência, e que se afigura correcto - que existirá impossibilidade prática de subsistência da relação laboral sempre que, nas circunstâncias concretas, a permanência do contrato e das relações pessoais e patrimoniais, ínsitas a tal permanência, sejam de forma a ferir, de modo exagerado e violento, a sensibilidade e a liberdade psicológica de uma pessoa normal, colocada na posição do empregador – cfr António Menezes Cordeiro, Manual de Direito do Trabalho, Almedina, 1999,pág. 821 e ss e Isabel Pereira Ribeiro, A Quebra de Confiança como Critério de Concretização da Justa Causa de Despedimento, I Congresso Nacional de Direito do Trabalho, Almedina, págs 274/275.
E tais argumentos não deixam de impressionar, ainda mais quando é sabido que as partes devem agir de boa-fé, e particularmente nos contratos de execução continuada – art. 762.º n.º 2 do C.C.
Isto posto:
Os factos provados não traduzem porém – e com o devido respeito por diverso entendimento – violação de deveres que, enquanto trabalhador da ré, impendiam sobre o autor, designadamente do dever cumprir as ordens e instruções do empregador em tudo o que respeite à execução e disciplina do trabalho e, de modo muito particular, o dever de lealdade.
Com efeito, o que resta, e quanto ao essencial das imputações feitas pela ré ao autor, não é qualquer explícita violação de deveres laborais por parte do autor, mas apenas um quadro factual que permite todo o tipo de suposições e conjecturas.
Não se olvidando que estas são já aptas a corroer a confiança da ré no autor, não o podem ser para justificar o seu despedimento.
Salvo melhor entendimento, não é qualquer desconfiança que pode alicerçar a justa causa de despedimento.
Terá de ser uma desconfiança objectivada, positivamente, num comportamento (censurável) do trabalhador.
“No tocante ao dever (geral) de lealdade (…) sobressai o seu lado subjectivo que decorre da sua estreita relação com a permanência de confiança entre as partes, sendo necessário que a conduta do trabalhador não seja, em si mesma, susceptível de abalar ou obstruir essa confiança, criando no espírito do empregador a dúvida sobre a idoneidade futura do comportamento do trabalhador.” – Ac. do STJ de 14/04/1999, Acs Dout. do Supremo Tribunal Administrativo, Ano XXXVIII, N.º 456, pág. 1653.
Ora, a nosso ver, não é, de todo, o que traduzem os factos efectivamente provados.Na realidade, não sabemos o que se passou.
Não sabemos se o autor praticou os factos graves que a ré lhe imputou, ou se, ao invés, foi vítima de alguma tramoia.
Poder-se-á objectar, é certo, que o autor assinou uma nota de devolução, que isso já é grave o bastante, já tanto o compromete que não pode deixar de se considerar justificada a perda da confiança da empregadora e aceitar a inviabilidade da relação laboral.
Não concordamos.
Também esse facto, em si mesmo, nada demonstra de censurável no comportamento do autor – cf. o que, a propósito, consignamos na motivação da matéria de facto -, e sobre ele só se podem construir, uma vez mais, situações hipotéticas.
Por outro lado, o outro facto que, na perspectiva da ré, sustenta a justa causa de despedimento, é a apropriação pelo autor do computador que lhe foi disponibilizado pela ré.
Ainda aí, note-se, não sabemos ao certo o que se passou.
Mas admitindo que o autor não devolveu o PC e que ainda o tem na sua posse, convenhamos que há toda uma envolvente que muito diminui a gravidade desse comportamento.
Apesar de lhe ter sido disponibilizado tal equipamento, o autor usava de facto o seu computador pessoal, o que era do conhecimento da ré, sem que haja notícia que tenha (então) solicitado a devolução do que lhe pertencia e o autor, ademais e quando se disse impossibilitado de o devolver (por, na sua tese, já o ter entregue), logo se aprestou a indemnizar a ré pelo valor do dito computador – cf. números 23, 25, 61 e 65 da lista dos factos provados.
Sendo, certo, realce-se, que reportando-se a sua antiguidade a 01.02.2002, o autor não tem antecedentes disciplinares – cf. n.º 3 dos factos provados.
Em suma, entendemos que não pode concluir-se, no caso, que à ré/empregadora não é exigível que mantenha o autor como seu trabalhador.
Os factos não autorizam essa inexigibilidade, não ocorrendo justa causa para o despedimento do autor, pois, repete-se, entendemos que a conduta do autor, ainda que se lhe assaque alguma censurabilidade, não reveste gravidade que seja de molde a tornar, na prática, e de forma imediata, impossível a subsistência da relação de trabalho – cf. art. 351.º, nºs 1 e 2 do CT.
Em conclusão, entendemos que o despedimento foi ilícito – cf. art. 381.º b) do CT”.
Reafirmamos que, esta fundamentação, pela sua sustentação e acerto, merece o nosso inteiro acolhimento e, consequentemente, concorda-se sem dúvida com a decisão final, não nos suscitando qualquer reserva a declaração de ilicitude do despedimento de que foi alvo o A., dado não se ter apurado qualquer comportamento, do mesmo, que configure a violação de deveres laborais ou contratuais, nem dos que a recorrente lhe imputou na Nota de Culpa, supra transcrita.
Ora, verifica-se desta decisão que a razão, da procedência do pedido do A., para que o contrato fosse considerado findo, por despedimento ilícito, foi o não se ter demonstrado ter sido o A. a levantar dos armazéns da D… e que não deu entrada em nenhum dos estabelecimentos da B… a mercadoria identificada nas guias de devolução, constantes dos autos, nem se o computador e a pen, em causa, se encontram na posse daquele.
Ao contrário, do que defende a recorrente, não foi por se ter considerado que o A. “tenha sido alvo de qualquer “tramóia” que aquela defende “não existe qualquer indício factual na prova que aponte sequer para essa possibilidade”, que se julgou o A. despedido ilicitamente.
Tal aconteceu, porque não se sabe o que se passou, em concreto, no que respeita aos comportamentos imputados pela R. ao A. (na nota de culpa) e como a recorrente bem sabe, a ela competia demonstrar (art. 342º, nº 1, do CC).
Era aquela factualidade, alegadamente, imputada ao A., que tinha de ser demonstrada para que, a seguir, se analisasse se a mesma constituía justa causa do despedimento de que o mesmo foi alvo.
E, sendo desse modo, anteriores ou posteriores vicissitudes ocorridas, eventualmente, relacionadas com as diligências efectuadas pela Ré para recolher informações com vista à imputação daqueles comportamentos ao A. e das diligências efectuadas com vista à notificação da Nota de Culpa ao A. e o saber se a mercadoria identificada nas guias de devolução, não deu entrada nos armazéns da B…, ou se essas mercadorias foram ou não objecto de qualquer acção de “sell out”, são totalmente irrelevantes na apreciação a fazer sobre os comportamentos imputados ao A., na nota de culpa, alegadamente, violadores dos seus deveres e susceptíveis de constituírem justa causa do seu despedimento, por iniciativa da ré.
Aqueles sim, importava que se tivessem demonstrado, mas tal não aconteceu. Não se sabe o que se passou.
Assim, sem dúvida, concordamos com a decisão recorrida e, por isso, além das constantes naquela, não se justificariam outras considerações nossas. No entanto, tentando não incorrer numa repetição inútil da fundamentação do Tribunal “a quo”, além do já referido, deixaremos, apenas, as seguintes considerações para justificar a nossa concordância.
Refere o art. 381º, do CT, sob a epígrafe, “Fundamentos gerais de ilicitude de despedimento”, que o despedimento por iniciativa do empregador é ilícito:
“(...)
b)Se o motivo justificativo do despedimento for declarado improcedente;
(...).”.
Por sua vez, o art. 389º, do mesmo código, quanto aos “Efeitos da ilicitude de despedimento”, dispõe:
“1 – Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado:
a) A indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais;
(...).”.
Assim, pese embora, não nos merecer censura a decisão recorrida, ao decidir ser ilícito o despedimento do A., importa que regressemos à questão da impugnação da decisão de facto, cuja análise interrompemos.
No entanto, ainda, previamente, à apreciação da questão da impugnação da decisão da matéria de facto, uma outra se coloca. Saber se será aquela matéria (impugnada) juridicamente relevante, qualquer que seja a decisão que sobre a mesma venha a ser proferida à luz das diversas soluções plausíveis das questões de direito a solucionar?
E, a resposta, como nos parece evidente e já deixámos antever, só pode ser negativa, face aos fundamentos da acção, o pedido formulado pelo autor e o decidido em 1ª instância.
Os quesitos impugnados, dados como provados e não provados e que a recorrente considera deviam ser dados como “parcialmente provados”, “acrescentado” e “provados na sua totalidade”, são do seguinte teor:
“18 – A mercadoria identificada na guia de devolução rubricada pelo autor foi por ele levantada nos armazéns da D… e não deu entrada em nenhum dos estabelecimentos da B…?
19 – Relativamente à mercadoria identificada nas restantes duas guias de devolução, o autor também procedeu ao seu levantamento nos armazéns da D…, não tendo a mesma dado entrada em nenhum dos estabelecimentos da B…?
21 – Apesar das quantidades entregues pela B… ao cliente D… no denominado “bónus de “sell-out” serem coincidentes com as quantidades de produto levantado pelo autor no armazém da D…, as primeiras foram entregues ao cliente D… em data imediatamente posterior a cada um dos levantamentos?
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16 – Não obstante os esclarecimentos prestados pelo responsável da D…, foram tomadas por F…, as seguintes providências para confirmação daquelas informações:
a. reanálise de “todos os documentos relativos àquela mercadoria (encomendas, facturas, guias de devolução e conta corrente do cliente)”;
b. análise de “todas as encomendas de atum N… 120 gramas, realizadas por outros clientes da mesma carteira” de acompanhada/gerida pelo autor “e respectivas contas correntes, no período de tempo compreendido entre a data da primeira devolução e o último dia do mês da última devolução”;
c. análise dos “níveis de stock daquela referência no período de tempo acima referido”;
d. confirmadas as “recepções de produto atum N… 120 gramas, no armazém da B…, naquele período de tempo”;
e. reanálise de toda a correspondência trocada com o autor “no primeiro semestre do ano de 2016 sobre devoluções de produto e sobre eventuais bónus acordados com clientes”?
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88 – Em cumprimento da solicitação feita pela instrutora do procedimento disciplinar, no dia 01/02/2018, pelas 16h00, o trabalhador L… deslocou-se à morada da residência do trabalhador sita na Praceta …, …, …, em Valongo, para lhe entregar cópia da comunicação da nota de culpa junta a fls. 103 a 112v. e da comunicação junta a fls.114v. a 115 dos autos?
89 – Nesse dia 01/02/2018 o trabalhador, apesar de ter aberto a porta da sua residência ao trabalhador L…, recusou-se a receber a documentação referida e a assinar o comprovativo da recepção dessa documentação?
90 – E transmitiu ao colega L…, à porta de sua casa, após leitura da comunicação, “fui aconselhado a não assinar esta carta e a não receber este envelope, por isso levas de volta e dizes à empresa que não me encontraste nem estiveste comigo, porque tenho de ter tempo para pôr um processo contra a empresa. Se disseres o contrário é a minha palavra contra a tua”?
91 – Em face dessa recusa e após contacto telefónico com a instrutora do presente processo, o trabalhador L… voltou à morada da residência do trabalhador, sem que este, desta feita, lhe tivesse aberto a porta?
92 – O trabalhador L… depositou na caixa do correio do domicílio do trabalhador, … prédio sito na praceta …, nº …, em Valongo (morada de residência do trabalhador), a comunicação da instauração do processo e respectiva nota de culpa, bem como a comunicação de fls.114v., 115, 126v. e 127 dos autos?
93 – O trabalhador L…, apôs, pelo seu próprio punho, na comunicação que o trabalhador se recusou a receber, “Uma vez que o C… recusou receber em mão coloquei na caixa de correio do andar …, …, em 1 de Fevereiro de 2018”?
94 – Mais colocou, também pelo seu próprio punho, nessa comunicação, “foi também deixado na caixa de correio comunicação e nota de culpa”?”.
Da leitura destes, face ao que se considerou na sentença recorrida que, como já dissemos, subscrevemos, para se decidir pela ilicitude do despedimento do A., não é possível concluir qual a relevância daquela factualidade ou importância dos mesmos para a decisão da causa, como refere a recorrente.
Ora, sobre a concreta questão, dos comportamentos que são imputados ao A. e serviram para deduzir a Nota de Culpa, junta aos autos e que na sentença recorrida se concluiu, não se saber o que se passou, em nosso entender, acertadamente, a factualidade que a recorrente, considera deve ser acrescentada, não influiria, de modo algum, na decisão que foi proferida, atenta a factualidade que se provou e aquela, que não se provando, a recorrente, não impugna, basta atentar, na resposta dada aos quesitos 18 e 19 e naquela que a mesma, nesta sede, pretende lhes seja dada, ou seja, “18 - A mercadoria identificada na guia de devolução rubricada pelo Autor não deu entrada em nenhum dos estabelecimentos da B…” e;
19 - A mercadoria identificada nas restantes guias de devolução também não deu entrada nos armazéns da B…”.
Em suma, quanto ao decidido sobre o despedimento, face a tudo o que já se deixou exposto não se vê, em termos de subsunção jurídica, qual a relevância dos factos ali referidos, atento o que se apurou sobre o modo como cessou o contrato e que a decisão recorrida bem, em nosso entender, considerou ilícita.
Pois, mesmo a darem-se como provados, como defende a apelante, os quesitos cuja resposta impugna, será que o pedido, de ilicitude do despedimento, formulado pelo autor, improcederia?
É evidente que a resposta só pode ser não.
Aqueles reportam-se a factualidade que não tem a ver com os comportamentos imputados pela R. ao A., alegadamente, violadores de deveres laborais do mesmo que, não se apuraram.
E, através do presente recurso pretende a recorrente que se considerem aqueles justa causa do despedimento. Mas, como é manifesto, não é, por via, da alteração daqueles, que será possível concluir e saber o que se passou, em concreto, a respeito de quem levantou ou não as mercadorias, que a R. alega, foram levantadas pelo A. e se este tem ou não na sua posse o computador e a pen, comportamentos que lhe imputa e com os quais fundamentou o procedimento disciplinar que contra ele instaurou.
Ora, a decisão recorrida considerou e ficou confirmado nesta instância, que o contrato terminou com o despedimento ilícito do A., por não se ter apurado o que se passou e, em nosso entender, bem, já que a Ré não logrou demonstrar que o mesmo levantou as mercadorias, em causa, do armazém da D…, nem que o computador e a pen se encontrem na posse daquele, revelando-se absolutamente inócua, para que se dêem por provados aqueles factos, a impugnação deduzida contra a decisão de facto.
Como já dissemos, subscrevemos o entendimento expresso na sentença e, daí a irrelevância de apurar, as vicissitudes anteriores ou posteriores com vista à elaboração da nota de culpa ou o saber se a mercadoria a que aludem as guias de devolução não deram entrada nos armazéns da D… ou se não foram objecto de qualquer acção de “sell out”.
O que importava saber é se foram levantadas pelo A., dos armazéns da D….
E, sempre com o devido respeito, permita-se-nos dizer, ao contrário do que alegou (art. 47º da contestação), a Ré não logrou provar que foi o A. que levantou no armazém da D… a mercadoria em causa, num valor global de 10.242,02€.
Acrescendo que, também, não logrou provar que o A. lhe tenha causado prejuízos naquele montante e à sua imagem, bom nome e marcas da empresa junto do seu cliente D…. Sempre, porque, apesar de se desconhecerem os procedimentos praticados na Ré, a nível contabilístico, sempre com o devido respeito, não se compreende como, a mesma emite notas de crédito relativas a, alegadas, devoluções efectuadas pela D…, quando não há qualquer prova que permita concluir que as, alegadas mercadorias, identificadas nas guias de devolução, em causa, tenham saído dos armazéns daquela e a ré, pretende se dê, como provado não deram entrada em nenhum dos seus estabelecimentos.
E, se até é possível admitir, não sendo normal, o comportamento da Ré para com a D… (sua cliente – na salvaguarda de um bom relacionamento entre elas), como alega “reconhecendo que a mercadoria foi efectivamente devolvida pelo cliente”, no sentido de manter aquela relação, fornecedor/cliente, o que decorre do ponto 97 dos factos provados, já não pode isso servir para daí se concluir que foi o A. que levantou aquelas mercadorias. E, sem dúvida alguma, a Ré não logrou provar que ele o tenha feito.
Além de que, como decorre do facto 46 dado como provado, existem procedimentos internos do departamento comercial da Ré, no que toca ao levantamento de mercadoria junto de clientes, dependendo de autorização prévia da Direcção, com o conhecimento do KAM respectivo, não tendo o A. nem umas funções nem outras.
Sem dúvida, o alegado prejuízo, que a recorrente alega ter tido, com a emissão das referidas notas de crédito, não pode ser imputado ao A.. Além de que, também, não é de fácil compreensão, as datas das guias de devolução das mercadorias e a data em que o departamento de contabilidade da B… deu conhecimento dessas devoluções (vejam-se factos 12 e 41), muito mais de um ano depois.
Assim sendo e além das considerações que antecedem, sendo sabido que, à reapreciação da matéria de facto impugnada só há que proceder, caso estejam em causa factos essenciais a fundamentarem solução jurídica do caso, pois, não sendo desse modo, deve ser indeferida a reapreciação, parece-nos ser essa a situação no caso.
Conforme, neste sentido, veja-se o (Acórdão desta Relação de 19.5.2014 in www.dgsi.pt), onde se decidiu, “atento o carácter instrumental da reapreciação da decisão da matéria de facto, no sentido de que a reapreciação pretendida visa sustentar uma certa solução para uma dada questão de direito, a inocuidade da aludida matéria de facto justifica que este tribunal indefira essa pretensão”.
Do teor daqueles quesitos e pontos objecto de impugnação, é claro que os mesmos não contêm matéria susceptível de fundamentar a solução jurídica do caso, nem a pretensão do recorrente, que soçobrou nos termos da decisão recorrida, sendo totalmente inócuos.
Pelo que, surge-nos evidente a inutilidade da pretendida reapreciação da matéria de facto e, como resulta do disposto no art. 130º, a lei proíbe a prática de actos inúteis.
Entendemos, assim, que não há que proceder à reapreciação daquela matéria de facto impugnada, neste sentido, veja-se ainda, o douto (Ac. da RC de 6.3.2012, no mesmo sítio da internet), onde se decidiu, “não há lugar à reapreciação da matéria de facto quando o facto concreto objecto da impugnação não for susceptível de, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe, antemão, ser inconsequente, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processual.”.
Atento o exposto, indefere-se a impugnação da decisão da matéria de facto requerida pela recorrente, mantendo-se nos seus precisos termos a matéria de facto dada como assente pelo Tribunal “a quo”, apenas, com a alteração determinada, nesta sede, através do aditamento do facto supra referido.
Aqui chegados diga-se, apenas, que o não ter sido dada como provada, a factualidade que a recorrente impugna, não se mostra em contradição nem com a decisão quanto a qualquer questão proferida, nem com qualquer facto dado como provado, ao contrário do que considera a recorrente, (vejam-se conclusões 9ª e 11ª) ou os mesmos se mostram importantes para a decisão da causa (veja.se conclusão 14ª), como já dissemos, ou de modo algum resultam provados da conjugação das provas produzidas e em consonância com a globalidade da demais factualidade (veja-se conclusão 3ª).
Acrescendo, como é fácil de verificar da motivação da decisão de facto, supra transcrita, que não houve qualquer desvalorização ou valorização indevida de todas as provas produzidas nos autos, as quais tivemos oportunidade de analisar e fizemo-lo, permita-se-nos dizer, na expectativa de “desvendar o mistério”, do que terá acontecido e a convicção que firmámos não foi diversa da que consta firmada, com acerto e empenho pelo Mº Juiz “a quo”.
Razão porque, podemos afirmar, além de inócua para a decisão, a factualidade impugnada não resultou provada.
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Por fim, vejamos, a última questão de saber - se ocorre justa causa de despedimento e foi lícito o despedimento do A., como defende a recorrente, ou tal não acontece como se considerou na decisão recorrida.
Ora, mantendo-se inalterada a matéria de facto, nenhuma censura merece a sentença recorrida, cuja subsunção jurídica dos factos se mostra correctamente efectuada, em concreto, quanto à declarada ilicitude do despedimento do A. e à condenação da Ré, nas quantias em que foi, enquanto decorrência legal daquela.
Pelo que, aquela questão colocada no recurso, de saber se ocorre justa causa de despedimento e foi lícito o despedimento do A., como defende a recorrente, improcede totalmente, sem necessidade de outras considerações quanto a ela, face ao antes exposto.
Dizendo-se, apenas, que não se tendo apurado a infracção de qualquer dever laboral e contratual, por parte do A., aquela questão da apreciação da justa causa, com vista a ver declarada a licitude do despedimento, mostra-se prejudicada face a tudo o que deixámos exposto.
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Improcedem, assim, todas ou são irrelevantes as conclusões da apelação.
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III – DECISÃO
Face ao exposto, acorda-se nesta secção em julgar o recurso improcedente e confirmar a decisão recorrida.
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Custas pela recorrente.
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Porto, 14 de Julho de 2020
Rita Romeira
Teresa Sá Lopes
António Luís Carvalhão