Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2210/18.5T8VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JUDITE PIRES
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
CONCORRÊNCIA DE CULPA E RISCO
CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA
Nº do Documento: RP202205042210/18.5T8VNG.P1
Data do Acordão: 05/04/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Uma interpretação actualista do artigo 505.º do Código Civil não exclui a possibilidade de concorrência com a responsabilidade objectiva, associada ao risco inerente à circulação do outro veículo também interveniente no acidente de viação.
II - Essa concorrência, porém, não se configura quando o acidente tenha ficado a dever-se a culpa exclusiva do próprio lesado, constituindo esta uma circunstância excludente da responsabilidade emergente da circulação do outro interveniente no acidente.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 2210/18.5T8VNG.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia – Juiz 5

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I.RELATÓRIO.
AA, NIF ..., residente na Travessa ... n.º ..., 2.º Esquerdo, Traseiras, ..., Vila Nova de Gaia, menor de idade, representada pelos progenitores, BB, residente na Travessa ... n.º ..., 2. º Esquerdo, Traseiras, ... Vila Nova de Gaia e por CC, residente na Rua ..., ... entrada, R/C Esquerdo, ... Vila Nova de Gaia, propôs acção comum contra " X... – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., NIPC ..., com sede no Largo ..., ... Lisboa, pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia de 20.357,18 a título de danos morais e patrimoniais sofridos, acrescida da quantia a liquidar em execução de sentença, respeitante aos danos provenientes da IPG défice funcional permanente de integridade física ou psíquica que venha a ser definida.
Fundamenta o seu pedido alegando que foi atropelada por veículo seguro na ré, considerando que o embate ocorreu por culpa da sua condutora.
Mais alega a existência de danos sofridos em consequência do acidente.
A ré, regularmente citada – fls. 58 - apresentou contestação, alegando que o acidente se deveu a culpa exclusiva da autora, pronunciando-se pela improcedência da acção.
Foi elaborado despacho saneador, fixado o objecto do litígio, e definidos os temas de prova.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença que, julgando totalmente improcedente a acção, absolveu a ré do pedido contra ela formulado.
2. Não se conformando a autora com tal sentença, dela interpôs recurso de apelação para esta Relação, formulando com as suas alegações as seguintes conclusões:
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………………………………
A apelada apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

II.OBJECTO DO RECURSO.
A. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pela recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito.
B. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pela recorrente, no caso dos autos cumprirá apreciar:
- se existe erro na apreciação da prova;
- culpa dos intervenientes no acidente.

III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
III.1. Foram os seguintes os factos julgados provados em primeira instância:
1. A Autora nasceu em .../.../2004;
2. No dia 20 de Abril de 2016, pelas 15h00, a autora encontrava-se na paragem de autocarros, que fica a cerca de 10m do entroncamento da Rua ..., com a Rua ..., Vila Nova de Gaia.
3. Nesse dia e hora, o veículo ligeiro de passageiros de matrícula ..-JR-.., da marca Seat ..., de 2010, conduzido por DD, circulava na Rua ..., junto à ..., no sentido nascente poente junto ao n.º ..., Vila Nova de Gaia,
4. A autora encontrava-se na paragem do autocarro, após o fim das aulas, aguardando a chegada do seu transporte para retornar a casa;
5. E estava acompanhada de várias amigas, socializando, próximas da guia do passeio;
6. No momento em que tal veículo passava junto da referida paragem de autocarro a autora, que estava a brincar com outra colega, a subir e a descer do passeio, foi para a faixa de rodagem quando se encontrava na rua, tendo embatido, com a cabeça, na parte lateral dianteira do referido veículo;
7. O que provocou a sua queda no chão;
8. O referido veículo, pelo menos à data, era propriedade de EE;
9. Sendo que a responsabilidade civil emergente da circulação de veículo automóvel JR estava transferida, naquela data, para a aqui ré, através de contrato titulado pela apólice ...;
10. No local do acidente existe um entroncamento à esquerda, atento o sentido de marcha do veículo ..-JR-.. a cerca de 10m e tem uma passadeira a cerca de 20m da paragem de autocarro.
11. O JR circulava a cerca de 30 km /h;
12. No local do embate a via tem boa visibilidade, avistando-se a respectiva faixa de rodagem em toda a sua largura numa extensão de mais de 50 metros;
13. Sendo que não chovia e o dia estava claro e o céu limpo.
14. Com pavimento em bom estado de conservação, já que em alcatrão.
15. A condutora do JR apercebeu-se, previamente ao embate, da existência de pessoas na paragem de autocarro;
16. Na sequência do referido embate e queda, a autora foi transportada para o Centro Hospitalar ...;
17. Foi imobilizada em plano duro, devido por atropelamento com embate lateral (ombro e cabeça) .
18. Foi observada por Ortopedia, apresentando queixas de dor na crista ilíaca direita, onde apresentava uma escoriação;
19. Bem como dor na grelha costal;
20. Efectuou radiografia da bacia e coluna lombar, sem sinais de fracturas nas incidências obtidas;
21. Foi observada por Pediatria, apresentando hematoma parietal esquerdo.
22. Afirmando que tinha caído no passeio;
23. Efectuou radiografia do crânio sem traços de fractura;
24. Fez também TAC, tendo sido detectada fractura alinhada da escama do osso temporal esquerdo. Hematoma epidural subfraturário com sinais sugestivos de hemorragia activa, com cerca de 2 cm de maior espessura e que comprime o lobo temporal.
25. Bem como desvio das estruturas medianas para a direita de cerca de 5mm e ligeira herniação do uncus esquerdo, com múltiplas pequenas contusões hemorrágicas de contra-golpe temporais direitas.
26. As cisternas da base estavam parcialmente obliteradas, sem conflito de espaço na região do buraco magno.
27. Foi avaliada por neurologia, e transferida para o Centro Hospitalar 1...;
28. Tendo sido submetida a entubação ET e NG;
29. Foi colocado cateter de PIC intraparenquimatoso frontal esquerdo,
30. Fez transfusão de glóbulos rubros e antibioterapia profilática com cefazolina no intra-operatório;
31. Foi admitida no serviço de cuidados intensivos pediátrico do Centro Hospitalar 1... em 20.04.2016;
32. Em 21.04.2016 mantinha sedoanalgesia com propofol e remifentanil;
33. Foi transferida para o serviço de neurocirurgia em 22.04.2016.
34. Fez novo TAC-CE de controlo em 04.05.2016, apresentando reabsorção de conteúdo hemático, observando-se diminuição das dimensões (cerca de 6mm no presente estudo) da densidade e do efeito de massa local da lamina hemática extra- axial temporo-parietal esquerda.
35. Bem como reabsorção do conteúdo aéreo, anteriormente presente no seu interior, e reabsorção das densidade hemáticas do foco de contusão temporal direito persistindo, sem significativo agravamento;
36. Em 05.05.2016 apresentava evolução clínica favorável, sem queixas ou défices, estando consciente, colaborante no tempo e espaço.
37. Teve alta do serviço de neurocirurgia em 05.05.2016.
38. Foi observada em consultas externas de Neurocirurgia do Centro Hospitalar 1... em 02.06.2016, 25.08.2016 e 27.10.2016, tendo tido alta da consulta nessa data;
39. Teve nova consulta em Neurocirurgia em 06.04.2017, apresentando queixas de cefaleias 2 a 3 vezes por semana, com limitação funcional e que impede a frequência da escola.
40. Apresentava então calcificações vasculares, alargamento dos espaços de liquor na região temporal direita, podendo corresponder a muito pequeno quisto de aracnóide, sem efeito compressivo mas interessando o sulco lateral.
41. Alterações ao nível da calote craniana supratentorial à esquerda.
42. Discreto alargamento de sulcos corticais principalmente à esquerda;
43. Realizou RM cerebral em 22.06.2017, apresentando craniotomia fronto-temporo-pareital esquerda;
44. Bem como área encefaloclásticas em planos cortico-subcorticais das regiões temporo-polares bilateralmente, com maior extensão à direita, traduzindo-se por cavitação com perda de volume, gliose e depósitos de hemossiderina, representativas de lesões sequelares a contusões hemorrágicas, com ligeira extensão à região frontoopercular e temporo-opercular à direita, com depósitos de hemossiderina.
45. Apresentava ainda alargamento de espaços de liquor adjacentes, sendo proeminente e assumindo configuração arredondada à direita, sugestivo de quisto aracnóide pós-traumático, com depósito de hemossiderina à periferia e que condiciona ténue moldagem da grande asa direita do esfenóide;
46. Apresentava também redução de volume do hipocampo direito e má definição da sua arquitetura interna;
47. Teve nova consulta em 29.06.2017, tendo tido alta;
48. A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 29/06/2017.
49. O período de Défice Funcional Temporário Total foi de 16 dias;
50. O período de Défice Funcional Temporário Parcial foi de 420 dias;
51. O período de Repercussão Temporária na Atividade Formativa Total foi de 44 dias;
52. Sendo o período de Repercussão Temporária na Actividade Formativa Parcial de 392 dias;
53. O quantum Doloris é de 4/7;
54. E o défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 10 pontos.
55. As sequelas descritas são, em termos de Repercussão Permanente na Actividade Formativa, são compatíveis com o exercício da atividade formativa habitual, mas implicam esforços suplementares;
56. O Dano Estético Permanente fixável é de grau 1 /7;
57. Necessitando de tratamentos médicos regulares;
58. Podendo apresentar no futuro, outras consequências, associadas ao desenvolvimento da autora.
III.2. A mesma instância considerou não provados os seguintes factos:
- Que, no momento do embate, o JR circulasse a uma velocidade superior a 50 km/h;
- Que a sua condutora DD circulasse no momento no interesse do proprietário deste, EE.

IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
1. Reapreciação da matéria de facto.
Não se conformando a recorrente com a decisão proferida em primeira instância quanto à matéria de facto submetida a julgamento, reclama desta instância o reexame da mesma.
Dispõe hoje o n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”, estabelecendo o seu nº 2:
A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta”.
Como refere A. Abrantes Geraldes[1], “a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência”… “afastando definitivamente o argumento de que a modificação da decisão da matéria de facto deveria ser reservada para casos de erro manifesto” ou de que “não é permitido à Relação contrariar o juízo formulado pela 1ª instância relativamente a meios de prova que foram objecto de livre apreciação”, acrescentando que este tribunal “deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações que se justificarem”.
Importa notar que a sindicância cometida à Relação quanto ao julgamento da matéria de facto efectuado na primeira instância não poderá pôr em causa regras basilares do ordenamento jurídico português, como o princípio da livre apreciação da prova[2] e o princípio da imediação, tendo sempre presente que o tribunal de 1ª instância encontra-se em situação privilegiada para apreciar e avaliar os depoimentos prestados em audiência. O registo da prova, pelo menos nos moldes em que é processado actualmente nos nossos tribunais – mero registo fonográfico –, “não garante a percepção do entusiasmo, das hesitações, do nervosismo, das reticências, das insinuações, da excessiva segurança ou da aparente imprecisão, em suma, de todos os factores coligidos pela psicologia judiciária e dos quais é legítimo ao tribunal retirar argumentos que permitam, com razoável segurança, credibilizar determinada informação ou deixar de lhe atribuir qualquer relevo”[3].
Também é certo que, como em qualquer actividade humana, sempre a actuação jurisdicional comportará uma certa margem de incerteza e aleatoriedade no que concerne à decisão sobre a matéria de facto. Mas o que importa é que se minimize tanto quanto possível tal margem de erro, porquanto nesta apreciação livre o tribunal não pode desrespeitar as máximas da experiência, advindas da observação das coisas da vida, os princípios da lógica, ou as regras científicas[4].
De todo o modo, a construção da realidade fáctica submetida à discussão não se poderá efectuar de forma parcelar e desconexa, atendendo apenas a determinado meio de prova, ou a parte dele, e ignorando todos os demais, ainda que expressem realidade distinta, a menos que razões de credibilidade desacreditem estes.
Ou seja: nessa tarefa não pode o julgador conformar-se com a análise parcelar e parcial transmitida pelos litigantes, mas antes submetê-la a uma ponderação dialéctica, avaliando a força probatória do conjunto dos meios de prova destinados à demonstração da realidade submetida a debate.
Assinale-se que a construção – ou, melhor dizendo, a reconstrução, pois que é dela que se deve falar quando, como no caso, se procede à ponderação dos factos que por outros foram apreendidos e transmitidos com o filtro da interpretação própria de quem processa essa apreensão – da realidade fáctica não pode efectuar-se de forma parcelar e desconexa, antes reclamando o contributo conjunto de todos os elementos que a integram.
Quer isto dizer que a realidade surge de um conjunto coeso de factos, entre si ligados por elos de interdependência lógica e de coerência.
A realidade não se constrói apenas a partir de um depoimento isolado ou de um conjunto disperso de documentos, ainda que confirmadores de uma determinada versão factual, antes se deve conformar com um património fáctico consolidado de forma sólida, coerente, transmitido por elementos probatórios com idoneidade e aptidão suficientes a conferir-lhe indiscutível credibilidade.
Como se escreveu no acórdão da Relação de Lisboa de 21.12.2012[5], “…a verdade judicial traduz-se na correspondência entre as afirmações de facto controvertidas, relevantes e pertinentes, aduzidas pelas partes no processo e a realidade empírica, extraprocessual, que tais afirmações contemplam, revelada pelos meios de prova produzidos, de forma a lograr uma decisão oportuna do litígio. Sobre as doutrinas da verdade judicial como mera coerência persuasiva ou como correspondência com a realidade empírica, vide Michele Taruffo, La Prueba, Marcial Pons, Madrid, 2008, pag. 26-29. Quanto à configuração do objecto da prova e a sua relação com o thema probandum, vide Eduardo Gambi, A Prova Civil – Admissibilidade e relevância, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, Brasil, 2006, pag. 295 e seguintes; LLuís Muñoz Sabaté, Fundamentos de Prueba Judicial Civil L.E.C. 1/2000, J. M. Bosch Editor, Barcelona, 2001, pag. 101 e seguintes.
Por isso mesmo, a “reconstrução” cognitiva da verdade, por via judicial, não tem, nem jamais poderia ter, a finalidade exclusiva de obter uma explicação exaustiva e porventura quase irrefragável do acontecido, como sucede, de certo modo, nos domínios da verdade história ou da verdade científica, muito menos pode repousar sobre uma crença inabalável na intuição pessoal e íntima do julgador. Diversamente, tem como objectivo conseguir uma compreensão altamente provável da realidade em causa, nos limites de tempo e condições humanamente possíveis, que satisfaça a resolução justa e legítima do caso (…)”.
Como decorre do artigo 607.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, a prova testemunhal é livremente apreciada pelo tribunal, solução que emana do artigo 396.º do Código Civil.
Livre apreciação que, todavia, não se confunde com arbítrio na apreciação desse meio de prova[6], “mas antes a ausência de critérios rígidos que determinam uma aplicação tarifada da prova, traduzindo-se tal livre apreciação numa apreciação racional e criticamente fundamentada das provas de acordo com as regras da experiência comum e com corroboração pelos dados objectivos existentes, quando se trate de questão em que tais dados existam”[7].
Trata-se de um meio probatório de particular importância[8], pela amplitude da sua produção, sendo o mais frequentemente usado em instrução, mas também por ser o único existente ou o único praticável.
Paralelamente, é também o meio probatório que reúne maiores riscos de falibilidade: por perigo de infidelidade da percepção e da memória da testemunha, por perigo de parcialidade da mesma, designadamente[9].
Por isso, e sem pôr em causa a liberdade de julgamento, deve o julgador colocar especial cuidado na avaliação e ponderação dos testemunhos prestados em audiência, valorando-os com um prudente senso crítico, pesando não apenas o seu sentido objectivo, mas ainda a forma como se manifestam.
A noção de documento autêntico é facultada pelo artigo 369.º do Código Civil, cujo artigo 371.º assim define a força probatória destes documentos: “os documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base na percepção da entidade documentadora; os meros juízos pessoais do documentador só valem como elementos sujeitos à livre apreciação do julgador”.
A participação de acidente, elaborado por autoridade policial, faz, assim, prova plena dos factos nela atestados, quer por percepção directa da entidade atestadora, quer dos por esta praticados: “a participação do acidente elaborada pela Guarda Nacional Republicana é um documento autêntico fazendo prova plena dos factos que refere como praticados pelo respectivo agente, assim como dos factos que nele são atestados com base nas percepções do mesmo.
Os meros juízos pessoais por ele emitidos só valem como elementos sujeitos a livre apreciação do julgador”[10].
Ou seja: “a força probatória plena atribuída à participação de acidente elaborada pela GNR limita-se aos factos praticados pelo documentador e por ele atestados”[11].
1.1. Discorda a apelante da decisão proferida em primeira instância, considerando incorrectamente julgada o segmento que considerou não provado que “a sua condutora DD circulasse no momento no interesse do proprietário deste, EE”, que, na sua perspectiva, deve integrar o elenco dos factos provados.
Também manifesta a sua divergência com a apreciação da matéria constante dos pontos 6.º e 11.º dos factos provados, propondo que a redacção de tais segmentos decisórios seja alterada.
Finalmente, pugna pelo aditamento ao acervo dos factos provados do seguinte facto: “O JR após o sinistro imobilizouse a cerca de 10 metros da paragem do autocarro onde a autora se encontrava”.
A recorrente identifica expressamente a matéria factual que considera erradamente apreciada pelo tribunal de primeira instância, indica o sentido em que, na sua perspectiva, devia ter sido julgada, apontando os meios probatórios em que ampara essa sua conclusão.
Mostram-se, deste modo, satisfatoriamente preenchidos os requisitos exigíveis para esta instância proceder à sindicância da decisão que apreciou a matéria de facto, na parte em que foi objecto de impugnação.
Convocando a matéria dada como assente no ponto 8.º dos factos provados, de onde resulta que, pelo menos à data do acidente, o veículo nele interveniente era propriedade de EE, sustenta a recorrente, invocando “a presunção que a propriedade do veículo gera”, que deve ter-se como provado que “A sua condutora DD circulava no momento no interesse do proprietário deste, EE”, matéria que reproduz o por si alegado no artigo 31.º da petição inicial.
Para que a presunção de culpa funcione, não basta a circunstância de alguém conduzir, no momento do acidente, veículo pertencente a terceiro. Essa presunção de culpa, emergindo de uma relação de comitente/comissário, pressupõe que o condutor exerça a condução por conta, sob a ordens e no desempenho das funções que lhe foram cometidas.
Pretendendo convocar a relação de comissão, fundamentadora da presunção de culpa de cujo regime se proponha beneficiar, deverá, por conseguinte, o demandante, alegar factos concretos e objectivos que traduzam a subordinação e a dependência que caracterizam a referida relação, demonstrando ainda a existência desse circunstancialismo fáctico.
Não basta, pois, alegar que o condutor, no momento do acidente, circulava no interesse do proprietário do veículo, já que a prova incide sobre factos e não sobre conceitos ou juízos conclusivos/valorativos, sendo necessária a alegação factual dos pressupostos que haverão de preencher a referida relação comitente/comissário, dever de alegação que indiscutivelmente a autora não cumpriu, limitando-se a afirmar uma conclusão despojada de factos, nomeadamente quanto ao invocado conceito de interesse.
O juízo conclusivo em causa é inócuo quer sob a veste de “facto” positivo, quer como “facto” indemonstrado, nada podendo, assim, contribuir para o enquadramento da culpa.
Como tal, não deve o aludido segmento ser adicionado aos factos provados.
Quanto à demais matéria objecto de impugnação:
Ouviu-se a gravação que regista os depoimentos prestados em audiência e que revelaram contornos relevantes quanto à descrição da dinâmica do acidente.
- A testemunha DD, condutora do veículo interveniente no acidente, relatou, de forma objectiva e convincente que, circulando a cerca de 30 Km/h, quando passou pela paragem de autocarros, apercebendo-se da existência de pessoas na mesma, nas quais não atentou por seguir atenta à estrada, quando sentiu que algo embateu lateralmente na viatura que conduzia. Parou de imediato, tendo então se apercebido que fora uma menina que embatera no vidro da frente do lado do passageiro e na porta do passageiro, a qual estava caída no passeio, cerca de dois metros atrás do carro que a depoente conduzia.
- A testemunha FF estava no local, a falar ao telemóvel com uma cliente, apercebendo-se de várias miúdas na paragem do autocarro a brincarem ao jogo do empurra quando, entretanto, passa um carro, conduzido por uma senhora, no momento em que uma das miúdas, a fugir da brincadeira, desce o passeio e bate na parte lateral, na porta, do veículo, que parou de imediato, junto à paragem, alinhado na respectiva faixa de rodagem, tendo a criança ficado caída, metade no passeio e metade na rua.
Não revelando contradições entre si, e contendo uma descrição coerente, completa e objectiva das circunstâncias em que ocorreu o acidente, não sendo infirmados por outros meios de prova, os referidos depoimentos são merecedores de credibilidade, sustentando a matéria dada como provada no ponto 6.º dos factos provados.
Tendo a autora alegado na petição inicial que o veículo de matrícula ..-JR-.. circulava, aquando do acidente, a uma velocidade superior a 50 km/hora, tal factualidade foi considerada não provada.
Imputa a recorrente erro de julgamento quanto ao ponto 11.º dos factos considerados provados, sustentando, com base no depoimento das testemunhas FF e DD, que se deve considerar provado que o “JR circulava a velocidade inferior a 50 Km/hora”.
No aludido ponto 11.º julgou-se provado que “O JR circulava a cerca de 30 km /h”, juízo compatível com a redacção propugnada pela recorrente já que tal velocidade, ainda que indicada de forma aproximada, é inferior aos 50 Km/hora pela mesma propostos.
Não se vislumbra, pois, fundamento para alterar a redacção do ponto 11.º dos factos provados.
Finalmente, reclama a apelante que seja aditado ao elenco dos factos provados o seguinte facto que, dele não consta: “O JR após o sinistro imobilizouse a cerca de 10 metros da paragem do autocarro onde a autora se encontrava”.
Para além da matéria em causa não ter sido alegada, também a mesma não resulta comprovada por qualquer dos meios de prova produzidos, não resultando, designadamente, do esboço do acidente, junto com a respectiva participação, invocado pela apelante.
A impugnação deduzida à decisão que apreciou a matéria de facto é totalmente desprovida de fundamento, não merecendo tal decisão qualquer censura que, assim, permanece sem alterações, improcedendo, nesta parte, o recurso da apelante.
2. Do mérito do julgado.
2.1. Da responsabilidade.
Dispõe o artigo 483.º, n.º 1 do Código Civil que “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”.
Da simples leitura do preceito, resulta que, no caso de responsabilidade por facto ilícito, vários pressupostos condicionam a obrigação de indemnizar que recai sobre o lesante, desempenhando cada um desses pressupostos um papel próprio e específico na complexa cadeia das situações geradoras do dever de reparação.
Reconduzindo esses pressupostos à terminologia técnica assumida pela doutrina, podem destacar-se os seguintes requisitos da mencionada cadeia de factos geradores de responsabilidade por factos ilícitos: a) o facto; b) a ilicitude; c) imputação do facto ao lesante; d) o dano; e) e nexo de causalidade entre o facto e o dano.
Assim, antes de mais, para que o facto ilícito gere responsabilidade é necessário que o agente tenha actuado com culpa, pois a responsabilidade objectiva ou pelo risco tem carácter excepcional, como se depreende da disposição contida no nº 2 do citado preceito legal.
Com efeito, a responsabilidade civil, em regra, pressupõe a culpa, que se traduz numa determinada posição ou situação psicológica do agente para com o facto. Aqui operam as fundamentais modalidades de culpa: a mera culpa (culpa em sentido estrito ou negligência) e o dolo, traduzindo-se aquela no simples desleixo, imprudência ou inaptidão, e esta na intenção malévola de produzir um determinado resultado danoso (dolo directo), ou apenas aceitando-se reflexamente esse efeito (dolo necessário), ou ainda correndo-se o risco de que se produza (dolo eventual).
Em termos de responsabilidade civil consagra-se a apreciação da culpa em abstracto, ou seja, desde que a lei não estabeleça outro critério, a culpa será apreciada pela diligência de um bom pai de família (in abstracto), e não segundo a diligência habitual do autor do facto ilícito (in concreto)[12]. Como sustenta o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 29.01.2008[13], “a lei ficciona um padrão ideal de comportamento que seria o que um homem medianamente sensato e prudente adoptaria se estivesse colocado diante das circunstâncias do caso concreto – critério do “bonus pater familias”; irreleva a diligência normalmente usada pelo agente”.
A culpa define-se, para este efeito, na circunstância de uma determinada conduta poder merecer reprovação ou censura do direito, ou seja, importará sempre avaliar se o lesante, face à sua capacidade e às circunstâncias concretas do caso em que actuou, podia e devia ter agido de outro modo[14].
Causa de um acidente é a acção ou omissão normalmente idónea a produzi-lo. Tem tais características, a acção ou omissão que, no consenso da generalidade das pessoas medianamente prudentes, colocadas nas circunstâncias do caso, e segundo um juízo de prognose póstumo e de acordo com as regras da experiência comum ou conhecida do agente, é apta a produzir o evento danoso[15].
Via de regra, e segundo o disposto no artigo 487.º do Código Civil, incumbe ao lesado a prova da culpa do autor da lesão[16], mas casos há em que a lei estabelece presunções de culpa do responsável.
Nas acções de indemnização por facto ilícito, embora caiba ao lesado a prova da culpa do lesante, essa sua tarefa está aliviada com o recurso à chamada prova de primeira aparência (presunção simples). Em princípio procede com culpa o condutor que, em contravenção aos preceitos estradais, cause danos a terceiros, ideia que pacificamente encontra eco na jurisprudência dos tribunais portugueses.
Ou seja: “sob pena de tornar-se excessivamente gravoso ou incomportável, o ónus probatório instituído no art. 487.º C.Civ. deverá ser mitigado pela intervenção da denominada prova prima facie ou de primeira aparência, baseada em presunções simples, naturais, judiciais, de facto ou de experiência - praesumptio facti ou hominis, que os arts. 349º e 351º C.Civ. consentem, precisamente enquanto deduções ou ilações autorizadas pelas regras de experiência - id quod plerumque accidit (o que acontece as mais das vezes) (…) Como assim, e dum modo geral, a ocorrência de situação que em termos objectivos constitua contravenção de norma(s) do Código da Estrada importa presunção simples ou natural de negligência, que cabe ao infractor contrariar, recaindo sobre ele o ónus da contraprova, isto é, de opor facto justificativo ou factos susceptíveis de gerar dúvida insanável no espírito de quem julga…”[17].
Do acervo factual apurado nos autos resulta demonstrado que no dia 20 de Abril de 2016, pelas 15h00, a autora, que nasceu a .../.../2004, encontrava-se na paragem de autocarros, que fica a cerca de 10m do entroncamento da Rua ..., com a Rua ..., Vila Nova de Gaia, acompanhada de várias amigas, próximas da guia do passeio.
Nesse mesmo dia e hora, circulava, a cerca de 30 Km/hora, na referida Rua, junto à ..., no sentido nascente poente junto ao n.º ..., Vila Nova de Gaia, o veículo ligeiro de passageiros de matrícula ..-JR-.., da marca Seat ..., de 2010, pertencente a EE, conduzido por DD, a qual se apercebeu da existência de pessoas na paragem de autocarro.
No momento em que tal veículo passava junto da referida paragem de autocarro a autora, que estava a brincar com outra colega, a subir e a descer do passeio, foi para a faixa de rodagem, tendo embatido, com a cabeça, na parte lateral dianteira do veículo, o que provocou a sua queda no chão, daí resultando as lesões descritas na sentença.
No local do embate a via tem boa visibilidade, avistando-se a respectiva faixa de rodagem em toda a sua largura numa extensão de mais de 50 metros, o piso, de alcatrão, achava-se em bom estado de conservação, e na altura não chovia e o dia estava claro e o céu limpo.
Resulta do quadro factual descrito que a autora, que se achava na identificada paragem de autocarros, em brincadeiras[18] com outras amigas, próximo à guia do passeio, no momento em que o veículo conduzido por DD passava junto a essa paragem de autocarros, invadiu a faixa de rodagem por onde circulava o veículo, embatendo com a cabeça na parte lateral do mesmo, caindo, de seguida, no chão.
É, pois, evidente que é esta conduta imprevidente da autora que, repentinamente, sem que nada o faça prever[19], sai do passeio, entra na faixa de rodagem pela qual nesse momento segue o veículo de matrícula ..-JR-.., embatendo com o corpo na parte lateral dianteira do mesmo, caindo, de seguida, no chão, a causadora do acidente por ela sofrido e das lesões corporais que dele resultaram.
Resta, ainda assim, indagar se concorre alguma outra causalidade para a produção do acidente, mesmo que a título de risco.
Já no Acórdão Relação do Porto, 16.03.73[20] se defendia: “não podendo atribuir-se culpa no acidente a qualquer dos condutores dos veículos colidentes, não obstante a responsabilidade civil brotar, como regra geral, dos factos ilícitos culposos (artº 483º do Código Civil), há que atender à chamada responsabilidade civil objectiva ou pelo risco, a qual se reveste, na nossa lei, de natureza excepcional (artigos 483º, nº2, 499º, e 503º do Código Civil)”.
Defende, sem oscilação, a jurisprudência, ser possível a convolação para a responsabilidade pelo risco do pedido de indemnização fundado apenas na culpa, não provada[21].
Como esclarece o Acórdão da Relação de Évora, de 02.07.75[22]: “ o risco em matéria de acidente de viação provém do perigo que os veículos em marcha representam para a circulação rodoviária e para as pessoas”.
Tem sido largamente debatido na jurisprudência e na doutrina a questão de se saber se, perante a existência de culpa, mas não exclusiva, do lesado no acidente de viação de que foi vítima, e ausência de culpa, pelo menos demonstrada, do condutor do outro veículo automóvel interveniente no mesmo acidente, é admissível o concurso entre culpa e risco, na linha do entendimento da mais recente jurisprudência e doutrina, ou se, como é sustentado pela mais tradicional jurisprudência, a existência de culpa do lesado, ainda que não exclusiva, afasta a possibilidade de concurso com a responsabilidade do titular da direcção efectiva do veículo, assente no risco.
Esta última posição ancora nos ensinamentos do Prof. Antunes Varela para quem o artigo 505º do Código Civil coloca um inultrapassável problema de causalidade: sempre que ocorra uma das circunstâncias nele contempladas (acidente imputável ao lesado, por facto culposo ou não, ou a terceiro, ou quando o acidente tenha resultado de causa de força maior estranha ao funcionamento do veículo) ocorre uma quebra do nexo de causalidade entre os riscos próprios do veículo e o dano, afastando a possibilidade de responsabilidade objectiva do detentor do veículo por risco inerente à sua utilização.
A tese defendida pelo Prof. Vaz Serra, nos trabalhos preparatórios do Código Civil, no sentido da admissibilidade de concorrência entre responsabilidade pelo risco do detentor ou condutor do veículo e responsabilidade emergente de culpa do próprio lesado, não logrou então obter vencimento, não tendo sido acolhida no texto definitivo do aludido diploma a sua proposta de consagração de preceito enunciador dessa possibilidade.
Mas não obstante a sucumbência dessa sua proposta, mesmo após publicação do Código Civil continuou este Professor a defender a tese favorável à admissibilidade da aludida concorrência, argumentando, por um lado, que a expressão “acidente imputável ao lesado” inserida no artigo 505º do Código Civil deve ser entendida com o significado de acidente devido unicamente a facto do lesado, e, por outro, havendo similitude entre a situação de concorrência entre risco e culpa e a situação contemplada no artigo 570º do mencionado diploma, deve este ser aplicado por analogia, o que leva à aplicação das regras gerais sobre a conculpabilidade do lesado.
Também o Prof. Calvão da Silva vem pugnando pela tese da admissibilidade de concorrência entre culpa do lesado e risco inerente ao veículo, quando ambos os factos em causa contribuem para a produção do dano. Na análise interpretativa que faz do artigo 505º do Código Civil, sustenta este Autor que a ressalva consagrada na parte inicial do preceito (“sem prejuízo do disposto no artigo 570º”) reporta-se à responsabilidade objectiva fixada no nº1 do artigo 503º do citado diploma, pelo que a concorrência entre a culpa do lesado do artigo 570º e o risco da utilização do veículo do artigo 503º resulta do disposto no artigo 505º, só sendo excluída a responsabilidade pelo risco quando o acidente for imputável, ou seja exclusivamente devido, com ou sem culpa, ao próprio lesado ou a terceiro, ou quando ele resulte, também exclusivamente, de força maior estranha ao funcionamento do veículo.
Isto é, para este autor, sem prejuízo do concurso com a culpa do lesado, a responsabilidade objectiva do detentor do veículo só é excluída quando a acidente se dever unicamente ao próprio lesado ou a terceiro, ou quando o mesmo resulte exclusivamente de causa de força maior alheia ao funcionamento do veículo.
Também Brandão Proença[23] se tem pronunciado, a propósito da questão em debate, pela necessidade de introdução de uma interpretação mais actualista e harmoniosa dos preceitos em análise, que não exclua liminarmente a possibilidade de concurso entre responsabilidade decorrente do perigo da utilização do veículo e a que deriva de facto (culposo ou não) imputável ao lesado: “numa época em que a relação pura de responsabilidade, nos domínios do perigo criado por certas actividades, se enfraqueceu decisivamente, não parece compreensível, a não ser por preconceitos lógico-formais, excluir liminarmente o concurso de uma conduta culposa (ou mesmo não culposa) do lesado, levando-se a proclamada excepcionalidade do critério objectivo às últimas consequências”[24].
Pode ler-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04.10.2007[25]: “a este entendimento doutrinal mais moderno, de afirmação da concorrência do risco com a culpa da vítima – para cujo desenvolvimento é de justiça salientar também o papel dos estudos desenvolvidos por JORGE SINDE MONTEIRO desde há quase 30 anos Cfr. “Responsabilidade civil”, in RDEc., ano IV, n.º 2, Jul./Dez. 1978, pág. 313 e ss., e “Responsabilidade por culpa, responsabilidade objectiva, seguro de acidentes, in RDEc., ano V, n.º 2, Jul./Dez. 1979, pág. 317 e ss. e ano VI/VII, 1980/1981, pág. 123 e ss. – têm aderido outros prestigiados juristas, como ANA PRATA Cfr. o estudo intitulado “Responsabilidade civil: duas ou três dúvidas sobre ela”, in Estudos em comemoração dos cinco anos da Fac. de Direito da Univ. do Porto, 2001, pág. 345 e ss., merecendo referência o actual posicionamento do Prof. ALMEIDA COSTA, que, tendo seguido, durante muito tempo, a posição tradicional, na esteira de A. VARELA, se mostra agora sensível à argumentação de BRANDÃO PROENÇA e dos demais arautos da tese da concorrência “Se um facto do próprio lesado, (...) concorrer com a culpa do condutor, a responsabilidade poderá ser reduzida ou mesmo excluída, mediante aplicação do artigo 570º. E, de igual modo, existindo concorrência de facto de terceiro, quanto à repartição da responsabilidade. Ora, valerá esta doutrina para o caso de haver concurso de facto da vítima ou de terceiro, já não com a culpa do condutor, mas com o risco do veículo? Respondem afirmativamente VAZ SERRA, (...), PEREIRA COELHO, (...), SÁ CARNEIRO, (...), e por último BRANDÃO PROENÇA, (...). Afiguram-se-nos ponderosas as considerações aduzidas, designadamente na perspectiva da tutela do lesado” (Direito das Obrigações, 10ª ed. reelaborada, Almedina, Setembro/2006, pág. 639, nota 1..
Entre os práticos do direito tem sido o Juiz Desembargador AMÉRICO MARCELINO, com argumentação consistente, um estrénuo defensor deste entendimento Cfr. “Acidentes de Viação e Responsabilidade Civil”, 8ª ed. revista e ampliada, pág. 309 e ss.”.
E acrescenta o mesmo acórdão: “…não podemos deixar de ponderar a justeza da crítica, que à corrente tradicional tem sido dirigida, de conglobar, na dimensão exoneratória da norma do art. 505º, tratando-as da mesma forma, situações as mais díspares, como sejam os comportamentos mecânicos dos lesados, ditados por um medo invencível ou por uma reacção instintiva, os eventos pessoais fortuitos (desmaios e quedas), os factos das crianças e dos (demais) inimputáveis, os comportamentos de precipitação ou distracção momentânea, o descuido provocado pelas más condições dos passeios, uniformizando, assim, “as ausências de conduta, as condutas não culposas, as pouco culposas e as muito culposas dos lesados por acidentes de viação”, “desvalorizando a inerência de pequenos descuidos à circulação rodoviária”, e conduzindo, muitas vezes, a resultados chocantes.
Tal corrente mostra, ademais, na sua inflexibilidade e cristalização, uma insensibilidade gritante ao alargamento crescente, por influência do direito comunitário – e tendo por escopo a garantia de uma maior protecção dos lesados – do âmbito da responsabilidade pelo risco, que tem tido tradução em vários diplomas (a que faremos alusão mais adiante) cujo relevo maior radica, por um lado, na exigência, como circunstância exoneratória, de culpa exclusiva do lesado, e, por outro, na expressa consagração, no sector da responsabilidade civil do produtor ou fabricante de produtos defeituosos, da hipótese de concorrência entre o risco da actividade do agente e “um facto culposo do lesado” (art. 7º/1 do Dec-lei 383/89, de 6 de Novembro).
Esta evolução legislativa não pode, a nosso ver, ser ignorada, e dela devem ser retiradas “as devidas consequências para uma actualização interpretativa da rigidez normativa do Código Civil, tanto mais que a partir de meados da década de 80 passaram a coexistir dois regimes diferenciados, ou seja, o rígido sistema codificado e uma série de subsistemas imbuídos de um escopo protector e direccionado para os lesados” Autor e loc. cits. na nota anterior, pág. 29.
Como não deve ser ignorado o papel das directivas comunitárias no domínio do seguro obrigatório automóvel e a sua influência no direito da responsabilidade civil do próprio Código Civil. Sendo embora certo que, como é entendimento do Tribunal de Justiça, “na falta de regulamentação comunitária que precise qual o tipo de responsabilidade civil relativa à circulação de veículos que deve ser coberta pelo seguro obrigatório, a escolha do regime de responsabilidade civil aplicável aos sinistros resultantes da circulação de veículos é, em princípio, da competência dos Estados-Membros”, não deixa de ser igualmente verdade que as soluções decorrentes da interpretação das disposições das directivas ou do seu efeito útil penetram (ou devem penetrar) as legislações nacionais nesse domínio; e a sua influência no direito português é visível, quer na erradicação, do texto do art. 504º, dos limites aí estatuídos para a responsabilidade do transportador a título gratuito, quer na alteração dos limites máximos indemnizatórios do art. 508º.
A corrente jurisprudencial tradicional é igualmente insensível à filosofia que dimana do regime, estabelecido no Código do Trabalho, para os acidentados laborais, onde se estabelece que o dever de indemnização do empregador só é excluído se o acidente “provier exclusivamente de negligência grosseira do sinistrado”.
Estas são razões com força suficiente, a nosso ver, para pôr de remissa a interpretação jurisprudencial a que vimos aludindo”.
A propósito do acórdão citado, a cuja fundamentação também adere, esclarece o acórdão da Relação de Coimbra de 03.06.2008[26]: “está em causa neste aresto a interpretação que parte significativa da nossa doutrina vinha adiantando, com base na crítica ao entendimento tradicional de referir o sentido exoneratório do artigo 505º do CC a todas as situações de culpa do lesado ou de causalidade exterior ao lesante”.
Explica o acórdão da mesma Relação de 29.05.2012[27]: “A doutrina dominante [...] era (…) a de uma interpretação estritamente causalista da norma contida no artº 505 do Código Civil que enfatizava o primado da culpa, não admitindo qualquer solução ponderativa: a concepção, mais preocupada com a função reparadora da responsabilidade civil e com a tutela da vítima e que, em coerência rejeitava a visão absorvente da culpa do lesado, era nitidamente minoritária.
Simplesmente, é claro que o entendimento, doutrinaria e jurisprudencialmente dominante, do problema – assente numa solução extremista de tudo ou nada [...] – uniformiza as ausências de conduta, as condutas não culposas, as pouco culposas e as muito culposas dos lesados por acidentes de viação e desvaloriza a inerência de pequenos descuidos à circulação rodoviária, conduzindo, por vezes, a resultados chocantes, formalmente exactos mas materialmente inexplicáveis [...].
Sensível ao irrecusável desamparo do lesado que decorre de uma leitura da norma considerada à luz estrita da causalidade – sobretudo nos casos em que o dano é atribuído exclusivamente a uma falta leve do lesado e à conduta inesperada de pessoas desadaptadas ao tráfego [...], em atenção à pouca mobilidade e à dificuldade de percepção da pessoa idosa ou deficiente e à normal imprudência da criança que se atravessa de repente na via ou que corre atrás de uma bola – e impressionada pelo nada indemnizatório como preço de pequenos descuidos, a doutrina mais recente orienta-se para a admissibilidade da concorrência do risco com a culpa do lesado, ou mais exactamente, do concurso do risco com o facto, culposo ou não, da vítima, só excluindo a responsabilidade objectiva do detentor do veículo quando o acidente seja devido, com ou sem culpa, unicamente ao próprio lesado ou a terceiro [...].
E a jurisprudência não deixou de se mostrar permeável a esta evolução doutrinária. Exemplo acabado disso mesmo é, decerto, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Outubro de 2007 [...] que – de forma não inteiramente acorde – concluiu que o artº 505 do CC deve ser interpretado no sentido de que nele se acolhe a regra do concurso a culpa do lesado com o risco próprio do veículo, ou seja que a responsabilidade objectiva do detentor do veículo só é excluída quando o acidente for devido unicamente ao próprio lesado ou a terceiro, ou quando resulte exclusivamente de causa de força maior estranha ao funcionamento do veiculo”.
Entendendo ser cada vez mais defensável uma interpretação actualista do artigo 505.º do Código Civil, que não exclui a possibilidade de concorrência com a responsabilidade objectiva resultante do risco subjacente à utilização de veículo interveniente em acidente de viação, de acordo com os fundamentos espelhados na doutrina citada e jurisprudência mais recente, designadamente no mencionado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04.10.2007, sempre, no caso concreto, se afigura inaplicável tal entendimento, por se concluir que foi a actuação negligente da vítima, a autora AA, a concorrer, em exclusivo, para a produção do acidente.
Com efeito, da condutora do veículo automóvel, circulando nas condições em que o fazia, não era exigível diferente comportamento ou sequer outras cautelas, mesmo tendo ela se apercebido previamente da existência de pessoas na paragem do autocarro, não sendo expectável, em termos de regras de normalidade, que alguma delas invadisse a faixa de rodagem, no justo momento em que o veículo prossegue a sua marcha junto a essa paragem, indo embater no mesmo.
Do acórdão da Relação de Porto de 25.03.2021[28] retira-se: “...devemos considerar que perante perigos que são tão habituais ou expectáveis que qualquer condutor, usando do normal cuidado e diligência, os pode detectar e adequar a sua condução à presença dos mesmos, caem na esfera de responsabilidade do próprio agente os danos decorrentes da falta ou falha no comportamento que lhe era exigível.
Pelo contrário, o agente não pode ser responsabilizado por um perigo com que não podia ou devia contar, cujo surgimento era em condições normais imprevisível, decorrente de um factor ou obstáculo cujo aparecimento aqui e agora constitui uma surpresa [...].
O aparecimento súbito de um obstáculo em plena faixa de rodagem é algo com que não se conta em condições normais (é algo diferente se, por exemplo, há nevoeiro ou outras condições atmosféricas adversas) e, por isso, constitui uma cilada em que pode cair qualquer condutor diligente. Ora este quadro não pode estar arredado da avaliação ético-jurídica para efeitos de formulação do juízo de culpa da actuação do condutor que vindo por trás do veículo imobilizado acaba por ir embater nele.
Afigura-se-nos, contudo, que a ideia de que os condutores não têm de contar com (de conformar a sua actuação em função de) eventos imprevistos, como o aparecimento de obstáculos na faixa de rodagem, sejam eles peões, veículos parados, líquidos que reduzam ou eliminem a aderência ou animais, não pode ser levada longe de mais. Aligeirar o dever dos condutores de serem cautelosos e prudentes e evitarem avaliações temerárias e conduções ousadas é, com todo o devido respeito por opinião contrária, contribuir para os enormes custos humanos que a circulação rodoviária tem no mundo actual e em particular no nosso país [...].
A afirmação de que o condutor não tem de prever que se vai deparar com a presença de um veículo a obstruir a faixa de rodagem não pode pois afastar a exigência de que ele imprima ao seu veículo uma velocidade que, em caso de necessidade, lhe permita imobilizar-se antes do obstáculo.
Pensar diferentemente é, cremos, olvidar que as regras jurídicas visam essencialmente a imposição de regras de conduta, ajustando a liberdade de cada um ao necessário à coexistência e convivência da colectividade. Nas actividades de risco o objectivo do direito é mesmo o de reduzir esse risco a valores aceitáveis, o que se procura alcançar impondo aos agentes deveres de actuação para diminuir o risco, designadamente responsabilizando-os independentemente de culpa para que a ameaça dessa consequência os leve a adoptar os cuidados indispensáveis para a eliminação ou redução do risco.
A previsibilidade está associada ao desconhecido, à probabilidade de um evento incerto ocorrer, mas o dever de actuação rectius, a amplitude do dever de actuação, é dependência dos factores que se conhecem e dominam. Não há razão para que numa actividade de risco, numa situação em que as velocidades e as dimensões dos veículos podem causar elevados danos pessoais e materiais, seja permitido ao condutor, perante o desconhecido, confiar sem mais, ao invés de se lhe exigir que seja prudente e cauteloso. Se o condutor não tem visibilidade para além de determinado ponto (v.g. é uma curva, está nevoeiro, chove muito) não deve confiar que para além dele tudo estará livre; pelo contrário, deve ser mais cauteloso, prudente, previdente”.
No caso em apreço, seguindo a condutora do veículo automóvel a uma velocidade de cerca de 30 km/hora, na sua faixa de rodagem, não se mostrando comprovado que seguisse desatenta ou demasiado encostada à guia do passeio, em nada contribuiu a mesma para o acidente que vitimou a autora, o qual, de resto, poderia até ocorrer, embora com consequências eventualmente menos graves, achando-se o veículo imobilizado, dado ter sido a autora a embater no mesmo, caindo após no solo.
Também não resulta demonstrado que o risco inerente à circulação do veículo em causa tenha de alguma forma contribuído para o referido desfecho infortunístico, o qual, se deveu exclusivamente à actuação negligente da autora.
Deve, assim, concluir-se que a produção do acidente ficou a dever-se, em exclusivo, a culpa da própria lesada, o que constitui circunstância excludente da responsabilidade da demandada pela reparação dos danos por aquela sofridos.
Improcedem, consequente, as conclusões de recurso, impondo-se a manutenção do decidido.
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Síntese conclusiva:
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Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar, de facto e de Direito, improcedente o recurso da apelante, confirmando a sentença recorrida.

Custas da apelação: pela apelante, levando-se em conta o benefício do apoio judiciário que lhe foi concedido.

Porto, 4 de Maio de 2022
Acórdão processado informaticamente e revisto pela primeira signatária.
Judite Pires
Aristides Rodrigues de Almeida
Francisca Mota Vieira
______________
[1] “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2013, Almedina, pág. 224 e 225.
[2] Artigos 396º do C.C. e 607º, nº5 do Novo Código de Processo Civil.
[3] Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil”, vol. II, 1997, pág. 258. Cfr. ainda, o Ac. desta Relação de Coimbra de 11/03/2003, C.J., Ano XXVIII, T.V., pág. 63 e o Ac. do STJ de 20/09/2005, proferido no processo 05A2007, www.dgsi.pt, podendo extrair-se deste último: “De salientar a este propósito, como se faz no acórdão recorrido, que o controlo de facto em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade.
Na verdade, a convicção do tribunal é construída dialecticamente, para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, também pela análise conjugada das declarações e depoimentos, em função das razões de ciência, das certezas e ainda das lacunas, contradições, hesitações, inflexões de voz, (im) parcialidade, serenidade, "olhares de súplica" para alguns dos presentes, "linguagem silenciosa e do comportamento", coerência do raciocínio e de atitude, seriedade e sentido de responsabilidade manifestados, coincidências e inverosimilhanças que, por ventura transpareçam em audiência, das mesmas declarações e depoimentos (sobre a comunicação interpessoal, RICCI BOTTI/BRUNA ZANI, A Comunicação como Processo Social, Editorial Estampa, Lisboa, 1997)”.
[4] Anselmo de Castro, “Direito Processual Civil”, Vol. 3º, pág. 173 e L. Freitas, “Introdução ao Processo Civil”, 1ª Ed., pág. 15 7.ve
[5] Processo nº 5797/04.2TVLSB.L1-7, l1-7, www.dgsi.pt.
[6] Até porque sobre o julgador recai, como já se mencionou, o dever de fundamentar a sua convicção no que concerne ao julgamento da matéria de facto.
[7] Acórdão da Relação de Coimbra, 19.01.2010, processo nº 495/04.3TBOBR.C1, www.dgsi.pt
[8] Na expressão de Bentham, é na prova testemunhal que estão os olhos e os ouvidos da justiça…
[9] Cf. Antunes Varela, Miguel Bezerra, Sampaio e Nora, “Manual de Processo Civil”, págs. 614, 615; Manuel de Andrade, “Noções Elementares de Processo Civil”, págs. 276, 277; Anselmo de Castro, “Direito Processual Civil Declaratório”, vol. III, pág. 342.
[10] Acórdão da Relação do Porto, 15.12.94, processo nº 9440149, www.dgsi.pt.
[11] Acórdão da Relação do Porto, 26.10.2004, processo nº 0423773, www.dgsi.pt.
[12] Acórdão do STJ, 18.05.2006, procº nº 06B1644, www.dgsi.pt. [13] www.dgsi.pt.
[14] cf. Antunes Varela, “Revista de Legislação e Jurisprudência”, ano 102º, pág. 8 e ss.
[15] Neste sentido, Acórdão Relação do Porto, 14/3/89, BMJ 385º, 603.
[16] O que, de resto, se coaduna com as regras gerais da repartição do ónus da prova, plasmadas no artigo 342º do Código Civil, já que a culpa, sendo um dos pressupostos que integra e fundamenta o dever de indemnizar, é um facto constitutivo do direito a que o lesado se arroga; cf. ainda, neste sentido, entre outros, Acórdãos do STJ, 12.07.2005, 21.11.2006, 13.11.2008, Acórdão desta Relação, de 21.09.2004, todos em www.dgsi.pt.
[17] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19.10.2009, Processo n.º 04B2638, www.dgsi.pt.
[18] Brincando ao jogo do empurra, como explicou em audiência a testemunha FF.
[19] Segundo relato da mesma testemunha FF, que presenciou os factos, a autora, a “fugir da brincadeira”, desceu o passeio, bateu na parte lateral do veículo que nesse momento ia a passar, o qual “parou de imediato”.
[20] BMJ 226º-271; cfr. ainda Acórdão Relação de Coimbra, 25.07.75, BMJ 251º-213, Acórdão Relação de Coimbra, 02.02.82, Colectânea de Jurisprudência 1982, 1, 95.
[21] Entre outros, Acórdão Relação de Lisboa, 09.05.78, Colectânea de Jurisprudência 1978, 3, 921; Acórdão Relação de Coimbra, 18.02.76, Colectânea de Jurisprudência 1976, 1, 33; Acórdão Relação Évora, 02.07.75, BMJ 250º- 219; Acórdão Relação de Lisboa, 03.07.74, BMJ 239º-255.
[22] BMJ 250º-219.
[23] “A conduta do lesado como pressuposto e critério de imputação do dano extracontratual”, Almedina, Coimbra, 1997.
[24] Ob. cit., pág. 276.
[25] Processo nº 07B1710, www.dgsi.pt.
[26] Processo nº 801/2002.C1, www.dgsi.pt.
[27] Processo n.º 20/10.7TBALD.C1, www.dgsi.pt.
[28] Processo 2716/19.9T8PRD.P1, www.dgsi.pt.