Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1425/21.3T8VCD.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOÃO RAMOS LOPES
Descritores: PRESCRIÇÃO PRESUNTIVA
PROVA DO CUMPRIMENTO
ÓNUS DA PROVA
Nº do Documento: RP202302071425/21.3T8VCD.P1
Data do Acordão: 02/07/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO PROCEDENTE; DECISÃO REVOGADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O escopo e finalidade das prescrições presuntivas encontra-se na protecção do devedor contra o risco de satisfazer duas vezes dívidas que costumam ser pagas rapidamente e de cujo pagamento não é usual exigir recibo ou guardá-lo durante muito tempo..
II - Considerando o pensamento normativo subjacente ao estabelecimento das prescrições presuntivas, deve ter-se por arredada a aplicação dos normativos que as prevêem nas situações em que não estão presentes os fundamentos daquelas, seja porque não é usual pagamento imediato (ou em prazo curto), seja porque não é usual o pagamento sem quitação e é regra a conservação e guarda do recibo comprovativo do pagamento.
III - Não beneficia da presunção de cumprimento estabelecida no art. 317º, c) do CC o devedor sociedade comercial que, possuindo (por imposição da lei) contabilidade organizada, tem o dever de registar e manter em arquivo os pagamentos efectuados.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação nº 1425/21.3T8VCD.P1
Relator: João Ramos Lopes
Adjuntos: Rui Moreira
João Diogo Rodrigues
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto
RELATÓRIO

Apelante (autora): AA.
Apelada (ré): A..., SA.
Juízo local cível de Vila do Conde (lugar de provimento de Juiz 2) - T. J. da Comarca do Porto.
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Intentou a autora a presente acção comum alegando como fundamento ter contratado com a ré prestar-lhe serviços de arquitectura que pormenoriza (é arquitecta e dedica-se se profissionalmente a executar projectos de arquitectura), serviços que prestou e cujos honorários, que ascendem ao valor global de 12.109,19€ (doze mil cento e nove euros e dezanove cêntimos), a ré não pagou, pedindo a sua condenação a pagar-lhe tal montante, acrescidos dos juros à taxa legal.
Contestou a ré, alegando ter procedido ao pagamento dos honorários (o que fez em numerário, sem que lhe fosse entregue documento de quitação), invocando a prescrição presuntiva (por decorridos, à data da propositura acção, mais de oito anos desde a data da prestação dos serviços – serviços que decorreram até 2013). Conclui pela improcedência da acção e sua consequente absolvição do pedido e ainda pela condenação da autora como litigante de má fé.
Tramitada a causa (cumprido o contraditório sobre a invocada excepção) e realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo a ré do pedido (considerando não se verificar a invocada litigância de má fé da autora), por entender verificar-se, no caso a presunção de cumprimento estabelecida no art. 371º, c) do CC, não ilidida pela autora.
Por se não conformar com o decidido, apela a autora, pretendendo a revogação da sentença e sua substituição por outra que julgue procedente o pedido, terminando as suas alegações formulando as seguintes conclusões:
1. Por brevidade, dá-se aqui por integralmente reproduzida a matéria de facto dada como provada na douta sentença recorrida.
2. Não pode, a ora Recorrente conformar-se com a decisão de Direito, pelos motivos que se passam a expor e salvaguardado o devido respeito pelo entendimento nela vertido.
3. Sobe, pois, o presente recurso de apelação a V. Exas. para crítica e revogação da douta sentença recorrida quanto ao respectivo julgamento de direito com as inevitáveis consequências quanto ao pedido formulado pela Recorrente.
4. A sentença recorrida, que, considerou procedente a excepção da prescrição invocada, fundamenta-se no facto de à situação sub júdice ser aplicável o disposto na alínea c) do art. 317º do C.C., ou seja, aplicando o prazo de dois anos da prescrição presuntiva.
5. Ora, a Mma. Juiz a quo erra ao considerar, como efectivamente considerou, que o direito da recorrente de demandar a recorrida pelo pagamento dos serviços prestados, já se encontra prescrito por terem decorrido mais de dois anos.
6. Efectivamente, a recorrida, invocou a prescrição do direito da recorrente, por entender ser aplicável o disposto na alínea c), do art. 317º do Código Civil, o qual dispõe que prescrevem no prazo de dois anos: “Os créditos pelos serviços prestados no exercício de profissões liberais e pelo reembolso das despesas correspondentes.”
7. No entanto, não pode a aqui recorrente conformar-se ou concordar com tal interpretação e decisão, porquanto, ao contrário do sustentado pela douta sentença a quo não pode operar in casu a invocada prescrição presuntiva (presunção de cumprimento).
8. Dispõe o convocado art.º 317.º, al.ª c), do C. Civil, que “prescrevem no prazo de dois anos os créditos pelos serviços prestados no exercício de profissões liberais e pelo reembolso das despesas correspondentes.” Entende a douta sentença a quo que este preceito legal é aplicável ao caso dos autos (desencadeando a prescrição).
9. No entanto, tratando-se de uma relação contratual entre uma profissional liberal e uma sociedade comercial, no exercício da sua actividade profissional e comercial de ambos, não é aplicável o preceito do art.º 317.º, al.ª c), do C. Civil.
10. Isto porque o crédito de um profissional liberal sobre uma sociedade comercial, emergente de um contrato de prestação de serviços celebrado entre os dois, não cabe na previsão da alínea c) do artigo 317º do CC, ainda que tal prestação seja feita através de profissional liberal e não entre duas sociedades comerciais.
11. Neste sentido vide Acórdão da Relação de Lisboa de 21/11/2013 in http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/9d2b1029d824858980257c540030cd17?OpenDocument: “Ora, é certo que, diversamente da prescrição extintiva – que tem na sua base razões de segurança jurídica e assenta na inércia do credor –, “a prescrição presuntiva tem por objectivo proteger o devedor da dificuldade de prova do pagamento e corresponde em regra a dívidas que normalmente se pagam em prazos curtos e, muitas vezes, sem que ao devedor seja entregue documento de quitação, ou relativamente às quais, pelo menos, é corrente que se não conserve tal documento”.
Assim, a razão de ser das prescrições presuntivas encontra-se na circunstância de as obrigações a que se referem costumarem ser pagas em prazo curto e não ser usual exigir documento de quitação ou guardá-lo por muito tempo.
Decorrido o prazo legal, presume a lei que o pagamento foi efectuado, dispensando o devedor da sua difícil prova, dada a ausência de recibo.
Pretende a lei, ao fim e ao cabo, nos casos que inclui no regime, proteger o devedor contra o risco de se ver obrigado a pagar duas vezes dívidas de que não é costume pedir ou guardar recibo ou que, elas próprias, habitualmente não constam de documento (…).
Não extinguindo, em tais prescrições, o decurso do prazo, só por si, a obrigação do devedor, compreende-se que a sua eficácia se quede pela liberação deste do ónus da prova do cumprimento, destinando-se o prazo prescricional estabelecido na lei a fixar o momento a partir do qual passa a recair sobre o credor o ónus da prova em contrário da presunção de cumprimento.
Por isso, “considerando o pensamento normativo subjacente ao estabelecimento das prescrições presuntivas, deve ter-se por arredada a aplicação dos normativos que as prevêem nas situações em que não estão presentes os fundamentos daquelas, seja porque não é usual pagamento imediato (ou em prazo curto), seja porque não é usual o pagamento sem quitação e é regra a conservação e guarda do recibo comprovativo do pagamento (quando, pelas mais variadas razões, o devedor ao cumprir tem o cuidado de se munir, conservando-o, o recibo de quitação).
(…)
“Justifica-se assim se considere não ser aplicável o regime da prescrição presuntiva quando esteja subjacente ao crédito judicialmente exigido uma obrigação relativamente à qual é usual, contra o pagamento, emitir-se documento de quitação e bem assim quando é expectável (quer porque é usual e regra, quer porque é dever legal) que o devedor proceda à guarda e conservação de tal recibo de quitação – designadamente em casos em que o devedor tem a preocupação de exigir o recibo comprovativo do pagamento, conservando-o no seu arquivo contabilístico, mais ou menos organizado.
A inaplicabilidade do regime da prescrição presuntiva em tais casos assenta na consideração de que nenhuma tutela especial demanda o devedor, pois não corre o risco de ter de cumprir duas vezes (por estar impedido de comprovar, com o documento de quitação, a satisfação da obrigação) – nestes casos o devedor não tem qualquer dificuldade de prova do pagamento (o documento de quitação é exigido, é emitido e é conservado em arquivo contabilístico)”
Bem se compreende, pela mesma tipologia de razões, a diferenciação legal, na al.ª b) do mesmo art.º 317.º do CCiv., ao estabelecer igual presunção a favor das dívidas resultantes da aquisição de bens a comerciantes e industriais, mas excluindo-a quando tais bens se destinem ao exercício do comércio ou da actividade industrial do devedor.
Neste âmbito, designadamente entre comerciantes ou sociedades comerciais, se a prova logo decorre da escrituração regular de cada um, a prescrição prevista naquele preceito legal (o da al.ª b) referida) não é aplicável a negócios celebrados entre tais comerciantes, no âmbito das respectivas actividades.
Vistas, pois, as aludidas razão de ser e finalidade que subjazem à figura da prescrição presuntiva, também perfilhamos o entendimento de que o crédito de uma sociedade comercial sobre outra, emergente de um contrato de prestação de serviços em que reciprocamente se vincularam, não caberá na previsão da al.ª c) do art.º 317.º do CCiv., ainda que tal prestação seja feita com a intervenção de profissional liberal.”
12. Entendimento semelhante no que diz respeito aos serviços prestados por profissionais liberais a sociedades comerciais é o do Acórdão da Relação de Guimarães de 21/01/2021 in http://www.gde.mj.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/e87d9adfd0884b9b80258670005b9ebc?OpenDocument quando refere que: “Concordamos com a Jurisprudência citada pelo apelante na medida em que se afirma que o regime das prescrições presuntivas foi criado pelo legislador de 1966 à luz de um mundo de reduzida expressão económica, em que as unidades empresariais eram incipientes, muitas sem escrituração comercial e em que, por regra, as transacções comerciais dispensavam qualquer suporte documental. Aonde a necessária protecção do consumidor comum que, não dispondo de quitação, por não constituir regra a sua entrega, mereceu este regime de dispensa da prova da quitação após o decurso do prazo prescricional. Hoje, com o apertado controlo do fisco e das respectivas exigências, tal protecção perdeu actualidade, designadamente quando o devedor é uma sociedade com contabilidade organizada e as respectivas contas sujeitas a certificação por revisor oficial de contas.”
13. Ora, no caso dos autos, tratando-se de uma profissional liberal e uma sociedade comercial, ambas actuando/contratando no domínio e exercício da respectiva actividade comercial, os pagamentos têm de ser documentados.
14. Com tais documentos a serem objecto de incorporação na contabilidade respectiva e aí permanecer por largo lapso de tempo, posta a exigência de contabilidade para tais sociedades, donde que, nesse contexto, não ocorra a dificuldade de prova do pagamento.
15. Não aproveita, pois à aqui recorrida, a alegada presunção de cumprimento nos termos da referida norma, pelo que lhe cabe a prova do pagamento, o que in casu não sucedeu.
Em suma,
16. A finalidade do instituto da prescrição presuntiva radica na protecção do devedor face ao risco de satisfazer duas vezes dívidas que comummente são pagas de forma célere e em que não é usual exigir recibo de quitação ou guardá-lo prolongadamente;
17. O crédito de uma sociedade comercial sobre outra, neste caso de uma profissional liberal no âmbito da sua actividade, emergente de um contrato de prestação de serviços em que reciprocamente se vincularam, não cabe na previsão da al.ª c) do art.º 317.º do Cód. Civil.
18. Pelo que, pelos motivos supra mencionados, não é subsumível ao caso em apreço a prescrição presuntiva para isentar a recorrida da necessidade de provar o pagamento, e não tendo este sido efectivamente provado, deveria ter improcedido a alegada excepção de prescrição.
19. Sendo assim, afastando-se os prazos de prescrição mais curtos, diga-se, excepcionais, de 5 anos (artigo 310.º do C.C.), de 6 meses (artigo 316.º do C.C.) ou de 2 anos (artigo 317.º do C.C.), apenas resta o prazo normal de prescrição previsto no artigo 309.º do C.C., de vinte anos.
20. Ora, considerados os factos provados nos pontos 4 e 27 da douta sentença a quo, é claro que a dívida reconhecida e assumida pela recorrente não prescreveu por não decorridos os vinte anos previstos no artigo 309.º do Código Civil.
No entanto, sem prescindir e por mera cautela de patrocínio,
21. A prescrição presuntiva não funciona (não pode ser declarada) quando o alegado devedor, pratica em juízo actos incompatíveis com a presunção de cumprimento que é inerente àquela figura, o que acontece designadamente nos casos em que nega a dívida, discute o montante, não alega com clareza que pagou a concreta dívida que é peticionada.
22. Ora, a recorrida não concretizou claramente o modo e a forma de pagamento dos montantes em dívida, indica apenas, pagamentos parcelares, sem concretizar em quantas vezes e em que montante se realizou cada pagamento que afirma ter realizado.
23. Pelo que, sem prejuízo de opinião diversa e com o devido respeito, não é possível afirmar que a R. tenha concretizado e afirmado com a clareza necessária o pagamento de modo a que possa alegar a presunção de cumprimento.
24. Isto porque a alegação que procedeu ao pagamento da dívida em “tranches” ou “prestações” sem determinar ou concretizar datas ou modo de pagamento constitui per si acto contraditório com a presunção de pagamento a que alude o alegado art 317º, alínea c) do C.C.
Assim,
25. Ao decidir como decidiu o Tribunal a quo incorreu em erro de interpretação dos factos e em erro de interpretação e aplicação da lei, designadamente por julgar prescrita a dívida ao abrigo da alínea c) do art. 317º do Código Civil, e deverá ser substituída por decisão que julgue não aplicável a prescrição do crédito pelos motivos e considerações supra expostas e, consequentemente, condenar a recorrida no pagamento do valor peticionado pela recorrente.
Contra-alegou a ré, sustentando a improcedência da apelação e consequente manutenção da decisão recorrida, concluindo:
1ª. A recorrente aponta à douta sentença recorrida erro de interpretação dos factos e erro de interpretação e aplicação da lei.
2ª. Alega que aos presentes autos não é aplicável a prescrição presuntiva prevista na alínea c) do artigo 317º do Cód. Civil e que, por força disso, a acção deveria proceder, porquanto segundo a sua leitura dos factos provados em 2 a 27 do libelo decisório, os mesmos revelam o reconhecimento por parte da Ré da dívida peticionada pela Autora, o que no seu entender conduziria à condenação daquela.
3ª. Mais alega subsidiariamente que ainda que a prescrição presuntiva fosse aplicável, sempre seria afastada a sua aplicação in casu, porquanto a ora recorrida em sede de contestação teria (alegadamente) assumido uma posição incompatível com a alegação de cumprimento da obrigação, pelo facto de não ter concretizado pormenorizadamente o modo e forma do invocado pagamento.
4ª. A recorrente não impugnou a decisão sobre a matéria de facto da sentença recorrida em nenhum segmento das alegações de recurso e/ou respectivas conclusões, não apontando erros no julgamento da matéria de facto e/ou apreciação da prova, mormente identificando a materialidade erradamente julgada e as concretas provas que impunham decisão diferente, com a identificação da matéria que, em sua substituição, deveria ter resultado julgada provada ou não provada.
5ª. Ainda que se tivesse verificado erro na apreciação da prova, o que não se concede, a apreciação do visado vício estará sempre vedado a este Venerando Tribunal por incumprimento da recorrente do ónus recursivo previsto no artigo 640º do Cód. Proc. Civil que sobre si impendia, não sendo, por isso, modificável nesta instância a douta decisão sobre a matéria de facto.
6ª. A recorrente defende que sendo a Ré uma sociedade comercial pela mesma não é invocável a prescrição presuntiva prevista na alínea c) do artigo 317º do Cód. Civil, ainda que o serviço pelo qual se peticiona o preço seja prestado no âmbito do exercício de uma profissão liberal, invocando em sua defesa duas decisões jurisprudenciais que, no entanto, não encontram respaldo nem identidade com substracto fáctico dos presentes autos, nem sufragam a conclusão da qual a recorrente se pretende fazer valer para alterar a decisão ora recorrida.
7ª. Ainda que não nos atentemos na divergência jurisprudencial existente sobre a matéria, nos presentes autos a recorrida tem efectivamente registos contabilísticos [que não têm necessariamente de corresponder a recibos de quitação] que reflectem a concretização de pagamentos por si feitos à autora em numerário para liquidação dos seus honorários – Cfr. documento nº. 3 junto com a contestação que não foi impugnado pela ora recorrente.
8ª. Dispõe o artigo 317º do Cód. Civil na sua alínea c) que prescrevem no prazo de dois anos os créditos pelos serviços prestados no exercício de profissões liberais e pelo reembolso das despesas correspondentes, reportando-se a uma prescrição presuntiva, a qual, como referido no artigo 312º do mesmo código, se funda na presunção do cumprimento.
9ª. Do texto da lei, resulta que a mencionada prescrição aproveita a todo e qualquer devedor, não limitando a lei a sua aplicação a pessoas singulares ou colectivas, não exigindo qualquer qualidade do prestador dos serviços ou de quem os recebe (ao contrário do que está consagrado na al. b) da mesma disposição legal).
10ª. O legislador na formulação da visada alínea c) não identificou os créditos subsumíveis à norma como “os créditos dos profissionais liberais” [ao contrário da clara identificação vertida na alínea b)], nem fez qualquer ressalva sobre a natureza dos destinatários dos serviços [v.g a menos que a prestação se destine ao exercício industrial do devedor;], ao contrário do que fez na previsão normativa mais uma vez contida na alínea b) do mesmo artigo.
11ª. Se o legislador, contrariando a intenção que claramente transpôs para a alínea b), no normativo em discussão optou por identificar o objecto da norma como “os créditos dos serviços ….” é porque claramente o que quis enfatizar foi a natureza dos serviços, a cujo crédito seria de aplicar a presunção de cumprimento/pagamento, e não a natureza do prestador e/ou natureza e características do seu destinatário, pois se assim fosse bastaria ter optado por uma técnica de redacção idêntica à que utilizou na alínea anterior.
12ª. Igual conclusão chegamos quando passamos para a análise da ratio da norma. Trata-se de serviços de rápida cobrança e em que normalmente não se dá quitação oficial/contabilística. Onde existe uma exigida relação de confiança entre as partes e que normalmente duram algum (bastante) tempo, donde resulta que a razão de ser deste regime especial assenta em considerações de ordem prática, colhidas da experiência comum e conexionadas com o tipo de relações contratuais que estão em causa, por referência ao seu objecto – Vaz Serra, Pires de Lima e Antunes Varela, Rita
Canas e Manuel de Andrade.
13ª. A posição sufragada com maior expressão pelo Supremo Tribunal de Justiça é a que determina como critério de aplicação da presunção prevista na alínea c) do art. 317º Cód. Civil a natureza do serviço e não a qualidade dos sujeitos - Ac. STJ de 12-09-2006, Proc. 06A1764, relatado por Nuno Cameira e Ac. STJ de 15-05-2014, citado no Ac. TRL de 11-07-2019, Proc. 13638/17.8T8LRS.L1-2, relatado por Pedro Martins, ambos disponíveis em www.dgsi.pt “[…] há prescrição presuntiva de dois anos para os créditos pelos serviços prestados no exercício de profissões liberais (c) independentemente da qualificação jurídica da entidade que os presta ou da entidade a quem são prestados.”.
14ª. Idêntica posição tem sido assumida com maior expressão nos Tribunais da Relação do Porto e Lisboa, onde em processos cujos autores e réus eram sociedades (comerciais e/ou civis) o critério determinante decidendum foi o da natureza do serviço - Ac. TRP de 22-05-2017, Correia Pinto, Proc. 104226/15.8YIPRT.P1, Ac. TRP de 24-03-2015, Henrique Araújo, Proc. 102608/13.9YIPRT.P1, Ac. TRL de 11-07-2019 citado na douta sentença recorrida, Ac. TRL de 25-06-2013, Eurico Reis, Proc. 92437/11.1YYPRT-A.L1-1, - citado e sufragado pelo Ac. TRL de 18-11-2021, Manuel Rodrigues, Proc. 2049/20.8T8CSC.A.L1-6, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
15ª. Encontrando-se vedado aos Tribunais o poder de legislar, não podem estes sob a veste de uma interpretação actualista, consagrar interpretação que contraria claramente o texto da lei e a sua ratio, atropelando o nobre princípio ubi lex non distinguit nec nos distinguire debemus e o postulado segundo o qual se presume que o legislador “soube exprimir o seu pensamento de forma adequada”- art. 9.° n.º 3 do Cód. Civil.
16ª. Na aplicação da alínea c) do artigo 317º do Cód. Civil, o que relevará é que a natureza do serviço prestado, cujo crédito se invoque, se identifique com um serviço típico do resultante de uma profissão liberal, ou seja, resultante de uma actividade primordialmente intelectual e susceptível de regulamentação e controlo próprios (Ordens e Câmaras), como são os serviços de contabilidade, advocacia e arquitectura.
17ª. Resultou provado nos autos (vide ponto 1. dos factos provados) que a recorrente é arquitecta de profissão, sendo que, nos termos dos artigos 3/1-b e 151, ambos do CIRS, conjugados com ponto 1 do anexo I da Portaria 1011/2001, de 21/08, alterada pelas Portarias nº. 256/2004 de 09/03 e nº. 23/2022 de 07/01, essa actividade é qualificada como prestação de serviços no âmbito de profissões liberais.
18ª. A sentença recorrida não padece de qualquer erro de interpretação e/ou subsunção do Direito, tendo sido feita uma correcta interpretação e aplicação da norma vertida no art. 317º alínea c) do Cód. Civil.
19ª. Ainda que a visada presunção de cumprimento não fosse aplicável ao caso sub judice, a matéria de facto dada como provada e não provada – não impugnada – não basta à procedência do pedido, nem o permite, porquanto a recorrente não logrou provar a existência da dívida, ou seja, que os seus honorários não tenham sido pagos – veja-se neste sentido a alínea i) dos factos não provados da douta sentença recorrida e a respectiva fundamentação no que à convicção do tribunal a quo diz respeito.
20ª. Ao contrário do sufragado pela recorrente nas suas alegações, da matéria dada como provada em 2 a 27 não resulta provado, nem se retira, qualquer reconhecimento por parte da recorrida da existência da dívida, resultando tão só que a recorrente prestou aqueles serviços à recorrida e quais os valores de honorários estimados acordados.
21ª. A prova da prestação de serviços e a sua “orçamentação”, não permite que desta factualidade, qual salto quântico-jurídico, se retire qualquer factualidade sobre o (não) pagamento correspondente.
22ª. A alegação da prescrição presuntiva, porque assente na presunção de cumprimento pelo decurso do prazo, contém em si mesma a alegação do cumprimento e sua prova por presunção legal, não podendo, por conseguinte, valer como confissão tácita de dívida a não impugnação expressa, directa e especificada, da falta de pagamento alegada pelo autor/credor.
23ª. Não tendo o julgamento da matéria de facto sido impugnado pela recorrente e perante a factualidade ali fixada, ainda que não fosse de aplicar a prescrição presuntiva prevista na alínea c) do artigo 317º do Cód. Civil, a sentença recorrida nunca poderia ser alterada no sentido por aquela pretendido, porquanto não resultam factos na matéria assente que o sustentem.
24ª. A recorrida não praticou na presente lide quaisquer actos incompatíveis com a presunção de cumprimento, tendo em 15º a 20º, 23º a 25º, 35º da sua contestação alegado inequivocamente que pagou o crédito peticionado pela autora, pelo que não é de afastar a pugnada aplicação da alínea c) do art. 317º do Cód. Civil.
25ª. É pacífico na jurisprudência que se o réu de alguma forma colocar em causa o crédito peticionado, impugnando o seu valor, total ou parcial, discutir a validade do negócio que o subjaz, ou invocar qualquer forma de extinção (vg. compensação) que não o cumprimento, afasta a aplicação da visada prescrição, contudo, a recorrida não alegou qualquer umas das factualidades acima descritas.
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.
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Da delimitação do objecto do recurso
Considerando, conjugadamente, a sentença recorrida (que constitui o ponto de partida do recurso) e as conclusões das alegações, emergem cristalinamente como questões a decidir:
- apurar se a apelada beneficia (como considerado na decisão apelada) ou não (como defende a apelante), relativamente ao crédito peticionado, da presunção de cumprimento estabelecida no art. 317º, c) do CPC,
- apurar se, beneficiando a apelada de tal presunção, deve a mesma ser afastada em razão de a apelada ter praticado em juízo factos incompatíveis com o cumprimento (art. 314º do CC),
- apurar, caso a apelada não beneficie da presunção de cumprimento ou se a mesma for de afastar, se assiste à apelante o direito a haver da apelada as quantias peticionadas (honorários e juros).
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FUNDAMENTAÇÃO
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Fundamentação de facto
Na sentença recorrida consideraram-se, com interesse para a decisão da causa:
Factos provados
1. A autora é arquitecta de profissão, inscrita na Ordem do Arquitectos com o n.º ..., que se dedica na sua actividade profissional a elaborar e executar projectos de arquitectura.
2. O objecto social da ré é o exercício da atividade de compra e venda de bens mobiliários e imobiliários, arrendamento, compra para revenda dos imóveis adquiridos para esse fim, gestão de investimentos imobiliários e administração de imóveis, importação e venda de equipamentos, verificação e calibração de contadores volumétricos, qualificação e homologação de equipamentos de contagens e medição, assistência de produtos comercializados, prestação de serviços e de consultadoria empresarial e intermediação de negócios conexos com as referidas atividades.
3. A ré é proprietária do prédio sito na Rua ..., freguesia ..., concelho de Vila do Conde, descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila do Conde sob o n.º ..., com o artigo matricial ..., da freguesia ....
4. No âmbito da actividade comercial da ré, e através da sua representante legal, a Sr.ª BB, a Autora foi contratada no ano de 2002 para executar e realizar os serviços de arquitectura necessários para a construção da moradia unifamiliar que hoje existe no prédio supra identificado.
5. Para o efeito, e a pedido da ré, a autora desenvolveu um projecto de arquitectura de moradia unifamiliar, tendo para tal sido apresentada e combinada verbalmente uma estimativa de custos e honorários para a concretização de todas as fases do projecto.
6. A ré aceitou a estimativa de honorários apresentada pela autora que consistiu na elaboração e execução das diferentes fases do citado projecto, a saber: Projecto Base; Estudo prévio; Projecto de Licenciamento; Projecto de Execução; Projecto de Arranjos Exteriores; Acompanhamento de Obra; Múltiplas visitas à obra durante vários anos; Coordenação dos vários Projectos das Especialidades.
7. O valor global da Obra da Moradia foi estimado em 178.500,00 €, tendo sido classificada na categoria II.
8. O valor de honorários proposto pela autora e aceite pela ré foi um valor estimado de cerca de 8.000,00€, sem prejuízo de futuras rectificações e trabalho adicional.
9. A autora iniciou nessa altura o trabalho para o necessário licenciamento da obra, cujo processo de obras e respectivo projecto de engenharia correu termos na Câmara Municipal ... com o n.º ..., até à obtenção de alvará.
10. A autora executou o projecto de arquitectura e os projectos de especialidade propostos, tudo de acordo com as instruções da ré, e em conformidade com o Plano Director Municipal, com o Regime Geral das Edificações Urbanas e Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, bem como toda a legislação aplicável ao já referido Processo de Obras com o n.º ....
11. Para o efeito, a autora entregou inicialmente, na Câmara Municipal ... o respectivo Requerimento e Termo de Responsabilidade, bem como todas as peças inerentes ao projecto de arquitectura conforme o descrito no requerimento e posteriormente os necessários projectos de especialidade.
12. A autorização para executar escavações foi emitida pela CM... em 4/02/2004, e posteriormente foi emitido o alvará de licença de construção sob o n.º ....
13. A licença de construção supra referida foi objecto de um pedido de prorrogação da licença de construção, isto porque foi necessário elaborar e dar entrada de várias adendas ao projecto inicial, o que obrigou a autora a reformular por diversas ocasiões o projecto de arranjos exteriores e entregar projecto de pavimentações devido a incongruências dos limites entre propriedade privada e pública na extrema do passeio da Rua ....
14. Para resolver a situação descrita, procedeu-se então a um processo de venda de terreno público entre a propriedade da ré e a via pública.
15. No decorrer da obra, e antes de obter o necessário licenciamento, a ré construiu uma piscina, o que motivou a abertura do processo contra-ordenacional n.º ....
16. Por estes motivos as obras prolongaram-se mais do que previsto, pelo que foi requerida e obtida a prorrogação da licença referida em 12.
17. Para proceder ao licenciamento da piscina que havia sido construída, foi apresentada mais uma adenda ao processo de obras.
18. No entanto, tal adenda não foi admitida por estarem em causa os limites previstos da RAN (Reserva Agrícola Nacional).
19. Na sequência desse indeferimento a autora, em nome da ré, apresentou diversas exposições junto da Câmara Municipal ... no sentido de contrariar tal decisão, que Autora e Ré consideraram ser uma interpretação restritiva dos limites previstos na legislação aplicável.
20. Apesar disso, tais intervenções não lograram reverter a decisão inicial de indeferimento do licenciamento da piscina, sendo que a única forma de resolver a situação seria através da alteração dos limites fixados pela RAN, o que só poderia ser feito através da alteração do Plano Director Municipal, cujo período de revisão nessa altura já decorria.
21. A ré pretendeu ainda desenvolver no mesmo local, mais concretamente nos 8 000m2 sobrantes que se encontravam em zona de reserva agrícola, uma urbanização para construção de outras quatro moradias.
22. A ré também contratou a autora para apresentar junto da Câmara Municipal ... um pedido de alteração do Plano Director Municipal, mais concretamente para “alteração da classificação do solo previsto de zona de Reserva Agrícola Nacional para zona de Construção Tipo II”.
23. Para o efeito, a autora elaborou e entregou extracto da planta de condicionantes do plano organizou e instruiu o referido pedido com todos os elementos e documentos necessários à sustentação do mesmo, designadamente certidões, extratos da planta de ordenamento director municipal, extrato de planta de enquadramento geral do plano director municipal, extrato da planta de enquadramento local do plano director municipal, extracto do ortofotomapa do plano director municipal, planta topográfica, memória descritivo, planta do existente, planta da proposta piso térreo e planta da proposta cobertura.
24. O valor dos honorários da autora pela elaboração e apresentação junto da Câmara Municipal ... do pedido de alteração do PDM, correspondente à primeira fase do pedido de alteração corresponde a 19 250,00x0,20, ou seja, 3 850,00€ (três mil oitocentos e cinquenta euros).
25. Para além disso, para a obtenção do alvará de utilização, em 2007 a ré solicitou à autora que interviesse também como Directora Técnica da fase final da obra e cumprisse todas as diligências burocráticas inerentes, uma vez que a empresa de construção que a ré contratara tinha falido e o livro de obra estava desaparecido.
26. E uma vez que não era possível realizar a vistoria final para obtenção do alvará de utilização com a piscina por licenciar, a ré comunicou à Câmara Municipal ... que havia “desistido” da piscina.
27. Na sequência dessa comunicação, o Alvará de Autorização de Utilização foi emitido com o n.º ..., em Maio de 2012.
27. Em 2014 a ré contratou outro arquitecto, o Sr. Arq.º CC, para o processo de ampliação, tendo o mesmo assinado requerimento de entrada de projecto de arquitectura de ampliação e remodelação de moradia junto do Processo de obras n.º ....
28. Em Fevereiro de 2014 foi enviada a necessária notificação da “Declaração Para Alterar Projecto de Arquitectura”.
29. O Sr. Arq.º CC executou e instruiu o requerimento para emissão de novo alvará de utilização.
30. A autora, por meio da patrona nomeada para o efeito, e no sentido de uma resolução extrajudicial do assunto, enviou carta registada datada de 22 de Fevereiro de 2021 à ré solicitando o pagamento do trabalho realizado no âmbito de pedido de alteração do Plano Director Municipal, no valor de 3.000,00€.
Factos não provados
a) Durante o mês de Outubro de 2013, a autora reuniu-se com a representante legal da ré no local da obra no sentido de dar seguimento a um novo projecto de ampliação e remodelação da moradia unifamiliar ali existente.
b) Em concretização dos trabalhos contratados, e com vista à cabal execução dos aludidos projectos, a autora reuniu diversas vezes com a representante legal da ré, tanto no local da obra como no seu gabinete, como com outros profissionais e ainda com técnicos da Câmara Municipal ....
c) Em 2014 a autora, por razões de ordem pessoal, foi forçada a alterar o seu domicílio pessoal e profissional e passou a residir e trabalhar na Póvoa de Varzim, e foi na sequência de tal facto, sem justificação ou razão para tal, a ré decidiu a contratação referida em 27.
d) A ré decidiu o referido em 27. em Dezembro de 2013, sem cuidar de comunicar tal decisão à autora, e sem cuidar de saldar os honorários devidos pelo trabalho e serviços requisitados e prestados pela autora.
e) O arquitecto identificado em 27. teve intervenção no processo de obras ainda antes de proceder à comunicação devida à autora.
f) A notificação referida em 28. qual foi enviada para a anterior morada da autora, e nunca foi receptionada pela autora.
g) Só mais tarde a autora tomou conhecimento da sua substituição no projecto de ampliação e remodelação da habitação situada na Rua ..., em ..., Vila do Conde.
h) Após tomar conhecimento do facto referido em 27. a autora contactou a representante legal da ré no sentido de solicitar o pagamento dos serviços e trabalhos efectivamente realizados até à data, quer o respeitante ao Processo de obras n.º ..., quer o respeitante ao pedido de alteração do Plano Director Municipal.
i) Até à data a ré não pagou os valores relativos ao trabalho realizado, encontram-se em dívida: a quantia de 8.259,19€ (oito mil duzentos e cinquenta e nove euros e dezanove cêntimos) relativas ao Proc. de Obras n.º ..., e a quantia de 3 850,00 € (três mil oitocentos e cinquenta euros), relativa ao pedido de alteração do Plano Director Municipal apresentado.
j) Até ao final de 2013 existiram uma série de contratempos com as aprovações camarárias, os quais deixaram de existir a partir do momento em que a autora deixou de prestar serviços à ré.
k) A ideia referida em 21. foi da própria autora, a qual referiu que haveria, por essa via, a possibilidade de a ré obter uma mais-valia imobiliária interessante e, paralelamente, poder legalizar a piscina.
l) Foi a autora que disse que pretendia receber os seus honorários em numerário, pois não queria envolver directamente neste trabalho a sociedade de que era sócia-gerente, denominada, à data, B..., Ldª., e actualmente denominada B..., Unipessoal, Ldª.
m) A ré não recebeu qualquer documento comprovativo de quitação, o que foi contornado com acertos dos suprimentos dos sócios.
n) Para concretização do pedido de licenciamento da obra de construção da moradia unifamiliar, a autora estudou e empregou todo o seu saber e labor técnico e toda a sua experiência.
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Fundamentação jurídica
A. Da presunção de cumprimento – beneficia ou não a apelada da presunção de cumprimento estabelecida no art. 317º, c) do CPC.
A primeira questão suscitada na apelação consiste em apurar se a apelada beneficia ou não, relativamente ao crédito peticionado, da presunção de cumprimento estabelecida no art. 317º, c) do CPC, ponderando as razões justificativas (fundamentos) do instituto – dito doutra forma, importa apurar se considerando o pensamento normativo subjacente ao seu estabelecimento deve arredar-se a aplicação da presunção de cumprimento nas situações em que os fundamentos que justificam a sua previsão não se mostrem presentes, seja porque se trata de situação em que não é usual o pagamento imediato (ou em prazo curto), seja porque não é usual o pagamento sem quitação e, pelo contrário, é regra a conservação e guarda do recibo comprovativo do pagamento (ou dos documentos que demonstrem o pagamento)[1].
A prescrição presuntiva consubstancia-se numa presunção de cumprimento da obrigação a favor do devedor (trata-se de figura que pertence ao direito substantivo mas cujo efeito se repercute na definição da parte à qual incumbe o ónus de provar o cumprimento da obrigação[2] – a sua repercussão imediata verifica-se a nível da prova e não da alteração da ordem jurídica[3]), fazendo impender sobre o credor o ónus de prova do não cumprimento e confrontando-o com limitações ao nível do direito probatório – no art. 312º do CC o legislador considera que nas situações tipificadas nos artigos 316º e 371º do CC, o ‘decurso do prazo presume o cumprimento, não necessitando o devedor de provar o facto extintivo’; a presunção de cumprimento, ‘verdadeiro ‘favor debitoris, não se baseia, como a prescrição extintiva, na inércia do devedor e, em rigor, em razões de certeza jurídica, mas no pressuposto de que, em atenção à conformação (binómio sujeitos-conteúdo) de certas obrigações e aos usos do tráfico jurídico, o credor é célere na reclamação do crédito e o devedor cumpre num prazo breve, sem exigir, ou pelo menos, guardar por muito tempo o respectivo documento de quitação’[4] (os créditos previstos nas situações tipificadas dos artigos 316º e 317º do CC são normalmente reclamados a curto prazo pelo credor, uma vez que resultam da sua actividade profissional, da qual vive, sendo também em regra, satisfeitos com prontidão pelo devedor, por corresponderem, as mais das vezes, a necessidades repetidas da vida quotidiana[5], concernindo a obrigações usualmente satisfeitas sem que, em regra, se exija recibo de quitação ou se conserve um tal documento por muito tempo – a lei presume, em tais casos, e face ao decurso de determinado período temporal sobre o nascimento da obrigação, que o pagamento foi efectuado pelo devedor, dispensando-o da sua prova, já que esta poderia ser-lhe difícil ou até impossível, dada a ausência de documento de quitação, quer pela sua não emissão, quer pela circunstância de tal documento não ter sido conservado[6]).
O decurso do período temporal legalmente previsto implica (quanto aos créditos sujeitos à prescrição presuntiva) se infira o cumprimento da obrigação a que o devedor estava adstrito: decorrido o prazo legal a lei presume que o pagamento está efectuado (em atenção à circunstância de, por via de regra – face à normalidade das coisas e à experiência da vida – não ser exigível quitação ou, pelo menos, não ser o recibo ou documento de quitação conservado pelo devedor durante muito tempo[7]), dispensando o devedor da respectiva prova – o direito (crédito) não se extingue com o decurso do prazo, como nas prescrições extintivas (ao beneficiário da prescrição presuntiva a lei não faculta a recusa do cumprimento da prestação ou a oposição ao exercício do direito prescrito), estabelecendo a lei unicamente uma presunção iuris tantum de que o devedor realizou a prestação a seu cargo (ou seja, as prescrições presuntivas protegem-no ‘da dificuldade de prova do pagamento’ de ‘obrigações que costumam ser pagas em prazo bastante curto e em relação às quais não é costume exigir recibo de quitação’ ou em que um tal documento não é usualmente conservado por muito tempo’, dispensando-o da prova do cumprimento, que de acordo com as regras gerais da repartição do ónus de prova lhe caberia, nos termos do art. 342º, nº 1 do CC, deslocando-se o ónus de prova do não pagamento para o credor[8]).
Presunção de cumprimento pelo decurso do prazo que só pode ser ilidida por confissão do devedor originário (art. 313º do CC)[9] – atento o seu fundamento (proteger o devedor contra o risco de satisfazer duas vezes dívidas de que não é usual exigir recibo ou guardá-lo durante muito tempo), ‘não poderia admitir-se que o credor contrariasse a presunção de pagamento com quaisquer meios de prova’, exigindo-se por isso que os meios de prova do não pagamento provenham do devedor[10]; o credor, contra o que resultaria das regras gerais das presunções iuris tantum (art. 350º, nº 2 do CC), ‘não pode ilidir a presunção provando que, afinal, o devedor nada pagou’, pois que apenas o ‘próprio devedor, caindo em si, o poderá fazer’ por confissão[11].
Dispensa de prova do cumprimento (porque legalmente presumido) que pretende salvaguardar o devedor da dificuldade ou impossibilidade de prova, dada a ausência (em regra) de documentação de quitação (quer pela sua não emissão, quer pela circunstância de tal documento não ter sido conservado)[12].
Deve, pois, reconhecer-se que ‘o objectivo da lei ao estabelecer as prescrições presuntivas é tão só o de estabelecer um necessário equilíbrio na repartição do ónus de prova – não tem em vista alcançar um qualquer propósito discricionário de fazer pender o fiel da balança para um dos lados da relação jurídica controvertida, mas antes, certamente inspirado na teoria das normas que preside ao estabelecimento das regras da repartição do ónus da prova (assente na relação entre regra e excepção, presente no direito substantivo, ao prever e regular em termos gerais e abstractos as diversas ocorrências da vida real), determinar que aquilo que seja regra na vida real seja também tido por regra (e não excepção) no âmbito da realização do direito, assim obstando a que a aplicação da regra geral sobre o ónus da prova (art. 342º, nº 1 e 2 do CC) fizesse impender sobre o devedor o ónus de provar o cumprimento de obrigação que as regras da normalidade do comércio jurídico têm por efectuado (e de acordo com as quais se reconhece ser difícil ao devedor a sua demonstração, quer porque não é normal a exigência e emissão de recibo de quitação, quer porque não é normal que, emitido um tal recibo, ele seja conservado durante muito tempo)’[13].
O ‘escopo e finalidade (razão de ser) das prescrições presuntivas encontra-se, assim, na protecção do devedor contra o risco de satisfazer duas vezes dívidas de que não é usual exigir recibo ou guardá-lo durante muito tempo[14] – foi precisamente ‘para valer ao devedor de dívidas que costumam ser pagas rapidamente e de cujo pagamento não é habitual cobrar recibo que as prescrições presuntivas foram criadas[15]’.[16]
Em consideração a esta sua ratio, a jurisprudência dominante tem vindo a entender não ser a prescrição presuntiva compatível com ‘atividades (p. ex., certas empreitadas duradouras de construção civil ou prestação de serviços de limpeza a condomínios) que geram créditos cuja natureza não favorece a tutela dos débitos correspetivos’[17] – corrente jurisprudencial que, v. g., rejeita a aplicabilidade da presunção de cumprimento constante da alínea b) do art. 317º do CC aos créditos das empreitadas realizadas em imóveis[18] (pois nestes contratos nem é usual o pagamento imediato ou em curto prazo – a maioria das vezes o pagamento é feito em prestações espaçadas no tempo –, nem é usual que o devedor não exija e conserve documento de quitação, desde logo face aos valores implicados).
Justifica-se assim se considere não ser aplicável o regime da prescrição presuntiva quando esteja subjacente ao crédito judicialmente exigido uma obrigação relativamente à qual é usual, contra o pagamento, emitir-se documento de quitação e bem assim quando é expectável (quer porque é usual e regra, quer porque é dever legal) que o devedor proceda à guarda e conservação de tal recibo de quitação – designadamente em casos em que o devedor deve ter a preocupação de exigir o recibo comprovativo do pagamento e de o conservar no seu arquivo contabilístico, mais ou menos organizado.
Os comerciantes (como é o caso das sociedades comerciais – art. 13º, nº 2 do Código Comercial) são especialmente obrigados a ter escrituração mercantil (nº 2 do art. 18º do Código Comercial), estando as sociedades comerciais obrigadas a manter escrituração organizada, fiável e verdadeira (veja-se o art. 64º do Código das Sociedades Comerciais) – a escrituração destina-se a espelhar, retratar e revelar as operações realizadas pela sociedade na prossecução do seu objecto social (os negócios realizados, os pagamentos efectuados e/ou recebidos, etc.), servindo não só interesses próprios (permitindo analisar, de forma consistente e segura, os resultados obtidos e comprovar todas as operações realizadas – mormente o cumprimento das suas obrigações perante os seus credores) mas também o interesse de quem contrata com o comerciante ou com a sociedade comercial, pois serve de fundamento e demonstração a eventuais reclamações de quem se sinta lesado (a escrituração faculta informações relevantes e decisivas), para lá de servir o interesse geral do público (faculta ao Estado a possibilidade de actuar com fins de polícia, de fiscalização ou de supervisão)[19].
Precisamente porque é de todo em todo inadmissível (por desconforme aos comandos legais de manutenção de escrituração ou contabilidade organizada – essencial ao cumprimento da obrigação de prestar contas, estabelecida nos arts. 65º a 70º do Código das Sociedades Comerciais) que uma sociedade comercial (anónima, como é o caso da apelante) desenvolva o seu giro comercial sem dispor de contabilidade organizada (de escrituração) e, assim, dos meios documentais, mantidos em arquivo, que facilmente demonstram as operações em que intervenha perante terceiros (designadamente dos pagamentos feitos a fornecedores e a quem presta serviços necessários ao exercício da sua actividade), não faz sentido aplicar-se a presunção de cumprimento relativamente a créditos de que seja titular passivo uma sociedade anónima e respeitantes a serviços que lhe sejam prestados por profissionais liberais[20].
A inaplicabilidade do regime da prescrição presuntiva em tal circunstância assenta na consideração de que nenhuma tutela especial demanda o devedor, pois não corre o risco de ter de cumprir duas vezes (por estar impedido de comprovar, com o documento de quitação, a satisfação da obrigação) – nestes casos o devedor não tem qualquer dificuldade de prova do pagamento, pois que é legalmente exigido à sociedade comercial que conserve em arquivo da sua contabilidade os recibos de quitação concernentes aos pagamentos feitos no exercício da sua actividade.
De concluir, assim[21] – cumprindo o desiderato exigido à jurisprudência (a jurisprudência, enquanto ‘ciência interpretativa, encerra em si pensamento normativo de realização do direito, correspondente às expectativas prático-sociais dos sujeitos, realizando o direito na solução do caso concreto com a consciência jurídica geral, com as expectativas jurídico-sociais de validade e justiça’, pois só ‘assim a justiça será o fundamento necessário da interpretação jurídica’[22]), interpretando a ‘norma em referência à unidade do sistema jurídico (art. 9º, nº 1 do Código Civil), frente ao «Princípio da coerência valorativa ou axiológica da ordem jurídica»’, uma unidade ‘intrinsecamente coerente a ser interpretada em projecção da ideia de direito, tradutora de uma concebida ordem social justa, que a fundamenta’, sempre cuidando de evitar solução injusta no resultado (solução injusta no resultado que não pode ser entendida como vontade da lei – art. 9º, nº 3 do Código Civil) e, acima de tudo, na aplicação dialética do facto à norma, atender, mais do que à ratio legis, à ratio iuris[23] –, que não beneficia da presunção de cumprimento estabelecida no art. 317º, c) do CC o devedor sociedade comercial que, possuindo (por imposição da lei) contabilidade organizada, tem o dever de registar e manter em arquivo os pagamentos efectuados[24]. O entendimento contrário representaria uma intolerável (atentas as expectativas jurídico-sociais de validade e justiça) concessão à introdução de desproporção e desequilíbrio nas regras da repartição do ónus de prova (com perversos resultados na aplicação da justiça) – inverter-se-ia o ónus da prova favorecendo, injustificadamente, devedor que de tal ajuda não necessita.
Não beneficia, pois, a apelada (sociedade anónima, legalmente obrigada a possuir contabilidade organizada e a registar e manter em arquivo os pagamentos efectuados) da presunção de cumprimento estabelecida no art. 317º, c) do CC.
B. Do direito da apelante a haver da apelada as quantias peticionadas.
Não beneficiando a apelada da presunção de cumprimento (e ficando, por isso, prejudicado apreciar do afastamento de tal presunção, à luz do art. 314º do CC), incumbe-lhe a prova do pagamento, nos termos do art. 342º, nº 2 do CC – o cumprimento (a satisfação da prestação a que o devedor está vinculado – art. 762º do CC) é facto extintivo da obrigação (é o modo paradigmático de extinção da obrigação).
Cumprimento que a apelada, alegando-o, não logrou provar.
Tem assim a apelante o direito a haver os honorários correspondentes aos serviços prestados à apelada – a apelante, que exerce a actividade de arquitecta, foi contratada pela apelada com vista à realização do projecto de arquitectura relativo à construção de moradia (elaboração e execução das diferentes fases) e, também, para apresentar junto de Câmara Municipal um pedido de alteração do PDM, mediante a obrigação, a cargo da apelada, de pagar honorários: vinculação negocial que se configura como contrato de prestação de serviços inominado ou atípico (art. 1154º do CC), já que a prestação a cargo da apelante se traduziu no resultado ou produto de um trabalho intelectual, e não em qualquer obra ou resultado material; contrato inominado ou atípico, não expressamente regulado na lei, sendo-lhe aplicáveis, com as necessárias adaptações, as disposições sobre o contrato de mandato[25]; trata-se de contrato oneroso (pois acordada retribuição – resultaria a onerosidade também da presunção prevista no art. 1158º, nº 1 do CC, pois que o contrato teve por objecto actos que a apelante pratica como profissão), impendendo sobre a apelada a obrigação de pagar a retribuição (arts. 1154º, 1156º, 1158º e, mais expressamente, o art. 1167º, b), todos do CC), assistindo, por contraponto, à apelante, o direito de exigir judicialmente o respectivo pagamento (art. 817º do CC), no montante peticionado (tal valor foi aceite nos articulados – a demandada aceitou-o, invocando ter procedido ao pagamento).
Porque se trata de obrigação pecuniária tem a apelante o direito a haver da apelada os juros de mora, a contar da citação (interpretando o pedido, conclui-se que apenas a partir dessa data são pedidos – a autora pede os honorários, a acrescer dos juros, reportando-se a juros vincendos e não a quaisquer juros vencidos), nos termos dos art. 804º, nº 1, 805º, nº 1 e 806º, nº 1 do CC, calculados à taxa legal (art. 559º do CC e Portaria 291/2003, de 8/04), até integral pagamento.
C. Síntese decisória.
Atento o exposto, procede o recurso, podendo sintetizar-se a argumentação decisória (nº 7 do art. 663º do CPC) nas seguintes proposições:
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DECISÃO
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Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção cível em julgar procedente a apelação e, em consequência, revogando a decisão recorrida, em condenar a apelada a pagar à apelante a quantia de 12.109,19€ (doze mil cento e nove euros e dezanove cêntimos), acrescida de juros desde a citação e até integral pagamento, à taxa legal.
Custas (da acção e da apelação) pela apelante.
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Porto, 7/02/2023
João Ramos Lopes
Rui Moreira
João Diogo Rodrigues

(por opção do signatário, o presente texto não obedece às regras do novo acordo ortográfico, salvo quanto às transcrições/citações, que mantêm a ortografia de origem)
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[1] Questão que o relator do presente tratou no acórdão desta Relação de 23/02/2012, publicado no sítio www.dgsi.pt, sendo que se seguirá de perto a linha argumentativa ali expendida – ainda que actualizando-a (ao nível doutrinal e jurisprudencial) e reforçando-a.
[2] José Dias Marques, Prescrição Extintiva, 1953, p. 49.
[3] Acórdão da Relação do Porto de 13/9/2018 (Araújo de Barros), no sítio www.dgsi.pt.
[4] José Brandão Proença, in Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Editora (coordenação de Luís Carvalho Fernandes e José Brandão Proença), nota I ao artigo 312º do CC, pp. 758/759.
[5] Sousa Ribeiro, Prescrições Presuntivas, Revista de Direito e Economia, Ano V, nº 2, p. 393.
[6] Vaz Serra, Prescrição Extintiva e Caducidade, BMJ 106, p. 45 e in RLJ, Ano 103, p. 254 e RLJ, Ano 109, p. 246.
[7] Almeida Costa, Direito das Obrigações, 4ª edição, p. 795.
[8] Acórdão do STJ de 9/02/2010 (Garcia Calejo), no sítio www.dgsi.pt.
[9] Presunção por isso referida como ‘sui generis’ – Raquel Rei, As Prescrições Presuntivas’, separata de Francisco Salgado Zenha - Liber Amicorum, 2003, p. 627, apud José Brandão Proença, in Comentário ao Código Civil (…), p. 760.
[10] P. ex., Pires de Lima e Antunes Varela (com a colaboração de Henrique Mesquita), Código Civil Anotado, Volume I, 3ª edição revista e actualizada, p. 280.
[11] António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, V, Parte Geral (Legitimidade, representação, prescrição, abuso do direito, colisão de direitos, tutela privada e provas), 2011 (2ª reimpressão da edição de Maio/2005), p. 181.
[12] Vaz Serra, Prescrição Extintiva e Caducidade, BMJ 106, p. 45 e in RLJ, Ano 103, p. 254 e RLJ, Ano 109, p. 246.
[13] Cfr. o citado acórdão da Relação do Porto de 23/02/2012, cuja argumentação se vem seguindo de perto.
[14] A. Varela, RLJ, Ano 103, p. 254; e Almeida Costa, Direito das Obrigações (…), p. 795.
[15] Vaz Serra, Prescrição Extintiva e Caducidade, BMJ 106, p. 51.
[16] Cfr., ainda, o citado da Relação do Porto de 23/02/2012.
[17] José Brandão Proença, in Comentário ao Código Civil (…), p. 765.
[18] Cfr., v. g., acórdão da Relação do Porto de 15/04/2004 (Fernando Batista), acórdãos da Relação de Lisboa de 23/02/2006 (Gil Roque), de 18/05/2006 (Ferreira Lopes) e de 16/07/2009 (Sousa Pinto), acórdão da Relação de Coimbra de 29/04/2008 (Ferreira Barros) e acórdãos do STJ de 8/05/2013 (Moreira Alves) e de 29/11/2016 (João Camilo), todos no sítio www.dgsi.pt.
[19] Sobre a questão, Menezes Cordeiro, Manual de Direito Comercial, Vol. I, pp. 297 e 298 e J. Pires Cardoso, Noções de Direito Comercial, p. 114.
[20] Acórdão da Relação de Lisboa de 27/06/2017 (Luís Espírito Santo), no sítio www.dgsi.pt (a citação aqui feita reporta-se à nota 4 do aresto).
[21] Não se desconhece jurisprudência dissonante - p. ex., os acórdãos da Relação de Lisboa de 11/07/2019 (Pedro Martins) e da Relação de Guimarães de 28/09/2017 (Beça Pereira), no sítio www.dgsi.pt.
[22] Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 1/99, de 12/01/1999, publicado no DR de 13/02/1999.
[23] Ainda o citado AUJ nº 1/99, de 12/01/1999.
[24] Assim também os acórdãos da Relação de Lisboa de 21/11/2013 (Vítor Amaral), da Relação de Coimbra de 20/02/2019 (Fonte Ramos) e da Relação do Porto de 8/06/2022 (Eugénia Cunha) e o acórdão do STJ de do STJ de 14/01/2014 (Salreta Pereira), todos no sítio www.dgsi.pt.
[25] Cfr. J. Baptista Machado, in RLJ, Ano 118, pp. 277 e 278, onde afirma que o contrato de elaboração de estudos e projectos de arquitectura é um contrato de prestação de serviço, atípico ou inominado, no qual as prestações típicas são o resultado ou produto de um trabalho intelectual, não uma obra ou resultado material, questionando porém se o seu regime deve ser mais próximo do mandato ou, sob certos aspectos, mais próximo da empreitada (defendendo aí a aplicação do regime da empreitada, com as devidas adaptações no que concerne à responsabilidade por defeitos da obra, à impossibilidade de execução e à desistência do dono da obra) – questão que, à economia da decisão não interessa aprofundar.