Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
22967/17.0T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MIGUEL BALDAIA DE MORAIS
Descritores: PROCESSO DE REGULAÇÃO DE RESPONSABILIDADES PARENTAIS
RESIDÊNCIA DO MENOR
SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA
Nº do Documento: RP2019012122967/17.0T8PRT.P1
Data do Acordão: 01/21/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ªSECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º688, FLS.92-99)
Área Temática: .
Sumário: I - Sob o ponto de vista legal, designadamente à luz do disposto no nº 7 do artigo 1906º do Código Civil, nada obstaculiza a que, paralelamente com o exercício conjunto das responsabilidades parentais, se fixe um regime de alternância de residência.
II - É possível estabelecer o regime da residência alternada mesmo contra a vontade dos progenitores, desde que essa solução se revele como a mais adequada ao interesse da criança de manter uma relação o mais próxima possível com ambos os progenitores, de molde a que possa usufruir em pleno, e em termos paritários, do afeto, apoio e segurança que cada um deles lhe pode proporcionar.
III - Havendo disponibilidade e condições de ordem prática e psicológica de ambos os progenitores, e não havendo circunstâncias concretas que o desaconselhem (como, por exemplo, famílias com histórico de violência doméstica ou quando os progenitores residam em localidades distantes uma da outra), a residência alternada é a solução com melhor aptidão para preservar as relações de facto, proximidade e confiança que ligam o filho a ambos os progenitores, sem dar preferência à sua relação com um deles, em detrimento do outro, o que concorrerá para o desenvolvimento são e equilibrado do menor e melhor viabilizará o cumprimento, por estes últimos, das suas responsabilidades parentais.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 22967/17.0T8PRT.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Porto – Juízo de Família e Menores, Juiz 2
Relator: Miguel Baldaia Morais
1º Adjunto Des. Jorge Miguel Seabra
2ª Adjunta Desª. Maria de Fátima Andrade
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Sumário
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
I- RELATÓRIO
O Ministério Público veio requer a regulação do exercício das responsabilidades parentais relativamente ao menor B…, sendo requeridos os respectivos progenitores, C… e D….
Após citação dos requeridos teve lugar conferência de pais, em 14 Dezembro de 2017, sendo então estabelecido um regime provisório, no qual, para além do mais, se fixou a residência do menor junto dos progenitores, de forma alternada, por períodos de três noites consecutivas. Nessa ocasião foram estes remetidos para a mediação familiar, a qual não se iniciou por falta de adesão da progenitora.
Ambos os progenitores apresentaram alegações, pugnando o pai pela manutenção do regime de guarda partilhada com residência alternada, enquanto a mãe preconizou a alteração desse regime, de molde a que o menor fique a residir exclusivamente consigo, estipulando-se um regime de visitas pelo pai.
Realizou-se audiência de julgamento, com observância do formalismo legal, vindo a ser proferida sentença na qual se decidiu:
«a) Fixar a residência da criança, alternadamente com cada um dos progenitores, em períodos de 3 dias seguidos, mantendo-se a alternância nos termos do regime provisório em vigor;
b) Para efeitos fiscais, de saúde (SNS) e educação (escolha de escola pública) deverá considerar-se a residência da criança como sendo a da progenitora;
c) A criança passará, alternadamente, a véspera e o dia de Natal com cada um dos progenitores, iniciando-se a véspera com o progenitor e o dia com a progenitora, em horários a combinar entre os progenitores, mas por forma a que almoce com o progenitor com quem passar o dia;
d) O mesmo acontecendo com a véspera e o dia do Ano Novo, iniciando-se este ano a véspera com a progenitora, e o dia com o progenitor, em horários a combinar entre os progenitores, mas por forma a que almoce com o progenitor no dia de Ano Novo;
e) No dia do seu aniversário a criança tomará, com cada um dos progenitores, uma das refeições principais, devendo pernoitar em casa do progenitor com quem jantar;
f) A criança passará o dia de aniversário de cada um dos progenitores, bem como os dias do Pai e da Mãe com o respectivo aniversariante, e com ele pernoitando;
g) Nas férias escolares do Verão, e sem prejuízo do regime ora fixado, a criança estará com cada um dos progenitores dois períodos de 8 dias seguidos, devendo as datas serem comunicadas pelos progenitores, um ao outro, até ao dia 31 de Maio de cada ano. Em caso de falta de acordo nos anos ímpares prevalecerá a escolha da mãe, e nos anos pares a escolha do pai;
h) Sempre que coincidir com dias em que o infantário esteja a funcionar, as entregas e recolhas terão lugar no mesmo;
i) Quanto as entregas coincidam com dias em que o infantário não esteja a funcionar, as entregas terão lugar na residência do progenitor que deva receber a criança, e pelo progenitor que a tenha consigo, sempre pelas 19h00 dos respectivos dias;
j) Cada um dos progenitores assegurará as despesas com o filho, nos dias em que este se encontrar aos seus cuidados;
k) Mais dividirão, na proporção de 2/3 (progenitora) e 1/3 (progenitor), em partes iguais, as despesas extraordinárias de saúde, na parte não comparticipada, sempre mediante apresentação dos respectivos comprovativos;
l) Bem como a mensalidade dos estabelecimentos de ensino privados que a criança frequentar, na mesma proporção de 2/3 para a progenitora e 1/3 para o progenitor, atenta a diferença de rendimentos, devendo os pagamentos serem realizados directamente no estabelecimento de ensino em causa pela progenitora, devendo o progenitor proceder ao pagamento à progenitora do montante a seu cargo, até ao último dia do mês a que disser respeito;
m) Que todas as despesas extraordinárias de educação – livros, material escolar, por um lado, e explicações, centros de estudo (quando existirem) e actividades extracurriculares (desde que acordadas entre ambos, no que se refere a estas três questões), serão divididas entre os progenitores, em partes iguais, sempre mediante a apresentação dos respectivos comprovativos».
Não se conformando com o assim decidido, veio a progenitora interpor o presente recurso, o qual foi admitido como apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes
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4. FUNDAMENTOS DE DIREITO
Nos presentes autos o tribunal de 1ª instância decidiu - primeiramente a título provisório[1] e depois a título definitivo - regular o exercício das responsabilidades parentais relativamente ao menor B… (nascido no dia 5 de fevereiro de 2016) fixando, para além do mais, a residência deste com ambos os progenitores, de forma alternada, por períodos de três noites consecutivas.
A apelante rebela-se contra esse segmento decisório por considerar que, sendo a relação entre os progenitores conflituosa e dada a tenra idade do menor, a residência alternada não é o regime adequado ao caso concreto, posto que o B… necessita de regras, estabilidade e rotinas que a residência alternada não possibilita que sejam implementadas eficazmente, preconizando, por isso, que o menor fique a residir exclusivamente consigo por apresentar melhores condições para dele cuidar a tempo inteiro.
Que dizer?
É facto que, sob o ponto de vista legal (designadamente à luz do disposto no nº 7 do art. 1906º do Cód. Civil, na redação que lhe foi dada pela Lei nº 61/2008, de 31.10[2]), nada obstaculiza a que, paralelamente ao exercício conjunto das responsabilidades parentais, se fixe à criança uma residência alternada.
Malgrado a admissibilidade legal da fixação desse regime de residência, não se vem, contudo, registando consenso na jurisprudência relativamente aos requisitos que devem presidir ao seu decretamento. Assim, uma das correntes que se formou (sobretudo, logo após a entrada em vigor da citada Lei nº 61/2008, de 31.10) sustenta que havendo desacordo dos pais, ou animosidade entre eles, esse regime de residência não pode ser fixado[3]; um outro posicionamento, que ultimamente se vem perfilando como majoritário, tem-se pronunciado no sentido da desnecessidade de acordo dos progenitores e da irrelevância do princípio da existência de um qualquer litígio entre eles[4].
Idêntica divergência se verifica na doutrina pátria, ora sustentando-se a necessidade de acordo dos progenitores e inexistência de conflito entre os mesmos[5], ora advogando-se que a residência alternada é possível mesmo contra a vontade dos progenitores e da existência de conflito entre eles, contanto que essa solução se revele a mais adequada à satisfação do superior interesse da criança[6].
Os sequazes dos posicionamentos em confronto têm esgrimido diversos argumentos em sustentação da respectiva tese[7], que vão desde considerar que um regime de alternância de residência se revela desajustado no que respeita à consolidação dos hábitos, valores, e ideias na mente do menor, com prejuízo para a formação da sua personalidade, sobretudo em crianças de tenra idade, face ao revezamento sistemático entre casas e pais, com padrões de vida diferentes, saindo o mesmo “prejudicado” em resultado das separações repetidas relativamente a cada um dos seus progenitores, causadas pela constante mudança de residência[8]. Por outro lado, tem sido defendido que a residência alternada possibilita, se os progenitores souberem aproveitar as virtualidades desse regime de residência, que o filho volte a ter com os progenitores uma relação o mais próximo possível da que com eles mantinha antes da separação, evitando, desse modo, quebrar a relação afectiva que antes tinha com ambos, acrescentando-se ainda que o objectivo de fixar responsabilidades parentais não deve (salvo se se registarem situações que objectivamente o justifiquem) ser escolher um dos progenitores, mas antes verificar as potencialidades dos dois e organizar a nova relação entre eles e o filho.
Os referidos posicionamentos são, em grande medida, recuperados no âmbito do presente recurso pelos progenitores, sufragando a apelante na sua argumentação recursória a tese que preconiza a necessidade de acordo entre os pais e de inexistência de conflito entre eles, enquanto o progenitor, nas contra-alegações que apresentou, envereda antes pela tese contrária.
Procurando tomar posição nesta contenda, vejamos, antes do mais, o contributo que nos é trazido pela lei substantiva, a qual, no nº 5 do já citado art. 1906º do Cód. Civil (aplicável in casu por mor do disposto no nº 2 do art. 1911º do mesmo diploma legal, dado que, no ínterim, cessou a convivência entre os progenitores do menor, que coabitavam em união de facto), dispõe que “[O] tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro”. Por seu turno, acrescenta o nº 7 do mesmo normativo que “[O] Tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles”.
A exegese dos transcritos incisos normativos aponta, na leitura que deles fazemos, no sentido de que é possível estabelecer o regime da residência alternada mesmo contra a vontade dos progenitores, desde que essa solução se revele como a mais adequada ao interesse da criança (que a lei estabelece como critério primeiro a atender na fixação da residência) de manter uma relação o mais próxima possível com ambos os progenitores, de molde a que possa usufruir em pleno, e em termos paritários, do afeto, apoio e segurança que cada um deles lhe podem proporcionar.
Essa solução da residência alternada tem vindo a ganhar força pela consciência de que os laços afectivos se constroem dia-a-dia e não se compadecem com o tradicional regime de fins-de-semana quinzenais, sendo igualmente posto em evidência[9] que a fixação da residência junto de um só dos progenitores leva ao progressivo esbatimento da relação afectiva com o outro progenitor, fazendo com que o menor se sinta uma mera visita em casa deste e levando a que o progenitor não guardião desista de investir na relação por se sentir excluído do dia-a-dia da criança.
Com efeito, embora seja natural que a residência alternada crie alguma desestabilização nas rotinas e horários da criança, essa desestabilização resulta, em primeiro lugar, da separação e dificilmente será afastada pela fixação da residência apenas com um dos progenitores. Além disso, muito mais importante que a manutenção das rotinas e horários, já prejudicados pela separação, é a manutenção de uma relação emocional próxima com ambos os progenitores, que a residência apenas com um deles irá prejudicar irremediavelmente.
Daí que havendo disponibilidade e condições de ordem prática e psicológica de ambos os progenitores, e não havendo circunstâncias concretas que o desaconselhem (como, por exemplo, famílias com histórico de violência doméstica ou quando os progenitores residam em localidades distantes uma da outra), a residência alternada vem sendo ultimamente[10] considerada a solução com melhor aptidão para preservar as relações de facto, proximidade e confiança que ligam o filho a ambos os progenitores, sem dar preferência à sua relação com um deles, em detrimento do outro, o que concorrerá para o desenvolvimento são e equilibrado do menor e melhor viabilizará o cumprimento, por estes últimos, das suas responsabilidades parentais. Somente assim se assegurará a ambos os progenitores um envolvimento continuado nos cuidados, na educação e na vida quotidiana do seu filho, numa verdadeira situação de co-parentalidade.
Esta solução tem, aliás, obtido acolhimento em diversos instrumentos normativos internacionais de que constituem exemplo a Convenção sobre os Direitos das Crianças (art. 18º), os Princípios do Direito Europeu da Família relativos às responsabilidades parentais (cfr. 2º do princípio 3:20) e a Resolução 2079 da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, adotada a 2 de outubro de 2015 (cfr. § 2º, 3º e 5.5, onde recomenda aos Estados-membros “[I]ntroduzir na sua legislação o princípio da residência alternada depois da separação, limitando as exceções aos caos de abuso infantil ou negligência, ou violência doméstica, ajustando o tempo em que a criança vive na residência de cada progenitor em função das suas necessidades e interesses”).
Revertendo ao caso em apreço, na resolução da questão que é submetida à apreciação deste Tribunal de recurso, temos como circunstâncias relevantes a atender para efeito de determinação do regime de residência que melhor satisfaça o interesse do B…, o facto de este (que, a breve trecho, completará três anos de idade) desde o seu nascimento ter convivido sempre com ambos os progenitores, inicialmente na mesma casa e após a separação dos pais (o que, conforme consta da ata que ficou a documentar a conferência de progenitores que se realizou em 14 de dezembro de 2017, ocorreu cerca de um mês e meio antes dessa data) e até ao presente residindo na casa de cada um deles, por períodos de três noites consecutivas.
Haverá ainda que atentar que as residências dos progenitores são geograficamente próximas, encontrando-se igualmente próximas do estabelecimento de ensino que o B… frequenta, o que, naturalmente, favorece o seu contacto com ambos os progenitores.
De igual modo, o tecido fáctico apurado revela que o menor mantém uma efectiva vinculação com ambos os progenitores.
Da ponderação dos descritos factores, afigura-se-nos que deve ser mantida a residência alternada, nos moldes estabelecidos no ato decisório sob censura, posto que essa solução tem permitido que o B… mantenha uma relação muito próxima com ambos os progenitores (permanecendo com cada um deles sensivelmente o mesmo tempo), o que, tal como emerge da materialidade apurada, se vem revelando profícuo para o seu desenvolvimento, sendo que ambos os progenitores têm revelado motivação, disponibilidade e capacidade para acompanhar o filho no seu crescimento, existindo entre eles fortes laços afectivos que se devem procurar preservar tanto quanto possível. Aliás, como se referiu, desde o seu nascimento o B… tem residido sempre com ambos os progenitores, pelo que, nessas circunstâncias, uma (eventual) nova alteração no modo de vida e da relação com os progenitores, expectavelmente, potenciaria um acréscimo de instabilidade e, nessa medida, seria contrária ao seu superior interesse.
De facto, como a este respeito salienta a pedopsiquiatra ANA VASCONCELOS[11], “a residência alternada permite que os pais continuem a dividir atribuições, responsabilidades e tomadas de decisões em iguais condições, reconhecendo as suas diferenças e limitações bem como o valor do papel de cada um para com a criança. Esta diferença clara e coerente de papéis materno e paterno é fundamental para o saudável crescimento dos filhos pois permite uma estruturante identificação aos modelos parentais, fundamental para um normal desenvolvimento de sua identidade pessoal”, acrescentando, mais adiante[12], que “a guarda partilhada com residência alternada será mesmo a solução natural quando a criança tem um convívio normal com ambos os progenitores, no âmbito do que se designa por relação positiva com ambos os progenitores: este tipo de relação é a que se encontra na maioria das situações das crianças cujos pais já não vivem ou nunca viveram maritalmente, em que valorizam a relação com ambos os seus progenitores e claramente desejam partilhar o seu convívio com os dois, de um modo significativo e, muitas vezes, em tempo igual”.
Acresce que, ao invés do entendimento sustentado pela apelante, a estabilidade e rotinas necessárias ao equilibrado desenvolvimento do B… também poderão ser alcançadas vivendo este com o pai e com a mãe em regime de residência alternada, facilmente se habituando (sendo que, até ao momento, os autos nada revelam em contrário), até pela sua tenra idade, a ter duas casas, sendo que os seus sentimentos de estabilidade e segurança sairão reforçados com o convívio e partilha de afeto, de forma assídua e paritária, com ambos os progenitores como vem sucedendo até à data, não podendo, assim, falar-se com propriedade na existência de um progenitor que constitua a única figura primária de referência.
De igual modo, nada existe que, de forma objectiva, se oponha a essa solução a não ser a discordância dos progenitores sobre a questão e a conflitualidade que existe entre ambos (que, na essência, se tem traduzido no uso de impropérios por banda do progenitor no seu relacionamento com a ora apelante), factores estes que, ainda assim, não se erigem como obstaculizantes da residência alternada. Aliás, neste conspecto, não será despiciendo convocar os contributos que nesta matéria têm sido aportados pela praxis judiciária, de que nos dá nota JOAQUIM MANUEL SILVA[13], que permitem comprovar que “a residência partilhada favorece o atenuar do conflito entre os progenitores: colocando-os em condições de igualdade, levará precisamente a que, qualquer um deles, como tem por contraponto um período de tempo em que o menor estará longe de si e entregue ao outro, terá todo o interesse em facilitar ao outro os contactos com o menor no período em que é ele a deter a guarda, precisamente porque é isso que espera e deseja que lhe seja proporcionado quando o menor está com o outro”.
Como assim, na presença do descrito quadro, afigura-se-nos que o caso em apreço será precisamente um daqueles em que o regime de residência alternada surge como perfeitamente adequado, porquanto é aquele que, nesta oportunidade temporal e tendo em atenção todas as circunstâncias que se mostram pertinentes e objetivamente atendíveis, se revela em concreto como a melhor solução para o desenvolvimento harmonioso do B… e que vai de encontro à satisfação do seu superior interesse.
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III- DISPOSITIVO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em:
julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida procedente;
determinar o desentranhamento e a devolução às partes dos documentos que ofereceram na alegação e contra-alegação, condenando cada uma delas na multa de uma Uc pelo incidente a que deram causa.
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Custas do recurso a cargo da apelante.
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Porto, 21.01.2019
Miguel Baldaia de Morais
Jorge Seabra
Fátima Andrade
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[1] Na conferência de progenitores, que teve lugar no dia 14 de dezembro de 2017, foi estabelecido regime provisório nos seguintes termos:
a) A residência da criança é fixada junto dos progenitores, de forma alternada, por períodos de 3 noites consecutivas, com início no dia de amanhã com o progenitor;
b) Sempre que coincidir com dias em que o infantário esteja a funcionar, as entregas e recolhas terão lugar no mesmo;
c) Quanto as entregas coincidam com dias em que o infantário não esteja a funcionar, as entregas terão lugar na residência do progenitor que deva receber a criança, e pelo progenitor que a tenha consigo, sempre pelas 19h00 dos respectivos dias;
d) A criança passará a véspera do Natal com a progenitora, e o dia de Natal com o progenitor, em horários a combinar entre os progenitores, mas por forma a que almoce com o pai;
e) Passando ainda a véspera do ano Novo com o progenitor, e o dia com a progenitora, em horários a combinar entre os progenitores, mas por forma a que almoce com a mãe;
f) Cada um dos progenitores assegurará as despesas com o filho, nos dias em que este se encontrar aos seus cuidados;
g) Mais dividirão, em partes iguais, as despesas de saúde, na parte não comparticipada, sempre apresentação dos respectivos comprovativos;
h) Bem como a mensalidade do infantário frequentado pela criança, nesta parte na proporção de 2/3 para a progenitora e 1/3 para o progenitor, atenta a diferença de rendimentos, devendo os pagamentos serem realizados directamente no estabelecimento de ensino em causa, ou, caso não seja possível, directamente pela progenitora, com pagamento a esta da sua parte, por parte do progenitor.
[2] Com tal alteração legislativa foi seu propósito confesso consagrar o reconhecimento da (efectiva) igualdade de direitos e deveres dos pais em relação aos filhos e de envolver, comprometendo e responsabilizando, ambos os progenitores no cumprimento dos deveres funcionais que são conteúdo da responsabilidade parental.
[3] Cfr., neste sentido e inter alia, acórdãos da Relação de Coimbra de 5.05.2009 (processo nº 530/07.3TBCVL-A.C1), da Relação de Lisboa de 7.11.2013 (processo nº 7598/12.9TBCSC-A.L1-6), de 18.03.2013 (processo nº 3500/10.0TBBRR.L1-6) e de 14.02.2015 (processo nº 1463/14.2TBCSC.L1-8) e desta Relação de 13.05.2014 (processo nº 107/08.6TBVFR-A.P1) e de 28.06.2016 (processo nº 3850/11.9TBSTS-A.P1), acessíveis em www.dgsi.pt.
[4] Cfr., por todos, acórdãos da Relação de Coimbra de 24.10.2017 (processo nº 273/13.9TBCTB-A.C1) e de 27.04.2017 (processo nº 4147/16.3T8PBL-A.C1), da Relação de Évora de 9.11.2017 (processo nº 1997/15.1T8STR.E1) e de 7.06.2018 (processo nº 4505/11.0TBPTM.E1), da Relação de Lisboa de 17.12.2015 (processo nº 6001/11.6TBCSC.L1-6) e de 24.01.2017 (processo nº 954/15.2T8AMD-A.L1-7) e da Relação de Guimarães de 2.11.2017 (processo nº 996/16.0T8BCL-C.G1), acessíveis em www.dgsi.pt.
[5] Assim, CLARA SOTTOMAYOR, in Regulação do exercício das responsabilidades parentais nos casos de divórcio, 6ª ed. revista, págs. 262 e seguintes e JOANA SALAZAR GOMES, in O superior interesse da criança e as novas formas de guarda, 2017, págs. 101 e seguintes.
[6] Neste sentido, entre outros, GUILHERME DE OLIVEIRA, A residência alternada na Lei nº 61/2008, in Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Carlos Pamplona Corte Real, 2016, JOSÉ LAMAS LEITE, in Revista do Ministério Público, nº 151 (julho-setembro de 2017), págs. 65-81 e JOAQUIM MANUEL DA SILVA, in A família das crianças na separação dos pais – A guarda compartilhada, 2016, págs. 135 e seguintes.
[7] Pode ver-se uma exaustiva análise dos respectivos argumentos no acórdão da Relação de Lisboa de 7.08.2017 (processo nº 835/17.5T8SXL-A-2), acessível em www.dgsi.pt.
[8] O que conduz, na expressão de CLARA SOTTOMAYOR (ob. citada), “a um sistema salomónico que, repartindo a criança entre ambos os pais como se de um objeto se tratasse, satisfaz os interesses dos pais, sacrificando o dos filhos”, preconizando, assim, que este tipo de regime apenas deve ser adotado nas situações em que os progenitores revelem capacidade de cooperação e de educar em conjunto a criança, capacidade de separar os seus conflitos interpessoais dos seus papéis enquanto pais e que ambos tenham com os filhos uma boa relação afectiva.
[9] Esta ideia é particularmente enfatizada nos trabalhos publicados pelo Centro de Estudos Judiciários, que versaram sobre o tema “Residência única ou residência alternada – Vantagens e inconvenientes”, que podem ser consultados no respectivo E-book, de julho de 2014.
[10] Não será, aliás, despiciendo registar, neste conspecto, as iniciativas que têm sido levadas a cabo junto da Assembleia da República por algumas instituições, – v.g,. a Associação Portuguesa para a Igualdade Parental e Direitos dos Filhos -, propondo uma alteração ao Código Civil que, de forma expressa, consagre uma partilha “mais igualitária” do tempo das crianças num contexto de divórcio ou separação dos progenitores através da consagração de uma presunção jurídica da residência alternada.
[11] Em artigo intitulado Do cérebro à empatia, Do divórcio à guarda partilhada com residência alternada, integrado no referido E-Book, pág. 10.
[12] Op. citada, pág. 11.
[13] Ob. citada, págs. 121 e seguintes, onde sublinha igualmente que «havendo conflito entre os progenitores, a residência exclusiva agrava-o, consolida-o, aumentando-o muitas vezes, gerando um grande número de abandonos, de “órfãos de pais vivos”, que, quando não ocorrem, por força da exposição da criança a este stresse tóxico, permanente e intenso, gera nelas profundos problemas de desenvolvimento emocional e cognitivo, que são na sociedade actual um problema grave de saúde».