Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | NELSON FERNANDES | ||
Descritores: | TRANSFERÊNCIA DE LOCAL DE TRABALHO PREJUÍZO SÉRIO ÓNUS DA PROVA INTERPRETAÇÃO DA CLÁUSULA CONVENÇÃO COLECTIVA DE TRABALHO | ||
Nº do Documento: | RP2019010723987/16.7T8PRT.P1 | ||
Data do Acordão: | 01/07/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
Indicações Eventuais: | 4ªSECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º287, FLS.214-241) | ||
Área Temática: | . | ||
Sumário: | I - O Código do Trabalho (2009 tutela o direito do trabalhador à prestação da sua atividade/trabalho no local convencionado, nos termos previstos nos artigos 129.º, al. f), 193.º e 194.º. II - A leitura do artigo 194.º não prescinde que se tenha presente o princípio da inamovibilidade, na justa medida em que nele se preenche uma das garantias do trabalhador, compreendendo-se facilmente que, para admitir a mudança de local do trabalho, se deva ponderar que o trabalhador, sabendo que a sua atividade está localizada, condicione muitas vezes a sua vida pessoal em função desse lugar. III - O prejuízo para o trabalhador, a que alude a alínea b) do n.º 1 do artigo 194.º, deve ser avaliado de acordo com um parâmetro de boa fé no cumprimento do contrato, impondo o dever de colaboração que o trabalhador sacrifique conveniências pouco relevantes ao interesse da empresa e, em contrapartida, que tenha de se verificar, do ponto de vista empresarial, uma razão económica, técnica, organizacional, etc. ponderosa, que justifique a mudança de local. IV - Incumbe ao empregador fazer a prova dos factos constitutivos do direito de alterar o local de trabalho do trabalhador (artigo 342º/1 CC), incumbindo por sua vez a este fazer a contraprova de que, no caso, existe um prejuízo sério, assim como provar os factos que integram este conceito, isto é, o trabalhador tem de fazer a prova dos factos impeditivos (artigo 342º, nº 2 do CC). V - Admitindo o artigo 194.º que o regime nele previsto possa ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho (n.º 6), constando de cláusula expressa, para além do mais, que “no caso de transferências definitivas, a entidade empregadora terá em atenção a expectativa geográfica que, à data da criação da D…, cada trabalhador tinha em relação à sua mobilidade geográfica e que “poderá, ainda, proceder a transferência que não se enquadre naquela expectativa, desde que desta não resulte uma deslocação entre a residência e o novo local de trabalho superior a 2 horas, em transporte público”, considerando o carácter normativo da analisada cláusula, na sua interpretação teremos de aplicar os critérios estabelecidos nos artigos 9.º e 10.º do CC, sem todavia perdermos de vista as circunstâncias em que as partes fundamentaram a decisão de contratar, como estipulado no artigo 520º, nº 2 do CT e, bem assim, que se trata de um instrumento que é decorrente de negociações entre as partes e, nessa medida, se distingue da lei, fornecendo aquelas negociações elementos relevantes para a interpretação nas respetivas cláusulas. VI - É por referência aos critérios estabelecidos nas referidas normas que importa fixar, de entre os sentidos possíveis da cláusula, qual é o seu sentido e alcance decisivo, para o que importará ter presente o elemento gramatical ou textual (a “letra da lei“) – com uma função desde logo negativa, eliminando todos os sentidos que não encontrem qualquer apoio, correspondência ou ressonância no texto –, mas sempre em necessária ligação/correspondência com o elemento lógico – pois que a interpretação gramatical tem de ser obrigatoriamente lógica –, integrado pelos elementos sistemático, racional ou teleológico (a ratio legis) e histórico. VII - O elemento gramatical ou textual (a “letra da lei“), tendo a função negativa de eliminar todos os sentidos que não encontrem no texto qualquer apoio, correspondência ou ressonância, permite afastar uma interpretação, por não nesse texto qualquer correspondência, de que apenas se pretendesse “salvaguardar a situação dos colaboradores dos D2… à data da fusão, para não serem transferidos para fora das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto” ou que “a expectativa geográfica” à data da criação da D1… fosse “para os trabalhadores oriundos da empresa D2…, as áreas metropolitanas do Porto e Lisboa, para os trabalhadores das demais empresas que se fundiram, todo o território nacional”. VIII - O texto da cláusula aponta, também, um critério objetivo, ao fazer menção expressa, mas para além já dos casos abrangidos pela “expectativa geográfica” que se quis salvaguardar na primeira parte do mesmo n.º 8 (aquela que, “à data da criação da D1…, cada trabalhador tinha em relação à sua mobilidade geográfica”), a uma duração máxima da deslocação do trabalhador até duas horas em transportes públicos, para ser possível a sua transferência definitiva de local de trabalho. | ||
Reclamações: | |||
Decisão Texto Integral: | Apelação 23.987/16.7T8PRT.P1 Autor/recorrido: B… Ré/recorrente: C…, S.A. ____________________ Relator: Nelson Fernandes 1ª Adjunta: Des. Rita Romeira 2ª Adjunta: Des. Teresa Sá Lopes Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto I - Relatório 1. B… intentou a presente ação declarativa sob a forma comum contra C…, S.A., peticionando a condenação desta a ver declarada a revogação da sua ordem de transferência de local de trabalho, a pagar-lhe todas as despesas ocasionadas com a apontada transferência, bem como uma indemnização por danos morais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, até efetivo e integral pagamento, devendo ainda a Ré ser condenada no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso no cumprimento da revogação da apontada ordem de transferência.Alegou, para tanto e em suma, que, trabalhando para a Ré, foi por esta transferido, sem o seu acordo e sem fundamento legal, de local de trabalho, o que lhe causou prejuízos sérios. 1.1 Realizada a audiência de partes e frustrada a tentativa de conciliação, foi a Ré notificada para contestar, o que esta fez, defendendo, também em síntese, que o Autor, segundo é do seu conhecimento, reside na cidade de Braga, sendo que foi no Porto (local para onde foi transferido) que a Ré encontrou funções compatíveis e adequadas ao nível de conhecimentos do Autor. 1.2 Fixado o valor da ação em €30.000.01 e saneado o processo, indicando-se ainda o objeto do litígio e bem assim os temas de prova, prosseguindo os autos os seus termos subsequentes, veio por fim a realizar-se a audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença, de cujo dispositivo consta: “Pelo exposto, julgo a presente ação totalmente procedente, por provada, e, em consequência: a) Revogo a ordem de transferência de local de trabalho dada pela R., C…, S.A., ao A., B…, e, em consequência, determino que este seja recolocado no local de trabalho que ocupava anteriormente àquela; b) Condeno a R. a pagar ao A. o montante que se vier a apurar em sede de liquidação de sentença e relativo aos encargos suportados pelo segundo com a referida ordem de transferência; c) Mais condeno a R. a pagar ao A., a título de indemnização por danos morais, a quantia de €5.000 (cinco mil euros), à qual deverão acrescer juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação, até efetivo e integral pagamento; d) Por cada dia de atraso no cumprimento do determinado em a) condeno a R. a pagar, a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia diária de €200 (duzentos euros); e) ainda condeno o A. e a R. nas custas do processo, na proporção de dez por cento para o primeiro e de noventa por cento para a segunda. Registe e notifique.” 2. Não se conformando com o assim decidido, apelou a Ré, ……………………………………………………………….. ……………………………………………………………….. ……………………………………………………………….. 2.1 Contra-alegou o Autor, ……………………………………………………………….. ……………………………………………………………….. ……………………………………………………………….. * O Tribunal recorrido deu como provados os factos seguidamente transcritos:III – Fundamentação A) Fundamentação de facto “1) A R. é uma sociedade comercial por ações que se dedica por conta própria, carácter habitual e escopo lucrativo: “1- A conceção, a construção, a gestão e a exploração de redes e infraestruturas de comunicações eletrónicas, a prestação de serviços de comunicações eletrónicas, dos serviços de transporte e difusão de sinal de telecomunicações de difusão e a atividade de televisão. 2 – A sociedade tem ainda como objeto a prestação de serviços nas áreas de tecnologias de informação, sociedade da informação, multimédia e comunicação, o desenvolvimento e a comercialização de produtos e equipamentos de comunicações eletrónicas, tecnologias de informação e comunicação, bem como a realização da atividade de comércio eletrónico, incluindo leilões on line, e ainda a prestação de serviços de formação e consultoria nas áreas que integram o seu objeto social. 3 – A sociedade poderá ainda exercer quaisquer atividades que sejam complementares, subsidiárias ou acessórias das referidas nos números anteriores, diretamente ou através da constituição ou participação em sociedades. 4 – A sociedade pode, mediante deliberação do Conselho de Administração, adquirir e alienar participações em sociedades com objeto social diferente do descrito nos números anteriores, em sociedades reguladas por leis especiais, em sociedades de responsabilidade limitada ou ilimitada, bem como associar-se com outras pessoas jurídicas para, nomeadamente, formar agrupamentos complementares de empresas, agrupamentos europeus de interesse económico, novas sociedades, consórcios e associações em participação e, bem assim, constituir ou participar em quaisquer outras formas de associação, temporária ou permanente, entre sociedades e ou entidades de direito público ou privado.”; 2) A R. incorporou por fusão a sociedade comercial por ações outrora denominada por D…, S.A., NIPC: ……….., com sede na Rua …, …, …. - … Lisboa; 3) A R. foi objeto de aquisição por parte da E…; 4) O A. é trabalhador da R., tendo sido admitido através de contrato verbal de trabalho em 3 de julho de 1973, para a categoria de Técnico de Apoio, à época, pela empresa F…, E.P., a qual foi extinta, uma vez que foi incorporada, por fusão, pela antecessora da R.; 5) O A. foi despedido na sequência de procedimento disciplinar e depois reintegrado por decisão judicial; 6) Atualmente o A. aufere um salário base de €1.248,57 e tem o seguinte horário de trabalho: de manhã das 9h até às 12h30min e da parte da tarde das 14h às 17h36min; 7) Através de comunicação datada de 24 de fevereiro de 2015 e cuja cópia consta de fls. 170, a R. notificou o A. de que na sequência de um “processo de mobilidade geográfica com vista à adequação dos recursos humanos às necessidades efetivas da empresa, e decorre das restrições impostas pelo seu novo quadro societário, relativamente a novas admissões”, aquele viria a ser, como foi, transferido do seu local de trabalho, deixando de exercer as suas funções no G…, Edifício …., no Lugar …, na cidade de Braga, para, a partir do sobredito dia 1 de abril de 2015, as passar a exercer no edifício sito na Rua …, …, na cidade do Porto; 8) O A. nunca deu o seu acordo à aludida transferência, tendo, através da interposição de uma providência cautelar não especificada para suspensão da ordem de transferência, que correu termos na 1.ª Secção de Trabalho – J2 da Instância Central de Braga, integrada na Comarca de Braga, sob o n.º de processo 1451/15.1T8BRG, e mediante a instauração de uma outra providência idêntica a esta, manifestado a sua oposição e discordância relativamente à ordenada transferência; 9) O A., até ao momento em que foi transferido para o Porto, exerceu sempre as suas funções em locais de trabalho situados na cidade de Braga, motivo pelo qual constituiu família e fixou residência nesta região, mais precisamente e inicialmente na Rua …, n.º .., …, em Braga, e subsequentemente, desde maio de 2008, no Largo …, n.º …, …. - … …, Vieira do Minho, onde reside; 10) A duração da viagem de …, em Vieira do Minho, à cidade do Porto é de cerca de três horas utilizando transportes públicos e de cerca de duas horas utilizando viatura automóvel própria; 11) O primeiro autocarro disponível para o aludido percurso parte de …, Vieira do Minho, por volta das 6h30min da manhã, chegando à cidade de Braga por volta das 7h45min (isto se inexistirem atrasos, situação que é frequente); 12) Para que o aqui A. consiga apanhar o comboio das 7h45min para o Porto seria necessário, para além de não haver atrasos, que o autocarro passasse próximo da estação da CP ou terminasse ali o seu trajeto, o que não acontece em nenhum dos casos, pelo que o trabalhador tem ainda que deslocar-se, a pé, durante cerca de vinte minutos entre a paragem do autocarro até à estação da CP; 13) Ainda que o A. lograsse chegar a tempo para embarcar no comboio Urbano Braga – Porto/S. Bento das 7h45min, o trajeto até à cidade do Porto duraria uns adicionais cinquenta minutos, aí chegando somente por volta das 8h35min da manhã, sendo ainda necessários cerca de quinze minutos mais para a deslocação, a pé, entre este local de desembarque na cidade do Porto e a Rua …; 14) Tendo o A. que percorrer a pé a distância entre a Rua … e a estação de Porto - S. Bento, no que demora cerca de dez a quinze minutos, apenas consegue embarcar no comboio das 17h45min, que chega a Braga às 18h56min, o que leva a que, à hora de chegada a Braga, o trabalhador não tenha disponível nenhum transporte público que o leve até à sua residência em …, posto que o último autocarro com este destino parte da cidade dos arcebispos às 18h30min; 15) A esposa do A. é doméstica; 16) A mãe do A. está a cargo deste mas não coabita com o mesmo; 17) Desde 1 de abril de 2015 que o A. tem estado, em exclusivo, a custear as despesas com os acréscimos de transportes; 18) Cada viagem diária de táxi entre … e Braga ascende à quantia de €50, sendo que o percurso inverso, Braga a …, perfaz €51,70; 19) A que há que acrescentar as despesas tidas semanalmente com os comboios da CP, ou seja, a quantia de €31; 20) Existe um passe da CP que permite viagens entre Braga e Porto com um custo mensal de €72,45. 21) No que concerne aos encargos com as deslocações de comboio entre Braga e Porto, e vice-versa, que a R. se comprometeu a assumir perante o A., apenas ainda não lhe foram pagos pelo facto de o trabalhador não ter inserido no portal do colaborador os documentos comprovativos, para que possam ser processados para pagamento pela R. 22) O descrito em 7) fez com que o A. se sinta vexado, desorientado, passando a sentir dificuldades em conciliar o sono, dores de cabeça, ansiedade, angústia e humilhação, até porque não consegue suportar as despesas inerentes à modificação do seu local de trabalho e ao mesmo tempo sustentar a sua família; 23) Como é do conhecimento da R., o A. não é, na cidade de Braga, o trabalhador com menor antiguidade na empresa; 24) O posto de trabalho anteriormente ocupado pelo A. não foi extinto, nem o foram as funções por este exercidas; 25) O aludido local de trabalho, no G…, sito no Lugar …, Edifício …, na cidade de Braga, permanece a laborar; 26) Não ocorreu nenhuma saída, durante o segundo/terceiro trimestre de 2015, de um outro trabalhador que à época se encontrava a exercer as funções no edifício da … descritas na missiva que comunicou a transferência em apreço, porquanto nenhum dos três trabalhadores que então se encontravam a exercer funções no repartidor no edifício da …, …, no Porto, a saber, H…, I… e J…, apresentaram no apontado período temporal qualquer pedido de reforma, pré-reforma, suspensão do contrato de trabalho, transferência do local de trabalho, cedência ocasional, tendo em vista abandonarem a empresa e/ou o aludido local de trabalho; 27) O pedido de reforma de H… foi deferido em 20 de novembro de 2015, com efeitos a 22 de dezembro de 2015; 28) A R. tem no piso quarto do sobredito edifício …, mais concretamente no G1…, três técnicos habilitados para preencher o lugar do A., a saber, K…, L… e M…, mas que a R. mantém inativos, sem funções atribuídas.” ………………………………………………………….. ………………………………………………………….. ………………………………………………………….. 1.3 Base factual a atender Nos termos anteriormente expostos, a base factual a atender, para a aplicação do direito do caso, é a que como tal foi considerada pelo Tribunal a quo, com exceção do que fez constar do ponto 24.º, que se tem por não escrito, e com aditamento do seguinte:“Em 1994 constituiu-se a D…, um operador único nacional de telecomunicações que juntou as empresas do sector cujo capital era totalmente detido pelo Estado através da Comunicações Nacionais: A D1…, os D2… e a D3…”. 2. O Direito …………………………………………………………………………………………………………………………………… ………………………………………………………………… 2.1 Questão de saber se a ordem de transferência do Autor é ilegal 2.1.1 O local de trabalho/mobilidade geográfica 2.1.1.1 Introito Será certamente indesmentível que, no âmbito da relação laboral, a questão do local de trabalho assume particular relevância, constituindo um dos elementos mais relevantes do contrato de trabalho, seja na ótica do empregador seja na do trabalhador. Não obstante, enquanto entidade patronal, beneficiária da prestação laboral, assiste a essa, no âmbito da sua iniciativa económica e livre modo de gestão empresarial, escolher e definir o local onde irá exercer a sua atividade económica, podendo depois, no âmbito dos seus poderes de direção e organização dessa atividade, determinar ao trabalhador o local onde este deverá prestar a sua atividade, muito embora, importa lembrá-lo, sem prejuízo das limitações ou exigências que decorram da lei ou que estejam convencionalmente previstas, assim desde logo, sendo esse o caso, sobre a garantia da inamovibilidade do trabalhador. Por sua vez, vista a questão na ótica do trabalhador, torna-se desde logo apodítico dizer que é de acordo com o seu local de trabalho que o mesmo irá afinal organizar a sua vida, assim nomeadamente quanto ao local em que acaba por fixar a sua residência, com interferência direta na organização do seu próprio núcleo familiar, incluindo inserção no meio envolvente, criando um conjunto de interações com esse meio e em função das respetivas especificidades. 2.4 Sanção pecuniária compulsória Por último, a Recorrente dirige a sua conclusão 51.ª ao valor de € 200,00 fixado na sentença a título de sanção pecuniária compulsória, invocando como único argumento que tal valor apresenta-se como “excessivo e leonino”.Pugnando mais uma vez o Apelado pela manutenção do julgado, cumprindo apreciar, fez-se constar da sentença recorrida, nesse âmbito, o seguinte (citação): “(...) O trabalhador veio também requerer a fixação de uma sanção pecuniária compulsória à empregadora para o caso de esta não cumprir o que aqui for estipulado em termos de revogação da ordem de transferência dada. Preceitua o art.º 365.º n.º 2 do C. P. Civil, que é sempre admissível a fixação, nos termos da lei civil, da sanção pecuniária compulsória que se mostre adequada a assegurar a efetividade da providência decretada. A sanção pecuniária compulsória só é compatível com o cumprimento de obrigações de facto infungível, positivas ou negativas (art.º 829.º-A do C. Civil). Na situação que ora nos ocupa temos uma obrigação positiva – a adoção de um determinado comportamento –, cuja realização não depende de especiais qualidades científicas ou artísticas da R. (art.º 829.º-A n.º 1 do citado diploma legal). No caso em análise, ao decretar-se que a R. recoloque o A. no antigo posto de trabalho deste, está-se-lhe a impor o cumprimento de uma obrigação de facere. Por outro lado, a obrigação que impende sobre a R. é duradoura e tem natureza continuada. Tudo ponderado, consideramos, em concreto, mais eficaz fixar, a título de sanção pecuniária compulsória, um montante por cada dia de infração, e não um valor global, por forma a fazer com que a R. prefira o cumprimento ao inadimplemento. Resta determinar o quantitativo da sanção pecuniária compulsória. Preceitua o art.º 829.º-A n.º 2 do C. Civil que aquela deve ser fixada segundo critérios de razoabilidade. Assim, devem-se ter presentes, na medida do possível, os dados concretos da relação jurídica controvertida e a situação das partes, com recurso a um juízo de equidade. Tudo ponderado, consideramos justo e adequado fixar em €200 o montante da sanção pecuniária compulsória a liquidar por cada dia de infração à obrigação de facere decretada por via desta ação. O cumprimento da dita sanção só é exigível aquando do trânsito em julgado da presente decisão. (...)” Ora, vista a citada fundamentação, que sem dúvidas explica cabalmente quer o fundamento jurídico quer os critérios que presidiram à fixação da sanção pecuniária compulsória, não se deteta, salvo o devido respeito, a razão por que a Recorrente a considera excessiva e leonina, afirmação que a mesma avança simplesmente nas alegações e conclusões sem a fundamentar minimamente. Não obstante, sempre se dirá que se acompanha o julgado, importando assinalar, o que a Recorrente parece esquecer, que a condenação proferida, como o afirmou o Tribunal a quo, apenas é exigível aquando do trânsito em julgado da decisão, sendo que, afinal, após esse trânsito, fundamento algum se vislumbra para que não cumpra o determinado pelo Tribunal, obstando assim a que se torne exigível tal sanção. Ou seja, está afinal na livre vontade e disponibilidade da Recorrente o cumprir ou não cumprir, sendo que, diga-se por último, o valor fixado também se nos afigura adequado, desde logo face à situação em que se encontram as partes, sem esquecermos a própria dimensão da Recorrente. Nos termos expostos, improcede também o recurso quanto a esta questão. * Em conclusão, não obstante a alteração parcial da matéria de facto, nos termos afirmados no ponto 1.3. da nossa análise, alteração essa que não interfere com a aplicação do direito ao caso que se decide, improcedendo totalmente neste âmbito o recurso interposto pela Ré/recorrente, confirma-se, sem fundamento diverso, a sentença recorrida.Decaindo no recurso, a Apelante é responsável pelas custas (artigo 527.º do CPC). *** Em conformidade com os fundamentos expostos, procedendo parcialmente o recurso quanto à matéria de facto e alterando-se ainda parcialmente essa de modo oficioso, nos termos constantes do presente acórdão, mas improcedendo totalmente o mesmo recurso na vertente da aplicação do direito, acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação do Porto em confirmar, neste âmbito, a sentença recorrida.IV. Decisão: Custas pela Ré/recorrente. Nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do CPC, anexa-se o sumário do presente acórdão. Porto, 7 de janeiro de 2019 Nelson Fernandes Rita Romeira Teresa Sá Lopes ______________ [1] “1 - É proibido ao empregador: (...) f) Transferir o trabalhador para outro local de trabalho, salvo nos casos previstos neste Código ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, ou ainda quando haja acordo; (...)” [2] “1 - O empregador pode transferir o trabalhador para outro local de trabalho, temporária ou definitivamente, nas seguintes situações: (...) b) Quando outro motivo do interesse da empresa o exija e a transferência não implique prejuízo sério para o trabalhador. (...) 6 - O disposto nos números anteriores pode ser afastado por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho. (...)” [3] “1 - O empregador deve comunicar a transferência ao trabalhador, por escrito, com oito ou 30 dias de antecedência, consoante esta seja temporária ou definitiva. 2 - A comunicação deve ser fundamentada e indicar a duração previsível da transferência, mencionando, sendo caso disso, o acordo a que se refere o n.º 2 do artigo 194.” [4] Relator Conselheiro Melo Lima, disponível para consulta em www.dgsi.pt. [5] “[21] PEDRO ROMANO MARTINEZ, ob.cit. p. 698” [6] Veja-se o Ac. de 26-03-2012, Relatora Desembargadora Paula Leal de Carvalho, disponível em www.dgsi.pt. [7] Relator Conselheiro Melo Lima, disponível para consulta em www.dgsi.pt. [8] “[22] PEDRO ROMANO MARTINEZ, ob.cit. p.701-703” [9] “[23] Refere a Recorrente na Conclusão 41ª: «Como é pacífico na nossa jurisprudência e doutrina, no caso da transferência individual, o ónus de alegar e provar a existência de prejuízo sério impende, sobre o trabalhador.» Não é tão pacífico quanto isso. Nem na doutrina, nem na jurisprudência. Bastará recordar, relativamente a esta, o Acórdão deste STJ de que a Recorrente se socorre na sua fundamentação (Ac. de 12.02.2009), no qual se refere que «À face do nº1 do artigo 315º do Código do Trabalho [Leia-se: Artigo 315º/1 do CT/2003, com correspondência ao artigo 194º nº1 al. b) do CT/2009], a inexistência de ‘prejuízo sério’ é pressuposto do exercício do poder do empregador de determinar a transferência de local de trabalho, pelo que sobre o empregador recai o ónus da respetiva prova, nos termos do artigo 342º nº1, do Código Civil»” [10] Tratado de Direito do Trabalho, Parte III, págs. 286 a 287 e 350. [11] Manual de Direito do Trabalho, pág. 307. [12] in Direito do Trabalho, cit., págs. 212 a 214, [13] Vejam-se ainda: Bernardino Lobo Xavier, Manual de Direito do Trabalho, Verbo, 2011, pág. 263, afirmando que as CTT criam verdadeiras normas jurídicas; Maria do Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho, Parte I, Secção II, ponto 27.V, e Parte II, pág. 203, quando refere que as CCT deverem seguir as regras de interpretação da lei [14] Ensaio sobre a Teoria da Interpretação das Leis, pág. 21 [15] Baptista Machado, Introdução ao direito e ao Discurso Legitimador, 12ª reimpressão, págs. 175 e segs [16] Como se afirma no mesmo Acórdão, citando em parte o Acórdão do mesmo Tribunal de 9 de Julho de 2010 (publicado no DR, Iª série de 9/07/2010), «“na interpretação das cláusulas das convenções colectivas de trabalho de conteúdo normativo, ou regulativo – como é o caso -, há que ter presente, por um lado, que elas consubstanciam verdadeiras normas jurídicas e, por outro, que provêm de acordo de vontades de sujeitos privados”, havendo, por conseguinte, que obedecer às regras próprias de interpretação da lei (cfr. no mesmo sentido o acórdão do STJ de 28/09/2005 – Cons. Sousa Peixoto – publicado no DR, Iª série de 10/11/2005) e de 30/04/2014, proc.3230/11.6TTLSB.S1 (Cons. Melo Lima)». |