Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
121/19.6T8GDM.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CARLOS PORTELA
Descritores: ÓBITO DE UM DOS ELEMENTOS DA UNIÃO DE FACTO
PRESTAÇÕES POR MORTE
SEGURANÇA SOCIAL
COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS
Nº do Documento: RP20200528121/19.6T8GDM.P1
Data do Acordão: 05/28/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Cabe aos serviços da segurança social o reconhecimento da situação de união de facto como pressuposto do direito às prestações por morte de membro de uma situação união de facto, estabelecidas na Lei n°7/2001, de 11 de Maio, na redacção resultante da Lei n°23/2010, de 30 de Agosto.
II - A discordância dos interessados relativamente à avaliação feita pelos serviços da segurança social sobre a existência da situação de união de facto, integra litígio emergente de uma relação jurídica administrativa da competência dos Tribunais da Jurisdição Administrativa, nos termos do artigo 4.º, n°1, alíneas a) e c) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
III - Isto, por se tratar de uma decisão de um instituto público integrado na administração indirecta do Estado, que prossegue atribuições do Ministério da Solidariedade e da Segurança Social, sob superintendência e tutela do respectivo Ministro.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação nº 121/19.6 T8GDM.P1
Tribunal recorrido: Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo Local Cível de Gondomar
Relator: Carlos Portela (1014)
Adjuntos: Joaquim Correia Gomes
António Paulo Vasconcelos

Acordam na 3ª Secção do Tribunal da Relação do Porto

I.Relatório:
B…, portadora do cartão de cidadão n.º…………, contribuinte fiscal n.º………, residente na Rua …, n.º…, rés-do-chão direito, ….-… … intentou a presente acção contra o Estado Português, representado pelo Ministério Público, pedindo o reconhecimento da união de facto nos termos e para os efeitos da Lei 7/2001 de 11/5.
Alegou, para tal e em suma, que manteve com C… a condição de conviventes de facto análoga à dos cônjuges desde Julho de 2001 até à data do seu óbito em 5/4/2018, vivenciaram uma relação familiar, social, afectiva e sexual e residiram na mesma casa desde Julho de 2001 até finais de 2015, na Rua …, n.º…, 4.º direito, …, Gondomar.
Mais alegou que em finais de Fevereiro, inícios de Março de 2016 ele foi internado no D…, primeiramente só em regime de dia e depois em regime interno de dia e noite, vindo passar os fins de semana com a autora à sua residência, partilhando ambos refeições, casa, leito e contribuindo ambos para o sustento do lar.
Alegou ainda que desde então eram vistos juntos em eventos sociais e familiares, partilharam a relação afectuosa e marital publicamente, contribuindo ambos para a economia do casal, mediante mútuo auxílio em relacionamento tipicamente de marido e mulher, sendo que as decisões eram tomadas em acordo no supremo interesse de ambos.
Concluiu pedindo a procedência do seu pedido por se achar no direito de requerer o reconhecimento judicial da situação de união de facto vivida com o falecido C….
O Ministério Público contestou a acção, aceitando o óbito de C… mas impugnando a demais factualidade alegada na petição inicial.
Por despacho oportunamente proferido foi ordenada a notificação a autora para, além do mais, aperfeiçoar a petição inicial alegando a finalidade da presente acção, por forma ao Tribunal apreciar o pressuposto processual do interesse em agir.
A autora respondeu ao convite alegando, além do mais, que com a presente acção pretende o reconhecimento da união de facto mantida com o de cujus C… de Julho de 2001 a Abril de 2018 e pretende-se reconhecida para que a autora adquira o direito de receber a pensão por morte por óbito do de cujus, pois o membro sobrevivo da união de facto tem direito a usufruir, em condições análogas às dos cônjuges, das prestações por morte a atribuir nos termos dos regimes de segurança social vigentes.
Notificado, o Ministério Público veio invocar a excepção de incompetência material deste Tribunal e a ilegitimidade passiva do Estado Português, com os seguintes fundamentos:
O que a autora pretende com a presente acção é ver reconhecida a sua união de facto com C… com vista a receber uma pensão, pelo que deveria ter intentado a acção contra o organismo/entidade pagadora da pensão.
Por outro lado, a Lei 23/2010 alterou a redacção da Lei 7/2001 de 11/5, sendo que nos termos do actual artigo 6.º da referida Lei na redacção da Lei 23/2001 o procedimento de obtenção das prestações por morte do beneficiário passou a ser feito por requerimento entregue à entidade responsável pelo pagamento, vindo assim a reconhecer ao membro sobrevivo da união de facto a protecção social por morte do beneficiário, sem necessidade de interpor acção judicial.
Assim, o Tribunal comum deixou de ter qualquer intervenção no que tange à declaração de quaisquer direitos do interessado às pensões por óbito do membro da união de facto, os quais são fixados em sede de procedimento administrativo pelo que o eventual futuro controlo das decisões proferidas nestes sede são da competência dos Tribunais administrativos, nos termos do artigo 4.º, n.º1 a) e 212.º, n.º3 do Constituição da República Portuguesa.
Mais, a única intervenção da jurisdição comum é no esclarecimento de eventuais dúvidas quanto à existência da união de facto, apenas para aferir desta união, e como elemento coadjuvante daquele procedimento administrativo que não é substituído por este procedimento judicial.
Alegou, ainda, que a autora não tem interesse em agir pois de nada vale à autora a condenação do Estado Português em lhe reconhecer a União de Facto para os fins de lhe ser atribuída uma pensão, já que o Estado Português não pode ordenar ao organismo competente para decidir, que o faça.
A autora exerceu o contraditório, alegando que requereu junto do Instituto da Segurança Social a prestação de pensão por morte pelo óbito de C…, tendo esse Instituto indeferido, aconselhando-a a requerer apoio judiciário e intentar a acção para que o seu direito lhe seja reconhecido.
Mais alegou ter interesse em agir.
Os autos prosseguiram os seus termos, acabando por ser proferida decisão que definiu os factos tidos por provados e a final julgou o Tribunal materialmente incompetente para conhecer e tramitar os presentes autos, e, em consequência, absolveu o réu estado Português da instância.
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A autora veio interpor recurso desta decisão, apresentando desde logo e nos termos legalmente prescritos, as suas alegações.
O réu Estado Português, contra alegou.
Foi proferido despacho que considerou o recurso tempestivo e legal e admitiu o mesmo como sendo de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito meramente devolutivo.
Recebido o processo nesta Relação emitiu-se despacho que teve o recurso por próprio, tempestivamente interposto e admitido com efeito e modo de subida adequados.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Enquadramento de facto e de direito:
Ao presente recurso são aplicáveis as regras processuais da Lei nº 41/2013 de 26 de Junho.
È consabido que o objecto do presente recurso, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso obrigatório, está definido pelo conteúdo das conclusões vertidas pela autora/apelante nas suas alegações de recurso (cf. artigos 608º, nº2, 635º, nº4 e 639º, nº1 do CPC).
E é o seguinte o teor dessas conclusões:
A A./Recorrente pretende que seja reconhecida a União de Facto mantida entre a A. e o de cujus C… entre Julho de 2001 e 05 de Abril de 2018, nos termos e para os fins da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio,
E que seja reconhecido à A. o direito de receber a pensão por morte pelo óbito de C….
Para tal desiderato e nos termos postos consideramos verificar-se a competência material do Tribunal.
Nos termos, e sempre com o muito Douto suprimento de Vossas Excelências, Venerados Desembargadores, pugnando pela improcedência da requerida incompetência material e consequente absolvição do Réu, reconhecendo-se a União de facto entre a A. e o de cujus,
Com o que se fará, JUSTIÇA!
Por seu turno o Estado Português representado pelo Ministério Público, conclui do seguinte modo as suas contra alegações:
1ª) A Autora recorreu da decisão da MMª Juiz que com base na excepção dilatória, da competência absoluta, em razão da matéria, do Tribunal Cível, absolveu da Instância do Estado Português;
2ª) A recorrente alega que é o Tribunal Cível o competente para reconhecer a sua união de facto mantida com o de cujus C…, entre Julho de 2001 e 05 de Abril de 2018 e reconhecimento do direito de receber a pensão por morte do referido C…, nos termos da Lei 07/2001 de 11 de Maio.
3ª) Não refere as normas violadas.
4ª) Não tendo a recorrente alegado as normas violadas pelo MMº Juiz na decisão objecto de recurso, deve este ser rejeitado, nos termos do art.º 639º nº2 al. a) do CPC.
5ª) Mas mesmo que assim se não entenda, o MªPº não concorda com a recorrente.
6ª) Muito bem andou a MMª Juiz ao absolver o Estado Português da Instância, com base na nova redacção dada ao art.º 6º da Lei 07/2001 pela Lei 23/2010 que refere: “O membro sobrevivo da união de facto beneficia dos direitos previstos nas al. e), f) e g) do nº3, independentemente da necessidade de alimentos. A entidade responsável pelo pagamento das prestações, quando entenda que existem fundadas duvidas sobre a existência da união de facto, pode solicitar meios de prova suplementares, designadamente declaração emitida pela Autoridade Tributária e Aduaneira ou pelo Instituto dos Registos e Notariados, IP, onde se ateste que à data da morte os membros da união tinham domicilio fiscal comum há mais de dois anos. Quando, na sequência das diligências previstas no número anterior, subsistam dúvidas, a entidade responsável pelo pagamento das prestações deve promover a competente acção judicial com vista à sua comprovação”. Ou seja, com esta nova redacção do citado preceito legal, o controlo das decisões proferidas nesta sede, são da competência dos tribunais administrativos, nos termos do art.º 4º nº1 al.) do ETAF e 212º nº3 da CRP.
7ª) Mas mesmo que assim se não entenda, sempre o Estado Português é parte ilegítima na acção, pois correspondendo a legitimidade processual, num litigio determinado, ao interesse directo em demandar, caso da legitimidade activa, ou interesse directo em contradizer, legitimidade passiva, terá a mesma de ser aferida tendo em conta os termos em que o autor delineou a relação jurídica controvertida. Ora, pretendendo a autora ver reconhecida a sua união de facto com C…, entretanto falecido, com vista a receber uma pensão, deve a autora propor a acção contra a entidade pagadora da referida pensão e não contra o Estado Português, pois tal entidade constituiu um organismo de administração indirecta do Estado, diferente da pessoa colectiva Estado, tal como é previsto no DL-167-C/2013. O que igualmente conduziria à absolvição do Estado Português da Instância, nos termos dos art.ºs 576º nº2, 577º ale) e 278º nº1 als. d) e e), todos do CPC.
8ª) E por tudo o exposto, a autora não tem interesse em agir, pois nada valeria à autora a condenação do Estado Português em reconhecer a sua união de facto para fins de lhe ser atribuída determinada pensão, quando o Estado Português não pode ordenar ao organismo competente para decidir, que reconheça essa união de facto e por via disso lhe pague determinada quantia em dinheiro, o que constituiu uma excepção dilatória inominada que tem como consequência a absolvição da instância, art.º 278º nº1 al. e) do CPC.
9ª) A decisão objecto de recurso não violou quaisquer normas legais, antes tendo feito correcta, criteriosa e justa aplicação das normas jurídicas que são aplicadas ao caso, acima citadas.
10ª) Devendo assim, tal Decisão ser mantida.
Se outro for o entendimento de Vªs ESªs, por certo SE FARÁ JUSTIÇA!
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Perante o antes exposto, resulta claro ser a seguinte a questão suscitada no presente recurso:
A competência/incompetência material do Tribunal “a quo” para tramitar, apreciar e decidir a presente acção.
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Para responder a tal questão importa ter em conta a seguinte factualidade, já antes vertida na decisão recorrida e não impugnada pelas partes e que resulta do alegado pela autora nos autos:
A autora intentou a presente acção contra o Estado Português, representado pelo Ministério Público, pedindo o reconhecimento judicial da sua união de facto com o falecido C… para que a autora adquira o direito a receber a pensão por morte de C….
A autora requereu junto do Instituto de Solidariedade e Segurança Social a prestação de pensão por morte de C…, pedido que lhe foi indeferido.
Mas para além desta e porque se mostra documentalmente provado, e tem relevo para a decisão a proferir, importa ter em conta a seguinte circunstancialismo de facto:
A autora B… nasceu a 03.04.1952, estando divorciada de E… desde 01.06.1999.
C…, nasceu a 01.02.1941, foi casado com F… de quem se divorciou em 13.03.1985 e faleceu no estado de divorciado no dia 05.04.2018.
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Vejamos, pois.
Como já se verificou, na presente acção a autora B… pretende o reconhecimento da sua união de facto com C…, nos termos e para os efeitos da Lei nº7/2001 de 11 de Maio.
Ora todos sabemos que posteriormente a tal diploma legal, foi aprovado e entrou em vigor a Lei nº 23/10 de 30 de Agosto.
Mais, apesar da referida Lei n.º 23/2010 de 30 de Agosto, só ter entrado em vigor com a posterior Lei do Orçamento do Estado (1 de Janeiro de 2011), a verdade é que o Acórdão Uniformizador do STJ, de 15 de Março de 2012, fixou jurisprudência no sentido de que a alteração introduzida pela Lei n.º 23/2010 é aplicável também às situações em que o óbito do beneficiário ocorreu antes da entrada em vigor do novo regime o que não é manifestamente o caso nos autos.
Para além disso, importa salientar que tal diploma não revogou a Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, procedendo sim a alguns ajustamentos ao seu regime.
E destes sobressai o que ocorreu relativamente ao artigo 6.º onde, antes, (o n.º 1) se dispunha que beneficiavam dos direitos das alíneas e), f) e g) do artigo 3.º as uniões de facto que reunissem as “condições constantes do artigo 2020.º do Código Civil, decorrendo a acção perante os tribunais”.
Actualmente, o n.º2 (que tinha esta redacção: - "Em caso de inexistência ou insuficiência de bens da herança, ou nos casos referidos no número anterior, o direito às prestações efectiva-se mediante acção proposta contra a instituição competente para a respectiva atribuição") – tem a seguinte redacção: "A entidade responsável pelo pagamento das prestações previstas nas als. e), f) e g) do art.º 3º, quando entenda que existem fundadas dúvidas sobre a existência da união de facto, deve promover a competente acção judicial com vista à sua comprovação”.
Deve assim concluir-se que o interessado nas prestações aí previstas deixa de ter de propor acção contra a entidade responsável pelo pagamento e de provar a verificação dos pressupostos estabelecidos no artigo 2020°, n.º 1 do Código Civil, bastando-lhe provar, para a atribuição dos alimentos perante a instituição competente, a existência da união de facto nos termos estabelecidos no referido artigo 2°-A (o que resulta do artigo 8º do DL 322/90 e artigo 41° do DL 142/73, na redacção dos artigos 4º e 5º, da Lei 23/10 de 30 de Agosto) ou seja, os unidos de facto passaram a ter direito às prestações por morte, designadamente à pensão de sobrevivência, independentemente da necessidade de alimentos, bastando-lhes, por meio de procedimento administrativo, provar a união de facto há mais de dois anos, à data da morte do beneficiário.
Ou seja, nos dias de hoje, o processo inicia-se perante a Segurança Social devendo o interessado impugnar a decisão administrativa que lhe seja desfavorável perante os tribunais administrativos.
Tudo isto, porque se trata de uma decisão de um Instituto Público integrado na administração indirecta do Estado, que prossegue atribuições do Ministério da Solidariedade e da Segurança Social, sob superintendência e tutela do respectivo Ministro (art.º 1° do Decreto-Lei 83/2012 de 30 de Março), sendo os seus actos recorríveis para os tribunais administrativos (art. 4°, n.º 1 alínea a), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, anexo à Lei 13/2002, de 19 de Fevereiro).
Assim só se o ISS entender que existem sérias dúvidas sobre a existência da união de facto, é que intentará a competente acção judicial com vista à sua determinação.
Face ao exposto, é legítimo concluir que, com a Lei 23/2010, cessou a competência dos tribunais judiciais para decidirem os pedidos de reconhecimento da qualidade de titular de prestações sociais, pois que a apreciação da mesma cabe à entidade administrativa com recurso das decisões desta para o tribunal administrativo, como acima se disse.
Ora segundo a alegação da autora, a mesma diligenciou junto do ISS no sentido de lhe ser reconhecida a união de facto mantida com o falecido C… de Julho de 20091 até 5 de Abril de 2018, pedido que foi indeferido.
O que fica por provar é se a mesma autora recorreu de tal decisão para os Tribunais Administrativos.
De todo o modo, pode pois concluir-se que os tribunais comuns passaram, (com a Lei 23/2010) a ser materialmente incompetentes para decidir as pretensões do interessado no reconhecimento da sua qualidade de titular de prestações sociais.
Como já se viu, a apreciação das mesmas cabe à entidade administrativa, com recurso dos actos desta para o tribunal administrativo.
Em suma, os tribunais comuns são, materialmente incompetentes para condenar o Réu à prática do acto administrativo de reconhecimento do alegado direito da Autora a prestações por morte e à prática do acto administrativo de pagamento dessas prestações.
Mas para além do exposto, pode ir-se mais longe e afirmar o seguinte:
A Lei n.º 23/10 transferiu para a Segurança Social a averiguação da união de facto enquanto pressuposto das prestações sociais consagradas naquela Lei.
Neste sentido vai o Acórdão do Tribunal dos Conflitos, de 25 de Janeiro de 2017, processo nº 028/16, onde se afirmou que: “As diligências que visam a demonstração dos pressupostos das prestações em causa correm no âmbito de um procedimento administrativo e culminam com um acto administrativo, atribuindo ou recusando as prestações peticionadas.
É verdade que, nos termos do n°2 do artigo 6° na nova redacção, «a entidade responsável pelo pagamento das prestações previstas nas alíneas e), f) e g) do artigo 3°, quando entenda que existem fundadas dúvidas sobre a existência da união de facto, deve promover a competente acção judicial com vista à sua comprovação». (…)
“Consagra-se apenas uma exigência de transparência e de rigor na actuação da Administração na demonstração dos pressupostos do direito às prestações, impondo-lhe que, em caso de dúvidas fundadas, só decida da atribuição ou recusa das prestações depois da demonstração em acção judicial da existência ou inexistência da união de facto sobre a qual essas dúvidas se suscitem.
“Deste modo, quando os elementos recolhidos não sejam concludentes no sentido do reconhecimento da união de facto e justifiquem «fundadas dúvidas», a entidade competente dissipa as dúvidas através da instauração de uma acção com vista à demonstração da existência dessa união de facto.” (…).
“A discordância dos interessados no procedimento administrativo instaurado com o que seja decidido pelos serviços da segurança social, num sentido ou noutro, recai claramente no âmbito da jurisdição administrativa, carecendo de sentido que os tribunais que integram aquela jurisdição não possam conhecer de todos os pressupostos das prestações sociais, nomeadamente, da união de facto.”.
Tem assim razão o Tribunal “a quo” quando na parte final da decisão recorrida afirma o seguinte:
“Nesta conformidade, tendo já a entidade responsável pelo pagamento proferido a respectiva decisão administrativa no âmbito do procedimento de obtenção das prestações por morte do unido de facto, a jurisdição competente para reacção à mesma é jurisdição administrativa e não a cível, nos termos do artigo 4.º, n.º1 a) e c) do ETAF (Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais - Lei 13/2002 de 19/2) e 212.º, n.º3 da Constituição da República Portuguesa.
Nesta conformidade, julga-se este Juízo materialmente incompetente para conhecer da presente acção, tal como a mesma está intentada pela autora, porquanto por via da mesma a autora obter o reconhecimento de uma situação jurídica que não foi reconhecida pela entidade administrativa competente para atribuição da prestação social que pretende obter, o que determina a absolvição do réu instância, de harmonia com o disposto no artigo 6.º da Lei 7/2001 de 11 de Maio, na redacção da Lei 23/2010 de 30 de Agosto, 64.º, 96.º, n.º1 a), 97.º, 99.º, n.º1 e 278.º, n.º1 a), todos do Código de Processo Civil”.
Em conclusão, nenhum reparo nos merece tal entendimento, justificando-se, sim, a confirmação do decidido.
Sem mais, improcede o recurso aqui interposto.
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Sumário (cf. art.º 663º, nº7 do CPC):
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III. Decisão:
Pelo exposto, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida.
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Custas a cargo da autora (cf. art.º 527º, nºs 1 e 2 do CPC).
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Notifique.

Porto, 28 de Maio de 2020
Carlos Portela
Joaquim Correia Gomes
António Paulo Vasconcelos