Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
69/13.8T2AND.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CARLOS PORTELA
Descritores: CONTRATO DE MÚTUO
DIVÓRCIO
OBRIGAÇÃO DE RESTITUIR
DESPESAS DO CONDOMÍNIO
Nº do Documento: RP2020070269/13.8T2AND.P1
Data do Acordão: 07/02/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - No contrato de mútuo, a principal obrigação do mutuário é a restituição da quantia mutuada ao mutuante.
II - No caso dos autos, os sujeitos passivos da obrigação, são o autor e a ré, obrigados como mutuários em regime de solidariedade, perante a entidade bancária.
III - Provando-se que tais encargos foram suportados unicamente pelo autor, ao mesmo assiste o direito de exigir da ré metade de todos os valores que pagou desde a data do divórcio.
IV - Por constituírem também elas encargos com as fracções em regime de compropriedade, tem o autor ainda direito a exigir da ré o pagamento de metade das quotas que integralmente suportou, a título de despesas de condomínio.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação nº 69/13.8T2AND.P1
Tribunal recorrido: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro
Juízo Central Cível de Aveiro
Relator: Carlos Portela (1020)
Adjuntos: Joaquim Correia Gomes
António Paulo Vasconcelos

Acordam na 3ª Secção do Tribunal da Relação do Porto

I.Relatório:
B…, divorciado, com residência profissional em Rua …, …, freguesia e concelho de Águeda, instaurou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum ordinário contra C…, divorciada, residente em Rua …, n.º .., 3º direito, Ala Norte, Edifício …, freguesia e concelho de Águeda, formulando os seguintes pedidos:
Pedindo que a acção fosse julgada procedente por provada e, consequentemente, a Ré condenada a pagar ao Autor:
a) A quantia global de € 23.915,13 (vinte e três mil novecentos e quinze euros e treze cêntimos) até 14 de Fevereiro de 2013, referente a metade das prestações mensais pelo empréstimo contraído junto do banco D…, S.A. para aquisição das fracções sub judice e aos respectivos seguros de vida, multirrisco e de recheio, e às despesas com o condomínio muito embora estas devessem ser suportadas somente pela Ré, pois só ela vem habitando e ocupando os imóveis;
b) A pagar 50% de todas as prestações mensais relativas ao financiamento contraído junto do Banco “D…, S.A.”, com seguros e condomínio que o Autor venha a liquidar enquanto os imóveis objecto dos presentes autos se mantenham em compropriedade;
c) A pagar a quantia de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), também até 14 de Fevereiro de 2013, como indemnização pelo facto de o Autor não poder habitar nem usufruir do imóvel e que corresponde a metade do valor de uma renda para um imóvel idêntico até esta data, e ainda a quantia mensal de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros) devidas a título de rendas vincendas e a que o Autor tem direito até efectiva decisão transitada em julgado no processo Nº 663/09.1T2AND que corre termos pelo Juízo de Média e Pequena Instância Cível de Águeda;
Alegou para tanto e em síntese que:
- Autor e Ré contraíram casamento civil no dia 13 de Setembro de 1991, no regime de separação de bens, casamento dissolvido por divórcio decretado no dia 12 de Outubro de 2004;
- O Autor e a Ré são comproprietários das fracções autónomas que identifica, sitas em Águeda, correspondendo às letras “AG” - terceiro andar direito (ala Norte) destinado a habitação –, “P” - garagem na cave – e “Q” - correspondente garagem na cave;
- Após ter sido decretado o divórcio entre o Autor e a Ré, esta instaurou em 26 de Outubro de 2004, uma acção especial de divisão de coisa comum, que inicialmente seguiu os seus trâmites pelo 1º Juízo do extinto Tribunal Judicial da Comarca de Águeda e depois transitou para o Juízo de Média e Pequena Instância Cível de Águeda, da Comarca do Baixo Vouga, com o n.º 154/04.8TBAGD, tendo por objecto as fracções identificadas;
- Nessa acção foi declarada a indivisibilidade das fracções e determinada a adjudicação, ou venda, das mesmas, por sentença transitada em julgado, datada de 20 de Maio de 2005;
- Na sequência do trânsito em julgado de tal decisão, o processo seguiu seus termos para a fase da adjudicação ou venda das fracções, determinando-se a venda mediante negociação particular;
- Posteriormente a ré, aí autora, por requerimento de 17 de Julho de 2009, desistiu do seu pedido, que foi homologado por sentença proferida em 29 de Setembro de 2009;
- Como o autor não pretendia continuar na indivisão, requereu uma acção de divisão de coisa comum das mesmas fracções, em 19 de Novembro de 2009, que deu origem ao processo n.º 663/09.1T2AND, que corre termos pelo Juízo de Média e Pequena Instância Cível de Águeda;
- No âmbito desse processo foi declarada a indivisibilidade dos prédios e ordenado o prosseguimento dos autos para a fase de adjudicação, encontrando-se actualmente à espera que os bens sejam vendidos por negociação particular;
- O imóvel sempre foi habitado pela ré e seu companheiro, mas é o autor quem está a suportar o pagamento das prestações perante o banco financiador do empréstimo de aquisição das fracções;
- Autor e Ré, aquando do divórcio, acordaram que a casa de morada de família e que corresponde à fracção “AG”, ficaria atribuída a ambos, podendo os dois nela residir;
- Contudo, após o divórcio ter sido decretado e de se ter assinado o acordo quanto ao destino a dar à casa de morada de família, a Ré não mais permitiu que o Autor nela habitasse, tendo a Ré passado a habitar, exclusivamente, a dita fracção “AG”, e ocupado as garagens, onde ainda reside com um companheiro;
- O autor foi impossibilidade de entrar no apartamento, tendo sido insultado e ameaçado, em circunstâncias que descreve;
- Autor e Ré, para aquisição das fracções objecto dos presentes autos, contraíram um empréstimo bancário à habitação junto do banco D…, S.A. no valor de €122.205,00, constituindo hipoteca voluntária a favor de tal entidade bancária e que se encontra registada, empréstimo que foi integralmente utilizado aquando da aquisição de tais fracções autónomas e que se encontra, em parte, por pagar.
- A obrigação pecuniária emergente de tal empréstimo apenas vem sendo suportada pelo Autor, designadamente, as prestações mensais, bem como o pagamento dos seguros: a prestação mensal do empréstimo é de € 309,35; o seguro de vida tem o valor mensal de € 71,81; o seguro multirriscos do imóvel anual é de € 47,50; o seguro do recheio da habitação anual é de € 80,52, sendo que este o autor apenas o manteve até Outubro de 2008;
- Desde a data do divórcio e até ao dia 13 de Dezembro de 2012, o autor pagou os seguintes montantes:
- € 36.035,85 a título das prestações mensais ao banco devido ao empréstimo para aquisição das fracções;
- € 5.741,17, relativo ao seguro de vida;
- € 1.008,57, a título de seguro multirriscos;
- € 322,42 a título de seguro do recheio;
- as prestações bancárias referentes aos meses de Dezembro de 2012, Janeiro de 2013, no valor de € 619,74 e Fevereiro de 2013, no valor de € 309,35, bem como o seguro de vida, referentes a tais meses, no montante de total de € 214,66;
- Para além de todas as prestações e seguros liquidados pelo Autor, também por si só têm sido, desde que adquiriu aquelas fracções conjuntamente com a Ré, suportados todos os encargos inerentes ao condomínio do edifício em propriedade horizontal, tendo até Dezembro de 2012 liquidado o montante de € 3.578,50;
- Deve ser ressarcido por metade dos valores pagos, sendo que o montante que aqui reclama, também é devido, a título de enriquecimento sem causa, que residualmente invoca.
- A Ré deverá também ser condenada a pagar metade do valor que o Autor teria que pagar pela renda de um imóvel idêntico ao apartamento dos presentes autos e que atendendo às características e localização, nunca seria inferior a € 500,00
- Até à data, 14 de Fevereiro de 2013, a título de renda mensal, contabiliza-se o montante de € 50.00,00, devendo a ré a pagar metade deste montante, como indemnização pelo facto de o Autor não poder habitar nem usufruir do imóvel e que corresponde a metade do valor de uma renda para um imóvel idêntico.
Regulamente citada a ré apresentou contestação, em que concluiu pela improcedência dos pedidos formulados pelo autor.
Sumariamente alegou que:
- As dívidas a que o autor se arroga credor não foram relacionadas no divórcio, nem tão pouco foram partilhados os bens que são comuns, ou que se encontram em compropriedade.
- A responsabilidade pelo pagamento do empréstimo bancário junto do D…, com vista a aquisição das referidas fracções no valor de 122.205,00 euros e as prestações dos seguros de vida e até condomínio, pertence quer ao autor, quer à ré, empréstimo esse, bem como os seguros associados, que se encontram a ser liquidados através de débito em conta do D…, conta essa que é solidária e são titulares quer o Autor quer a Ré;
- A conta e os respectivos saldos de depósitos em conta pertencem a ambos em partes iguais.
- A existir um crédito só poderá ser exigida em sede de partilha ou in caso, na data da venda ou adjudicação dos imóveis;
- A Ré nunca proibiu o Autor de habitar na casa de morada de família e consequentemente nunca se opôs ao que ficou acordado aquando do divórcio quanto ao destino da mesma, ou seja, que nela habitariam até à venda ambos os ex-cônjuges;
- Por causa das relações agudizadas entre os ex-cônjuges o A. nunca mais quis permanecer na que era até então casa de morada de família.
- Quanto às ameaças, injurias e demais queixas-crime, alegadas, designadamente quanto ao processo n.º 1161/04.5GBAGD, as mesmas foram todas arquivadas;
- A Ré nunca proibiu o A. de viver na então casa de morada de família e habita-a no exercício de um direito, não sendo da sua responsabilidade o pagamento de qualquer renda ou hipotética renda, pelo elevado valor e 500,00€ ou outro, constando do acordo após o divórcio que a casa de morada de família ficava atribuída a ambos os ex-cônjuges até à venda e por possuir tamanho e número de divisões que permite a necessária privacidade entre os futuros ex-cônjuges que nela ficarão a habitar até à venda;
O autor apresentou articulado de réplica, concluindo como na petição inicial, referindo que estão em causa dívidas posteriores ao divórcio, motivo pelo qual não deveriam, nem teriam de ser relacionadas num processo de partilha.
Mais referiu que no processo de divisão de coisa comum requereu o pagamento dos montantes em causa nesses autos, tendo sido proferida decisão, quanto a essa matéria, a considerar que deveria ser uma questão dirimida no processo comum ordinário.
Referiu ainda que todos os valores que foram depositados na conta solidária desde o divórcio pertencem ao autor, que a aprovisiona para proceder a esses pagamentos, conta que não foi cancelada após o divórcio por ser uma conta associada ao empréstimo bancário.
Requer, ainda, a condenação da ré como litigante de má-fé.
Foi proferido despacho saneador (na vigência do CPC anterior ao CPC aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho) em que se afirmou a validade e regularidade da instância e onde foi seleccionada a matéria de facto assente e elaborada a base instrutória.
Foram admitidos os meios de prova.
Foi designada a realização da audiência final.
No âmbito da audiência final foi elaborada uma transacção, que não foi homologada por oposição da ré.
Prosseguiram os autos com a designação da audiência final.
Posteriormente foi o processo suspenso, pelo facto de se encontrar pendente um processo especial de inabilitação/interdição relativo à ré.
No processo especial de interdição foi proferida decisão final, transitada em julgado em 07-03-2018, na qual se julgou improcedente o pedido.
Foi declarada cessada a suspensão da instância, prosseguindo os autos para julgamento.
Procedeu-se a realização da audiência final com observância de todo o formalismo legal no culminar da qual foi proferida sentença na qual se julgou parcialmente procedente a acção e se condenou a ré a pagar ao autor:
A) A quantia de € 22.632,97 (vinte e dois mil, seiscentos e trinta e dois euros e noventa e sete cêntimos) acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, desde a citação, calculados à taxa legal de 4%, até efectivo e integral pagamento;
B) Se absolveu a ré dos demais peticionado.
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A ré veio interpor recurso desta decisão, apresentando desde logo e nos termos legalmente prescritos as suas alegações.
O autor contra alegou.
Foi proferido despacho no qual se considerou o recurso tempestivo e legal e se admitiu o mesmo como sendo de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito meramente devolutivo.
Recebido o processo nesta Relação emitiu-se despacho onde se teve o recurso por próprio, tempestivamente interposto e admitido com efeito e modo de subida adequados.
Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
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II. Enquadramento de facto e de direito:
Ao presente recurso são aplicáveis as regras processuais da Lei nº 41/2013 de 26 de Junho.
È consabido que o objecto do presente recurso, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso obrigatório, está definido pelo conteúdo das conclusões vertidas pela ré/apelante nas suas alegações (cf. artigos 608º, nº2, 635º, nº4 e 639º, nº1 do CPC),
E é o seguinte o teor dessas mesmas conclusões:
B1. Vem o presente recurso ordinário de apelação interposto da sentença proferida pelo tribunal de primeira instância que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou a aqui R. ao pagamento ao A. da quantia de € 22.632,97.
B2. Os motivos de dissídio prendem-se com o erro no julgamento da matéria de facto, designadamente no facto de o Tribunal a quo não ter interpretado correctamente a prova documental e testemunhal constante dos autos e, por tal facto, ter julgado mal provados determinados factos e/ou julgou não provados outros. Por fim, e considerando a alteração propugnada em sede de matéria de facto, não se concebe o julgamento efectuado em sede de direito.
B3. Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 640º do CPC incumbirá, antes de mais, elencar os pontos de facto que mereceram, erradamente – salvo o devido respeito – resposta positiva:
17.º Até à data em que se decretou o divórcio, a Ré não residia no apartamento aludido em 3º (1º da BI);
22.º Desde a data do divórcio e até ao dia 13 de Dezembro de 2012, o Autor, tem pago, a expensas suas, e exclusivamente, as quantias, a saber: i) € 36.035,85, a título das prestações mensais ao banco devido ao empréstimo para aquisição das fracções aludidas em 3º; ii) € 5.741,17 relativo ao seguro de vida; iii) € 1.008,57, a título de seguro multirriscos das fracções sub judice; iv) € 322,42, a título de seguro do recheio… (artigo 12º da BI)
23.º E posteriormente, o Autor liquidou as prestações bancária referentes a: i)Aos meses de Dezembro de 2012, Janeiro de 2013, no valor de € 619,74; ii) Fevereiro de 2013, no valor de € 309,35, e iii) Seguro de vida, referentes a tais meses, no montante de total de € 214,66 (artigo 13º da BI)
24.º Desde o divórcio até Dezembro de 2012 o autor, a expensas suas, pagou a totalidade dos encargos inerentes ao condomínio do edifício em propriedade horizontal, nos seguintes valores montantes: - Quotas de Março, Abril de 2006 e quota extra 2006, respectivamente nos valores de € 47,01, € 47,01, € 77,97, num total de € 171,99 (fls. 56) - Quotas de Junho, Julho, Agosto e Setembro de 2006, no valor individual de € 47,01, num total de € 188,24 (fls. 55); - Quotas de Outubro a Dezembro de 2006, no valor de € 141,03 (fls. 54); - Quotas de Janeiro de 2007 no valor de € 47,01 (fls. 54); - Quotas de Setembro de 2007 a Maio de 2008, num total de € 223,22 (fls. 57); - Quota extra relativa à apólice do seguro multirriscos, pago em Novembro de 2008, no valor de € 46,40 (fls. 58); - Quotas de Junho a Novembro de 2008, no total de € 196,30 (fls. 58); Num total de € 1.014,19. (resposta com esclarecimento ao artigo 14º da BI)
E, agora, aquele que erradamente mereceu resposta negativa:
16º - As quantias devidas, a título de empréstimo e seguros associados a este, desde o divórcio até Fevereiro de 2013, foram pagos pelo Autor e Ré conjuntamente através de débito, em conta conjunta de ambos existente no D…, S.A
B4. Passam a identificar-se os meios probatórios susceptíveis de alterar os factos julgados provados na sentença em crise. E assim: - Depoimento prestado pela testemunha E…, na sessão de julgamento que teve lugar no dia 07.03.2019, depoimento gravado gravada, na aplicação H@bilus [módulo H@bilus Média Studio], 14:16:28 a 14:49:29, ficheiro 20190307141628; - Depoimento prestado pela testemunha F…, na sessão de julgamento que teve lugar no dia 07.03.2019, depoimento gravado gravada, na aplicação H@bilus [módulo H@bilus Média Studio], 14:50:40 a 15:52:41, ficheiro 20190307145038; - Documentos de fls. (extractos bancários juntos aos autos pela Direcção Jurídica do D…, de 19.11.2013, documentos juntos pela R. no seu requerimento de 05.06.2013).
B5. No que se reporta ao facto 17º da Base Instrutória (Factos Provados): A testemunha E…, na sessão de julgamento que teve lugar no dia 07.03.2019, depoimento gravado gravada, na aplicação H@bilus [módulo H@bilus Média Studio], 14:16:28 a 14:49:29, ficheiro 20190307141628, tempo 03:19 a 03:47, pessoa reputada como idónea pelo Tribunal a quo e efectivamente conhecedora do assunto em questão, quer por ter residido no prédio desde 2001, quer por ser administradora do condomínio dele desde 2004, referiu expressamente que a R. residia no apartamento antes do divórcio. Donde, deveria o ponto 17 da Base instrutória (factos provados) ter sido julgado como não provado.
B6. Dos factos provados sob 22 e 23 e daquele outro não provado sob 16: a este respeito, o Tribunal a quo firmou a sua convicção nos documentos de fls. 93, 136 e 319 a 439, limitando-se, no que tange aos valores alegadamente apurados como pagos pelo A., a reproduzir o teor do documento 15 junto com a petição inicial. Ora, B7. O referido documento 15 consubstancia um documento particular, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 363º-1-2, in fine e 373º e ss, todos do CC; trata-se de um documento emitido por uma agência (a de Águeda); desconhece-se a autoria da assinatura; não identifica o crédito hipotecário a que se reporta; o seu teor foi impugnado na contestação (artigo 19º); é infirmado pelo teor de outros juntos pelo próprio A. (v.g. o documento nº 1 junto com a réplica) e por documentos bancários emitidos pela Direcção Jurídica.
B8. Considerando o exposto na conclusão antecedente, não poderia o Tribunal a quo ter considerado como válidas e verdadeiras as afirmações constantes do referido documento e, dessarte, estribado a sua posição, quanto aos referidos factos, naquela prova, violando, com tal jeito de proceder, o disposto nos artigos 363º, 373º e 376º, todos do CC e, ainda, julgando incorrectamente como provados os factos 22 e 23 dos factos provados e como não provado o facto 16. Ainda e ad cautelam,
B9. Diz-se, na sentença recorrida, que o dinheiro depositado na conta de DO associada ao crédito hipotecário provinha de contas bancárias da titularidade exclusiva do autor e/ou de uma sociedade da qual o mesmo era representante, donde era mister identificar os pagamentos que foram efectuados pelo A. e aqueles outros que foram efectuados pela predita sociedade já que, quanto a estes, apenas a própria sociedade pode reclamá-los, por deter capacidade judiciária própria.
B10. Com efeito, os documentos juntos pelo Banco D… a fls. (cfr. documento datado de 19.11.2013, junto aos autos a 25.11.2013) não referem a origem das transferências efectuadas para a conta associada ao empréstimo hipotecário (isto é, se do A., se da referida sociedade), o que só seria possível através dos elementos de suporte associados aos movimentos de transferência, cuja junção não foi requerida pelo A. nem oficiada pelo Tribunal a quo.
B11. E, cabendo ao A. o ónus da prova dos pagamentos que efectivamente efectuou, (art. 342º do CC), considerando que a falta de prova apenas a ele lhe é imputável, nunca poderia o Tribunal a quo ter decidido a matéria de facto encerrada nos pontos ut supra do jeito que o fez, por falta de elementos probatórios nesse sentido, violando, ainda, o disposto no referido art. 411º do CPC e art. 342º CC. Mas ainda que assim não se entendesse: 21
B12. Considerando, como parece ter feito o Tribunal a quo, que os sócios da indicada sociedade podem beneficiar dos pagamentos por ela efectuados, afigurava-se-lhe mister apurar qual o grau de participação da R. naquela sociedade de modo a, também ela, na respectiva proporção da quota de que é detentora, beneficiar dos pagamentos pela sociedade efectuados e, ao não fazê-lo, o Tribunal violou o dever de indagação oficiosa ínsito no art. 411º do CPC. Ainda:
B13. O Tribunal a quo, nas contas elaboradas, considerou um pagamento efectuado em Setembro de 2004 que não é, de todo, chamado a estes autos (na causa de pedir apenas se invocam pagamentos a partir de Outubro de 2004), donde sempre os referidos pontos 22 e 23 devem ser julgados não provados. Prosseguindo:
B14. O Tribunal a quo não valorou devidamente o depoimento da testemunha F…, na sessão de julgamento que teve lugar no dia 07.03.2019, depoimento gravado gravada, na aplicação H@bilus [módulo H@bilus Média Studio], 14:50:40 a 15:52:41, ficheiro 20190307145038, 24:10 a 25:13 e 28:20 a 29:22), o qual referiru ter presenciado a R. a pagar, em numerário, algumas prestações associadas ao crédito bancário, declarações essas que vêm corroboradas pelos documentos juntos com o requerimento de 05.06.2013 – documentos emitidos pela Direcção do Banco e não pela agência de Águeda, aliás em litígio com a aqui recorrente (veja-se o depoimento da testemunha supra indicada aos minutos 28:20 a 29:22) – dos quais resulta que a R. também efectuou pagamentos: € 1996,58 relativos a capital e juros pagos no ano de 2011 e € 1.359,41 a título de capital no ano de 2012.
B15. Ora, assim, sempre o Tribunal a quo deveria – e deve-se – ter “abatido” esses valores pagos pela R. aqueles efectivamente pagos pelo A..
B16. Diga-se, a final, que os valores apurados em cada um dos documentos juntos pelo A. (doc. 15 da petição inicial e doc. 1 da réplica) são díspares entre si (para o mesmo período existem diferença superiores a € 10.000,00), donde não tendo o Tribunal a quo justificado a razão de valorar um documento em detrimento de outro é causa de nulidade da sentença, ao abrigo do disposto no art. 615, b) do CPC que ora se invoca para os legais e devidos efeitos.
B17. No que respeita ao ponto 24º dos Factos Provados: dos recibos juntos pelo A., designadamente naquele de fls. 58, relativo ao pagamento das quotas de Junho a Novembro de 2008, resulta que o A. pagou a quantia de € 150,30 e não € 196,30. Concomitantemente, o valor em dívida em sede de quotas de condomínio, a final, será de € 968,46 ao invés dos € 1.014,19 fixados na sentença recorrida e, nessa medida, deve o referido ponto 24º ser alterado em conformidade.
B19. Em suma: No que tange aos factos provados constantes da sentença recorrida sob 17, 22 e 23, deveriam os mesmos ter sido julgados como não provados; No que atine ao facto não provado sob 16 da sentença recorrida deveria o mesmo ser julgado provado e, em consequência, ser o mesmo aditado aos factos provados; O facto 24 dos factos provados deve ser julgado como provado mas com a seguinte alteração: 24.º Desde o divórcio até Dezembro de 2012 o autor, a expensas suas, pagou a totalidade dos encargos inerentes ao condomínio do edifício em propriedade horizontal, nos seguintes valores montantes: - Quotas de Março, Abril de 2006 e quota extra 2006, respectivamente nos valores de € 47,01, € 47,01, € 77,97, num total de € 171,99 (fls. 56) - Quotas de Junho, Julho, Agosto e Setembro de 2006, no valor individual de € 47,01, num total de € 188,24 (fls. 55); - Quotas de Outubro a Dezembro de 2006, no valor de € 141,03 (fls. 54); - Quotas de Janeiro de 2007 no valor de € 47,01 (fls. 54); - Quotas de Setembro de 2007 a Maio de 2008, num total de € 223,22 (fls. 57); - Quota extra relativa à apólice do seguro multirriscos, pago em Novembro de 2008, no valor de € 46,40 (fls. 58); - Quotas de Junho a Novembro de 2008, no total de € 150,30 (fls. 58); Num total de € 968,46. (resposta com esclarecimento ao artigo 14º da BI);
B20. Ante o exposto, por erro na interpretação da prova produzida e, ainda, por violadora do disposto nos arts. 411º CPC e 342º, 363º, 373º e 376º, todos do CC, deve a sentença sob escrutínio ser revogada e substituída por outra que altere a matéria de facto nos termos supra descritos.
B21. A fundamentação exclusivamente de direito constante da sentença colocada em crise não merece, em si, censura. Não obstante, a alteração em sede de matéria de facto, tal qual propugnado supra, terá os seus inexoráveis reflexos em sede de matéria de direito, designadamente considerando-se que o A. não logrou fazer a prova que lhe competia, de acordo com a repartição do ónus da prova, acerca dos valores por ele efectivamente pagos, em nome pessoal, a título de crédito hipotecário e despesas associadas. E, por outro lado, que a R. almejou demonstrar e provar que residia no apartamento anteriormente ao divórcio e que efectuou alguns pagamentos.
B29. Por conseguinte, por violadora do disposto nos arts. 342º e 524º ambos do CC, deve a sentença recorrida, também na parte de direito, ser revogada e substituída por outra que julgue improcedente a acção proposta pelo A., com as legais consequências.
Termos em que, na procedência do presente recurso, deverá a sentença proferida pelo Tribunal a quo ser revogada e substituída por outra que julgue improcedente a acção proposta pelo A., com as legais consequências, assim se fazendo a COSTUMADA JUSTIÇA!!!!
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Por seu turno o autor/apelante conclui do seguinte modo as suas contra alegações:
A) O Tribunal a quo, ao tomar posição sobre os factos sub judice, analisou e valorou correctamente todos os meios de prova produzidos nos autos, como ressalta da douta fundamentação de facto constante da decisão recorrida e que, por com ela se concordar, aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os devidos e legais efeitos, tendo analisado a globalidade da prova, no seu conjunto, atendendo às regras da experiência comum e tendo feito uma análise critica da mesma, como consta da douta fundamentação de facto.
B) Sendo que os depoimentos da testemunha que a Apelante indica nas suas alegações de recurso, a testemunha F… – que é o actual companheiro/marido da Apelante –, não mostrou conhecimento da realidade factual, cujo ónus da prova era da Apelante; não bastando, em sede de recurso, que os Apelantes apresentem apenas uma afirmação de cada uma das testemunhas, totalmente descontextualizada do conjunto do depoimento, para poder querer que o Tribunal ad quem altere a resposta dada a tal matéria de facto pelo Tribunal a quo o que nunca poderá suceder. Ora
C) O que estava em causa nos presentes autos era apurar que o Apelado, só ele, liquidou as prestações de empréstimo à habitação desde a data do divórcio, sem que a Apelante tivesse contribuído com um único cêntimo, tendo o Apelado logrado provar – através da prova documental junta aos autos e da prova testemunhal – que efectuou, sozinho, o pagamento de tais prestações bancárias que reclamou dos autos, bem como o pagamento dos prémios de seguro e de condomínio.
D) Já a Apelante, na sua douta contestação, excepcionou ao alegar que a conta donde eram retirados os valores das prestações era uma conta solidária e que, portanto, segundo ela, se presumia que os valores aí depositados eram dos dois, tendo alegado que aí depositava valores, não tendo logrado provar nos autos que tivesse em algum momento, após o divórcio, depositado ou transferido qualquer valor monetário para a conta bancária do D… onde eram debitadas as prestações, sendo que era a ela que competia o ónus da prova desse facto que alegou.
E) A Apelante não indica qual a razão de ciência e a razão que levaria este Venerando Tribunal a alterar a resposta dada pela Meritíssima Juiz a quo, quando esta viu todos os pormenores do processo e que presidiu ao julgamento e pôde ouvir e perceber os gestos corporais das testemunhas, entendeu, e bem, que as referidas testemunhas da Apelante, na matéria que responderam por esta alegada, não tinham conhecimento dos factos, o que se depreende até da audição do conjunto do depoimento.
F) Com efeito, quanto ao facto provado sob o ponto 17º, que não merece censura, o Tribunal a quo refere que “foram valorados os depoimentos das testemunhas: G…, que revelou conhecimento sobre estes factos e que foi corroborado pelo depoimento da testemunha E…”. Ora
G) A Apelante pretende que tal facto seja dado como não provado indicando o depoimento da testemunha indicada E…, contudo em parte alguma das suas doutas alegações transcreve ou refere qualquer passagem do seu depoimento que ponha em causa o que pelo Tribunal a quo foi julgado, como devia tê-lo feito, para além de que, com se deixou dito, não basta apresentar uma frase do depoimento, antes terá que se ter em conta a globalidade e contexto do mesmo.
H) No que concerne aos factos dados como provados sob os pontos 22º e 23º, que não merece censura, é referido que “valoramos a vasta prova documental que consta dos autos sobre essa matéria, nomeadamente os documentos de fls. 93, 136 e extractos bancários de fls. 319 a 439, documentos que atestam os valores que foram pagos e de onde provinham as quantias que eram transferidas para a conta solidária de autor e ré, associada ao crédito bancário. Desses documentos verifica-se que as quantias necessárias para proceder ao pagamento das prestações vinham de contas bancárias da titularidade exclusiva do autor e/ou de uma sociedade da qual o mesmo era representante.”
I) Com efeito, a Apelante, na impugnação que faz desses factos, apenas alega de forma vaga que o Tribunal a quo não interpretou correctamente a demais prova documental junta – mas qual e em que medida tal prova documental infirmaria os documentos que o Tribunal a quo considerou como válidos e credíveis –, e não relevou o depoimento da testemunha F… – que é companheiro/marido da Apelante e, por isso, com interesse directo na causa – mas sem, mais uma vez, dizer em que medida o que por este foi dito, de forma parcial como considerou o Tribunal a quo, poderia pôr em causa a validade dos documentos probatórios que o Apelado juntou aos autos.
J) Pelo que os argumentos que a Apelante expende, para pôr em crise, a resposta data a tais factos, não têm qualquer acolhimento legal, já que se a Apelante tivesse transferido ou depositado valores para a conta solidária, teria vindo aos autos juntar documentos de tal realidade, o que não fez porque nunca nela depositou qualquer cêntimo, como bem sabe e ao dizer o contrário falta à verdade.
K) Por outro lado, também o depoimento do companheiro - marido no Brasil pois aí estão casados - da Apelante, que tem interesse directo na causa, não mostrou qualquer conhecimento desses factos, tendo sido um depoimento, como é referido pelo Tribunal a quo, “que se revelou pouco isento e contrário aos restantes elementos de prova”.
L) Daí que bem esteve o Tribunal a quo, ao dar como provada a factualidade dos pontos 22º e 23º, em dar como não provada a factualidade do ponto 16º dos factos não provados, é referido e bem na douta fundamentação que “sobre os pagamentos que a ré sustenta serem, em conjunto pelo facto de serem titulares de uma conta solidária, a prova produzida, sobre a qual já nos pronunciámos, indicou que apenas foi o autor quem procedia aos pagamentos. Os únicos documentos juntos pela ré, com os quais pretendia sustentar a sua posição, são as duas declarações emitidas pela entidade bancária em seu nome para efeitos de IRS – fls. 146 a 148 – que não constituem prova que abalasse os restantes documentos que comprovam que a conta solidária do casal e provisionada com fundos vindos de contas tituladas unicamente pelo autor e não com valores depositados pela ré.”
M) Também o facto sob o ponto 24º não merece qualquer alteração à sua resposta e nem a Apelante, uma vez mais, indica qualquer meio de prova que tivesse sido atendido pelo Tribunal a quo ou que ponha em causa a decisão de facto sobre essa matéria.
N) Daí que não se imponha nenhuma alteração à matéria de facto considerada pelo Tribunal a quo e, muito menos, em relação aos factos que a Apelante impugna, mas que bem sabe que a resposta que foi dada aos mesmos pelo Tribunal a quo o foi atendendo à análise criteriosa de toda a prova existente nos autos, sendo que nenhuma testemunha, designadamente, as indicadas pelo Apelantes logrou demonstrar a versão que a Apelante nestes autos pretendia.
O) Ante os factos dados como provados – e que terão que se considerar fixados – muito bem esteve o Tribunal a quo na aplicação do direito a tais factos, não merecendo, nesta parte, qualquer censura a douta decisão recorrida, pelo que o Apelado concordando com a douta fundamentação da sentença recorrida dá aqui e agora e para os devidos e legais efeitos a mesma por integralmente reproduzida, não se mostrando violadas as normas indicadas pela Apelante.
P) Pelo exposto, não há nenhum fundamento alegado pelos Apelantes, nas suas alegações de recurso, que contrarie o que foi doutamente decidido pelo Tribunal a quo, devendo a douta sentença recorrida manter-se nos termos em foi proferida, deixando-se impugnadas as doutas conclusões de recurso B1 a B29 apresentadas pela Apelante.
TERMOS EM QUE
Deverá ser negado provimento ao recurso e, consequentemente, deverá ser mantida a douta decisão recorrida nos exactos termos em que foi proferida, tudo com os demais termos até final.
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Perante o antes exposto, resulta claro que são as seguintes as questões suscitadas neste recurso:
1ª) A impugnação da decisão da matéria de facto;
2ª) A revogação da sentença no segmento da mesma em que condenou a ré a pagar ao autor as quantias correspondentes a metade das prestações do crédito hipotecário e despesas associadas, bem assim como as despesas de condomínio na proporção de 50%, tudo no valor de € 22.632,97, mais juros de mora.
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Ora estando em causa a decisão de facto que aqui foi proferida, importa, antes do mais, recordar aqui qual o seu conteúdo.
Assim:
Factos provados:
Matéria considerada como assente no despacho saneador elaborado nos autos:
1. Autor e Ré contraíram casamento civil no Registo Civil de …, Estado de S. Paulo, Brasil, no dia 13 de Setembro de 1991, no regime de separação de bens, conforme decorre do teor doc. n.º 1 junto com a petição inicial. (A)
2. No dia 12 de Outubro de 2004 foi decretado o divórcio do Autor e Ré por decisão proferida pela Exma. Sra. Conservadora do Registo Civil de Águeda, transitada no mesmo dia, conforme decorre do doc. nº2 junto com a petição inicial. (B)
3.ºA Ré reconhece que Autor e a Ré são comproprietários das seguintes fracções autónomas do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Rua …, n.º .., freguesia e concelho de Águeda, descrito na Conservatória do Registo Predial de Águeda sob o n.º 07134/24052001 e inscritos registralmente a seu favor nesses termos, a saber:
a) Fracção “AG” correspondente ao terceiro andar direito (ala Norte) destinado a habitação – garagem G vinte e quatro, de nascente com galeria de circulação Norte-Sul de nascente, de poente apartamento tipo T3, com 174 m2, composto por vestíbulo de entrada, cozinha com área de serviço, despensa, sala comum com varanda, três quartos de dormir, sendo dois com varanda, dois quartos de banho, um lavabo e arrecadação S -seis com 11,5 m2, localizada no sótão (a última do lado esquerdo, contada do sentido Norte para Sul, a partir da casa das máquinas do elevador da ala Norte);
b) Fracção “P”, correspondente à garagem na cave com 22 m2, designada por G vinte e três, a confrontar do Norte com galeria de circulação nascente -poente de Norte, do Sul com garagens G vinte e cinco e G vinte e seis;
c) Fracção “Q” correspondente à garagem na cave com 23 m2, designada por G vinte e quatro, a confrontar do Norte com garagem G vinte e três, de Sul com galeria de circulação nascente -poente de Sul, de nascente de circulação Norte-Sul de nascente, de poente com as garagens G vinte e seis e G vinte e sete, conforme decorre do teor dos docs nºs 3, 4, 5, 6, 7 e 8 juntos com a petição inicial. (C);
4.º Após ter sido decretado o divórcio entre o Autor e a Ré, esta instaurou, em 26 de Outubro de 2004, uma acção especial de divisão de coisa comum, que inicialmente seguiu os seus trâmites pelo 1º Juízo do extinto Tribunal Judicial da Comarca de Águeda e que finalmente (após a entrada em vigor das NUT’s piloto) correu seus termos pelo Juízo de Média e Pequena Instância Cível de Águeda, da Comarca do Baixo Vouga, com o n.º 154/04.8TBAGD, sobre as mesmas fracções que se elencam na al. c) dos Factos Assentes, onde peticionou que se declarasse a indivisibilidade das fracções sub judice. (D)
5.º O Autor não apresentou contestação, confessando o seu interesse na divisão de tais imóveis, pelo que, tal acção foi julgada procedente por provada e, consequentemente, foi declarada a indivisibilidade das fracções objecto dos presentes autos e determinada a adjudicação, ou venda, das mesmas, por douta sentença já transitada em julgado, datada de 20 de Maio de 2005, conforme se infere do doc. n.º 9 junto com a petição inicial. (E) e F));
6. Na sequência do trânsito em julgado de tal decisão, o processo seguiu seus termos para a fase da adjudicação ou venda das fracções, determinando-se a venda mediante negociação particular, pelo melhor preço, com designação de um encarregado de venda por nomeação judicial. (G);
7. No decurso de tal negociação particular, mediada pela H…, Lda., o Autor demonstrou o seu interesse em adquirir os imóveis melhor identificados na al. c) dos Factos Assentes, fazendo sempre as mais altas propostas de compra. (H)
8. No prosseguimento da apresentação das propostas, no dia 6 de Julho de 2009, veio o aqui Autor apresentar aos autos daquela acção requerimento junto como doc. nº 10 junto com a petição inicial. (I)
9.º No âmbito do processo n.º 663/09.1T2AND, que corre termos pelo Juízo de Média e Pequena Instância Cível de Águeda, foi declarada a indivisão dos prédios e ordenado o prosseguimento dos autos para a fase de adjudicação, encontrando-se actualmente à espera de os bens serem vendidos por negociação particular, conforme se infere do doc. n.º 11 junto com a petição inicial. (J)
10.º Autor e Ré, aquando do divórcio, acordaram que a casa de morada de família e que corresponde à fracção “AG” melhor identificada na al. C) dos Factos Assentes, ficaria atribuída a ambas as partes, podendo ambos nela residir, conforme decorre do teor do doc. n.º 2 junto com a petição inicial. (K);
11.º O Autor apresentou queixa-crime contra a Ré e seu companheiro, o que deu origem ao processo n.º 1161/04.5GBAGD, conforme se infere do doc. n.º 12 junto com a petição inicial e que viria a ser arquivado, conforme decorre do teor do doc. nº1 junto com a contestação. (L e M);
12.ºAutor e Ré, para aquisição das fracções aludidas em c), contraíram um empréstimo bancário à habitação junto do banco D…, S.A. no valor de €122.205,00, constituindo hipoteca voluntária a favor de tal entidade bancária e que se encontra registada. (N)
13.º O referido empréstimo foi integralmente utilizado aquando da aquisição de tais fracções autónomas e que se encontra por pagar. (O; P);
14.º Na presente data, a prestação mensal do empréstimo aludido em O) dos Factos Assentes (actual artigo 13º dos factos provados) está fixada no valor de € 309,35 e a título de seguro de vida, exigido pela entidade bancária mutuante, é devido o prémio mensal de €71,81 e pelo seguro multirriscos do imóvel, é devido o prémio anual de € 47,50 e pelo seguro do recheio da habitação mantido até Outubro de 2008, o prémio anual devido era de € 80,52 (alíneas Q, R, S e T).
15º No dia 17 de Julho de 2009 a ré desistiu do pedido formulado no processo identificado em 4º, contra a oposição do autor, desistência que foi homologada por sentença proferida no dia 29 de Setembro de 2009 (certidão de fls. 263 a 279);
16.º O autor instaurou em 19 de Novembro de 2009 o processo identificado em 9º (certidão de fls. 164 a 236);
Base Instrutória:
17.º Até à data em que se decretou o divórcio, a Ré não residia no apartamento aludido em 3º (1º da BI);
18.º No mesmo dia em que foi decretado o divórcio, o Autor deslocou-se ao apartamento, e verificou que se encontrava nele instalada a Ré com mais uma pessoa (2º BI);
19.º Nesse dia o autor chamou a GNR (resposta restritiva ao artigo 4º da BI);
20.º No dia 14 de Outubro de 2004 o autor deslocou-se mais uma vez ao apartamento (7º da BI);
21.º O apartamento tem vindo a ser habitado pela Ré e seu companheiro quem única e exclusivamente vem habitando e usufruindo os imóveis (resposta restritiva ao artigo 11º da BI)
22.º Desde a data do divórcio e até ao dia 13 de Dezembro de 2012, o Autor, tem pago, a expensas suas, e exclusivamente, as quantias, a saber:
i) € 36.035,85, a título das prestações mensais ao banco devido ao empréstimo para aquisição das fracções aludidas em 3º;
ii) € 5.741,17 relativo ao seguro de vida;
iii) € 1.008,57, a título de seguro multirriscos das fracções sub judice;
iv) € 322,42, a título de seguro do recheio… (artigo 12º da BI)
23.º E posteriormente, o Autor liquidou as prestações bancárias referentes a:
i) Aos meses de Dezembro de 2012, Janeiro de 2013, no valor de € 619,74;
ii) Fevereiro de 2013, no valor de € 309,35, e
iii) Seguro de vida, referentes a tais meses, no montante de total de € 214,66 (artigo 13º da BI)
24.º Desde o divórcio até Dezembro de 2012 o autor, a expensas suas, pagou a totalidade dos encargos inerentes ao condomínio do edifício em propriedade horizontal, nos seguintes valores montantes:
- Quotas de Março, Abril de 2006 e quota extra 2006, respectivamente nos valores de € 47,01, € 47,01, € 77,97, num total de € 171,99 (fls. 56)
- Quotas de Junho, Julho, Agosto e Setembro de 2006, no valor individual de € 47,01, num total de € 188,24 (fls. 55);
- Quotas de Outubro a Dezembro de 2006, no valor de € 141,03 (fls. 54);
- Quotas de Janeiro de 2007 no valor de € 47,01 (fls. 54);
- Quotas de Setembro de 2007 a Maio de 2008, num total de € 223,22 (fls. 57);
- Quota extra relativa à apólice do seguro multirriscos, pago em Novembro de 2008, no valor de € 46,40 (fls. 58);
- Quotas de Junho a Novembro de 2008, no total de € 196,30 (fls. 58);
Num total de € 1.014,19. (resposta com esclarecimento ao artigo 14º da BI)
25.º Um apartamento, com características do aludido em 3º, a título de arrendamento, custa, no mínimo, € 500,00 (15º BI)
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Factos não provados:
Da Base Instrutória:
3º…a qual intimidou o Autor e ameaçou-o, que se abrisse a porta, o matava…?
4º - Provado apenas o que consta do artigo 19º dos factos provados;
5.º…e , com receio das ameaças, já não pernoitou no imóvel…?
6º …como vinha acontecendo até tal data?
8º …tendo sido ameaçado pelo companheiro da Ré, que passou aí a habitar, com um revolver e agrediu-o aos murros e pontapés...?
9º …e dizendo-lhe ambos que se lá voltasse seria logo morto…?
10º …e sempre que se desloca ao prédio para prestar serviços profissionais ao condomínio é ameaçado e agredido fisicamente pelo companheiro da Ré…?
11.º - Provado apenas o que consta do artigo 21º dos factos provados;
14.º Provado apenas o que consta do artigo 24º dos factos provados;
16º - As quantias devidas, a título de empréstimo e seguros associados a este, desde o divórcio até Fevereiro de 2013, foram pagos pelo Autor e Ré conjuntamente através de débito, em conta conjunta de ambos existente no D…, S.A.
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Para justificar o seu recurso da decisão de facto a ré/apelante cumpre devidamente os ónus previstos no artigo 640º, nºs 1 e 2 do CPC (cf. conclusões B4 a B27).
Vejamos, pois, se com fundamento.
Assim e no que toca ao ponto 17º dos Factos Provados (1º da Base Instrutória), chama à colação o depoimento prestado em julgamento pela testemunha E….
Perante tal alegação e como nos era imposto, procedeu-se à audição da gravação onde foi registado o depoimento da referida testemunha.
Procedemos ainda à audição da gravação do depoimento da testemunha G…, no qual o Tribunal “a quo”, também justificou a resposta afirmativa a tal matéria.
E destas audições não extraímos elementos suficientes para dar como provado o facto vertido no ponto 1º da Base Instrutória, cujo teor aqui recordamos:
“Até à data em que se decretou o divórcio, a Ré não residia no apartamento aludido em K) dos Factos Assentes…?”
Assim, a testemunha E…, vizinha do dissolvido casal no imóvel dos autos e administradora do respectivo condomínio desde 2004/2005, afirmou com convicção que o Autor e a Ré viveram ambos no apartamento em questão até à altura em que foi decretado o divórcio no ano de 2004.
Já a testemunha G…, amiga de infância do Autor e antiga funcionária do escritório de advogado que em determinada altura o representou, referiu que antes do divórcio quem habitava o apartamento era apenas a Ré.
A ser deste modo, não podia pois o Tribunal “a quo” ter dado como provada tal matéria tendo por base tais depoimentos, os quais e quanto a esta matéria, não se revelaram suficientemente esclarecedores.
Por outro lado, resulta para nós claro que nos autos não foi produzida qualquer outra prova que justifica a resposta positiva a tal questão.
Sendo assim e sendo certo que cabia ao Autor provar tal matéria por ser constitutiva do direito que veio alegar (cf. art.º 342º, nº1 do CC), não logrando este tal desiderato, tem a mesma que ser considerada como não provada.
Ou seja, neste ponto procede o recurso interposto pela ré/apelante.
Ora também já vimos que neste seu recurso a ré/apelante também questiona a decisão proferida no que toca aos factos provados 22º, 23º e 24º e quanto ao facto não provado 16º.
Importa por isso apreciar tal pretensão, começando desde logo por recordar a motivação que ficou inscrita na decisão recorrida:
“No que concerne aos pagamentos das prestações bancárias e seguros associados ao empréstimo por parte do autor e exclusivamente por si e mencionados no artigo 22º e 23º dos factos provados, valoramos a vasta prova documental que consta dos autos sobre essa matéria, nomeadamente os documentos de fls. 93, 136 e extractos bancários de fls. 319 a 439, documentos que atestam os valores que foram pagos e de onde provinham as quantias que eram transferidas para a conta solidária de autor e ré, associada ao crédito bancário. Desses documentos verifica-se que as quantias necessárias para proceder ao pagamento das prestações vinham de contas bancárias da titularidade exclusiva do autor e/ou de uma sociedade da qual o mesmo era representante.
No que concerne aos pagamentos dos valores integrais das quotas de condomínio, mencionados no artigo 24º dos factos provados, só se consideraram os recibos em que o autor pagou a totalidade e não os que pagou metade, fls. 51, 52, 53, uma parte de fls. 55, uma parte de fls. 56 e, por isso, não demos valor à declaração de fls. 94, que não distingue o que foi pago na totalidade do que foi pago parcialmente, englobando quotas em que apenas o autor pagou metade. Por conseguinte, apenas foram valorados os recibos de fls. 54 a 58, que comprovam os valores do condomínio que foram pagos pela totalidade. Sobre esta matéria foi ainda valorado o depoimento da testemunha E…, administradora do condomínio, que confirmou os pagamentos efectuados pelo autor e os documentos juntos aos autos sobre os pagamentos, referindo que actualmente as quotas são pagas na proporção de metade pelo autor e metade pela ré, o que já ocorre há algum tempo, referindo que os recibos reflectem essa realidade, ou seja, são emitidos recibos para cada uma das partes sobre a proporção da quota do condomínio que pagaram.”
(…)
Sobre os pagamentos que a ré sustenta serem, em conjunto pelo facto de serem titulares de uma conta solidária, a prova produzida, sobre a qual já nos pronunciamos, indicou que apenas foi o autor quem procedia aos pagamentos.
A ré não juntou qualquer documento que infirmasse a prova do autor.
Os únicos documentos juntos pela ré, com os quais pretendia sustentar a sua posição, são as duas declarações emitidas pela entidade bancária em seu nome para efeitos de IRS – fls. 146º a 148º - que não constituem prova que abalasse os restantes documentos que comprovam que a conta solidária do casal e provisionada com fundos vindos de contas tituladas unicamente pelo autor e não com valores depositados pela ré.”
Ora salvo melhor opinião, não existem quaisquer razões que possam questionar a fundamentação que acabamos de transcrever.
Ou seja, a análise conjugada e ponderada de toda a prova documental produzida, leva, como levou, a que se tenha como provada a factualidade contida nos pontos 22º, 23º e 24º e como não provada a que consta do ponto 16º.
Assim, não tem razão a ré/apelante quando questiona a forma como foi interpretada a vasta prova documental produzida, chamando entre o mais, á colação o depoimento prestado pelo seu companheiro de há vários anos, a testemunha F….
Deste modo, impõe-se que se diga, desde logo, que a resposta dada à questão dos pagamentos das prestações do crédito hipotecário e seguros associados a este, não teve só por base o que resulta da Declaração emitida pelo D… e junta com a petição inicial a fls.93, mas resultou da conjugação do seu conteúdo com toda a restante prova produzida, nomeadamente a Declaração da mesma entidade bancária de fls.136 e os extractos bancários de fls.319 a 439.
Por isso ao valorarem-se como se valoraram tais documentos não se raciocinou de uma forma “demasiado simplista”, nem se violaram quaisquer regras do nosso direito substantivo, como por exemplo as do artigo 376º do Código Civil.
Por outro lado e agora quanto ao pagamento dos valores das despesas de condomínio, bem andou o Tribunal “a quo” quando valorou, apenas, o que resulta dos recibos de fls. 54, 55, em parte, 56, 57 e 58, desconsiderando os restantes.
A este propósito impunha-se também considerar, como se considerou, o que em julgamento foi declarado pela administradora do mesmo condomínio, a testemunha E…,
Para além disso, sobre estas questões não podia o Tribunal “a quo” dar relevo às declarações prestadas pelo identificado companheiro da ré, a testemunha F…, cuja gravação também ouvimos.
E isso porque este e desde logo, não revelou conhecimentos suficientes quanto a tais factos, sendo ainda certo que no seu depoimento, revelou alguma parcialidade na abordagem das questões, circunstância esta que naturalmente descredibiliza o valor das suas declarações.
Mais, a única prova documental junta pela ré, foi a que resulta das declarações emitidas pelo D… para efeitos de IRS e que consta de fls.146, 147 e 148.
No entanto, também para nós o conteúdo das mesmas não permite questionar o que resulta da prova que o autor aqui produziu e à qual já antes fizemos suficiente referência.
Ou seja a prova produzida nos autos pelo autor foi suficiente para dar como provados os factos contidos nos pontos 22º, 23º e 24º.
Diversamente, a prova produzida pela Ré não permitiu, como não permite, questionar tais respostas, justificando sim que seja negativa a resposta a dar à matéria vertida no ponto 16º.
Em suma, improcede, nesta parte, o recurso aqui interposto pela ré/apelante.
Concluindo:
Atento o disposto, no art.º 662º, nº1 do CPC, altera-se nos seguintes termos a decisão recorrida:
Determina-se que passe de provada a não provada a seguinte matéria de facto:
“Até à data em que se decretou o divórcio, a Ré não residia no apartamento aludido em 3º (1º da BI).”
É pois de acordo com tal decisão, agora alterada, que deve ser apreciada e decidida a segunda questão aqui suscitada.
Como ficou já visto a ré/apelante pretende a revogação da sentença no segmento da mesma em que se condenou a ré a pagar ao autor as quantias correspondentes a metade das prestações do crédito hipotecário e despesas associadas, bem assim como as despesas de condomínio, na proporção de 50%, tudo no valor global de € 22.632,97, mais juros de mora.
Ora como ficou referido na sentença recorrida, na presente acção e entre outros, o autor formulou o seguinte pedido:
O de condenação da ré a pagar-lhe a quantia global de € 23.915,13 (vinte e três mil novecentos e quinze euros e treze cêntimos) até 14 de Fevereiro de 2013, referente a metade das prestações mensais pelo empréstimo contraído junto do banco D…, S.A. para aquisição das fracções em questão e aos respectivos seguros de vida, multirrisco e de recheio, e às despesas com o condomínio.
Quanto a estas últimas (as do condomínio) e segundo a tese do autor, deve ser a ré a suportá-las na íntegra já que só ela vem habitando e ocupando os imóveis de que ambos são proprietários.
Pode dizer-se, desde já, que a decisão proferida não nos merece qualquer reparo.
Se não vejamos.
Resultou provado que as partes, autor e ré, são comproprietários das três fracções autónomas melhor identificadas no artigo 3º dos factos provados.
Também se provou que para adquirirem as referidas fracções, autor e ré, contraíram um empréstimo bancário à habitação junto do banco D…, S.A. no valor de €122.205,00, constituindo hipoteca voluntária a favor de tal entidade bancária, hipoteca esta que se encontra registada.
Provou-se ainda que o referido empréstimo foi integralmente utilizado aquando da aquisição de tais fracções autónomas e que o mesmo ainda está por liquidar.
Mais se provou que a prestação mensal do empréstimo, à data da entrada da acção, era de € 309,35 e a título de seguro de vida, exigido pela entidade bancária mutuante, é devido o prémio mensal de € 71,81 e pelo seguro multirriscos do imóvel, é devido o prémio anual de € 47,50 e pelo seguro do recheio da habitação mantido até Outubro de 2008, o prémio anual devido era de € 80,52.
Provou-se, igualmente, que desde a data do divórcio e até ao dia 13 de Dezembro de 2012, o autor, a expensas suas, e exclusivamente, pagou as seguintes quantias:
- € 36.035,85, a título das prestações mensais do crédito hipotecário;
- € 5.741,17, do seguro de vida;
- € 1.008,57, a título de seguro multirriscos das fracções em questão;
- € 322,42, a título de seguro do recheio;
Provou-se, ainda que posteriormente, o Autor liquidou as seguintes prestações bancárias:
- Dos meses de Dezembro de 2012, Janeiro de 2013, no valor de € 619,74;
- Do mês de Fevereiro de 2013, no valor de € 309,35, e
- Do seguro de vida, referentes a tais meses, no montante de total de € 214,66.
Ora todos sabemos que segundo o disposto no artigo 1142.º do C. Civil, o contrato de mútuo é o contrato pelo qual uma das partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade.
Sabemos assim que são elementos caracterizadores deste tipo de contrato os seguintes: a) a natureza da prestação – “dinheiro ou outra coisa fungível”; b) o seu carácter real; c) a obrigação do mutuário de restituir ao mutuante outro tanto do mesmo género e qualidade.
Pensa bem a Sr.ª Juiz “a quo” quando faz lembrar que é a obrigação de restituição que individualiza e caracteriza o contrato de mútuo.
E também quando salienta o facto do mútuo bancário ser sempre oneroso.
Como antes já vimos, no contrato de mútuo, a principal obrigação do mutuário é a restituição da quantia mutuada.
No caso dos autos, os sujeitos passivos dessa obrigação, são o autor e a ré, obrigados em regime de solidariedade.
É por demais sabido que a obrigação é solidária quando cada um dos devedores responde pela prestação integral e a todos liberta ou quando cada um dos credores tem a faculdade de exigir, por si só, a prestação integral e esta a todos libera o devedor para com todos eles (cf. art.º 500º, n.º 1 do C. Civil).
De acordo com o disposto no artigo 524º do C. Civil, “o devedor que satisfizer o direito do credor além da parte que lhe competia, tem direito de regresso contra cada um dos condevedores, na parte que a este compete”.
Já segundo o disposto no art.º 516º do mesmo código “nas relações entre si, presume-se que os devedores ou os credores solidários, comparticipam em parte iguais na dívida ou no crédito, sempre que da relação jurídica entre eles vigente não resulte que são diferentes as suas partes”.
Já vimos que o autor e a ré são comproprietários, das fracções identificadas no artigo 3º dos factos provados.
Também sabemos que dos documentos constantes dos autos, nomeadamente as certidões prediais juntas de fls.24 a fls.29, se pode concluir que as quotas são qualitativamente iguais e, na falta de indicação em contrário e perante a presunção prevista pelo artigo 1403º, n.º 2 do C. Civil, as mesmas devem ser consideradas quantitativamente iguais.
Por força do disposto no nº2 do artigo 1405º do Código Civil, “os comproprietários, separadamente, participam nas vantagens e encargos da coisa, em proporção das suas quotas”.
Tem pois razão a Sr.ª Juiz “ a quo” quando perante tal norma, conclui que no caso, dos autos, autor e ré, enquanto comproprietários, têm a obrigação de participar nos encargos com aquisição dos imóveis, encargos esses que se traduzem no pagamento do crédito bancário que contraíram para o efeito, na proporção das suas quotas, ou seja, na proporção de metade para cada um.
A ser assim e provando-se que tais encargos foram suportados unicamente pelo autor, ao mesmo autor assiste o direito de exigir da ré metade de todos os valores que pagou, desde a data do divórcio e mencionadas nos artigos 22º e 23º dos factos provados, tudo no valor global de € 44.251,76 (quarenta e quatro mil, duzentos e cinquenta euros e setenta e seis cêntimos).
De acordo com as mesmas regras e por constituírem também elas encargos com os imóveis que estão em regime de compropriedade, tem o autor ainda direito a exigir da ré o pagamento de metade das quotas que suportou, integralmente, a título de despesas de condomínio, valor esse que segundo o que consta do ponto 24º dos factos provados, se cifrou na quantia de € 1.014,19 (mil e catorze euros e dezanove cêntimos).
Perante o referido e porque também aqui improcedem os argumentos recursivos, da ré/apelante, justifica-se que sem mais se confirme a decisão recorrida.
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Sumário (cf. art.º 663º, nº7 do CPC):
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III. Decisão:
Pelo exposto, julga-se improcedente o presente recurso de apelação e, em consequência, confirma-se a sentença recorrida.
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Custas a cargo da ré/apelante (cf. art.º 527º, nºs 1 e 2 do CPC).
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Notifique.

Porto, 2 de Julho de 2020
Carlos Portela
Joaquim Correia Gomes
António Paulo Vasconcelos