Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1545/13.8TTPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RUI PENHA
Descritores: DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR
REGIME ESPECIAL
ENSINO SUPERIOR PARTICULAR E COOPERATIVO
CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
NULIDADE
Nº do Documento: RP201810111545/13.8TTPRT.P1
Data do Acordão: 10/11/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NÃO PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ªSECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º283, FLS.2-22)
Área Temática: .
Sumário: I - A contratação de docentes universitários está sujeita a regras próprias que afastam o regime geral do contrato de trabalho.
II - O regime jurídico do pessoal docente das universidades e institutos universitários (Dec. Lei nº 448/79, de 13 de Novembro), é aplicável, na falta de regulamentação específica, pelo menos subsidiariamente ou por analogia, ao ensino superior particular ou cooperativo.
III - O contrato de trabalho a termo celebrado com “professor auxiliar convidado” não doutorado, é nulo, por falta de habilitações próprias.
IV - Não tendo a autora formulado qualquer pedido neste âmbito da nulidade, está vedado ao este tribunal pronunciar-se sobre as consequências de tal nulidade relativamente a eventuais compensações devidas.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 1545/13.8TTPRT.P1
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto
I. Relatório
B…, residente na Rua …, nº …, …, Porto, patrocinada por mandatário judicial, veio intentar a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra Universidade C…, com sede na Rua …, …/…, Porto.
Formula o seguinte pedido: “a) ser a Ré condenada a reconhecer, desde 01.07.1987, a existência de um contrato sem termo celebrado com a Autora; b) ser o despedimento efectuado pela Ré declarado ilícito;c) ser a Ré condenada a reintegrar a Autora, sem prejuízo do direito de esta poder optar por uma indemnização no valor nunca inferior a €51.008,06; d) ser a Ré condenada a pagar à Autora as retribuições vencidas e vincendas até à data do trânsito em julgado da sentença, no montante mensal ilíquido €1.593,54; e e) ser a Ré condenada a pagar à Autora a quantia de €10.000,00 a título de danos morais. Sem prescindir, no caso de se considerar que a caducidade do contrato alegada pela Ré é legítima, o que apenas por mera hipótese de raciocínio se admite, sempre deverá a Ré ser condenada a pagar à Autora a quantia de €34.005,37, a título de compensação, calculado sobre o montante de €1.292,98.”
Alega, em síntese: foi admitida ao serviço da ré, em 01.07.1987, por contrato de trabalho verbal, celebrado por tempo indeterminado , para exercer funções lectivas; no ano lectivo de 1993/1994, após defender a sua tese de mestrado em C1.1…, a Autora assumiu a categoria profissional de “Professora Auxiliar Convidada”, e, com o intuito de formalizar a nova categoria e funções, em 01.10.1993, foi assinado entre as partes um “contrato de serviço docente”, válido por 5 anos e renovável por iguais períodos; por carta datada de 12.09.2013, entregue em mão à autora nessa mesma data e posteriormente remetida pelo correio, a ré comunicou à autora a caducidade do “contrato de serviço docente”; a autora sentiu-se profundamente humilhada perante a sua família, os seus amigos e até mesmo os seus alunos, vendo-se, de repente, ao fim de mais de 26 anos de trabalho, sem qualquer rendimento mensal para fazer face às suas despesas e do seu agregado familiar, deixando a autora totalmente desgastada psicologicamente; a autora deixou de dormir bem de noite, tem insónias e sobressaltos constantes, vive da ajuda financeira de amigos e familiares enquanto não consegue obter o subsídio de desemprego e encontra-se psicologicamente incapaz de procurar emprego e de acabar o seu doutoramento ao qual se dedicou durante anos, tendo 51 anos de idade, é divorciada e tem a seu cargo dois filhos, uma menor com 13 anos e outro maior, com 22 anos, este a estudar no ensino superior.
Realizou-se diligência de audiência das partes.
A ré veio contestar, alegando, em síntese que, desde 08 de Abril de 2008, a Reitoria da Universidade da ré vem interpelando a autora para calendarizar o trabalho de Doutoramento e data prevista para o seu “terminus”, o que não aconteceu até hoje; a autora não publica qualquer trabalho científico desde o ano de 2005; no caso da autora, quer o Diretor de Departamento, quer a Reitoria entenderam que já não estava em tempo de cumprir as exigências legais.
A autora respondeu sustentando o alegado na petição inicial.
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Foi proferida sentença, na qual se decidiu a final: “julga-se a presente ação totalmente improcedente por não provada, absolvendo-se a ré dos pedidos contra si formulados, reconhecendo-se a valia da caducidade do contrato de trabalho que vinculava autora e ré, por impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva, nos termos do disposto no art. 343º, al. a), do Código do Trabalho.
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Inconformada interpôs a autora o presente recurso de apelação, concluindo:
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3. (I)licitude da cessação da relação contratual
Alega a recorrente:
47. Não há impossibilidade nem superveniente, nem absoluta, nem definitiva que determine a caducidade do contrato de trabalho da Apelante e, consequentemente, a invocação desta pela Recorrida em violação da lei representou um despedimento ilícito da Apelante.
48. Sobre a densificação dos conceitos, por especialmente claro, louva-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10/07/2013 em cujo sumário se pode ler “2 – A impossibilidade de o trabalhador prestar o trabalho, ou de o empregador o receber, para determinar a caducidade do contrato de trabalho deve ser superveniente (no sentido de que não se verificava, não tinha sido prevista, nem era previsível na data da celebração do contrato), absoluta (o que se traduzia numa efectiva inviabilidade, à luz dos critérios normais de valorização da prestação) e definitiva (no sentido de que face a uma evolução normal e previsível, não seria mais viável a respectiva prestação).” (sublinhado nosso).
(…) para que a Apelada pudesse continuar a ministrar o ciclo de estudos em causa – licenciatura – apenas lhe era exigido que tivesse simultaneamente 60% dos docentes em regime de tempo integral e 50% dos docentes com o grau de doutor.
54. Dito de outro modo, nem lhe era exigível que todos os docentes estivessem a tempo integral nem que todos os docentes fossem doutores.
55. Foi perante este condicionalismo que a Apelada elaborou a distribuição de serviço lectivo para o ano 2013/2014 do curso de licenciatura C1.2… e nele incluiu a Autora.
56. Foi, também, nessa exacta circunstância que a Apelante, apesar de ter dispensado a Apelada, continuou a ministrar o ciclo de estudos mantendo na docência do mesmo “(....) 37. outros professores que não têm doutoramento, como era o caso, por exemplo, de D… e de E…. 38. Ou até só com o grau de licenciados, como é o caso, por exemplo, de F… e G….(....)”
57. Mesmo que se concebesse uma dificuldade na prestação, o que se não concede, em nenhum caso se estaria perante uma situação em que a Apelada está efectivamente impedida de receber a prestação da Apelante.
58. Não se estava pois perante qualquer impossibilidade absoluta porquanto não se verificou qualquer inviabilidade de recepção pela Recorrida do trabalho da Apelante cuja prestação laboral não foi atingida no seu núcleo essencial.
59. Mas, tão pouco, se verificou uma situação de impossibilidade definitiva.
Respondeu a recorrida: “o Regime Geral que regula o Ensino Superior Privado, refere que a carreira docente será regulada por diploma próprio a publicar para o efeito. O que nunca aconteceu até á presente data, logo no que à progressão de carreira diz respeito dever-se-á ter em conta, por analogia, o ECDU do setor público, conjugado com o ECDU, de cada instituição. (...) a alteração da legislação que veio impor às Instituições de Ensino Superior uma revisão da carreira docente, impondo uma avaliação dos docentes que constituem o seu corpo docente próprio, coloca-nos perante uma situação de caducidade do contrato de trabalho. Já quanto ao conceito de “Absoluta”, atentemos ao preâmbulo do Decreto-Lei nº 205/2009, de 21 de Agosto, que procede à alteração do Estatuto da Carreira Docente Universitária (...).
A Magistrada do Ministério Público entende que deve improceder a argumentação da recorrente, atenta a matéria de facto provada.
Consta da sentença:
“Face a todos os constrangimentos a que a ré se encontrava – e porventura ainda se encontra – sujeita, emerge claro que existia uma forte pressão para fazer incrementar a qualificação académica do seu corpo docente, sob o perigo sério de não ver acreditados os ursos por si ministrados, dentre eles aqueles onde a autora participava como docente – e que a ré fez traduzir na renovação do quadro docente por pessoas mais qualificadas academicamente.
“E logo se percebe o caráter essencial, preponderante, deste esforço para a manutenção da atividade da ré.
“É nessa medida que se entende ser de aceitar o enquadramento efetuado pela ré de ver impossibilitada a manutenção do vínculo, perante as exigências concretas provindas do esforço de acreditação dos cursos.
“Pretende a autora a aceitação de que poderia prosseguir o seu labor lecionando no ciclo de licenciatura. Todavia, este ciclo estava comprometido pela falta de qualificações, em particular dos professores que lecionavam a tempo integral, como era o seu caso, apontando-se inclusivamente a sua regência de disciplinas inaceitável perante a falta do grau académico de Doutor.
“Não se pode afirmar que a ré sabia e conformou-se com a falta de qualificações da autora quando desde 2008 que vinha instando esta a informar do andamento da sua formação de Doutoramento, frisando a importância do esforço de qualificação em causa, mormente para a própria instituição.
“E as sucessivas respostas da autora induziram, naturalmente, a concluir que desde 2008 até 2013 o progresso foi nulo, ou pouco mais do que isso, inexistindo um verdadeiro esforço da autora na conclusão dessa empresa, o que, no tangente ao cariz temporário do impedimento, levaram a que se quebrasse a confiança no empenhamento da autora na sua própria qualificação, e que se afastasse a consideração, pela ré, de que a autora poderia concluir, em tempo útil, o seu Doutoramento.
“É que – e perdoe-se o jargão –, na data da cessação, após os vários pedidos e avisos, a obtenção do Doutoramento pela autora seria “p’ra ontem”, e não “p’ra amanhã”.
“Para agravar toda esta perceção sobre o real cometimento da autora na prossecução dos objetivos pretendidos de incremento qualitativo, surge a ausência de trabalhos científicos por si elaborados desde 2005, outro fator que acarreta uma acrescida fragilidade na sua inserção no corpo docente, em qualquer ciclo de estudos.
“No respeitante ao cariz absoluto do impedimento, sendo a autora docente de uma área científica específica, não vislumbra o tribunal forma de esta ser inserida num outro posto de trabalho dentro da estrutura educativa da ré, desde logo porque a sua falta de qualificação permanece em qualquer posto formativo que aí pudesse quiçá ocupar, mantendo-se o risco de falta de acreditação.”
Provou-se que (facto provado nº 4):
No dia 01 de Outubro de 1993 a Ré, na qualidade de primeira outorgante, e a Autora, na qualidade de segunda outorgante, subscreveram o documento que se encontra junto a fls. 26 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, denominado “CONTRATO DE SERVIÇO DOCENTE”, mediante o qual, entre outras coisas, as partes acordaram que:
“(...) 1. O primeiro outorgante admite o segundo ao seu serviço com a categoria de Professor Auxiliar Convidado.
2. Este contrato começa a vigorar a partir de 1 de Outubro de 1993 e é válido por cinco anos, renovável por sucessivos e iguais períodos, mediante deliberação favorável do Conselho Pedagógico e Científico.
3. As funções, os direitos e deveres do 2º outorgante são regulados pelos "Estatutos" e “Regulamento Administrativo” da Universidade C…. (...)”.
Começaremos por referir que, conforme referido no acórdão do STJ de 4 de Maio de 2011, “embora o legislador reconheça a necessidade de criar um regime especial de contratação do pessoal docente para o ensino nos estabelecimentos de ensino superior particular ou cooperativo, a contratação de docentes pode efectuar-se entretanto através dos típicos contratos de trabalho” (processo 10/11.2YFLSB, acessível em www.dgsi.pt).
Pretende a recorrente que celebrou com a recorrida um contrato de trabalho sem termo a 1 de Julho de 1987, conforme facto provado nº 3: “Em 01 de Julho de 1987 a Autora foi convidada pelo Senhor Dr. H…, à data secretário do Departamento C1… da Ré, para, na qualidade de sua assistente, dar as aulas práticas da cadeira de política económica nas instalações da Ré.”
Assiste razão à recorrente, uma vez que se provou que: A partir da data mencionada em 3, a Autora ministrou aulas práticas da cadeira de “política económica”; O que fez sujeita ao horário de trabalho que a Ré, no início de cada ano, lhe definia; E utilizando os instrumentos e equipamentos de trabalho desta, nomeadamente computadores e material escolar e de escritório; Auferindo uma retribuição mensal; E estava sujeita ao poder disciplinar da Ré (factos provados 24 a 28).
Porém, a contratação de docentes universitários estava sujeita a regras próprias que afastam o regime geral do contrato de trabalho. Mais precisamente, embora o regime jurídico do pessoal docente das universidades e institutos universitários (Dec. Lei nº 448/79, de 13 de Novembro), tenha como alvo os docentes do ensino superior público, até porque o ensino superior particular ou cooperativo tinha regulamentação própria (no caso da Universidade Católica), ou era inexistente, nada na lei afasta a sua aplicação, pelo menos subsidiaria ou por analogia, ao ensino superior particular e cooperativo, na falta de regulamentação específica.
Ora, sucede que, nos termos do disposto no art. 26º, nº 1, do Dec. Lei nº 448/79, de 13 de Novembro, os assistentes seriam “providos por contrato quinquenal prorrogável por um biénio”.
Sendo certo que, conforme estipulado no nº 2 do mesmo artigo, esta prorrogação só poderia ser autorizada mediante proposta fundamentada do conselho científico, baseada em relatório do professor responsável pela disciplina, grupo de disciplinas ou departamento respectivo, e desde que o assistente tenha em fase adiantada de realização o trabalho de investigação conducente à elaboração da dissertação de doutoramento.
Não se provando este último requisito, nem sequer poderia haver lugar à prorrogação, pelo que, o eventual contrato de trabalho teria que se considerar nulo, ou, pelo menos, teria caducado em 1 de Julho de 1992.
Assim, improcede o argumento da recorrente da existência de um contrato de trabalho sem termo com início a 1 de Julho de 1987.
Resta-nos, assim, o contrato de trabalho, a termo, celebrado em 1 de Outubro de 1993, este sim cumprindo o requisito temporal exigido para o contrato de assistente, ou mesmo para o professor convidado (art. 31º, nº 1 do Dec. Lei nº 448/79, de 13 de Novembro), mas que igualmente não é válido para as funções de Professor Auxiliar Convidado, uma vez que o professor auxiliar tem que ter doutoramento (art. 26º, nº 4, do mesmo diploma), e o professor convidado tem que reunir os requisitos previstos no art. 15º, nº 1, do aludido diploma (tratar-se de individualidades cujo mérito, no domínio da na disciplina ou grupo de disciplinas em causa, seja comprovado por valiosa obra científica, ou pelo currículo científico e o desempenho reconhecidamente competente de uma actividade profissional), para além do doutoramento, requisitos que não se mostram provados no caso vertente.
Poderia sim a recorrente ser contratada como assistente convidada, nos termos dos arts. 12º, nº 1, e 16º, nº 1, ainda do Dec. Lei nº 448/79, na versão resultante do Dec. Lei nº 316/83, de 2 de Julho, dos quais resulta que os assistentes convidados são recrutados de entre titulares de grau de mestre, com pelo menos quatro anos de actividade científica ou profissional em sector adequado ou da área da disciplina ou grupo de disciplinas para que são propostos.
Ora, os assistentes convidados teriam que ser “providos por contrato anual, renovável por sucessivos períodos de três anos”, conforme art. 32º, nº 1, ainda do Dec. Lei nº 448/79 na versão então vigente, dependendo a renovação de deliberação favorável do conselho científico, nos termos do nº 2 do mesmo preceito.
Ou seja, as habilitações da recorrente apenas permitiam a sua contratação como assistente, com um período máximo de contratação por cinco anos, prorrogável por um biénio, desde que tivesse em “fase adianta de realização o trabalho de investigação conducente à elaboração da dissertação de doutoramento (arts. 12º, 16º e 26º do Dec. Lei nº 448/79, de 13 de Novembro, na versão na altura em vigor).
Ainda que se considere o contrato com a autora como de assistente convidada, o que não se concede, atentas as funções que a recorrente veio a desempenhar, a lei ainda impõe critérios rígidos para a renovação dos contratos, cuja verificação não foi demonstrada nos autos, conforme o art. 32º, nº 2, do Dec. Lei nº 448/79, de 13 de Novembro, quer na versão original, quer na versão resultante do art. 2º do Dec. Lei nº 205/2009, de 31 de Junho.
Conforme resulta evidente do regime jurídico do pessoal docente do ensino superior, só os doutorados podem exercer funções a tempo integral e por tempo indeterminado, sendo todas as restantes situações soluções de recurso provisórias, por falta de candidatos com habilitações próprias, ou por se tratar de pessoas que iniciaram a carreira académica com vista ao doutoramento, ou tratando-se de pessoas de reconhecida competência académica, profissional ou científica, convidados ainda por tempo determinado e para leccionarem matérias específicas.
Ou seja, nos termos já analisados, a recorrida não podia leccionar numa instituição de ensino superior, para além do referido prazo de cinco anos, por falta de habilitações suficientes.
No sentido defendido na sentença sob recurso pronunciou-se o acórdão desta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto de 15 de Maio de 2006, processo 516735, acessível em www.dgsi.pt), no qual se refere: “é a própria lei que determina a cessação de funções por não preenchimento, pelo trabalhador, de um requisito que ela exige para o exercício das mesmas. E se tal impossibilidade é absoluta e superveniente, será ela definitiva? A resposta terá de ser afirmativa.”
Já no acórdão deste mesmo Tribunal de 1 de Dezembro de 2014, processo nº 868/12.8TTVNF.P1, relatado pelo aqui relator, se decidiu que “a consequência da celebração do contrato é a nulidade do mesmo, conforme disposto nos arts. 4º da LCT (por analogia), 113º, nº 1, do Código do Trabalho de 2003, e 117º, nº 1, do Código do Trabalho de 2009 (Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 29-2-2012, processo 376/06.6TTCSC.L1-4, relator José Eduardo Sapateiro, acessível em www.dgsi.pt).” Esta é a posição que se perfilha.
Sobre este acórdão incidiu acórdão do STJ de 25 de Junho de 2015, processo 868/12.8TTVNF.P1.S1, acessível em www.dgsi.pt, no qual se decidiu:
“No caso dos autos, atingido o prazo máximo permitido pela lei, a A. manteve-se ao serviço da R. (...), tendo as partes recorrido, para esse efeito, à outorga de novos contratos de docência a termo certo.
“À luz do critério exposto, tendo em conta que à data da sua celebração já se verificava a apontada proibição legal, não pode deixar de concluir-se no sentido da nulidade desses novos contratos.
“Quais as suas consequências, é o que cumpre agora analisar.
“No domínio do direito do trabalho vigora o princípio da não retroatividade dos efeitos da declaração de nulidade ou anulação do contrato de trabalho que tenha sido executado, ao invés do regime geral estatuído no art. 289.º, n.º 1, do C. Civil: o contrato de trabalho declarado nulo ou anulado produz efeitos como se fosse válido em relação ao tempo durante o qual esteve em execução (art. 122.º, n.º 1, do CT/2009).
“No dizer de Maria do Rosário Palma Ramalho, “as razões de ser ser desta regra são a impraticabilidade da repetição das prestações laborais, (…), a necessidade de tutela do trabalhador nestas situações e (…) a conveniência de estabelecer um regime de aplicação escorreita num contrato que, apesar de inválido, pode ser executado durante largo tempo”.[Tratado de Direito do Trabalho, II, 4ª edição, Coimbra, 2012, p. 187 – 188]
“Deste modo, enquanto foram executados, os contratos que considerámos nulos produziram efeitos idênticos aos contratos de docência a termo certo validamente celebrados, dispondo o art. 123.º, n.º 1, do mesmo diploma, no que concerne ao regime da sua cessação, que “o facto extintivo ocorrido antes da declaração de nulidade ou anulação (…) aplicam-se as [correspondentes] normas sobre a cessação do contrato”(nomeadamente, no plano dos respetivos requisitos e eventuais consequências indemnizatórias, que são independentes da invalidade do contrato[Ibidem, p. 190]).
Decorre daqui que a invalidade do contrato de trabalho não afeta, em princípio, a possibilidade de se proceder à sua extinção, como se fosse válido, enquanto esteja em execução[16], sendo ainda certo, conexamente, que o conhecimento da nulidade (que opera ipso jure) confere à parte interessada o direito de a todo o momento pôr termo à execução do contrato, com tal fundamento. [Maria do Rosário Palma Ramalho, ob. cit., p. 189]
“Como emerge de tudo o já exposto, é inequívoco que, na sua vertente temporal, o vínculo contratual em causa nunca assumiu natureza indeterminada.
“Aliás, conclusão diversa implicaria tratar uma relação laboral que, como vimos, é sempre, por imperativo legal, de duração limitada, em termos idênticos aos aplicáveis aos contratos por tempo indeterminado, o que seria contraditório com o princípio da unidade e coerência do sistema jurídico.
“Deste modo, é apodítico que as eventuais consequências da extinção contratual em debate nos autos nunca poderiam ser as consignadas na lei para as situações de rutura sem justa causa de contratos sem termo.
“Apesar de a constatada nulidade em nada colidir, como se referiu, com a possibilidade de à cessação do vínculo contratual em litígio (cuja génese radica numa sucessão de contratos a termo certo), estarem aliados determinados efeitos, a verdade é que a autora não formulou qualquer pedido neste âmbito, estando por conseguinte vedado a este tribunal pronunciar-se sobre tal matéria.”
Aplicando esta doutrina ao caso vertente, à qual o aqui relator aderiu, importa concluir pela improcedência da apelação, , embora com diferente fundamento.
IV. Decisão
Pelo exposto:
- não se admite a junção dos documentos apresentados pela recorrida com as suas alegações, determinando-se a oportuna devolução dos mesmos, condenando-se a recorrida em uma UC de multa;
- julga-se improcedente a impugnação da decisão relativa à material de facto;
- embora com diverso fundamento, confirma-se a decisão de mérito proferida em primeira instância.
Custas pela recorrente.

Porto, 11 de Outubro de 2018
Rui Penha
Jerónimo Freitas
Nelson Fernandes