Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
49/19.0SFPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: VÍTOR MORGADO
Descritores: CRIME DE TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES DE MENOR GRAVIDADE
CRIME CONTINUADO
Nº do Documento: RP2021021049/19.0SFPRT.P1
Data do Acordão: 02/10/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AUDIÊNCIA (RECURSO DO ARGUIDO)
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – Mostra-se liminar e definitivamente afastada a hipótese de as várias condutas do recorrente serem unificadas por uma unidade de resolução.
Por outro lado, não obstante alguma proximidade temporal entre as diversas atuações do arguido B… (pois ocorreram no mesmo mês), verifica-se que as mesmas tiveram lugar em circunstâncias diferenciadas e independentes uma das outras:
- uma, a 5/05/2019, em que realizou o transporte de droga a pedido do aqui coarguido C…;
- outra, a 23/05/2019, em que, em acordo com os aqui coarguidos D… e C…, encaminhou diversos consumidores para comprarem estupefacientes ao referido D… e chegou a entregar droga a consumidores que se encontravam num carro (e a receber o respetivo preço);
- e outra, a 13/05/2019, na qual, em acordo com o coarguido (no processo pré julgado 50/19.3SFPRT) F…, o recorrente fez vigia e encaminhou consumidores para transacionarem estupefacientes com o mencionado F….
II - A autonomização de tais condutas surge, face à reconhecida situação de toxicodependência do impugnante, como um deslocado artificialismo. Se o recorrente tivesse optado por colocar em causa as razões de facto que levaram a que se procedesse à alteração não substancial da factualidade narrada na acusação, logo se patenteariam os fundamentos da destrinça efetuada.
III - Ora, no presente caso, os factos demonstrados não permitem concluir que os atos praticados a 23-05-2019, bem como pelo arguido B… a 13-05-2019 e pelos quais foi autonomamente julgado e condenado no âmbito do processo n.º 50/19.3SFPRT, sejam considerados mera descarga daqueles primeiros praticados a 05-05-2019, exigindo, pois, um novo processo deliberativo. A confirmar essa mesma conclusão cumpre destacar que a atuação dos arguidos em cada um desses dias não é sequer homogénea. Na verdade, a conduta que os arguidos C… e B… assumiram no dia 05-05-2019 não voltou a ser repetida, sendo completamente distinta a por eles assumida no dia 23-05-2019. Por outro lado, o arguido C… mudou a sua forma de atuação, socorrendo-se no dia 23-05-2019 de mais colaboradores para a execução das transações de estupefacientes de que era beneficiário e impulsionador. Por seu turno, e quanto ao arguido B…, embora no processo n.º 50/19.3SFPRT lhe tivesse sido imputada a prática de um crime de tráfico de estupefacientes desde o mês de maio de 2019, o certo é que apenas ficou demonstrada uma atuação em conluio com pessoa distinta de qualquer um dos arguidos destes autos, limitada a um único dia. Deste modo, tal atuação é perfeitamente desligada da atuação em causa nestes autos onde o arguido B… se envolveu com diferentes pessoas, pressupondo, pois, resolução autónoma, o que impede que toda a sua atuação nos dois processos seja encarada como constituindo o mesmo pedaço de vida ou descarga da mesma resolução inicial.
IV - Não assume especial relevância a constatação do alargado leque descritivo das ações típicas que podem integrar o tipo legal de crime de tráfico de estupefacientes, pois não foi tanto a similitude ou a diferenciação das concretas tarefas ou papéis desempenhados pelo arguido B… nas diversas datas consideradas que conduziu, no acórdão recorrido, à autonomização dos delitos cometidos.
Pesaram mais a diversidade dos acordos estabelecidos com diferentes coautores (isto, para além de ocorrerem em dias e locais díspares) e sobretudo, decisivamente, o corte da linha de continuidade psicológica entre os factos julgados nos presentes autos e aqueles que foram previamente sentenciados.
V - Ou seja, recorrendo à fórmula legal utilizada no nº 2 do artigo 30º do Código Penal para a unificação de diversas condutas em um só crime continuado, o que faltou não foi só (ou tanto) a execução por forma essencialmente homogénea, mas também (ou até particularmente) a manutenção de toda a situação exterior que diminuísse consideravelmente a culpa do agente.
Não se verificam, pois, no caso, os pressupostos de existência de um só crime continuado.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Recurso 49/19.0SFPRT.P1
Origem: T.J. Comarca do Porto, Porto- Juízo Central Criminal do Porto- Juiz 14

Acordam, em audiência, na 1ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto:
I – RELATÓRIO
O Ministério Público acusou, em processo comum e com intervenção de tribunal coletivo, B…, nascido a ../06/1966, além de mais dois arguidos – C… e D… – imputando-lhes a prática, em coautoria e sob a forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art.º 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro.
O arguido B… apresentou contestação em que pugnou pela sua condenação pelo crime de traficante-consumidor, previsto e punido pelo artigo 26.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro.
Já no decurso da audiência de julgamento, o arguido B… alegou a exceção do caso julgado, tendo por referência os factos imputados nestes autos e aqueles pelos quais foi condenado no âmbito do processo comum coletivo n.º 50/19.3SFPRT, do Juízo Central Criminal do Porto (J7), do Tribunal Judicial da Comarca do Porto.
Foram ainda comunicadas uma alteração não substancial e uma alteração da qualificação jurídica dos factos descritos no despacho de acusação, passando, designadamente, o arguido B… a incorrer na prática, sob a forma consumada e em concurso efetivo, como autor imediato de um crime de tráfico de menor gravidade previsto e punido pelos artigos 14.º, n.º 1, 26.º, do Código Penal e 25.º, al. a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, e, como coautor, de um crime de tráfico de menor gravidade previsto e punido pelos mesmos artigos.
A final da audiência de julgamento, o Tribunal Coletivo deliberou, designadamente, julgando improcedente a exceção do caso julgado, condenar este arguido B…, como autor imediato e sob a forma consumada, de um crime de tráfico de menor gravidade, previsto e punido pelos artigos 14.º, n.º 1, 26.º, do Código Penal e 25.º, al. a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, praticado em 05/05/2019, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, e, como coautor, sob a forma consumada, de um crime de tráfico de menor gravidade, previsto e punido pelos artigos 14.º, n.º 1, 26.º, do Código Penal e 25.º, al. a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, praticado em 23/05/2019, na pena de 2 anos de prisão, e, em cúmulo jurídico destas duas penas parcelares, na pena única de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, cuja execução se suspende pelo período de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses, condicionada a regime de prova assente num plano de reinserção social, a definir e a executar com vigilância e apoio pelos serviços de reinserção social, ficando desde já condicionada à obrigação de se inscrever numa "Consulta de Especialidade", mediante o pagamento pelo condenado das taxas moderadoras, se necessário, em data e hora a definir pelos serviços de reinserção social, para despiste de problemas de toxicodependência e/ou avaliação da necessidade de tratamento médico dessa problemática e consequente tratamento, se considerado necessário sob o ponto de vista médico.
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Não se conformando com o assim decidido, veio o mesmo arguido B… interpor o presente recurso, cuja motivação sintetizou através das seguintes conclusões:
«1º - Antes do início do julgamento, nos termos do art.º 338 º CPP o aqui arguido arguiu exceção de caso julgado e violação do ne bis in idem.
2º - Pois teria sido já julgado e condenado, com trânsito em julgado, em 19/02/2020, antes do início do nosso julgamento, por factos/crime igual, p.p no art 21º n.º1 do D.L. 15/93, por factos ocorridos em 19/05/2019 [1], ou seja entre o 1º facto/data criminoso e o segundo.
3º - Baseando-se no art.º 30º n.º 2 do CP, crime continuado, requerendo a absolvição de instância do aqui arguido.
4º - Tendo em conta as específicas características do crime de tráfico de estupefacientes, o tribunal ordenou o prosseguimento do julgamento.
5ª – Em 25/03/2020, condenou o aqui arguido pelo art.º 25º daquela Lei, face à alteração da qualificação jurídica.
6ª – Desatendendo a exceção com a fundamentação de que a execução dos crimes seria diferente e que não "estávamos perante o mesmo pedaço de vida ou descarga da mesma resolução inicial".
7ª – O aqui arguido discorda, pois os requisitos de crime continuado estão preenchidos, visto que são os confirmados dogmaticamente pelo Ac. TRC de 08/11/2017 do Relator Luís Teixeira - proc., n.º 1558/12.7TACBR.C1, consultável in dgsi.pt.
"I - São requisitos do crime continuado descritos nos nºs 2 e 3 do artigo 30º, do Código Penal:
a) A realização plúrima de violações típicas do mesmo bem jurídico, desde que este não proteja bens eminentemente pessoais.
b) Execução essencialmente homogénea das sobreditas violações.
c) No quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que lhe diminua consideravelmente a culpa.
d) Um elemento subjetivo que há de estender-se à inteira relação de continuação, abrangendo as hipóteses de um dolo conjunto (planeamento prévio pelo agente das diversas resoluções típicas) ou de um dolo continuado (o plano do agente de que repetiria a realização típica sempre que a ocasião se proporcionasse)”.
8ª – E a exceção de caso julgado - Veja-se também o Ac., RL Lx de 13/04/2011, do relator Rui Gonçalves proc., n.º 250/06.6PCLRS.L1-3, consultável in dgsi.pt.
"I – A exceção de caso julgado materializa o disposto no art. 29.º, n.º 5, da CRP, quando se estabelece como princípio a proibição de reviver processos já julgados com resolução executória afirmando “Ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime”.
II – O caso julgado é um efeito processual da sentença transitada em julgado, que, por elementares razões de segurança jurídica, impede que o que nela se decidiu seja atacado dentro do mesmo processo (caso julgado formal) ou noutro processo (caso julgado material).
III – Transcendendo a sua dimensão processual a proibição do duplo julgamento pelos mesmos factos faz que o conjunto das garantias básicas que rodeiam a pessoa ao longo do processo penal se complemente com o princípio ne bis in idem ou non bis in idem, segundo o qual o Estado não pode submeter a um processo um acusado duas vezes pelo mesmo facto, seja em forma simultânea ou sucessiva.
IV – Esta garantia visa limitar o poder de perseguição e de julgamento, autolimitando-se o Estado e proibindo-se o legislador e demais poderes estaduais à perseguição penal múltipla e, consequentemente, que exista um julgamento plural.
V – Caso julgado, em substância, significa decisão imutável e irrevogável; significa imutabilidade do mandado que nasce da sentença. Aproximamo-nos assim à lapidar definição romana da jurisdição: quae finem controversiarum pronuntiatione iudicis accipit (que impõe o fim das controvérsias com o pronunciamento do juiz).
VI – Para que a exceção funcione e produza o seu efeito impeditivo característico, a imputação tem que ser idêntica, e a imputação é idêntica quando tem por objeto o mesmo comportamento atribuído à mesma pessoa (identidade de objeto - eadem res). Trata-se da identidade fáctica, independentemente da qualificação legal (nomen iuris) atribuída. As duas identidades que refere a doutrina, unidade de acusado e unidade de facto punível, têm sido assim consideradas:
(i) - Para que proceda a exceção de caso julgado, requer-se que o crime e a pessoa do acusado sejam idênticos aos que foram matéria da instrução anterior à que se pôs termo no mérito de uma resolução executória.
(ii) - A identidade da pessoa refere-se só à do processado e não à parte acusadora para que proceda a exceção de caso julgado.
VII – Se os factos são os mesmos e culminaram com uma sentença executória, ainda que o nomen juris seja distinto, é procedente a exceção de caso julgado.
VIII – O ne bis in idem, como exigência da liberdade do indivíduo, o que impede é que os mesmos factos sejam julgados repetidamente, sendo indiferente que estes possam ser contemplados de distintos ângulos penais, formal e tecnicamente distintos.”.
9ª – Bem como, o 3º requisito segundo este Aresto –
XII – Um terceiro requisito de procedibilidade, que tem relação estreita com a natureza do caso julgado, respeita a que o primeiro processo tenha sido findo totalmente e que não seja suscetível de meio impugnatório algum, para que justamente se possa reclamar os efeitos de inalterabilidade que acompanha as decisões jurisdicionais que passam à autoridade de caso julgado.
10ª - O que concretamente sucedeu in casu, pois já tinha ocorrido o trânsito do processo 50/19.3.SFPRT, antes de este nosso processo começar a ser julgado.
11ª - O Tribunal a quo fundamenta a aceitação de tal documentação nos apontados despachos ora impugnados com a seguinte dimensão normativa: por efeitos dos arts. 340º n.ºs 1 e 2, 360º n.º 4 e 371º n.º1, todos do C.P.P., se aceita a junção aos autos da referida documentação.
12ª - Quanto ao fundamento do mesmo pedaço de vida ou descarga da mesma resolução inicial". Também se discorda desta fundamentação, pois o crime de tráfico de muitas resoluções criminosas – vd., no art.º 21 do D.L, 15/93, de 22/01 – cultivar, produzir, ceder, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, venda, distribuir, comprar, proporcionar a outrem, transportar, importar, fizer transitar, entre outras situações plasmadas nesta norma.
13ª - O modus operandi não tem que se efetivar da precisa forma para ser crime contínuo, apenas tem que ser com o intuito de concretizar o mesmo objetivo criminógeno.
14ª - Especialmente quando o crime em causa tem legalmente tipificadas diversas manifestações.
15ª - In casu, é a realização plúrima de violação típica do mesmo bem jurídico, tal como prenunciado no art.º 21 do D.L, 15/93 de 22/01., bem como a circunstância de se ter, a final, condenado o aqui arguido pelo art.º 25º, do mesmo corpo legal, nada muda em sede de crime continuado e exceção de caso julgado.
16ª - Mais, a identidade dos processos é tanta que as testemunhas, excetuando uma, são as mesmas, bem como confundiram e misturaram os factos.
17ª - Em sede de dimensão constitucional, o art.º 29º n.º 5 da CRP determina que o crime deve ser considerado idêntico e o mesmo na justa medida em que exista uma parte comum entre o facto histórico julgado e o facto histórico a julgar e que ambos os factos tenham como objeto o mesmo bem jurídico ou formem, como ação que se integra na outra, um todo do ponto de vista jurídico. Como sucede in casu.
18ª- É prática comum retirar-se do artigo 282.º, n.º 3, da CRP, um argumento de maioria de razão para se fundamentar a consagração constitucional do princípio da intangibilidade do caso julgado; a intangibilidade do caso julgado é um princípio constitucional com consagração implícita e que encontra fundamento nas exigências de certeza e segurança jurídicas, corolários do Estado de direito, existindo ainda várias manifestações constitucionais da sua relevância.
19ª- O Tribunal Constitucional fundamenta que o caso julgado é um princípio constitucional tácito, cuja consagração resulta do artigo 282.º, n.º 3, da Constituição, do valor da certeza e segurança jurídica, enquanto dimensão do princípio do Estado de Direito, do princípio da separação de poderes e da própria natureza da função jurisdicional, da qual resulta a obrigatoriedade das decisões respetivas.
20ª - Vd. Ac., Ac., acórdão n.º 86/2004, de 4 de fevereiro, a inconstitucionalidade da norma constante do n.º 4 do artigo 10.º da Lei n.º 85/2001, de 4 de agosto, "por se ter decidido que a mesma apenas se pretende aplicar a situações já definidas por sentença transitada em julgado; e o seu efeito traduz-se (...) em contrariar (parcialmente) a definição da relação controvertida resultante da decisão condenatória".
21ª - De modo que se requer que sobre esta questão recaia Acórdão que se debruce sobre esta temática, mormente se é inconstitucional a interpretação do art.º 30º n.º 2 do C.P., quando analisado no sentido de julgar e condenar novamente um arguido pelos mesmos factos/crime previamente julgado e condenado por Acórdão previamente transitado em julgado, por violação da proibição do ne bis in idem e exceção de caso julgado, ínsito no art.º 29º n.º5 da CRP e 282.º, n.º 3, da CRP viola ou não os princípios do Estado de Direito.»
Finaliza o arguido o seu recurso pedindo a revogação do acórdão recorrido e a sua substituição por uma decisão que o absolva.
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Na resposta que apresentou, o Ministério Público sintetizou a sua posição nos seguintes termos:
«I.- O princípio do caso julgado ou da exceptio judicati encontra-se consagrado na Constituição da República Portuguesa (CRP) através do n.º 5 do art. 29º, na senda da Declaração Universal dos Direitos do Homem (DUDH), no qual se estabelece: ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime.
Como direito subjetivo fundamental (Prof. Gomes Canotilho e Prof. Vital Moreira, CRP Anotada), o princípio ne bis in idem garante ao cidadão o direito de não ser julgado mais do que uma vez pelo mesmo facto, conferindo-lhe, ao mesmo tempo, a possibilidade de se defender contra atos estaduais violadores desse direito (direito de defesa negativo).
Como princípio constitucional objetivo (dimensão objetiva do direito fundamental), obriga fundamentalmente o legislador à conformação do direito processual e à definição do caso julgado material de modo a impedir a existência de vários julgamentos pelo mesmo facto.
II.- Tendo presente que a noção de caso julgado não nos é dada pelo atual Código de Processo Penal, não podendo a mesma ser decalcada da noção dada pelo Código Processo Civil no art. 497º, há que recorrer aos princípios gerais do processo penal a fim de se delimitar a noção de “caso julgado”. Neste sentido decidiu o STJ no Assento n.º 3/2000, no qual se concluiu: “entende-se, por tal motivo, e uma vez que a lei penal ainda não regulamentou os efeitos do caso julgado penal, que se têm de considerar ainda em vigor as disposições regulamentadoras do tema que constavam do anterior CPP, na medida em que traduzem os princípios gerais do direito penal vigente entre nós”.
III.- Existe concordância na doutrina e na jurisprudência de que o referente “mesmo crime” não deve ser interpretado no seu sentido estrito técnico-jurídico, mas sim em função do valor que o princípio assume para a dignidade da pessoa humana, de forma a garantir-se que “aquele que viveu a dramática experiência do processo penal, que não possa mais, por aquele acontecimento, voltar a ser incomodado, assegurando-se, assim, ad futurum, a paz jurídica do cidadão” (Frederico Isasca).
IV.- Se, na aplicação coerente do princípio de que “a consumpção do direito de acusação por força de um julgamento definitivo anterior se verifica na precisa medida da extensão dos poderes e deveres de cognição do juiz relativamente a factos nele apreciados”, “algumas atividades que fazem parte de uma continuação criminosa foram já objeto de uma sentença definitiva, ter-se-á de considerar consumido o direito de acusação relativamente a quaisquer outras que pertençam a esses mesmo crime continuado, ainda que elas de facto tivessem permanecido estranhas ao conhecimento do juiz” (Eduardo Correia, Caso Julgado e Poderes de Cognição do Juiz, Coimbra, 1948, p. 350), a fortiori, idêntica solução há de impor-se relativamente a “outros” atos naturalisticamente subsumíveis a uma mesma e única resolução criminosa que foi já objeto de conhecimento e decisão.
Na verdade, “se o juiz se convence (...) de que tais atividades constituem tão só elementos de um crime continuado, que foi já objeto de um processo, será forçado a concluir que elas deveriam ter sido apreciadas. Ainda, pois, que o não tivessem sido, tudo se passa como se assim fosse, estando, por isso, consumido e extinto o direito de as acusar e podendo opor-se sempre ao exercício da respetiva ação penal a exceção ne bis in idem” (Eduardo Correia, ob. cit. p. 351).
V.- Importa ainda tecer algumas considerações sobre a natureza do crime de tráfico de estupefacientes, concebido como crime de trato sucessivo, de execução permanente, mas mais comummente denominado de crime exaurido e, na terminologia alemã, de delito de empreendimento, que, como a falsificação de documentos e outros, fica perfeito com a comissão de um só ato, se excute só com ele, preenchendo-se com esse ato gerador o resultado típico; o conjunto das múltiplas ações unifica-se e é tratado como tal pela lei e jurisprudência.
VI.- O crime de tráfico de estupefacientes é um crime ‘exaurido’ e, como tal, é uma figura criminal em que a incriminação da conduta do agente se esgota nos primeiros atos de execução, independentemente de os mesmos corresponderem a uma execução completa, e em que a repetição dos atos, com produção de sucessivos resultados, é imputada a uma realização única.
É um crime que tem sido caracterizando como aquele crime em que ocorre uma “unificação das condutas ilícitas sucessivas, desde que essencialmente homogéneas e temporalmente próximas, quando existe uma mesma, uma só resolução criminosa, desde o início assumida pelo agente.
VII.- Posto isto, entendemos que não se verifica sobreposição temporal da atividade de tráfico de estupefacientes que o arguido recorrente levou a cabo, e o tribunal coletivo recorrido decidiu, com a alteração não substancial da qualificação jurídica operada, subsumir os factos ocorridos no dia 5/05/2029 e no dia 23/05/2019, a 2 (dois) crimes de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelos arts. 14º, n.º 1, 26º, ambos do C.Penal e art. 25º, al. a), do Dec.-Lei n.º 15/93, de 22/01, com referência às Tabelas I-A e I-B anexas (Ata de julgamento de 25/03/2020).
Tratou-se de um procedimento legal e que se justificou precisamente para obstar à ofensa do caso julgado firmado pelo acórdão proferido no proc. n.º 50/19.3SFPRT e à violação do princípio ne bis in idem.
VIII.- No caso concreto, confrontando a factualidade imputada nos presentes autos ao arguido recorrente, ocorrida nos dias 5/05/2109 e 23/05/2019, com a atuação deste mesmo arguido, no dia 13/05/2019, pela qual foi já julgado e condenado no proc. n.º 50/19.3SFPRT, não podemos deixar de considerar que aqueles não funcionam como uma espécie de elos da mesma corrente, não se encontrando interligados por fazerem parte do mesmo empreendedorismo criminoso. Estamos perante crimes autónomos, que não fazem parte da mesma figura, que é o crime exaurido, p.p. pelo art. 25º, do Dec.-Lei n.º 15/93, de 22/01.
Daqui decorre que a figura do crime exaurido tem de se considerar esgotada quanto aos factos ocorridos no dia 13/05/2019, a que a condenação no proc. n.º 50/19.3 SFPRT pela sua prática se refere.
IX.- Não pode deixar de ser valorada a circunstância de o arguido ter sido detido e sujeito a interrogatório judicial, no sentido de uma forçosa tomada de consciência da ilicitude e censurabilidade da atividade por si desenvolvida, o que tem como consequência o afastamento da unificação da conduta.
Deste modo, a qualificação jurídico-criminal dos factos levada a efeito na decisão recorrida não é merecedora de reparo, a pluralidade da intenção criminosa afasta a unidade do sentido social da ilicitude e impõe a consideração deste segundo núcleo de factos como crimes autónomos.
X.- Ademais, como se afirma no acórdão recorrido, as condutas do arguido recorrente não são homogéneas, o modus operandi foi distinto, o que acabou por levar à consideração de que a pluralidade de atos se transformava em 2 (dois) crimes de tráfico de menor gravidade.
XI.- Forçoso é então concluir que o trânsito em julgado do acórdão proferido no proc. n.º 50/19.3SFPRT não tem efeito preclusivo sobre os factos em análise nos presentes autos imputados ao arguido recorrente, pelo que não existe violação do princípio ne bis in idem.
XII.- De sublinhar que no acórdão aqui sob recurso está claramente definido o período temporal que foi objeto de apreciação e de cognição, o qual manifestamente se não confunde com a matéria de facto apreciada no proc. n.º 50/19.3SFPRT.
Os factos que foram objeto de conhecimento num e noutro dos processos encontram-se bem delimitados, não existindo qualquer risco de confusão entre eles, e, neste contexto, a questão não pode ser tratada na órbita do crime exaurido.
Assim, deve improceder o recurso do arguido recorrente.»
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Realizou-se a requerida audiência em 2ª instância.
Cumpre decidir.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar [2], sem prejuízo das de conhecimento oficioso.
Considerando a matéria de facto dada como provada (que a seguir se reproduzirá) e os termos do recurso interposto, a principal questão a decidir é a de saber se os factos imputados ao arguido nos presentes autos se integram – juntamente com aqueles por que o arguido foi já condenado, com trânsito em julgado, no processo n.º 50/19.3SFPRT – em um só crime continuado de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, não devendo ser apreciados nos presentes autos, por força da verificação da exceção do caso julgado.
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A matéria de facto dada como provada
«Factos Provados (…):
I.
No dia 5 de maio de 2019, na Rua…, Bairro …, nesta cidade do Porto, pelas 00h.50m, C…, aqui arguido, que se dedicava à entrega de heroína e cocaína a terceiros a troco de dinheiro, ordenou a B…, aqui também arguido, que levasse heroína e cocaína, seguindo pela Rua… até à Alameda…, Bloco n.º .., entrada …, naquele bairro, local de venda de estupefaciente situado a cerca de 150 metros, onde depois se comprometeu a entregar estupefaciente ao arguido B… como contraprestação pelo transporte, ao que este anuiu.
Após se certificar da ausência de agentes policiais, o arguido C… entregou ao arguido B… duas embalagens de plástico incolor contendo 100 embalagens de heroína, com o peso líquido de 7,977 gramas, com um grau de pureza de 5,6 %, que permitiria preparar 4 doses médias individuais diárias, bem como vários pedaços de cocaína (éster metílico), com o peso líquido de 41,432 gramas, com um grau de pureza de 12, 6 %, que permitiria preparar 169 doses médias individuais diárias.
A dita heroína e cocaína pertenciam ao arguido C… e estavam destinadas a serem por ele entregues a terceiros a troco de dinheiro.
Logo de seguida, o arguido B… dissimulou as embalagens que lhe foram entregues na manga do casaco que vestia, e seguiu marcha pela Rua… na direção da Alameda…, Bloco n.º …, entrada …, naquele bairro, enquanto o arguido C… se dirigiu para este local pela Rua…, tendo na sua pose a quantia de €25,15, proveniente da venda de estupefacientes.
O arguido C… agiu sabendo e querendo deter heroína e cocaína destinadas a serem cedidas a terceiros a troca de dinheiro e prometer ao arguido B… a entrega de estupefaciente a troco da execução, por este, do transporte daquela heroína e cocaína e, desta forma, sabendo e querendo determinar o arguido B… a efetuar esse transporte.
O arguido B… agiu sabendo e querendo deter e transportar a dita heroína e cocaína, cujas características, natureza e efeitos conhecia, sabendo que as mesmas se destinavam a serem cedidas a terceiros em troca de dinheiro, com a intenção de auferir benefício.
Os arguidos agiram livre e conscientemente, sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal.
Os arguidos C… e B… foram então detidos, sujeitos a primeiro interrogatório judicial de arguido detido, tendo sido aplicada a cada um deles a medida de coação de apresentações periódicas, a proibição de contactarem, por qualquer meio, entre si e com outras pessoas conotadas com o narcotráfico, bem como a proibição de frequentarem ou permanecerem nos bairros do Porto conotados com o narcotráfico, nomeadamente o Bairro ….
II.
No dia 23 de maio de 2019, pelas 23h.28m, no exterior e junto à entrada …, do Bloco .., do referido Bairro, o arguido B… encaminhou dois indivíduos para a referida entrada onde D…, aqui também arguido, entregou a cada um deles estupefaciente (heroína e/ou cocaína), recebendo de cada, em troca, quantia monetária não apurada, que guardou.
Pelas 23h.32m, o arguido B… recebeu quantia monetária não apurada de dois indivíduos que se encontravam dentro de um carro e dirigiu-se ao arguido D…, entregou-lhe aquela quantia monetária e dele recebeu estupefaciente (heroína e/ou cocaína) que, por sua vez, entregou aos referidos indivíduos.
Pelas 23h.36m, o arguido B… encaminhou, em fila, quatro indivíduos para aquela entrada, onde o arguido D… entregou, a cada um deles, estupefaciente (heroína e/ou cocaína) e recebeu de cada um deles quantia monetária não apurada.
Pelas 23h.38m, o arguido C… surgiu no local e dirigiu-se para aquela entrada, onde entregou ao arguido D… um embrulho contendo quantidade não apurada de estupefaciente (heroína e/ou cocaína) e, após, dirigiu-se para junto do Bloco …, onde se sentou numa cadeira, a controlar e vigiar as vendas.
Pelas 23h.40m, o arguido B… encaminhou um indivíduo para a dita entrada, onde entregou quantia monetária não apurada ao arguido D… que lhe entregou estupefaciente (heroína e/ou cocaína).
Pelas 23h.44m, quando o arguido D… se encontrava na dita entrada, tinha na sua posse 72 embalagens de heroína, com o peso líquido de 9,402 gramas, com um grau de pureza de 6,3 %, que permitiria preparar 5 doses médias individuais diárias, vários pedaços de cocaína (éster metílico), com o peso líquido de 14,704 gramas, com um grau de pureza de 18,3 %, que permitiria preparar 89 doses médias individuais diárias, bem como a quantia monetária de €680,79.
Nessa altura, o arguido C… tinha na sua posse a quantia monetária de €2,45. As referidas quantias eram provenientes das vendas de estupefacientes já realizadas.
A heroína e cocaína pertenciam ao arguido C… e estavam destinadas a serem entregues a terceiros a troco de dinheiro.
Os arguidos C…, B… e D… agiram, de comum acordo e em comunhão de esforços, sabendo e querendo ceder e vender os referidos estupefacientes, cujas características natureza e efeitos conheciam, destinados a serem cedidos a terceiros a troco de dinheiro, com a intenção de obterem contrapartida económica.
Os arguidos agiram sempre livre e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.
III.
À data dos factos o arguido C… residia com a avó, o irmão mais novo e a mãe, num apartamento de tipologia 3, num bairro social com razoáveis condições de habitabilidade, fortemente conotado com problemas socais e criminais. Atualmente, o arguido C… mantém-se no mesmo agregado, com exceção da mãe, que se autonomizou.
A dinâmica familiar caracteriza-se por um padrão de relacionamento estável, afetuoso e coeso, descrito dentro dos parâmetros da normalidade, mantendo os familiares o apoio entre si.
O processo de desenvolvimento e acompanhamento educativo do arguido C… decorreu no agregado familiar da avó materna, de modesta condição socioeconómica. Com a ausência do pai e a emigração da mãe durante a infância, a avó materna substituiu as figuras parentais, uma vez que aos 7 anos de idade a avó passou a assumir o processo educativo do arguido, tendo-lhe sido na altura atribuída a sua guarda.
A dinâmica familiar é positiva e marcada pela existência de laços de afetividade entre os seus elementos, mantendo o arguido contactos regulares com quatro irmãos (2 germanos e 1 uterino).
O agregado subsiste com €410 mensais, relativos à prestação de RSI do agregado, e à comparticipação mensal variável da mãe, o que permite ao agregado assegurar as despesas quotidianas, ainda que com gestão criteriosa.
O arguido C… frequentou o sistema de ensino em idade normal, tendo tido um percurso instável com registo de absentismo e retenções. Concluiu o 7.º ano de escolaridade com 15 anos, altura em que abandonou o ensino.
Nesta altura, passou a manter um quotidiano sem estruturação, caracterizado pelo ócio e convívio com grupo de pares conotado com um quotidiano socialmente desadequado, passando a desenvolver atividades ilícitas, o que terá facilitado a intensificação de consumo de haxixe que iniciou pelos 17 anos.
No âmbito do presente processo, o arguido encontra-se em medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, e evidenciou um comportamento adequado à sua execução, ao nível do cumprimento das regras inerentes e da articulação com a equipa de vigilância eletrónica.
IV.
No âmbito do Processo Comum Coletivo n.º 20/17.6SFPRT, do juízo central criminal do Porto (J12), do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, o arguido C… foi em 27-02-2019 condenado na pena única de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, pela prática em 20-06-2017, em coautoria e sob a forma consumada, de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo art.º 25.º, al. a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro (1 ano e 9 meses de prisão), e em 01-02-2018, em autoria imediata e sob a forma consumada, de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo art.º 25.º, al. a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro (2 anos de prisão), tendo a respetiva decisão transitado em julgado em 17-12-2019.
V.
O arguido B… é filho único e o seu desenvolvimento processou-se maioritariamente na cidade do Porto, de onde é natural e na qual sempre viveu até mais recentemente, num contexto familiar predominantemente tradicional e conservador, sem particulares contornos de rigidez/autoritarismo parental e/ou especiais carências a nível económico.
O progenitor trabalhava como guarda prisional no estabelecimento prisional do Porto, inicialmente ainda no edifício da Rua…, transitando posteriormente para …, depois da mudança de instalações daquele estabelecimento prisional. Por seu turno, a mãe dedicava-se, essencialmente, às tarefas domésticas e aos cuidados a prestar ao descendente.
O arguido B… completou o antigo 5.º ano dos liceus sem incidentes de relevo e com aproveitamento, revelando ter apreciado os conteúdos letivos e o espaço escolar até ao momento em que, com 12 anos de idade, encetou consumo de canabinóides com pares e colegas, num percurso de escalada para estupefacientes de crescente poder aditivo, designadamente heroína e cocaína.
A dependência de substâncias psicotrópicas foi e é uma circunstância determinante e basilar no percurso do arguido, com reflexos claros em diversas vertentes, nomeadamente profissional, relacional e social. Iniciou atividade laboral precária aos 20 anos, depois de uma adolescência ociosa e centrada nos consumos de droga, em ocupações provisórias, como estafeta, pintor de construção civil, hotelaria, até ao seu último e mais permanente emprego, de rececionista numa pensão no centro do Porto (cerca de 20 anos, entre 1995 e 2015, sensivelmente).
Casou-se em 1995. A experiência conjugal foi um fator de estabilidade e adequação. Contudo, a mulher morreu em 2009, na sequência de doença do foro cardíaco. Tem uma filha atualmente com 18 anos de idade, com a qual não mantém contacto, por aquela desaprovar o estilo de vida do pai. O pai do arguido faleceu na década de 1990 e a mãe encetou nova ligação conjugal, passando a residir na zona de Santa Maria da Feira, terra de origem do companheiro. Assim, sem qualquer suporte relacional próximo, o trajeto de B… encetou espiral cada vez mais descendente e mais intrincada na toxicodependência. É acompanhado no CRI do Porto Central já há mais de 30 anos e continua a fazer terapia de substituição com antagonista, pelo que não consome heroína há aproximadamente 26 anos. No entanto, mantém dependência de cocaína, a sua droga de eleição.
O arguido viveu, até há cerca de 2 anos, na Rua…, residência arrendada de seus pais. Todavia, o senhorio decidiu vender o prédio, pelo que B… se viu forçado a abandonar o imóvel, tendo-lhe sido oferecida guarida na garagem de uma sua parente afastada, na …, Matosinhos, sua atual morada.
À data dos factos, tal como atualmente, B… vivia, a título gracioso, na garagem supramencionada. Chegou a estar alojado na própria residência, mas, aproveitando a ausência do familiar no hospital, decidiu dar uma festa com vários dos seus amigos e conhecidos, deixando a habitação em estado caótico de desarrumação e mesmo alguma destruição, pelo que a parente lhe retirou autorização para permanecer na casa. Utiliza uma sanita química portátil de campismo e, aos fins-de-semana, toma banho na piscina municipal da ….
A situação económica é claramente deficitária: o arguido recebe apenas €176 mensais respeitantes a subsídio de sobrevivência da falecida mulher, pelo que a sua subsistência depende, em essência, de apoio institucional e/ou solidário. Até há aproximadamente 2 meses tomava as refeições no … E…, no Porto, para onde foi encaminhado pelo CRI do Porto Central, mas foi encontrado num dos WC a consumir estupefacientes, pelo que a entidade retirou a disponibilidade até aí evidenciada.
Apesar de morar agora em Matosinhos, o quotidiano de B… decorre fundamentalmente no Porto, nos bairros e locais usualmente conotados com utilização e tráfico de estupefacientes, espaços onde encontra pares com hábitos e estilos de vida semelhantes aos seus.
VI.
No âmbito do Processo Comum Singular n.º 166/17.0PBMTS, do juízo local criminal de Matosinhos (J4), do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, o arguido foi em 05-04-2019 condenado na pena de 2 anos e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos e 3 meses, pela prática em 12-02-2017 de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 2, al. e), do C.P., tendo a respetiva decisão transitado em julgado em 20-05-2019.
No âmbito do Processo Comum Coletivo n.º 50/19.3SFPRT, do juízo central criminal do Porto (J7), do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, o arguido B… foi em 20-01-2020 condenado na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano e 6 meses de prisão, subordinada a regime de prova, pela prática, em 13-05-2019, em coautoria e sob a forma consumada, de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo art.º 25.º, al. a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, tendo a respetiva decisão transitado em julgado em 19-02-2020.
No âmbito do referido processo, no dia 30-09-2019 foi deduzida acusação, onde lhe foi imputado: “Desde data não concretamente apurada, mas seguramente desde o mês de maio de 2019, que o arguido F…, com alcunha de "F1…" atuando em conjugação de esforços e divisão de tarefas com o arguido B…, cabendo a este último a função de vigia, procedem à venda, a troco de dinheiro, de produtos estupefacientes, heroína e cocaína, a vários consumidores.
Estabeleceram como ponto de venda dos produtos estupefacientes a porta da residência do arguido F…, sita no Bairro…, Bloco…, entrada…, casa.., nesta cidade.
Assim, no dia 13 de maio de 2019, pelas 19h.40m, o arguido B… deslocou-se ao encontro do arguido F…, junto da porta da residência deste.
Minutos depois, e após uma troca de palavras, encaminharam-se ambos até junto de um ringue, sito na Alameda… (local muito próximo) onde o arguido B… se posicionou num ponto de controlo de eventuais investidas policiais e encaminhamento de consumidores para o arguido F….
O arguido F…, por sua vez, deslocou-se até ao local onde armazenava o estupefaciente para venda: Bloco…, entrada ..., onde permaneceu cerca de cinco minutos (das 20h.00m às 20h.05m) e de onde saiu munido de uma bolsa de mão, de cor escura, que acondicionava no seu interior 70 embalagens plásticas, contendo heroína (15,82 gramas, peso bruto, correspondente a 9,933 gramas, peso líquido, de heroína); e uma embalagem plástica, contendo vários pedaços de cocaína [4,81 gramas, peso líquido, de cocaína (éster metílico), com uma (THC) de 34,5 %].
Quando o arguido F… caminhava na direção do ponto de venda pré-estabelecido (Bloco .., entrada …) deu-se início à intervenção policial, que provocou a fuga imediata dos dois arguidos.
O arguido F…, nessa fuga, lançou para o chão a bolsa atrás descrita, que foi de imediato recolhida pelas autoridades policiais, acabando por ser intercetado um pouco à frente, junto ao Bloco .., entrada ....
Não foi possível intercetar, naquela ocasião, o arguido B….
Os arguidos, destinavam os produtos estupefacientes apreendidos à cedência, a troco de dinheiro, a terceiros, visando com tal atividade obter proventos económicos.
Os arguidos tinham consciência de que não podiam adquirir, deter, ceder, proporcionar a outrem ou vender as mencionadas substâncias, cuja natureza e características conheciam, e mesmo assim muniram-se das mesmas, com o propósito de entregar, mediante contrapartida, a outras pessoas para consumo, pretendendo assim obter vantagens económicas”.
Contudo, no referido acórdão, foi apenas considerado provado que:
“No dia 13 de maio de 2019, o arguido F…, com alcunha de "F1…", atuando em conjugação de esforços e divisão de tarefas com o arguido B…, cabendo a este último a função de vigia, acordaram proceder à venda, a troco de dinheiro, de heroína e cocaína a vários consumidores.
Estabeleceram como ponto de venda a porta da residência do arguido F…, sita no Bairro …, Bloco .., entrada …, casa .., nesta cidade.
Pelas 19h.40m, o arguido B… deslocou-se ao encontro do arguido F…, junto da porta da residência deste, sita no Bairro …, Bloco …, entrada …, casa .., nesta cidade do Porto.
Minutos depois, e após uma troca de palavras, encaminharam-se ambos até junto de um ringue, sito na Alameda… (local muito próximo) onde o arguido B… se posicionou num ponto de controlo de eventuais investidas policiais e para posterior encaminhamento de consumidores de estupefacientes.
O arguido F…, por sua vez, deslocou-se até ao interior do Bloco .., entrada .., onde permaneceu cerca de cinco minutos (das 20h.00m às 20h.05m) e de onde saiu munido de uma bolsa de mão, de cor escura, que acondicionava no seu interior 70 embalagens plásticas, contendo heroína com o peso líquido de 9,933 gramas de heroína e uma embalagem plástica, contendo vários pedaços de cocaína, com o peso líquido de 4,81 gramas (éster metílico), com uma (THC) de 34,5 %.
Quando o arguido F… caminhava na direção do ponto de venda pré-estabelecido com o coarguido (Bloco .., entrada …) deu-se início à intervenção policial, que provocou a fuga imediata dos dois arguidos.
O arguido F…, nessa fuga, lançou para o chão a bolsa atrás descrita, que foi de imediato recolhida pelas autoridades policiais, acabando por ser intercetado no … piso do Bloco ...
Não foi possível intercetar, naquela ocasião, o arguido B….
Os arguidos, destinavam a heroína e a cocaína apreendidos à cedência, a troco de dinheiro, a consumidores.
Os arguidos tinham consciência de que não podiam deter e vender as mencionadas substâncias, cuja natureza e características conheciam, e mesmo assim muniram-se das mesmas, com o propósito de entregar, mediante contrapartida monetária, a outras pessoas para consumo.
Os arguidos, agiram voluntária livre e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei, agindo sempre em conjugação de esforços e intenções no âmbito de plano que entre todos delinearam”.
VII.
(Factos respeitantes ao arguido D…)
O processo de crescimento e desenvolvimento do arguido D… decorreu, maioritariamente, no agregado familiar de origem, do qual faziam também parte os progenitores e um irmão mais novo, atualmente com 13 anos de idade. A dinâmica familiar era um pouco conturbada devido às sucessivas ruturas entre os progenitores, situação que culminou na separação definitiva há cerca de 4 anos.
O arguido integrou o sistema escolar na idade convencionada, tendo concluído o 9.º ano através do ensino regular, integrando no 10.º ano de escolaridade o ensino profissional, o qual lhe atribuiria equivalência ao 12.º ano de escolaridade e certificação profissional. Todavia abandonou a sua frequência após ter feito 18 anos uma vez que já não se encontrava ao abrigo da escolaridade obrigatória.
Assim, iniciou com 19 anos atividade laboral como repositor num supermercado, onde permaneceu cerca de três meses. Posteriormente trabalhou na colocação de andaimes na empresa “G…, Lda.”, saindo decorridos dois anos por encerramento da empresa. Trabalhou também oito meses na H… como empregado de limpeza da área de exteriores.
Enquanto ocupação dos tempos livres, o arguido pratica desde os cinco anos de idade a modalidade desportiva de futebol, enquanto atleta federado, tendo jogado na época de 2018/19 no I… como médio-avançado, encontrando-se atualmente a aguardar nova contratação.
Há cerca de oito anos estabeleceu relacionamento afetivo, tendo desta união um descendente de 2 anos de idade. Contudo, há sensivelmente um ano o casal entrou em rutura. Apesar da separação estabelece um relacionamento próximo com o descendente.
À data dos factos o arguido encontrava-se a residir com o progenitor (40 anos, proprietário de alojamento local), sendo a relação entre ambos equilibrada e afetuosa. Residem, na morada constante nos autos, em habitação própria, de tipologia 5, situada em meio urbano, conotado com problemáticas sociais relevantes.
Atualmente o arguido reside sozinho, fazendo exploração de alojamento local na sua própria habitação, tendo o progenitor passado a viver com a atual companheira.
O arguido estabeleceu entretanto novo relacionamento afetivo de namoro, encontrando-se a atual namorada grávida de cinco meses.
Profissionalmente, o arguido encontra-se a realizar o Curso de Formação para Obtenção de CMTVDE (transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados a partir de plataforma eletrónica), com o objetivo de vir a exercer funções de motorista profissional de passageiros em veículo caracterizado a partir de plataforma eletrónica (TVDE), através da empresa “Uber Portugal, Lda.”.
Aufere mensalmente cerca de €500 dos rendimentos provenientes das suas funções enquanto jogador de futebol, embora atualmente se encontre a aguardar nova contratação, e do alojamento local que explora. As despesas continuam a ser asseguradas pelos progenitores.
Enquanto ocupação dos tempos livres privilegia o convívio com familiares e amigos, nunca tendo consumido qualquer tipo de substância aditiva, apenas tabaco.
VIII.
Não lhe são conhecidos antecedentes criminais. (…)».
*
A invocada exceção de caso julgado
Já no início da audiência de julgamento, suscitando a sua apreciação no âmbito das questões prévias que obstariam à apreciação do mérito da causa a que se refere o artigo 338º do Código de Processo Penal, o arguido ora recorrente alegou a exceção de caso julgado e violação do ‘ne bis in idem’, pois teria sido já julgado e condenado, com trânsito em julgado, em 19/02/2020, antes do início do julgamento dos presentes autos, por factos/crime igual, previsto e punido no artigo 21º, n.º1, do D.L. 15/93, por factos ocorridos em 13/05/2019 – ou seja, entre o primeiro e o segundo factos criminosos ora ajuizados.
Em seu entender, estar-se-ia perante um mesmo crime continuado, nos termos do nº 2 do artigo 30º do Código Penal, circunstância que conduziria à sua “absolvição da instância”.
Assim não entendeu, porém, o Tribunal Coletivo, que, no acórdão recorrido, analisou este tema nos seguintes termos:
«(…) É certo que o crime de tráfico de estupefacientes é um crime exaurido, no sentido de que a condenação de alguém pela prática de tal crime, referida a um determinado período de tempo, corresponde a uma apreciação global da sua atividade delituosa durante esse período, independentemente da falta de consideração de algum ou alguns factos parcelares praticados nessa época. Outros factos desse crime, praticados durante esse período, apesar de não conhecidos ou considerados na condenação anterior estão abrangidos pelo caso julgado que ele formou (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18-06-1998, in Coletânea de Jurisprudência – acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, Tomo III, pág. 167).
Contudo, os factos julgados no processo comum coletivo n.º 50/19.3SFPRT foram praticados num único dia e não ao longo de um período de tempo. Acresce que aqueles foram cometidos como descarga de uma resolução criminosa distinta e autónoma de qualquer uma das resoluções criminosas aqui em causa, que também são autónomas entre si, não formando, pois, uns factos e outros uma unidade de ação, quer do ponto de vista naturalístico quer do ponto de vista jurídico.
Deste modo, fica afastada a verificação da exceção do caso julgado
Vejamos.
Importa salientar que o recorrente em nenhum momento do seu recurso põe em causa a matéria de facto dada como provada nos presentes autos.
Tal significa que, desde logo, se mostra liminar e definitivamente afastada a hipótese de as várias condutas do recorrente serem unificadas por uma unidade de resolução.
Por outro lado, não obstante alguma proximidade temporal entre as diversas atuações do arguido B… (pois ocorreram no mesmo mês), verifica-se que as mesmas tiveram lugar em circunstâncias diferenciadas e independentes uma das outras:
- uma, a 5/05/2019, em que realizou o transporte de droga a pedido do aqui coarguido C…;
- outra, a 23/05/2019, em que, em acordo com os aqui coarguidos D… e C…, encaminhou diversos consumidores para comprarem estupefacientes ao referido D… e chegou a entregar droga a consumidores que se encontravam num carro (e a receber o respetivo preço);
- e outra, a 13/05/2019, na qual, em acordo com o coarguido (no processo pré julgado 50/19.3SFPRT) F…, o recorrente fez vigia e encaminhou consumidores para transacionarem estupefacientes com o mencionado F….
Poderíamos ser levados a cogitar – como sibilinamente parece sugerir o recorrente – que a autonomização de tais condutas surge, face à reconhecida situação de toxicodependência do impugnante, como um deslocado artificialismo ou uma obstinação injustificada do Tribunal recorrido.
Mera aparência, porém!
Se o recorrente tivesse optado por colocar em causa as razões de facto que levaram a que se procedesse à alteração não substancial da factualidade narrada na acusação, logo se patenteariam os fundamentos da destrinça efetuada.
Com efeito, basta atentar no seguinte trecho da motivação da decisão da matéria de facto no acórdão recorrido:
«Convém ter presente que os arguidos C… e B… terão que ter atuado no dia 23-05-2019 ao abrigo de uma resolução autónoma à que presidiu às condutas que levaram a cabo no dia 05-05-2019, dado que outra não pode ser a conclusão a tirar do facto de terem sido entretanto submetidos a interrogatório judicial indiciados pelo crime de tráfico de estupefacientes, onde inevitavelmente lhes foi dado um sinal de alerta quanto ao desvalor das suas condutas adequado a fazê-los interiorizar que o Direito não permitia a prática de tais factos.
“A circunstância de o agente ser detido e ouvido em interrogatório judicial relativamente à prática dos atos de tráfico até aí cometidos tem a virtualidade de fazer cessar definitivamente o processo factual ocorrido preteritamente, correspondendo a prática ulterior de factos desvaliosos semelhantes, sustentado por um impulso subjetivo autónomo relativamente ao dolo inerente aos factos anteriores, a novo crime” (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 06-01-2011, processo n.º 13/09.7JELSB.E1, in www.dgsi.pt).
Ora, no presente caso, os factos demonstrados não permitem concluir que os atos praticados a 23-05-2019, bem como pelo arguido B… a 13-05-2019 e pelos quais foi autonomamente julgado e condenado no âmbito do processo n.º 50/19.3SFPRT, sejam considerados mera descarga daqueles primeiros praticados a 05-05-2019, exigindo, pois, um novo processo deliberativo. A confirmar essa mesma conclusão cumpre destacar, como resulta do já exposto, que a atuação dos arguidos em cada um desses dias não é sequer homogénea. Na verdade, a conduta que os arguidos C… e B… assumiram no dia 05-05-2019 não voltou a ser repetida, sendo completamente distinta a por eles assumida no dia 23-05-2019. Por outro lado, o arguido C… mudou a sua forma de atuação, socorrendo-se no dia 23-05-2019 de mais colaboradores para a execução das transações de estupefacientes de que era beneficiário e impulsionador. Por seu turno, e quanto ao arguido B…, embora no processo n.º 50/19.3SFPRT lhe tivesse sido imputada a prática de um crime de tráfico de estupefacientes desde o mês de maio de 2019, o certo é que apenas ficou demonstrada uma atuação em conluio com pessoa distinta de qualquer um dos arguidos destes autos, limitada a um único dia. Deste modo, tal atuação é perfeitamente desligada da atuação em causa nestes autos onde o arguido B… se envolveu com diferentes pessoas, pressupondo, pois, resolução autónoma, o que impede que toda a sua atuação nos dois processos seja encarada como constituindo o mesmo pedaço de vida ou descarga da mesma resolução inicial [3]
Compreende-se, assim, por que razão o recorrente optou por deslocar o fulcro da discussão para as – no caso, átonas e especulativas – questões da verificação de um só crime continuado e do âmbito de abrangência da exceção do caso julgado.
Com efeito, pode dizer-se, desde logo, que não assume especial relevância para a solução de tais questões a constatação do alargado leque descritivo das ações típicas que podem integrar o tipo legal de crime de tráfico de estupefacientes, pois não foi tanto a similitude ou a diferenciação das concretas tarefas ou papéis desempenhados pelo arguido B… nas diversas datas consideradas que conduziu, no acórdão recorrido, à autonomização dos delitos cometidos.
Pesaram mais a diversidade dos acordos estabelecidos com diferentes coautores (isto, para além de ocorrerem em dias e locais díspares) e sobretudo, decisivamente, o corte da linha de continuidade psicológica entre os factos julgados nos presentes autos e aqueles que foram previamente sentenciados.
Ou seja, recorrendo à fórmula legal utilizada no nº 2 do artigo 30º do Código Penal para a unificação de diversas condutas em um só crime continuado, o que faltou não foi só (ou tanto) a execução por forma essencialmente homogénea, mas também (ou até particularmente) a manutenção de toda a situação exterior que diminuísse consideravelmente a culpa do agente.
Não se verificam, pois, no caso, os pressupostos de existência de um só crime continuado.
Aliás, em hipótese semelhante, também no recentíssimo acórdão da Relação de Coimbra de 20/01/2021, proferido processo 144/18.2.GBSCD.C1, acedível em www.dgsi.pt, se decidiu no mesmo sentido: “Em casos como o ocorrido no âmbito destes autos, em que a atividade de tráfico de estupefacientes cessa por força da detenção (na concreta situação, em flagrante delito) do arguido, as condutas posteriores de igual natureza praticadas pelo mesmo agente constituem, em relação às anteriores, uma unidade resolutiva autónoma, verificando-se, deste modo, quanto à globalidade da ação delitiva do arguido, um concurso efetivo de dois crimes.”.
Nenhuma censura nos pode merecer, consequentemente, o decidido no douto acórdão recorrido quanto à ausência de verificação dos requisitos da exceção do caso julgado, nenhuma ofensa tendo sido feita ao princípio “non bis in idem”, com consagração constitucional no nº 5 do artigo 29º da CRP.
*
III – DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido B…, assim confirmando o decidido no douto acórdão recorrido.
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Custas a cargo do recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3,5 U.C.s.
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Porto, 10 de fevereiro de 2021
Vítor Morgado
Maria Joana Grácio
Francisco Marcolino
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[1] Incorre aqui o arguido/recorrente em lapso, visto que, como decorre do acórdão proferido no processo 50/19.3.SFPRT, cuja cópia se encontra junta a folhas 499-509 dos presentes autos, os factos aí dados como praticados, ocorreram a 13/05/2021.
[2] Ver, nomeadamente, o Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, III, 2ª edição, página 335 e jurisprudência uniforme do S.T.J. (por exemplo, o acórdão do S.T.J. de 28/04/1999, in CJ/STJ, ano de 1999, tomo II, página 196 e jurisprudência nos mesmos citada).
[3] Sublinhados nossos.