Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
367/15.6T9AMT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOÃO PEDRO NUNES MALDONADO
Descritores: CITIUS
ALERTAS
FALTA DE DILIGÊNCIA
Nº do Documento: RP20170524367/15.6T9AMT.P1
Data do Acordão: 05/24/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 718, FLS.451-457)
Área Temática: .
Sumário: I - Os serviços do portal Citius de alertas via SMS e/ou correio electrónico, não foram objecto de qualquer regulação normativa, não constituem meios ou formas de notificação de actos processuais e não são geridos pela secretaria judicial onde corre o processo em relação ao qual é prestada a informação.
II - A falta a um acto judicial de pessoa para ele convocada em virtude de haver recebido um alerta via SMS de haver sido alterada a data é injustificada.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº367/15.6T9AMT.P1

Acórdão, deliberado em conferência, na 2º secção criminal do Tribunal da Relação do Porto
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I. B…, assistente, veio interpor recurso da decisão instrutória proferida no processo nº367/15.6AMT, Marco de Canavezes - instância central – secção de instrução criminal –J2, Porto, Tribunal da Comarca do Porto Este, que não pronunciou o arguido C… pelos factos e imputação jurídica constantes do requerimento para a abertura da instrução.
I.1. Decisão recorrida (que se transcreve parcialmente).
1. Relatório.
1.1. Despacho arquivamento
A final do inquérito o Ministério Público proferiu despacho de arquivamento (fls. 103 e ss), por ter entendido não se mostrar indiciada a ilegitimidade do benefício que com a falsificação do documento a arguida teria de pretender atingir.
1.2. Requerimento de abertura da instrução.
Veio o assistente B… requerer a abertura da instrução (fls. 111 e ss) contra a arguida C…, inconformado com o referido despacho de arquivamento, afirmando a prática por esta de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256º, nº1, al.d) do Código Penal.
Para tanto, em síntese, imputa-lhe:
A arguida nos autos de processo com o nº 421/07.8TBAMP apresentou um requerimento do qual consta, além do mais, a assinatura do assistente.
A assinatura aposta no referido requerimento como sendo do assistente é falsa. A assinatura referida foi aposta pela arguida.
1.3. Da instrução.
Foi declarada aberta a instrução (fls. 133/134).
Ouvida a arguida, realizou-se o debate instrutório, com observância do legal formalismo, como da acta consta.
2. Saneamento (…).
3. Fundamentação.
3.1 As finalidades da instrução (…).
No caso concreto cabe verificar se, ao contrário do decidido pelo MP no despacho de arquivamento, existem ou não indícios suficientes nos autos que sustentem os factos imputado pela assistente e se, havendo-os, os factos imputados configuram a prática de um crime de falsificação de documento e da sua imputação à arguida.
3.2. Os factos suficientemente indiciados:
1. Nos autos de processo nº 42I/07.8TBAMT, Instância Local Cível, actualmente Núcleo de Amarante, Comarca de Porto Este, a arguida apresentou o requerimento cuja cópia se encontra a fls. 13, do qual consta, além de outras, a assinatura da arguida e do assistente.
2. A assinatura com o nome do assistente foi aposta pelo punho da arguida.
3. Pelo requerimento referido em I a arguida solicitou a transferência do montante devido pela expropriação para uma conta bancária por si apenas titulada.
Ainda:
4. A assinatura aposta no documento referido em I foi com consentimento do assistente.
5. A transferência do dinheiro para a conta referida em 2 foi com o conhecimento do assistente.
6. Após a transferência do dinheiro referido em 5 a arguida cumpriu o acordo documentado nos autos e estabelecido no âmbito do processo de execução nº 1451/08.8TBAMT.
7. Posteriormente a arguida abriu uma conta no D… para onde transferiu o dinheiro remanescente pertencente ao assistente, conta bancária que apenas este movimenta.
8. A arguida agiu livre, deliberada e conscientemente.
3.3. Os factos não suficientemente indiciados:
9. A arguida sabia que com a sua conduta violava a lei.
3.4. Motivação.
A arguida, mãe do assistente, confessou ter aposto no documento em causa a assinatura do assistente, seu filho, afirmando peremptoriamente que o fez com o consentimento deste.
Efectivamente a arguida, em declarações desenvolvidas prestadas em sede de instrução, de forma clara, mas com alguma emoção própria e decorrente dos laços maternais que a ligam ao assistente, deu a conhecer o seu relacionamento passado e actual com o assistente, seu filho, bem como os negócios em que este se envolveu e a cobertura que teve de efectuar relativamente a muitos desses negócios, fazendo-o com dinheiro seu.
E a versão dos factos que apresentou em sede de instrução está aliás de acordo com os dizeres constantes do requerimento que apresentou no processo nº 421/07.8TBAMT e com as declarações
que apresentou em sede de inquérito (fls. 59/60), o que tudo está resumido no requerimento de fls. 63/66, em conformidade ainda com o acordo alcançado no âmbito da execução nº 1451/08.8TBAMT, cuja cópia do acordo e plano de pagamento foi ora junto pelo arguido de forma legível, estando ainda junto o adiantamento ao mesmo (fls. 85).
E o assistente ao contrário do que se esperaria remete-se a uma posição lacónica em sede de inquérito, remetendo para a queixa, mas nem sequer comparece em sede de instrução, não esclarecendo, e já teve a oportunidade de o fazer, se efectivamente a conta que a arguida, sua mãe, abriu no D…, como a mesma referiu, apesar de ser por ela titulada, é ou não por si exclusivamente movimentada, bem como as razões subjacentes a esse modo de proceder.
De qualquer forma, o que se apresenta essencial, em face das declarações da arguida, as quais se nos afiguraram absolutamente credíveis, não tem o Tribunal a menor dúvida em afirmar a veracidade do relato da mesma. Tal como não tem o Tribunal qualquer dúvida em afirmar que a assinatura aposta no requerimento em causa, como sendo aposta pelo punho do assistente, foi aposta pelo punho da arguida, mas com conhecimento e consentimento do assistente e teve por finalidade exclusiva a obtenção do montante da expropriação com a finalidade referida no mesmo requerimento (aliás o beneficiário da indemnização no referido processo de expropriação, em face do requerimento apresentado, não era apenas o assistente, mas também a arguida, a filha desta e o marido desta última).
Ademais, o interesse na apresentação apressada de tal requerimento era essencialmente do assistente, pois era este o devedor de uma quantia de 97.000,00 euros, tendo sido aceite pelo exequente a redução do referido montante da dívida para 32.500,00 euros, montante este que teria de ser pago nos cinco dias seguintes à disponibilização do montante da indemnização. Prazo final que ficou estabelecido, em face da declaração de fls. 85, para 31/01/2015, mas que em face do envolvimento pessoal da arguida junto do credor, como a mesma referiu, foi fixado em 28/02/2015, pelo que o requerimento apresentado em 15/02/2015 no referido processo se apresentava urgente e o assistente não se encontrava presente para o assinar, pois nos dizeres da arguida, ao que se lembra, estava em Lisboa, pelo que em contacto com ele estabelecido e ao corrente da situação consentiu na aposição da própria assinatura pelo punho da arguida.
E o que acabou de se referiu é reiterado pela irmã do assistente e filha da arguida. Na verdade esta (fls. 101/102) reitera integralmente a posição da arguida, a autorização dada pelo assistente para que a mãe (a arguida) assinasse o documento, em face do que a mãe ia respondendo "eu posso assinar o documento por ti".
É em face do supra exposto que o Tribunal deu como suficiente e não suficientemente indiciada a factualidade supra, bem como acrescentou a factualidade referida em 4 a 7.
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I.2. Recurso do assistente (conclusões que se transcrevem parcialmente).
1. A signatária e o assistente não compareceram à diligência para a qual foram notificados pelos motivos elencados e provados em sede de requerimento de arguição de nulidade da diligência.
2. Não se sufragando dos fundamentos de indeferimento da referida arguição
5. Com efeito, a signatária/mandatária do assistente comunicou atempadamente, mais concretamente no dia anterior à diligência, mediante requerimento e respectivo comprovativo, do seu impedimento em comparecer à diligência e, consequentemente requereu que fosse agendada nova data.
6. Através de SMS enviada pelo Citius a mandatária do assistente recepcionou um SMS no seu telemóvel com a seguinte mensagem: " A diligência relativa ao processo 367/15.6T9AMT das 11H15 de 13-12-2016 foi alterada. Para mais informações, consulte o Portal Citius".
7. Por via do teor desta mensagem, a mandatária do assistente/signatária ficou convencida de que a diligência não se iria realizar.
8. Pelo que, o referido SMS/enviado via Citius recepcionado pela signatária compeliu esta a entender que a diligência não se realizaria.
9. A dita comunicação escrita que induzido em erro a signatária e esta o assistente não pode prejudicar este.
10. Dispõe o artigo 157º, nº 6, do CPC, aplicável ao processo penal nos termos do artigo 42 do CPP, que "os erros e omissões dos atos praticados pela secretaria judicial não podem, em qualquer caso, prejudicar as partes".
11. A ausência do assistente à diligência em causa nos termos em que o foi, na qual seriam tomadas as suas declarações constitui nulidade prevista no artigo 120, nº 2, alínea d), do CPP.
12. O despacho que deu sem efeito a sua tomada de declarações está igualmente ferido de nulidade.
13. Tais nulidades acarretam, nos termos do disposto no artigo 122º do CPP, a anulação dos despachos recorridos e, consequentemente, a sua substituição por outros que defira as arguidas nulidades, determinando-se a realização das diligências de prova, tomada de declarações do assistente.
14. A Ilustre Defensora constituída da arguida, requereu a junção aos autos de um documento, cópia simples do acordo e plano de pagamento efectuado no âmbito do processo de execução com número 1451/08.8TBAMT, no qual a arguida é parte interessada, por ser fiadora do assistente, ali executado, no decurso da diligência a que faltaram o assistente a a signatária.
15. Documento que nunca foi notificado ao assistente que dele teve conhecimento apenas por consulta dos autos.
16. Pelo que sobre o referido documento não foi exercido o contraditório.
17.O princípio do contraditório tem consagração constitucional - artigo 32º, nº 5, da CRP.
18. Determinando, por sua vez, o artigo 359º nº1, do CPP que "Não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência".
19. A consequência processual da inobservância do contraditório consubstancia uma nulidade insanável - artigo 119º, c), do CPP, que ora se invoca.
20. O Tribunal recorrido ao ter dado sem efeito a tomada de declarações do assistente, inviabilizou que fossem carreados para os autos factos essenciais e imprescindíveis à descoberta da verdade material.
21. Verifica-se, no nosso modesto entendimento, a nulidade prevista no artigo 119º, d), do CPP, por omissão de diligências que reputamos por essenciais à descoberta da verdade material, que para os devidos efeitos se invoca.
22 Reiteramos verifica-se insuficiência de instrução, porque subsistem inúmeros factos que carecem de explicação. Podendo, o assistente caso fosse ouvido, dissipá-las e, deserto, trazer para os autos prova complementar que se mostrasse crucial à descoberta da verdade material.
23. Por conseguinte, toda a fundamentação da decisão recorrida está ferida de nulidade por não espelhar a verdade dos factos em causa.
I.3. Resposta do MºPº (conclusões que se transcrevem parcialmente).
d) O assistente e a sua Mandatária faltaram à audiência designada por acordo para o dia 13/12/2016, e, tendo-se aquela realizado e ali sido produzido um documento, vieram arguir nulidade;
e) Ora, a presença de Mandatário do assistente não é obrigatória aquando da realização dos actos de instrução (embora deva ser notificado - o que no caso concreto aconteceu). E no que diz respeito à realização do Debate Instrutório, a presença da Ilustre Mandatária também não é obrigatória (ao contrário do que acontece com o defensor do arguido).
f) Pelo que, tendo a audiência do dia 13 sido designada por acordo das partes e tendo aqueles faltado à diligência para a qual estavam convocados, não há credencial legal para o adiamento, pelo que não foi cometida qualquer nulidade;
g) Não tendo estado naquela diligência, cuja presença não era obrigatória, por sua exclusiva culpa, não podem ora alegar violação do contraditório por não terem sido confrontados com a possibilidade de analisarem o documento junto naquela audiência, o qual aliás, teve pouca ou nenhuma relevância para a decisão final;
h) Finalmente, o assistente insurgiu-se contra a fundamentação do despacho de não pronúncia, mas não alegou em concreto quais as provas que impunham uma decisão diversa da tomada, pelo que, também nesta parte, o recurso surge votado ao insucesso.
I.4. Resposta da arguida (motivações que se transcrevem parcialmente).
1.Alega o recorrente que a sua ilustre mandatária e ele próprio não compareceram à diligência para a qual foram notificados, tendo a mandatária comunicado no dia anterior à diligência o impedimento de comparecer e o requerimento a pedir que fosse agendada nova data.
2. Requerimento esse que foi recebido e lido às 9h50m.
3.O senhor Juiz de instrução, com os fundamentos indicados no seu douto despacho, considerou não haver fundamento para o adiamento.
4. Sabe-se que o citius tem um sistema automático de alerta, admitindo-se que a mandatária tivesse recebido essa comunicação.
5. Mas, se tal mensagem foi recebida, não pode, nem deve ser considerada como notificação e não tem valor vinculativo, pelo que não podia a mandatária basear-se nela para pressupor que a diligência não se realizaria.
6. A referida mensagem não tem a virtualidade de induzir em erro os mandatários, uma vez que sempre lhes é exigido que verifiquem a bondade de todas as informações recebidas por essa via, recorrente aos meios que têm ao seu dispor.
7. Ao caso sub judice não pode ser aplicado o disposto no art°. 157.°, n.° 6 do C. P. Civil, uma vez que não configura qualquer erro ou omissão de acto praticado pela secretaria judicial e não pode prejudicar as partes.
8. Assim, não tendo o assistente comunicado a sua falta e a respectiva justificação antes da diligência, mostra-se fundamentado legalmente o douto despacho proferido pelo senhor Juiz de instrução, não se vislumbrando qualquer nulidade.
Exercício do direito do contraditório
9. Como resulta do exame do processo, a arguida juntou, por correio electrónico, muito antes da diligência em causa, o documento a que se refere o recorrente e que é o acordo e plano de pagamento efectuado no âmbito do processo de execução com o n°. 1451/08.8TBAMT.
10. Consultado o processo, a mandatária da arguida verificou que a impressão do mesmo não estava correctamente feita, pelo que requereu que fosse junto o original desse documento para ser mais fácil a sua leitura pelo Magistrado.
11. Assim, o recorrente já tinha conhecimento da junção aos autos desse acordo e plano de pagamento efectuado no âmbito do processo de execução n.° 1451/08.8TBAMT, por si subscrito.
12. Aliás, o recorrente não alega qualquer irregularidade ou falsidade deste documento, mas tão só que, em relação a ele, não foi observado o princípio do contraditório.
13. Ora, uma vez que não se trata de uma junção ao processo de documento novo, mas sim cópia do documento que já existe nos autos, não se mostra violado, no entender da arguida, qualquer princípio que devesse ser cumprido, não se verificando qualquer nulidade.
14. Por isso, se o recorrente pretendia pronunciar-se sobre o mesmo, já o podia ter feito quando esse documento foi junto aos autos, ou aquando do requerimento de instrução, uma vez que tinha conhecimento do seu teor.
15. Não se trata, por isso, de um documento novo, mas sim de junção devidamente impressa do documento já conhecido pelo recorrente e indevidamente impresso nos autos.
16. Daí que não foi violado o princípio do contraditório, violação invocada pelo recorrente.
Do despacho de não pronúncia
17. Pretende o recorrente que este Tribunal revogue o despacho de não pronúncia, substituindo-o por outro que pronuncie a arguida pela prática do crime p.p. no art.° 256.°, n.° 1 do CP, com o fundamento de que se verifica a nulidade prevista no art°. 119.°, al. d) do C.P.Penal.
18. Dispõe aquele normativo legal que constituem nulidades insanáveis, que devem ser oficiosamente declaradas em qualquer fase do procedimento, além das que como tal forem cominadas em outras disposições legais: (...) al. d) A falta de inquérito ou de instrução, nos casos em que a lei determinar a sua obrigatoriedade.
19. Entende o recorrente que ocorreu omissão de diligências que reputa essenciais à descoberta da verdade material.
20. Do que deixa expresso, entende a arguida que tal omissão não ocorreu e não se verificam os pressupostos legais para que seja declarada a nulidade invocada.
I.5. Parecer do Ministério Público na Relação.
Pugnou pela improcedência com referência aos argumentos aduzidos na resposta.
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II. Objecto do recurso.
O objecto do recurso está limitado pelas conclusões apresentadas pelo recorrente (cfr. Acórdão do STJ, de 15/04/2010, in http://www.dgsi.pt: “Como decorre do artigo 412.º do CPP, é pelas conclusões extraídas pelo recorrente na motivação apresentada, em que resume as razões do pedido que se define o âmbito do recurso. É à luz das conclusões da motivação do recurso que este terá de apreciar-se, donde resulta que o essencial e o limite de todas as questões a apreciar e a decidir no recurso, estão contidos nas conclusões(…)”, sem prejuízo, obviamente da eventual necessidade de conhecer oficiosamente da ocorrência de qualquer dos vícios a que alude o artigo 410º, do Código de Processo Penal nas decisões finais (conhecimento oficioso que resulta da jurisprudência fixada no Acórdão nº 7/95, do STJ, in DR, I série-A, de 28/12/95).
São as conclusões da motivação que delimitam o âmbito do recurso. Se ficam aquém a parte da motivação que não é resumida nas conclusões torna-se inútil porque o tribunal de recurso só pode considerar as conclusões e se vão além também não devem ser consideradas porque são um resumo da motivação e esta é inexistente (neste sentido, Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português, Vol. 3, 2015, págs. 335 e 336).
O recorrente submete à apreciação deste tribunal as seguintes questões:
1º nulidade do debate instrutório e nulidade do despacho que sobre a sua arguição incidiu – artigo 120º, nº2, alínea d), do CPP;
2º nulidade insanável por preterição do direito de exercer o contraditório relativamente a documento apresentado pela arguida – artigo 119º, alínea c), do CPP e;
3º nulidade da instrução por omissão de diligências essenciais para a descoberta da verdade – artigo 119º, alínea d), do CPP.
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II.1. Da arguida nulidade do debate instrutório.
O assistente requereu a abertura da instrução em relação ao despacho de arquivamento do MºPº no inquérito instaurado contra a arguida. No mesmo (fls.114) indicou como meios de prova a reinquirição de uma testemunha e a acareação entre a arguida e o recorrente.
Foi indeferida a requerida reinquirição, deferida a tomada de declarações do assistente/recorrente e o interrogatório da arguida, ficando a requerida acareação dependente de juízo posterior (uma vez que a arguida nunca tinha prestado declarações nessa qualidade e, naturalmente, se desconhecia se a mesma as iria prestar), seguidas da realização do debate instrutório, designado para o dia 22 de Novembro de 2016, pelas 10.00 horas- despacho de fls.134.
No dia designado, por requerimento conjunto deduzido pelo recorrente e arguida e sem oposição do MºPº, foi interrompida a diligência e designada para o seu reinício o dia 13 de Dezembro de 2016, pelas 11.15 horas, data agendada de acordo com a disponibilidade dos presentes – despacho de fls.151.
A mandatária do assistente, no dia 12 de Dezembro, pelas 19.08 horas, requereu que lhe fosse justificada a falta no dia seguinte e que fosse agendada nova data para a diligência – fls.156.
Por despacho proferido no dia 13 de Dezembro, antes da diligência, foi tal falta julgada justificada e indeferido o agendamento de nova data.
Na data e hora designadas, sem a presença do recorrente e sua mandatária, procedeu-se ao interrogatório da arguida, não se tomaram declarações ao assistente, que não compareceu nem justificou a sua falta, e os presentes formularam as suas sínteses sobre a (in)suficiência de indícios tendo o juiz de instrução designado o dia 20 de Dezembro, pelas 14.00 horas, para a leitura da decisão instrutória.
Por requerimento apresentado pelo ora recorrente no dia 18 de Dezembro (22.09 horas) foi suscitada a nulidade da diligência com os seguintes fundamentos:
- após o seu pedido de adiamento da diligência a mandatária do assistente recepcionou uma SMS com o seguinte teor: A diligência relativa ao processo 367/15.6T9AMT das 11H15 de 13-12-2016 foi alterada. Para mais informações, consulte o Portal Citius;
- por tal motivo o assistente não compareceu naquela data.
Por despacho proferido na ata de leitura da decisão instrutória foi tal nulidade indeferida e procedeu-se à leitura da decisão instrutória.
Relativamente ao pedido de adiamento da diligência de prova e debate instrutório nada há a censurar no despacho de indeferimento. Nos termos do artigo 300º, nº1, do Código de Processo Penal, mesmo entendendo o advérbio “nomeadamente” como tradutor da possibilidade de adiamento para além do impedimento legítimo da presença do arguido (que tem o direito de estar presente naquele acto e de se pronunciar sobre a prova – artigos 289º, nº1, 61º, nº1, alínea b), e 301º, nº2, do Código de Processo Penal), como o impedimento do assistente (que tem direito a estar presente e de participar pessoalmente no debate – artigo 289º, nº1, do Código de Processo Penal), o mesmo não contempla o impedimento legítimo de comparência do representante (mandatário) do assistente.
Questão distinta será apreciar a natureza jurídica da comunicação (SMS, cuja autenticidade não é posta em crise) recepcionada pela representante do assistente e que determinou a ausência de comparência do assistente por o ter induzido em erro.
A convocação de uma pessoa para acto processual (ou, por maioria de razão, a desconvocação) é efectuada pelos meios consagrados no artigo 112º do Código de Processo Penal e pelas formas estabelecidas no artigo 113º do mesmo diploma.
O assistente (e deste facto tem o mesmo consciência) nunca foi objecto de qualquer comunicação de desconvocação para comparência ao acto processual designado, comunicação para comparência que lhe foi efectuada pelo juiz de instrução quando se encontrava presente na primeira data designada para o debate instrutório e que ficou documentada em acta – cfr. artigo 113º, nº7, alínea a), do Código de Processo Penal.
O representante do assistente também nunca foi objecto de qualquer notificação de adiamento da diligência efectuada pelos meios legalmente previstos (telecópia, contacto pessoal, via postal simples ou registada) – cfr. artigo 113º, nº10, do Código de Processo Penal.
Uma área de serviços (a que os advogados podem aderir) do portal Citius de alertas via SMS e/ou correio electrónico permite receber informação sobre a alteração de diligências. Esta medida foi integrada no plano de modernização Justiça + Próxima, e visa, nos termos publictados pelo Governo da República Portuguesa, evitar deslocações desnecessárias dos mandatários e poupança de recursos, através da maior celeridade no conhecimento das alterações de agenda, da maior flexibilidade na interação com os tribunais e da maior comodidade pela utilização de meios digitais.
Os referidos serviços (e as restantes medidas integradas no plano Justiça+Próxima) não foram objecto de qualquer regulamentação normativa, não constituem meios ou formas de notificação de actos processuais e são geridos por uma plataforma alheia ao controlo da secretaria judicial onde corre o processo em relação ao qual é a informação prestada.
Teve, por isso, o Governo da República Portuguesa, o cuidado de na publicitação desta sua medida governativa anunciar que “ Os alertas não constituem nem pretendem substituir qualquer notificação judicial, nem dispensam a consulta regular do portal Citius”.
De acordo com o disposto no artigo 157º, nº6, do Código de Processo Civil, aplicável ao processo penal por força do disposto no artigo 4º do Código de Processo Penal (entendimento por nós exposto no acórdão proferido em 23/11/2016 no processo 4065/14.0T9PRT, consultável no site da DGSI) os erros praticados pela secretaria judicial não podem, em qualquer caso, prejudicar as partes. O erro em causa, porém, não foi cometido no âmbito da prática de um acto processual nem, sequer, o foi pela secretaria judicial.
Por tal motivo é válido o despacho que, face à ausência injustificada do assistente, determinou a não produção do meio de prova em causa (as suas declarações).
Por outro lado, praticou o juiz de instrução todos os actos legalmente obrigatórios (cfr. artigo 289º, nº1, do Código de Processo Penal), não se verificando a existência de qualquer nulidade por insuficiência da instrução nos termos do artigo 120º, nº2, alínea d), do Código de Processo Penal.
Improcede o recurso nesta parte.
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II.2. Da arguida nulidade insanável por preterição do direito de exercer o contraditório relativamente a documento apresentado pela arguida.
O princípio do contraditório, que adquire contornos de protecção constitucional (cfr. artigo 32º, nº5, da Constituição da República Portuguesa) como princípio geral da prossecução processual, apresenta-se como o direito que a acusação e defesa têm de “oferecerem provas para demonstrar as suas teses processuais e de se pronunciarem sobre as alegações, as iniciativas, os actos ou qualquer comportamento processual do outro sujeito processual (cfr. Germano Marques da Silva, DPPP, Tomo I, 2013, pág.86).
Na perspectiva do arguido, constitui uma garantia de defesa do processo criminal (cfr. artigo 32º, nº1, da Constituição da República Portuguesa). Como princípio geral (artigo 32º, nº5, primeira parte, da Constituição da República Portuguesa) integrado no processo penal de estrutura acusatória, constitui a expressão da finalidade processual penal de protecção dos direitos fundamentais das pessoas (também nestas incluídos o arguido) - cfr. Maria João Antunes, DPP, 2016, pág.74). Neste âmbito, último artigo e número citados, na segunda parte, estabelece que a audiência de julgamento e os actos instrutórios que a alei determinar estão sujeitos ao princípio do contraditório.
Em relação à fase de instrução (excluindo, por isso, os actos de instrução praticados em sede de inquérito e ao actos praticados em audiência de julgamento) o referido principio, no que ao assistente concerne e em relação à instrução por si solicitada, encontra consagração expressa para o debate instrutório (artigos 298º, 289º, nº1, 301º, nº2 e 302º do Código de Processo Penal), declarações para memória futura (artigo 294º do Código de Processo Penal) e para os actos de instrução por si ou pelo arguido requeridos (artigo 289º, nº2, do Código de Processo Penal).
O referido princípio integra o estatuto processual do assistente, que lhe atribui competências para intervir na instrução, oferecendo provas e requerendo as diligências que entenda necessárias (artigo 69º, nº2, alínea a), do Código de Processo Penal).
A preterição do direito do contraditório do assistente em tais actos só constitui nulidade, sanável, nos casos em que está o mesmo impossibilitado do seu exercício por falta de notificação – artigo 120º, nº2, alínea b), do Código de Processo Penal.
Nos termos supra expostos o assistente (e seu representante) foi regularmente convocado para os actos de instrução e debate instrutório motivo pelo qual lhe não assiste razão alguma neste segmento do seu recurso.
Mas mesmo que se entendesse de forma distinta, ao contrário do alegado pelo recorrente, o documento junto pela arguida em sede das diligências que precederam o debate instrutório (cfr. documento de fls.159 a 166) corresponde, tão só, a cópia (não certificada) do mesmo documento, também ele cópia não certificada mas com reprodução gráfica diferente que a arguida já oferecera durante o inquérito (cfr. documento de fls.67 a 91) e, neste sentido, já era do conhecimento do recorrente, pelo mesmo sindicável.
Neste sentido, e apesar da ausência do assistente ao acto processual, não foi violado o referido princípio do contraditório.
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II.3. Da arguida nulidade da instrução por omissão de diligências essenciais para a descoberta da verdade.
Versa a discordância do recorrente no facto de o mesmo não ter prestado declarações e, assim, terem subsistido factos que carecem de explicação e que seriam dissipados através daquele meio de prova.
No âmbito da instrução, fase facultativa do processo penal, o juiz investiga autonomamente o caso tendo em conta da indicação constante do requerimento da abertura da instrução (artigos 286º, nº2, 287º, nº2, e 288º, nº4, do Código de Processo Penal).
Tal autonomia, direccionada para a finalidade da instrução, no caso concreto a comprovação judicial da decisão de arquivar o inquérito (artigo 286º, nº1, do Código de Processo Penal), determina a realização dos actos que entenda levar a cabo e pela ordem que reputar mais conveniente para o apuramento da verdade (artigos 290º, nº1, e 291º, nº1, do Código de Processo Penal), devendo apenas repetir os actos praticados em sede de inquérito quando, para além de vicissitudes da sua validade formal, se revelar indispensável à realização das finalidades da instrução (artigo 291º, nº3, do Código de Processo Penal).
O assistente requereu a prestação de declarações, o que foi deferido para momento anterior à realização do único acto obrigatório desta fase processual- o debate instrutório (artigo 289º, nº1, do Código de Processo Penal).
O regime de adiamento do debate instrutório não interfere, não é aplicável, aos actos de instrução designados de forma contemporânea mas para momento anterior. Dito de outra forma, a ausência injustificada do assistente, arguido ou testemunhas para a realização dos actos processuais designados para momento anterior ao debate instrutório mas de forma contemporânea a este não determina a aplicação da regra estabelecida no artigo 300º, nº1, do Código de Processo Penal, pensada exclusivamente para aquele acto processual obrigatório – o debate instrutório.
Em relação aos actos de instrução prévios (que, no caso concreto, correspondiam à totalidade dos actos de instrução requeridos pelo assistente e admitidos – o interrogatório da arguida e a prestação de declarações do assistente) terá o juiz de instrução (tal como o do julgamento, de acordo com as finalidades próprias desta fase), aferir da sua indispensabilidade no quadro de persecução das finalidades da instrução.
Porém, no caso do assistente (sem prejuízo do poder/dever da oficiosidade do juiz de instrução: artigos 289º, nº1, 291º, nº1, 292º, nº2, e 299º do Código de Processo Penal), foi o mesmo que solicitou a prestação das suas declarações (em rigor, a acareação com a arguida) no âmbito de uma faculdade própria (artigo 145º, nº1, do Código de Processo Penal) e não compareceu, injustificadamente, na data designada.
Teria o juiz de instrução, oficiosamente, condições para equacionar como indispensável a tomada de declarações do assistente para as reputar como essenciais para a descoberta da verdade?
O assistente prestou declarações em sede de inquérito na qualidade de ofendido (cfr. auto de inquirição de fls.38) que o juiz de instrução, bem, qualificou de “posição lacónica” uma vez que nada esclareceu em relação à sua denúncia.
A arguida, na estranha qualidade de testemunha (uma vez que foi objecto de denúncia prévia da prática da autoria da escrita de nome alheio, que admitiu), declarou em sede de inquérito toda a matéria de facto susceptível de esclarecimento pelo assistente (cfr. auto de inquirição de fls. 59 a 60).
O absoluto desinteresse do assistente durante a fase de inquérito e na instrução (que impulsionou) não é susceptível de provocar qualquer dúvida, sequer razoável, em relação à indispensabilidade das suas declarações, sendo certo que a sua valoração comportamental da arguida se encontram plenamente perceptíveis no requerimento de abertura da instrução.
Concluindo, entendemos que a preterição da produção do meio de prova pelo mesmo solicitada e simultaneamente comprometida (declarações do assistente) não representou qualquer omissão de diligência essencial para a descoberta da verdade em sede instrução e, neste sentido, não constitui nulidade relativa (cfr. artigo 120º, nº2, alínea d), do Código de Processo Penal).
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III. Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso e confirma-se a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente, fixando em 5 UCs a taxa de justiça (artigo 515º, nº1, alínea b), do Código de Processo Penal e artigo 8º, nº9, e tabela III do RCP).
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Porto, 24 de Maio de 2017
João Pedro Nunes Maldonado
Francisco Mota Ribeiro