Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2050/14.0T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MANUEL DOMINGOS FERNANDES
Descritores: CONTRATO DE MEDIAÇÃO
PROVA
DECLARAÇÕES DE PARTE
REGIME DE EXCLUSIVIDADE
REMUNERAÇÃO
BOA-FÉ
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
DANOS PATRIMONIAIS INDIRECTOS
PESSOA COLECTIVA
Nº do Documento: RP201606202050/14.0T8PRT.P1
Data do Acordão: 06/20/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 635, FLS.206-207)
Área Temática: .
Sumário: I - Na reapreciação da prova a Relação goza da mesma amplitude de poderes da 1.ª instância e, tendo como desiderato garantir um segundo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto impugnada, deve formar a sua própria convicção.
II - A prova por declarações de parte é apreciada livremente pelo tribunal, na parte que não constitua confissão, razão pela qual será normalmente insuficiente para a prova de um facto essencial à causa de pedir que surja desacompanhada de qualquer outra prova que a sustente ou sequer indicie.
III - O contrato de mediação imobiliária é um contrato bilateral e oneroso: o mediador obriga-se a procurar interessado e a aproximá-lo do comitente para a realização do negócio no sector imobiliário e este último obriga-se a remunerá-lo pelo serviço prestado.
IV - Em princípio, no contrato de mediação, a remuneração apenas é devida ao mediador com a conclusão e perfeição do negócio.
V - Todavia, tendo o contrato de mediação sido celebrado em regime de exclusividade em que as partes não fazem depender o pagamento da remuneração da efectiva outorga de qualquer contrato, é a mesma devida desde que o negócio visado esteja acertado, isto é, que haja um interessado efectivo para o mesmo que aceite as condições do vendedor ainda que aquele não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário (artigo 19.º, nº 2 da 15/2013, de 8/02).
VI - Tendo os Réus recorridos aceitado o negócio, aceitado o preço de venda proposto pela interessada angariada pela imobiliária Autora, discutido o valor da comissão que foi aceite por esta e tendo dado início às diligências necessárias com a solicitação de documentos da interessada que foram fornecidos e tendo-se, ao fim de dois meses, recusado a vender sem qualquer justificação, forçoso é concluir o negócio visado só não se veio a concretizar por causa imputável àqueles.
VII - Verifica-se que há, assim, sem qualquer dúvida, uma manifesta contrariedade directa entre o primeiro e o segundo comportamento existindo, no caso concreto, uma necessidade ético-jurídica de impedir a conduta contraditória, designadamente, por não se poder evitar ou remover de outra forma o prejuízo dos confiantes, e por a situação conflituar com as exigências de conduta de uma contraparte leal, correcta e honesta, com os ditames da boa fé em sentido objectivo.
VIII - Os danos não patrimoniais em virtude de o prestígio, imagem e bom nome de um contratante terem ficado afectados podem ser ressarcidos em sede de responsabilidade contratual.
IX - Porém, tratando-se de uma pessoa colectiva, embora seja dotada de personalidade jurídica, não se concebe que possa sofrer danos morais decorrentes daquela ofensa, razão pela qual nestes casos poderemos estar, sim perante o que a doutrina usualmente denomina de danos patrimoniais indirectos, ou seja, um género de danos morais com reflexos patrimoniais.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 2050/14.0T8PRT.P1-Apelação
Origem: Comarca do Porto-Porto-Inst. Central-1ª Secção Cível-J1
Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Caimoto Jácome
2º Adjunto Des. Sousa Lameira
Sumário:
I- Na reapreciação da prova a Relação goza da mesma amplitude de poderes da 1.ª instância e, tendo como desiderato garantir um segundo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto impugnada, deve formar a sua própria convicção.
II- A prova por declarações de parte é apreciada livremente pelo tribunal, na parte que não constitua confissão, razão pela qual será normalmente insuficiente para a prova de um facto essencial à causa de pedir que surja desacompanhada de qualquer outra prova que a sustente ou sequer indicie.
III- O contrato de mediação imobiliária é um contrato bilateral e oneroso: o mediador obriga-se a procurar interessado e a aproximá-lo do comitente para a realização do negócio no sector imobiliário e este último obriga-se a remunerá-lo pelo serviço prestado.
IV- Em princípio, no contrato de mediação, a remuneração apenas é devida ao mediador com a conclusão e perfeição do negócio.
V- Todavia, tendo o contrato de mediação sido celebrado em regime de exclusividade em que as partes não fazem depender o pagamento da remuneração da efectiva outorga de qualquer contrato, é a mesma devida desde que o negócio visado esteja acertado, isto é, que haja um interessado efectivo para o mesmo que aceite as condições do vendedor ainda que aquele não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário (artigo 19.º, nº 2 da 15/2013, de 8/02).
VI- Tendo os Réus recorridos aceitado o negócio, aceitado o preço de venda proposto pela interessada angariada pela imobiliária Autora, discutido o valor da comissão que foi aceite por esta e tendo dado início às diligências necessárias com a solicitação de documentos da interessada que foram fornecidos e tendo-se, ao fim de dois meses, recusado a vender sem qualquer justificação, forçoso é concluir o negócio visado só não se veio a concretizar por causa imputável àqueles.
VII- Verifica-se que há, assim, sem qualquer dúvida, uma manifesta contrariedade directa entre o primeiro e o segundo comportamento existindo, no caso concreto, uma necessidade ético-jurídica de impedir a conduta contraditória, designadamente, por não se poder evitar ou remover de outra forma o prejuízo dos confiantes, e por a situação conflituar com as exigências de conduta de uma contraparte leal, correcta e honesta, com os ditames da boa fé em sentido objectivo.
VIII- Os danos não patrimoniais em virtude de o prestígio, imagem e bom nome de um contratante terem ficado afectados podem ser ressarcidos em sede de responsabilidade contratual.
IX- Porém, tratando-se de uma pessoa colectiva, embora seja dotada de personalidade jurídica, não se concebe que possa sofrer danos morais decorrentes daquela ofensa, razão pela qual nestes casos poderemos estar, sim perante o que a doutrina usualmente denomina de danos patrimoniais indirectos, ou seja, um género de danos morais com reflexos patrimoniais.
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I-RELATÓRIO
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
“B…, Lda.”, com sede na …, nº.., R/chão, Marco de Canaveses, veio instaurar o presente processo de declaração, contra C… e mulher D…, residentes na …, nº …, .º E, Estoril.
Termina pedindo:
- que a presente acção seja julgada procedente por provada e em consequência:
A) Declarar-se definitivo e culposo o incumprimento do contrato de mediação por parte dos RR.;
B) Condenar-se os RR. a pagarem à A. a quantia de EUR: 46.231,71, acrescida de IVA à taxa legal de 23%, no montante de EUR: 10.633,29, bem como juros vencidos e vincendos, desde 6 de Junho de 2014, à taxa legal em vigor, os quais nesta data somam a importância de EUR: 658,64, até integral e efectivo pagamento.
ou caso assim se não entenda,
C) Condenar-se os RR. a pagarem à A a indemnização que venha a ser julgada ao abrigo da equidade, mas desde já se calcula em montante nunca inferior de EUR: 56.865,00.
em qualquer dos casos,
D) Condenar-se os RR. no pagamento da quantia de € 15.000,00 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros vincendos a contar da citação dos RR.
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Citados os Réus, apresentaram contestação.
Concluem, pedindo que:
a) Deve a acção ser julgada totalmente improcedente por não provada e, em consequência, serem os RR. absolvidos dos pedidos, com as legais consequências.
b) Deve a A. ser condenada no pedido de litigância de má-fé em montante até € 10.000,00.
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Realizou-se Audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador com identificação do objecto do litígio e, bem assim, dos temas da prova.
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Teve lugar a audiência de julgamento com as formalidades legais tendo, a final, sido proferido decisão que julgou a acção totalmente improcedente por não prova absolvendo os Réus dos pedidos contra eles formulados.
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Não se conformando com o assim decidido veio a Autora interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela forma seguinte:
1.-Entendeu o Meritíssimo Juiz a quo que não se provou que a aceitação por parte da interessada do preço pretendido pelos recorridos tenha sido, de novo, imediatamente comunicado àqueles, os quais deram o negócio por concluindo, e que a recorrente tivesse recebido ordens daqueles no sentido de exigir a celebração do contrato promessa, com a entrega de um cheque no montante de EUR: 50.000,00 a título de sinal (artigo 17° e 18° da petição inicial).
2.-Considerou, ainda, não terem sido dado como provado que o sócio gerente da recorrente tenha telefonado pessoalmente ao recorrido marido, avisando-o" de que já estava redigido, tendo aquele pedido que as cláusulas do referido contrato promessa lhe fosse de imediato transmitido verbalmente o que de facto aconteceu, tendo, nessa altura, o recorrido declarado aceitar as ditas cláusulas constantes do dito contrato promessa, impondo que aquele fosse, primeiro, assinado pelo promitente comprador para depois ser assinado pelos recorridos e que só depois de ter a anuência dos recorridos é que tal contrato foi transmitido à interessada, (artigo 20° a 24°, 25° da petição inicial).
3.-Considerou, ainda, como não provado que a recorrente se viu forçada a aceitar reduzir a sua comissão para o valor de EUR: 50.000,00 já com IVA incluído e que os recorridos impediram a recorrente de poder concretizar o negócio de venda já discutido a acertado (art° 45° e 70° da petição inicial).
4.-Em declarações de parte do sócio gerente da recorrente, Dr. E…, perguntado sobre o mail de 07-06-2014, documento 6 junto à petição inicial, este respondeu: "Para além destas alterações deve a B… declarar que o valor de venda é 850 mil euros e o valor da sua comissão como intermediaria é de 56.865 já com IVA incluído". 00:09:2 a 00:09:29
5.-Perguntado se nesse dia 7 de Junho, o contrato promessa já estava assinado, este respondeu " No dia 7 de Junho havia já um contrato promessa assinado pelo comprador". 00:09:34 a 00:09:40
6.-Perguntado se o recorrido sabia desse contrato, este respondeu: "Sabia, sabia". 00:09:42 a 00:09:43 e continuou "Mas depois decidiu por be introduzir outras cláusulas, que foram reintroduzidas" 00:09:44 a 00:09:50 e ainda "Já sabia que o contrato promessa, já sabia que havia um chegue de 50 mil euros da empresa, passado ao seu nome" 00:09:55 a 00:10:04.
7.-Perguntado se tinha aceite o preço de EUR: 850.000,00, este respondeu: "Não, não, ele não ê questão de pôr em causa, ele aqui pede até para nós confirmarmos que o negócio são 850 mil e a comissão são 56865,00. Dra. Ele fala aqui nos 56865,00 porque isto foi alvo de uma negociação. Se nós tirarmos 6% de 850 não dá mais IVA, mais IVA, não dá 56865,00".00:10:10 a 00:10:33, e continua: "Dá um pouco mais, dá um pouco mais. E portanto, foi renegociada a nossa comissão. Talvez, este, esta, esta necessidade de passar a escrito a nossa comissão" 00:10:35 a 00:10:48 E mais à frente refere: "Se eu tirar os 23% do IVA digamos que dá 60 e qualquer coisa mil euros. O que ficou, acordado entre a B… e o Sr. C… é que nós suportaríamos metade do IVA e ele suportaria a outra metade. Porque o Pr. C… não queria pagar o IVA. Mas nós gostamos sempre de pagar o IVA" 00:11:04 a 00:11:26.
8.-Perguntado se o negócio havia sido aceite pelo recorrido, este respondeu: "Eu não posso ter um contrato promessa de um cliente assinado, onde a pessoa me diz para o assinar, me confirma mesmo que é isso mesmo, e depois me muda o valor de comissão. Mas eu ainda assim, talvez por saber que não tinha alternativa, de fazer o contrário, porque tenho uma marca de reputação máxima, eu represento a F… e portanto ele sabia disso, por isso é que o imóvel dele estava lá, e eu não posso ter danos de imagem". 00:15:38 a 00:15.01.
9.-Confrontado com a data do contrato promessa e do cheque de 06/06 e da data do envio do contrato ao recorrido, e se tal procedimento é normal, este respondeu: "Não. Não é normal, eu posso-lhe explicar o que é que aconteceu. O Pr. C… falou comigo ao telefone. O negócio estava fechado. Eu disse Pr. eu vou ter, o comprador, poderei ter o comprador, ele ia para fora, tinhamos ali uma janela temporal muito apertada. E ele disse feche o negócio. Feche o negócio, receba o cheque. E eu disse oh Pr. e a minuta? Leia-me a minuta E eu li-lhe a minuta. Ao telefone eu li-lhe a minuta toda. E depois de estar assinado ele disse bom então introduza mais isto". 00:14:19 a 00:18:02.
10.- Perguntado se era normal um comprador entregar um sinal com um contrato promessa não assinado pelo vendedor, este respondeu: "É". 00:19:38 e continua "É, exactamente porque o Pr. C… estava em … e dizia: ok recolha o sinal, que deixem o cheque, e depois eu vou aí e assino. Foi isso que se passou. Fazemos isso todos os dias Sr. Pr.. É sempre assim, praticamente. Aliás, a nossa clientela muitas vezes até envia os sinais para a nossa conta, porque é uma clientela internacional. E depois são entregues aos compradores, aos vendedores, peço desculpa". 00:19:40 a 00:20:07.
11.-Perguntado se é normal submeterem contratos aos vossos clientes não negociados e receber sinais não negociados, este respondeu: "Sr. Pr. Nós fizemos sempre tudo com a anuência do Pr. C…. Isto está bem evidenciado". 00:25:56 a 00:26:00, e ainda: "Foi negociado, o Sr. C… estava em …, Foi negociado, há prova feita, há prova feita que o preço foi, está aqui 850 mil, foi-lhe lido o contrato promessa ao telefone porque ele estava em …, e depois ele até diz,-não-eu gostava–de alterar aqui uns pontos, mas tudo bem, o promitente comprador até lhe altera os pontos. Aliás, ele até na sequência disto, até pergunta o nome do comprador, para por os papéis, o nome da empresa, o número do telefone, o contacto para dar entrada no IGESPAR. Oh Sr. Pr. Eu faço-lhe uma pergunta porque é que alguém pede certidões de idoneidade duma empresa passado três meses se o negócio não está feito?" 00:27:24 a 00:28:11.
12.- Perguntado A testemunha G…, se a H… fez uma proposta para 850 mil, esta respondeu: "Exactamente" 00:10:32 e se tal proposta foi aceite, esta respondeu: "Foi aceite". 00:10:34.
13.-Perguntado como surge o contrato promessa, esta respondeu: "O Pr. C… disse-nos "vamos então prosseguir com o negócio, façam o contrato promessa". Não fui eu que lhe expliquei as cláusulas, nunca estive à fala com o Pr. C…". 00:11:04 a 00:11:14 e continua: "E depois assinem o contrato, logo gue tenham o contrato digam-me, eu vou aí ao Porto, vou ter convosco, porque ele nunca tinha vindo ao escritório até então, durante a negociação, assinem digam-me logo quando estiver assinado que eu vou aí para assinar eu". 00:11:15 a 00:11:35.
14.-Confrontado com o documento n° 4 da petição inicial, que é o contrato promessa e perguntado se o mesmo foi acordado entre ambos, esta respondeu: "das partes, até porque há negocios em que as partes não querem contrato promessa querem ir directamente para a escritura, neste caso as partes quiseram realizar um contrato promessa". 00:12:34 a 00:12:40 e perguntado a razão de ser 50 mil euros, esta respondeu: "Não, foi o que as partes acordaram que seria o sinal".00:13:09.
15.-E perguntado se sabe o que foi feito a seguir, esta respondeu: "Depois o Pr. E… ligou na minha presença ao Pr. C… a dizer "eu já tenho cá assinado e o cheque do sinal e perguntou, agora quando pode vir agora cá ao Porto? Foi isso. E o Pr. C… disse "enviem-me a minuta, que é isto que eu estou a dizer, enviem-me a minuta do contrato". 00:13:52 a 00:14.14.
16.-Perguntado se havia pedido de alteração quanto ao preço, esta respondeu: "Mas quanto ao preço não". 00:14:49.
17.-Perguntado se se pode concluir que para o recorrido o negócio está 00:16:58 a 00:17:00, e continua: "são meras questões formais que tem de ser tratadas se não há venda". 00:17:02 a 00:17:05.
18.-Perguntado o que aconteceu com a comissão, esta respondeu: "O Pr. C… disse que tendo em conta que iria ter alguns custos com esta situação do IGESPAR e da Câmara é que pretendia os 800 mil euros para ele líquidos. Portanto se o negócio era por 850 não dava para termos a nossa comissão na integralidade".00:20:35 a 00:20:56, e perguntado se tal proposta foi aceite pela recorrente, esta respondeu: "E foi aceite por nós. 50 mil euros, está aqui. Já com iva incluído, ou seja já iamos suportar mais IVA e menos comissão". 00:20:58 a 00:21:06.
19.-Perguntado se é hábito, os compradores assinarem e depois receberem sinal, e depois é que os vendedores assinam, esta respondeu: "Na minha empresa é normal Os compradores assinam, com, o representante da empresa que estiver no escritório e depois os vendedores assinam connosco presencialmente. A não ser que as partes queiram estar as duas frente a frente".00:22:56 a 00:23:16 e se foi o que aconteceu neste caso, esta respondeu: "Exactamente" 00:23:18, e continua: "Porque nós somos a mediação, nós passamos a informação de um lado para o outro, e o vendedor deu-nos a informação que aceitava o negócio, prossigam com tudo, e nós demos essa informação ao comprador. E depois no fundo, tivemos de dizer ao comprador que o vendedor já não queria vender". 00:23:33 a 00:23:50.
20.-Perguntado ao que se quer referir quanto à conclusão do negócio, esta responde: "Sim, não tínhamos mais negócio com ninguém A partir do momento que o negócio foi fechado, chegamos ao preço dos 850 mil euros e o Pr. C… prossigam com o negócio, nós deixamos de mostrar aquela casa a outra cliente": 00:35:59 a 00:36:17.
21.-E finalmente perguntado à testemunha I…, _na qualidade de socio gerente da interessada compradora, se o preço era de 850 mil euros, este respondeu: "Exactamente, foi isso" 00:04.31 e se foi deixado um sinal, este respondeu: "Sinal. Fui deixar um cheque, Exactamente, foi esse" 00:04:33 a 00:04:37 identificando o documento n° 4 B junto à petição inicial 04.34.
22.-Perguntado se havia dúvidas quanto á aceitação do negócio, este respondeu: "para nós estava fechado" 00:05.04.
23.-perguntado-quais são os ecos que tem quanto ao negócio,-este respondeu: "Sra. Dra. É a partir deste momento que vi este contrato assinado, foi-nos pedido depois algumas alterações a este contrato, posterior a isto, mais um ponto aqui, mais um, depois de ele estar assinado, e depois foi-nos pedido a não dívida â Segurança Social. O processo está todo comentado por email, porque nós as negociações que fazemos são todas por email. Portanto, a parte verbal existe mas a seguir a uma reunião há sempre". 00:07:43 a 00:08:12.
24.-Perguntado se foi feito algum pedido de alteração de preço, este respondeu: "espere, não. Não, não. Isso nunca foi". 00:08.28.
25.-Pelo que, de toda a prova produzida, quer testemunhal quer documental, entendemos que resulta provado que após a aceitação por parte da interessada angariado pela recorrente do preço de venda pretendido pelos recorridos de 850.000,00, os recorridos foram contactados, os quais deram o negócio por concluindo, tendo dado ordens expressas para que fosse elaborado o respectivo contrato promessa pelo valor de 850.000,00, com a assinatura do potencial comprador e a entrega do sinal de 50.000,00.
26.-Resulta ainda provado que os recorridos tiveram conhecimento do teor do contrato promessa via telefone, através do sócio gerente da recorrente, tendo aquele pedido que as cláusulas do mesmo lhe fosse transmitido verbalmente, o que de facto aconteceu, tendo aqueles declarado aceitar as ditas cláusulas, impondo que fosse primeiro assinado pelo promitente compradora e depois por eles.
27.-Resulta finalmente de toda a prova documental, que a redução da comissão foi aceite pela recorrente, a pedido dos recorridos e que, de facto, os recorridos recusaram a cumprir com o negócio já acordado e acertado.
28.-Pelo que, os factos constantes dos artigos 17°, 18°, 20°, 21°, 22°, 23°, 24°, 25°, 45°, e 70 da petição inicial devem ser dados como provados.
29.-E por sua vez entendemos que devem ser dados como não provados os artigos 35° e 36 da douta contestação, uma vez que não foi produzida qualquer prova nesse sentido.
30.-Da leitura dos mails juntos aos autos, resulta que o negócio foi aceite por todos pelo preço de EUR: 850.000,00, e que todos os pedidos formulados pelos recorridos foram sendo satisfeitos, inclusive a negociação sem que tenha havido qualquer suspensão por parte dos recorridos da venda nos termos por eles pretendido e que foram aceites pela interessada e inclusive pela recorrente, a qual baixou a sua comissão.
31.-Do documento n° 8 junto à petição inicial, não se retira a conclusão que os recorridos pretenderam a suspensão de negócio, e que o Meritíssimo Juiz a quo deu como provado, mal em nosso modesto entender, já que do mail em causa de 9 de Junho de 2014 às 18:39 pode-se ler que se obriga a tratar das divergências das áreas existentes, remete o código da nova certidão do Registo predial referente ao prédio em causa, e assume efectuar a comunicação ao IPPAR e à Camara a partir de quarta feira.
32.-Da matéria dada como provada, resulta evidente que a recorrente angariou um interessado, mas não um interessado qualquer como refere o Meritíssimo Juiz a quo, mas um interessado que propôs um preço de venda que foi aceite pelos recorridos.
33.-Entendemos que a aceitação do preço de venda proposto pelo interessado por parte dos recorridos basta para se poder concluir que o negócio, que a recorrente tinha de intermediar, se encontrava de facto concluído e que a mesma havia cumprido com a sua obrigação.
34.-De uma leitura atenta aos pedidos de alterações do contrato promessa podemos concluir que as mesmas não eram de todo essenciais à assinatura do contrato promessa.
35.-Os recorridos adoptaram durante os dois meses que decorreram entre a assinatura do contrato promessa e o mail a desistir da venda, um comportamento reprovável, já que nunca deixaram dúvidas de que haviam aceite a venda quer quanto ao preço quer quanto ao valor do sinal e condições de pagamento.
36.-O contrato de mediação imobiliária é o contrato nos termos do qual uma parte se obriga a diligenciar pela aproximação de duas pessoas com vista à celebração de um dos indicados negócios relativamente a um imóvel.
37.-No caso, a recorrente peticiona a remuneração acordada com os recorridos, pese embora, não ter concluído o negócio visado, invocando para o efeito o disposto no artigo 19° n°2 do DL n°15/2013 de 8/01, uma vez que o contrato de mediação foi celebrado, em regime de exclusividade e face aos factos dados como provado, outra solução não restará que concluir que o negócio não se fez por culpa exclusiva dos recorridos.
38.-Por nos situarmos no âmbito da responsabilidade contratual, é ao devedor que cabe o ónus de demonstrar que a falta de cumprimento da obrigação não procede de culpa sua (art.° 799°, n° 1, do Código Civil); ou seja, sempre seria dos recorridos o dever de provar que a inviabilização do cumprimento do contrato de mediação não resultou de facto seu, sob pena de se presumir que agiram com culpa.
39.-Ao contratarem e na execução do contrato as partes devem usar de lisura e correcção, garantindo quanto possível a justiça real, comutativa. Devem agir com lealdade e de boa fé. Como já foi afirmado, a boa fé é um ar que circula por toda a vida do contrato.
40.-Ora, da matéria dada como provada, resulta evidente que os recorridos aceitaram o negócio, aceitaram o preço de venda proposto pelo interessado angariado pela recorrente, discutiram o valor da comissão, o que a recorrente aceitou, deram início às diligências necessárias, pediram documentos da interessada que foram fornecidos, e ao fim de dois meses recusaram-se a vender pura e simplesmente.
41.-Com o comportamento inicial dos recorridos, pela clareza e sentido unívoco da sua declaração, a recorrente, objectivamente, ficou em condições muito sólidas de se convencer de que o imóvel já estava vendido, razão pela qual efectuou todos as diligências supra descritas e suportou essas despesas, de tal modo que, nisso tendo confiado, a sua destruição pelo venire posterior, com regresso à situação anterior, se traduziria numa injustiça clamorosa.
42.-Não há qualquer dúvida que no caso em apreço a recorrente cumpriu de forma escrupulosa as obrigações decorrentes do contrato de mediação imobiliária, publicitando e mostrando o imóvel em causa a interessados, a qual se veio a interessar, de forma séria na aquisição do imóvel dos recorridos, outorgando contrato promessa, entregando cheque de sinal e todos os documentos solicitados.
43.-E a recusa súbita e injustificada por parte dos recorridos em concretizar o negócio, deve ser qualificado de "frustração do negócio por culpa dos recorridos."
44.-Mas mesmo que assim, se não entendesse, o que só por mera cautela se encara, sempre se deverá considerar que, face aos factos dados como provados, os recorridos violaram culposamente o contrato em causa.
45.-Dos autos resulta que a recorrente pediu, subsidiariamente, que os recorridos fossem condenados a pagar-lhe a indemnização que viesse ser julgada ao abrigo da equidade, mas calculada em montante nunca inferior ao valor da comissão reclamada.
46.-Dos factos dados como provados, resulta evidente que da violação contratual foram provocados prejuízos à recorrente, tendo aliás sido dado como provado que a recorrente procedeu a diversas diligências que se encontram enumerados nos factos dados como assentes.
47.-Deste modo, salvo o devido respeito e melhor opinião, entendemos que o Meritíssimo Juiz a quo não decidiu bem quando não condenou os recorridos no pagamento da indemnização pedida pela recorrente.
48.-Se assim é no caso de nulidade, entendemos que será de aplicar igual pensamento caso o contrato de mediação imobiliário seja válido e se verifique incumprimento culposo por parte dos clientes, sob pena de ser preferível estarmos perante um contrato nulo do que um contrato válido.
49.-E caso se entenda que a indemnização que a recorrente tenha direito não deve ser fixada em montante igual à comissão, sempre o Meritíssimo Juiz a quo deveria e poderia ter relegado para liquidação o apuramento do montante pecuniário a esse título devido.
50°.- Quanto à indemnização peticionada a título de danos não patrimoniais, entendemos que a conduta dos recorridos é culposa e ilícita, assistindo, deste modo, a indemnização reclamada a esse título
51.-A douta sentença violou por errada interpretação os artigos 19°, n° 2 do Decreto-Lei n° 15/2013 de 8/01, artigo 609° n°2 do NCPC, artigos 483, 798° e 799° todos do CC.
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Devidamente notificados contra-alegaram os Réus concluindo pelo não provimento do recurso.
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Corridos os vistos legais cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.
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No seguimento desta orientação são duas as questões que importa apreciar:
a)- saber se o tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto;
b)- decidir em conformidade face à alteração, ou não, da matéria factual e, mesmo não se alterando esta, se a subsunção jurídica se encontra correctamente feita;
c)- saber se deve ser atribuída à Autora apelante indemnização referente a danos morais.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

É a seguinte a matéria de facto que vem dada como provado pelo tribunal recorrido e a que se procede com nova renumeração:

1º)- A A. dedica-se, com intuito lucrativo, à mediação imobiliária, possuindo para o efeito, um estabelecimento comercial sito na …, nº …, cidade do Porto (art. 1 da p.i-admissão por acordo das partes).
2º) A A. está devidamente licenciada para o exercício dessa actividade de mediação imobiliária, através do competente Instituto de Mercados de Obras Públicas e Particulares e Imobiliário, sendo titular da licença n.º ….-AMI–cfr. “Doc. 1”-(art. 2 da p.i admissão por acordo das partes).
3º) No exercício da sua actividade, a A. foi contactada pelos RR. já que pretendiam que a mesma promovesse a venda, propriedade daqueles e que tem a seguinte descrição: “Prédio urbano, composto por casa de habitação, de cave, rés-do-chão, um andar, garagem e quintal, sito na …, nº …., freguesia …, concelho do Porto, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 1984 e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo 2824.”–cfr. “Doc. 2” (art. 3 da p.i admissão por acordo das partes).
4º) Na sequência desse contacto, foram apresentados aos RR., pela angariadora J…, os serviços da A., no imóvel em causa, e na sequência de tal apresentação, os Réus leram, aceitaram e assinaram, conjuntamente com a A., o contrato de mediação imobiliária, n.º ……., no dia 17 de Dezembro de 2013, com uma duração de 9 meses, renovável automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não fosse denunciado pelas partes (art. 4 da p.i admissão por acordo das partes).
5º) Nos termos de tal contrato, A. e RR. acordaram que aquela, no exercício da sua actividade, iria promover por conta dos RR., em regime de exclusividade, a venda do imóvel supra identificado–cfr. “Doc. 3” (art. 5 da p.i admissão por acordo das partes).
6º) Nos termos igualmente constantes do contrato de mediação, o preço de venda pedido pelos RR. era de EUR: 1.000.000,00 (art. 6 da p.i admissão por acordo das partes).
7º) Se a A. viesse a conseguir interessado que concretizasse a compra em causa, os RR. obrigavam-se a pagar-lhe, como compensação e contrapartida por esses serviços, a quantia de 6% sobre o valor final da venda mais IVA. (art. 7 da p.i admissão por acordo das partes).
8º) Todas as cláusulas do referido contrato foram explicadas aos RR, os quais pretenderam aliás alterar algumas das cláusulas que dele constavam (art. 8 da p.i dmissão por acordo das partes).
9º) o que de facto veio a acontecer e a ser aceite pela A. (art. 9 da p.i admissão por acordo das partes).
10º) Acabando A. e RR. por subscreverem e assinarem o contrato de mediação imobiliária, com as alterações pretendidas por aqueles RR., e que consiste no documento junto sob o nº 3 (art. 10 da p.i admissão por acordo das partes).
11º) Por tal imóvel, veio-se a interessar a sociedade comercial “H…, SA” (art.13 da p.i.-admissão por acordo das partes);
12º) A. enviou a minuta do contrato promessa no dia 6 de Junho pelas 15.29–cfr. “Doc. 5” (art. 29 da p.i.- admissão por acordo das partes);
13º) os Réus, por mail de 7 de Junho de 2014, pelas 12.46, pretenderam efectuar as alterações ao mesmo que se passa a transcrever:
“1- A cláusula 3ª, nº 2 deve terminar em “...à denuncia do presente contrato.” Sendo eliminado o restante texto; no seu nº 1 deve especificar-se que a comunicação por escrito de ser feita por carta registada. 2- Na cláusula 5ª nº 1 o texto “...até à sua tradição...” deve ser substituído pelo seguinte: “até à data da celebração da escritura”. 3- O nº 2 da cláusula 5ª deve ser eliminado. 4- Deve ser acrescentada uma nova cláusula –que poderá ser a 7ª-com o seguinte texto: “A posse do prédio pelo segundo outorgante será efectiva a partir da data da outorga da escritura notarial de compra e venda” 5-As actuais cláusulas 7ª e 8ª passarão a ser, respectivamente, as 8ª e 9ª 6- Finalmente, deve ser acrescentada mais uma cláusula–a 10ª - com o seguinte texto: “Titulo: FORO; Texto: As partes estipulam o foro da comarca do Porto para dirimir qualquer litigio emergente do presente contrato. 7-Depois das cláusulas deve ser escrito o seguinte: Este contrato foi feito em 2 exemplares de igual teor e conteúdo e assinado no Porto de Junho de 2014.” (art. 30 da p.i.–admissão por acordo das partes).
14º) os Réus solicitaram à A. que declarasse que o valor da venda era de 850 mil euros e o valor da comissão daquela de EUR: 56.865,00 já com IVA incluído–cfr. “Doc. 6” (art. 31 da p.i.-admissão por acordo das partes).
15º) Por mail de 9 de Junho de 2014, pelas 15.27, o Réu marido foi alertado para o facto do imóvel ora em causa se encontrar classificado como “Imóvel Classificado Conjunto de Interesse Público”, sendo necessário a prévia autorização/comunicação ao IGESPAR, IP e à Câmara Municipal … para que a transacção em causa pudesse ser efectuada, (art. 32 da p.i.-admissão por acordo das partes).
16º) alertando-os, ainda, de erros nas áreas da propriedade em questão entre a Conservatória e as Finanças, o que obrigava à sua prévia correcção–cfr. “Doc. 7” (art.33 da p.i. - admissão por acordo das partes).
17º) A tal email, o Réu marido respondeu também por email dessa mesma data, pelas 18.39 que iria tratar da divergência de área existente e detectada bem como da comunicação de venda à Câmara Municipal … e ao IPPAR (art. 34 da p.i.-admissão por acordo das partes).
18º) Pedindo que a A. confirmasse o valor da comissão–cfr. “Doc. 8” (art. 35 da p.i.- admissão por acordo das partes).
19º) Por mail de 11 de Junho de 2014, pelas 13.17, foi o Réu marido informado dos dados pretendidos por aquele para poder dar seguimento ao processo, (art. 37 da p.i.- admissão por acordo das partes).
20º) Sucede que, por email de 12 de Junho de 2014, pelas 10.47, e apesar de saber que já estava assinado pela promitente compradora, o Réu marido veio pedir que no contrato promessa fossem introduzidas rectificações por ele solicitadas (art. 41 da p.i.- admissão por acordo das partes).
21º) devendo a convocação para a escritura definitiva ser por ele efectuada (art. 42 da p.i.-admissão por acordo das partes).
22º) No dia 17 de Junho de 2014, o Réu marido enviou email pelas 10.41, nos termos dos quais comunicava que iria apresentar o dito valor de EUR: 850.000,00, e que logo que tivesse a rectificação das áreas efectuadas e as respostas das ditas entidades a consultar quanto ao direito de preferência, procederiam então à assinatura do contrato promessa–cfr. “Doc. 15” (art. 46 da p.i.-admissão poracordo das partes ).
23º) ao que a A. respondeu ficar então a aguardar a informação das datas previsíveis para a resolução das ditas situações–cfr. “Doc. 16” (art. 47 da p.i.-admissão por acordo das partes).
24º) No dia 18 de Junho de 2014, por mail de 11.57, o Réu marido voltou a solicitar informações sobre o adquirente–cfr. “Doc. 17” (art. 48 da p.i.-admissão por acordo das partes).
25º) No dia 27 de Junho de 2014, por estranhar o silêncio do Réu marido, a A enviou um email pelas 19.10 a pedir que o Réu marido lhe fizesse o ponto de situação quanto à rectificação de áreas e aos direitos de preferência, (art. 49 da p.i.-admissão por acordo das partes).
26º) informando ainda que a escritura poderia ser realizada rapidamente, logo que tais situações estivessem tratadas–cfr. “Doc. 18” (art. 50 da p.i.-admissão por acordo das partes).
27º) A tal mail, o Réu marido respondeu por mail da mesma data e hora de 19.51 que não haveria desenvolvimento do processo enquanto não recebesse as informações/documentos solicitados nos seus emails dos passados dias 17 e 18 do corrente ao Dr E…–cfr. “Doc. 19” (art. 51 da p.i.-admissão por acordo das partes).
28º) Na sequência do envio do email que constitui o doc. nº 20 da p.i./ 1 de Julho de 2014 a Autora solicitou então que fosse dado andamento quer as rectificações de áreas quer aos direitos de preferência (art. 53 da p.i.-admissão por acordo das partes).
29º) o Réu marido respondeu por mail de 2 de Julho de 2014, pelas 16.40 que o documento em anexo não correspondia ao que havia sido por ele pedido, sem, no entanto, referir o que não estava correcto–cfr. “Doc. 21” (art. 54 da p.i.–admissão por acordo das partes).
30º) Por mail de 2 de Julho de 2014, pelas 17.08, foi respondido pela A. desconhecer o que o Réu pretendia mas que estava à disposição para rectificar tudo quanto achasse necessário–cfr. “Doc. 22” (art. 56 da p.i.-admissão por acordo das partes).
31º) No dia 3 de Julho de 2014, pelas 18.49, o Réu marido solicitou que lhe fosse enviado certidão permanente da sociedade adquirente bem como um documento das finanças e da segurança social para comprovar que a situação fiscal se encontrava regularizada–cfr. “Doc. 23” (art. 57 da p.i.-admissão por acordo das partes);.
32º) Os RR. não compareceram em reunião convocada pela Autora para o dia 2 de Setembro de 2014 ou 3 de Setembro–cfr. “Doc. 31” (art. 69 da p.i.-admissão por acordo das partes).
34º Logo após a assinatura do aludido contrato, a A. publicitou o pretendido negócio, colocando em várias páginas da Internet o imóvel em causa, mencionando as suas características e preço pedido,
35º) colocando ainda dois cartazes de venda no próprio imóvel com o logotipo da A. “K…”/“F…”.
36º) na sequência dessas diligências, em Maio de 2014, a A. acabou por conseguir que o representante legal da sociedade H… visitasse o dito imóvel e se viesse a interessar na aquisição do mesmo, oferecendo o preço de EUR: 800.000,00.
37º) Tal proposta foi de imediato comunicada aos RR, os quais a recusaram e disseram que venderiam somente por EUR: 850.000,00.
38º) Confrontada com a resposta dos RR., a dita sociedade decidiu subir o valor para a quantia pedida pelos RR de EUR: 850.000,00.
39º) A aceitação por parte da interessada do preço pretendido pelos RR. foi, de novo, imediatamente comunicado àqueles;
40º) Foi, então, elaborado um contrato promessa que constitui o documento nº 4 junto com a petição inicial;
41º) A A., em 6 de Junho de 2014, apresentou o contrato promessa à promitente compradora, a qual de imediato o assinou;
42º) tendo emitido o cheque de sinal no montante de EUR: 50.000,00, com a mesma data–cfr. “Doc. 4 a) e b)”.
43º) De imediato, o representante legal da A. informou os RR que a promitente compradora havia assinado o dito contrato promessa, e emitido o cheque de sinal, no valor pretendido,
44º) depois de saber que a promitente compradora já havia assinado o referido contrato promessa, e entregue o cheque em causa, os RR. solicitaram então que a A. lhe enviasse a minuta do contrato promessa em causa, (Matéria de facto assente–als. n) a s)
45º) No dia 10 de Junho de 2014, por email enviado às 14.48, o Réu marido solicitou que lhe fosse transmitido os dados do interessado bem como a sua morada e data prevista para a realização da escritura–cfr. “Doc. 9”.
46º) tendo sido nesse mesmo mail, informado que a venda seria efectuada pelo preço de EUR: 850.000,00, sendo a comissão da A. fixada em EUR: 56.865,00, já com IVA incluído – cfr. “Doc. 10”.
47º) Foi então pedido por mail do mesmo dia pelas 15.27, o nome da freguesia e o código postal do comprador–cfr. “Doc. 11”.
48º) o que também foi facultado–cfr. “Doc. 12”.
49º O Réu exigiu no email que constitui o doc. nº13 da p.i. receber um valor total liquido de EUR: 800.000,00–cfr. “Doc. 13”.
50º) Por email de 15 de Junho de 2014, de 6.45, a A. comunicou aceitar reduzir a sua comissão para o valor de EUR:50.000,00 já com IVA incluído de forma a não inviabilizar o negócio;
51º) a A. enviou no dia 1 de Julho de 2014 pelas 18.46 uma nova minuta do contrato promessa–cfr. “Doc. 20”,
52º) os documentos solicitados pelo Ré referidos na al. hh) da matéria de facto assente foram remetidos por mail de 4 de Julho de 2014 pelas 19.19. – cfr. “Doc. 24”,
53º) o documento da segurança social veio a ser remetido na dia 9 de Julho de 2014, pelas 15.08 por mail–cfr. “Doc. 25” .
54º) o Réu marido por mail de 9 de Julho de 2014, pelas 18.58, informou a A. de que afinal não aceitava o negócio proposto e que apenas venderia o imóvel em causa pelo preço de EUR: 1.000.000,00–cfr. “Doc. 26”.
55º) Por mail de 10 de Julho de 2014 e carta remetida nesse mesmo dia, carta essa que veio a ser devolvida por não ter sido reclamada, pelos RR, a A. manifestou a sua estranheza a essa mudança súbita e inesperada de atitude dos RR, já que o negócio em causa já havia sido objecto de discussão por aqueles,
56º) os quais impuseram ao longo de todo o processo negocial a sua vontade e as suas condições,
57º) as quais foram aceites quer pela A. quer pela cliente angariada por aquela,
58º) Assim, nesse email conclui-se pela obrigação por parte dos RR do pagamento da comissão devida,
59º) bem como de uma indemnização–cfr. “Docs. 27 e 28”.
60º) De tal decisão dos RR foi dado conhecimento à promitente compradora por mail de 15 de Julho de 2014, pelas 15.23–cfr. “Doc. 29”,
61º) ao qual a mesma respondeu por carta de 16 de Julho de 2014–cfr. “Doc. 30”,
62º) Perante esta última missiva e numa última tentativa de solucionar este negócio, foi ainda tentada pela Autora a marcação de uma reunião para o dia 2 de Setembro de 2014 ou 3 de Setembro–cfr. “Doc. 31”,
63º) A. é afiliada da F…,
64º) Preza possuir serviços de elevada qualidade correspondente à excelência da clientela por ela angariada,
65º) Preza o seu nome e a sua prestigiada reputação,
66º) a cliente angariada H… na sequência da não conclusão do negócio jurídico remeteu à Autora a carta que constitui o “Doc. 31” da p.i.,
67º) a clientela alvo da A. é uma clientela de um círculo restrito e de nível alto;
68º) os RR. nunca assinaram qualquer Contrato-Promessa de venda do imóvel, ou sequer, proposta de venda do imóvel.
69º) Os RR. assinaram o contrato de mediação imobiliária junto como Doc. 3 da Petição Inicial, nos termos do qual, de acordo com o nº 2 da cláusula 5.ª, mediante a alienação do imóvel em causa pelo preço de € 1.000.000,00 (um milhão de euros), à A. seria paga uma quantia de 6% “calculada sobre o preço pelo qual o negócio é efectivamente concretizado”
70º) Consta do mesmo contrato que a comissão seria paga, nos termos do n.º 3 da mesma cláusula, com “50% do valor total da remuneração, aquando da celebração do contrato promessa de compra e venda, e os restantes 50% aquando da celebração da escritura de compra e venda.”
71º) Neste ano de 2014, o representante da A. informou os RR. da existência de um interessado na compra do imóvel, o qual apresentou uma proposta inicial de € 800.000,00 (oitocentos mil euros), prontamente recusada pelo R. Marido;
72º) Posteriormente, o R. Marido é informado de uma nova proposta de compra do imóvel, agora pelo valor total de € 850.000,00 (oitocentos e cinquenta mil euros).
73º) o R. Marido pediu o envio da proposta de Contrato-Promessa para analisar.
74º) O que foi feito pela A. a 6 de Junho conforme doc. 5 junto pela Autora com a Petição Inicial.
75º) A 7 de Junho de 2014, e como resulta do Doc. 6 junto com a petição inicial, o marido R. envia um conjunto de alterações à minuta de Contrato-Promessa;
76º) No dia 9 de Junho, a A. informou o marido R. que o imóvel em causa se encontra sujeito a preferência da Câmara Municipal … e do IGESPAR, I.P. (agora DGPC), e que no caso de uma transmissão do mesmo, seria necessário obter a aprovação destas entidades.
77º) Na mesma data, a A. informou o marido R. de que a venda era impossível de ser realizada por uma diferença na área inscrita do imóvel entre o Serviço de Finanças e a Conservatória do Registo Predial.
78º) O Marido R., em entendimento com a A., assumiu que realizaria, a seu cargo e custo, os inevitáveis processos de correcção das áreas dando conhecimento disso ao A., na medida em que seria sempre necessário para a venda do imóvel.
79º) Sobre os termos da venda, valor de negócio, comissão da Autora, texto do Contrato Promessa e identificação do interessado tudo se encontrava suspenso.
80º) Tendo inclusive o R. marido pedido melhores esclarecimentos sobre a proposta “na mesa” como resulta do documento 8 da Petição Inicial:“Aproveito para lhe pedir que me informe se o valor que enviei no meu mail anterior sobre a vossa comissão se encontra correcto ou se é outro”.
81º) A 10 de Junho, o R. Marido volta a interrogar sobre o andamento da proposta, conforme doc. 9 junto com a Petição Inicial.
82º) A 11 de Junho, a A. responde ao R. marido como consta do e-mail junto como Doc. 10 na Petição Inicial
83º) a proposta de dia 11 de Junho previa uma comissão de € 56.865,00 (cinquenta e seis mil oitocentos e sessenta e cinco euros), sobre um preço de venda de € 850.000,00 (oitocentos e cinquenta mil euros),
85º) O que representaria para o R. Marido um proveito de € 793.135,00 (setecentos e noventa e três mil cento e trinta e cinco euros).
86º) e uma comissão para a A. de 5,15% do valor de escritura mais IVA, à laia do próprio contrato de mediação.
87º) A 12 de Junho, o Marido R. apresenta uma resposta à A. que constitui o doc. 3 da contestação-(Doc. 13 da p.i.).
88º) A 15 de Junho, a A. apresenta uma proposta ao Marido R., de acordo com a qual o Marido R. receberia € 800.000,00 (oitocentos mil euros), a A. € 50.000,00 de Comissão e o interessado pagaria um valor de € 850.000,00 (oitocentos e cinquenta mil euros)-Doc. 4 da contestação (Doc. 14 da p.i.)
89º) a A. indica que: “qualquer alteração a estes valores inviabilizará o negocio”.
90º) A 17 de Junho, o Marido R. pede ao A. o envio de uma minuta do Contrato- Promessa de Compra e Venda juntamente com a confirmação da aceitação das alterações à minuta de contrato promessa por ele pedidas. (doc. 5 da contestação ).
91º) No mesmo dia, o funcionário da Autora diz que apenas após estar resolvida a questão das áreas e das preferências poderá ser “dado andamento ao processo” (cfr. Doc. 5 da contestação-doc. 16 da p.i).
92º) Dez dias depois, a 27 de Junho, vem a A. pedir ao R. Marido esclarecimentos sobre o “estado do processo” (doc. 18 d a p.i);
93º) A que o R. Marido de pronto, na mesma hora, respondeu da forma que consta do doc. nº 19 da p.i.;
94º) A 1 de Julho, a mediadora entrega ao R. Marido uma proposta de compra do imóvel, anexando uma minuta de Contrato-Promessa (Doc. 20);
95º) Minuta que mereceu a resposta constante do documento nº 21 da p.i.; (e 6 da contestação (de 2 de Julho);
96º) Adicionalmente, o Réu marido pediu os elementos de identificação do interessado comprador para poder avaliar a nova proposta os quais foram enviados a 9 de Julho (doc. 25 da p.i.)
97º) O Réu marido, tendo em mãos a informação do interessado comprador, a proposta final de preço de compra, decidiu recusar a mesma no próprio dia, e disso dado conhecimento à A. (cfr. Doc. 7 da contestação e 26 da p.i.)
98º) Perante a recusa da proposta contratual do R. Marido, a A. envia uma comunicação ao R. marido (que se junta como Doc. 8 da contestação e 27 da p.i.;
99º) Sete dias depois a A. envia nova comunicação ao R. Marido que constitui o Doc. 9 da contestação;
100º) A 21 de Agosto, a A. volta a enviar a comunicação que constitui o doc. nº 31 da p.i..
*
Matéria de facto não provada objecto dos temas da prova
Arts. 18, 20 a 24, 45, 55, 70, 102, 103 e 108 da petição inicial;
Arts,. 10 a 12, 21 a 23, 50 e 74 da contestação.
*
Matéria de direito ou conclusiva
Arts: 71 a 96, 97, 98, 105, 106 e 109 a 112 da p.i.
Arts: 1 a 9, 13, 14, 16, 26 a 30, 39, 43, 48, 53, 60, 61, 63 a 67, 71, 72, 73, 75 a 170 da contestação.
*
III. O DIREITO

Como supra se referiu a primeira questão que importa apreciar e decidir consiste em:

a)- saber se o tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto.

Como resulta do corpo alegatório e das respectivas conclusões a Ré recorrente impugnou a decisão da matéria de facto tendo dado cumprimento aos ónus impostos pelo artigo 640.º, nº 1 als. a), b) e c) do CPCivil, pois que, faz referência aos concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados, indica os elementos probatórios que conduziriam à alteração daqueles pontos nos termos por ela propugnados, a decisão que no seu entender deveria sobre eles ter sido proferida e ainda as passagens da gravação em que se funda o recurso e que transcreveu [nº 2 al. a) do citado normativo].
Cumpridos aqueles ónus e, portanto, nada obstando ao conhecimento do objecto de recurso nesse segmento, a Autora apelante não concorda com a decisão sobre a fundamentação factual relativa aos pontos 17°, 18°, 20°, 21°, 22°, 23°, 24°, 25°, 45°, e 70º da petição inicial que deveriam ser dados como provados e, por sua vez, os artigos 35° e 36º da contestação deviam ser dados como não provados.
Quid iuris?
O controlo de facto, em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência, não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade.
Efectivamente, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova (consagrado no artigo 607.º nº 5) que está deferido ao tribunal da 1ª instância, sendo que, na formação da convicção do julgador não intervêm apenas elementos racionalmente demonstráveis, já que podem entrar também elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação vídeo ou áudio, pois que a valoração de um depoimento é algo absolutamente imperceptível na gravação/transcrição.[1]
Ora, contrariamente ao que sucede no sistema da prova legal, em que a conclusão probatória é prefixada legalmente, no sistema da livre apreciação da prova, o julgador detém a liberdade de formar a sua convicção sobre os factos, objecto do julgamento, com base apenas no juízo que fundamenta no mérito objectivamente concreto do caso, na sua individualidade histórica, adquirido representativamente no processo.
O que é necessário e imprescindível é que, no seu livre exercício de convicção, o tribunal indique os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela sobre o julgamento do facto como provado ou não provado”.[2]
De facto, a lei determina expressamente a exigência de objectivação, através da imposição da fundamentação da matéria de facto, devendo o tribunal analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador (artigo 607.º, nº 4 do CPCivil).
Todavia, na reapreciação dos meios de prova, a Relação procede a novo julgamento da matéria de facto impugnada, em busca da sua própria convicção, desta forma assegurando o duplo grau de jurisdição sobre essa mesma matéria, com a mesma amplitude de poderes da 1.ª instância.[3]
Impõe-se-lhe, assim, que “analise criticamente as provas indicadas em fundamento da impugnação, quer a testemunhal, quer a documental, conjugando-as entre si, contextualizando-se, se necessário, no âmbito da demais prova disponível, de modo a formar a sua própria e autónoma convicção, que deve ser fundamentada”.[4]
Importa, porém, não esquecer porque, como atrás se referiu, se mantêm vigorantes os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova e guiando-se o julgamento humano por padrões de probabilidade e nunca de certeza absoluta, o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto deve restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão, nos concretos pontos questionados.[5]
Tendo presentes estes princípios orientadores, vejamos agora se assiste razão à Autora apelantes, neste segmento recursório da impugnação da matéria de facto, nos termos por ela pretendidos.
*
Os artigo 17º, 18º e 20º a 25º da petição inicial tinham a seguinte redacção:
17º- A aceitação por parte da interessada do preço pretendido pelos RR. foi, de novo, imediatamente comunicado àqueles, os quais deram o negócio por concluído,
18º- ordenando à A., para concretizar o negócio, que fosse elaborado o respectivo contrato promessa, afirmando que apenas ficariam seguros caso o potencial comprador aceitasse assinar o contrato promessa e entregasse um sinal de EUR: 50.000,00.
20º- Quanto aos RR, o sócio gerente da A. telefonou pessoalmente ao Réu marido avisando-o de que já estava redigido,
21º- tendo aquele pedido que as cláusulas do mesmo lhe fosse de imediato transmitido verbalmente,
22º- o que de facto acabou por acontecer,
23º- tendo, nessa mesma altura, o Réu marido declarado aceitar as ditas cláusulas constantes do referido contrato promessa,
24º- impondo aquele que fosse, primeiro, assinado pela promitente comprador para depois ser assinado pelos RR..
25º- Assim, depois de ter tido a anuência dos RR. às cláusulas do contrato promessa, a A., em 6 de Junho de 2014, transmitiu o contrato promessa à promitente compradora, a qual de imediato o assinou”.
45.º- o que não era aceitável, razão pela qual a A. se viu forçada a aceitar o que os RR. pretendiam.
70.º- impedindo, desta forma, a A. de poder concretizar o negócio de venda do imóvel em causa, já discutido e acertado os pormenores com os RR e por eles aceites.
*
Para prova dos referidos factos, ou melhor para prova do seu conteúdo integral, pois que alguma da matéria factual contida nos artigo 17º e 25º já foi dada como provada pelo tribunal recorrido, a apelante convocou as declarações de parte do representante legal da Autora e ainda o depoimento das testemunhas G… e I….
No que tange à valoração das declarações de parte o tribunal recorrido discorreu do seguinte modo:
No que concerne às declarações de parte, cada um dos declarantes manteve a versão fáctica já vertida nos articulados, relatando os factos pessoais em que intervieram (no caso, entre ambos por via telefónica e email, nunca pessoalmente), fazendo-o de uma forma corroborada pela prova documental que já se mostra mencionada na matéria de facto provada (e que mais à frente se mencionará).
Da prestação das respectivos declarações decorreu que se manteve a divergência quanto à imputabilidade da não concretização do negócio com o cliente angariado pela Autora, entendendo o legal representante da Autora que tudo fizeram para concretizar o negócio e que essa não concretização decorreu da conduta do Réu, e entendendo este por sua vez que a Autora não logrou atender às suas exigências e dúvidas (“tive dúvidas em relação ao negócio que me estava a ser proposto”; “pedi para fazer uma reunião com os promitentes compradores”; “houve várias minutas em que pedi rectificações” “nunca conheci o gerente da Autora “ (Facto que foi confirmado pelo legal representante da Autora); “nunca assinei qualquer contrato promessa”; “pedi elementos para saber quem era a entidade compradora”, “nunca recebi o texto final nem houve reunião”, etc.) e por isso a não concretização da celebração do negócio (desde logo, a não assinatura do contrato promessa) se deveu à Autora (no que concerne a estas declarações, o Tribunal concatenou as mesmas com a prova documental junta aos autos, nomeadamente a sequência de emails junta aos autos de onde se pode retirar a confirmação das declarações prestadas pelas partes)”.
Nos termos estatuídos no artigo 466.º do CPCivil as partes podem requerer, até ao início das alegações orais em 1.ª instância, a prestação de declarações sobre factos em que tenham intervindo pessoalmente ou de que tenham conhecimento directo (n.º 1); às declarações das partes aplica-se o disposto no artigo 417.º–quanto ao dever de cooperação para a descoberta da verdade–e ainda, com as necessárias adaptações, o estabelecido na secção anterior, relativa à prova por confissão das partes (n.º 2); o tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão (n.º 3).
Trata-se de disposição inovadora introduzida na novo CPCivil, mencionando-se na Exposição de Motivos da proposta de lei n.º 113/XII, que está na origem da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, que se prevê “a possibilidade de prestarem declarações em audiência as próprias partes, quando face à natureza pessoal dos factos a averiguar tal diligência se justifique, as quais são livremente valoradas pelo juiz, na parte em que não representem confissão”.
A relevância probatória destas declarações tem sido objecto de apreciação em sede de jurisprudência, salientando-se diferentes acórdãos proferidos por este Tribunal da Relação.
Dúvidas não existem de as declarações de parte que, diga-se, divergem do depoimento de parte, devem ser atendidas e valoradas com algum cuidado.
Não se pode olvidar que, como meio probatório são declarações interessadas, parciais e não isentas, em que quem as produz tem um manifesto interesse na acção.
Efectivamente, seria de todo insensato que sem mais, nomeadamente, sem o auxílio de outros meios probatórios, sejam eles documentais ou testemunhais, o Tribunal desse como provados os factos pela própria parte alegados e por ela, tão só, admitidos.
Não obstante o supra referido, o certo é que são um meio de prova legalmente admissível e pertinentemente adequado à prova dos factos que sejam da natureza que ele mesmo pressupõe (factos em que as partes tenham intervindo pessoalmente ou de que as partes tenham conhecimento directo).
Todavia, tais declarações são apreciadas livremente pelo tribunal (466.º, n.º 3, do CPCivil) e, nessa apreciação, engloba-se a sua suficiência à demonstração do facto a provar.
A afirmação, peremptória e inequívoca, de as declarações das partes não poderem fundar, de per si e só por si, um facto constitutivo do direito do depoente, não é correta, porquanto, apresentada sem qualquer outra explicação, não deixaria de violar, ela mesma, a liberdade valorativa que decorre do citado n.º 3 do artigo 466.º do CPC.
Mas compreende-se que, tendencialmente as declarações das partes, sem qualquer corroboração de outra prova, qualquer que ela seja, não apresentem, ainda assim, e sempre num juízo de liberdade de apreciação pelo tribunal, a suficiência bastante à demonstração positiva do facto pretendido provar.
Neste contexto de suficiência probatória, e não propriamente de valoração negativa e condicionada da prova (e só assim pode ser, respeitando o princípio que se consagra no artigo 466.º, n.º 3 do CPC) parece-nos claro que nunca pode estar em causa a violação da norma constitucional que salvaguarda a tutela efectiva do direito (artigo 20.º, n.º 5, da CRP).
Evidentemente que, perspectivando de modo inverso o problema, também a admissão da prova por declaração de parte num sentido interpretativo de onde decorresse, em qualquer circunstância, a prova dos factos constitutivos do direito invocado por mero efeito das declarações favoráveis, não deixaria de violar a norma constitucional, na medida em que, num processo de partes como é o processo civil, deixaria sem possibilidade de defesa–e aí, sem tutela efectiva–a parte contrária.
Como assim, a prova por declarações de parte, nos termos enunciados no artigo 466.º do Código de Processo Civil, é apreciada livremente pelo tribunal, na parte que não constitua confissão, na certeza de que a livre apreciação é sempre condicionada pela razão, pela experiência e pelas circunstâncias e que, neste enquadramento, a declaração de parte que é favorável e que surge desacompanhada de qualquer outra prova que a sustente ou sequer indicie, será normalmente insuficiente à prova de um facto essencial à causa de pedir.
Postas estas breves considerações, torna-se evidente, que a Autora apelante não invoca qualquer fundamento que infirme a livre apreciação das declarações de parte do legal representante da Autora feita pelo tribunal recorrido, no confronto com as prestadas pelo Réu na vertente da sua divergência, nem qualquer outra circunstância objectivável que possa corroborar as referidas declarações.
No que tange ao depoimento da testemunha G…, Director comercial da Autora desde Janeiro de 2013 também se releva inócua para o desiderato pretendido.
Efectivamente, embora a referida testemunha tivesse tido intervenção na fase inicial da relação negocial estabelecida entre as partes, pois que elaborou o contrato de mediação por escrito, sempre referiu que não teve qualquer intervenção na fase da angariação e no que concerne ao relacionamento estabelecido pelo legal representante da Autora com o Réu referiu que nunca esteve ou falou com o mesmo ao telefone e que todas as comunicações telefónicas estabelecidas com este foram realizadas por aquele representante legal.
Relativamente à suposta aceitação, por parte do recorrido, da proposta de 850.000,00 Euros e respectivas instruções para que a Recorrente avançasse com a elaboração e assinatura do contrato, a testemunha referiu que o seu entendimento era o de que a proposta do interessado foi aceite e que se quis passar para a celebração do contrato promessa, acabando todavia, por esclarecer que aquilo que sabia ter-lhe-ia sido dito pelo citado representante legal da recorrente.
A recorrente sob este conspecto convocou também o depoimento da testemunha I…, representante da referida interessada H….
Acontece que, respigando o seu depoimento, o que dele se retira é apenas e tão só que para a sua representada o negócio estava fechado.
Decorre, assim, do exposto, que os elementos probatórios (declarações de parte e prova testemunhal) convocados pela Autora apelante não permitem que se dê como provada a factualidade inserta nos pontos 18º a 24º supra transcritos.
Relativamente ao artigo 45º da petição inicial e que vem na sequência do artigo 44º da mesma peça, a parte que encerrava um facto está dada como provada (facto descrito em 50º da fundamentação factual) encerrando o citado artigo 45º uma mera conclusão e, como tal, sem que possa integrar o quadro dos factos provados.
Da mesma forma que também o artigo 70º da petição inicial encerra uma simples conclusão não igualmente integrar os factos provados.
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Impugna também a Recorrente a matéria dos artigos 35º e 36º da contestação alegando que a mesma não devia ter sido dada como provada.
Esses artigos tinham a seguinte redacção:
35.º Sobre os termos da venda, valor de negócio, comissão da Autora, texto do Contrato Promessa e identificação do interessado tudo se encontrava suspenso.
36.º Tendo inclusive o R. Marido pedido melhores esclarecimentos sobre a proposta “na mesa” como resulta do documento 8 da Petição Inicial: “Aproveito para lhe pedir que me informe se o valor que enviei no meu mail anterior sobre a vossa comissão se encontra correcto ou se é outro”.
Refere a Autora recorrente que nenhuma prova feita nos autos sobre essa realidade factual.
Cremos que, efectivamente, assiste, neste conspecto, razão à Autora apelante.
Com efeito, não foi produzida nos autos qualquer prova testemunhal ou documental dos quais se retire que os termos da venda, valor do negócio, comissão da recorrente, texto do contrato promessa e identificação do interessado, tudo se encontrava suspenso.
Bem pelo contrário, da leitura dos mails juntos aos autos, resulta que o negócio foi aceite por todos pelo preço de EUR: 850.000,00, e que todos os pedidos formulados pelos recorridos foram sendo satisfeitos, inclusive a negociação da comissão daquela.
Nunca em lado algum, se pode ler ou concluir que tenha havido qualquer suspensão por parte dos recorridos da venda nos termos por eles pretendido e que foram aceites pela interessada e inclusive pela recorrente, a qual baixou a sua comissão.
Nem do documento n° 8 junto à petição inicial, se retira a conclusão que os recorridos pretendem de suspensão de negócio, já que do mail em causa de 9 de Junho de 2 014 às 18:39 pode-se ler que se obriga a tratar das divergências das áreas existentes, remete o código da nova certidão do registo predial em causa e assume efectuar a comunicação ao IPPAR e à Câmara a partir de quarta feira.
Destarte, de todo este mail do recorrido não pode deixar de se concluir que esteve a dar seguimento ao processo de venda de acordo com o estipulado no contrato promessa, ou seja, pelo valor de EUR: 850.000,00, sendo que, quanto à confirmação do valor da comissão, resulta evidente que se tratava apenas de uma confirmação, mas da qual não dependia o prosseguimento do que se havia assumido e que se comprometia a fazer.
Aliás, mesmo que assim se não entendesse, por mail de 11-06-2015, correspondente ao documento n° 10 junto à petição inicial a recorrente confirmou o valor da comissão que os recorridos pretendiam, razão pela qual nada se encontrava suspenso.
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Como assim, devem ser eliminados da fundamentação factual os referidos factos.
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Improcedem, assim, as conclusões 1ª a 28ª formuladas pela Autora apelante e procedem as formuladas em 29ª a 31ª.
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Alterada a matéria factual nos termos referidos a segunda questão que vem colocada no recurso consiste em:

b)- saber se a sua subsunção se mostra correctamente efectuada.

Não vem questionado a qualificação jurídica da relação negocial estabelecida entre as partes como sendo de um contrato de mediação imobiliária.
Este contrato pode definir-se como o contrato pelo qual uma das partes se obriga a promover, de modo imparcial, a aproximação de duas ou mais pessoas, com vista à celebração de certo negócio, mediante retribuição.[6]
São assim elementos caracterizadores deste contrato: obrigação de aproximação de sujeitos; actividade tendente à celebração do negócio; imparcialidade; ocasionalidade; retribuição.
Saliente-se que a actividade do mediador consiste essencialmente na prática de actos materiais, tendentes a favorecer o encontro de eventuais contraentes e a celebração do negócio em causa. Essa actividade tem, pois, carácter necessariamente pluridireccional, dirigindo-se a um resultado que envolve, pelo menos, duas pessoas.[7]
Por outro lado, o mediador não age por conta do comitente, nem no interesse deste. A imparcialidade impõe ao mediador o dever de se comportar, perante os potenciais contraentes, em termos não discriminatórios e de modo a evitar danos para qualquer deles; nomeadamente deverá avisar ambas as partes quando conheça alguma circunstância, relativa ao negócio, capaz de influenciar a decisão de contratar (ou não).[8]
No caso concreto, no momento em que foi celebrado o contrato em discussão já se encontrava em vigor a Lei nº 15/2013, de 8 de Fevereiro.
Tal como nos anteriores diplomas legais (DL 211/2004 e DL 77/99), o legislador no artigo 2.º, nº 1 da referida Lei, define a actividade de mediação imobiliária como a consistente na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objecto bens imóveis.
O artigo 16.º do citado diploma estatui, por sua vez, sobre alguns dos elementos do citado contrato.
Das características atrás elencadas sobre o referido contrato interessa-nos, no caso concreto, a referente à retribuição, pois que, a apelante fundamenta a acção no incumprimento contratual e, portanto, no não pagamento da retribuição acordada.
Com efeito, o contrato aqui em causa é um contrato necessariamente oneroso.
Por outro lado, ainda no âmbito da caracterização do contrato, com interesse para a discussão da presente causa, importa atender a que, de acordo com o regime jurídico aplicável, pode ser convencionada uma cláusula de exclusividade.
É contrato sujeito a prazo. Impõe-se a celebração do contrato por tempo determinado, mas o período de vigência é deixado na disponibilidade das partes, sendo supletivo o prazo de seis meses (no caso concreto, as partes estabeleceram no contrato o prazo de nove meses).
Para além disso, caracteriza-se também por ser um “contrato aleatório, só dando azo à retribuição quando tenha êxito”.[9]
Com efeito, no artigo 19.º da Lei nº 15/2013, de 8 de Fevereiro, dispõe-se efectivamente que:
1- A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra.
2- É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.
De facto, na concretização da obrigação do mediador, este pratica, por conta própria, vários actos materiais, que podem ser de publicitação do que se pretende vender (por exemplo, publicação de anúncios em jornais e revistas, colocação de placas nos prédios em venda, estabelecimento de contactos com clientes em carteira, etc.), visando a obtenção ou concretização do negócio em relação a determinado imóvel.
Porém, só no momento da concretização do negócio com o interessado, exigindo-se ainda que seja perfeito, no sentido de eficaz[10], é que o mediador cumpre o fim precípuo da mediação, razão pela qual, em princípio, apenas nesse momento lhe assiste o direito à remuneração, ressalvado o caso do nº 2.
Portanto, a remuneração do mediador, em princípio, está dependente duma condição essencial, também dita de condição suspensiva, que se traduz na realização do negócio objecto do contrato de mediação.[11]
E, nesse sentido, sempre se vem afirmando que, em geral, a lei exige que haja uma relação causal entre a actuação do mediador e a conclusão e perfeição do contrato.
Na verdade, como refere Higina Orvalho[12] “a conclusão do contrato visado perfeito não marca apenas o momento em que a remuneração é devida, sendo mais do que isso, uma circunstância sem a qual não nasce para o mediador a remuneração (…) Repare-se que não sendo celebrado o contrato visado (…) o mediador não tem direito a ser remunerado. Isto torna-se claro com a leitura do nº 2 do art. 19º que introduz uma excepção nesta regra, desde que se verifiquem cumulativamente determinados pressupostos, a saber: contrato de mediação celebrado com proprietário… de bem imóvel; regime de exclusividade e não concretização do negócio visado por causa imputável ao cliente (…)”.
Sendo, portanto, este o arquétipo legal da figura do contrato de mediação imobiliária, nomeadamente no que concerne ao direito à remuneração por parte do Mediador Imobiliário, importa aplicar estas considerações ao caso concreto.
É inequívoco, em face da matéria de facto provada que, não se tendo concretizado o negócio entre o interessado angariado pela Autora e os Réus, nem tendo sido celebrado o contrato promessa de compra e venda, a Autora só poderá obter a remuneração pretendida com a presente acção, se lograr provar a factie species da segunda hipótese atrás elencada, isto é, se conseguir provar que o negócio por si angariado só se não se concretizou por causa imputável ao cliente proprietário, pois que, conforme decorre do contrato de mediação imobiliária celebrado entre as partes ele obedece ao regime de exclusividade.
É que, como já se referiu, decorre do artigo 19.º, nº 2 da Lei nº 15/2013 que é igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio, visado no contrato de mediação, tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.
Todavia, e antes de avançarmos na análise de saber se a matéria factual que está provada nos autos se subsume nesse segmento legal, importa esclarecer aquilo que se deve entender pela expressão utilizada pelo legislador no nº 2 do citado preceito: “quando o negócio visado no contrato de mediação não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário (…)”.
Portanto, o que se impõe saber é o que significa, neste contexto contratual, a referida expressão.
Como decorre do exposto, este preceito legal vem já dos dois regimes anteriores (artigo 18.º, nº 2, do DL 211/2004 e artigo 19.º, nº 2, do DL 77/99).
Nos casos em que não há regime de exclusividade, mesmo que o contrato visado não venha a ser concretizado por causa imputável ao cliente, não nasce a remuneração para o mediador imobiliário, pois o cliente, nestes casos mantém intacta a sua liberdade de contratar (balizada, nos termos gerais, perante o terceiro pelo dever de boa-fé nas negociações).
Todavia, já assim não sucede no caso de o contrato de mediação imobiliária ter sido celebrado em regime de exclusividade.
Efectivamente, nestes casos a remuneração do mediador imobiliário já não depende da perfeição, da eficácia, da concretização do negócio visado, mas antes de duas circunstâncias: a)- que o negócio visado não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário e b)- que o mediador tenha cumprido a sua obrigação de mediação. Circunstâncias que, uma vez verificadas, responsabilizam o cliente da mediadora imobiliária pelo pagamento da remuneração.
Acontece que, a verificação destas circunstâncias impõe, desde logo, que o mediador imobiliário não se limite a angariar um qualquer interessado no negócio visado, mas sim que angarie um interessado que satisfaça o interesse especifico do seu cliente (proprietário do bem imóvel-os aqui RR.), ou seja, um interessado que esteja pronto a celebrar o negócio visado nos moldes em que este negócio foi concebido no âmbito do contrato de mediação e nos termos em que o cliente da mediadora imobiliária está disposto a celebrar o contrato, sendo este quem determina se a proposta apresentada satisfaz os seus interesses e não a mediadora imobiliária.[13]
Significa, portanto, que neste âmbito, a mediadora imobiliária tem que alegar e provar a existência do sucesso desse cumprimento que satisfez o interesse do credor, ou dito de outra forma, é exigível que o negócio esteja não somente perspectivado, mas acertado, isto é, que haja um interessado efectivo para o mesmo, que aceite as condições do vendedor.
Isto dito, o que agora importa averiguar é se, efectivamente, a Autora apelante angariou, ou não, um interessado efectivo para a compra do imóvel em questão disposto a aceitar as condições dos vendedores Réus.
Respigando a matéria factual que nos autos se encontra provada, vejamos então o que dela resulta, sendo certo que o tribunal recorrido propendeu para o entendimento de que o negócio que a Autora tentou intermediar, embora estivesse perspectivado no que tange ao preço, nunca chegou a ser acertado entre os Réus e o interessado apresentado pela Autora, nunca tendo entre si consensualizado o clausulado contratual, permanecendo entre eles um dissenso evidente.
Com este entendimento não concorda a Autora apelante, alegando que o negócio visado só não se concretizou por causa imputável aos Réus apelados.
Quid iuris?
Está provado nos autos que:
-No exercício da sua actividade, a A. foi contactada pelos RR. já que pretendiam que a mesma promovesse a venda, propriedade daqueles e que tem a seguinte descrição: “Prédio urbano, composto por casa de habitação, de cave, rés-do-chão, um andar, garagem e quintal, sito na …, nº …., freguesia …, concelho do Porto, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 1984 e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo 2824.”–cfr. “Doc. 2” (art. 3 da p.i admissão por acordo das partes).
-Na sequência desse contacto, foram apresentados aos RR., pela angariadora J…, os serviços da A., no imóvel em causa, e na sequência de tal apresentação, os Réus leram, aceitaram e assinaram, conjuntamente com a A., o contrato de mediação imobiliária, n.º ……., no dia 17 de Dezembro de 2013, com uma duração de 9 meses, renovável automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não fosse denunciado pelas partes (art. 4 da p.i admissão por acordo das partes).
-Nos termos de tal contrato, A. e RR. acordaram que aquela, no exercício da sua actividade, iria promover por conta dos RR., em regime de exclusividade, a venda do imóvel supra identificado–cfr. “Doc. 3” (art. 5 da p.i admissão por acordo das partes).
- Nos termos igualmente constantes do contrato de mediação, o preço de venda pedido pelos RR. era de EUR: 1.000.000,00 (art. 6 da p.i admissão por acordo das partes).
- Se a A. viesse a conseguir interessado que concretizasse a compra em causa, os RR. obrigavam-se a pagar-lhe, como compensação e contrapartida por esses serviços, a quantia de 6% sobre o valor final da venda mais IVA. (art. 7 da p.i admissão por acordo das partes).
- Todas as cláusulas do referido contrato foram explicadas aos RR, os quais pretenderam aliás alterar algumas das cláusulas que dele constavam (art. 8 da p.i dmissão por acordo das partes).
- o que de facto veio a acontecer e a ser aceite pela A. (art. 9 da p.i admissão por acordo das partes).
- Acabando A. e RR. por subscreverem e assinarem o contrato de mediação imobiliária, com as alterações pretendidas por aqueles RR., e que consiste no documento junto sob o nº3 (art. 10 da p.i admissão por acordo das partes)”.
Para os efeitos que agora nos interessam, acertados que foram os termos do contrato de mediação celebrado entre as partes, decorre desta factualidade que o preço de venda do imóvel em questão e que os Réus proprietários pretendiam era de € 1.000.000,00 (um milhão de euros).
Com interesse para a decisão da questão colocada resultou ainda provado nos autos que:
- Iniciados os trâmites inerentes ao referido contrato de medição por banda da Autora apelante (publicitação do imóvel, com a sua colocação em várias páginas da Internet e colocação de dois cartazes de venda no próprio imóvel com o logotipo da A. “K…”/“F…) em Maio de 2014, acabou por conseguir que o representante legal da sociedade H… visitasse o dito imóvel e se viesse a interessar na aquisição do mesmo, oferecendo o preço de EUR: 800.000,00;
- Tal proposta foi de imediato comunicada aos Réus, os quais a recusaram e disseram que venderiam somente por EUR: 850.000,00, sendo que, confrontada com a resposta daqueles, a dita sociedade decidiu subir o valor para a quantia pedida pelos Réus de EUR: 850.000,00 tendo tal facto sido comunicado imediatamente aos Réus;
- Ora, estando neste pé as negociações, foi então, elaborado um contrato promessa (documento nº 4 junto com a petição inicial) que a Autora em 6 de Junho de 2014, apresentou à promitente compradora (H…), a qual de imediato o assinou e tendo logo emitido um cheque de sinal no montante de EUR: 50.000,00, com a mesma data;
- De imediato, o representante legal da A. informou os Réus que a promitente compradora havia assinado o dito contrato promessa, e emitido o cheque de sinal, no valor pretendido;
- Depois de saber que a promitente compradora já havia assinado o referido contrato promessa, e entregue o cheque em causa, os Réus solicitaram então que a Autora lhe enviasse a minuta do contrato promessa em causa;
- A Autora enviou, por mail, a minuta do contrato promessa no dia 6 de Junho pelas 15.29 e os Réus, por mail de 7 de Junho de 2014, pelas 12.46, pretenderam efectuar as seguintes alterações ao mesmo:
1- A cláusula 3ª, nº 2 deve terminar em “...à denuncia do presente contrato.” Sendo eliminado o restante texto; no seu nº 1 deve especificar-se que a comunicação por escrito de ser feita por carta registada. 2- Na cláusula 5ª nº 1 o texto “...até à sua tradição...” deve ser substituído pelo seguinte: “até à data da celebração da escritura”. 3- O nº 2 da cláusula 5ª deve ser eliminado. 4- Deve ser acrescentada uma nova cláusula – que poderá ser a 7ª-com o seguinte texto: “A posse do prédio pelo segundo outorgante será efectiva a partir da data da outorga da escritura notarial de compra e venda” 5- As actuais cláusulas 7ª e 8ª passarão a ser, respectivamente, as 8ª e 9ª 6- Finalmente, deve ser acrescentada mais uma cláusula–a 10ª-com o seguinte texto: “Titulo: FORO; Texto: As partes estipulam o foro da comarca do Porto para dirimir qualquer litigio emergente do presente contrato. 7- Depois das cláusulas deve ser escrito o seguinte: Este contrato foi feito em 2 exemplares de igual teor e conteúdo e assinado no Porto a–- de Junho de 2014.”, solicitando ainda à Autora que declarasse que o valor da venda era de 850 mil euros e o valor da comissão daquela de EUR: 56.865,00 já com IVA incluído (facto descrito em 14º da fundamentação factual);
- A 17 de Junho, o marido R. pede ao A. o envio de uma minuta do Contrato-Promessa de Compra e Venda juntamente com a confirmação da aceitação das alterações à minuta de contrato promessa por ele pedidas;
- No mesmo dia, o funcionário da Autora diz que apenas após estar resolvida a questão das áreas e das preferências poderá ser “dado andamento ao processo”.
Respigando este primeiro quadro factual, dúvidas não existem de que a Autora angariou um interessado efectivo para a compra do imóvel em questão disposto a aceitar as condições dos vendedores Réus.
Com efeito, como se pode dizer que assim não foi?
É certo que o valor pretendido pelos Réus apelados para a venda do imóvel aquando da celebração do contrato de mediação foi, de facto, € 1.000.000,00 (um milhão de euros).
Acontece que, em momento posterior e parente o valor oferecido pela empresa compradora, H…, SA angariada pela Autora, aceitaram reduzir esse valor para € 850.000,00.
E, perante essa aceitação de redução do valor para ao montante indicado, a referida compradora assinou logo o contrato promessa que lhe foi apresentado pela Autora e emitiu de imediato um cheque de 50.000,00 correspondente a um dos sinais.
Ora, logo que estes factos foram conhecidos dos Réus, solicitaram de imediato que lhes fosse enviada a minuta do contrato promessa e, tendo-a recebido, propuseram que ao mesmo fossem feitas as alterações atrás assinaladas.
Decorre, assim, do exposto que até ao referido momento e perante a conduta dos Réus consubstanciada na factualidade supra descrita, o cliente angariado pela Autora aceitou as condições impostas por aqueles, sobretudo naquilo que era o elemento essencial para a concretização do negócio, ou seja, o preço da venda do imóvel.
Bom mas refere o Sr. juiz do processo que os Réus e a promitente compradora nunca chegaram a consensualizar entre si o clausulado do contrato, permanecendo entre eles um dissenso evidente, mais referindo que as alterações no contrato, que aqueles pretendiam introduzir, eram absolutamente essenciais para a sua perfeição.
Importa, desde logo referir que, efectivamente, como ensina o Prof. Inocêncio Galvão Teles[14] “(…) quase sempre a celebração de um contrato é antecedida de negociações preliminares, que ocupam espaço de tempo mais ou menos longo, a que se pode chamar fase de período pré-contratual. Os futuros contraentes avizinham-se, sondam-se reciprocamente, manifestam as suas intenções, discutem, procurando chegar a acordo. E só depois de determinado o conteúdo do acordo em toda a extensão poderá haver contrato, muitas vezes, à medida que se vão estabelecendo certas bases fixando outras, fixando certos pontos, reduzem-se a escrito, possivelmente com as assinaturas dos interessados, para se não regressar à sua discussão. Mas de nada valem estes escritos fragmentários ou parciais quando se não forme com acordo total. As negociações preliminares, a própria minuta não têm carácter vinculativo. São tentativas para a celebração do contrato, com êxito se levam a essa celebração, goradas e sem valor se a esta não conduzem”. [15]
Todavia, da matéria de facto provada nos autos não se vislumbra onde existia o mencionado dissenso, entre os Réus e a promitente compradora, quanto ao clausulado contratual.
Com efeito, o que os Réus sugeriram foi a alteração da redacção de algumas cláusulas que constavam do contrato promessa já assinado pela promitente compradora, e a introdução de outras relacionadas com o momento da posse do imóvel por parte desta e com o foro competente para dirimir qualquer litígio.
Porém, não está provado nos autos que a promitente compradora não quisesse aceitar as alterações sugeridas pelos Réus referentes a algumas das cláusulas e o aditamento de outras, nomeadamente, as supra referidas.
Por outro lado também não se divisa, como as alterações e aditamentos sugeridos pelos Réus apelados, se podem considerar essenciais no âmbito da economia do contrato.
Na verdade, as alterações queridas e sugeridas pelos Réus tratam-se, algumas delas de correcções de erros e outros de rectificação de números, outras de eliminação e aditamento, mas nada que se possa qualificar de absolutamente essencial.
É que, essencial no contrato promessa, são os elementos referentes ao preço, ao valor do sinal, à forma de pagamento, à data da celebração do contrato prometido (prazos de cumprimento seja da obrigação principal seja de obrigações intercalares) e procedimentos para a realização da escritura.[16]
Ora, nada disto, foi posto em causa pelos Réus nas apresentadas alterações do clausulado.
Aqui chegados, a pergunta que agora se impõe é esta: então por que motivo, ou motivos, os Réus não assinaram o contrato promessa, num primeiro momento, e não se concretizou a celebração do contrato prometido, num segundo momento?
Analisando.
Logo após a assinatura do contrato promessa por parte da promitente compradora ocorreram algumas condutas por parte dos Réus apelados que nos ajudam a compreender a não assinatura do contrato promessa e, por lógica implicância, a não realização do contrato definitivo.
No dia 9 de Junho, a Autora, por mail, informou o marido R. que o imóvel em causa se encontrava sujeito a preferência da Câmara Municipal … e do IGESPAR, I.P. (agora DGPC), e que no caso de uma transmissão do mesmo, seria necessário obter a aprovação destas entidades alertando-o ainda, de erros nas áreas da propriedade em questão entre a Conservatória e as Finanças, o que obrigava à sua prévia correcção (factos descritos em 15º e 16º da fundamentação factual).
A tal email, o Réu marido respondeu também por email dessa mesma data, que iria tratar da divergência de área existente e detectada bem como da comunicação de venda à Câmara Municipal … e ao IPPAR, pedindo que a Autora confirmasse o valor da comissão (factos descritos em 17º e 18 da fundamentação factual).
No dia 10 de Junho de 2014, por email o Réu marido solicitou que lhe fosse transmitido os dados do interessado bem como a sua morada e data prevista para a realização da escritura, tendo sido nesse mesmo mail, informado que a venda seria efectuada pelo preço de EUR: 850.000,00, sendo a comissão da A. fixada em EUR: 56.865,00, já com IVA incluído (factos descritos em 45º e 46º da fundamentação factual).
Por mail de 11 de Junho de 2014, pelas 13.17, foi o Réu marido informado dos dados pretendidos por aquele para poder dar seguimento ao processo (facto descrito em 19º da fundamentação factual).
Sucede que, por email de 12 de Junho de 2014, pelas 10.47, e apesar de saber que já estava assinado pela promitente compradora, o Réu marido veio pedir que no contrato promessa fossem introduzidas rectificações por ele solicitadas, devendo a convocação para a escritura definitiva ser por ele efectuada, exigindo ainda receber um valor total liquido de EUR: 800.000,00 (factos descritos em 20º, 21º e 49º da fundamentação factual).
Por email de 15 de Junho de 2014, de 6.45, a Autora comunicou aceitar reduzir a sua comissão para o valor de EUR:50.000,00 já com IVA incluído de forma a não inviabilizar o negócio (facto descrito em 50º da fundamentação factual).
No dia 17 de Junho de 2014, o Réu marido enviou email nos termos dos quais comunicava que iria apresentar o dito valor de EUR: 850.000,00, e que logo que tivesse a rectificação das áreas efectuadas e as respostas das ditas entidades a consultar quanto ao direito de preferência, procederiam então à assinatura do contrato promessa, ao que a Autor respondeu ficar então a aguardar a informação das datas previsíveis para a resolução das ditas situações (factos descritos em 22º e 23º da fundamentação factual).
Desta factualidade decorre, sem margem para qualquer tergiversação, que era intenção dos Réus apelados proceder à assinatura do contrato promessa logo que estivessem rectificadas as áreas e fossem dadas as respostas das entidades a consultar quanto ao direito de preferência, tanto mais que a Autora tinha aceitado baixar o valor da sua comissão para os € 50.000,00 de modo a que os Réus recebessem o valor total líquido de € 800.000, 00 como tinham exigido.
Acontece que, no dia no dia 18 de Junho de 2014, por mail, o Réu marido voltou a solicitar informações sobre o adquirente (facto descrito em 24 da fundamentação factual).
No dia 27 de Junho de 2014, por estranhar o silêncio do Réu marido, a Autora enviou um email pelas 19.10 a pedir que o Réu marido lhe fizesse o ponto de situação quanto à rectificação de áreas e aos direitos de preferência, informando ainda que a escritura poderia ser realizada rapidamente, logo que tais situações estivessem tratadas (factos descritos em 25º e 26º da fundamentação factual).
A tal mail, o Réu marido respondeu por mail da mesma data e hora de 19.51 que não haveria desenvolvimento do processo enquanto não recebesse as informações/documentos solicitados nos seus emails dos passados dias 17 e 18 do corrente ao Dr E… (facto descrito em 27º da fundamentação factual).
Em resposta a esse mail, a Autora enviou logo no dia 1 de Julho de 2014 pelas 18.46 o dito contrato promessa com todas as alterações pretendidas e que haviam sido aceites pela promitente compradora solicitando então que fosse dado andamento quer as rectificações de áreas quer aos direitos de preferência (factos descrito em 28 da fundamentação factual).
O Réu marido respondeu por mail de 2 de Julho de 2014, pelas 16.40 que o documento em anexo não correspondia ao que havia sido por ele pedido, sem, no entanto, referir o que não estava correcto (facto descrito em 29º da fundamentação factual).
Por mail de 2 de Julho de 2014, pelas 17.08, foi respondido pela A. desconhecer o que o Réu pretendia mas que estava à disposição para rectificar tudo quanto achasse necessário (facto descrito em 30 da fundamentação factual).
No dia 3 de Julho de 2014, pelas 18.49, o Réu marido solicitou que lhe fosse enviada certidão permanente da sociedade adquirente bem como um documento das finanças e da segurança social para comprovar que a situação fiscal se encontrava regularizada tendo tais documentos sido remetidos, por mail de 4 de Julho pela Autora (factos descrito em 31º e 52º da fundamentação factual), faltando apenas o documento da segurança social, o qual veio a ser remetido na dia 9 de Julho de 2014, pelas 15.08 por mail (facto descrito em 53º da fundamentação factual).
Sucede que por o Réu marido por mail de 9 de Julho de 2014, pelas 18.58, informou a Autora de que afinal não aceitava o negócio proposto e que apenas venderia o imóvel em causa pelo preço de EUR: 1.000.000,00 (facto descrito em 54º da fundamentação factual).
De tal decisão dos Réus foi dado conhecimento à promitente compradora por mail de 15 de Julho de 2014 ao qual a mesma respondeu por carta de 16 de Julho de 2014 e perante esta última missiva e numa última tentativa de solucionar este negócio, foi ainda marcado uma reunião para o dia 2 de Setembro de 2014 ou 3 de Setembro a qual os Réus não compareceram (factos descritos em 32º, 60º, 61º e 62º da fundamentação factual).
Perante esta conduta dos Réus como não dizer que a não assinatura do contrato promessa e a concretização do negócio visado se deveu a causa a eles imputável?
Então não foram acolhidas pela interessada H…, SA e pela Autora todas as exigências impostas pelos Réus?
Não lhe foram fornecidos todos os elementos que solicitaram?
E a Autora apelante não aceitou mesmo baixar a sua comissão para valor inferior ao estipulado contratualmente e até aceite posteriormente pelos Réus, por forma a que estes recebessem o valor líquido de € 800.000,00?
Que motivo, ou motivos, invocaram os Réus para virem, já depois de satisfeitas todas as suas exigências, informar que, afinal, não aceitavam o negócio proposto e que apenas venderiam o imóvel em causa pelo preço de EUR: 1.000.000,00?
A resposta é simples: nenhumas.
Pura e simplesmente não quiseram celebrar o negócio.
Na verdade, em 1 de Julho, a Autora entrega ao Réu marido uma proposta de compra do imóvel, anexando uma minuta de Contrato-Promessa e perante isso o Réu diz: “O documento anexo não corresponde ao que eu pedi. Já começam a ser demais as vossas hesitações e falta de informação.” (factos descritos 94º e 95ºda fundamentação factual).
Porém, pedindo adicionalmente, os elementos de identificação do interessado comprador para poder avaliar a nova proposta, os quais foram enviados a 9 de Julho, o Réu marido, tendo em mãos a informação do interessado comprador e a proposta final de preço de compra, decidiu recusar a mesma no próprio dia tendo disso dado conhecimento à Autora (factos descritos em 96º e 97º da fundamentação factual).
Portanto, os Réus sem qualquer justificação decidiram, por motu próprio, não querer celebrar o negócio com o cliente que a Ré tinha angariado, assumindo conduta e posturas contraditórias com a que tinham tido, quando vieram dizer que apenas venderia o imóvel em causa pelo preço de EUR: 1.000.000,00.
Se de facto, os Réus recorridos não queriam vender por valor inferior a € 1.000.000,00, como era seu direito, então nunca teriam aceitado o preço oferecido e nunca teriam estado dois meses a negociar a comissão e muito menos a pedir documentação.
Bastaria ter dito que não aceitavam, e à Autora recorrente apenas lhe restaria, como alternativa, procurar interessado pelo preço pretendido pelos recorridos.
Mas não foi o que aconteceu.
Diga-se, aliás, salvo o devido respeito por diferente opinião, que para estes efeitos quer-nos parecer ser inócuo a existência do contrato promessa e o seu clausulado.
Então e se as partes tivessem decidido não fazer qualquer contrato promessa, como se poderia ver que o promitente vendedor havia aceitado o negócio? Como se poderia concluir que a recorrente havia conseguido um interessado e cumprido a sua obrigação?
A seguir o entendimento do tribunal recorrido nunca.
Não é assim, todavia.
O Direito das Obrigações é um direito de cooperação social: o negócio jurídico visa realizar determinada cooperação entre os indivíduos nele interferentes.
A boa-fé é um critério de reciprocidade, comportamento devido e esperado, que deve ser observado nas relações jurídicas entre sujeitos do mesmo grau, que têm a mesma identidade moral.
É neste critério de reciprocidade, essencial à boa fé, que está a separação do abuso de direito.
Ora, além dos deveres típicos e principais de uma relação contratual, existem deveres secundários da prestação, traduzidos, por vezes, em prestações autónomas, a par, ainda, de deveres de protecção, laterais, de diligência ou de conduta que são deveres de adopção de determinados comportamentos impostos pela boa fé.[17]
São deveres de fidelidade, de cuidado para com o património da outra parte, de cooperação com a outra parte, deveres de notificação, de lealdade, de correcção.
Ao contratarem e na execução do contrato as partes devem usar de lisura e correcção, garantindo quanto possível a justiça real, comutativa. Devem agir com lealdade e de boa fé.
Proceder de boa fé, seja no cumprimento da obrigação, seja no próprio exercício do direito, significa, no sentido amplo em que a expressão boa fé é manifestamente usada, agir lealmente, correctamente, honestamente, quer no cumprimento do dever que a lei impõe ou sufraga, quer no desfrute dos poderes que o Direito confere.[18]
O princípio da boa fé contratual vincula tanto o credor como o devedor. Deve considerar-se extensivo a todos os outros domínios onde exista uma relação especial de vinculação entre duas ou mais pessoas. É válido para o credor enquanto proibição de abusar do seu direito de crédito e para o devedor enquanto critério de determinação do alcance da prestação e da forma do seu cumprimento. Tanto um como outro deverão abster-se de assumir quaisquer atitudes que possam acarretar prejuízos à contraparte.
A violação do princípio da boa fé e da confiança, revela normalmente um comportamento com que, razoavelmente, não se contava, face à conduta anteriormente assumida e às legítimas expectativas.
A conduta do agente terá, objectivamente, de trair o "investimento de confiança" feito pela contraparte, importando que os factos demonstrem que o resultado de tal conduta constituiu, in concreto, uma clara injustiça.
Na tutela e "responsabilidade pela confiança" trata-se fundamentalmente de ressarcir e evitar danos. O compromisso assumido na conduta ou comportamento não é necessariamente sancionado pelo direito como se fosse um compromisso negocial válido e, como tal, fruto directo de uma obrigação, mas por se revelar indispensável impor o cumprimento de tal compromisso como único meio de impedir o dano que, de outro modo, resultaria da frustração da confiança gerada. Ou seja: sê-lo-á ainda em função do dano a evitar ou ressarcir não em função do cumprimento de uma obrigação validamente assumida".[19]
Feitos estes breves considerandos, da matéria dada como provada, resulta evidente que os Réus recorridos aceitaram o negócio, aceitaram o preço de venda proposto pela interessada angariada pela recorrente, discutiram o valor da comissão, o que a recorrente aceitou, deram início às diligências necessárias, pediram documentos da interessada que foram fornecidos, e ao fim de dois meses recusaram-se a vender pura e simplesmente.
Há, assim, sem qualquer dúvida, uma manifesta contrariedade directa entre o primeiro e o segundo comportamento. E, salvo sempre o devido respeito por diferente opinião, entendemos que, há, no caso concreto, uma necessidade ético-jurídica de impedir a conduta contraditória, designadamente, por não se poder evitar ou remover de outra forma o prejuízo dos confiantes, e por a situação conflituar com as exigências de conduta de uma contraparte leal, correcta e honesta, com os ditames da boa fé em sentido objectivo.
Na verdade, com o comportamento inicial dos recorridos, pela clareza e sentido unívoco da sua declaração, a recorrente, objectivamente, ficou em condições muito sólidas de se convencer de que a venda do já estava acertada, razão pela qual efectuou todos as diligencias supra descritas e suportou essas despesas, de tal modo que, nisso tendo confiado, a sua destruição pelo venire posterior, com regresso à situação anterior, se traduziria numa injustiça clamorosa.
Significa, portanto, que no caso em apreço a recorrente cumpriu de forma escrupulosa as obrigações decorrentes do contrato de mediação imobiliária, publicitando e mostrando o imóvel em causa a interessados, tendo um deles manifestado o firme propósito de adquirir o imóvel dos recorridos, pois que, outorgou no contrato promessa que lhe foi apresentado, entregou cheque de sinal e disponibilizou todos os documentos que lhe foram solicitados por exigência dos Réus, sendo que, o negócio visado só não se veio a concretizar por causa imputável aos Réus.
Como assim, contrariamente ao sufragado na decisão recorrida, a verdade é que a recorrente conseguiu provar o que lhe incumbia e, dessa forma, a acção devia ter sido julgada procedente por provada e os Réus condenados a pagar à Autora apelante a comissão que contratualmente foi acordada.
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Procedem, assim as conclusões 32ª a 43ª formuladas pela Autora apelante ficando, assim, prejudicada a apreciação das formuladas em 44ª a 49ª.
No âmbito desta questão importa ainda salientar que os Réus só ficaram constituídos em mora com a citação para a acção, pois que, dos autos não resulta factualidade que demonstre terem sido interpelados em qualquer outro momento e, por outro lado, a obrigação deixou de ter prazo certo a partir do momento em que não foi outorgado o contrato promessa e a respectiva escritura de compra e venda (cfr. cláusula 5ª do contrato de mediação).
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A última questão que importa apreciar e decidir consiste em:
c)- saber se deve ser atribuída à Autora apelante indemnização referente a danos morais.
Como resulta do petitório a Autora apelante pretende que os Réus sejam condenados a pagar-lhe a quantia de € 15.000,00 (quinze mil euros) a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros vincendos a contar da citação
Na decisão recorrida julgou-se improcedente o referido pedido por não estarem verificados os respectivos pressupostos de responsabilização contratual dos Réus.
Ora, face ao supra decidido, isto é, da responsabilização contratual dos Réus, evidentemente que este argumento não pode fundamentar a improcedência da acção neste segmento.
Mas será de conceder tal indemnização como pretende a Autora apelante?
Atentemos.
Os danos que a Autora apelante reputa como não patrimoniais, por si invocados em virtude de o seu prestígio, imagem e bom nome terem ficado afectados junto dos clientes, entendemos poderem ser ressarcidos em sede de responsabilidade contratual, embora esta posição não tenha acolhimento unânime na doutrina e jurisprudência. No sentido que nós propugnamos, com a maioria da doutrina a seu favor, veja-se, entre outros, Vaz Serra[20], Galvão Telles[21] e Almeida Costa.[22]
No entanto, no caso dos autos, não estamos perante danos não patrimoniais (ou morais), strictu sensu, pois não se vê como a Autora, sendo uma pessoa colectiva, apesar de ter personalidade jurídica, conferida legalmente (cfr. artigo 5.º do Código das Sociedades Comerciais), possa sofrer danos morais por ofensa ao seu crédito ou bom nome, que necessariamente imporiam que se sentisse ofendida.
Poderemos estar, sim perante o que a doutrina usualmente denomina de danos patrimoniais indirectos, ou seja, um género de danos morais com reflexos patrimoniais. Neste sentido, de as pessoas colectivas poderem sofrer danos não patrimoniais, veja-se o Ac. RL 10/05/78[23], que cita no mesmo sentido De Cupis, “Il Dano, 32”, e refere “é fora de dúvida que as pessoas colectivas podem sofrer danos não patrimoniais: se não podem ter dores físicas ou morais, podem ser atingidas na sua reputação, por exemplo”.
Na verdade, como decorre do artigo 12.º, nº 2 da Constituição da República Portuguesa, “as pessoas colectivas gozam dos direitos e estão sujeitas aos deveres compatíveis com a sua natureza”.
Assim, não estão excluídos da capacidade de gozo das pessoas colectivas alguns direitos de personalidade, como é o caso do direito à liberdade, ao bom nome e à honra na sua vertente da consideração social (artigos 26.º, nº 1, da Constituição, 70.º, nº 1 e 72.º, nº 1, do Código Civil).
Isso significa que o bom-nome das pessoas colectivas, no quadro da actividade que desenvolvem, ou seja, na vertente da imagem, de honestidade na acção, de credibilidade e de prestígio social, está legalmente protegido.
Há ofensa do bom nome se o facto praticado tiver a virtualidade de abalar o prestígio de que a pessoa goza ou o conceito positivo em que é tida no meio social em que se integra.
O referido prestígio coincide com a consideração social, ou seja, o merecimento que as pessoas, físicas ou meramente jurídicas, têm no meio social, isto é, a respectiva reputação social.
Isto dito vejamos, agora qual o quadro factual que dos autos resulta assente sob este conspecto e que não foi impugnado pela Autora apelante.
Tal quadro é o seguinte:
- A. é afiliada da F…;
- Preza possuir serviços de elevada qualidade correspondente à excelência da clientela por ela angariada;
- Preza o seu nome e a sua prestigiada reputação;
- a cliente angariada H… na sequência da não conclusão do negócio jurídico remeteu à Autora a carta que constitui o “Doc. 31” da p.i”;
- a clientela alvo da A. é uma clientela de um círculo restrito e de nível alto” (factos descritos em 63º a 67º da fundamentação factual).
Como se torna evidente não se vê, perante a descrita factualidade, que a Autora apelante tenha sofrido danos na sua imagem e prestígio social.
Que factualidade suporta a afirmação feita pela Autora apelante que a conduta dos Réus teve consequências na sua imagem?
Que danos sofreu com tal conduta a recorrente?
Portanto, a recorrente não logrou provar que tivesse sido atingida na sua reputação, bom nome e prestígio social, que em consequência da não celebração do negócio visado tenha deixado de efectuar algum negócio ou tenha perdido algum cliente ou mesmo que tivesse perdido “aviamento”, com reflexos patrimoniais na actividade por si desenvolvida.
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Decorre, assim, do exposto, que a sua pretensão indemnizatória nesta parte tem de improceder, não podendo, pois, ser acolhida a conclusão 50ª formulada pela recorrente.
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IV-DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação interposta parcialmente procedente por provada e, consequentemente, revogando-se a decisão recorrida condenam-se os Réus a pagar à Autora apelante a quantia de € 56.865,00 (cinquenta e seis mil oitocentos e sessenta e cinco euros) acrescida de juros de mora à taxa legal a contar da citação até efectivo e integral pagamento.
No mais confirma-se a decisão recorrida embora por diferente fundamentação.
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Custas da apelação por apelante e apelados na proporção do respectivo decaimento (artigo 527.º nº 1 do C.P.Civil).
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Porto, 20 de Junho de 2016.
Manuel Domingos Fernandes
Caimoto Jácome
Sousa Lameira
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[1] De facto, “é sabido que, frequentemente, tanto ou mais importantes que o conteúdo das declarações é o modo como são prestadas, as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória, etc.”-Abrantes Geraldes in “Temas de Processo Civil”, II Vol. cit., p. 201) “E a verdade é que a mera gravação sonora dos depoimentos desacompanhada de outros sistemas de gravação audiovisuais, ainda que seguida de transcrição, não permite o mesmo grau de percepção das referidas reacções que, porventura, influenciaram o juiz da primeira instância” (ibidem). “Existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores” (Abrantes Geraldes in “Temas…” cit., II Vol. cit., p. 273).
[2] Miguel Teixeira de Sousa in Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, p. 348.
[3] Cfr. acórdãos do STJ de 19/10/2004, CJ, STJ, Ano XII, tomo III, pág. 72; de 22/2/2011, CJ, STJ, Ano XIX, tomo I, pág. 76; e de 24/9/2013, processo n.º 1965/04.9TBSTB.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[4] Cfr. Ac. do S.T.J. de 3/11/2009, processo n.º 3931/03.2TVPRT.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[5] Ac. Rel. Porto de 19 de Setembro de 2000, CJ XXV, 4, 186; Ac. Rel. Porto 12 de Dezembro de 2002, Proc. 0230722, www.dgsi.pt
[6] Cfr. C. Lacerda Barata, Contrato de Mediação, em Estudos do Instituto de Direito do Consumo, I, 192. Sobre mediação, cfr. ainda L. Brito Correia, Direito Comercial, I, 202 e 203; Pessoa Jorge, O Mandato sem Representação, 231 e segs e M. Helena Brito, O Contrato de Concessão Comercial, 6, 7 e 112 e segs- cfr. art. 2º do DL 285/92.
[7] Cfr. Lacerda Barata, Ob. Cit., 193.
[8] Cfr. Lacerda Barata, Ob. Cit., 198.
[9] Higina Orvalho Castelo, in “Regime Jurídico da Actividade de Mediação Imobiliária Anotado”, 2015, Almedina, pág. 126 “por força desta circunstância que coloca a remuneração na dependência da celebração do contrato visado o mediador corre um risco especifico de não ser remunerado, mesmo tendo cumprido escrupulosamente a sua prestação. Daí a referida frequente classificação do contrato de mediação como aleatório (…)”.
[10] Como refere Higina Orvalho obra citada pág.129 “Quando o contrato é celebrado sob condição suspensiva o direito à remuneração só nasce quando a condição se verifica; e quando enferma de invalidade absoluta, o mediador não tem direito à remuneração (…)”.
[11] Como refere Higina Orvalho, obra citada pag. 126 “(…) o contrato de mediação não se classifica como contrato condicional em sentido próprio, mas incorpora uma condição atípica ou circunstância de eventualidade cuja ocorrência é necessária à produção de um dos seus efeitos jurídicos principais, o dever de remunerar (…) “.
[12] Obra citada pag. 122/123
[13] O que se exige é que entre o proprietário e o interessado não possam existir dissensos impeditivos da concretização do negócio.
[14] In “Manual dos Contratos em Geral nº 80.
[15] No mesmo sentido, Rodrigues Bastos in “Das Relações Jurídicas Segundo o Código Civil de 1966, vol. III, pág. 22 onde refere, citando o artigo 154.º do CCivil alemão que segundo o autor terá inspirado o nosso artigo 232.º do CCivil, “(…) o consenso apenas acerca de alguns pontos não é vinculativo, ainda que exarado em minuta (…)”; e Heinrich E. Hoerster, no estudo “Sobre a formação do contrato segundo os arts. 217 e 218 ,224 a 226 e 228 a 235 do CCivil na R.D.E., IX- pág. 154 ) entende por seu lado que “(…) enquanto as partes não houverem acordado em todas as cláusulas sobre as quais uma delas julga necessário o acordo, o contrato não fica concluído. Está-se perante uma situação de dissenso (…)“, e defende o mesmo nas suas lições “A parte geral do Código Civil Português– Teoria geral do direito civil” pág. 465/6 .
[16] Cfr. neste sentido Carlos Ricardo Soares in Contrato Promessa de Compra e Venda de Fracção Autónoma, Guia Prático, 2ª Ed., Almedina, pag. 18 e ss.
[17] Cfr. neste sentido Carneiro da Frada in Contrato e Deveres de Protecção, Almedina, 1994 pág. 130.
[18] Cfr. A. Varela, RLJ, 122.°-148.
[19] Cfr. Baptista Machado, Obra Dispersa, Vol. I, págs 352 e 367.
[20] In RLJ 108.º-122.
[21] In Obrigações, 6.ª ed., p. 383.
[22] In Obrigações, 6.ª ed., p. 495.
[23] In, CJ, 1978, III, p. 927.