Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3503/15.9T8AVR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: TERESA SÁ LOPES
Descritores: RECURSO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO
REQUISITOS
NEGÓCIO JURÍDICO
TRANSMISSÃO
UNIDADE ECONÓMICA
MESMA ZONA GEOGRÁFICA
MESMA ORGANIZAÇÃO DE MEIOS
MESMOS TRABALHADORES
MESMAS FERRAMENTAS
Nº do Documento: RP201805303503/15.9T8AVR.P1
Data do Acordão: 05/30/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÕES EM PROCESSO COMUM E ESPECIAL(2013)
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ªSECÇÃO (SOCIAL),(LIVRO DE REGISTOS N.º277, FLS.103-112).
Área Temática: .
Sumário: I - “No recurso de apelação em que seja impugnada a decisão da matéria de facto é exigido ao recorrente que concretize os pontos de facto que considera incorretamente julgados, especifique os concretos meios probatórios que imponham uma decisão diversa, relativamente a esses factos, e enuncie a decisão alternativa que propõe.”.
II - Não sendo efetuada qualquer referência à parte dos depoimentos prestados que impunham uma decisão diversa sobre a matéria de facto sobre que incide a impugnação, nem a eventuais fragilidades de tais depoimentos, bem como não sendo indicadas as exatas passagens da gravação desses depoimentos em que se funda o recurso, nem efetuada a transcrição dos excertos dos mesmos tidos por relevantes, não é observado o disposto no artigo 640º, nº1 alínea b) e nº2 do Código de Processo Civil, impondo-se, nessa parte, a rejeição do recurso.
III - Nos termos do artigo 318º, nº4 do Código do Trabalho, redação anterior à introduzida pela Lei nº 7/2009, de 12.02., uma unidade económica prossupõe “a existência de um conjunto de meios organizados com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória, e é esse conjunto de meios organizados com o objetivo de exercer a atividade que é suscetível de transmissão ou reversão”.
IV - Ainda que não fique provada a existência de nenhum negócio jurídico de transmissão da unidade económica, a mesma ocorre se a adquirente começa a exercer de imediato a mesma atividade da transmitente, na mesma zona geográfica, e no essencial mantem a organização de meios que antes pertencera aquela última, nomeadamente vários trabalhadores e as ferramentas/equipamentos considerados elementos essenciais da atividade em causa.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 3503/15.9T8AVR.P1
4ª Secção
Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Juízo de Águeda
Relatora: Teresa Sá Lopes
1ª Adjunta: Desembargadora Fernanda Soares
2º Adjunto: Desembargador Domingos Morais
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
1. Relatório:
1.1. B…, intentou a presente ação com processo comum contra C…, Ldª, peticionando a condenação desta a reconhecer - lhe a categoria profissional de motorista, desde o início do contrato e a pagar-lhe a quantia de €14.298,40 respeitante à compensação pelo despedimento e créditos em dívida à data da cessação do contrato de trabalho.
A fundamentar a sua pretensão alegou, em síntese, o seguinte:
- Foi admitido ao serviço da R., que se dedica à construção civil e obras públicas, em 1.3.2008, para o exercício das funções de motorista que sempre exerceu, mas foi-lhe atribuída a categoria profissional de Estucador de 2ª.
- Por carta datada de 24.10.2014, a R. comunicou-lhe a decisão de fazer cessar o contrato por extinção do posto de trabalho, com efeitos a partir de 31.12.2014, data em que deixou de trabalhar.
- À data da cessação do contrato auferia a retribuição mensal de €505,00, acrescida de subsídio de alimentação, no valor de €5,65 por dia.
- A R. no recibo de vencimento de dezembro de 2014 descontou-lhe indevidamente €133,30, horas de trabalho que considerou como faltas injustificadas e não lhe pagou as férias e os subsídios de férias e de Natal em dívida, nem a compensação legal pela cessação do contrato.
- Desde 1991 que trabalhava para D… que exercia a atividade de construção civil como empresário individual e, em princípios de 2008, este constituiu a ora R. que, em março de 2008, iniciou a atividade de construção civil com vários trabalhadores que até então tinham trabalhado para o seu legal representante e com as ferramentas ao mesmo pertencentes.
E concluindo que por força do artigo 285º do Código do Trabalho, a sua antiguidade deve reportar-se a 1991.
Em sede de audiência de partes, não foi lograda a conciliação.
Notificada para o efeito a Ré, na contestação, pugnou pela improcedência da acção, sustentando que o A. desempenhava as funções de estucador de 2ª, que não se verificou a alegada transmissão de estabelecimento e que à data da cessação do contrato pagou ao autor todas as quantias que lhe eram devidas.
Foi proferido despacho saneador, no qual se afirmou a validade e regularidade da instância e se dispensou a realização da audiência prévia e a enunciação dos temas da prova.
Oportunamente realizou-se a audiência de julgamento com observância de todo o formalismo legal.
Em 29.05.2017, a Mm.ª Juiz a quo proferiu sentença, a qual terminou com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto e, sem necessidade de mais considerações, julgando-se a presente ação parcialmente procedente, decide-se:
1º- Reconhecer ao A. a categoria profissional de motorista desde o início do contrato de trabalho.
2º- Condenar a R. a pagar ao A. a quantia de €12.933,66 (doze mil novecentos e trinta e três euros e sessenta e seis cêntimos) a título de compensação pelo despedimento, com fundamento na extinção do posto de trabalho, férias e subsídios de férias e de natal em dívida, com juros de mora à taxa legal de 4%, contados desde 1.1.2015 até integral pagamento.
3º- Absolver a R. do restante pedido.
*
Custas por ambas as partes, na proporção do respectivo decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário de que o A. beneficia.”.

1.2. Inconformado com esta decisão, a Ré apresentou recurso, defendendo a revogação da sentença, terminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões:
“1. Ao contrário do que é referido pelo Tribunal Recorrido não houve transmissão da empresa ou unidade económica de D… para a sociedade pelo mesmo constituído em 2008.
2. Na verdade não foi realizada prova que tal tenha sucedido.
3. O Tribunal Ad Quo deu como provado factos, a nosso ver mal, que se mostram importantes para esta questão; são eles:
“10. O A. antes de trabalhar pra a R., já exercia as mesmas funções, sob as ordens, direcção e fiscalização do legal representante desta, D…, que se dedicava à construção civil em nome individual, executando obras nesse ramo de actividade, essencialmente nos concelhos de Estarreja e Albergaria-a-Velha.
12. Em Março de 2008, a R. através do seu gerente, D…, começou a exercer a actividade de construção civil, adjudicando obras nos concelhos de Albergariaa- Velha e Estarreja, que executava com as mesmas ferramentas/equipamentos que tinham pertencido a D…, enquanto construtor em nome individual.”
4. Ora como facilmente alcançamos, através do depoimento da testemunha K… que foi a única que falou sobre este facto, concluímos que o D… nunca deixou a actividade da construção civil, mantendo-a até aos dias hoje.
5. Quanto ao ponto 12 não foi referido pelas testemunhas que as ferramentas/equipamentos usadas pela R. eram as mesmas que tinham pertencido a D…, enquanto construtor em nome individual.
6. Não se vislumbra como o Tribunal recorrido deu como provados estes factos, porquanto não foi afirmado pelas testemunhas e inexiste documentos no processo que o atestem.
7. Refere, ainda, a sentença recorrida o seguinte: não se provou a existência de negócio jurídico de transmissão.
8. Ora tal aconteceu porque na verdade não existiu qualquer transmissão da unidade económica que pertencia - e pertence - ao D… para a sociedade ora R.
9. Na verdade, a unidade económica de D…, manteve a sua laboração até aos dias hoje.
10. A R. de facto celebrou contratos de trabalho com alguns trabalhadores daquela unidade, mas não totalidade dos trabalhadores que detinha há data, como verificamos através das informações prestadas pela segurança social que se encontram juntas nos autos.
11. Pelo que não houve como diz o Tribunal recorrido qualquer transmissão da unidade económica que pertencia a D….
12. Pelo que, será forçoso nesta parte ser revogada sentença proferida.
13. Acresce ainda que o Tribunal Ad Quo devia ter dado como provado que em 31.12.2014,a R. pagou ao A. as quantias a que o mesmo tinha direito em Função da Execução e cessação do contrato.
14. E tal sucede porque a testemunha K… foi peremptória a afirmá-lo.
15. Ora, parece-nos assim, que em consequência deveria o Tribunal Ad Quo ter absolvido também nesta matéria a Ré.
De tudo o exposto resulta claro que deverá o presente recurso ser julgado procedente nos termos ora referidos.
ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA. “ (sublinhado e realce nossos).
1.3. O Autor, apresentou contra-alegações, nas quais sustentou que a sentença se deve manter na íntegra e em suma alegou:
- A Apelante limitou-se a transcrever os factos provados com que não concordava, como foi o caso da conclusão 3ª 8ª.
- As conclusões 4ª e 5ª (e quanto a esta não se encontra sequer especificado quais as testemunhas a que se refere) e 6ª não podem ser havidas como cumprimento do disposto no artigo 640º nº 1 alíneas b) e c) e nº2 alínea a), todos do Código de Processo Civil (CPC), por não cumprirem os requisitos aí aludidos de forma expressa e clara.
- Na conclusão 14ª, a Apelante apenas refere que “ a testemunha K… foi peremptório a afirmá-lo”, sem, contudo, dar cumprimento ao disposto no artigo 640º nº 1 alíneas a), b) e nº 2 alínea a) todos do CPC.
- Na conclusão 13ª, a Apelante também não deu cumprimento às obrigações que lhe eram impostas pelo artigo 640º nº 1 alínea C) CPC.
- Tais omissões estão expressamente cominadas na Lei com a rejeição do recurso pelo que deve o recurso interposto pela Ré ser rejeitado.
- a sentença recorrida especificou correta e detalhadamente os “factos provados”, os quais tiveram por base uma apreciação global da prova documental e testemunhal, tendo sido esta última apreciada segundo as regras da experiência comum, tendo a testemunha E… deposto de forma isenta, idónea, desapaixonada e credível.
- o direito aplicado encontra-se correctamente coadunado com a matéria de facto dada como provada.
- pelo que nenhuma alteração existe a efetuar no que concerne à matéria de facto provada, assim como ao direito aplicado, devendo a decisão final de mérito manter-se totalmente inalterada.
- Existiu transmissão da unidade económica “D…” para a sociedade Ré “C…, Lda”.
- Da prova documental da Segurança Social extrai-se que o Autor e mais 04 trabalhadores (F…, G…, H…, I…) deixaram de trabalhar para J… em Fevereiro/2008 e começaram a trabalhar para a Ré em Março/2008.
- J… e a Ré têm a mesma actividade negocial, ou seja, a construção civil, embora aquele o tivesse exercido em nome individual.
- K… [Acta de Audiência de Julgamento de 20/4/2017, faixa 5, 00:00-15:20]
Testemunha K…; - “falámos com o meu pai e optámos por recrutar funcionários que eram dele” [ minuto 2:40 sensivelmente]
- Depoimento de parte do legal representante da Ré/Apelante, D… [Acta de Audiência de Julgamento de 20/4/2017, faixa 2, 00:00-25:19]
- Meritíssima Juiz: “ tinha equipamento para trabalhar nas obras quando trabalhava em nome individual e depois quando começou a sociedade utilizava os mesmos?”
- D… respondeu: “eu cedi à empresa” [minuto 14:40 sensivelmente]
- Sendo aquele J… sócio da Ré, com uma quota de 3.500€, assim como sua gerente (cfr. documentos juntos com a petição inicial e, ainda, Acta de Audiência de Julgamento de 20/4/2017, onde lhe foi colhido depoimento de parte como representante legal da Ré)
- O Autor exerceu sempre as mesmas funções, ou seja, motorista, ora por conta, sob a ordens e direcção daquele D…, ora da Ré.
- Testemunha E… (faixa 4, 00:00 – 9:40; Acta de Audiência de Julgamento de 20/4/2017):
- “era condutor” (minuto 2:30 sensivelmente)
- “trazia os materiais para as obras” (minuto 2:37 sensivelmente)
- “tudo o que fosse preciso nas obras, ele ia buscar” (minuto 2:40 sensivelmente)
- “era só na condução” (minuto 2:50 sensivelmente)
- “tinha um camião grande, 1 Mitsubishi, e tinha um outro mais pequeno que também era Mitsubishi, e era os 2 com que ele andava” (minuto 5:35 sensivelmente)
- ele descarregava o material e ia buscar mais (minuto 6:20 sensivelmente)
- o trabalho dele era só conduzir” (minuto 8:35 sensivelmente)
- Meritíssima Juiz: “ a partir de 2008 não sabe o que ele [entenda-se Sr. B…, o Autor] fazia?
Testemunha E… respondeu: “ ainda o cheguei a ver com o camião depois que eu sai” (minuto 9:30 sensivelmente)
- A Ré, através do seu gerente D…, começou a exercer actividade de construção civil, nos concelhos de Estarreja e Albergaria-a-Velha, com as mesmas ferramentas/equipamentos que tinham pertencido a D…, enquanto construtor em nome individual.
- Depoimento de parte do legal representante da Ré/apelante, D… [faixa 2, 00:00 – 25:19; Acta de audiência de Julgamento de 20/4/2017]
- Meritíssima Juiz: “ tinha equipamento para trabalhar nas obras quando trabalhava em nome individual e depois quando começou a sociedade utilizava os mesmos?”
- D… respondeu: “eu cedi à empresa” [minuto 14:40 sensivelmente]
- A transmissão de uma empresa ou estabelecimento ou parte de um e outro que constitua uma unidade económica está prevista no artigo 285º do Código do Trabalho, a qual pode ocorrer “por qualquer título.
- O nº 1 do artigo 285º consagra o princípio da transmissão para o adquirente da empresa ou estabelecimento de todas as obrigações relativas aos contratos de trabalho abrangidos pela respetiva transmissão.
- Tal princípio visa garantir a manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transmissão da titularidade da empresa, do estabelecimento, ou de parte da empresa ou do estabelecimento, que constitua uma unidade económica, concedendo-lhes o direito de se manterem ao serviço do novo empresário nas mesmas condições acordadas com o anterior.
- O Autor antes de trabalhar para a Ré já exercia as mesmas funções, sob as ordens, direção e fiscalização do legal representante desta, D…, que se dedicava à construção civil em nome individual, executando obras desse ramo de actividade, essencialmente nos concelhos de Estarreja e Albergaria-a-Velha.
- O Autor trabalhou por conta de D… como construtor civil em nome individual desde Maio/1991 até Fevereiro/2008, passando em Março/2008 a trabalhar para a Ré.
- O objeto social da Ré, com o capital social de 5.000€, é a construção civil e as obras públicas, foi registada em 23/11/2007.
- Em Março/2008, a Ré, através do seu gerente D…, começou a exercer a actividade de construção civil, adjudicando obras nos concelhos de Albergaria-a-Velha e Estarreja, que executava com as mesmas ferramentas/equipamentos que tinham pertencido a D…, enquanto construtor em nome individual.
- Ocorreu uma transmissão da unidade económica que pertencia a D…, para a sociedade Ré, pois esta começou a exercer, de imediato, a mesma atividade, na mesma zona geográfica, e no essencial manteve a organização de meios que antes pertencera ao seu legal representante, nomeadamente vários trabalhadores, entre eles o Autor, e as ferramentas/equipamentos, que são os elementos essenciais neste tipo de actividade.
- No fundo, foi transmitido para a Ré um conjunto de meios organizados (mão de obra e equipamentos/instrumentos) com um objectivo de prosseguir uma actividade económica, sem interrupção.
- Mercê de tal transmissão, a Ré assumiu “ex legis” a posição de empregadora no contrato de trabalho que o Autor tinha celebrado com o seu legal representante enquanto empresário da construção civil em nome individual.
- Consequentemente, a antiguidade do Autor reporta-se a Maio/1991, data em que iniciou a relação laboral com D… (cfr documentos da Segurança Social junto aos auto em 20/4/2017).
- Assim, andou bem a douta sentença, reconhecendo a existência da transmissão da “unidade económica”, assim como aplicou corretamente as consequências daí advindas reportadas ao Autor.
- A Ré deve ao Autor as quantias em que foi condenado, uma vez que não procedeu ao seu pagamento.
- O pagamento dos direitos devidos ao Autor, em virtude do contrato de trabalho, assim como os devidos pela sua cessação não se presumem.
- Consequentemente, o seu pagamento carece obrigatoriamente de ser provado.
- Essa prova, no caso concreto, só por documento por de ser feita.
- Circunstância que a Ré não fez, não obstante impender sobre si o ónus da prova nessa matéria, já que o Autor provou ter direito ao pagamento dos direitos laborais a que aquela foi condenada.
- E nem se diga que a prova produzida pela Apelante nesta matéria é válida, credível, admissível e valorável, pois a mesma baseou-se única e exclusivamente na Testemunha por si arrolada, K…, que além de filho do gerente da Ré, é também sócio desta e, assim, com interesse na mesma e desfecho do presente processo.
- Esta testemunha, assim como o seu pai (legal representante da R.) quando instada sobre detalhes dos pagamentos ao Autor remeteu para terceiros, entre eles o contabilista, argumentando que este sabia dos documentos, os quais, repita-se, nunca foram juntos aos autos ou sequer foi dada uma explicação para tal ausência.
- Testemunha K… (faixa 5, 00:00 a 15:20; acta de audiência de julgamento de 20/4/2017)
- quem tratou de fazer os pagamentos com ele foi o meu pai (minuto 4:09 sensivelmente)
- Meritíssima Juiz: “sabe como foi efectuado o pagamento desse valor?”
A testemunha K… respondeu: “como foi não sei ... eu não estava lá” (minuto 6:56 sensivelmente)
- E assim sucedeu porque efectivamente a Ré não pagou ao Autor nenhuma das quantias em que veio a ser condenada, ou seja 11.418,66€ a titulo de compensação e 1.515€ (3x505€) referentes a subsídios de férias e natal e férias, a que acrescem os inerentes juros moratórios contados desde a data da cessação do contrato até efectivo e integral pagamento.
- Tem aplicação aos autos o artigo 5º, nºs 1 e 2 da Lei nº 69/2013 de 30/8 e os artigos 245º nº 1 alínea b), 263º nº 2 alínea b) e 264º nºs 1 e 2 todos do Código do Trabalho
- Face a todo o exposto, o recurso interposto pela Ré deve ser totalmente improcedente e não provado.
1.4. O recurso foi admitido por despacho proferido em 30.10.2017.
1.5. Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora – Geral Adjunto emitiu o parecer que parcialmente se transcreve:
“(…), a decisão ora em causa motivou e analisou criticamente, de forma ponderada e com recurso às regras da experiência, a globalidade da prova produzida, não padecendo de desconformidade com os elementos probatórios disponíveis.
Deverá assim manter-se inalterada a matéria de facto, que não foi objecto de gravação. O tribunal aprecia livremente as provas, decidindo sobre cada facto segundo a sua prudente convicção, tal como resulta do art ° 607.° n.°5 do CPC norma que consagra o princípio da livre apreciação da prova.
(…)
Improcedendo a impugnação da matéria de facto, deverá manter-se a douta decisão recorrida, a qual efectuou correcta análise dos factos e aplicação do Direito não merecendo censura.
Emite-se parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso da Ré.”, (sublinhado e realce nosso).
Foi cumprido o disposto na primeira parte do nº2 do artigo 657º do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26.06., aplicável “ex vi” artigo 87º, do Código de Processo do Trabalho.
2. Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
2.1. Na primeira instância foi proferida a seguinte decisão de facto:
“Com interesse para a decisão da causa provaram-se os seguintes factos:
1. A R. dedica-se à construção civil e obra públicas.
2. O A. foi admitido ao serviço da R. em 1.3.2008 para mediante remuneração trabalhar sob as ordens, direção e fiscalização desta, consistindo as suas funções em transportar, em veículo por si conduzido, materiais de construção, tais como, tijolo, ferro, cimento, areias, blocos de cimento e placas, para as obras que a R. tinha em construção.
3. Em Dezembro de 2014, o A. auferia a remuneração mensal base de € 505,00, acrescida de subsídio de alimentação no valor diário de €5,65.
4. Os locais de trabalho do A. situavam-se essencialmente nos concelhos de Albergaria-a-Velha e de Estarreja, onde a R. angariava as obras para construção, nomeadamente, nas zonas da …, … e ….
5. O horário de trabalho do A. era de segunda a sexta feira, das 8.00 às 12.00 e das 13.00 às 18.00 horas.
6. O A. trabalhou ininterruptamente para a R. desde 1.3. 2008.
7. Em 24.10.2014, a R. entregou ao A. a comunicação inserta a fls 11v, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, na qual lhe comunicou a decisão de extinguir o seu posto de trabalho devido a dificuldades crescentes da empresa, designadamente a falta de encomenda de serviços, com efeitos em 31.12.2014.
8. Em 31.12.2014, o A. deixou de trabalhar para a R.. 9. A R. comunicou à segurança social a cessação do contrato de trabalho do A., por extinção do posto de trabalho, com efeitos em 31.12.2014.
10. O A. antes de trabalhar para a R., já exercia as mesmas funções, sob as ordens, direção e fiscalização do legal representante desta, D…, que se dedicava à construção civil em nome individual, executando obras nesse ramo de atividade, essencialmente nos concelhos de Estarreja e Albergaria-a-Velha.
11. O A. trabalhou por conta de D… como construtor civil em nome individual desde Maio de 1991 até finais de fevereiro de 2008, passando em março de 2008 a trabalhar para a ora R..
12. O objeto social da R. é a construção civil e obras públicas, foi registada em 23.11.2007, e tem como sócios D…, com uma quota de €3.500,00, L…, com uma quota de €750,00, e M… (07-05-2018 11:25:41) Página 266 de 398 N…, com uma quota de €750,00, sendo o primeiro o único gerente.
12. Em Março de 2008, a R. através do seu gerente, D…, começou a exercer a atividade de construção civil, adjudicando obras nos concelhos de Albergaria-a- Vellha e Estarreja, que executava com as mesmas ferramentas/equipamentos que tinham pertencido a D…, enquanto construtor em nome individual.
13. E, além do A., mais 4 trabalhadores, que até Fevereiro de 2008 trabalhavam por conta de D…, em Março continuaram a exercer as mesmas funções nas obras de construção civil adjudicadas pela R., ao serviço desta.”.
Relativamente aos factos não provados:
“Com interesse para a decisão da causa, não se provaram os seguintes factos :
1. Que o A. no mês de Dezembro de 2014 trabalhou todos os dias úteis em obras da R., designadamente. nos dias 1 a 16, numa obra na … e do dia 17 até ao final do mês numa obra em ….
2. Que o A. desempenhava as funções de estucador de 2ª.
3. Que em 31.12.2014, a R. pagou ao A. as quantias a que o mesmo tinha direito em função da execução e cessação do contrato.”.
A fundamentação do tribunal sobre a decisão relativa à matéria de facto foi:
“O Tribunal alicerçou a sua convicção quanto aos factos controvertidos na apreciação global da prova documental e testemunhal carreada para os autos, esta última apreciada segundo as regras da experiência comum, salientando-se os seguintes aspetos por constituírem o cerne do litígio.
No essencial deu-se como provada a versão dos factos trazida aos autos pelo A., com base na análise conjunta da prova produzida na audiência e do teor dos documentos juntos.
Com efeito, dos documentos da segurança social resulta que o A. trabalhou para D… desde maio de 1991 até fevereiro de 2008 e também que em março de 2008 o A. e mais 4 trabalhadores deste começaram a trabalhar para a ora R., sendo que o próprio legal representante da R., no seu depoimento, admitiu que cedeu os equipamentos que possuía enquanto construtor em nome individual à R. e que houve transição de alguns trabalhadores.
Por outro lado, a testemunha E… que trabalhou nas obras adjudicadas por D… desde 1993 até 2008 e depôs de forma isenta, disse que as funções exercidas pelo A. eram apenas de motorista, transportando todo o tipo de materiais necessários para as obras, conduzindo, umas vezes, um camião grande e outras um veículo mais pequeno, acrescentando que, não trabalhou para a ora R., mas que já depois de 2008, viu várias vezes o A. a conduzir os mesmos veículos, infirmando assim a versão da R. na contestação de que o A. era estucador e o depoimento do seu legal representante, o qual disse que o A. executava vários serviços, nomeadamente, de estucador e motorista.
No que concerne ao pagamento do mês de Dezembro de 2014, o A. não demonstrou ter trabalhado todos os dias úteis desse mês. O legal representante da R. no seu depoimento admitiu que o último trabalho do A. foi em …, mas acrescentou que nos últimos tempos o A. faltava muito por motivos de doença, e não foi produzida qualquer outra prova sobre tais factos.
Relativamente aos factos da contestação deram-se como não provados, porquanto a única testemunha da R. foi K…, sócio desta, e filho do legal representante da mesma que, tal como o pai, veio dizer que aquando da cessação do contrato fizeram contas com o A. e nada lhe devem, e até que quando o mesmo começou a trabalhar para a R. lhe pagaram pela cessação do contrato anterior, porém, quando instados a fundamentar os seus depoimentos diziam que o contabilista é que sabia dos documentos, sublinhando-se que com a contestação a R. não juntou qualquer documento para provar os pagamentos alegados.
Por último, anota-se que a matéria não elencada nem nos factos provados, nem nos infirmados, foi tida como conclusiva ou de direito.”.
2.2. O objecto do recurso, delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, (artigo 635º, nº4 e 639º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, “ex vi” artigo 87º, nº1, do Código de Processo do Trabalho), ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, consubstancia-se nas seguintes questões:
- necessidade de alteração da decisão de facto nos termos requeridos pela Entidade Patronal.
- saber da inexistência da transmissão da unidade económica D…, enquanto empresário em nome individual para a Ré;
- saber do pagamento pela Ré à data da cessação do contrato de trabalho de todas as quantias que lhe eram devidas.
2.2.1. Fundamentação de facto: alteração da decisão de facto.
De harmonia com o disposto no artigo 662º, nº1 do Código de Processo Civil, o Tribunal da Relação deve alterar a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto, “se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Lê-se no Acórdão do S.T.J. de 24.09.2013, in www.dgsi.pt, « (…) o legislador pretende que a Relação faça novo julgamento da matéria de facto impugnada, vá à procura da sua própria convicção, assim se assegurando o duplo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto em crise (…)».
Os poderes da Relação sobre o julgamento da matéria de facto foram efetivamente reforçados na actual redação do Código de Processo Civil.
Na reapreciação da força probatória das declarações de parte, dos depoimentos das testemunhas e dos documentos, importa ter presente o princípio da livre apreciação, como resulta do disposto 607º, nº5 e 466º, nº3, ambos do Código de Processo Civil e 396º e 366º do Código Civil.
Ainda assim, tal deve suceder sem que se ignorem os princípios da oralidade, da imediação, da concentração e da livre apreciação da prova, devendo a alteração da decisão da 1ª instância cingir-se ao casos de manifesta desconformidade entre os elementos de prova carreados e a mesma decisão, relativamente à decisão sobre a matéria de facto impugnada.
Preceitua ainda o artigo 640º do Código de Processo Civil:
1 – Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
a) Os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
b) A decisão que no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas;
2 – No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando nos meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo da possibilidade de proceder à respectiva transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes”, (sublinhado e realce nossos).
Como se lê no Acórdão do STJ de 01.10.2015, in www.dgsi.pt, “Quer isto dizer que recai sobre a parte Recorrente um triplo ónus:
Primo: circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento;
Secundo: fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa;
Tertio: enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas.
Ónus tripartido que encontra nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e boa fé processuais a sua ratio e que visa garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, arredando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão. Cf., também, sobre esta matéria, Lopes do Rego, in “Comentários ao Código de Processo Civil”, pág. 465 e que, nesta parte, se mantém actual.
(…) A interpretação desta nova alínea c), do art. 640º, do CPC, é-nos dada de forma exemplar por Abrantes Geraldes, podendo ler-se a este propósito que:
“O Recorrente deixará expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem no reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente”… Cf. António Santos Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2014, 2ª Edição, pág. 133.
Porém, essa exigência, bem como o cumprimento do ónus a cargo do Recorrente, quando esteja em causa a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, não pode redundar na adopção de entendimentos formais por parte dos Tribunais da Relação, centrados numa visão formalista do processo e que, na prática, se traduzam na recusa de reapreciação da matéria de facto, maxime da audição dos depoimentos prestados em audiência, coarctando à parte Recorrente o direito de ver apreciada e, quiçá, modificada a decisão da matéria de facto, com a eventual alteração da subsunção jurídica.
Mais concretamente, não pode admitir-se que, por uma via interpretativa de raiz essencialmente formal, o Recorrente fique impedido de alcançar o objectivo visado pelo legislador e que foi consagrado nas reformas introduzidas ao processo civil: o segundo grau de jurisdição no âmbito do julgamento da matéria de facto.
A jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça (…)vem repetidamente apontando um rumo substancialmente diverso, (…).
(…) no sentido de que importante “é que o Recorrente, ao impugnar a matéria de facto, especifique de forma concreta quais os pontos de facto impugnados, embora sem referência a números, pois o que importa é que a contraparte e o julgador possam apurar ao certo o que o recorrente impugna”.
Entende a Ré que foi erradamente dado como provado que D… se dedicava à construção civil em nome individual.
Ainda que foi erradamente dado como provado que a Ré começou a exercer a actividade de construção civil com as mesmas/ferramentas/equipamentos que tinham pertencido a D…, enquanto construtor em nome individual.
Aduziu para tal que não foi referido pelas testemunhas que D… já não se dedica à construção civil, precisando que a testemunha K… aquando do seu depoimento, no minuto 9 e 30 segundos referiu que “(…) o meu pai continua a trabalhar (…)”(…) nós montámos uma empresa porque precisávamos de trabalhar (…)”.
Ainda que não foi referido pelas testemunhas que as ferramentas/equipamentos usados pela Ré eram as mesmas que tinham pertencido a D…, enquanto construtor em nome individual.
Mais alegou que estes factos além de não terem sido mencionados pelas testemunhas, não existem documentos nos autos que os afirmem.
Entende o Autor que a Ré limitou-se a transcrever os factos provados com que não concordava, como sucedeu na conclusão 3ª e 8ª e que nas conclusões 4ª, 5ª e 6ª não foi cumprido o disposto no artigo 640º nº 1 alíneas b) e c) e nº2 alínea a), todos do Código de Processo Civil, quanto aos requisitos aí aludidos, devendo o recurso nesta parte ser rejeitado.
Vejamos:
A matéria em causa, foi dada como provada na sentença do Tribunal a quo nos itens 10 e 12 dos factos provados.
E foi alegada pelo Autor nos artigos 26º e 30º da petição inicial.
Sobre tal matéria, cujo ónus de prova incumbia ao Autor, foi, por este, requerido o depoimento pessoal do legal representante da Ré, D… e foram indicadas as testemunhas O… e E….
A testemunha K…, apresentada pela Ré, foi tão só indicada à matéria da contestação, articulado no qual, além da matéria conclusiva de que “não tendo ocorrido a transmissão alegada” pelo Autor (artigo 1º da contestação), nada mais foi alegado pela Ré relativamente à matéria, em causa, para além da impugnação da versão trazida pelo Autor, com referência aos artigos da petição inicial em que foi alegada por este último (artigo 6º da contestação).
Importa por outro lado referir que o facto de se ter dado como provado que D… se dedicava à construção civil em nome individual, não significa que aquele deixou de trabalhar na construção civil.
A esse propósito nada foi mesmo alegado pela Ré na contestação.
Ora, o ónus da prova da matéria, em causa, alegada nos artigos 26º e 30º da petição inicial, incumbia como ficou já referido ao Autor e o tribunal fundamentou a respectiva convicção, a esse propósito, com base no depoimento do legal representante da Ré e no depoimento da testemunha E…, meios de prova apresentados e indicados pelo Autor, para o efeito.
Lê-se na fundamentação da decisão de facto:
“(…) o próprio legal representante da R., no seu depoimento, admitiu que cedeu os equipamentos que possuía enquanto construtor em nome individual à R. e que houve transição de alguns trabalhadores.
Por outro lado, a testemunha E…, que trabalhou nas obras adjudicadas por D… desde 1993 até 2008 (…) já depois de 2008, viu várias vezes o A. a conduzir os mesmos veículos (…).».
Acresce referir que a Ré não fez qualquer referência à parte do depoimento do seu legal representante nem do depoimento da testemunha E… que impunham uma decisão diversa sobre tal matéria, ou a eventuais fragilidades de tais depoimento assim como não indicou as exatas passagens da gravação desses depoimentos em que funda o seu recurso, nem efetuou a transcrição dos excertos dos mesmos que considerasse relevantes para a conclusão a que chega.
Não foi assim observado pela Ré, como observado pelo Autor, o disposto no transcrito artigo 640º, nº1 alínea b) e nº2 do Código de Processo Civil, o que implica a rejeição do recurso, nesta parte.
Em conformidade com tudo o exposto, improcede nesta parte a pretensão da Ré.
- Entende ainda a Ré que o tribunal devia ter dado como provado que a mesma Ré pagou todas as quantias a que o Autor tinha direito em função do contrato de trabalho bem como da cessação do mesmo.
Sobre tal matéria, foi indicada a testemunha K….
Entende o Autor que também nesta parte o recurso deve ser rejeitado, em virtude de:
Na conclusão 14ª, a Ré apenas refere que “ a testemunha K… foi peremptório a afirmá-lo”, sem, contudo, dar cumprimento ao disposto no artigo 640º nº 1 alíneas a), b) e nº 2 alínea a) todos do CPC.
Na conclusão 13ª, a Ré também não deu cumprimento às obrigações que lhe eram impostas pelo artigo 640º nº 1 alínea C) CPC.
- Tais omissões estão expressamente cominadas na Lei com a rejeição do recurso pelo que deve o recurso interposto pela Ré ser rejeitado.
Vejamos:
A conclusão 14ª das alegações de recurso da Ré, está relacionada com a conclusão 13ª, do mesmo articulado.
Reportam-se ambas à matéria alegada pela Ré no artigo 5º da contestação, onde a Ré alegou que, na mesma data (31.12.2014), a Ré pagou todas as quantias a que o Autor tinha direito em função do contrato de trabalho bem como da cessação do mesmo, não ficando em dívida qualquer importância.
Na sentença foi dado como não provado que em 31.12.2014, a Ré pagou ao Autor as quantias a que o mesmo tinha direito em função da execução e cessação do contrato, (item 3 da matéria de facto não provada.
Independentemente de nas conclusões 13ª e 14ª, a Ré não ter indicado o que a testemunha K… referiu a esse propósito nem a que momento da gravação ficou registado o referido pela mesma a esse propósito, certo é que o fez nas alegações de recurso.
Com efeito, a propósito da 2ª questão identificada nesse mesmo articulado, como objeto do recurso, a Ré alegou que “foi dito pela testemunha K… no minuto 7 que “No final do ano de 2014 (…) chegaram a acordo com o A. e que lhe foi pago (…) minuto 9 (…) nunca bateu à porta para reclamar dinheiro (…)”.
Mostra-se assim minimamente observados os requisitos que constam do artigo 640 do Código do Processo Civil.
Como se lê no sumário, do citado acórdão do STJ de 01.10.2015, “(…) o ónus a cargo do recorrente consagrado no art. 640º, do Novo CPC, não exige que as especificações referidas no seu nº 1, constem todas das conclusões do recurso, mostrando-se cumprido desde que nas conclusões sejam identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação.”.
Ainda assim a pretensão da Ré de que seja dada como provada a matéria em causa não pode proceder.
O Autor alegou que não lhe pagaram as referidas prestações.
Atento o disposto no artigo 342º, nº2 do Código Civil, compete à Ré fazer a prova do pagamento dessas quantias. Ora, parece que não basta uma testemunha (ainda por cima pertencente aos corpos sociais da empresa) vir dizer que pagaram tudo. A questão reside no meio de prova e não propriamente na prova do respetivo facto. A entidade patronal está obrigada a fazer constar do recibo de vencimento os pagamentos efectuados e por isso era de toda a conveniência que tivesse junto aos autos essa prova (ou então que o dito contabilista em depoimento tivesse esclarecido como foi feito esse pagamento). Em suma: o depoimento da testemunha é de todo insuficiente para se concluir que ocorreu o dito pagamento.
Improcede pois também nesta parte a pretensão da Entidade Patronal.
2.2.2. Fundamentação de direito:
Passemos agora a analisar a segunda questão objecto do presente recurso, a qual se prende com saber da inexistência da transmissão da unidade económica D…, enquanto empresário em nome individual para a Ré.
A , defende a revogação da sentença na parte em que na mesma se determinou que ocorreu uma transmissão da unidade económica que pertencia a D… para a mesma, tendo concluído que:
- não existiu qualquer transmissão da unidade económica que pertencia – e pertence – ao D… para a sociedade ora Ré;
- A unidade económica de D…, manteve a sua laboração até aos dias hoje.
- A Ré de facto celebrou contratos de trabalho com alguns trabalhadores daquela unidade, mas não a totalidade dos trabalhadores que detinha há data.
Por seu turno, o Autor considera que exerceu sempre as mesmas funções, as de motorista, primeiro por conta, sob a ordens e direcção de D…, como construtor civil em nome individual desde Maio/1991 ate Fevereiro/2008, e a partir de Março/2008, para a Ré.
O mesmo sucedeu com mais quatro trabalhadores.
D… dedicava-se à construção civil em nome individual, executando obras desse ramo de actividade, essencialmente nos concelhos de Estarreja e Albergaria-a-Velha.
A Ré, cujo objecto social é a construção civil e as obras públicas, tem como sócios, entre outros, aquele D… e começou a exercer actividade de construção civil, nos concelhos de Estarreja e Albergaria-a-Velha, com as mesmas ferramentas/equipamentos que tinham pertencido a D…, enquanto construtor em nome individual.
O nº 1 do artigo 285º do Código do Trabalho consagra o princípio da transmissão para o adquirente da empresa ou estabelecimento de todas as obrigações relativas aos contratos de trabalho abrangidos pela respetiva transmissão.
Decisivo é que possa concluir-se que determinada unidade económica se manteve.
Em concreto, ocorreu uma transmissão da unidade económica que pertencia a D…, para a sociedade Ré, já que foi transmitido para esta um conjunto de meios organizados (mão de obra e equipamentos/instrumentos) com um objectivo de prosseguir uma actividade económica, sem interrupção.
Mercê de tal transmissão, a Ré assumiu a posição de empregadora no contrato de trabalho que o Autor tinha celebrado com o seu legal representante enquanto empresário da construção civil em nome individual.
Consequentemente, a antiguidade do Autor reporta-se a Maio/1991, data em que iniciou a relação laboral com D….
Finalmente, o Ministério Público observa que efectuou uma correta análise dos factos e aplicação do direito.
Acompanhamos o enquadramento fáctico que na sentença, a este propósito, ficou referido.
Com efeito, em concreto é esta a factualidade a atender:
- O Autor antes de trabalhar para a Ré, já exercia as mesmas funções, sob as ordens, direção e fiscalização do legal representante desta, D…, que se dedicava à construção civil em nome individual, executando obras nesse ramo de atividade, essencialmente nos concelhos de Estarreja e Albergaria-a-Velha, (item 10º da factualidade assente como provada).
- O Autor trabalhou por conta de D… como construtor civil em nome individual desde Maio de 1991 até finais de fevereiro de 2008, passando em março de 2008 a trabalhar para a ora Ré, (item 11º da factualidade considerada provada).
- O objeto social da Ré é a construção civil e obras públicas, foi registada em 23.11.2007, e tem como sócios D…, com uma quota de €3.500,00, L…, com uma quota de €750,00, e K…, com uma quota de €750,00, sendo o primeiro o único gerente, (item 12º da factualidade considerada provada).
- Em Março de 2008, a Ré através do seu gerente, D…, começou a exercer a atividade de construção civil, adjudicando obras nos concelhos de Albergaria-a-Vellha e Estarreja, que executava com as mesmas ferramentas/equipamentos que tinham pertencido a D…, enquanto construtor em nome individual, (item 13º da factualidade considerada provada).
- E, além do A., mais 4 trabalhadores, que até Fevereiro de 2008 trabalhavam por conta de D…, em Março continuaram a exercer as mesmas funções nas obras de construção civil adjudicadas pela Ré, ao serviço desta, (item 14º da factualidade assente como provada).
Vejamos:
Os factos a ter em conta para se concluir pela transmissão ocorreram antes do CT/2009 sendo aplicável o CT/2003
Dispõe o artigo 318º do Código do Trabalho, na referida redação aplicável de tal preceito, redação essa anterior à introduzida pela Lei nº 7/2009, de 12.02.:
«Transmissão da empresa ou estabelecimento
1 - Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade da empresa, do estabelecimento ou de parte da empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmite-se para o adquirente a posição jurídica de empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, bem como a responsabilidade pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laboral.
2 - Durante o período de um ano subsequente à transmissão, o transmitente responde solidariamente pelas obrigações vencidas até à data da transmissão.
3 - O disposto nos números anteriores é igualmente aplicável à transmissão, cessão ou reversão da exploração da empresa, do estabelecimento ou da unidade económica, sendo solidariamente responsável, em caso de cessão ou reversão, quem imediatamente antes exerceu a exploração da empresa, estabelecimento ou unidade económica.
4 - Considera-se unidade económica o conjunto de meios organizados com o objectivo de exercer uma actividade económica, principal ou acessória.».
O artigo 318º do Código do Trabalho, (redação aplicável de tal preceito), consagra o imperativo constitucional de segurança no emprego, estabelecido no artigo 53º da Constituição da Republica Portuguesa, tendo transferido para o direito interno a Directiva 2001/23/CE do Conselho de 12.03.2001.
Lê-se no Acórdão desta secção proferido no processo nº 3294/16.6T8PRt.P1, de 06.11.2017, (Relator Jerónimo Freitas) que «(…)a Diretiva 2001/23/CE se justifica pela necessidade de “adoptar disposições para proteger os trabalhadores em caso de mudança de empresário especialmente para assegurar a manutenção dos seus direitos».
Lê-se no Acórdão também proferido no processo n.º346/16.6T8VLG.P1, de 06.11.2017, (Relatora Fernanda Soares), «(…)no artigo 1º, al. b) da Directiva determina-se: (…) “É considerada transferência, na acepção da presente directiva, a transferência de uma entidade económica, que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória”.
O conceito de «transmissão de empresa/estabelecimento» é, deste modo, um conceito que tem sido entendido em sentido amplo».
O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE) tem vindo, através das suas decisões, a clarificar a noção de entidade económica ao defender que “O conceito de entidade remete assim para um conjunto organizado de pessoas e elementos que permitam o exercício de uma actividade económica que prossegue um objectivo próprio. Tal entidade, embora deva ser suficientemente estruturada e autónoma, não inclui necessariamente elementos de activos, materiais ou imateriais, significativos” (…)(acórdão de 10.12.1998), (sublinhado nosso).
A posição do STJ é coincidente ao afirmar que “É, assim, essencial que a transferência tenha por objecto um conjunto de elementos que permitam a prossecução, de modo estável, de todas ou de parte das actividades da empresa cedente e deve ser possível identificar essa entidade económica na esfera do transmissário” – acórdão de 24.03.2011 na CJ, acórdãos do STJ, ano 2011, tomo 1, página 268 [no mesmo sentido é igualmente o acórdão do STJ de 26.09.2012, em www.dgsi.pt»]».
Lê-se também no sumário do Acórdão do S.T.J. de 27.05.2009, in www.dgsi.pt, «III – constituem indícios da manutenção da “unidade económica” a transmissão de parte significativa dos efectivos da empresa, a natureza claramente similar da atividade prosseguida antes e depois da transmissão e a continuidade dessa actividade», (sublinhado nosso).
Em concreto, da factualidade supra elencada, resulta que ocorreu efectivamente uma transmissão da unidade económica.
Como se aferiu na sentença que também nesta parte acompanhamos, nada havendo de oportuno a acrescentar à fundamentação aí explanada que se transcreve “(…) não obstante não se ter provado a existência de nenhum negócio jurídico de transmissão, ocorreu de facto uma transmissão da unidade económica que pertencia a D… para a sociedade ora R., pois esta começou a exercer de imediato a mesma atividade, na mesma zona geográfica, e no essencial manteve a organização de meios que antes pertencera ao seu legal representante, nomeadamente vários trabalhadores, entre eles, o A., e as ferramentas/equipamentos, que são os elementos essenciais neste tipo de atividade.
E mercê de tal transmissão, a R. assumiu “ ex legis” a posição de empregadora no contrato de trabalho que o A. tinha celebrado com o seu legal representante enquanto empresário da construção civil em nome individual.”, (sublinhado nosso).
Daí que como também correctamente se conclui na sentença «(…), não restam dúvidas de que a antiguidade do A. se deve reportar a Maio de 1991, data em que iniciou a relação laboral com D….»
Perante tal conclusão e o que demais resultou decidido, em 2.2.1., a propósito da impugnação da matéria de facto, fica prejudicado o conhecimento da 3ª questão objecto do presente recurso, concluindo-se sem mais pela respetiva improcedência.
3. Decisão:
Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar o recurso improcedente e em consequência confirmar a sentença.
Custas pela Ré.

Porto, 30 de Março de 2018.
Teresa Sá Lopes
Fernanda Soares
Domingos Morais