Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
361/22.0T8AVR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: NELSON FERNANDES
Descritores: DENÚNCIA DO CONTRATO PELO TRABALHADOR
PRAZO DE AVISO PRÉVIO
PRAZO DE REVOGAÇÃO DA DENÚNCIA
DESPEDIMENTO ILÍCITO DO TRABALHADOR
EFEITOS
Nº do Documento: RP20230227361/22.0T8AVR.P1
Data do Acordão: 02/27/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO PARCIALMENTE PROCEDENTE; ALTERADA A SENTENÇA.
Indicações Eventuais: 4. ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - As formas de cessação do contrato de trabalho constam do artigo 340.º do Código do Trabalho de 2009 (CT), matéria que é objeto, quanto à sua licitude, de rigorosa disciplina, plasmada em normas de carácter imperativo (artigo 339.º, n.º 1).
II - A possibilidade de denúncia do contrato pelo trabalhador assume-se como um caso específico de cessação do contrato em que prevalece o princípio da denúncia livre ou da liberdade de desvinculação, pois que o trabalhador não pode ser forçado a continuar a prestar trabalho contra a sua vontade, pois que só este entendimento se coaduna com o princípio da liberdade de trabalho (artigo 47.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa), que se projeta na faculdade de o trabalhador, livremente e a todo o momento, fazer cessar a relação laboral.
III - Querendo denunciar o contrato, o trabalhador deverá comunicar essa sua intenção ao empregador, sendo que, estando em causa uma declaração negocial recipienda, neste caso, porém, afastando-se do regime geral previsto no Código Civil, estabeleceu o legislador, no CT, a possibilidade da sua revogação em determinado prazo pelo trabalhador (n.º 1 do artigo 402.º).
IV - O facto extintivo da relação laboral, resultando aqui da própria declaração de rescisão emitida pelo trabalhador, apenas se assumirá como plenamente eficaz, para a produção dos seus efeitos, no momento em que decorra o prazo previsto na lei para a sua revogação pelo trabalhador, pelo que, podendo assim a extinção dos efeitos do contrato revogado ser imediata ou diferida, ocorrendo este último caso, tratando-se assim de rescisão com prazo de aviso prévio, tendo-se produzido já aquela eficácia, a mesma não é impedida pela circunstância de ocorrer entretanto um qualquer ato do empregador que se configure como de despedimento ilícito.
V - Em face do referido em IV, não obstante os efeitos do contrato se manterem enquanto dura ou decorre o prazo de aviso prévio, se nesse período, mas depois de decorrido o prazo de revogação da denúncia, a entidade patronal proceder ao despedimento ilícito do trabalhador, uma vez que a extinção dos efeitos do contrato ficou fatalmente diferida pelo tempo do aviso prévio, o trabalhador apenas terá direito ao pagamento da importância correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde a data desse despedimento até à data do termo da sobrevida do vínculo laboral, não tendo também designadamente direito a indemnização por antiguidade.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação / processo n.º 361/22.0T8AVR.P1
Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro Juízo do Trabalho de Aveiro - Juiz 1

Autora: AA
Ré: A... - Associação de Solidariedade Social
_______
Nélson Fernandes (relator)
Teresa Sá Lopes
António Luís Carvalhão



Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I - Relatório
1. AA instaurou, contra Centro Social de A... - Associação de Solidariedade Social, ação declarativa com processo comum, emergente de contrato de trabalho, pedindo: I. Que seja declarado ilícito o seu despedimento por parte da R..; II. A condenação da R. a pagar-lhe: a) €4.485,00 de indemnização, nos termos do art. 391º n.º 1 do Cód. do Trabalho - pela qual opta, em detrimento da reintegração; b) Quantia que se vier a apurar referente às retribuições que deixou de auferir desde o despedimento, até ao trânsito em julgado da sentença, à razão de €690,00 por mês; c) €278,69, a título de retribuição pelas horas de formação que não lhe foram ministradas; d) €828,00, que a R. lhe descontou a título de aviso prévio em falta; e) €500,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais; f) Juros vencidos e vincendos sobre as referidas quantias, até efetivo e integral pagamento, contados desde a data dos respetivos vencimentos.
Alegou para tanto, em síntese: que, tendo sido admitida ao serviço subordinado da Ré em 05/06/2015, por contrato de trabalho sem termo, para exercer funções próprias de Auxiliar de Serviços Gerais, em 05/11/2021, dirigiu a esta uma carta registada com aviso de receção, que foi rececionada em 08/11/2021, através da qual lhe comunicou a denúncia do contrato de trabalho, para ter efeitos em 07/01/2022, assim cumprindo o dever de aviso prévio de 60 dias a que estava obrigada; tendo-lhe a Ré comunicado em 02/12/2021 que iniciaria o seu período de gozo de férias no dia seguinte no dia 03/12/2021, data em que iniciou o gozo das suas férias, porém, quando se encontrava em pleno gozo dessas férias, foi surpreendida com a receção, em 24/12/2021, de uma carta registada com A/R que a Ré lhe remeteu em 23/12/2021, através da qual lhe comunicava a cessação do vínculo laboral, alegando o abandono do trabalho, sendo que antes dessa comunicação nunca a Ré lhe apontou a falta de comparência ao trabalho, ou a alertou para o abandono de trabalho de que posteriormente a veio a acusar; tal comunicação configura um despedimento ilícito, nos termos dos artigos 381.º e seguintes do Código do Trabalho, conferindo-lhe o direito a ser ressarcida, como peticionado, independentemente da denúncia que havia comunicado à Ré; tendo direito, em cada ano, a um número mínimo de 40 horas de formação contínua, porém, nos últimos três anos de vigência do contrato, a Ré somente lhe ministrou 50 horas de formação, devendo-lhe por isso a quantia a esse título peticionada; no recibo de fecho de contas, a Ré descontou-lhe €828,00, a título de “Pré aviso em falta”, quantia que lhe deve restituir; em resultado do despedimento ilícito, deliberadamente promovido pela Ré, sofreu danos não patrimoniais, que justificam a compensação a esse título reclamada.

A Ré contestou, impugnando a versão dos factos alegada pela Autora e contrapondo, no essencial: que na carta onde denunciou o contrato, a Autora dizia pretender, se possível, gozar férias até à cessação do contrato, sendo que, se numa situação normal aceitaria essa pretensão, como aliás é habitual que aconteça, contudo, dada a situação de pandemia que então se vivia e não tendo ninguém que pudesse desempenhar as funções da Autora, transmitiu-lhe em reunião realizada no dia 25-112021 que não havia condições para lhe conceder o gozo de férias, pelo que deveria assegurar o serviço que lhe estava destinado até ao final do período do aviso prévio, ou seja, 6 de Janeiro de 2022; a Autora ignorou essa determinação e desde o dia 3-12-2021 não mais compareceu no seu local de trabalho, nem a informou do motivo ou razão dessa ausência, pelo que, não lhe sendo exigível enquanto entidade patronal que a interpelasse para tentar averiguar os motivos que a levavam a não comparecer no seu posto de trabalho, o facto de nunca ter comunicado as razões para não ir trabalhar, durante tão longo período, revela cristalinamente que tinha intenção de não comparecer no seu local de trabalho, razão pela qual decidiu pôr termo a essa incerteza e dirigiu à Autora carta registada com aviso de receção, informando-a que, nos termos do artigo 403.º do Código do Trabalho, considerava cessado o contrato de trabalho por iniciativa da trabalhadora, por abandono de trabalho; o facto de a Autora ter denunciado o seu contrato de trabalho não a desobrigava imediatamente dos direitos e obrigações decorrentes do contrato, pelo que tinha o dever de continuar a prestar os seus serviços até ao termo do prazo do aviso prévio de 60 dias; limitou-se a antecipar a cessação de um contrato já validamente denunciado pela Autora, com efeitos a partir de 7 de Janeiro de 2022, pelo que não faz sentido a pretensão da Autora de ser indemnizada e de receber as retribuições que deixou de auferir desde trinta dias antes da propositura da ação até ao trânsito em julgado da sentença; nada deve à Autora, nem o crédito por formação contínua, uma vez que a própria, em Setembro de 2020, solicitou a desistência da formação.
Concluiu pela improcedência da ação.

Proferido despacho saneador tabelar, dispensando-se de seguida a identificação do objeto do litígio e a enunciação dos temas da prova.
Foi ainda fixado à ação o valor de €6.091,69.

Prosseguindo os autos os seus termos subsequentes, realizada a audiência de julgamento, proferiu-se sentença, de cujo dispositivo consta:
“Termos em que se decide julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência:
I. Declarar que a A. foi ilicitamente despedida pela R..
II. Condenar a R. a pagar à A.:
a) €4.485,00 (quatro mil, quatrocentos e oitenta e cinco euros), a título de indemnização pela ilicitude do despedimento.
b) As retribuições - a liquidar ulteriormente, nos termos do disposto nos arts. 609º n.º 2 e 358º n.º 2 e segs. do Cód. de Processo Civil - que a A. deixou de auferir por causa do despedimento, desde 27/12/2021 até ao trânsito em julgado da sentença, a razão de €690,00 (seiscentos e noventa euros) por mês, como peticionado, com desconto dos montantes que tenha recebido no mesmo período de tempo ou venha a receber, a título de subsídio de desemprego, que cabe à R. entregar à Segurança Social.
c) €326,19 (trezentos e vinte e seis euros e dezanove cêntimos) ilíquidos, indevidamente descontados pela R. a título de aviso prévio em falta.
d) Juros de mora à taxa legal (actualmente de 4%) sobre as referidas quantias, até efectivo e integral pagamento, contabilizados desde a citação da R., excepto no que se refere à al. b), em que apenas são devidos juros a partir da liquidação do montante em dívida.
III. No mais, absolver a R. do pedido.
Custas por A. e R., na proporção dos respectivos decaimentos - art.º 527º n.ºs 1 e 2 do Cód. de Processo Civil.
Registe e notifique.”

2. Não se conformando com o assim decidido, apresentou a Ré requerimento de interposição de recurso, apresentando as suas alegações, que finda com as seguintes conclusões:
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2.1. Contra-alegou a Autora, apresentando extensas e prolixas conclusões, em que defende a improcedência do recurso e a manutenção do julgado.

2.2. O recurso foi admitido em 1.ª Instância como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.

3. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, parecer esse sobre o qual não ocorreu pronúncia das partes.
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II – Questões prévias
Não obstante as conclusões apresentadas pela Recorrente padecerem de clara prolixidade, o que poderia justificar a formulação de convite ao aperfeiçoamento, na consideração, porém, de que ainda assim se percebem sem grande dificuldade as questões que são objeto do recurso, por razões de celeridade processual, entendeu o aqui relator não formular aquele convite, razão pela qual de seguida procederemos à apreciação.

Cumpridas as formalidades legais, nada obstando ao conhecimento do mérito, cumpre decidir:

III – Questões a resolver
Sendo pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do NCPC – aplicável “ex vi” do art. 87º/1 do Código de Processo do Trabalho (CPT) –, integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir: (1) invocada nulidade da sentença; (2) recurso sobre a matéria de facto; (3) dizendo de direito: questões de saber se o Tribunal a quo errou na aplicação do Direito ao ter considerado que não ocorreu abandono do trabalho pela Autora e que se verificou antes o seu despedimento e, neste último caso, se as consequências desse despedimento serão as que foram afirmadas na sentença, na consideração de que teria ocorrido antes daquele despedimento denúncia do contrato.
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IV – Fundamentação
A) Fundamentação de facto:
O Tribunal recorrido deu como provados os factos seguidamente transcritos:
“1. A A. foi admitida ao serviço subordinado da R. em 05/06/2015, por contrato de trabalho sem termo, para exercer funções próprias de Auxiliar de Serviços Gerais, com o horário, a remuneração e demais condições clausuladas no contrato de trabalho junto a fls. 9/10 dos autos.
2. Tal contrato veio a ser objecto de um aditamento outorgado pelas partes em 18/09/2018, através do qual alteraram o convencionado, no que respeita ao horário de trabalho e às tarefas a executar.
3. As funções exercidas pela A. compreendiam a lavandaria e a limpeza das instalações da instituição, nomeadamente o refeitório e o pavilhão do ATL, frequentados pelos utentes, nomeadamente crianças.
4. Em 05/11/2021, a A. dirigiu à R. uma carta registada com aviso de recepção, que esta recepcionou em 08/11/2021, com o seguinte teor:
«Assunto - Rescisão de Contrato de Trabalho - Pré-aviso Aveiro, 05 de Novembro de 2021
Exm.ºs Senhores,
Venho, por este meio, comunicar a vossa Exa. que, por motivos pessoais, deixo de trabalhar na Vossa Instituição a partir do próximo dia 07 de janeiro de 2022, cumprindo desta forma o pré-aviso legal, segundo o Código do Trabalho Artigo 400.º, n.º 1).
Pretendo, se possível, gozar os dias de férias a que tenho direito, até cessação do contrato.
Solicito a V. Exas., que realizem o apuramento dos vencimentos a que tenho direito até à data da minha rescisão.».
5. Em Novembro de 2021, a A. já tinha gozado 22 dias úteis das férias vencidas em 01/01/2021.
6. É habitual na R. os trabalhadores gozarem as férias a que têm direito nos dias imediatamente anteriores à cessação do contrato de trabalho.
7. Em Dezembro de 2021, vivia-se no contexto de uma pandemia provocada pelo Covid-19.
8. Em reunião realizada nas instalações da R. no dia 25/11/2021, com a presença da A., da directora técnica, BB e do Presidente da Direcção da R., foi transmitido à A. que deveria assegurar o serviço que lhe estava destinado até ao final do período do aviso prévio (06/01/2022) e que não lhe poderia ser concedido o gozo de férias.
9. No dia 02/12/2021, a Directora Técnica da R. comunicou à A. que entraria de férias no dia seguinte, ou seja, no dia 03/12/2021.
10. Perante tal comunicação, a A. já não foi trabalhar no dia 03/12/2021, na convicção de que estava em gozo das suas férias, não mais tendo prestado trabalho para a R. a partir daí.
11. As trabalhadoras da R. estavam convencidas que a A. estava em gozo de férias.
12. A A. sempre comunicou e justificou as faltas que dava enquanto trabalhadora da R..
13. Mesmo depois do dia 03/12/2021, a A. continuou a deslocar-se pelo menos uma ou duas vezes por semana às instalações da R., para levar e/ou recolher o seu neto, que é utente do ATL da R., tendo nessas alturas contacto com colegas de trabalho na R..
14. A R. tinha o contacto telefónico da A. e o seu email, meios de comunicação que eram por vezes utilizados para comunicações a respeito de assuntos relacionados com o trabalho.
15. A A. residia e reside a cerca de 1,5 km das instalações da R..
16. No dia 16 de Dezembro de 2021, a A. telefonou para à R., tendo falado com a Directora Técnica, BB, solicitando-lhe o pagamento do subsídio de Natal desse ano.
17. Na altura, não foi dito à A. que estaria a faltar ao trabalho, nem a A. foi questionada a esse respeito.
18. No dia 17/12/2021, a A. enviou um email à R., dirigido ao seu Presidente da Direcção, a insistir pelo pagamento do referido subsídio de férias.
19. Em meados de Dezembro de 2021, a Directora Técnica da R., BB, telefonou à A., a convidá-la para se deslocar no dia 22/12/2021 às instalações da R., para a entrega de prendas de Natal habitualmente realizada pela R..
20. No dia 22/12/2021, a A. compareceu nas instalações da R., onde com outros colaboradores e na presença de elementos da Direcção, nomeadamente do seu Presidente, esteve em convívio, tendo sido trocados presentes e recolhidas as prendas de Natal oferecidas pela R..
21. Pelo menos até ao referido dia 22/12/2021, nunca ninguém da R. questionou a A. sobre a falta de comparência ao trabalho ou a alertou para abandono de trabalho.
22. No dia 24/12/2021, a A. recebeu uma carta registada com A/R, que a R. lhe remeteu em 23/12/2021, através da qual lhe comunicou a cessação do vínculo laboral entre ambas, invocando o abandono de trabalho por parte da A., por ausência do serviço desde o dia 03/12/2021, sem informar a R. dos respectivos motivos.
23. A A. sentiu-se triste, desanimada e angustiada, em resultado da mencionada comunicação de abandono de trabalho, que lhe foi dirigida pela R..
24. Em Dezembro de 2021, a A. auferia mensalmente €669,00 de retribuição base, mais € 21,00 de diuturnidades.
25. Em 03/01/2022, a R. remeteu à A., por email, o recibo de vencimento referente ao mês de Dezembro de 2021, onde consta o desconto de €828,00, a título de “Pré-aviso em falta”.
26. Com referência ao mencionado recibo de vencimento, foi paga à A. a quantia líquida de € 856,64.
27. Em 08/09/2020, a A. formalizou pedido de desistência de uma formação do “Centro Qualifica”, do Centro de Emprego e Formação Profissional ....”

Fez-se de seguida constar:
“Não se provaram quaisquer outros factos com relevo para a decisão da causa, de entre os alegados na petição inicial e contestação, nomeadamente que a R., nos últimos três anos de vigência do contrato de trabalho, só proporcionou à A. 50 horas de formação.”
***
B) Discussão
1. Nulidade da sentença
Invoca a Recorrente, o que levou às conclusões B) a F), que o Tribunal recorrido socorreu-se na sentença de factos não alegados pela Autora, os quais foram decisivos para a procedência do pedido, “o que pode configurar a nulidade prevista no n.º 1, alínea c) do artigo 615.º do Código de Processo Civil”, ao ter considerado provado que “No dia 02.12.2021, a diretora técnica da ré comunicou à A. que entraria de férias no dia seguinte, ou seja, no dia 03.12.2021 (9 dos factos provados); e Perante tal comunicação, a A. já não foi trabalhar no dia 03.12.2021, na convicção de que estava em gozo das suas férias, não mais tendo prestado serviço para a ré, a partir daí (10 dos factos provados)”, pois que, diz, tais factos não foram os alegados pela Autora, na sua petição inicial, que se limitou a afirmar que em 02-12-2021 a Ré lhe comunicou que iniciaria o seu período de férias no dia seguinte, o que é completamente diferente, razão pela qual, acrescenta, “ficou impedida de exercer o respetivo contraditório, pugnando pela inverdade do facto, alegando que a diretora técnica não é o órgão executivo da ré, não tinha competência delegada para o efeito e até que, a ser verdade tal decisão, contrariava orientações da direção da associação, suscetível de constituir grave infração disciplinar”.
Pugnando a Apelada pela não ocorrência do vício invocado, como primeira nota começaremos por esclarecer que, fazendo a Recorrente referência à alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, não se percebe, em face da sua previsão – assim: c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível –, de que modo aí se integrará o que invoca.
Ainda assim, em face das razões que refere, não deixaremos de apreciar a questão, o que faremos pois de seguida.
Para o efeito, teremos de começar por esclarecer, por estar em causa uma pretensa preterição do contraditório e existência de decisão surpresa (decisão em violação do disposto no artigo 3.º, n.º 3, do CPC), que a ocorrer uma qualquer nulidade com esse fundamento a mesma dirá respeito a atividade anterior à da prolação da sentença propriamente dita, assumindo-se assim como processual, enquanto desvio entre o formalismo prescrito na lei e o formalismo efetivamente seguido no processo – vício formal que pode consistir: a) na prática de um ato proibido; b) na omissão de um ato prescrito na lei; c) na realização de um ato imposto ou permitido por lei, mas sem as formalidades requeridas[1] –, sendo que, como é consabido, dessas, em princípio cabe reclamação e não recurso, reclamação essa também em princípio dirigida ao tribunal em que foi cometida a nulidade, só assim não ocorrendo quando essa estiver a coberto de uma decisão judicial, pois que nesta situação o meio de impugnação será o recurso e não aquela reclamação. Assim o afirmava já o Professor Alberto dos Reis[2], com a autoridade que por todos lhe foi sempre reconhecida, cujos ensinamentos neste âmbito se têm por atuais, ao referir o seguinte: “A reclamação por nulidade tem cabimento quando as partes ou os funcionários judiciais praticam ou omitem actos que a lei não admite ou prescreve; mas se a nulidade é consequência de decisão judicial, se é o tribunal que profere despacho ou acórdão com infracção de disposição da lei, a parte prejudicada não deve reagir mediante reclamação por nulidade, mas mediante interposição de recurso. É que, na hipótese, a nulidade está coberta por uma decisão judicial e o que importa é impugnar a decisão contrária à lei; ora as decisões impugnam-se por meio de recursos (art. 677º) e não por meio de arguição de nulidade do processo.”[3]
Distinguindo a lei entre duas modalidades distintas de nulidades processuais, na terminologia da doutrina as principais (ou, de 1.º grau, típicas ou nominadas) e as secundárias (ou, de 2.º grau, atípicas ou inominadas), as primeiras configuram-se como as mais graves pelas suas consequências, estando especificamente previstas na lei e podendo o Tribunal delas conhecer oficiosamente, conforme estabelecido no artigo 196.º do CPC[4], enquanto as segundas, por sua vez, serão todas aquelas que caiam na fórmula genérica do n.º 1 do artigo 195.º do mesmo Código: “Fora dos casos previstos nos artigos, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa”[5]. Importa ainda ter presente que, neste último caso, tratando-se pois de nulidade secundária, o seu conhecimento depende de arguição, posto que o tribunal só pode conhecer oficiosamente das nulidades principais[6], regulando a lei a legitimidade de quem pode invocá-las (artigo 197.º), o prazo em que pode fazê-lo (artigo 199.º) e as consequências/modo do seu suprimento (artigo 195.º, n.ºs 2 e 3, e 200.º, n.º 3).
No caso dos autos, face à posição da Apelante, se bem a percebemos, o vício invocado é pela mesma vislumbrado nomeadamente numa imputada falta de cumprimento do princípio do contraditório, princípio esse que, como é consabido, podemos ter como emanado do n.º 4 do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa – direito constitucional a um processo equitativo – e que encontra atualmente consagração expressa no CPC, assim no seu artigo 3.º, n.º 3, em que se estabelece que o “juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem”.
Trata-se de princípio que, estando ainda diretamente associado aos deveres de gestão processual e de cooperação para com as partes, também cometidos ao juiz – respetivamente, pelo artigo 6.º e 7.º do CPC –, tem normalmente como campo de aplicação os casos em que o tribunal tenha de debruçar-se sobre questões (de facto ou direito) de conhecimento oficioso que as partes não tenham considerado/invocado, impondo-se ao juiz, mesmo nesses casos, que antes de decidir dê a possibilidade às partes de se pronunciarem, independentemente da fase em que se encontre o processo[7]’[8]. São de resto bem evidentes as vantagens que desse regime podem resultar, seja para o julgador, por lhe permitir após a audição das partes que a sua posição seja afirmada com maior convicção e segurança, seja para as partes, ao dar a estas a possibilidade de esgrimirem os seus argumentos de modo a poderem influenciar aquela decisão[9].
Ora, omitindo o juiz a aplicação do analisado princípio do contraditório, daí pode então resultar nulidade – a apreciar nos termos gerais do artigo 201.º[10] –, caindo na previsão do artigo 195.º, do CPC, pois que a decisão surpresa, salvos os casos de manifesta desnecessidade, ao não ter dado às partes a oportunidade de se pronunciarem, pode influir no exame ou na decisão a causa.
Pois bem, por decorrência do regime que antes sinteticamente se expôs, tentando perceber-se o que se invoca no caso, estaríamos então, a ocorrer este vício, perante nulidade processual, nos termos antes configurados, ocorrida não na sentença propriamente dita e sim, diversamente, em momento prévio, nulidade essa que, a verificar-se, chamando à colação o que se referiu anteriormente, não se integraria no núcleo das nulidades principais (ou, de 1.º grau, típica ou nominada), as quais constam especificamente previstas na lei e de que pode o Tribunal conhecer oficiosamente, conforme estabelecido no artigo 196.º do CPC[11], assumindo antes, diversamente, a natureza de nulidade secundária (ou, de 2.º grau, atípica ou inominada), caindo assim na fórmula genérica do n.º 1 do artigo 195.º do CPC, razão pela qual, como desse resulta, sempre o seu conhecimento, pela sua afirmada natureza, dependeria de arguição, regulando a lei a legitimidade de quem pode invocá-las (artigo 197.º) e o momento / prazo em que pode fazê-lo (artigo 199.º, n.º 1: “se a parte estiver presente, por si ou por mandatário, no momento em que forem cometidas, podem ser arguidas enquanto o ato não terminar; se não estiver, o prazo para a arguição conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum ato praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência”).
Importando então apreciar da tempestividade da arguição, estando na base da invocação a pronúncia do Tribunal recorrido sobre a matéria de facto ocorrida apenas na sentença, entendemos que não ocorre razão para não termos por tempestiva a reação, ainda que apenas em sede recursiva, pois que a coberto da mesma sentença.
Apreciando, então, adiantamos desde já ser nosso entendimento que não assiste razão à Recorrente neste âmbito, como procuraremos evidenciar de seguida.
Constando expressamente alegado na petição inicial que “Em 02/ 12/ 2021 a Ré comunicou à Autora que esta iniciaria o seu período de gozo de férias no dia seguinte, ou seja, no dia 3 desse mesmo mês”, que “Ao que a Autora acedeu, iniciando nesse dia o gozo das suas férias” (artigos 4.º e 5.º) – ainda, no artigo 7.º que “se encontrava descansadamente em pleno gozo das suas férias” –, em face dessa alegação, na consideração do que veio a fazer-se constar da sentença e a que alede a Recorrente – assim que “No dia 02.12.2021, a diretora técnica da ré comunicou à A. que entraria de férias no dia seguinte, ou seja, no dia 03.12.2021 (9 dos factos provados)” e que “Perante tal comunicação, a A. já não foi trabalhar no dia 03.12.2021, na convicção de que estava em gozo das suas férias, não mais tendo prestado serviço para a ré, a partir daí (10 dos factos provados)” –, consideramos que, em face pois daquela alegação e dessa pronúncia, não ficou a Ré / aqui recorrente impedida de se defender, como aliás o fez na contestação, pois que, afinal, sendo alegado na PI o facto de ter comunicado à Autora que esta iniciaria o seu período de gozo de férias num determinado dia e que a tal esta acedeu, iniciando nesse dia o gozo das suas férias, a circunstância de se ter dado como provado que aquela comunicação teria sido feita pela sua diretora técnica ainda se insere no âmbito do facto alegado, traduzindo-se apenas em mera concretização em relação àquele facto alegado, assim identificando a pessoa que emitiu a declaração.
De resto, em, face do regime que resulta do n.º 2 do artigo 5.º do CPC – em que se estabelece que “Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz: a) Os factos instrumentais que resultem da instrução da causa; b) Os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar; (…)”[12] –, então, no caso, na nossa perspetiva, de modo claro que a referência que está em causa não se assume claramente com a natureza de essencial, tratando-se antes, no máximo, de facto meramente concretizador, razão pela qual, ainda que não alegado, desde que resultante da instrução da causa e tendo tido as partes a possibilidade de se pronunciar sobre ele, poderia ser considerado, como o foi.
Do exposto resulta que não se pode falar aqui de pronúncia por parte do tribunal sobre um “facto novo” e muito menos de que tenha ocorrido falta de cumprimento do contraditório.
Do que se disse anteriormente decorre, também, esclareça-se por último, caso a intenção da Ré tenha sido a de invocar esse vício – como antes o dissemos a referência à alínea c) só se compreende por lapso, dada a sua previsão –, assim o previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC (O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento), que também este não se verificará pelas razões já ditas, pois que este, como é consabido, tem a ver diretamente com os limites da atividade de conhecimento do tribunal, estabelecidos no artigo 608º, nº2 do CPC[13] – tratando-se pois, como se afirma no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31 de outubro de 2012[14], “de anomia atinente aos deveres e limitações do decisor em matéria de cognição da causa, ou seja, relativa ao poderes/deveres de cognição do julgador”.
Não colhe assim fundamento, nos termos expostos, a analisada invocação da Recorrente, que assim improcede.

2. Impugnação da matéria de facto / apreciação do recurso
Dirigindo a Recorrente o recurso também à impugnação da matéria de facto, assim aos pontos 9.º e 10.º da factualidade provada, razão pela qual, porque consideramos suficientemente cumpridos os ónus legais estabelecidos no artigo 640.º do CPC, de seguida procederemos à apreciação.
Os pontos impugnados têm a redação seguinte:
9. No dia 02/12/2021, a Directora Técnica da R. comunicou à A. que entraria de férias no dia seguinte, ou seja, no dia 03/12/2021.
10. Perante tal comunicação, a A. já não foi trabalhar no dia 03/12/2021, na convicção de que estava em gozo das suas férias, não mais tendo prestado trabalho para a R. a partir daí.”
Para suportar a alteração que defende, a Recorrente refere que, tendo resultado provados com fundamento no depoimento da testemunha CC que confirmou as declarações nesse sentido prestadas pela Autora, no entanto, diz, em audiência “prestou depoimento a diretora técnica, a qual negou, pura e simplesmente, ter ordenado que a A. ficasse de férias”, localizando e transcrevendo passagem deste depoimento, referindo de seguida que “por documentos juntos em audiência”, a Autora “no dia 2 de dezembro terá recusado a hipótese de cessar o contrato por mútuo acordo (cfr. Doc. de fls. 46 a 51 dos autos)” e acrescentando depois que, “face a depoimentos tão contraditórios e não tendo sido demonstrado nenhum outro facto que contrariasse que, a Autora deveria assegurar o serviço que lhe estava destinado até ao final do período e que não lhe poderia ser concedido o gozo de férias” cf decidido na reunião da direcção de 25-11-2021, afigura-nos duvidoso que o Tribunal a quo, sem a necessária fundamentação, tivesse optado por dar credibilidade a um depoimento em prejuízo de outro”, pelo que, porque competia à Autora a prova e se produziu contraprova, a factualidade em causa deverá ser considerada não provada (cfr. art. 342.º do C.Civil)”. Conclui depois que deve ser considerando não provado o facto descrito em 9 e ao n.º 10 fixada a seguinte redação: “Não obstante a comunicação (decisão 8 dos factos provados), a A., a partir de 3 de dezembro de 2021, não mais compareceu ao trabalho, nem apresentou qualquer justificação para a sua ausência”.
Pronunciando-se a Apelada pela manutenção do julgado, no que é acompanhada pelo Ministério Público junto desta Relação, constata-se que se fez constar da motivação contante da sentença o seguinte:
«No que concerne à demais factualidade dada com provada, a convicção do tribunal baseou-se: (…)
N.ºs 9, 10 e 11: A testemunha CC (que trabalha na R. há mais de 30 anos, como Cozinheira) afirmou peremptoriamente em julgamento que no dia 02/12/2021, quinta-feira, ouviu a Directora Técnica da R., BB, a dizer à A. que esta iria de férias no dia seguinte, 03/12/2021 - confirmando as declarações nesse sentido prestadas em juízo pela A..
E de acordo com a referida testemunha e com as testemunhas DD (que trabalha na R. desde 2005, como Educadora de Infância) e EE (que trabalha na R. desde 1997, como administrativa), a A. não mais foi trabalhar a partir daí, convencida que estava efectivamente em gozo de férias, tendo-se inclusivamente despedido das colegas de trabalho no dia 02/12/2021, dizendo que iria de férias e já não voltaria, porque o contrato de trabalho iria cessar.
Sendo que, segundo foi dito por todas as mencionadas testemunhas e ainda por FF, GG (que trabalha na R. há 35 anos, como ajudante de acção educativa) e HH (que faz parte dos órgãos sociais da R. desde 2014, primeiro como Tesoureira, depois como Presidente da Direcção e actualmente como Presidente do Conselho Fiscal), era a Directora Técnica, BB, que decidia e comunicava verbalmente as férias aos trabalhadores, sendo usual estes gozarem férias antes de cessaram os respectivos contratos de trabalho.
Tendo a testemunha HH acrescentado que a dada altura do mês de Dezembro de 2021, em conversa telefónica com a Directora Técnica da R., BB, pediu-lhe que a A. ajudasse, como habitualmente, nos trabalhos de enfeites de Natal da Junta de Freguesia, tendo-lhe a mesma respondido que não podia ser, porque a A. estava de férias.
Também a testemunha II, marido da A., afirmou que a A. chegou a casa do trabalho, na 5ª feira do dia 02/12/2021, dizendo que no dia seguinte já não iria trabalhar, porque a Dr.ª BB lhe tinha dito que entraria de férias, até ao final do contrato.
De igual modo, a testemunha JJ (amiga da A. desde há 40 anos), disse em julgamento que a A. comentou consigo que a Dr. BB a tinha mandado de férias na quinta-feira, dia 02/12/2021 e que não iria mais trabalhar na R., depois das férias. (…)»
Em face desta motivação, na consideração agora, como nos é imposto, de toda a prova produzida, assim a que foi atendida na motivação transcrita e dessa em parte indicada pela Recorrente – deixando-se consignado que se procedeu à audição dos registos de gravação no que à prova gravada se refere –, desde já diremos que não encontramos fundamentos bastantes para, afastando-se a que foi firmada em 1.ª instância, criarmos convicção diversa, assim a que é pretendida pela Recorrente, pelas razões que melhor esclareceremos de seguida.
Desde logo, importa ter presente que, diversamente do que é referido pela Recorrente, para criar a convicção o Tribunal recorrido não se baseou apenas no que teria resultado do depoimento da testemunha CC confirmando as declarações nesse sentido prestadas em juízo pela Autora, pois que, noutros termos, o que facilmente se extrai da antes citada motivação, se atendeu, para além dessas, ainda, ao que expressamente se disse que teria resultado dos depoimentos das testemunhas DD, EE, FF, GG, HH, II e JJ.
Com o aludido enquadramento, em face de todo esse manancial de prova que expressamente foi mencionado pelo Tribunal como tendo estada na base da formação da sua convicção, não se pode considerar que existam elementos que nos permitam afastar de modo minimamente sustentado a convicção que foi firmada, pois que, não obstante o que possa resultar das declarações prestadas pela testemunha BB em que se suporta a Recorrente, outra prova resultou, em contrário, dos demais depoimentos, como o refere o Tribunal.
Aliás, a posição defendida pela Recorrente no que se refere aos pontos 9.º e 10.º aqui reanalisados só com muita dificuldade se poderia compaginar com o que resultou provado noutros factos provados, que não impugnou no presente recurso, assim os pontos 11.º, 13.º, 16.º, 17.º, 19.º, 20.º e 21.º, dos quais resulta, respetivamente: 11. As trabalhadoras da R. estavam convencidas que a A. estava em gozo de férias. 13. Mesmo depois do dia 03/12/2021, a A. continuou a deslocar-se pelo menos uma ou duas vezes por semana às instalações da R., para levar e/ou recolher o seu neto, que é utente do ATL da R., tendo nessas alturas contacto com colegas de trabalho na R.. 16. No dia 16 de Dezembro de 2021, a A. telefonou para à R., tendo falado com a Directora Técnica, BB, solicitando-lhe o pagamento do subsídio de Natal desse ano. 17. Na altura, não foi dito à A. que estaria a faltar ao trabalho, nem a A. foi questionada a esse respeito. 19. Em meados de Dezembro de 2021, a Directora Técnica da R., BB, telefonou à A., a convidá-la para se deslocar no dia 22/12/2021 às instalações da R., para a entrega de prendas de Natal habitualmente realizada pela R.. 20. No dia 22/12/2021, a A. compareceu nas instalações da R., onde com outros colaboradores e na presença de elementos da Direcção, nomeadamente do seu Presidente, esteve em convívio, tendo sido trocados presentes e recolhidas as prendas de Natal oferecidas pela R.. 21. Pelo menos até ao referido dia 22/12/2021, nunca ninguém da R. questionou a A. sobre a falta de comparência ao trabalho ou a alertou para abandono de trabalho.)
Daí que, tendo sido na consideração da referida diversidade de prova, assim analisada e ponderada criticamente, que o Tribunal recorrido extraiu a sua convicção – ou seja, na consideração da diversidade de versões sobre os factos que resulta de toda essa prova, toda ela, pois (incluído assim também aquela a que alude o Recorrente) –, sempre teremos de ter presente, relembrando-o, que, vigorando neste âmbito o princípio da livre apreciação da prova – este que, por apelo aos ensinamentos de Lebre de Freitas[15], “significa que o julgador deve decidir sobre a matéria de facto da causa segundo a sua íntima convicção, formada no confronto com os vários meios de prova”[16] –, na sua aplicação ao caso, não encontramos afinal fundamento bastante para dizermos que a decisão recorrida não tenha motivado e analisado, de forma ponderada, a globalidade da prova produzida, não padecendo de desconformidade com os elementos probatórios disponíveis, tanto mais que, assim o entendemos, claramente que não resulta infirmada tal decisão na alegação da Recorrente. Assim o dizemos pois que, tendo por base o regime legal aplicável, a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação, tendo de ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância – pois que só assim poderá ficar plenamente assegurado o duplo grau de jurisdição[17] –, muito embora não se trate de um segundo julgamento e sim de uma reponderação, não se basta com a mera alegação de que não se concorda com a decisão proferida em 1.ª instância, exigindo antes da parte processual que pretende usar dessa faculdade, a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efetivamente, no caso, foram produzidos – sem limitar, porém, o segundo grau, ou seja o tribunal de recurso, de sobre tais desconformidades, previamente apontadas pelas partes, se pronunciar, enunciando a sua própria convicção (não estando, assim, limitada por aquela primeira abordagem pois que no processo civil impera o princípio da livre apreciação da prova, artigo 607.º, nº 5 do CPC[18]).
Por decorrência do exposto, sem necessidade de outras considerações, improcede o recurso nesta parte.

3. Dizendo de Direito:
3.1. Introito
Em face do que resulta das conclusões que apresentou, que como antes o dissemos delimitam o objeto do recurso (salvo questões de conhecimento oficioso), a Apelante insurge-se contra o decidido pelo Tribunal a quo, sustentando que a sentença deve ser revogada e substituída por outra que julgue integralmente improcedentes os pedidos formulados pela Autora na petição inicial.
No essencial, refere nomeadamente, como argumentos, o seguinte:
- deferida a alteração da matéria de facto consignada em 9 e 10, os pedidos formulados no sentido da ilicitude do despedimento e, bem assim, o pagamento da indemnização de antiguidade e retribuições vencidas e vincendas desde o despedimento até ao trânsito em julgado da sentença, têm necessariamente de improceder, pois que, tendo a Recorrida comunicado a denúncia do contrato propondo-se prestar o aviso prévio de sessenta dias, tendo solicitado a possibilidade de gozar férias durante o aviso prévio, tal pretensão, no entanto, face à grave situação de calamidade que se vivia na altura, não pôde ser atendida – “não tinha ninguém que, naquele período, pudesse desempenhar as funções destinadas à Autora, tanto mais que, para além do trabalho e preocupação acrescidos pela propagação da doença em si, competia-lhe acautelar situações que não podia prever nem evitar, como ficar com redução de pessoal, caso outros trabalhadores ficassem confinados se se infectassem ou tivessem tido contactos de risco, o que acontecia com muita frequência” –, pelo que, diz, a Recorrida, não obstante aquela decisão, ao ter deixado de comparecer ao trabalho desde o dia 3 de dezembro, não apresentando qualquer justificação para a ausência, incumpriu o disposto nas alíneas b) e c) do art. 128.º e com as consequências previstas no art. 256.º do Código do Trabalho (CT), razão pela qual, ela Ré / recorrente, perante a ausência injustificada da trabalhadora pelo período de 10 dias consecutivos, comunicou a cessação do contrato, por iniciativa da Autora invocando abandono de trabalho, nos termos do art. 403.º do CT;
- mesmo que a impugnação da matéria de facto viesse a improceder, a sentença proferida jamais poderia julgar procedente o pedido formulado pela Autora, sendo aliás totalmente contraditório o pedido de pagamento da indemnização de antiguidade com o pedido de pagamento de retribuições desde o alegado despedimento até ao trânsito da sentença, já que na data da propositura da ação manifesta inequivocamente que não pretende ser reintegrada e, por outro lado, tendo essa denunciado o contrato e comunicado que deixaria de trabalhar para a Ré a partir do dia 7 de janeiro de 2022, sem nunca ter revogado tal denúncia, fica claro que a relação jurídica estabelecida entre as partes terminou, inexoravelmente, naquele dia 7 de janeiro de 2022, pelo que, carece de fundamento serem-lhe pagas as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão – “embora a lei não o preveja expressamente, é perfeitamente admissível que neste caso a ré pudesse apenas ser condenada pelos montantes que efetivamente lhe foram descontados por falta de pré-aviso, solução admitida também no caso do art. 393.º do Cód.Trabalho, pela cessação ilícita do contrato a termo certo ou incerto”, mas, “ainda assim, a procedência do pagamento das prestações vencidas e vincendas quando a autora manifesta ab initio a vontade de não pretender a reintegração, configuraria um abuso do direito (art. 334.º do C.Civil)”;
- em abono da sua tese, com fundamento em jurisprudência que diz em caso semelhante, refere ter sido decidido: “I- O facto extintivo da relação laboral é a declaração de rescisão, funcionando o aviso prévio apenas como um termo suspensivo aposto à denúncia do contrato, determinando a rescisão a cessação do vínculo laboral, de modo diferido no caso de ter havido aviso prévio. II- Em tais casos, os efeitos do contrato mantêm-se enquanto dura ou decorre o prazo de aviso prévio. III- Se nesse período do aviso prévio a entidade patronal proceder ao despedimento sumário do trabalhador, verificar-se-á um despedimento ilícito, face ao qual o trabalhador tem direito apenas ao pagamento da importância correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data do termo da sobrevida do vínculo laboral, uma vez que a extinção dos efeitos do contrato ficou fatalmente diferida pelo tempo do aviso prévio ( e sem direito a indemnização por antiguidade)”.
Defendendo a Apelada o julgado, no que é acompanhada pelo Ministério Público, de seguida procederemos à apreciação das questões que nos são colocadas.

3.2. Da questão da invocada cessação do contrato por abandono do trabalho por parte da Autora
Como expressamente o refere a Recorrente, a sua pretensão, quanto a esta questão, dependeria da necessária procedência do recurso na parte que dirigiu à impugnação da matéria de facto, razão pela qual, não tendo logrado alcançar tal desiderato no presente recurso, nos termos que decidimos anteriormente, carecem, por decorrência, de qualquer suporte, as considerações que faz neste âmbito, tanto mais que, em face da pronúncia constante da sentença a esse propósito, com base na factualidade – que culminou na afirmação de que, por não ter ocorrido abandono do trabalho por parte da Autora, a cessação do contrato de trabalho operada pela Ré com esse fundamento se traduz num despedimento ilícito, por não se subsumir a nenhuma forma de cessação contratual legalmente prevista –, o que se contata é que não avançou, nomeadamente para o caso de não lograr alcançar aquela alteração da matéria de facto por que também pugnou, de dirigir àquela sentença, nessa eventualidade, quanto a esta questão, no que à aplicação do direito diz respeito, qualquer argumento jurídico tendente a infirmar essa aplicação do direito, assim nomeadamente erro na interpretação ou aplicação da lei, no sentido de explicar a razão por que a decisão deveria ter sido outra.
Ora, como é comummente afirmado, impende sobre o recorrente, em sede de recurso, o ónus de invocar, também no domínio da aplicação da lei, os argumentos (jurídicos) que na sua ótica justificam o afastamento dos fundamentos constantes da decisão recorrida para sustentar o modo como interpretou e/ou aplicou a lei, de tal modo que o tribunal superior os possa apreciar, no sentido de lhes dar ou não sustentação – versando o recurso sobre matéria de direito, deve o Recorrente, para além de indicar nas conclusões as normas jurídicas violadas, referir também o sentido que, no seu entender, as normas que constituem o fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas (artigo 639.º, n.º 2, do CPC).
Em face do exposto, improcede o recurso quanto a esta questão.

3.3. Das questões da denúncia do contrato e do despedimento ilícito/consequências decorrentes do despedimento no caso em análise
Na sentença recorrida fez-se constar designadamente o seguinte:
«II. Estando em causa um despedimento ilícito, assiste ao trabalhador o direito a ser indemnizado por todos os danos sofridos, de ordem patrimonial e não patrimonial, bem assim como à reintegração no mesmo estabelecimento da empresa, mantendo a categoria e antiguidade, podendo todavia optar (como no caso sucedeu), até ao termo da discussão em audiência de julgamento e em detrimento da reintegração, por uma indemnização a fixar pelo tribunal entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade (com o limite mínimo correspondente a 3 meses de retribuição base e diuturnidades), atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no art. 381º – cfr. arts. 389º n.º 1, als. a) e b) e 391º, n.ºs 1, 2 e 3.
Tendo ainda direito, a título de compensação, às retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal, com eventual dedução dos montantes das retribuições respeitantes ao período decorrido desde a data do despedimento até 30 dias antes da propositura da acção (caso esta não tenha sido instaurada nos 30 dias subsequentes ao despedimento); das importâncias que aufira com a cessação do contrato e que não receberia, se não fosse o despedimento; e do subsídio de desemprego, que cabe ao empregador entregar à Segurança Social – art. 390º n.ºs 1 e 2, als. a), b) e c).
Defende a R. que com a comunicação de abandono do trabalho se limitou a antecipar a cessação de um contrato já validamente denunciado pela A. com efeitos a partir de 7 de Janeiro de 2022, pelo que entende que não faz sentido a pretensão da A. de ser indemnizada e de receber as retribuições que deixou de auferir desde trinta dias antes da propositura da acção, até ao trânsito em julgado da sentença. Citando em abono do seu ponto de vista, o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10/11/2005.
Sem razão, a nosso ver.
É pacífico que enquanto perdurar o período de aviso prévio, o contrato de trabalho mantém-se em vigor, com o conjunto de direitos e obrigações que dele decorrem para as partes, que não sofrem modificações pelo facto do trabalhador ter anunciado o propósito de pôr termo ao contrato. O que significa que o vínculo pode cessar antes da data prevista para a produção de efeitos da denúncia contratual, nomeadamente por via de despedimento entretanto decidido pela entidade empregadora, que se for ilícito, é gerador do dever de indemnizar[19] [20].
No mesmo sentido, escreveu-se no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 14/01/2008[21] que «(…) o aviso prévio não é mais que um termo suspensivo relativamente à rescisão do contrato, o que significa que durante a sua duração o contrato se encontra em execução, com todos os seus direitos e deveres, para ambas as partes. (…) Mantendo-se durante o período de aviso prévio todos os direitos e deveres de ambas as partes, a recusa da prestação laborativa naquele tempo traduz um despedimento, como em qualquer outro momento, sendo irrelevante a asserção de que se teria tratado de mera dispensa de aviso prévio.».
Com idêntico entendimento, podem ver-se na doutrina os autores citados no mencionado aresto, nomeadamente Carlos Alberto Lourenço Morais Antunes e Amadeu Francisco Ribeiro Guerra[22], de acordo com os quais «(…) Durante o prazo de aviso-prévio o contrato de trabalho continua plenamente em vigor. (…) Daí que, durante o prazo de aviso prévio os direitos e deveres das partes se mantenham integralmente pelo que quaisquer actos lesivos da estabilidade do vínculo contratual reger-se-ão pelos termos gerais da Lei. Assim, se a entidade patronal despedir o trabalhador sem justa causa ou sem processo disciplinar, estando a decorrer o lapso de tempo correspondente ao aviso-prévio, o trabalhador terá direito às indemnizações legais inerentes à nulidade do despedimento. (…)».
Ainda na jurisprudência, sumariou-se no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 31/05/2010[23] que «I- A apresentação da declaração de denúncia do contrato de trabalho com aviso prévio só produz efeitos no final do prazo respectivo, podendo o signatário revogar a declaração de cessação até ao 7.º dia seguinte à data da recepção da carta pela empregadora (artigos 447.º e 449.º do CT, aprovado pela Lei nº 99/03, de 27.08), mantendo-se a relação laboral em vigor, na pendência do aviso prévio, com todos os direitos e obrigações das partes, e, podendo, no decurso do respectivo período, o desenvolvimento do contrato gerar situações anómalas, justificativas do rompimento antecipado do vínculo, a qualquer das partes é permitido pôr-lhe termo com justa causa.
II- Embora o trabalhador tenha manifestado a vontade de denunciar o contrato de trabalho que mantinha com a entidade empregadora, tal manifestação de vontade foi inutilizada por via da cessação ilícita, por iniciativa desta, do mencionado vínculo em data anterior quer àquela em que a aludida declaração de denúncia produziria efeitos quer em data anterior ao termo do prazo para o exercício daquele direito de revogação.
III- Assim, o contrato de trabalho não cessou – nem rigorosamente se pode afirmar que inevitavelmente cessaria, atenta a possibilidade de revogação da declaração de rescisão – por virtude da carta de denúncia emitida pelo trabalhador.
IV- Deste modo, os efeitos da referida declaração de ilicitude não sofrem qualquer restrição pelo facto de ter existido a comunicação de denúncia, havendo de aplicarse, na sua plenitude, o disposto nos artigos 437.º e 439.º do CT.».
Nele se transcrevendo o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13/01/2010, na parte em que se escreveu que «Como se observou no Acórdão deste Supremo de 24 de Maio de 2006 (Documento n.º SJ200605240003694, em www.dgsi.pt), a apresentação da declaração de rescisão contratual com aviso prévio só produz efeitos no final do prazo respectivo, podendo o signatário revogar a declaração de rescisão até ao 2.º dia útil seguinte à data da produção dos seus efeitos (artigos 38.º, n.º 1 e 39.º da LCCT e 2,º, n.º 1, da Lei n.º 38/96, de 31 de Agosto), mantendo-se a relação laboral em vigor, na pendência do aviso prévio, com todos os direitos e obrigações das partes, e, podendo, no decurso do respectivo período, o desenvolvimento do contrato gerar situações anómalas, justificativas do rompimento antecipado do vínculo, a qualquer das partes é permitido pôr-lhe termo com justa causa.
No caso, o contrato cessou por decisão da entidade empregadora, antes de decorrido o prazo de aviso prévio, desse modo se inutilizando o efeito pretendido pelo Autor ao manifestar a sua vontade de o rescindir, efeito cuja produção, aliás, não fora a extinção do contrato por decisão da empregadora, sempre poderia, durante o referido prazo e até ao segundo dia útil posterior ao seu termo final, por manifestação de vontade unilateral do Autor ser impedida, manifestação esta que deixou de fazer sentido, face à extinção da relação laboral exclusivamente imputável à empregadora.
Quer isto dizer que, contrariamente ao que pretende a Ré, o contrato não cessou – nem rigorosamente se pode afirmar que inevitavelmente cessaria –, por virtude da carta de rescisão, em 7 de Outubro de 2003, tendo, isso sim, terminado em 28 de Agosto do mesmo ano, data em que o Autor recebeu a comunicação do despedimento e a partir da qual cessaram os deveres e direitos recíprocos das partes emergentes da sua vigência, neles se compreendendo os implicados na carta de rescisão.
Deste modo, a posterior declaração de ilicitude do despedimento não pode ter como consequência a repristinação da eficácia da carta de rescisão, em termos de se ter por verificada a cessação do contrato na data nela prevista e, por conseguinte, os efeitos da referida declaração de ilicitude não sofrem qualquer restrição pelo facto de ter existido a comunicação de rescisão, havendo de aplicar-se, na sua plenitude, o disposto no artigo 13.º da LCCT, com o consequente reconhecimento, como se fez no acórdão recorrido, do direito do Autor a receber as retribuições vencidas até à data da decisão final.».
Apesar do se reportarem a regimes legais pretéritos, previstos no Decreto-Lei n.º 49408, de 24 de Novembro de 1969 (“LCT”) e no Cód. do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, as considerações expendidas nos referidos arestos mantêm actualidade e pertinência, à luz do actual Cód. do Trabalho.
A diferença que existe entre a situação de facto que estava subjacente aos mencionados acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 31/05/2010 e do Supremo Tribunal de Justiça de 13/01/2010 e de 24/05/2006, e a que está em apreciação nos presentes autos, prende-se fundamentalmente com a circunstância de naqueles, aquando do despedimento, ainda não ter decorrido o prazo para exercício pelo trabalhador da faculdade de revogar a comunicação de denúncia contratual, ao passo que nos presentes autos, quando foi comunicada à A. o abandono do trabalho, já tinham decorrido os 7 dias a que alude o art. 402º n.º 1.
Porém, o que se defende em tais arestos é que o despedimento ilícito operado na pendência do aviso prévio da denúncia contratual por parte do trabalhador, não só extingue o vínculo laboral, como faz cessar os efeitos dessa denúncia, inutilizando-a, o que significa que não pode ser repristinada para com base nela se considerar que as retribuições intercalares ou de tramitação não podem ir além da data em que a denúncia produziria efeitos, se não fosse o despedimento entretanto ocorrido.
Reconhece-se que tal solução pode ser bastante penalizadora para o empregador, sobretudo em casos - como o vertente - em que o despedimento foi consumado pouco tempo antes de operar uma denúncia contratual já comunicada pelo trabalhador.
Não obstante, qualquer decisão do empregador que possa vir a redundar em despedimento ilícito constitui um risco por este assumido, cabendo-lhe ponderar se vale ou não a pena corrê-lo, para mais quando o contrato de trabalho está a escassos dias de terminar.
Avançando para a quantificação da indemnização, tendo em conta o baixo valor da retribuição auferida pela A., o grau mediano de ilicitude do despedimento e a tristeza, desânimo e angustia sofridas pela A. em resultado da comunicação do pretenso abandono de trabalho, entende-se fixá-la em 30 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano ou fracção de antiguidade, o que significa que a A. tem direito a esse título, no mínimo, à peticionada indemnização de €4.485,00.
Quanto às denominadas retribuições intercalares ou de tramitação, uma vez que o despedimento ocorreu em 24/12/2021 e a acção foi proposta mais de 30 dias depois, em 27/01/2022 (cfr. fls. 2 v.º), são devidas as retribuições vencidas desde 27/12/2021 até ao trânsito em julgado da sentença.
Importa, porém, ter em conta que caso a A. tenha recebido ou venha a receber subsídio de desemprego, em razão do despedimento em apreço (o que se desconhece), os respectivos montantes terão que ser abatidos ao valor das retribuições intercalares, cabendo à R. entregá-los à Segurança Social.
Razão pela qual se relega para ulterior liquidação o crédito da A. relativamente a retribuições intercalares, desde 27/12/2021, até ao momento em que a condenação se torne definitiva, nos termos do disposto nos arts. 609º n.º 2 e 358º n.º 2 e segs. do Cód. de Processo Civil, a razão de €690,00 por mês, como peticionado. (…)»
Tendo necessariamente por base o disposto na lei, assim o quadro normativo indicado na sentença recorrida e aplicação que nessa se fez das normas nessa indicadas, bem como, ainda, as demais normas legais indicadas pela Recorrente e a interpretação por que pugna, cumprindo-nos pronúncia, desde já avançaremos que, não obstante admitirmos que a questão colocada possa merecer soluções não propriamente coincidentes, baseadas nomeadamente em interpretações das próprias normas que podem/devem ser chamadas, no dizer do Direito, à aplicação, sejam as previstas no Código Civil (CC), sejam as que constam do Código do Trabalho (CT/2009), no entanto, como ressalva do respeito devido, não nos revemos na solução a que se chegou na sentença. De facto, na consideração quer dos argumentos invocados pelo Tribunal recorrido quer também dos que o foram pela Recorrente e Recorrida, consideramos que, dentro dos quadros normativos e princípios de direito aplicáveis, a solução mais adequada não será a que se afirmou na sentença, para o que, diremos desde já, muito embora melhor o esclareceremos mais tarde, não é alheia a circunstância de a Jurisprudência que foi citada na sentença e que aí se considerou que daria suporte ao entendimento aí sufragado partir afinal de um pressuposto, de direito e de facto, diverso daquele que se verifica no caso que analisamos, sendo que se trata de aspeto que se assume como determinante, esse relacionado com a circunstância, que não ocorre no caso que apreciamos, de, estando a decorrer o prazo do aviso prévio dado pelo trabalhador na carta de denúncia do contrato quando ocorre o ato do empregador configurado como de despedimento ilícito, de ainda não ter decorrido o prazo previsto na lei para o denominado arrependimento / revogação da denúncia – atualmente previsto no n.º 1 do artigo 402.º, do CT/2009: “O trabalhador pode revogar a denúncia do contrato, caso a sua assinatura constante desta não tenha reconhecimento notarial presencial, até ao sétimo dia seguinte à data em que a mesma chegar ao poder do empregador, mediante comunicação escrita dirigida a este.”
A nossa posição tem subjacente os argumentos seguintes:
Em primeiro lugar, começaremos por realçar, chamando-se à discussão o próprio regime previsto no CC, a circunstância de resultar desse que a perfeição da declaração de vontade (negocial), válida e eficazmente expressa pelo emitente, que tenha um destinatário, se torna eficaz logo que a mesma chegue ao poder deste – diversamente do que ocorre nas declarações não recetivas que se tornam eficazes logo que a vontade se manifeste na forma adequada. A opção da nossa lei quanto ao momento da eficácia da declaração, assim pela doutrina da receção nas palavras de Carlos A. Mota Pinto[24], ou por combinar a teoria da receção com a do conhecimento como refere Heinrich Ewald Hörster[25] [26], resulta expressamente do que se dispõe no artigo 224.º do CC[27], esclarecendo porém este último Autor[28], referindo-se à conjugação dos dois critérios (da chegada ao poder e do conhecimento), que “no caso da verificação da chegada ao poder não se exige conhecimento efectivo por parte do destinatário”, por partir a lei “da situação regular e normal de que, com a chegada ao poder, o destinatário (o declaratário) está em condições de tomar conhecimento e que ele toma conhecimento”, determinando-se “em conformidade com as concepções reinantes no tráfico jurídico para os negócios em causa” a questão de “saber se a chegada ao poder conduz realmente a uma situação, suposta na lei, que permite o conhecimento efectivo”[29] [30]. Há que salientar, ainda, sem prejuízo de assumir também relevância (para além do mais que agora não importa) o momento da sua eficácia para aferir se foi feita em tempo ou não[31], que na celebração de contratos a declaração que chegou ao poder do destinatário é em princípio irrevogável, como resulta do n.º 1 do artigo 230.º do CC, aí se excluindo os casos em que o destinatário da declaração tenha recebido, antes ou pelo menos juntamente com essa, a retratação da proposta, ou se desta retratação tenha tido conhecimento por outros meios (n.º 2). Ainda quanto ao regime da eficácia da declaração que resultará do CC, ressalvando-se naturalmente a circunstância da nossa análise se circunscrever ao que ao caso decidindo possa relevar, importa esclarecer, ainda, que, afirmando-se é certo do n.º 2 do artigo 226.º do CC a ineficácia da declaração nos casos em que o declarante tenha perdido o poder de disposição do direito antes de o destinatário não receber ou não tiver conhecimento da declaração, porém, como elucidam porém Pires de Lima e Antunes Varela[32], “o artigo trata da eficácia da declaração e não do problema da sua validade, porque esta mede-se pela situação existente no momento em que a declaração é emitida”, como ainda, também, que tal ineficácia se refere, naturalmente, apenas ao direito cujo poder de disposição se perdeu – e não já, se for esse o caso, a qualquer outro direito que possa também porventura resultar da circunstância de ter sido emitida a declaração, com aquele específico conteúdo, questão que melhor veremos infra.
Visto antes, ainda que genericamente, o regime estabelecido no CC sobre a eficácia da declaração, teremos no entanto, porém, de chamar necessariamente à discussão e apreciação o que resulte expressamente da lei sobre os direitos que no caso se discutem, ou seja, porque no âmbito laboral, o que possa resultar do CT/2009, assim a respeito dos direitos que, de acordo com esse, assistam ao empregador e ao trabalhador, no caso específico da vigência de um contrato de trabalho, pois que as regras da eficácia da declaração e da sua relevância, sobre as quais nos pronunciámos anteriormente, resultantes do CC, não podem deixar de ter presente as normas daquele Código, algumas delas aliás imperativas.
Assim, neste âmbito, centrada apenas a análise no que importa à nossa apreciação, prevendo-se expressamente entre as modalidades de cessação do contrato de trabalho previstas no artigo 340.º do CT a denúncia pelo trabalhador (alínea h) do normativo), resultando depois do n.º 1 do seu artigo 400.º que “O trabalhador pode denunciar o contrato independentemente de justa causa, mediante comunicação ao empregador, por escrito, com a antecedência mínima de 30 ou 60 dias, conforme tenha, respectivamente, até dois anos ou mais de dois anos de antiguidade”[33], estabelece-se, porém, no n.º1 do artigo 402.º, já antes citado, nos caos e moldes nesse previstos, que o trabalhador pode revogar a denúncia do contrato até ao sétimo dia seguinte à data em que a mesma chegar ao poder do empregador.
Ou seja, resulta dos citados normativos que, querendo denunciar o contrato, o trabalhador deverá comunicar essa sua intenção ao empregador, assumindo-se assim tal comunicação como pressuposto do exercício desse direito, pelo que, se assim é, chamando então à discussão o regime a que aludimos anteriormente sobre a declaração e sua eficácia, estando em causa sem dúvidas uma declaração negocial recipienda, essa torna-se em princípio eficaz, como então se referiu, logo que chega ao poder do seu destinatário ou desse é conhecida (n.º 1 do artigo 224.º do CC). Assim, no caso que se aprecia, a declaração da Autora / trabalhadora (formalizada por escrito) de denúncia do contrato e consequente cessação desse findo o período do aviso prévio, que chegou ao conhecimento da Ré, tornou-se então eficaz para produzir os seu efeitos, sem prejuízo, porém, como melhor o veremos, do que possa resultar da possibilidade de revogação da denúncia, mas dentro do prazo de que o trabalhador dispõe, nos termos antes mencionados. Dito de outro modo, não nos merecendo reserva a afirmação de que, porque ainda em vigor nesse momento o contrato de trabalho, os efeitos deste se mantêm então naturalmente enquanto decorrer o prazo de aviso prévio, no entanto, porém, tal como se extrai dos normativos antes mencionados, quanto ao regime previsto do CT/2009 a respeito da denúncia do contrato, importa assinalar e reconhecer que esse se afasta da regra geral prevista no CC no que se refere à admissibilidade da revogação da declaração, pois que se neste último caso a declaração que chegou ao poder do destinatário é em princípio irrevogável, como resulta do n.º 1 do artigo 230.º do CC – aí se excluindo os casos em que o destinatário da declaração tenha recebido, antes ou pelo menos juntamente com essa, a retratação da proposta, ou se desta retratação tenha tido conhecimento por outros meios (n.º 2) –, já assim não ocorre no CT/2009, na medida em que, nos termos do n.º 1 do artigo 402.º, como antes o referimos, o trabalhador pode revogar a denúncia do contrato até ao sétimo dia seguinte à data em que a mesma chegar ao poder do empregador.
Não obstante o que acabámos de referir sobre a possibilidade da sua revogação, importará sempre sinalizar, a respeito da denúncia do contrato pelo trabalhador, que se trata afinal de um caso específico de cessação do contrato em que prevalece o princípio da denúncia livre ou da liberdade de desvinculação – pois que o trabalhador não pode ser forçado a continuar a prestar trabalho contra a sua vontade –, independentemente aliás do modo como tal vontade se tenha manifestado. Só este entendimento se coaduna com o princípio da liberdade de trabalho (artigo 47.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa), que se projeta na faculdade de o trabalhador, livremente e a todo o momento, fazer cessar a relação laboral[34].
O facto extintivo da relação laboral, resultando aqui, pois, da própria declaração de rescisão emitida pelo trabalhador, no entanto, importa esclarecê-lo, a mesma só venha a assumir a sua plena eficácia, para a produção todos os seus efeitos, no momento em que decorra o prazo previsto na lei para a sua revogação pelo trabalhador – como resulta do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de outubro de 2017[35], constituindo o direito de revogação da denúncia um direito potestativo do trabalhador, a denúncia só se torna plenamente eficaz decorrido “o prazo de arrependimento” –, do que decorre, por direta consequência, que, depois de decorrido esse prazo, se torna então como plenamente eficaz enquanto extintiva da relação laboral existente, muito embora este efeito extintivo apenas opere, sendo esse o caso, depois de decorrido o período do aviso prévio – daí que este seja visto como um termo suspensivo aposto à denúncia do contrato[36]. Ou seja, a extinção dos efeitos do contrato revogado, pode assim ser imediata ou diferida, sendo que, ocorrendo este último caso, tratando-se assim de rescisão com prazo de aviso prévio, relembrando-se que está em causa, como se disse, o exercício livre pelo trabalhador desse direito, à sua eficácia não poderá ser aposta, impedindo-a, qualquer posição isolada do empregador, sendo assim absolutamente indiferente a posição que este venha a assumir, nomeadamente, no sentido da sua aceitação ou não, pois que, independentemente da sua vontade, o contrato cessará necessariamente os seus efeitos decorrido que esteja o prazo do aviso prévio.
Em face precisamente do referido regime, teremos então de distinguir, diversamente do que o acabou por o entender o Tribunal recorrido, os casos em que ainda não tenha decorrido o prazo de revogação antes de se verificar o ato do empregador que consubstancie nomeadamente um despedimento tido como ilícito, daqueles em que, noutros teremos, como afinal acontece no caso que se analisa, esse prazo de revogação já havia decorrido. É que, se neste último caso, precisamente porque veio a ocorrer o despedimento antes de decorrer o prazo de revogação da denúncia, impedindo-se assim que o trabalhador pudesse exercer esta possibilidade livre que lhe assistia, porque ainda em tempo, aquele ato de despedimento veio a verificar-se num momento em que, como antes o vimos, a denúncia não se apresentava rodeada da sua plena eficácia, razão pela qual, em tal situação, não tenhamos propriamente dúvidas em acompanharmos as razões e fundamentos, como ainda a solução, sufragados nos Arestos que são citados na sentença, assim os Acórdãos desta Secção e Relação de 31 de maio de 2010 e do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de janeiro de 2010 – veja-se que, como se extrai do sumário do primeiro, fator determinante para o entendimento nesse sufragado foi precisamente o de o despedimento ter ocorrido antes da data em que se completaria o prazo do exercício do direito à revogação da denúncia. Porém, já diversamente, nos casos em que, como afinal se verifica na situação que se analisa, esse prazo de revogação já tenha decorrido, a solução não poderá ser a mesma em relação àquela que antes se mencionou, pois que, nestes casos, já se havia tornado, antes do momento em que ocorre o despedimento, plenamente eficaz a denúncia do trabalhador, como o dissemos por si só bastante para fazer operar a extinção da relação laboral existente, sendo que, a circunstância de este efeito extintivo apenas vir a operar, produzindo-se assim apenas nesse momento o seu efeito, sendo esse o caso, depois de decorrido o período do aviso prévio – daí que este seja visto como um termo suspensivo aposto à denúncia do contrato[37] –, tal não se pode confundir com o momento em que se assumiu a declaração de denúncia com a natureza plena de validade e eficácia. Daí que, aceitando-se que possa resultar daqueles Arestos, como dito na sentença, que “o despedimento ilícito operado na pendência do aviso prévio da denúncia contratual por parte do trabalhador, não só extingue o vínculo laboral, como faz cessar os efeitos dessa denúncia, inutilizando-a, o que significa que não pode ser repristinada”, no entanto, porém, repondo o rigor das coisas, importa dizer que tal afirmação e conclusão apenas encontram nesses mesmos arestos adequado suporte, pois que foram esses que aí foram considerados, nos casos em que o ato de despedimento ilícito da entidade patronal ocorra antes de decorrido o prazo de revogação da denúncia pelo trabalhador. Na verdade, permita-se a insistência neste aspeto essencial, podendo a extinção dos efeitos do contrato denunciado ser imediata ou diferida, ocorrendo este último caso, tratando-se assim de rescisão com prazo de aviso prévio, relembrando-se que está em causa, como se disse, o exercício livre pelo trabalhador desse direito, como também sendo esse o caso o de revogar dentro de determinado prazo essa denúncia, decorrido este prazo à eficácia da denúncia será absolutamente alheia a posição que venha a assumir o empregador, pois que, independentemente desta, o contrato sempre cessaria necessariamente os seus efeitos decorrido que esteja o prazo do aviso prévio[38].
Precisamente porque ser assim, então, nestes casos – em que se verifique, durante o período do aviso prévio, mas já depois de decorrido o prazo de revogação da denúncia pelo trabalhador, ou seja, já num momento em que o trabalhador já não possa exercer essa revogação, um qualquer ato por parte do empregador que possa consubstanciar-se como despedimento ilícito, como afinal se tratou no caso que analisamos –, todos e quaisquer direitos que porventura possam decorrer legalmente da ocorrência de um despedimento ilícito, havendo que se atender necessariamente, porque prévio, ao que resulta em termos de efeitos da denúncia do contrato já operada e eficaz pelo trabalhador, terão de conformar-se também com os efeitos dessa denúncia, assim, seja quanto ao que poderia decorrer do período em que perdurou o contrato até ao momento em que foi praticado tal ato de despedimento ilícito ou quanto ao período em que por sua direta decorrência ficará então afetada a vigência do contrato, tendo aqui desde logo como limite, pois, o termo da sobrevida do vínculo, uma vez que, como já resulta do que antes referimos, mas citando-se agora o Acórdão da Relação de Coimbra de 10 de novembro de 2005[39], “a extinção dos efeitos do contrato ficou fatalmente diferida pelo tempo do aviso prévio”. Dito de outro modo, tal ato do empregador, ainda que sendo configurando como de despedimento ilícito, precisamente por decorrência do facto de já se ter tornado plenamente eficaz a denúncia do contrato antes operada pelo trabalhador em termos de fazer cessar o vínculo, no caso decorrido o prazo do aviso prévio, apenas afeta, afinal, o período que decorreria entre a data daquele despedimento e aquela em que se completaria este período de aviso prévio, o que necessariamente terá de assumir relevância para efeitos de não aplicação em pleno do regime em geral previsto para o despedimento ilícito, assim desde logo a respeito da reintegração do trabalhador prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 389.º (e, por decorrência, porque ligada a essa, a indemnização em substituição de reintegração a pedido do trabalhador, prevista no artigo 391.º), como ainda, do mesmo modo, sobre as designadas retribuições intercalares, estas a que se alude no n.º 1 do artigo 390.º – “o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento” –, todos do CT/2009, pois que, por decorrência direita dos efeitos que necessariamente sempre decorreriam da obrigatória extinção do vínculo laboral na data em que findaria o período do aviso prévio por denúncia eficaz e operante do trabalhador, aqueles direitos terão de limitar-se, em conformidade, mal se compreendendo que, nestas circunstâncias, o trabalhador pudesse vir a obter, designadamente, vantagens patrimoniais que apenas lhe seriam legítimas em face da lei caso não tivesse, livre e validamente, denunciado o contrato.
É aliás essa adequação, assim ao período em que vigoraria o contrato, que levaram o legislador a estabelecer, assim no n.º 2 do artigo 393.º do Código, regras especiais relativas a contrato de trabalho a termo (“Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado: a) No pagamento de indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais, que não deve ser inferior às retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde o despedimento até ao termo certo ou incerto do contrato, ou até ao trânsito em julgado da decisão judicial, se aquele termo ocorrer posteriormente; b) Caso o termo ocorra depois do trânsito em julgado da decisão judicial, na reintegração do trabalhador, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade”), regras essas que, sendo diversas das previstas para os contratos sem termo, estabelecem que, nesses casos, “a indemnização devida pela ilicitude do despedimento no âmbito do contrato de trabalho a termo certo não poderá ser inferior às retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde o despedimento até ao termo certo do contrato [no caso do trânsito em julgado da decisão ocorrer em momento posterior a tal termo], sendo, tal indemnização mínima, devida independentemente dos prejuízos que o trabalhador haja, ou não, tido, não sendo aplicáveis os descontos previstos no art. 390º, nº 2, do CT”[40].
De resto, acrescente-se, num caso como o analisado, em que como o dissemos a declaração de denúncia do contrato já se tornou plenamente eficaz para produzir os seus efeitos, a entender-se, como na sentença recorrida, que o despedimento ilícito operado na pendência do aviso prévio da denúncia contratual por parte do trabalhador “faz cessar os efeitos dessa denúncia, inutilizando-a, o que significa que não pode ser repristinada para com base nela se considerar que as retribuições intercalares ou de tramitação não podem ir além da data em que a denúncia produziria efeitos, se não fosse o despedimento entretanto ocorrido”, para além de estar a esquecer-se que no caso a denúncia operada pela Autora já se tornou afinal plenamente – repetindo-se o que dissemos antes, por apelo ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de outubro de 2017, constituindo o direito de revogação da denúncia um direito potestativo do trabalhador, a denúncia só se torna plenamente eficaz decorrido “o prazo de arrependimento” –, sempre seria afinal de questionar, então, a aceitar-se tal entendimento, levando ao limite as suas consequências, se não seria também de considerar que o trabalhador / no caso a Autora teria mesmo o direito a peticionar na ação judicial que viesse a interpor a sua reintegração, o que, na consideração de que antes manifestara afinal comportamento e intenção diversa (ao ter denunciado o contrato sem ter revogado no prazo legal tal denúncia, deixando que a mesma assumisse a sua eficácia plena), sempre levaria a que tivesse de ser equacionada, como o invoca a Recorrente, a questão do abuso do direito, na modalidade de venire contra factum proprium.
Só com dificuldade se compreenderia, assim o consideramos, num caso em que, como no que se aprecia, o despedimento do empregador apenas afetou afinal a vigência do contrato nos dias que restavam para se completar o período do aviso prévio (por decorrência de denúncia operada livremente pelo trabalhador), que fosse aplicado critério diverso do que antes afirmámos, sendo antes de considerar, em face precisamente ao regime que resulta dos normativos aplicáveis, que sempre se imporá, até por ser essa em geral a intenção do legislador, utilizar um critério que vise repor o trabalhador na situação que teria caso não tivesse ocorrido o seu despedimento – como refere Monteiro Fernandes[41], é traço comum das modalidades de despedimento “o conjunto dos efeitos da declaração judicial da ilegalidade (por defeito de processo ou por falta de fundamento) do acto de ruptura do vínculo pelo empregador”, efeitos esses que “são indicados pelo art. 389.º CT e correspondem ao tratamento normal da ineficácia do negócio jurídico (art. 289º/1 CCiv.): recomposição do estado de coisas que se teria verificado sem a prática do acto” –, pelo que, aplicando-o ao caso, tal objetivo consubstanciar-se-á, mas apenas, na necessária consideração do período de vigência do contrato entre a data desse despedimento e aquela em que cessaria a relação por efeitos da denúncia. Assim, sendo verdade que em tese como efeito direto da ilicitude do despedimento o trabalhador tenha direito, por regra, ao pagamento da importância correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data da sentença (com as deduções aí previstas), bem como à reintegração no seu posto de trabalho ou, em opção, a sua substituição por uma indemnização de antiguidade, no entanto, em casos como o analisado, precisamente por decorrência direta dos efeitos que decorreriam da denúncia já plenamente válida e eficaz, a que importa atender como antes dito, o vencimento dos previstos direitos consequentes ao despedimento ilícito terão de ter como limite o termo da sobrevida do vínculo, uma vez que, como também já se disse, a extinção dos efeitos do contrato ficou fatalmente diferida pelo tempo do aviso prévio, do que decorre, pois, que sequer poderia operar, então, o direito à reintegração, nestas circunstâncias e, não sendo esse assim exequível, a direito alternativo à indemnização de antiguidade fica necessariamente afastado – como se refere no Acórdão da Relação de Coimbra de 10 de novembro de 2005, antes mencionado, se rescindira já o vínculo, de moto próprio, aguardando apenas o decurso do concedido prazo de aviso prévio, “seria absurdo, no mínimo, condenar a R. a reintegrá-lo” e, “não sendo exequível a reintegração, o direito alternativo à indemnização de antiguidade fica necessariamente obliterado”.
Em face do exposto, ao não ser atendido o regime que se referiu anteriormente, como afinal o não foi na sentença recorrida, tal traduz-se, com salvaguarda do devido respeito, como efetiva desconsideração, que temos por injustificada, porque carecida de adequada sustentação na lei (contrariando-a mesmo, aliás), dos necessários efeitos que terão de decorrer, legalmente, do ato de denúncia do contrato operado pelo trabalhador, plenamente eficaz, porque já decorrido o prazo em que poderia revogar tal denúncia.
Assiste, pois, desde logo, razão à Recorrente quando se insurge contra a sua condenação, constante da alínea a) do dispositivo da sentença, referente à quantia de €4.485,00, a título de indemnização pela ilicitude do despedimento, porque não devida no caso, como lhe assiste também razão no que se refere às retribuições que a Autora deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão, sustentando, o que temos por ajustado, que, porque a relação jurídica estabelecida entre as partes terminaria, inexoravelmente, no dia 7 de janeiro de 2022, pois que, como antes o concluímos, tal circunstância terá de ser efetivamente considerada, do que decorre, porém, nos termos também antes ditos, que sempre decorrerá para a Autora o direito a receber, mas apenas, a remuneração que auferiria até essa referida data – carecendo de qualquer fundamento, até porque de verificação posterior e não contende com tal condenação, o argumento da Recorrente de que, a Autora tenha manifestado ab initio a vontade de não pretender a reintegração, para invocar o abuso do direito (artigo 334.º do CC) –, do que decorre, por consequência, que a sentença recorrida terá de ser revogada, no que se refere à alínea b) do seu dispositivo, sendo neste caso substituída no presente acórdão pela condenação da Ré a pagar a remuneração referente a esse período, ou seja um total ilíquido de 13 dias, o que se traduz na quantia ilíquida de €299,00 – €690 (€669 + €21): 30 x 13.
Por último, referente à alínea c) do dispositivo, a condenação aí constante terá de manter-se, desde logo por decorrência da improcedência do recurso quanto à questão do pretenso abandono pela Autora, na consideração, ainda, de que outro fundamento foi invocado pela Recorrente nesse âmbito, não havendo assim fundamento para não mantermos tal condenação, pois que, sendo referente à quantia que se considerou na sentença, depois de deduzida a quantia de €501,81 correspondentes aos 16 dias úteis de férias gozados pela Autora, como sendo o saldo, assim de €326,19, que resta do valor que foi descontado, de €828,00, no recibo de vencimento referente ao mês de dezembro de 2021, de fecho de contas, a título de “Pré-aviso em falta”, em face da manutenção da sentença, razão alguma se verifica para o seu afastamento.
Nos termos expostos, procede parcialmente o presente recurso, com a consequente alteração da sentença, nos termos antes afirmados.
As custas da ação e deste recurso impendem sobre as partes em proporção de vencimento / decaimento.
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Sumário – a que alude o artigo 663º, nº 7, do CPC:
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V - DECISÃO
Acordam os juízes que integram a Secção social do Tribunal da Relação do Porto, na parcial procedência do recurso, mantendo essa no mais, em revogar a sentença recorrida quanto à condenação constante da alínea a) do seu dispositivo, que se elimina, alterando ainda as suas alíneas b) e d), pelo presente acórdão, em que se condena, na primeira, a Ré a pagar à Autora, referente a remuneração em falta, a quantia ilíquida de €299,00 e, na segunda, nos juros de mora à taxa legal sobre as referidas quantias, até efetivo e integral pagamento.

Custas da ação e deste recurso por ambas as partes, em proporção de vencimento/decaimento.
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Porto, 27 de fevereiro de 2023
(acórdão assinado digitalmente)
Nelson Fernandes
Teresa Sá Lopes
António Luís Carvalhão
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[1] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 1985, pág. 387
[2] In Comentário ao Código de Processo Civil, II, pág. 507
[3] No mesmo sentido, com idêntica relevância, Manuel de Andrade (in Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág. 183) quando escreveu: “Mas se a nulidade está coberta por uma decisão judicial (despacho) que ordenou, autorizou ou sancionou o respectivo acto ou omissão, em tal caso o meio próprio para a arguir não é a simples reclamação, mas o recurso competente a deduzir (interpor) e tramitar como qualquer outro do mesmo tipo. É a doutrina tradicional, condensada na máxima: dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se”.
Ainda:
- Antunes Varela (in Manual de Processo Civil, 1985, pág. 393), referindo que “Se, entretanto, o acto afectado de nulidade for coberto por qualquer decisão judicial, o meio próprio de o impugnar deixará de ser a reclamação (para o próprio juiz) e passará a ser o recurso da decisão”;
- Anselmo de Castro (in Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, Almedina, 1982, pág. 134): “Tradicionalmente entende-se que a arguição da nulidade só é admissível quando a infracção processual não está, ainda que indirecta ou implicitamente, coberta por qualquer despacho judicial; se há um despacho que pressuponha o acto viciado, diz-se, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade cometida, não é a arguição ou reclamação por nulidade, mas a impugnação do respectivo despacho pela interposição do competente recurso, conforme a máxima tradicional – das nulidades reclama-se, dos despachos recorre-se. A reacção contra a ilegalidade volver-se-á então contra o próprio despacho do juiz; ora, o meio idóneo para atacar ou impugnar despachos ilegais é a interposição do respectivo recurso (art.º 677.º, n.º 1), por força do princípio legal de que, proferida a decisão, fica esgotado o poder jurisdicional (art.º 666.º)”. Porém, depois de algumas reticências relativamente à aplicação do disposto no art.º 666.º a todas as decisões, acrescentou que aquela construção “não tem sequer sentido quanto àquelas nulidades de que o juiz não pode conhecer oficiosamente (todas as nulidades secundárias e as principais a partir do saneador”. Veja-se, o Ac. desta Relação e Secção de 10 de Outubro de 2016, Relator Desembargador Jerónimo Freitas, in www.dgsi.pt.
[4] Que igualmente procede à remissão para as respectivas disposições legais: a ineptidão da petição inicial (art.º 186.º e 187º); a falta de citação, seja do réu seja do Ministério Público, quando deva intervir como parte principal (art.º 188.º); a preterição de formalidades essenciais à citação (art.º 191.º); o erro na forma de processo (art.º 193.º); e, a falta de vista ou exame do Ministério Público, quando a lei exija a sua intervenção como parte acessória (art.º 194º)
[5] Nas palavras de Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora (in Manual de Processo Civil, 1985, pág. 391), “Serão relevantes, segundo o critério estabelecido, quando a lei especialmente o declare ou quando possam influir no exame ou na decisão da causa”
[6] art.ºs 196.º e 197.º n.º1, do CPC
[7] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, “Código de Processo Civil Anotado”, 3ª ed., Coimbra Ed., 2014, pág. 9.
[8] Porém, como referem Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, “Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil”, I, 2013, Almedina, 2012, pág. 50, não se trata aqui de uma atividade como que “assistencial à parte carenciada”, destinando-se antes, apenas, citando, “a sinalizar caminhos para a descoberta a verdade, de acordo com a estratégia heurística servida pelo processo, mantendo-se desimpedidas as vias processuais, bem como a manter a parte informada sobre os desenvolvimentos processuais que posam influenciar a sua estratégia processual, no sentido de pôr fim ao processo o mais adequada e rapidamente possível”.
[9] Fernando Pereira Rodrigues, “O Novo Processo Civil. Os Princípios Estruturantes”, 2013, Almedina, pág. 49
[10] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, ob. Cit., pág. 10.
[11] Que igualmente procede à remissão para as respectivas disposições legais: a ineptidão da petição inicial (art.º 186.º e 187º); a falta de citação, seja do réu seja do Ministério Público, quando deva intervir como parte principal (art.º 188.º); a preterição de formalidades essenciais à citação (art.º 191.º); o erro na forma de processo (art.º 193.º); e, a falta de vista ou exame do Ministério Público, quando a lei exija a sua intervenção como parte acessória (art.º 194º)
[12] Sendo factos essenciais os que fundamentam o direito invocado pelo autor, o pedido reconvencional deduzido pelo réu ou as exceções por este apresentadas, entende-se por factos instrumentais aqueles “cuja função é apenas probatória e não substanciam ou preenchem as pretensões jurídico-materiais do autor ou réu – da prova dos factos instrumentais infere-se a existência dos factos principais, pois, eles (facos instrumentais) não constituem condicionantes diretas da decisão (da sua prova pode inferir-se a prova dos factos principais) e factos concretizadores aqueles que densificam e pormenorizam as ocorrências da vida real exposta pelas partes e complementares os que servem para aditar ou completar essas mesmas ocorrências.
[13] “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”
Também na instância recursiva, nesse caso por referência às conclusões da alegação do recorrente, delimitativas do objeto do recurso, conforme resulta dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do mesmo diploma legal.
[14] Relator Conselheiro Oliveira Mendes, in www.dgsi.pt.
[15] em “Introdução ao Processo Civil, 3.ª edição, p. 196
[16] Acrescentando ainda: “Compreende-se como este princípio se situa na linha lógica dos anteriores: é porque há imediação, oralidade e concentração que ao julgador cabe, depois da prova produzida, tirar as suas conclusões, em conformidade com as impressões recém colhidas e com a convicção que através delas se foi gerando no seu espírito, de acordo com as máximas da experiência que forem aplicáveis”
[17] cf. neste sentido o Ac. STJ de 24/09/2013, in www.dgsi.pt
[18] cf. Ac. STJ de 28 de Maio de 2009, in www.dgsi.pt
[19] Vd. nesse sentido, Abílio Neto, na nota 4 ao artigo 400º do Novo Código do Trabalho Anotado, 4.ª Edição, pág.
[20] , Ediforum.
[21] Proferido no processo n.º 0715363 e disponível em http://www.dgsi.pt/jtrp.
[22] Despedimentos e Outras Formas de Cessação do Contrato de Trabalho, 1984, pág. 231.
[23] Proferido no processo n.º 363/05.1TTBCL.P1 e disponível em http://www.dgsi.pt/jtrp.
[24] Assim, então a propósito da conclusão dos contratos, in “Teoria Geral do Direito Civil”, 3.ª ed., Coimbra editora, 1988, pág. 441.
[25] In “A Parte Geral do Código Civil Português – A Parte Geral do Direito Civil”, Almedina, Coimbra, 1992, pág. 449.
[26] Define o mesmo Autor, in op. loc. cit., pág. 446-447, as várias fases da declaração do seguinte modo: 1.º exteriorização, quando a declaração é formulada ou manifestada, exprimindo o declarante a sua vontade; 2.º a expedição, quando a declaração, depois de exteriorizada, é expedida pelo declarante (…); 3.º a recepção, quando a declaração chega ao poder do seu destinatário ou declaratário em termos que, normalmente, lhe permitem tomar conhecimento do seu conteúdo (entrada na esfera do poder do declaratário); 4.º o conhecimento, quando o destinatário ou declaratário toma, de facto, conhecimento da declaração que lhe foi dirigida.
[27] Segundo Heinrich Ewald Hörster, in op. loc. cit., “esta solução legal dá relevância jurídica, no sentido de originar a perfeição da declaração negocial, àquele pressuposto que se verifica primeiro, combinando esta teoria da recepção (… logo que chega ao poder) com a teoria do conhecimento (… logo que … é dele conhecida”). Por via de regra as declarações receptícias feitas por escrito ganham eficácia logo no momento da chegada ao poder, enquanto declarações verbais dirigidas a um presente necessitam sempre da tomada do conhecimento por parte do destinatário.”
[28] in op. loc. cit. pág. 449.
[29] Veja-se, entre outros, sobre o regime que se analisa, o Ac. STJ de 11 de fevereiro de 2015, Relator Conselheiro Gabriel, in www.dgsi.pt.
[30] No mesmo sentido Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, Vol. I, 4.ª ed., pág. 214, referindo designadamente: “... não se exige, por um lado, a prova do conhecimento por parte do destinatário; basta que a declaração tenha chegado ao seu poder. O conhecimento presume-se neste caso, juris et de jure. Mas, provado o conhecimento, não é necessário provar a recepção para a eficácia da declaração.”.
[31] Como refere Heinrich Hörster in op. loc. cit., pág. 446 - “o momento da eficácia tem relevância sob três aspectos: em primeiro lugar esclarece se uma declaração foi feita tempestivamente ou não; em segundo lugar, determina a parte que arca com o risco de uma transmissão errada da declaração ao separar, no decurso temporal, as esferas de poder do declarante e do declaratário para as declarações receptícias; em terceiro lugar, determina o momento a partir do qual o declarante fica vinculado à sua declaração, o que tem importância para a conclusão do contrato e a correspondente transferência de direitos reais e do risco do perecimento ou deterioração da coisa, ou para a data a partir da qual correm os prazos da sua anulação.”
[32] In op. loc. cit. pág. 215.
[33] ainda, dos restantes números: “2 - O instrumento de regulamentação colectiva de trabalho e o contrato de trabalho podem aumentar o prazo de aviso prévio até seis meses, relativamente a trabalhador que ocupe cargo de administração ou direcção, ou com funções de representação ou de responsabilidade. 3 - No caso de contrato de trabalho a termo, a denúncia pode ser feita com a antecedência mínima de 30 ou 15 dias, consoante a duração do contrato seja de pelo menos seis meses ou inferior. 4 - No caso de contrato a termo incerto, para efeito do prazo de aviso prévio a que se refere o número anterior, atende-se à duração do contrato já decorrida. 5 - É aplicável à denúncia o disposto no n.º 4 do artigo 395.º”
[34] Veja-se, Acórdão STJ de 15 de setembro de 2010, Relator Conselheiro Vasques Dinis, in www.dgsi.pt.
[35] Relator Conselheiro Ribeiro Cardoso, processo 808/09.1TTBCL.P1.S1, in www.dgsi.pt.
[36] Vide, no mesmo sentido, entre outros, Pedro Furtado Martins, ‘Cessação do Contrato de Trabalho’, Edição Principia, pg. 171
[37] Vide, no mesmo sentido, entre outros, Pedro Furtado Martins, ‘Cessação do Contrato de Trabalho’, Edição Principia, pg. 171
[38] Carecem assim de real fundamento, com salvaguarda do devido respeito, as considerações constantes da sentença sobre reconhecer “que tal solução pode ser bastante penalizadora para o empregador, sobretudo em casos - como o vertente - em que o despedimento foi consumado pouco tempo antes de operar uma denúncia contratual já comunicada pelo trabalhador”, mas que, não obstante, “qualquer decisão do empregador que possa vir a redundar em despedimento ilícito constitui um risco por este assumido, cabendo-lhe ponderar se vale ou não a pena corrê-lo, para mais quando o contrato de trabalho está a escassos dias de terminar”.
[39] Relator Fernandes da Silva, in www.dgsi.pt.
[40] Sumário do Acórdão desta Secção de 28.11.2022, Relatora Desembargadora Paula Leal de Carvalho, in www.dgsi.pt.
[41] Direito do Trabalho, Almedina, 17ª ed., pág. 524;