Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
112/15.6T9VFR-E.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: HORÁCIO CORREIA PINTO
Descritores: ARRESTO PREVENTIVO
APREENSÃO DE BENS
Nº do Documento: RP20170906112/15.6T9VFR-E.P1
Data do Acordão: 09/06/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 726, FLS.8-24)
Área Temática: .
Sumário: Apreensão e arresto preventivo são realidades jurídicas diversas; aquela como instrumento de conservação das provas e de objectos relacionados com o crime e este como garantia patrimonial, pelo que não sendo incompatíveis entre si podem incidir sobre o mesmo bem ao mesmo tempo.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº112/15.6T9VFR-E.P1
Acordam os juízes que integram esta 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto.
Relatório.
B…, titular do CC n.º ……, residente na …, n.º …, em …, concelho de Vila Nova de Gaia, instaurou a presente procedimento cautelar de arresto preventivo contra os seguintes arguidos e demandados civis no processo principal nº 112/15.6T9VFR:
1) C…, UNIPESSOAL, LDA., titular do NIPC ………, com sede na Rua …, nº …, em São João da Madeira;
2) D…, residente na Rua …, n.º …, em São João da Madeira;
3) E…, residente na Avenida …, …, n.º …, em São João da Madeira, actualmente em prisão preventiva no E. P. F…, pedindo que, na medida do necessário, para assegurar o pagamento da indemnização de €8.881,55 por si peticionada através de pedido cível, se decrete o imediato arresto da quantia de €24.900 em dinheiro, apreendida em casa do último dos referidos arguidos ou, se assim se não entender, a conversão da apreensão em arresto.
Alegou, em síntese, que os requeridos arguidos se encontram acusados da prática de plúrimos crimes de burla qualificada, falsidade informática e falsificação de documentos, incluindo, por referência ao aqui requerente, de um (1) crime de burla qualificada, p. e p. pelo artºs 217 e 218 do C. Penal, de um (1) crime de falsidade informática, p. e p. pelo artº 3, nº 1 da Lei n.º 109/2009 de 15/09 e de quatro (4) crimes de falsificação de documento, p. e p. pelo artº 256 do C. Penal.
O requerente deduziu pedido de indemnização civil contra os requeridos, no valor de €8.881,55 que foi liminarmente admitido, existindo um “fumus boni iuris” da titularidade do crédito.
Na casa do requerido E… foi apreendida a quantia de €24.900 em dinheiro.
Para além do requerente, há nos autos 115 outros ofendidos, tendo sido admitidos 55 pedidos cíveis.
Face a tão elevado número de ofendidos, as garantias do pagamento do crédito da indemnização do requerente são diminutas.
Encontra-se, ainda, promovida na acusação a perda a favor do Estado dos bens apreendidos, nomeadamente da supra referida quantia de €24.900.
Quantia que ainda não foi arrestada, nem declarada perdida, pelo que deverá ser arrestada, porquanto a finalidade da garantia patrimonial não é servida pelas medidas de apreensão.
Devendo, por necessária, a apreensão dessa quantia ser convertida em arresto preventivo.
Para além dos bens apreendidos não são conhecidos outros bens ou rendimentos aos requeridos.
É justificado o receio do requerente de perder a garantia patrimonial do seu crédito, existindo razões objectivas para recear pela solvabilidade dos requeridos.
Em face do que se deixou dito, é possível decidir liminarmente da sorte do presente procedimento. Vejamos.
(descrição dos requisitos e pressupostos que fundamentam o procedimento cautelar)
(…)
Aqui chegados, descendo ao concreto da situação a que nos é trazida, é patente a inverificação do requisito do justo receio de perda da garantia patrimonial.
Com efeito, a quantia pecuniária de €24.900 que o requerente pretende ver arrestada foi apreendida ao requerido E…, permanecendo desde então ininterruptamente nessa situação (artº 178 do CPP).
O Ministério Público, na acusação, requer inclusivamente a declaração de perda dessa quantia, sob invocação de que é “produto da prática dos ilícitos imputados aos arguidos”.
A. Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, vol. IV, p. 175. Ac. do TRC de 13/11/1979, publicado no BMJ n.º 293, p. 441.
A apreensão pode ser um meio de lograr a prova. Mas, em paralelo, pode ser, como no caso é, uma incontornável garantia processual penal da perda (desempenhando uma função processual penal conservatória).
Tendo sido requerida a declaração de perda dos bens, eles permanecerão apreendidos até ao momento próprio para se decidir dessa questão, ou seja, até ao acórdão (artº 374, nº 3, al. c) do CPP), ou melhor, até ao trânsito do acórdão (cfr. artº186, nº 2 do CPP).
A quantia pecuniária apreendida está e ficará, subtraída à disponibilidade de qualquer dos requeridos, pelo que, até ao trânsito do acórdão, inexiste perigo de ser sonegada, dissipada, ocultada ou de qualquer forma subtraída à finalidade de garantia de crédito que lhe possa eventualmente caber.
À semelhança, aliás, do que sucede com qualquer dos outros bens ou quantias apreendidas nos autos relativamente aos quais tenha sido requerida a respectiva perda.
Se, porventura, não vier a ser declarada no acórdão a perda da quantia apreendida, então nessa altura - antes do trânsito em julgado - é que se poderá colocar, perante o circunstancialismo concreto, a questão do justo receio da perda da garantia patrimonial do requerente, em razão da eventual entrega dos bens apreendidos ao(s) requerido(s), podendo ponderar-se a pertinência da instauração do procedimento do arresto.
Outrossim, como se deixou dito, a apreensão, para além da finalidade de prova, tem uma finalidade conservatória da perda dos bens, cuja decisão haverá de ser tomada no acórdão.
J. Conde Correia, RPCC, n.º 25, p. 506 e 507,
Nesta decorrência, não há fundamento para o levantamento da apreensão dos bens, nem tampouco para a conversão do mesmo em arresto, que ademais é algo que a lei processual penal não prevê nem contempla.
Decisão:
Nestes termos, por ser manifesta a sua improcedência, ao abrigo do disposto nos artºs 226, nº 4, al. b) e 629, nº 3, al. c), ambos do Código de Processo Civil, indefiro liminarmente o presente procedimento cautelar de arresto preventivo instaurado pelo requerente B… contra os arguidos, ora requeridos, C…, Unipessoal, Lda., D… e E…, bem como indefiro a requerida conversão da apreensão da supra referida quantia pecuniária, referida nos arts 10º, 14º, 15º e 32º da petição de embargos, em arresto.
Recurso de B…
Conclusões:
1) Pese embora a quantia objecto de arresto se encontrar apreendida (cfr. nºs 2,3 e 4 do art° 111 do C P), é ponto assente que tal apreensão não consubstancia qualquer medida de garantia patrimonial, como é o caso do arresto preventivo (cfr. artº 228 do CPP) e da caução económica (cfr. artº 227 do CPP) e, em menor medida, para o requerente.
2) Efectivamente, se tal apreensão pudesse servir os propósitos da garantia patrimonial, então teríamos de concluir que a figura do arresto preventivo constitui uma previsão inútil no C.P.P. o que é de todo inconcebível.
3) Por conseguinte, ainda que apreendida e arredada da disponibilidade dos requeridos, não serve de garante à cobrança da indemnização peticionada pelo requerente.
4) Acresce que, até à presente data, a referida quantia, não foi alvo de qualquer arresto (v.g. nos termos do art° 228, nº1 do CPP e artº 10, nºs 3 e 4 da Lei n° 5/2002, de 11/01), nem foi declarada perdida a favor do Estado.
5) Mesmo que venha a ser declarada perdida a favor do Estado, jamais o poderá ser em prejuízo do requerente (cfr. nº 2 do artigo 111 do C.P e Ac. STJ de 03.10.2002).
6) Face ao elevado número de indemnizações que, em caso de condenação os requeridos terão que pagar, os bens apreendidos à ordem do processo crime, afiguram-se de todo insuficientes para ressarcir os potenciais lesados (115).
7) Aos requeridos não são conhecidos quaisquer outros bens ou rendimentos.
8) Existem, pois, razões objectivas para recear pela solvabilidade dos requeridos, o que se traduz numa séria diminuição da garantia do crédito do requerente.
9) Assim, de molde a acautelar o pagamento do seu crédito, prévia e diligentemente, o requerente entendeu por bem requerer (na medida no necessário) o arresto da dita quantia.
10) Por isso, muito injusto seria ver agora indeferida a sua pretensão, dando aso a que outros, em momento ulterior (v.g. após a prolação do acórdão cfr. 374, nº 3, alínea c), do CPP) o fizessem com prevalência do ora recorrente, vindo a ser deferida a pretensão destes.
11) Ou quiçá, não sendo declarados perdidos a favor do Estado, os bens apreendidos viessem a ser devolvidos a quem de direito (cfr. artigo 186, nº 2 do CPP e ainda Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 05.11.2014).
12) Pelas razões elencadas e tendo em conta que o dinheiro apreendido (€24.900,00), resultou da prática dos crimes (burla e falsificações, segundo a acusação pública), deverá servir para ressarcir os danos causados ao requerente.
13) Esta mesma ideia está patente no nº 2 do artigo 130 do CP, o qual, mediante requerimento do lesado e dentro dos limites dos seus danos, permite ao Tribunal atribuir-lhe os objectos declarados perdidos a favor do Estado, ou o preço da respectiva venda, ou preço ou o valdas vantagens provenientes do crime.
14) No espírito deste preceito legal, por maioria de razão (face ao elevado número de lesados e PICs existentes no processo crime em causa), está ínsito o direito de requerer o arresto preventivo de bens, ainda que aprendidos.
15) Sendo que, o direito de requerer arresto preventivo, tanto cabe ao Ministério Público, como ao lesado (cfr. artigo 228, nº 1 do CPP) e pode incidir sobre bens já aprendidos (cfr. Ac.deste Venerando Tribunal de 11.06.2016).
16) Acresce que, o "periculum in mora" como "conceito jurídico indeterminado gradativo" que é, deve ser analisado e valorado perante o caso concreto, tendo- se em conta as particularidades da situação singular em apreço (cfr. Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 04.12.2012).
17) Na análise do "periculum in mora" o que releva não é a natureza dos prejuízos que o requerente poderá sofrer até à decisão definitiva do direito, mas a sua repercussão na sua esfera jurídica (cfr. Ac. do STJ de 26.01.2006).
18) Salvo o mui devido respeito, entendemos que ao debruçar-se sobre tal requisito, o douto Tribunal “a quo" não subsumiu devidamente a sua ponderação ao caso sub judicie.
19) Não podemos olvidar que caso os bens não estivessem apreendidos, o requerente poderia enveredar pela prestação da caução económica e caso esta não fosse prestada, sempre estaria dispensado da prova do "periculum in mora" (cfr. artº 228 , nº 1, in fine, do CPP).
20) Aliás, a própria decisão recorrida admite a hipótese do requerente poder peticionar o arresto preventivo em momento ulterior, o qual, em nossa humilde opinião, pode e deve ser decretado agora.
21) A própria lei processual penal prevê que a apreensão levada a efeito no âmbito do processo crime possa prolongar-se como arresto preventivo (cfr. artigo 186, nº 5 do CPP).
22) Pelo que, sempre com o mui devido respeito, em nossa humilde opinião, a douta decisão ora em crise foi proferida em violação do disposto no nº 1 do artº 228 e nº 5 do artº 186, do CPP, no nº 2 do artigo 111 e nº 2 do artº 130 do CP, no artigo 619 do CC e, bem assim, nº 1 do artigo 391 do CPC.
Termos em que, concedendo provimento ao recurso e, revogando a douta decisão recorrida, substituindo-a por outra que após a produção da prova, nos termos conjugados dos artigos 111º, nº 2, 130, nº 2 do CP, 228 do CPP, 619 do CC e 391 e s.s. do CPC, venha a decretar, na medida do necessário ao pagamento da indemnização peticionada pelo requerente/lesado no valor de €8.881,55, o arresto preventivo da quantia de €24.900 em dinheiro já apreendida ou, em alternativa, a conversão da aludida apreensão em arresto…

O MP foi devidamente notificado da decisão recorrida e do despacho que admite o recurso, conforme informação lavrada em cota a fls 88.
O MP não proferiu resposta.

Já neste tribunal o MP deu parecer no sentido de que seja satisfeita a pretensão do recorrente

Cumpriu-se o artº 417, nº2 do CPP.
O recorrido D… respondeu ao parecer do MP pugnando para que não seja dado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais foram os autos submetidos a conferência.
Nada obsta à apreciação do mérito.
Mantém-se a regularidade da instância.
Fundamentação e direito.
O recurso tem como objecto a seguinte argumentação:
A quantia apreendida nos autos – 24.900 euros – não configura uma garantia patrimonial como o arresto, previsto no artº 111 do CP e 228 do CPP.
A quantia está apreendida mas não arrestada.
Nos presentes autos há um elevado número de ofendidos, contudo a verba e bens apreendidos são manifestamente insuficientes para ressarcir os interessados.
Os bens apreendidos podem ser entregues a quem demonstrar a eles ter direito.
A verba apreendida pretende-se que seja garantia do requerente.
O requerente funda o seu pedido nos termos do artº 228 do CPP.
O despacho recorrido viola o disposto nos artºs 228, nº1 do CPP; artº 619 do CC e artº 391 do CPC.
No fundo o requerente pretende veicular que não há confusão possível entre apreensão de bens e arresto preventivo.
Vejamos o que diz o despacho recorrido.
Começa por descrever os requisitos que enquadram a pretensão de quem requer o arresto preventivo.
O arresto preventivo, enquanto medida de garantia patrimonial autónoma, deve obedecer aos requisitos estabelecidos na legislação processual civil para o arresto (artº 228, nº 1 do Código de Processo Penal).
Os pressupostos do decretamento do arresto, nos termos do nº 1 do artº 391º do Código de Processo Civil, são: a) a probabilidade da existência do crédito do requerente; b) justo receio da perda da garantia patrimonial (cfr. ainda artºs 601 e 619, nº 1 do C. Civil).
O arresto é configurado, na lei processual civil, como providência cautelar gizada para a conservação da garantia patrimonial do seu crédito.
As providências cautelares visam acautelar o efeito útil da acção (artº 2, nº 2 do Código de Processo Civil), bastando para o seu decretamento que, através de uma summario cognitio, se conclua pela séria probabilidade do direito invocado (fumus boni iuris) e pelo fundado receio de que esse direito sofra lesão grave e de difícil reparação decorrente da natural e inevitável demora do processual (periculum in mora). O arresto serve deste modo para satisfazer o cumprimento de uma obrigação de indemnização.
Vejamos o requisito do justo receio da perda de garantia patrimonial (artº 391, nº 1 do Código de Processo Civil).
Este receio preenche no arresto o periculum in mora que serve de fundamento à generalidade das providências cautelares.
Pressupõe a alegação e prova, ainda que perfunctória, de um circunstancialismo fáctico que, mercê da demora, faça antever o perigo de se tornar difícil ou impossível a cobrança do crédito.
A análise deste receio tem que ser efectuada em termos objectivos e deve consubstanciar-se em factos ou circunstâncias que, de acordo com regras da experiência, aconselhem uma decisão cautelar imediata, sobe pena de perda da possibilidade de o credor ver satisfeito o seu crédito.
Em concreto, segundo o teor do despacho a quo, não se verifica o requisito do justo receio de perda de garantia patrimonial.
Com efeito, a quantia pecuniária de €24.900 que o requerente pretende ver arrestada foi apreendida ao requerido E…, permanecendo desde então ininterruptamente nessa situação (artº 178 do Código de Processo Penal).
O Ministério Público, na acusação, requer inclusivamente a declaração de perda dessa quantia, sob invocação de que é “produto da prática dos ilícitos imputados aos arguidos”.
A apreensão pode ser um meio de lograr a prova. Mas, em paralelo, pode ser, como no caso é, uma incontornável garantia processual penal da perda (desempenhando uma função processual penal conservatória).
A quantia permanecerá apreendida até a questão da perda ou restituição ser decidida em sede de acórdão, ou até trânsito do acórdão (artº 374, nº 3, al. c) e artº186, nº 2, ambos, do CPP).
A quantia pecuniária apreendida está e ficará, subtraída à disponibilidade de qualquer dos requeridos, pelo que, até ao trânsito do acórdão, inexiste perigo de ser sonegada, dissipada, ocultada ou de qualquer forma subtraída à finalidade de garantia de crédito que lhe possa eventualmente caber. Não há nesta perspectiva justo receio de perda de garantia patrimonial.
Se, porventura, não vier a ser declarada no acórdão a perda da quantia apreendida, então nessa altura - antes do trânsito em julgado - é que se poderá colocar, perante o circunstancialismo concreto, a questão do justo receio da perda da garantia patrimonial do requerente, em razão da eventual entrega dos bens apreendidos ao(s) requerido(s), podendo ponderar-se a pertinência da instauração do procedimento do arresto. Aqui já se reconhece a pertinência do arresto preventivo, que sempre teria de ser interposto antes do trânsito do acórdão, não deixando de se questionar o momento extemporâneo para operar a garantia.
Outrossim, como se deixou dito, a apreensão, para além da finalidade de prova, tem uma finalidade conservatória da perda dos bens, cuja decisão haverá de ser tomada no acórdão.
J. Conde Correia, RPCC, n.º 25, p. 506 e 507,
Nesta decorrência, não há fundamento para o levantamento da apreensão dos bens, nem tampouco para a conversão do mesmo em arresto, que ademais é algo que a lei processual penal não prevê nem contempla.
(citações em itálico reproduzem partes do despacho a quo)
Vejamos se a apreensão da verba protege o credor de forma tão eficaz como o expediente do arresto preventivo.
O arresto preventivo tem natureza subsidiária e só pode ser decretado quando não tenha sido prestada caução económica, como acontece nos presentes autos. A ausência de prestação de caução económica facilita a alegação de receio da perda de garantia patrimonial no procedimento cautelar de arresto preventivo.
Foi decretada a apreensão da verba por ordem do tribunal.
A apreensão de títulos, valores, quantias e objectos está disciplinada no artº 181 do CPP. Por outro lado o arresto preventivo constitui uma medida de garantia patrimonial de natureza civil. O arresto preventivo, previsto no artº 228 do CPP, bem como a caução económica, prevista no artº 227 do CPP, destinam-se a garantir o pagamento de pena pecuniária, taxa de justiça, custas do processo ou de qualquer outra dívida para com o Estado relacionada com o crime e ainda o pagamento de indemnização ou outras obrigações civis derivadas do crime; a apreensão destina-se essencialmente a conservar as provas reais e bem assim de objectos que em razão do crime, com que estão relacionados, podem ser declarados perdidos a favor do Estado.
Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, Página 197. Ver ainda o Acódão da RC, de 18 de Maio de 2005, CJ, Ano XXX,Tomo 3, fls 39.
Esta observação é ainda reforçada pelo previsto nos artºs 186, nº2 do e 374, nº3, ambos, do CPP, sobre o destino – restituição ou perdimento - dos bens apreendidos. Porém, já assim não será, caso tenha sido decretado arresto preventivo dos bens, nos termos do artº 228 do CPP (garantia patrimonial). Na senda deste raciocínio está o facto de o legislador prever no artº 186, nº3 do CPP a possibilidade da apreensão poder ser convertida em arresto preventivo.
Apreensão e arresto preventivo são realidades jurídicas diversas e destinam-se a proteger interesses distintos. Ali como instrumento de conservação de provas e de objectos relacionados com o crime, aqui como garantia patrimonial.
Não restam dúvidas que o indeferimento liminar do arresto preventivo contende com o justo receio de perda de garantia patrimonial, uma vez que as finalidades do arresto preventivo não estão, na sua plenitude, acauteladas pela declaração de apreensão.
O requerente quer estabelecer precedências e por isso lança mão do procedimento cautelar de arresto, como forma de assegurar o cumprimento de obrigações patrimoniais. Como bem refere o parecer: prior in tempus, posse in iure. A perda de quantias e bens, a favor do Estado ou eventual restituição, tem de ser devidamente fundamentada e não pode ser ultimada à custa de interesses particulares, designadamente dos ofendidos. O arresto salvaguarda uma pletora de obrigações processuais, como a citação do Professor Germano M. da Silva bem assinala.
De facto não está em causa o levantamento da apreensão, nem a sua conversão em arresto mas, tão só estabelecer uma garantia patrimonial, com contornos cíveis, de modo a viabilizar a pretensão do credor. A convivência dos dois institutos é possível e tem finalidades diversas, um fortemente marcado pela garantia patrimonial, outro pela conservação da prova.
O acórdão final saberá conciliar o arresto com a apreensão.
Face ao exposto o recurso deve merecer provimento.

Assim e nestes termos, acordam os juízes que integram esta 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto, em dar provimento ao recurso interposto pelo requerente B…, devendo o procedimento cautelar de arresto merecer despacho liminar favorável, seguindo-se os ulteriores trâmites processuais.

Sem custas por não serem devidas.

Notifique nos termos legais.

Porto, 6 de Setembro de 2017.
Horácio Correia Pinto.
Moreira Ramos.