Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
6465/19.0T8MTS-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RITA ROMEIRA
Descritores: NULIDADE DA DECISÃO
ARGUIÇÃO
PROCESSO LABORAL
RECURSO
EFEITO SUSPENSIVO
Nº do Documento: RP202109206465/19.0T8MTS-A.P1
Data do Acordão: 09/20/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - A decisão que não se pronuncie sobre questão que devesse apreciar é nula, cfr. art. 615º, nº 1, al. d) do Cód. do Proc. Civil.
II – No entanto, a nulidade dessa decisão, para que seja possível a sua apreciação pelo Tribunal Superior, tem de ser arguida, nos termos do nº 4, daquele art. 615º.
III - Em processo laboral, a apelante poderá obter o efeito suspensivo do recurso se, no requerimento de interposição do recurso requerer a prestação de caução da importância em que foi condenada, nos termos previstos no nº 2 do art. 83º do CPT e ainda que em separado do requerimento de interposição de recurso, dentro do prazo que dispõe para recorrer.
IV - Não o fazendo desse modo e fora do prazo legal para recorrer, o pedido formulado, para obtenção do efeito suspensivo do recurso, é extemporâneo.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. nº 6465/19.0T8MTS-A.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto - Juízo do Trabalho de Matosinhos - Juiz 2
Recorrente: B…, S.A.
Recorrido: C…

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I – RELATÓRIO
O presente recurso em separado, vem interposto de despacho proferido nos autos de acção especial de impugnação de regularidade e ilicitude de despedimento, processo nº 6.465/19.0T8MTS, onde é Autor, C… e Ré, B…, S.A..
Naqueles, em 11.02.2021, a Ré apresentou requerimento, no qual deduz a pretensão de prestação espontânea de caução tendo em vista a atribuição de efeito suspensivo aos efeitos da decisão proferida nos autos e objecto de recurso, pela mesma apresentado em 04.01.2021, alegadamente, em síntese, por se encontrar o processo a aguardar seja proferido o despacho de admissão daquele recurso previsto no artº 82º nº 1 do Cód. de Proc. do Trabalho e por considerar que tal “em nada, mas absolutamente nada, ofendem os direitos do Autor; tanto mais que a pretensão de prestação de caução que ora expressamente manifesta a Ré, em valor total a fixar pelo Tribunal fruto da necessidade de liquidação (leia-se, apuramento) dos concretos valores a caucionar, será efectuada através de depósito em dinheiro à ordem do processo”.
Termina pedindo que “POR TEMPESTIVO E LEGALMENTE ADMISSÍVEL, SEJA ADMITIDO O PRESENTE REQUERIMENTO E, CONSEQUENTEMENTE, DEFERIDAS AS PRETENSÕES SUPRA MANIFESTADAS NO SENTIDO DE SER ADMITIDA A PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO DAS IMPORTÂNCIAS EM QUE SE MOSTRA A REQUERENTE CONDENADA, CUJA LIQUIDAÇÃO SE REQUER A FIM DE SER COMPLEMENTADA/REFORÇADA A JÁ PRESTADA CAUÇÃO ATRAVÉS DE DEPÓSITO AUTÓNOMO EM DINHEIRO, QUE SE JUNTA, ATRIBUINDO-SE NO DESPACHO AINDA A PROFERIR ACERCA DA ADMISSIBILIDADE, EFEITOS E SUBIDA DO RECURSO, EFEITO SUSPENSIVO AO MESMO, SEGUINDO-SE OS ULTERIORES TERMOS PROCESSUAIS.”.
No seguimento deste, em 12.02.2021, o Autor pronunciou-se no sentido da inadmissibilidade do requerido.
Após, em 28.04.2021, foi proferido o despacho recorrido, com o seguinte teor:
A ré, veio em 11/02/2021 apresentar requerimento de prestação de caução com vista à obtenção de efeito suspensivo ao recurso da sentença que havia interposto em 14/01/2021.
O autor opôs-se ao deferimento da pretensão deduzida
(...)
No que respeita à prestação da caução, afigura-se-nos que, face ao disposto pelo art. 83º, nº 2 do Código de Processo do Trabalho, a pretensão deduzida é manifestamente extemporânea, já que nos termos daquela disposição legal é condição para a atribuição do efeito suspensivo ao recurso que a prestação de caução seja requerida no requerimento de interposição do recurso e esse, no caso dos autos, foi apresentado em 14/01/2021, sem que tenha sido requerida a prestação de caução para atribuição de efeito suspensivo ao recurso, só requerida em 11/02/2021.
Indefere-se, pois, por extemporânea, a requerida prestação de caução com vista à atribuição de efeito suspensivo ao recurso interposto.
Custas do incidente pela ré, com 1 UC de taxa de justiça.
Notifique.”.
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Inconformada a Ré interpôs recurso, terminando as suas alegações com as seguintes Conclusões:
“A) – A QUESTÃO (ÚNICA) QUE A RECORRENTE PRETENDE PELA PRESENTE VIA RECURSÓRIA A SUBMETER À SEMPRE DOUTA, SÁBIA E PRUDENTE DECISÃO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, EXMOS. SRS. JUÍZES DESEMBARGADORES, É A DE SABER SE:
- SERÁ PROCESSUALMENTE ADMISSÍVEL A APRESENTAÇÃO/DEDUÇÃO DE INCIDENTE DE PRESTAÇÃO ESPONTÂNEA DE CAUÇÃO POR PARTE DO RECORRENTE - APÓS A APRESENTAÇÃO DE RECURSO DE CONDENAÇÃO E RESPECTIVA MOTIVAÇÃO (NOS TERMOS DO ARTº 81º DO CÓD. DO TRABALHO – DIPLOMA AO QUAL SE REPORTARÃO TODAS AS INFRA INDICADAS NORMAS SEM QUALQUER EXPRESSA MENÇÃO EM CONTRÁRIO), MAS EM MOMENTO ANTERIOR AO DA PROLAÇÃO DO DESPACHO DE ADMISSÃO DO MESMO PELO TRIBUNAL RECORRIDO (NOS TERMOS DO ARTº 82º), TUDO TENDO EM VISTA A ATRIBUIÇÃO DE EFEITO SUSPENSIVO ÀQUELE RECURSO;
B) – DESDE LOGO, E ATENTA A RESENHA HISTÓRICA PROCESSUAL SUPRA REFERIDA, QUE POR MERA QUESTÃO DE BREVIDADE AQUI SE DÁ POR INTEGRALMENTE REPRODUZIDA, E EM MODESTO MAS CONVICTO ENTENDIMENTO DA RECORRENTE, DEVERÁ SER REVOGADO O DOUTO DESPACHO ORA EM CRISE, SENDO O MESMO SUBSTITUÍDO POR OUTRO QUE ADMITA AQUELE INCIDENTE DE PRESTAÇÃO ESPONTÂNEA DE CAUÇÃO;
C) - COMO ALEGOU A RECORRENTE, COM A PRESTAÇÃO DE TAL VOLUNTÁRIO E ESPONTÂNEO DEPÓSITO ACTO IMEDIATO REALIZADO QUANDO DO INÍCIO DAQUELE INCIDENTE, DEMONSTRADO FICOU:
- POR UM LADO, NÃO EXISTIREM QUAISQUER DÚVIDAS EM RELAÇÃO ÀS SUAS (DA RECORRENTE) REAIS, VERDADEIRAS E SÉRIAS INTENÇÕES NA APRESENTAÇÃO DAQUELE MESMO REQUERIMENTO E PEDIDO AD CAUSAM FORMULADO, E, SE DISSO E QUANDO FOR O CASO, CUMPRIR TODA E QUALQUER DECISÃO JUDICIAL CONDENATÓRIA;
- POR OUTRO LADO, DEIXAR O AUTOR/RECORRIDO GARANTIDO/SEGURO (FRUTO DA GÉNESE DA CAUÇÃO A PRESTAR) QUE, QUANDO E SE DISSO FOR O CASO, PODERÁ O MESMO RECLAMAR A ENTREGA DAQUELE VALOR E DO REMANESCENTE QUE O TRIBUNAL VENHA A QUANTIFICAR – O QUAL A RECORRENTE DESDE LOGO PROTESTOU DEPOSITAR NO PRAZO QUE PARA TAL LHE FOSSE CONCEDIDO;
D) - AQUELE MESMO PROCEDIMENTO PELA RECORRENTE ADOPTADO (DENOMINADO DE PRESTAÇÃO ESPONTÂNEA DE CAUÇÃO), EM NADA, MAS ABSOLUTAMENTE NADA, ATROPELA A RATIO DO ARTº 83º AO PRECEITUAR QUE O RECORRENTE “...PODE OBTER O EFEITO SUSPENSIVO SE ... REQUERER A PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO DA IMPORTÂNCIA EM QUE FOI CONDENADO” (SIC), SENDO QUE A A RATIO DAQUELE INSTITUTO VISA DESDE LOGO PROTEGER O CREDOR (AINDA QUE NÃO A TÍTULO DEFINITIVO) E O DECURSO DA NORMAL TRAMITAÇÃO PROCESSUAL (SEM QUAISQUER INCIDENTES IMPEDITIVOS DA SUBIDA DO RECURSO E EFEITOS DEVOLUTIVOS DO MESMO);
E) - O QUE TUDO JUSTIFICA E JUSTIFICARÁ A REFERÊNCIA A QUE AQUELA PRETENSÃO DE ATRIBUIÇÃO DE EFEITO SUSPENSIVO DO RECURSO PODE SER OBTIDA “...SE NO REQUERIMENTO DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO...” (SIC – ARTº 83º) FOR REQUERIDA TAL PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO QUE É PROCESSADO NOS PRÓPRIOS AUTOS, VISANDO O LEGISLADOR COM TAL DESCRITO PROCEDIMENTO (NO REQUERIMENTO DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO), A CELERIDADE E URGÊNCIA NA SUBIDA DO RECURSO - TENDO EM VISTA A DEFESA DOS PRINCÍPIOS DA SEGURANÇA E CERTEZA JURÍDICAS QUE SOMENTE UMA DECISÃO DEFINITIVA (LEIA-SE, JÁ DEFINITIVAMENTE TRANSITADA EM JULGADO PODE CONFERIR A TODOS OS SUJEITOS PROCESSUAIS);
F) - O QUE NÃO IMPEDE A POSTERIOR PRESTAÇÃO ESPONTÂNEA DE CAUÇÃO QUE, COMO SUCEDEU NO CASO EM APREÇO, PESE EMBORA TER TIDO INÍCIO EM MOMENTO POSTERIOR AO DA INTERPOSIÇÃO DO RECURSO, EM NADA AFECTOU A NORMAL TRAMITAÇÃO DO MESMO E DIREITOS E GARANTIAS DO RECORRIDO;
G) - A CAUÇÃO PREVISTA NO ARTº 83º VISA MANIFESTAMENTE UMA DUPLA FINALIDADE:
- VISA, POR UM LADO, PERMITIR QUE CONTRA O REGIME REGRA ESTABELECIDO NAQUELE ARTIGO, À APELAÇÃO SEJA ATRIBUÍDO EFEITO SUSPENSIVO, ASSIM EVITANDO QUE O APELADO, ORA RECORRIDO, ENQUANTO CREDOR (AINDA QUE NÃO A TÍTULO DEFINITIVO) POSSA DAR IMEDIATAMENTE À EXECUÇÃO A CONDENAÇÃO (OBJECTO DE RECURSO, LOGO, AINDA PROVISÓRIA);
- E, POR OUTRO LADO, VISA GARANTIR AO CREDOR, ORA RECORRIDO, A SATISFAÇÃO DO RESPECTIVO CRÉDITO (AINDA QUE NÃO DEFINITIVO), RECONHECIDO NA CITADA DOUTA SENTENÇA, SERVINDO DE TAL MODO A CAUÇÃO DE GARANTIA DO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DA RÉ, ORA RECORRENTE (CASO E SE A MESMA VIER A SER CONDENADA POR CONFIRMAÇÃO DO TRIBUNAL SUPERIOR OU NA MEDIDA EM QUE O VIER A SER).
H) - SENDO QUE A PRIMEIRA DAQUELAS MENCIONADAS FINALIDADES SE MOSTRA DESDE LOGO OBTIDA/ALCANÇADA COM O RECONHECIMENTO JUDICIAL DA IDONEIDADE DA CAUÇÃO PRESTADA – COMO SEGURAMENTE SE VERIFICA IN CASU (E NENHUMA OPOSIÇÃO A TAL RESPEITO MERECEU DO PRÓPRIO RECORRIDO); PRESSUPONDO A SEGUNDA DAQUELAS MENCIONADAS FINALIDADES QUE A CAUÇÃO SE MANTENHA IMODIFICÁVEL ATÉ À PROLAÇÃO DA DECISÃO PELO TRIBUNAL SUPERIOR, PERMITINDO DE TAL MODO AO ORA RECORRIDO, AUTOR E CREDOR, QUANDO E SE DISSO FOR O CASO, SATISFAZER O SEU CRÉDITO PELAS FORÇAS DA CAUÇÃO PRESTADA;
I) - O QUE TUDO SE VERIFICAVA E VERIFICA IN CASU E, COMO TAL, DEVERIA TER SIDO EXPRESSAMENTE RECONHECIDO E DECLARADO;
J) - AO DECIDIR COMO DECIDIU O TRIBUNAL RECORRIDO INTERPRETOU DE FORMA ERRADA E/OU VIOLOU O DISPOSTO, ENTRE OUTROS, 83º DO CÓD. DE PROC. DO TRABALHO E AINDA ARTºS. 704º E 906º E SEGTS., AMBOS DO CÓDIGO DE PROC. CIVIL.
N E S T E S T E R M O S,
E COM O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, VENERANDOS JUÍZES DESEMBARGADORES, DEVE SER DADO INTEIRO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, E, REVOGANDO-SE A DOUTA DECISÃO RECORRIDA, JULGAR-SE PROCEDENTE POR PROVADO O PRESENTE RECURSO, PROFERINDO-SE DOUTO ACÓRDÃO QUE ADMITA O INCIDENTE DE PRESTAÇÃO ESPONTÂNEA DE CAUÇÃO E SEU LEGAIS EFEITOS, MORMENTE A SUSPENSÃO DOS EFEITOS DA DOUTA SENTENÇA EXARADA A FLS. ... E AINDA NÃO TRANSITADA EM JULGADO, COM TODAS AS DEVIDAS E LEGAIS CONSEQUÊNCIAS, POR SER DE INTEIRA JUSTIÇA!”.
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O Autor apresentou contra-alegações que terminou com as seguintes CONCLUSÕES:
“1.ª – O Recorrente que pretenda que seja atribuído efeito suspensivo ao recurso mediante a prestação de caução tem o direito processual potestativo de o fazer no requerimento de interposição de recurso, conforme o preceitua, de modo claro e inequívoco, o n.º 2 do artigo 83.º do Código de Processo de Trabalho;
2.ª – Se não o fizer, o direito preclude e o efeito aplicável ao recurso é o meramente devolutivo, regime regra previsto no n.º 1 do mesmo dispositivo;
3.ª – No caso em apreço, o Recorrente nada requereu aquando da interposição do recurso, apenas tendo formulado requerimento autónomo quase um mês após a prática do acto;
4.ª – Uma decisão em sentido contrário à recorrida, asseverando o muito serôdio impetrar da atribuição de efeito suspensivo ao recurso seria, essa sim, uma flagrante violação da norma prevista no n.º 2 do artigo 83.º do Código de Processo de Trabalho;
5.ª – Os requisitos de tempo e modo do exercício do direito estatuídos na norma são cumulativos e não é a liquidação de DUC pelo valor que a Recorrente entendeu (nem nenhum dos demais inertes argumentos alvitrados) que afasta o facto de não ter requerido a atribuição de efeito suspensivo ao recurso aquando da sua interposição e no próprio requerimento.
6.ª – Destarte, a douta decisão recorrida é certa, justa, perfilha a melhor interpretação do direito (que, neste caso, nem sequer conferia grande espectro…) e deverá manter-se incólume.
NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO QUE V. EX.ªS MUI DOUTAMENTE SUPRIRÃO:
Deve ser, por V.Ex.ªs, negado provimento ao recurso, com as legais consequências; e
Assim se fazendo JUSTIÇA”.
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Admitido o recurso como apelação, em separado, com subida imediata e efeito devolutivo, foi ordenada a organização do apenso e a remessa dos autos a esta Relação.
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Neste Tribunal, o Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, nos termos do art. 87º, nº 3, do CPT, no sentido da improcedência da apelação e confirmação do despacho recorrido, no essencial, dada a extemporaneidade da requerida prestação de caução.
Notificadas, as partes, respondeu a recorrente, nos termos que constam a fls. 177 e ss., dos autos nos seguintes termos que se transcrevem:
“I) - por mera questão de brevidade e economia processual reitera desde logo a Recorrente tudo quanto a propósito da suscitada atribuição de efeito suspensivo ao recurso interposto nos autos principais concerne;
II) - mormente que tal suscitada questão, como das conclusões recursórias oportunamente apresentadas resulta, se prende com a apresentação de incidente de prestação de caução propriamente dito;
III) – e não o expediente processual previsto no artº 83º do Cód. de Proc. do Trabalho;
IV) – tendo a Recorrente cuidado de apresentar incidente próprio de prestação de caução, já prestada (e que não foi objecto de qualquer impugnação por parte do Recorrido quanto á respectiva idoneidade e suficiência);
V) – o que tudo garante e garantirá ao Recorrido que o hipotético recebimento da quantia em apreço, quando e se for mantida a douta sentença de primeira instância, se mostra assegurado;
VI) – finalidade esta que a prestação espontânea de caução visa e evita a eventual e posterior prática de actos manifestamente inúteis, que a Lei proíbe, mormente através da prestação de caução em sede executiva....
T E R M O S E M Q U E,
E NOS MELHORES DE DIREITO QUE VOSSAS EXCELÊNCIAS,
VENERANDOS SENHORES JUÍZES DESEMBARGADORES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO, DOUTAMENTE SUPRIRÃO, SE REQUER A JUNÇÃO DO PRESENTE REQUERIMENTO DE RESPOSTA AOS AUTOS, PROFERINDO-SE, A FINAL, DOUTO E EXEMPLAR ARESTO QUE JULGUE AS PRETENSÕES RECURSÓRIAS PROCEDENTES, COM TODOS OS DEVIDOS E LEGAIS EFEITOS.”.
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Cumpridos os vistos legais, nos termos do disposto no art. 657º, nº 2, do CPC, há que apreciar e decidir.
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Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigo 87º do CPT e artigos 608º, nº 2, 635º, nº 4, 639º, nºs 1 e 2 e 640º, do CPC (aprovado pela Lei nº 41/2013 de 26 de Junho) e importando conhecer de questões e não de razões ou fundamentos, a questão única a decidir e apreciar consiste em saber se o Tribunal “a quo” errou ao julgar extemporâneo o requerimento apresentado pela recorrente em 11.02.2021 e a decisão recorrida deve ser revogada, nos termos que a apelante defende.
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II – FUNDAMENTAÇÃO
A factualidade a atender para o conhecimento do presente recurso é a que consta do precedente relatório.
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Vejamos:
Insurge-se a recorrente contra a decisão recorrida pugnando pela sua revogação.
Fá-lo, reiterando os argumentos aduzidos, em 11.02.2021, aquando da apresentação do requerimento e pretensão deduzida junto do Tribunal “a quo”, de atribuição de efeito suspensivo ao recurso que apresentou em 14.01.2021, por considerar, como diz, ser “processualmente admissível a apresentação/dedução de incidente de prestação espontânea de caução por parte do recorrente - após a apresentação de recurso de condenação e respectiva motivação (nos termos do artº 81º do cód. do trabalho – diploma ao qual se reportarão todas as infra indicadas normas sem qualquer expressa menção em contrário), mas em momento anterior ao da prolação do despacho de admissão do mesmo pelo tribunal recorrido (nos termos do artº 82º), tudo tendo em vista a atribuição de efeito suspensivo àquele recurso” e defender que, citando novamente as suas palavras que, “d) - aquele mesmo procedimento pela recorrente adoptado (denominado de prestação espontânea de caução), em nada, mas absolutamente nada, atropela a ratio do artº 83º ao preceituar que o recorrente “...pode obter o efeito suspensivo se ... requerer a prestação de caução da importância em que foi condenado” (sic), sendo que a a ratio daquele instituto visa desde logo proteger o credor (ainda que não a título definitivo) e o decurso da normal tramitação processual (sem quaisquer incidentes impeditivos da subida do recurso e efeitos devolutivos do mesmo); e) - o que tudo justifica e justificará a referência a que aquela pretensão de atribuição de efeito suspensivo do recurso pode ser obtida “...se no requerimento de interposição de recurso...” (sic – artº 83º) for requerida tal prestação de caução que é processado nos próprios autos, visando o legislador com tal descrito procedimento (no requerimento de interposição de recurso), a celeridade e urgência na subida do recurso - tendo em vista a defesa dos princípios da segurança e certeza jurídicas que somente uma decisão definitiva (leia-se, já definitivamente transitada em julgado pode conferir a todos os sujeitos processuais); f) - o que não impede a posterior prestação espontânea de caução que, como sucedeu no caso em apreço, pese embora ter tido início em momento posterior ao da interposição do recurso, em nada afectou a normal tramitação do mesmo e direitos e garantias do recorrido”.
Assistir-lhe-á razão?
A resposta importa que nos debrucemos sobre o que na decisão recorrida ficou a constar, transcrevendo-a, novamente:
No que respeita à prestação da caução, afigura-se-nos que, face ao disposto pelo art. 83º, nº 2 do Código de Processo do Trabalho, a pretensão deduzida é manifestamente extemporânea, já que nos termos daquela disposição legal é condição para a atribuição do efeito suspensivo ao recurso que a prestação de caução seja requerida no requerimento de interposição do recurso e esse, no caso dos autos, foi apresentado em 14/01/2021, sem que tenha sido requerida a prestação de caução para atribuição de efeito suspensivo ao recurso, só requerida em 11/02/2021.
Indefere-se, pois, por extemporânea, a requerida prestação de caução com vista à atribuição de efeito suspensivo ao recurso interposto.
Custas do incidente pela ré, com 1 UC de taxa de justiça.
Notifique.”.
Esta a decisão impugnada que, importa se diga, antes demais, não temos dúvidas, se mostra omissa quanto à análise da pretensão colocada e deduzida pela ré/recorrente, no seu requerimento de 11.02.2021, que a mesma reitera, através do recurso, deve ser deferida na sequência da revogação daquela, seja a admissão de “Incidente de Prestação de Caução”, acentuando, na resposta que apresentou ao parecer proferido pelo Ex.mo Procurador Geral Adjunto, que a questão “se prende com a apresentação de incidente de prestação de caução propriamente dito;
III) – e não o expediente processual previsto no artº 83º do Cód. de Proc. do Trabalho;
IV) – tendo a Recorrente cuidado de apresentar incidente próprio de prestação de caução, já prestada (e que não foi objecto de qualquer impugnação por parte do Recorrido quanto á respectiva idoneidade e suficiência);
V) – o que tudo garante e garantirá ao Recorrido que o hipotético recebimento da quantia em apreço, quando e se for mantida a douta sentença de primeira instância, se mostra assegurado;
VI) – finalidade esta que a prestação espontânea de caução visa e evita a eventual e posterior prática de actos manifestamente inúteis, que a Lei proíbe, mormente através da prestação de caução em sede executiva...”.
Ora, da análise da decisão verifica-se que, a asserção constante da mesma que sublinhámos e colocámos a negrito, se limita a afirmar a extemporaneidade da pretensão deduzida de, atribuição de efeito suspensivo ao recurso apresentado pela recorrente em 14.01.2021, face ao disposto pelo art. 83º, nº 2 do Código de Processo do Trabalho, não se pronuncia quanto à questão, em concreto, colocada pela ré, do Incidente de Prestação Espontânea.
Não a aprecia e nada diz quanto à sua procedência ou improcedência, o que não é habitual nem espectável, atento o disposto no art. 608º nº 2 do CPC
Pois, nos termos deste dispositivo: “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras;…”.
E, se não o fizer, dispõe o art. 615º nº 1, do CPC, que a sentença é nula quando, nos termos da al. d): “O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar…”.
Verifica-se, assim, que a falta de inobservância deste dever de pronúncia sobre as questões que devesse conhecer - (no caso se pelo facto de ainda não ter sido proferido despacho a conhecer da interposição do recurso legitimava a recorrente a requerer, ainda, a prestação de caução) - será a nulidade da sentença ou do despacho impugnado – cfr. resulta do disposto naquela al. d), referida e do art. 613º, nº 3 do CPC.
Transpondo, o que acabámos de expor, para as considerações que tecemos sobre a decisão impugnada, a sua apreciação poderia acarretar a nulidade da mesma.
Em nosso entender, decorrente da não apreciação da questão que lhe foi colocada pela Ré/recorrente, como se prevê naquele art. 615º nº1, al. d).
No entanto, como supra consignámos, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente, cfr. art.s 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 2 do CPC, não podendo o tribunal conhecer de quaisquer outras questões “salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, cfr. art. 608º, nº 2 do mesmo diploma.
E, de entre estas questões, excepto no tocante àquelas que o tribunal conhece “ex officio”, o tribunal de 2ª instância, apenas, poderá tomar conhecimento das questões trazidas aos autos pelas partes, nos termos do art. 5º do CPC.
A nulidade supra referida, para que seja possível a sua apreciação, tem de ser arguida, nos termos do nº 4, daquele art. 615º.
Ora, o que se constata, das alegações é que a recorrente não o fez.
Não sendo, assim, possível fazer qualquer reparo, a este respeito, à decisão recorrida.
Mas, admitindo que o despacho recorrido contém, implicitamente, o entendimento de que o pedido de prestação de caução, para obter o efeito suspensivo do recurso, só pode ser formulado no requerimento de interposição de recurso e que formulado posteriormente é extemporâneo, cabe tecer as seguintes considerações: se ao recorrente é admissível apresentar requerimento de interposição de recurso e as alegações de recurso em separado, sempre dentro do prazo do recurso (entre outros o acórdão do STJ de 1.10.2003), por analogia, poderia o recorrente, dentro desse prazo mas ainda que em separado do requerimento de interposição de recurso, requerer a prestação de caução.
No entanto, não é o caso dos autos. Na verdade, como se verifica a sentença condenatória foi proferida em 01.12.2020 e foi notificada à Ré, em 03.12.2020, que interpôs recurso de apelação, em 04.01.2021, não tendo, porém, requerido a prestação de caução, o que só fez mais tarde, em 11.02.2021, muito para além do prazo que dispunha para recorrer.
Ou seja, a apelante não só não fez o pedido para obter o efeito suspensivo da apelação, nos termos prescritos no nº 2, do art. 83º, do CPT, como apresentou aquele pedido para além do prazo que dispunha para recorrer da sentença (art. 80º, nºs 2 e 3, do CPT).
Assim, não se vislumbra da análise da decisão recorrida a violação de qualquer outro dispositivo, nomeadamente, dos invocados pela recorrente, os art.s 704º e 906º e ss., do CPC e, em especial, o art. 83º do CPT.
O exposto implica a manutenção da decisão recorrida e total improcedência da apelação.
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III - DECISÃO
Nos termos expostos, acordam os juízes que constituem este Tribunal em julgar improcedente a apelação e manter a decisão recorrida.
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Custas pela recorrente.
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Porto, 20 de Setembro de 2021
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O presente acórdão é assinado electronicamente pelos respectivos,
Rita Romeira
Teresa Sá Lopes
António Luís Carvalhão