Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3746/18.3T8MTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RUI MOREIRA
Descritores: EMPREITADA DE CONSUMO
DENÚNCIA DOS VÍCIOS QUE REDUZEM OU EXCLUEM O SEU VALOR
EXERCÍCIO DOS DIREITOS DO DONO DA OBRA (CONSUMIDOR)
RESOLUÇÃO DO CONTRATO
DIVERGÊNCIA ENTRE OS DEFEITOS DENUNCIADOS E DOS DEFEITOS PROVADOS NA AÇÃO
Nº do Documento: RP202209133746/18.3T8MTS.P1
Data do Acordão: 09/13/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Indicações Eventuais: 2. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A uma “empreitada de consumo”, onde o dono da obra é um consumidor final, que a destina a uso não profissional, são aplicáveis as disposições previstas especificamente para relações de consumo, na Lei de Defesa do Consumidor (Lei nº 24/96, de 31/7) e no D.L. 67/2003, de 8/4 (este actualmente revogado pelo D.L. nº 84/2021, de 18/10).
II - O cumprimento perfeito de um contrato de empreitada implica que a obra convencionada seja entregue sem vícios que excluam ou reduzam o seu valor, ou a sua aptidão para o uso a que é destinada, o que não se verificará se a mesma não apresentar a qualidade que o consumidor pode razoavelmente esperar, atenta a natureza da obra em questão.
III - É essencial que os defeitos verificados pelo dono da obra, aquando da sua entrega pelo empreiteiro, lhe sejam denunciados, como condição do ulterior exercício de qualquer direito.
IV - No regime previsto no D.L. 67/2003, de cariz expressamente protector para com o dono da obra, em homenagem ao seu estatuto de consumidor, os direitos resultantes para o dono da obra em face dos defeitos que esta apresente têm idêntico conteúdo aos previstos no C. Civil. Porém não são de exercício sucessivo, mas sim independentes uns dos outros.
V - Quando seja legítima a resolução do contrato pelo dono da obra, não é essencial a plena coincidência entre os defeitos denunciados e aqueles que, ulteriormente apurados em acção judicial, vêm a justificar o direito à indemnização pelo prejuízo resultante dos defeitos.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: PROC. N.º 3746/18.3T8MTS.P1

Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim - Juiz 4

REL. N.º 707
Relator: Rui Moreira
Adjuntos: João Diogo Rodrigues
Anabela Andrade Miranda
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ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

1 - RELATÓRIO

AA, residente em 25 Rue ... – Luxemburgo, intentou acção declarativa de processo comum contra “H... Unipessoal, Lda.”, com sede na Rua ..., ... –Porto, (atualmente denominada “H1... UNIPESSOAL LDA”), “X...”, com sede em ..., Sintra, e “V... - Seguros S.A.”, com sede na Av. ..., Lisboa, pedindo a sua condenação a:
a) reconhecerem os defeitos que especifica, deixados na obra de remodelação efectuada no seu imóvel, por “H...”,
b) reconhecerem o atraso na entrega da obra, que se cifrou em 154 dias;
c) pagarem à autora uma sanção pecuniária compulsória de 150,00€ por cada dia de atraso na execução do sobredito, cifrando-se na quantia global de 23.100,00€ acrescida de juros vincendos até efectivo e integral pagamento;
d) pagarem à autora despesas de deslocação que suportou, no valor de 1.093,75€, e uma indemnização por lucros cessantes, de pelo menos 500,00€, acrescida de juros vincendos até efectivo e integral pagamento;
e) pagarem à autora o montante de 10.100,00€ acrescido de juros vincendos até efectivo e integral pagamento, correspondente ao custo dos trabalhos realizados pela “A... Lda.” para reparar os defeitos deixados, e, em consequência, ser decretada a irresponsabilidade da autora no pagamento das facturas n.ºs 19 e 20, emitidas pela ré “H...”;
f) verem arbitrada uma indemnização justa e equitativa por parte do tribunal, atendendo à má-fé demonstrada por parte da ré “H...”;
g) a pagarem, a título de indemnização por danos não patrimoniais, o montante global de 5.000,00€, acrescido de juros à taxa legal, a contar desde a citação até efectivo pagamento.
Alegou ter contactado a ré “X...”, conhecida como “M...”, para a realização de obras de remodelação do seu apartamento, correspondente ao quarto andar esquerdo, com entrada pelo n.º ..., do prédio sito na Avenida ..., na freguesia e concelho de Matosinhos, tendo sido reencaminhada e posteriormente contactada pelo Eng.º BB, no sentido de ser elaborado orçamento para realização do contrato de empreitada.
Um orçamento para a obra pretendida foi-lhe enviado em 19.09.2017 e foram acertados os trabalhos a realizar, o valor da obra e o prazo. A remodelação, uma vez a autora não reside em Portugal, iria ser realizada sem a sua supervisão e previa-se a sua conclusão no prazo máximo de 2 meses e meio, prazo este que se apresentou como condição essencial para a adjudicação da obra à ré “H...”, pois que a autora esperava ter a remodelação finalizada no início de 2018, por forma a garantir a estadia da sua filha e familiares que nessa altura viriam a Portugal.
Mais alegou que, volvidos os 2 meses e meio, começaram a ser veiculadas desculpas por parte do Eng.º BB para a não finalização da obra, o que levou a que pedisse a uma amiga para ver o estado da mesma. Esta, já em Fevereiro, viu a obra em estado bruto, quando haveria de ter sido finalizada cerca de 2 meses antes. Não obstante a alteração assim trazida para os seus planos, perante um cenário de hipotética não finalização de obra, o que lhe acarretaria prejuízos ainda maiores atento o valor já despendido na mesma, a autora anuiu a que a obra lhe fosse entregue até ao dia 16 de Abril de 2018. Então, tal como combinado entre ambos, a autora deslocar-se-ia a Portugal, acompanhada da sua filha e genro, para ver o efeito do pavimento que tinha sido combinado colocar (para além da expectativa da obra estar finalizada), tendo inclusivamente agendado com uma empresa de Paços de Ferreira uma deslocação ao apartamento para que pudessem tirar medidas e fazer encomenda do mobiliário.
Todos esses factos eram conhecidos da ré, que não deu conhecimento do estado do apartamento àquela data (não finalizado), para prevenir os custos inerentes à deslocação do Luxemburgo até Portugal por parte da autora, sua filha e genro, para recepção da obra.
Assim, aquando da chegada ao apartamento, o mesmo encontrava-se tal como em Fevereiro, completamente em bruto. Atento o atraso da obra, decidiu a autora agendar reunião para o dia 19 de Abril de 2018, na presença do seu mandatário, para que fosse alcançada uma solução consensual para a situação, atento ao incumprimento reiterado da ré “H...”. Ficou assim, uma vez mais, adiada a entrega da obra para 07.05.2018. Em tal data (19.04.2018) foram dadas indicações por parte da autora relativamente aos defeitos que a pouca obra realizada já padecia, sendo que a ré se comprometeu a rectificar os mesmos até ao dia 07.05.2018.
Todavia, continuou a alegar a autora, nessa data aprazada para a entrega da obra, apesar de ser intenção da ré fazê-lo, continuavam a existir os defeitos que a autora apontou, além de os trabalhos não estarem terminados. Concluiu, assim, que a ré entrou então em incumprimento definitivo. E afirmou que esta agiu com má-fé quanto à execução da obra, quanto à omissão de informação perante a autora e quanto aos “estratagemas ardilosos” utilizados após constatar que, efectivamente, não agiu conforme deveria, tentando fazer crer que a obra tinha sido entregue e aceite pela autora no dia 16.04.2018.
Referiu que, após vistoria à fracção, foram percepcionados, para além dos defeitos não corrigidos por parte da ré, danos no cerâmico da parede da cozinha. Além disso, a ré modificou a caixilharia da janela de um dos quartos que dá para a fachada do prédio, deixou por colocar painéis “blackout” nos quartos e a caixilharia da janela da cozinha ficou sem isolamento e desnivelada. Por tudo isso, conclui que a ré “H...” frustrou as suas expectativas de ter o apartamento pronto no início do ano de 2018, quanto mais não fosse para que a sua filha pudesse vir passar férias em Agosto, o que dificilmente poderia suceder.
Acresce que a ré enviou facturas para pagamento, tendo a autora declinado a responsabilidade pelo seu pagamento, atento o trabalho mal efectuado e a não finalização da obra. Mais alega ter ficado prejudicada com as deslocações que se viu obrigada a efectuar na expectativa de recepcionar a obra em perfeito estado, vendo-se face a um apartamento sem pavimento, tendo de recorrer a uma estadia num hotel por ser impossível habitar o seu imóvel.
Além disso, invocando a urgência na finalização das obras e resolução dos seus defeitos, a autora relata ter contratado os serviços da “A... Lda.”, para que o apartamento pudesse estar pronto para as férias da sua filha, o que importou num custo de 10.209,00€, superior ao reclamado nas facturas enviadas pela ré e que ascendem ao montante de 9.994,14€. Ainda assim, haverá vícios impossíveis de sanar a não ser com uma integral reformulação do apartamento.
Mais alegou ter sofrido danos não patrimoniais, pelos quais pretende ser indemnizada no valor de 5.000,00€, ao que deverá acrescer uma sanção pecuniária compulsória de 150,00€ por cada dia de atraso na entrega da obra, sendo que esse atraso se cifra em 154 dias, num total de 23.100,00€. A título de indemnização pelas despesas provocadas com a deslocação a Portugal, que resultou inútil e que a ré deveria ter prevenido, pretende a condenação dos RR. a pagarem-lhe 1.093,75€, a que deverá acrescer o valor de 1.000,00 que ela e a sua filha deixaram de auferir nessa altura, por causa da inútil viagem.
Por outro lado, alega ter dúvidas quanto à legitimidade da ré “H...” para reclamar o pagamento de quaisquer valores, já que foi a M... que foi contactada para execução dos trabalhos, sendo a ré “V...” demandada em razão do contrato de seguro celebrado com a ré “H...”.
Válida e regularmente citadas todas as rés contestaram.
A “H...” alegou que a autora tem uma filha, CC, que foi quem contactou a M... com vista à remodelação do imóvel em causa e com quem o representante da ré, Eng.º BB, contactou a acertou os detalhes relativos à realização da empreitada, na qualidade de franchisado na M.... Foram por isso ambas (autora e filha CC) a contratar com a ré “H...” a empreitada em causa nos autos. A referida empreitada foi solicitada e aceite, mediante apresentação de prévio orçamento datado de 19.09.2017, no montante de 29.219,24€, com IVA incluído, ocorrendo a adjudicação no dia 20.09.2017.
Impugnou, na sua generalidade, a factualidade alegada pela autora e narrou que realizou as obras com a celeridade e diligências possíveis, com alterações aos trabalhos e obras a mais e a menos solicitadas pela autora e sua filha, que implicaram atrasos. Contudo, o imóvel encontrava-se nessa altura desabitado, uma vez que a autora e sua filha se encontravam a viver no Luxemburgo e só precisariam do apartamento pronto em Agosto de 2018, como chegaram a referir expressamente ao representante da ré. Por conseguinte, o prazo de duração previsível de 2,5 meses foi meramente indicativo e nunca foi uma condição essencial para a realização da empreitada.
Alegou, ainda, que executou transportes de equipamentos e electrodomésticos a pedido da autora, que contribuíram para o atraso da obra, como foi o caso de um frigorífico tipo americano para a cozinha, de elevada dimensão e peso, que foi complicado colocar.
Entre os trabalhos não previstos, referiu a remoção do cilindro do WC, quando o orçamento só previa a remoção do armário no interior do qual se encontrava. Essa alteração acabou por atrasar a obra, já que o cilindro teve que ser removido para ser colocado na lavandaria, sendo que as ligações da água quente haviam sido anuladas por obra anterior, o que obrigou a refazer toda a instalação para a água quente. A autora também foi determinando alterações ao modelo inicialmente solicitado para a cozinha e só 6 meses depois da adjudicação é que apontou a solução definitiva. As sucessivas alterações na cozinha foram solicitadas pela autora, que nunca referiu qualquer problema sobre o atraso que a obra iria sofrer com isso, bem sabendo que esse atraso seria inevitável.
A isso acresceram limitações na realização dos trabalhos, em vários dias, a fim de não se fazer ruído ou fazer o menos ruído possível, a pedido de alguns vizinhos que pretenderam a não produção de ruídos até as 14 horas.
Descreveu ainda que a autora, no dia 16.04.2018, esteve no imóvel com o representante da ré, onde viram o estado das obras, agendando a entrega do imóvel para o dia 09.05.2018. Nessa altura o imóvel não tinha o pavimento colocado, pois seria das últimas coisas a realizar, a fim de não o danificar. Afirma ter terminado a obra, tendo-a entregue no dia 09.05.2018, com as chaves do imóvel, mas nem nessa altura, nem antes, a autora reclamou de qualquer defeito e muito menos solicitou a reparação de defeitos, pois os mesmos não existiam.
Quanto aos pagamentos a efectuar, refere que logo após a adjudicação da empreitada emitiu e enviou à autora a factura n.º ..., com data de 21.09.2017, no valor de 11.687,00€, que se reportou ao primeiro pagamento e que foi liquidada pela autora. Só voltou a emitir outra fartura passados cerca de 7 meses, com o n.º 16, de 11.04.2018, no mesmo valor de 11.687,00€, relativamente à qual a ré pagou 7.000,00€, no dia 13.04.2017 e 4.687,70€ após 16.04.2018. No final da empreitada a ré considerou “Trabalhos a menos” e “Trabalhos a mais”, tendo emitido depois duas facturas, as n.ºs ... e .... Só a partir do momento em que o representante da ré enviou as ditas facturas à autora esta iniciou um conjunto de reclamações com o único objectivo de não as pagar.
Salientou que, num email de 14.05.2018, com o qual remeteu a factura n.º ..., logo se mostrou disponível para qualquer correcção de algo que não tivesse ficado de acordo com a expectativas da autora, facultando um prazo de 10 dias para que esta agendasse dia e hora para as eventuais correcções. Contudo, a autora nada veio pedir, nem tão pouco deu oportunidade de corrigir eventuais desconformidades da obra que não estivessem dentro das suas expectativas.
Apenas no email de 15.05.2018 a autora reclamou, pela primeira vez, dos atrasos da obra e de defeitos da mesma. Alegou que, logo no dia 17.05.2018, respondeu, justificando o envio da factura, os atrasos na entrega da obra e os defeitos que haviam sido apontados, mostrando-se mais uma vez disponível para a reparação dos mesmos, o que levaria um dia de trabalho, solicitando o agendamento com 2 semanas de antecedência. O custo estimando para a correcção das situações em causa, incluindo a mão-de-obra, não ultrapassaria o montante de 500,00€.

Mais alegou que possui seguro válido mas já não na ré “V...”, o que constava do orçamento apenas por lapso, pois à data da obra e na presente data a possuí seguro na “Companhia de Seguros K..., S.A.”, actualmente com a apólice n.º ....
Deduziu, depois, reconvenção, pedindo a condenação da autora a pagar-lhe a quantia de 9.994,14€, acrescidos de juros legais à taxa de 7%, contados desde 14.05.2017 (data de vencimento das facturas não pagas) até à data da reconvenção (03.10.2018), os quais ascendem a 964,09€, no montante global de 10.958,23€.
Alegou, para o efeito que a empreitada foi orçamentada e adjudicada à autora/reconvinda e sua filha CC em 20.09.2017. Após a sua conclusão, e tal como acima já se referiu, a ré considerou “Trabalhos a menos” e “Trabalhos a mais”, tendo emitido as facturas n.ºs 19 e 20, relativas aos últimos trabalhos realizados, nos valores de, respectivamente, 5.843,84€ e 4.150,30€, as quais se encontram em dívida, peticionando o seu pagamento.
Contestou a ré “X...”.
Invocou a sua ilegitimidade processual passiva.
Alegou ser apenas a detentora da exploração da marca M... e que a ré “H...” e as sociedades de construção que atuam no mercado nacional sob essa marca, seus franquiados, são totalmente independentes, não tendo ela qualquer interferência no dia-a-dia das mesmas, sendo os franquiados que contratam diretamente com o consumidor final. Assim, rejeitou ter celebrado qualquer contrato com a autora.
Contestou a ré “V...”, impugnando por desconhecimento a factualidade alegada pela autora na petição. Reconheceu que a ré “H...” foi sua segurada ao abrigo da apólice de seguro nº ..., respeitante a um seguro de responsabilidade civil por danos decorrentes exercício da actividade profissional de engenharia. Mas acrescentou que esse seguro teve início no dia 01.01.2013 e foi válido até 30.12.2013, sem que se tivesse prorrogado para além desse prazo. Ora, os factos em causa nos autos ocorreram no segundo semestre de 2017 e no primeiro semestre de 2018, quando o seguro já não estava em vigor, em face do que se conclui que o sinistro está excluído do âmbito de cobertura da apólice. E mesmo que assim não fosse, o sinistro estaria sempre excluído do âmbito de cobertura da apólice.
Notificada das contestações, a autora, perante a reconvenção formulada pela ré “H...”, apresentou réplica, impugnando a factualidade na qual a mesma se alicerça e reproduzindo, no essencial, o teor da petição. Mais invocou a nulidade do contrato de empreitada, por mencionar um seguro inexistente, o que a ré usou como expediente tendente a transmitir uma segurança acrescida na celebração do contrato de empreitada, o que entende justificar a respectiva condenação como litigante de má-fé.
Notificada para o efeito, a autora pronunciou-se ainda sobre a matéria de excepção invocada pelas rés “X...” e “V...”, pugnando pela sua improcedência.
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Por despacho proferido em 07.06.2019, o qual consta de fls. 243, foi determinada a apensação aos presentes autos do processo n.º 83981/18.3T8MTS.
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Nesse processo, “H... Unipessoal, Lda.” (actualmente denominada “H1... UNIPESSOAL LDA”), formulou requerimento de injunção contra AA e CC, posteriormente distribuído como acção especial, pedindo a respectiva condenação no pagamento da quantia de 9.994,14€ a título de capital, acrescida de 92,00€ a título de juros vencidos, e de 40,00€ a título de indemnização pelos custos administrativos relativos à cobrança da dívida.
Alegou ter celebrado com as requeridas o contrato de empreitada supra referido, tendo executado as obras correspondentes, de cujo preço se encontram em dívida as facturas por si emitidas, com os n.ºs ... e ..., no valor global de 9.994,14€.
As requeridas apresentaram oposição, afirmando que o contrato em causa sido celebrado só com AA. Impugnaram toda a factualidade invocada pela requerente, alegando que o montante peticionado não é devido, que os trabalhos nunca foram terminados, que o prazo de 2 meses e meio contratado não foi cumprido e que, volvidos 8 meses sobre o início da obra, a mesma não se encontrava terminada. Acresce que nunca a obra foi entregue e aceite, tendo sido declinado o pagamento das facturas em causa. Mais alegaram que, sendo manifesto o incumprimento defeituoso da empreitada por parte da requerente, se viu AA forçada a contratar os serviços de outra empresa para sanar os defeitos existentes na obra, volvidos que foram mais de 5 meses do prazo limite para términus da mesma. Invocaram a nulidade do contrato de empreitada por vício/engano perpetrado pela requerente, decorrente do facto de o mesmo mencionar uma apólice de seguro caducada. O prazo que a requerente fixou para a realização da obra, bem como o facto de possuir alvará e seguro de responsabilidade de boa execução de obra, apresentaram-se como condições essenciais para que as requeridas celebrassem o contrato de empreitada com a requerente, sendo que se soubessem da inexistência de seguro válido, de alvará e da falta de cumprimento do prazo contratado para execução da obra, nunca as requeridas teriam contratado com a requerente.
Notificada para o efeito, a requerente pronunciou-se sobre as excepções deduzidas pelas requeridas na oposição, pugnando pela sua improcedência.
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Foi proferido despacho saneador, no qual se concluiu:
- pela verificação da excepção de ilegitimidade passiva da ré “X...”, demandada na acção principal, com a sua consequente absolvição da instância;
- pela verificação da excepção de litispendência relativamente ao pedido reconvencional deduzido pela ré “H...” na acção principal, com a consequente absolvição da autora da instância no que ao mesmo se refere;
- quanto ao demais, pela validade e regularidade da instância.
Foi fixado o objecto do litígio e foram indicados os temas da prova.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, na sequência do que foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, ficou o seguinte dispositivo:
“A) Julgo a ação principal parcialmente procedente por provada e, em consequência:
a) Condeno a ré “H... Unipessoal, Lda” (atualmente denominada “H1... UNIPESSOAL LDA”):
- a reconhecer que a obra de remodelação efetuada no imóvel da autora apresenta, por sua única e exclusiva culpa, os defeitos identificados no ponto 1.22. do elenco de factos provados;
- a reconhecer que ocorreu atraso na entrega da obra à autora;
- a pagar à autora as despesas por esta suportadas com a deslocação a Portugal no dia 16.04.2018, no valor de 196,36€, acrescido de juros de mora contabilizados à taxa legal de juro civil desde a citação até efetivo e integral pagamento;
- a pagar à autora o montante de 10.100,00€, acrescido de juros de mora contabilizados à taxa legal de juro civil desde a citação até efetivo e integral pagamento, pelos trabalhos de reparação dos defeitos realizados pela “A... Lda.” e pagos pela autora;
- a pagar à autora, a título de indemnização por danos não patrimoniais, o montante global de 1.500,00€, acrescido de juros contabilizados à taxa legal de juro civil desde a presente data até efetivo e integral pagamento.
b) Absolvo a ré “H... Unipessoal, Lda” (atualmente denominada “H1... UNIPESSOAL LDA”) do demais contra ela peticionado; e,
c) Absolvo a ré “V... S.A.” do pedido contra ela formulado.
Custas pela autora e pela ré “H...” na proporção dos respetivos decaimentos, os quais, considerando a condenação em custas já contida no despacho proferido em 29.10.2019, se fixam na proporção de 1/3 para cada uma delas.
(…)
B) Julgo a ação apensa parcialmente procedente por provada e, em consequência:
a) condeno as rés a pagarem à autora a quantia de 9.994,14€, acrescida de juros de mora contabilizados à taxa legal de juro civil desde a data de vencimento de cada uma das facturas e sobre o montante por cada uma delas titulado até efetivo e integral pagamento; e,
b) condeno as rés a pagarem à autora a quantia de 40,00€, em conformidade com o disposto no art.º 7º do DL n.º 62/2013 de 10.05.
Custas por autora e rés na proporção dos respetivos decaimentos.
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É contra esta sentença que a R. deduz o presente recurso, pretendendo a alteração da decisão da matéria de facto e concluindo pela necessária revogação da decisão na parte que, quanto a si, foi condenatória. Formulou as seguintes conclusões:
“ 1º. O presente recurso funda-se no disposto nos arts. 627.º, 629.º, 637.º, 638.º (nºs 1 e 7), 639.º, 640.º, 644.º, n.º 1, alínea a), 645.º, n.º 1, alínea a) e 647.º, n.º 2 e 3, todos do Código de Processo Civil.
2º. O presente recurso, sobre a matéria de facto e direito, com reapreciação da prova gravada (cfr. art. 638º nº 1 e 7 do C.P.C.), tem por objeto a alteração da decisão que foi erradamente julgada, i.e., julgou a ação principal parcialmente procedente por provada e, em consequência:
a) Condenou a ré “H... Unipessoal, Lda” (atualmente denominada “H1... UNIPESSOAL LDA”):
- a reconhecer que a obra de remodelação efetuada no imóvel da autora apresenta, por sua única e exclusiva culpa, os defeitos identificados no ponto 1.22. do elenco de factos provados;
- a reconhecer que ocorreu atraso na entrega da obra à autora;
- a pagar à autora as despesas por esta suportadas com a deslocação a Portugal no dia 16.04.2018, no valor de 196,36€, acrescido de juros de mora contabilizados à taxa legal de juro civil desde a citação até efetivo e integral pagamento;
- a pagar à autora o montante de 10.100,00€, acrescido de juros de mora contabilizados à taxa legal de juro civil desde a citação até efetivo e integral pagamento, pelos trabalhos de reparação dos defeitos realizados pela “A... Lda.” e pagos pela autora;
- a pagar à autora, a título de indemnização por danos não patrimoniais, o montante global de 1.500,00€, acrescido de juros contabilizados à taxa legal de juro civil desde a presente data até efetivo e integral pagamento.
- Custas pela autora e pela ré “H...” na proporção dos respetivos decaimentos, os quais, considerando a condenação em custas já contida no despacho proferido em 29.10.2019 (que na verdade foi no dia 04-10-2019), se fixam na proporção de 1/3 para cada uma delas.
Por outro lado, o Tribunal julgou ainda:
B) a ação apensa parcialmente procedente por provada e, em consequência:
a) condenou as rés a pagarem à autora a quantia de 9.994,14€, acrescida de juros de mora contabilizados à taxa legal de juro civil desde a data de vencimento de cada uma das faturas e sobre o montante por cada uma delas titulado até efetivo e integral pagamento; e,
b) condenou as rés a pagarem à autora a quantia de 40,00€, em conformidade com o disposto no art.º 7º do DL n.º 62/2013 de 10.05.
- Custas por autora e rés na proporção dos respetivos decaimentos.
3º. A decisão ora em crise teve por base uma errada apreciação dos elementos probatórios recolhidos, e por uma errada interpretação do Direito e da Lei, pelo que tem que se discordar da sentença proferida naqueles termos, que apreciou erradamente algumas das provas produzidas, mormente testemunhal e documental.
4º. Não pode a Ré Recorrente conformar-se com aquela decisão, por entender que i) a apreciação da prova produzida no processo impunha decisão distinta quanto à matéria de facto; ii) assim também, quanto à aplicação dos preceitos legais aplicáveis, que culminou, consequentemente, numa decisão que, não sendo conforme ao direito, não permite a realização da justiça.
5º. O Tribunal condenou erradamente em custas a Ré recorrente, pois julgou a ação apensa (B) parcialmente procedente, quando deveria ser totalmente procedente, dada a condenação das rés AA e CC a pagar à ali Autora H1... UNIPESSOAL LDA., a quantia de 9.994,14€, e ainda a quantia de 40,00€, em conformidade com o disposto no art.º 7º do DL n.º 62/2013 de 10.05., pelo que ao julgar “parcialmente” fê-lo certamente por lapso, já que condenou as rés em ambas as quantias peticionadas pela ali Autora H1..., e condenou em custas as partes na proporção dos respetivos decaimentos, quando não há decaimento da Autora H1... relativo à ação apensa.
6º. Por outro lado, na ação principal, o tribunal condenou erradamente em custas a Autora e a Ré “H...” na proporção dos respetivos decaimentos, tendo considerado a condenação em custas já contida no despacho proferido em 29.10.2019 – que não foi nesta data, mas em 04-10-2019 - e fixou as custas na proporção de 1/3 para cada uma delas, o que não faz sentido, face à absolvição da Ré V... S.A., e aos pedidos da Autora que estavam em causa (que totalizavam cerca de 40 mil euros), e à concreta condenação da Ré recorrente, que não chegou a 2 mil euros, atenta a reconvenção, da qual a sentença nem proferiu qualquer decisão, certamente por lapso.
7º. Entende a Recorrente ter sido incorretamente julgada a matéria de facto elencada nos seguintes Factos Provados, que não deveriam ter sido considerados como provados (mas antes não provados) ou teriam que ser alterados:
“1.7. A autora esperava ter a remodelação finalizada no início do ano de 2018.
1.9. A autora decidiu pedir a uma amiga para ver o estado da obra, sendo que esta, em Fevereiro de 2018, a viu ainda em estado bruto.
1.12. A autora decidiu prolongar o prazo para a entrega da obra para o dia 16 de Abril de 2018.
1.13. Tal como tinha sido combinado entre a autora e a ré, no dia 16.04.2018 a autora desloca-se a Portugal, acompanhada da sua filha e do seu genro, na expectativa de a obra estar finalizada, tendo inclusivamente agendado com uma empresa de Paços de Ferreira uma deslocação à fração para que pudessem tirar medidas e fazer encomenda do mobiliário necessário.
1.14. Essa deslocação era do conhecimento da ré “H...” que não se dispôs a dar conhecimento do estado da fração àquela data, no intuito de obstar a todos os custos inerentes à deslocação desde o Luxemburgo até Portugal, por parte da autora, sua filha e genro, para receção da obra.
1.16. Foi então que, atento o estado atrasado da obra, a autora decidiu agendar uma reunião para o dia 19 de Abril de 2018, com a presença do seu mandatário, para que pudessem obter uma solução consensual face ao atraso na execução da obra por parte da ré “H...”.
1.17. Na sequência dessa reunião, ficou uma vez mais adiada a entrega da obra, com o comprometimento por parte da ré “H...” de que tudo estaria finalizado no dia 07.05.2018, sem mais delongas.
1.18. Na data de 16.04.2018 foram indicados pela autora à ré defeitos que a parte da obra realizada já apresentava, nomeadamente, os elencados em 1.22. a), c), d) e e), sendo que a ré se comprometeu a retificar os mesmos até ao dia 07.05.2018, ficando ciente dos mesmos.
1.21. Na data aprazada para a entrega da obra, 07.05.2018, apesar de ser intenção da ré “H...” proceder à entrega da mesma, continuavam a existir os defeitos apontados pela autora na altura a que se alude em 1.18., apresentando os demais trabalhos executados desde então outros defeitos para além dessas.
1.22. Os defeitos apresentados pela obra em 07.05.2018 consistiam no seguinte:
b) Pinturas das paredes dos quartos e da sala com manchas;
c) Juntas entre cerâmicos mal betumadas em ambas as casas de banho;
d) Cerâmicos que revestem as paredes de uma das casas de banho mal colocados, no sentido de não ser assegurada a correta conjugação do desenho exibido pelos mesmos;
e) Junções entre os sanitários colocados nas casas de banho e os revestimentos cerâmicos mal betumadas;
f) Tampas de esgoto não embutidas no pavimento (salientes);
g) Manchas de tinta no pavimento flutuante colocado novo;
h) Pontos em que o pavimento flutuante colocado novo não encosta aos rodapés já existentes e em que é visível o espaço existente entre os dois;
i) Juntas de ligação entre o pavimento flutuante colocado novo e a mármore mal rematadas;
j) Junções entre os rodapés pré-existentes e o pavimento flutuante colocado de novo mal betumadas;
l) Deficiente remate entre o chão colocado novo na cozinha e o cerâmico já existente nas paredes;
m) Cerâmicos das paredes da cozinha danificados em consequência da aplicação do chão;
n) Calha para esconder tubo na cozinha inestética e mal aplicada;
o) Cerâmico da cozinha partido em consequência da passagem do tubo que a calha visa esconder;
p) Tomadas desalinhadas;
q) Caixilharia da janela colocada na cozinha sem isolamento e desnivelada;
r) Calha de junção entre o pavimento do hall e da cozinha não acompanha o recorte da ombreira;
s) Todas as madeiras do apartamento - portas, guarnições das portas e rodapés - estão mal lacadas e com massas mal aplicadas;
t) Parede feita de novo numa das casas de banho desnivelada;
u) Caixas de eletricidade desniveladas e mal colocadas;
v) Resguardos de duche com mau acabamento, nomeadamente, com juntas mal betumadas;
x) Rodapé com marcas de pregos;
z) Uma tomada e uma caixa de eletricidade sobrepostas;
aa) Manchas de tinta em várias partes da casa, a qual foi toda pintada;
bb) Portas lacadas com fissuras e furadas;
cc) Deficiente “emassamento” de paredes;
dd) Calhas de ligação entre espaços, ao nível do pavimento, mal cortadas;
ee) Estores colocados num dos quartos deixam passar a claridade;
ff) Manchas de tinta em tetos;
gg) Armário de um dos quartos empenado;
hh) Pavimento de uma das divisões mal colocado (assume várias direções);
ii) Rasgos para aplicação das caixilharias tortos;
jj) Aplicação de um armário numa das casas de banho com dimensões não contratualizadas (mais pequeno); e,
ll) Caixilharia da janela do quarto diferente das demais janelas existentes na fachada do prédio e no mesmo alinhamento dessa janela.
1.24. O mandatário da autora dirigiu à ré “H...” o email datado de 19.04.2018, junto aos autos a fls. 30 verso, ao qual anexou o comprovativo da transferência identificada em 1.23., referindo:
“Tal como reunião havida ontem, sou pelo presente a enviar, em anexo, comprovativo do pagamento do valor em falta relativo a uma das tranches.
Assim, reuniremos aquando da entrega da obra para que se possa chegar a acordo de valores atentos todos os prejuízos causados pelo atraso da obra (atraso de mais de 5 meses), bem como dos transtornos que causou à M/ Signatária uma vez se deslocar de propósito do Luxemburgo para aquisição da mobília quando o apartamento ainda está longe de ser finalizado.
Por forma a que tudo corra bem e que cumpra o prazo ontem combinado na N/ reunião para entrega da obra impreterivelmente no dia 07/05/2018, durante a próxima semana contacto-o para que consigamos reunir no apartamento.”
1.29. A situação a que se alude em 1.22. m) não existia antes da execução da obra pela ré “H...”.
1.30. Inexiste solução viável para a resolução da situação identificada em 1.22. m) que não a substituição dos cerâmicos danificados por outros iguais, a substituição de todos os cerâmicos caso inexistam cerâmicos iguais, ou a colocação de um rodapé com o intuito de esconder tais danos.
1.31. Foi orçamentada a “aplicação de estores interiores tipo “blackout” de rolo em vãos da habitação incluindo todos os acessórios e trabalhos complementares necessários a um perfeito acabamento”.
1.32. Num dos quartos da fração os estores colocados não são tipo “blackout”, tal como se refere em 1.22. ee).
1.35. Perante o que se refere em 1.17., a autora tinha a expetativa de ter o apartamento pronto, quanto mais não fosse, pelo menos para a sua filha vir passar férias em Agosto de 2018.
1.37. Com a deslocação a que se alude em 1.13., efetuada pela autora na expectativa de rececionar a obra, a mesma teve de recorrer a uma estadia num hotel, sendo que nessa data era impossível habitar a fração.
1.39. A autora teve de desmarcar com a empresa de Paços de Ferreira a que se alude em 1.13. a deslocação à fração, atento o facto de a mesma não estar pronta.
1.40. Para a eliminação dos defeitos identificados em 1.22., a autora contratou a empresa denominada “A... Lda.”
1.41. A autora tinha urgência na eliminação dos defeitos identificados em 1.22., para que a fração pudesse estar pronta pelo menos em Agosto, para as férias da sua filha, pelo que contratou a “A...”.
1.42. A “A...”, em 25.05.2018, elaborou um orçamento para a reparação dos defeitos elencados em 1.22., no valor de 8.300,00 €, sem IVA.
1.43. A autora pagou à “A...”, pela reparação dos defeitos elencados em 1.22., o valor de 10.209,00€, IVA incluído.
1.44. A autora ficou preocupada, desgostosa e angustiada com a situação do imóvel, tanto mais que se encontrava a longos quilómetros de distância.
8º. Por outro lado, entende a recorrente que, dos factos dados como não provados, alguns foram incorretamente julgados, e deveriam constar do capitulo dos factos considerados provados, concretamente os que abaixo se identificam:
2.10. As alterações aos trabalhos e as obras a mais e a menos solicitadas pela autora e pela sua filha CC implicaram atrasos na realização da obra.
2.11. A autora e a sua filha CC só precisariam do apartamento pronto no Verão de 2018, concretamente em Agosto, como chegaram a referir expressamente ao representante da ré, eng.º BB.
2.13. O transporte do frigorífico identificado em 1.55. contribuiu para o atraso da obra.
2.14. O representante da ré – eng.º BB – fez questão de saber a data exata em que a autora precisaria do imóvel, desde logo questionando a mesma nas várias conversas telefónicas que iam mantendo, recordando-se perfeitamente que logo no início da obra questionou se a autora precisaria do imóvel no Natal de 2017 (cerca de 3 meses após a data de adjudicação), ao que esta respondeu que não, exatamente por só precisar do imóvel em Agosto de 2018.
2.15. A remoção do cilindro da casa de banho a que se alude em 1.56. não estava prevista no orçamento, o qual só previa a remoção do armário da casa de banho mas não do cilindro que se encontrava dentro do mesmo, o qual a ré “H...” desconhecia na altura da realização do orçamento, tendo percebido esse facto mais tarde, quando abriram o dito armário.
2.16. A alteração referida em 1.56., não prevista, acabou por atrasar a obra.
2.17. As alterações à cozinha a que se alude em 1.57. implicaram um atraso na execução da obra.
2.18. O representante da ré, eng.º BB, falou diversas vezes com a autora e com a sua filha CC ao telefone, tendo ele próprio informado dos atrasos que a obra estava a sofrer, nomeadamente devido às contingências ocorridas, sem que tenha havido por parte daquela qualquer reclamação ou descontentamento.
2.19. A autora, na altura a que se alude em 1.69., sabia que a obra, na data de 16.04.2018, não estaria pronta.
2.20. Na altura a que se alude em 1.73., autora e ré “H...” agendaram a entrega do imóvel para o dia 07.05.2018.
2.21. Nem na data de 07.05.2018, nem antes, a autora reclamou de quaisquer defeitos na obra, pois os mesmos não existiam.
2.22. A autora e a sua filha nunca se queixaram relativamente aos trabalhos realizados pela ré “H...”.
2.23. O facto a que se alude em 1.77. era do conhecimento da autora e da sua filha.
2.24. Só a partir do momento em que o representante da ré enviou as faturas a que se alude em 1.28. e 1.29. à autora, com vista ao seu pagamento, esta iniciou um conjunto de reclamações, com o único objetivo de não pagar as mesmas.
2.25. No email a que se alude em 1.82., a autora, pela primeira vez, vem reclamar dos atrasos da obra e de desconformidades da mesma.
9º. Na visão da Ré ora recorrente, os meios probatórios que impunham decisão diferente incluem toda a prova documental junta aos autos pela autora e pela ré, nomeadamente:
• Orçamento inicial e suas alterações - TRABALHOS A MAIS e a menos (docs. 1, 2 e 3 da contestação da Ré);
• Todos os emails trocados pelas partes, incluindo os anexos / fotografias (docs. 4, 5, 6, 11, 12, 13, 14, 15 e 16 da contestação da Ré e ainda doc. 5 da Autora);
• Todos os documentos com fotografias juntas pelas partes (docs. 17, 18, 19 e 20 da contestação da Ré e ainda doc. 4 da Autora);
• Declarações de parte da Autora AA, gravadas em suporte digital no sistema aplicativo "Habilus Media Studio", assim como em suporte físico (CD), com início pelas 10.20 horas e términus pelas 12.19 horas, e cuja duração foi de 10 minutos e 36 segundos – art. 155º, n.º1 do C.P.C. (cfr. Ata de 03-02-2020, onde consta um erro, pois a duração foi de quase 2 horas e não de 10 minutos e 36 segundos);
• Declarações de parte do representante da Ré H1... UNIPESSOAL LDA., Eng. BB, registadas em suporte digital no sistema aplicativo "Habilus Media Studio", assim como em suporte físico (CD), com início pelas 14.17 horas e términus pelas 17.05 horas, e cuja duração foi de 2 horas, 48 minutos e 4 segundos – art. 155º, n.º 1 do C.P.C. (cfr. Ata de 30-06-2021).
• O depoimento da testemunha DD, cujo depoimento ficou gravado em suporte digital no sistema aplicativo "Habilus Media Studio", assim como em suporte físico (CD), com início pelas 14.25 horas e términus pelas 15.03 horas, e cuja duração foi de 28 minutos e 7 segundos – art. 155º, n.º 1 do C.P.C. (cfr. Ata de 30-10-2021).
10º. Da matéria de facto dada como provada e não provada, considera-se que houve erro do tribunal na apreciação das provas, testemunhal e documental (art. 640º do CPC), pois a decisão baseou-se em factos que considerou provados e não provados (acima identificados), que na realidade não deveriam ter sido considerados como tal e teriam que ser alterados, pois estão em contradição com a prova produzida e com a fundamentação do próprio tribunal.
11º. Desde logo os factos 1.16, 1.19, 1.20, dados como provados estão em contradição com os factos dados igualmente como provado nºs 1.38, 1.46 e 1.74, pois no dia 18-04-2018, a Autora voltou para o Luxemburgo, razão pela qual nunca poderia ter tido uma reunião no dia 19-04-2018, após voltar para o Luxemburgo, e por isso deve ser provado que a reunião foi dia 18-4-2018.
12º. Também o facto provado nº 1.24. não faz qualquer sentido para o apuramento da matéria de facto sem a referência ao errado endereço de email, atento o facto provado nº 1.77, onde se prova que a Ré não recebeu esse email, pois já usava um outro endereço de email nessa altura, cfr. facto provado nº 1.58, que prova que o email da Rrecorrente nesta altura era h....engenharias@gmail.com, - pelo que se a Ré não recebeu esse email, não teve conhecimento nem podia responder ao mesmo.
13º. O Doc. 3 junto com a Contestação da Ré – Trabalhos a Mais e a Menos – prova que foram efetuados vários trabalhos a mais e a menos, e foram acrescentados os seus custos nas contas finais, que deram origem às faturas em causa nos autos, o que era do conhecimento da Autora, que solicitou as alterações após a adjudicação da empreitada e já no decorrer dos trabalhos, o que levou a várias alterações na obra total e levaram necessariamente a um valor mais elevado a pagar pela Autora (fatura nº 20) e a um inevitável atraso na conclusão e entrega da obra.
14º. As alterações no desenho da cozinha solicitadas pela Autora foram feitas depois do inicio das obras, por isso era de prever uma alteração ao prazo que estava inicialmente estabelecido, pelo que a Autora se tinha que conformar com esse atraso na entrega da empreitada – cfr. facto não provado nº 2.10, e factos provados nºs 1.58 até 1.65, onde as partes trocam vários emails durante mais de um mês, a propósito das alterações na cozinha, já muito depois do inicio das obras.
15º. Considerar que as alterações e trabalhos a mais não provocariam atrasos na empreitada total vai completamente contra as regras da experiência comum.
16º. Ocorreram ainda várias contingências na obra que não estavam previstas ou orçamentadas, como o transporte e instalação de vários eletrodomésticos, sobretudo de um frigorifico americano pelas escadas, pois não coube no elevador (cfr. facto provado 1.55. e facto não provado 2.13), o que teria que levar a um atraso na obra, nem que fosse de algumas horas ou de uma manhã pelo menos, pois carregar um frigorifico americano pelas escadas até ao 4º andar levaria o seu tempo.
17º. Também foram relevantes as limitações nos trabalhos da parte da manhã até às 14 horas durante vários dias, devido ao pedido dos vizinhos de baixo para não se fazer barulho, pois pretendiam descansar por serem médicos (cfr. facto nº 1.66), sendo que estes factos ficaram provados (cfr. facto nº 1.55 e 1.68) e levaram naturalmente a um atraso relevante nos trabalhos, ainda que não quantificado em dias, tendo a Autora tido conhecimento e dado o seu consentimento e este pedido, pelo que tinha que se conformar com esse atraso, o que levaria a uma alteração no prazo e na data da entrega da obra, que teria que ser devidamente levado em conta pelo Tribunal.
18º. A Ré só reconheceu o atraso da obra em abril de 2018, através de email, e não antes (cfr. facto 1.11), porque, para a Autora, não havia atraso antes dessa altura, face às alterações solicitadas e a todas as contingências e a Autora nunca se tinha queixado de qualquer atraso, nem há emails nesse sentido, mesmo depois do prazo inicialmente previsto de 2 meses e meio, que naturalmente nunca foi importante para a Autora para a realização da empreitada, como considerou o próprio tribunal – cfr. factos não provados 2.1, 2.2, 2.3..
19º. A provar isso está também o email da Autora em resposta à Ré, enviado dia 11-04-2018, às 15,25h, em que refere apenas que vai enviar 30% do valor a pagar, mas não se queixa de qualquer atraso na obra.
20º. Os factos dados como provados nºs 1.52, 1.57, 1.58, 1.59, 1.60, 1.61, 1.62, 1.65, estão em contradição com o facto não provado nº 2.17, pois ao ficaram provadas várias alterações ao desenho da cozinha a pedido da Autora, estas alterações teriam que levar a um significativo atraso no prazo total da obra e a Autora teria que se conformar com esse atraso.
21º. Das declarações de parte da Autora resultaram diversas contradições, mentiras e incoerências, e o seu discurso contraria as regras da experiência comum e a restante prova junta aos autos, mormente documental, como sejam os vários emails trocados pelas partes, e que o tribunal não considerou para efeitos de prova.
22º. A Autora mentiu quando disse que em abril veio receber a obra, e que a mesma não estava pronta e tinha a sensação que nem ia a meio, nem na fase de acabamentos, e depois muda o discurso para dizer que em abril afinal a obra até estava adiantada e com algumas coisas prontas, como as casas de banho e que logo nessa altura apontou defeitos, mas tal não faz sentido, pois não enviou qualquer comunicação escrita nesse sentido nos dias seguintes, o que contraria as regras da experiência comum, tanto mais que as partes foram sempre comunicando via email.
23º. O Tribunal teria que considerar na decisão que não há um único email dirigido à Ré a apontar defeitos, após a visita à obra de abril de 2018, mesmo após o mandatário da Autora enviar um email para a Ré no dia 19-04-2018, para o endereço da Ré errado (cfr. facto provado nº 1.24, e nº 1.77, onde se dá como provado que a Ré não recebeu esse email).
24º. Se nessa altura existissem defeitos na obra, no caso da casa de banho (facto 1.18), que tivessem sido apontados pela Autora na reunião, teriam que ser referidos pelo mandatário nesse email, o que não sucedeu.
25º.Se existissem defeitos nessa altura, com certeza que a Autora não iria pagar mais um valor à Ré, logo após a visita ao imóvel, sem reclamar eventuais defeitos.
26º.Pelo que não faz sentido e vai contra as regras da experiência comum a Autora dizer em audiência que apontou defeitos na obra logo em abril (facto 1.18), pessoalmente ao eng. BB, na visita ao imóvel, quando depois não se refere nada sobre esta matéria em email enviado pelo seu mandatário no dia 19-4-2018, após a visita ao imóvel.
27º.A visita ao imóvel em abril nunca foi marcada para a entrega da obra, pois no dia 11-4-2018, as partes trocaram emails em que era evidente que a casa não estaria pronta no dia 16 de abril, nem se menciona qualquer referência à entrega da obra para o dia 16-4-2018.
28º.O email enviado pelo representante da Ré à filha da Autora, no dia 11 de abril de 2018 às 14:55, refere que a Autora não teria que pagar todo o valor (dos 40%), mas apenas uma parte, o que demonstra que se a casa estivesse pronta para entrega em abril, seria logo solicitado todo o valor do orçamento e não apenas uma parte dos segundos 40%.
29º.Nessa altura, a Autora só tinha pago ainda os primeiros 40% do orçamento, faltando ainda pagar 60%, sendo certo que o orçamento – Planeamento da obra (doc. 1 da contestação) – previa o pagamento dos segundos 40% a meio da obra e o restante na entrega, pelo que a obra nunca poderia estar pronta nessa altura, se ainda faltava pagar 60% do orçamento e a Ré nem pediu a totalidade dos 40% do orçamento no email enviado dia 11-4-2018.
30º.A Autora acabou por responder ao email do Eng. BB nesse dia 11 de abril de 2018 às 15:25, cerca de meia hora depois do email do Eng. BB, onde refere apenas o seguinte: “Vou enviar 30% e a hora já estava marcada desde que lhe informei que iria mos á Portugal. Isto é às 9H da manhã no apartamento segunda feira dia 16 de Abril ..até breve”.
31º.A Autora refere nessa altura que até já estaria marcada a hora, desde que informou que viria a Portugal, pelo que a Autora já tinha planeado vir a Portugal, mas obviamente não para rececionar a obra, mas apenas para ver como estavam os trabalhos.
32º.No dia 13-04-2017, a Autora efetuou uma transferência no montante de 7.000,00€ por conta da fatura nº 16 (no valor de 11.687,70€), deixando outra parte do valor para pagar mais tarde, após ver a empreitada, no dia 16-04-2018, como acabou por pagar, no dia 19-4-2018, o que leva a concluir que não havia reclamações ou defeitos em abril, pois se houvesse a Autora não teria efetuado estes 2 pagamentos seguidos sem reclamar.
33º.Não faz por isso sentido o discurso da Autora, nas suas declarações de parte, quando refere que veio a Portugal em abril para receber a obra e que nessa altura apontou defeitos à mesma, até porque, após chegar ao Luxemburgo, no dia 19-4-2018, a Autora liquidou a parte da fatura nº 16 que estava por pagar, no valor de 4.687,70€, sem qualquer reclamação.
34º. Com este pagamento ficou liquidada a totalidade da segunda fatura emitida, equivalente a 80% do valor orçamentado inicialmente, ficando por pagar os 20% finais, que seriam pagos naturalmente com a receção da obra, em maio, como previa o orçamento e adjudicação da obra, devidamente assinada pela Autora.
35º.A Autora, após a entrega da obra, no dia 7 de maio de 2018, que foi a data acordada com a Ré aquando da visita ao imóvel em abril, chamou de imediato uma outra empresa, para corrigir aquilo que entendia não estar bem feito, sem contactar ou chamar a Ré para corrigir o que fosse necessário, tendo assumido essa responsabilidade e risco por sua conta.
36º.Com esse comportamento a Autora não permitiu que a Ré pudesse voltar ao imóvel para corrigir eventuais defeitos ou desconformidades, apesar do representante da Ré se ter mostrado totalmente disponível para o fazer, como a própria até admitiu, pois recebeu emails nesse sentido.
37º. No dia 14 de maio de 2018 às 21:51, o representante da Ré enviou email à Autora e sua filha, com conhecimento do seu mandatário, onde remeteu a última fatura, tendo manifestado estar disponível para eventuais correções de situações que não tivessem ficado de acordo com a expectativas da Autora, “nomeadamente a colocação das grelhas de ventilação da casa de banho e os retoques na tinta dos rodapés”, que naturalmente teria sido algo que foi percecionado com a entrega da obra no dia 7 de maio, facultando um prazo de 10 dias para a Autora agendar um dia e hora para as eventuais correções, pois era algo simples e rápido de se fazer.
38º. Após a entrega da obra, o representante da Ré mostrou-se totalmente disponível para poder proceder a eventuais correções na obra ou desconformidades, sem qualquer custo para a Autora, bastando a esta agendar uma data, o que esta não fez nem permitiu, como a própria admitiu.
39º. Só no dia 15 de maio de 2018 às 15:35 o representante da Autora envia um email à Ré onde reclama do envio da fatura nº 20, e os atrasos da obra, tendo pela primeira vez enunciado alguns defeitos da mesma, considerando que a obra havia ficado num “estado lastimável”, juntando 14 fotografias desses alegados defeitos, que, vendo bem as fotos, afinal eram poucos e de fácil resolução.
40º. Esses defeitos que foram pela primeira vez denunciados, nada têm a ver com os que depois surgem na PI e deram origem aos presentes autos, que a Ré desconhecia totalmente e que nunca tinha sido confrontada com tais defeitos, como provam os vários emails trocados pelas partes, não tendo tido sequer a hipótese de os ver no imóvel e muito menos de os corrigir, o que teria que ser considerado pelo Tribunal.
41º. No dia 17 de maio de 2018 às 18:11, o representante da Ré respondeu ao mandatário da Autora, com conhecimento desta e da sua filha, onde explicou o envio da fatura, os atrasos na entrega da obra, e refere-se expressamente aos defeitos que haviam sido apontados no dia 15, com as 14 fotografias, mostrando-se mais uma vez disponível para a reparação desses apontados defeitos, cumprindo assim as suas obrigações legais, que o tribunal não considerou.
42º. A Autora assumiu que chamou de imediato outra empresa para efetuar trabalhos que se desconhecem quais foram, pois o orçamento da empresa A... datado de 25-5-2018 e o recibo junto aos autos, datado de 23-7-2018 é um orçamento “normal” e não menciona que os trabalhos seriam para corrigir defeitos de obra realizada anteriormente, para além de que não há fotografias dos trabalhos efetuados pela A... ou do estado em que ficou o imóvel após essa alegada correção, apesar de ter sido sugerida a sua junção, por requerimento da Ré aos Autos do dia 08-09-2021 (na sequência da junção pela Autora das 40 fotos originais) que nunca obteve resposta.
43º. A Autora deu entrada dos presentes Autos em 12-07-2018, onde juntou cerca de 40 fotografias a apontar defeitos na obra, cujas circunstâncias se desconhecem, pois não são fotografias datadas, não se sabendo em que momento foram tiradas, por quem e até se seriam daquela obra em causa (dado algumas fotos revelarem detalhes com muita proximidade).
44º. Tais fotografias não deveriam chegar para fazer prova segura dos defeitos mencionados no facto provado nº 1.22., sendo que a maioria deles acabam por ser denunciados na própria PI, pois nunca antes a Ré havia sido confrontada com esses defeitos, o que era crucial na decisão do Tribunal, no sentido de não poder responsabilizar a Ré pela reparação desses defeitos.
45º. A Autora assumiu que não efetuou qualquer perícia, avaliação ou relatório ao imóvel com vista a detetar defeitos na obra, e que não informou nem permitiu que a Ré voltasse à obra para corrigir os defeitos que entendia existirem, o que o tribunal ignorou na sua decisão e era relevante para se provarem todos os defeitos e os custos de reparação dos mesmos.
46º. A Autora referiu em audiência que a nova empresa que contratou, efetuou os trabalhos rapidamente, em cerca de 2 semanas, o que também confirma que os defeitos existentes na obra, seriam de resolução simples e rápida para a Ré, se tal oportunidade lhe tivesse sido dada, como prescreve a lei.
47º. O recibo emitido pela A... é datado de 23-7-2018 e menciona uma fatura (nº 13) datada de 18-7-2018, que não consta dos autos, pelo que não há descrição com detalhe dos trabalhos efetuados, em termos de custo de cada tarefa, de mão de obra, de material, de IVA correspondente ao material e mão de obra, não podendo por isso o tribunal dar como provada esta factualidade (factos 1.40 a 1.43).
48º. Os presentes autos deram entrada a 12-7-2018 (data da PI), ainda antes da emissão da fatura mencionada no recibo da A..., ou seja, a Autora avançou para Via Judicial antes dos trabalhos da A... estarem prontos e de ser emitida e paga a fatura da A....
49º. Tal factualidade demostra que a Autora assumiu por sua conta e risco a alegada obra que contratou com a A..., cujos trabalhos foram por si escolhidos, sem a intervenção de qualquer entidade isenta e credível que pudesse apontar os alegados defeitos e o custo de reparação dos mesmos, e sem ter sido dada a oportunidade à Ré de se manifestar, ver ou corrigir os defeitos que a Autora entendia que existiam, o que é inadmissível.
50º. A Autora até poderia voltar a refazer toda a obra, com os materiais que bem quisesse, desde que assumisse esses custos, mas não poderia depois responsabilizar a Ré pela sua opção, sem dar oportunidade a esta de participar neste processo de correção de defeitos, pelo que não se aceita como provado o facto 1.22, com a maioria dos defeitos que apenas surgem na PI pela primeira vez.
51º. As declarações do representante da Ré, eng. BB, foram honestas e verdadeiras, e vão de encontro à restante prova produzida, como sejam os emails trocados pelas partes, onde não há reclamações sobre o atraso na obra antes de abril, e onde nunca foram reclamados defeitos até serem enviadas as 2 faturas finais à Autora para pagamento.
52º. A testemunha DD afirmou no seu depoimento que não sabia que obras foram realizadas pela Ré antes da sua intervenção, assim como não sabia como estava o imóvel antes das obras realizadas pela Ré recorrente e não sabia o que foi orçamentado pela Ré e contratado pela Autora, desconhecendo ainda os documentos que estiveram na base desse contrato empreitada, nomeadamente o orçamento, os trabalhos a mais e a menos e as alterações solicitadas, razão pela qual não poderia esta testemunha analisar ou opinar as obras feitas pela Ré, pois não as conhecia.
53º. Nem poderia ter sido considerado pelo Tribunal o depoimento desta testemunha ao comentar as fotografias em audiência, juntas pela Ré, se não conhecia as circunstâncias em que foram tiradas, por quem, em que dia e em que momento.
54º. Era previsível que esta testemunha iria falar dos trabalhos que efetuou e que lhe foram solicitados pela Autora, mas não se provou qualquer relação entre os trabalhos efetuados pela empresa desta testemunha – A... – e os trabalhos efetuados pela Ré recorrente, no sentido em que os trabalhos efetuados pela Ré terem sido corrigidos pela A..., pois a testemunha não sabia das obras antes da sua intervenção.
55º.Assim, o depoimento da testemunha DD em nada poderia demonstrar ou provar que os trabalhos que efetuou serviram para corrigir defeitos na obra da Ré, que aliás afirmou desconhecer, razão pela qual não podia o tribunal dar como provados os factos 1.22., 1.30., 1.31., 1.32., 1.40., 1.41., 1.42., 1.43., para além de outros em que a testemunha não teve intervenção, como os relacionados com o atraso na obra.
56º.O tribunal só poderia, no máximo, confirmar e imputar à Ré os defeitos apontados pelo mandatário da Autora no dia 15 de maio de 2018, no email enviado à Ré com as 14 fotografias, pois só esses cumpriram os requisitos legais quanto à denúncia de defeitos e não há qualquer outra comunicação escrita a denunciar defeitos.
57º.O tribunal teria que dar como provado (como deu no facto 1.26.) e relevante para a decisão final, no sentido de não responsabilizar a Ré pela correção dos defeitos, porque esta, através do seu representante, Eng. BB, se mostrou totalmente disponível para corrigir os defeitos apontados (email de 14 de maio de 2018 e email de 17 de maio de 2018) sendo que neste último email até se reportou a cada um dos defeitos que foram apontados pelo mandatário da Autora e não a outros porque não lhe foi dado conhecimento de outros defeitos, que depois surgem na PI.
58º.O tribunal recorrido tinha que ter analisado com rigor a prova testemunhal e declarações de parte em conjunto com a prova documental, nomeadamente os emails trocados pelas partes e o orçamento da Ré recorrente, para concluir que as declarações de parte da Autora e da sua filha (Rés na ação apensa), mais não foram que condizentes no sentido de se furtarem ao pagamento das faturas em falta.
59º.A Autora não alegou nem demostrou qualquer incumprimento contratual da Ré recorrente, nem a exceção do não cumprimento, pois não se verificou tal exceção.
60º.O tribunal analisou e julgou igualmente mal a questão do atraso na obra e da condenação em indemnização por danos não patrimoniais, no montante global de 1.500,00€, pois a Ré nunca esteve em mora, uma vez que, “o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.” – Art.º 805.º, do C.C., o que não foi o caso nos presentes autos, pois nunca a Ré foi interpelada.
61º.A Autora nunca interpelou a Ré sobre os atrasos na obra e as suas eventuais consequências, como a perda de interesse, a resolução contratual, o incumprimento definitivo ou exceção de não cumprimento.
62º.O tribunal não levou e conta as regras legais que balizam esta matéria,
63º.E decidiu mal ao julgar parcialmente procedente a ação principal, condenando a Ré a reconhecer os defeitos elencados em 1.22., que nunca foram denunciados nos termos legais – cfr. art. 1225º, n.º 2 do C.C. e art. 5º-A, n.º 2 do DL n.º 67/2003.
64º.Não poderia ter sido julgada procedente a condenação da Ré na culpa nos defeitos elencados em 1.22.,
65º.Nem a condenação da Ré em reconhecer que ocorreu atraso na entrega da obra à Autora, com as consequências que daí advieram, como a indemnização em 1.500,00€ e as despesas com a deslocação da Autora a Portugal no dia 15-4-2018 (e não 16-4-2018 como refere a sentença).
66º.Assim como foi erradamente julgada a condenação da Ré a pagar à Autora o montante de 10.100,00€ pagos por esta à “A... Lda.”, pois a Ré recorrente mostrou-se disponível para corrigir os defeitos apontados, foi impedida de corrigir qualquer tipo de defeito, e não se provou que os trabalhos realizados pela A... tenham sido executados exclusivamente para corrigir os defeitos da obra realizada pela Ré.
67º.Não podia o Tribunal ter concluído pela existência de um incumprimento definitivo - que não foi sequer alegado na PI da Autora - fundado na perda do interesse objectivo (cfr. pag. 51 da sentença).
68º.Para que se tivesse provado um atraso com consequências para a Ré, teria a Autora que ter provado que havia comunicado por escrito à Ré no sentido de advertir esta que, se não cumprisse com a entrega da obra num certo prazo concedido, deixaria de ter interesse no contrato, transformando-o em incumprimento definitivo, podendo, então, resolver o contrato, o que nunca aconteceu.
69º.Não tendo a Autora percorrido tal caminho, teria de concluir-se, ao contrário do que considerou a sentença ora em crise, que a perda de interesse ou incumprimento definitivo não tem fundamento legal, nem podia o Tribunal substituir-se à Autora e considerar algo que não foi alegado ou provado.
70º.A matéria em causa (defeitos de obras, denúncia de defeitos, perda de interesse) já foi objeto de acórdãos dos Tribunais superiores, que têm entendido que o empreiteiro, após a denúncia dos defeitos pelo dono da obra dentro do prazo legal para o efeito, tem o direito (e o dever) de corrigir os mesmos por sua conta, antes de uma eventual ação judicial, como foi o caso dos autos.
71º.Por conseguinte, não poderia o tribunal julgar a ação principal parcialmente procedente e, em consequência, condenar a Ré recorrente nos pedidos já mencionados, pois esta teria que ter o direito a conhecer todos os defeitos e a corrigir os mesmos, o que lhe foi negado pela Autora.
72º.Assim, a douta sentença não ponderou bem sobre as provas produzidas, mormente a testemunhal e documental, o que levou a um resultado errado e contrário à lei, que não deveria ter ocorrido, no que à ação principal diz respeito, assim como em relação às custas, em ambas as ações.
73º.Consequentemente, deve a sentença proferida ser substituída por outra que i) declare a absolvição da Ré recorrente de todas as condenações descritas na ação principal, por inexistência de incumprimento contratual, e ii) mantenha a condenação das Rés AA a CC na ação apensa, mas com as inerentes custas exclusivamente a cargo destas.
74º.A douta decisão recorrida violou nomeadamente os artºs. 805, nº 1, 808º, nº 1 e 2, artº 1207 e ss., artº 1218º e ss, artº 1221º do Código Civil.
Termos em que se requer que o recurso seja julgado procedente e, consequência seja a sentença recorrida revogada, alterando-se a mesma, no sentido de declarar a absolvição da ré recorrente de todas as condenações descritas na ação principal, mantendo-se a condenação das rés AA a CC na ação apensa, mas com as inerentes custas exclusivamente a cargo destas, tal como se contempla nas conclusões aduzidas, fazendo assim vossas excelências inteira, sã e costumada justiça!”
A A., recorrida, não apresentou resposta ao recurso.
O recurso foi admitido como apelação, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo.
Foi recebido nesta Relação, onde cabe decidi-lo.

2- FUNDAMENTAÇÃO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - arts. 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 3 do CPC.
Assim, cumprirá decidir as seguintes questões:
- Se o dispositivo da sentença, na apreciação do pedido da acção apensa, incorreu em erro, pois deveria tê-lo classificado como inteiramente procedente e não como parcialmente procedente, com reflexo na imputação das custas, pois não houve ali qualquer decaimento da ora apelante;
- Se a decisão sobre a imputação da responsabilidade por custas, no âmbito da acção principal, esqueceu o despacho de 4/10/2019, que já decidira quanto a custas;
- Se foi omitida decisão quanto ao pedido reconvencional, da qual resultará que a condenação da ré, ora apelante, deve ser de menos de 2.000,00€;
- se deveriam ser dados por não provados os factos que o tribunal considerou provados sob os nºs 7, 9, 12, 13, 14, 16, 17, 18, 21, 22, 24, 29, 30, 31, 32, 35, 37, 39 a 44.
- se deveriam ser dados por provados os factos que o tribunal considerou não provados sob os nºs 10 e 11, 14 a 25.
- se ocorre contradição entre os factos provados 16, 19 e 20 e os 38, 46 e 74.
- se ocorre contradição entre o facto provado 24 e os 58 e 77.
- se ocorre contradição entre os factos provados 52, 57 a 62 e 65 e o não provado 17.
- se não ocorreu um incumprimento definitivo do contrato, pela apelante, fundado na perda de interesse objectivo, por a autora não lhe ter denunciado defeitos nem dado prazo para a sua correcção.
*
Na solução das questões descritas, importa ter presente a decisão sobre a matéria de facto controvertida, constante da sentença recorrida, que se passa a transcrever:
1.1. A autora é proprietária da fração autónoma designada pelas letras “CC”, destinada a habitação, correspondente ao quarto andar esquerdo, com entrada pelo n.º ..., do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Avenida ..., na freguesia e concelho de Matosinhos, descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o número ... e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ....
1.2. A autora encetou diligências no sentido de procurar empresas especializadas na área para remodelação da referida fração, tendo contactado para o efeito a empresa conhecida por M....
1.3. Foi então reencaminhada e posteriormente contactada pelo eng.º BB, legal representante da ré “H...”, no sentido de ser elaborado orçamento para realização da obra.
1.4. Após retificação do primeiro orçamento enviado, foi enviado para a filha da autora o “Orçamento” com a “Ref. Orç.: ML97b-2015” junto aos autos a fls. 108 a 111, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
1.5. Desse orçamento, datado de 19.09.2017, constam os trabalhos a realizar, o valor da obra e, relativamente ao prazo, a seguinte menção: “Para a realização desta obra prevemos a duração de 2,5 meses”.
1.6. A remodelação da fração, uma vez que a autora não se encontrava a residir em Portugal, iria ser realizada sem a supervisão da mesma, dando a ré “H...” a garantia de que tudo iria decorrer tal como proposto e requerido pela autora.
1.7. A autora esperava ter a remodelação finalizada no início do ano de 2018.
1.8. Volvidos que foram os 2 meses e meio a que se alude em 1.5., a obra não estava finalizada.
1.9. A autora decidiu pedir a uma amiga para ver o estado da obra, sendo que esta, em Fevereiro de 2018, a viu ainda em estado bruto.
1.10. Até essa data a autora havia transferido, sempre que lhe foi solicitado, verbas para a ré “H...” realizar a obra.
1.11. A ré “H...”, a partir de data não concretamente apurada mas posterior ao decurso do prazo a que se alude em 1.5. e anterior a 11.04.2018, assumiu o atraso na realização da obra.
1.12. A autora decidiu prolongar o prazo para a entrega da obra para o dia 16 de Abril de 2018.
1.13. Tal como tinha sido combinado entre a autora e a ré, no dia 16.04.2018 a autora desloca-se a Portugal, acompanhada da sua filha e do seu genro, na expectativa de a obra estar finalizada, tendo inclusivamente agendado com uma empresa de Paços de Ferreira uma deslocação à fração para que pudessem tirar medidas e fazer encomenda do mobiliário necessário.
1.14. Essa deslocação era do conhecimento da ré “H...” que não se dispôs a dar conhecimento do estado da fração àquela data, no intuito de obstar a todos os custos inerentes à deslocação desde o Luxemburgo até Portugal, por parte da autora, sua filha e genro, para receção da obra.
1.15. Aquando da chegada à fração, na data aprazada por autora e ré “H...”, a obra não estava pronta, designadamente, o pavimento não estava colocado.
1.16. Foi então que, atento o estado atrasado da obra, a autora decidiu agendar uma reunião para o dia 18 de Abril de 2018, com a presença do seu mandatário, para que pudessem obter uma solução consensual face ao atraso na execução da obra por parte da ré “H...”. (data rectificada, conforme decisão infra).
1.17. Na sequência dessa reunião, ficou uma vez mais adiada a entrega da obra, com o comprometimento por parte da ré “H...” de que tudo estaria finalizado no dia 07.05.2018, sem mais delongas.
1.18. Na data de 16.04.2018 foram indicados pela autora à ré defeitos que a parte da obra realizada já apresentava, nomeadamente, os elencados em 1.22. a), c), d) e e), sendo que a ré se comprometeu a retificar os mesmos até ao dia 07.05.2018, ficando ciente dos mesmos.
1.19. Na data de 19.04.2018 o pavimento ainda não se encontrava colocado.
1.20. Desde a chegada da autora e da sua filha à fração no dia 16.04.2018 e até ao dia 19.04.2018, foram realizados trabalhos na obra pela ré “H...”.
1.21. Na data aprazada para a entrega da obra, 07.05.2018, apesar de ser intenção da ré “H...” proceder à entrega da mesma, continuavam a existir os defeitos apontados pela autora na altura a que se alude em 1.18., apresentando os demais trabalhos executados desde então outros defeitos para além dessas.
1.22. Os defeitos apresentados pela obra em 07.05.2018 consistiam no seguinte:
a) Inexistência de grelhas de ventilação nas duas casas de banho;
b) Pinturas das paredes dos quartos e da sala com manchas;
c) Juntas entre cerâmicos mal betumadas em ambas as casas de banho;
d) Cerâmicos que revestem as paredes de uma das casas de banho mal colocados, no sentido de não ser assegurada a correta conjugação do desenho exibido pelos mesmos;
e) Junções entre os sanitários colocados nas casas de banho e os revestimentos cerâmicos mal betumadas;
f) Tampas de esgoto não embutidas no pavimento (salientes);
g) Manchas de tinta no pavimento flutuante colocado novo;
h) Pontos em que o pavimento flutuante colocado novo não encosta aos rodapés já existentes e em que é visível o espaço existente entre os dois;
i) Juntas de ligação entre o pavimento flutuante colocado novo e a mármore mal rematadas;
j) Junções entre os rodapés pré-existentes e o pavimento flutuante colocado de novo mal betumadas;
l) Deficiente remate entre o chão colocado novo na cozinha e o cerâmico já existente nas paredes;
m) Cerâmicos das paredes da cozinha danificados em consequência da aplicação do chão;
n) Calha para esconder tubo na cozinha inestética e mal aplicada;
o) Cerâmico da cozinha partido em consequência da passagem do tubo que a calha visa esconder;
p) Tomadas desalinhadas;
q) Caixilharia da janela colocada na cozinha sem isolamento e desnivelada;
r) Calha de junção entre o pavimento do hall e da cozinha não acompanha o recorte da ombreira;
s) Todas as madeiras do apartamento - portas, guarnições das portas e rodapés - estão mal lacadas e com massas mal aplicadas;
t) Parede feita de novo numa das casas de banho desnivelada;
u) Caixas de eletricidade desniveladas e mal colocadas;
v) Resguardos de duche com mau acabamento, nomeadamente, com juntas mal betumadas;
x) Rodapé com marcas de pregos;
z) Uma tomada e uma caixa de eletricidade sobrepostas;
aa) Manchas de tinta em várias partes da casa, a qual foi toda pintada;
bb) Portas lacadas com fissuras e furadas;
cc) Deficiente “emassamento” de paredes;
dd) Calhas de ligação entre espaços, ao nível do pavimento, mal cortadas;
ee) Estores colocados num dos quartos deixam passar a claridade;
ff) Manchas de tinta em tetos;
gg) Armário de um dos quartos empenado;
hh) Pavimento de uma das divisões mal colocado (assume várias direções);
ii) Rasgos para aplicação das caixilharias tortos;
jj) Aplicação de um armário numa das casas de banho com dimensões não contratualizadas (mais pequeno); e,
ll) Caixilharia da janela do quarto diferente das demais janelas existentes na fachada do prédio e no mesmo alinhamento dessa janela.
1.23. No dia 19.04.2018 a autora efetuou uma transferência bancária através da qual pagou à ré “H...” o montante de 4.687,70€.
1.24. O mandatário da autora dirigiu à ré “H...” o email datado de 19.04.2018, junto aos autos a fls. 30 verso, ao qual anexou o comprovativo da transferência identificada em 1.23., referindo:
“Tal como reunião havida ontem, sou pelo presente a enviar, em anexo, comprovativo do pagamento do valor em falta relativo a uma das tranches.
Assim, reuniremos aquando da entrega da obra para que se possa chegar a acordo de valores atentos todos os prejuízos causados pelo atraso da obra (atraso de mais de 5 meses), bem como dos transtornos que causou à M/ Signatária uma vez se deslocar de propósito do Luxemburgo para aquisição da mobília quando o apartamento ainda está longe de ser finalizado.
Por forma a que tudo corra bem e que cumpra o prazo ontem combinado na N/ reunião para entrega da obra impreterivelmente no dia 07/05/2018, durante a próxima semana contacto-o para que consigamos reunir no apartamento.”
1-24-A. Na altura a que se alude em 1.73., autora e ré “H...” agendaram a entrega do imóvel para o dia 07.05.2018.” (aditado, conforme decisão infra)
1.25. A ré “H...” entregou a obra e as chaves da fração no dia 07.05.2018.
1.26. O legal representante da ré “H...” dirigiu à autora o email junto aos autos a fls. 29 verso e 124, datado de 14.05.2018, no qual refere:
“Exma. Sra. AA
Em conformidade com o último e-mail enviado e na sequência da entrega da obra e da chave do imóvel no passado dia 16-04-2018, na presença do Exmo. Sr. Dr. EE, vimos por este meio remeter a fatura referente ao fecho de contas da V/ obra de reabilitação do apartamento sito em Matosinhos.
Aproveitamos mais uma vez para, e tal como referido pessoalmente no dia 16-04-2018, informar que mantemo-nos disponíveis para a eventual correção de qualquer situação que não tenha ficado de acordo com as V/ expetativas, nomeadamente a colocação das grelhas de ventilação das casas de banho e os retoques nas tintas dos rodapés.
Para o efeito, deverá V. Exa. informar nos próximos 10 dias, a fim de se agendar dia e hora para a eventual correção.”
1.27. Consta da fatura n.º 20, emitida pela ré “H...” em 14.05.2018, com vencimento na mesma data, no valor de 4.150,30€ (IVA incluído), referente a “Fecho da obra em conformidade com fecho”, junta aos autos a fls. 31 verso e enviada com o email identificado em 1.26., o seguinte: “Os artigos / serviços faturados foram colocados à disposição do adquirente (nº 5, Alínea f) do Artº 36º do CIVA) em: 14/05/2018”.
1.28. Consta da fatura n.º 19, emitida pela ré “H...” em 08.05.2018, com vencimento na mesma data, no valor de 5.843,84€ (IVA incluído), referente a “Adjudicação do Orçamento ... 2015”, junta aos autos a fls. 33, o seguinte: “Os artigos/serviços faturados foram colocados à disposição do adquirente (nº 5, Alínea f) do Artº 36º do CIVA) em: 08/05/2018”.
1.29. A situação a que se alude em 1.22. m) não existia antes da execução da obra pela ré “H...”.
1.30. Inexiste solução viável para a resolução da situação identificada em 1.22. m) que não a substituição dos cerâmicos danificados por outros iguais, a substituição de todos os cerâmicos caso inexistam cerâmicos iguais, ou a colocação de um rodapé com o intuito de esconder tais danos.
1.31. Foi orçamentada a “aplicação de estores interiores tipo “blackout” de rolo em vãos da habitação incluindo todos os acessórios e trabalhos complementares necessários a um perfeito acabamento”.
1.32. Num dos quartos da fração os estores colocados não são tipo “blackout”, tal como se refere em 1.22. ee).
1.33. O orçamento a que se alude em 1.4. e 1.5. ascendia ao valor total de 29.219,24€, IVA incluído.
1.34. Na data da adjudicação da obra à ré “H...”, perante o comportamento adotado pelo seu legal representante, a autora acreditava que estava perante profissionais qualificados e especializados.
1.35. Perante o que se refere em 1.17., a autora tinha a expetativa de ter o apartamento pronto, quanto mais não fosse, pelo menos para a sua filha vir passar férias em Agosto de 2018.
1.36. A ré “H...” enviou as faturas identificadas em 1.27. e 1.28. à autora, para pagamento.
1.37. “Aquando da deslocação a que se alude em 1.13., efetuada pela autora na expectativa de rececionar a obra, a mesma ficou instalada num hotel, sendo que nessa data era impossível habitar a fração.” (Em substituição do texto “Com a deslocação a que se alude em 1.13., efetuada pela autora na expectativa de rececionar a obra, a mesma teve de recorrer a uma estadia num hotel, sendo que nessa data era impossível habitar a fração.”, conforme determinado infra).
1.38. Com a deslocação a que se alude em 1.13., a autora teve custos com as viagens de avião e a estadia em hotel.
1.39. A autora teve de desmarcar com a empresa de Paços de Ferreira a que se alude em 1.13. a deslocação à fração, atento o facto de a mesma não estar pronta.
1.40. Para a eliminação dos defeitos identificados em 1.22., a autora contratou a empresa denominada “A... Lda.”
1.41. A autora tinha urgência na eliminação dos defeitos identificados em 1.22., para que a fração pudesse estar pronta pelo menos em Agosto, para as férias da sua filha, pelo que contratou a “A...”.
1.42. A “A...”, em 25.05.2018, elaborou um orçamento para a reparação dos defeitos elencados em 1.22., no valor de 8.300,00€, sem IVA.
1.43. A autora pagou à “A...”, pela reparação dos defeitos elencados em 1.22., o valor de 10.209,00€, IVA incluído.
1.44. A autora ficou preocupada, desgostosa e angustiada com a situação do imóvel, tanto mais que se encontrava a longos quilómetros de distância.
1.45. A autora viu-se privada da possibilidade de utilizar o apartamento desde o início do ano de 2018.
1.46. As despesas da autora com as viagens e a estadia em hotel a que se alude em 1.38. ascenderam aos montantes de, respetivamente, 91,66€ e 104,70€.
1.47. Para efetuar a deslocação a que se alude em 1.13., a autora ausentou-se do salão de beleza que tem no Luxemburgo, onde trabalha também a sua filha.
1.48. Constam do orçamento a que se alude em 1.4. e 1.5. as seguintes menções:
“Alvará de Obra N.º: .....
N.º de Apólice de Seguro: ... V...”.
1.49. A ré “H...” é uma sociedade comercial por quotas que se dedica, nomeadamente, à execução de trabalhos de construção civil.
1.50. A autora tem uma filha, de nome CC, com quem, tendo em vista a remodelação da fração, o representante da ré – eng.º BB – contactou e acertou detalhes relativos à realização da obra, na qualidade, à data, de franchisado na “M...”, sendo ambas, autora e sua filha CC, a acordar com a ré a realização por esta das obras de reabilitação da fração.
1.51. A execução da obra foi adjudicada à ré “H...” no dia 20.09.2017.
1.52. Os trabalhos realizados na fração, nomeadamente, trabalhos gerais, caixilharias, carpintarias e pinturas, implicaram a remodelação total ou parcial de várias divisões da fração, nomeadamente, da cozinha e de duas casas de banho.
1.53. A fração encontrava-se desabitada, uma vez que a autora e sua filha CC se encontravam a viver no Luxemburgo.
1.54. Não estavam incluídos no orçamento a que se alude em 1.4. e 1.5. e no prazo previsto no mesmo o transporte de mobiliário e/ou equipamentos, como eletrodomésticos.
1.55. No decurso da obra foi efetuado pela ré “H...” o transporte de um frigorifico tipo americano desde o rés-do-chão do prédio até à cozinha da fração, localizada no 4º andar, de elevada dimensão e peso, o qual não coube no elevador do prédio.
1.56. Foi removido o cilindro que se encontrava numa das casas de banho e colocado na lavandaria, sendo que as ligações da água quente haviam sido anuladas por obra anterior, o que obrigou a refazer a instalação para a água quente.
1.57. A autora solicitou alterações ao modelo inicialmente escolhido para a cozinha, não previstas no orçamento a que se alude em 1.4. e 1.5., as quais implicaram que o valor inicial orçamentado de 5.520,00€ fosse alterado para o valor de 6.750,00€.
1.58. A propósito das alterações na cozinha solicitadas pela autora, foram trocados emails entre a filha da autora, CC, com o endereço de email “CC...@hotmail.com, e o representante da ré, eng. BB, com o endereço de email h....engenharias@gmail.com.
1.59. Nos e-mails trocados as partes foram acertando os detalhes de como seria a cozinha.
1.60. A cozinha sofreu um novo desenho após envio, pela filha da autora, do email de 24.09.2017, junto aos autos a fls. 113, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, ao qual o representante da ré respondeu por email de 25.09.2017, junto aos autos a fls. 114 verso, dizendo “Recebi. Vamos analisar.”
1.61. No dia 13.10.2017, às 10:29, o representante da ré “H...” enviou um email à filha da autora, junto aos autos a fls. 116, com o novo desenho da cozinha para aprovação.
1.62. No dia 16.10.2017, às 12:14, a filha da autora, através do email junto aos autos a fls. 116 verso, responde que “(…) a cozinha está bem assim, mas tenho que apontar duas coisa o canto queria também que não acabasse como está queria acompanhar o canto cortado ..e queria saber se as portas pretas ao lado do frigorífico abrem todas por completo ou são divididas ..obrigado
Até mais”.
1.63. Por email de 23.10.2017, às 08:44, junto aos autos a fls. 117, o representante da ré responde à filha da autora que “No que diz respeito aos móveis do canto, os nossos móveis são em canto diagonal cortado a direito, mas graficamente o programa representa-o com o topo cortado.
Relativamente às portas da coluna, normalmente divide-se a altura total em 2 portas, sendo a porta inferior com 70 cm de altura igual aos móveis inferiores e a outra c/ 130 cm alt. No entanto podemos colocar as portas como pretender, sendo que se for 1 porta só terá mais tendência a empenos com o tempo.”
1.64. Por email de 23.10.2017, às 18:14, junto aos autos a fls. 117 verso, a filha da autora responde “(…) sim as portas tem que ser divididas mas preferia que a mais pequena de 70 cm ficasse em cima mas por favor não se esqueça que quero o dispenseiro do lado do micoondas e na outra porta preta com prateleiras ..o Sr Eng está a falar de 130 cm mais 70 cm mas a altura do teto é de 237 cm ..os móveis vão do chão ao teto, certo? Junto envio como tenho aqui em casa (…).”
1.65. A 23 de março de 2018 às 15:59 o representante da ré enviou novo e-mail à filha da autora, junto aos autos a fls. 118, referindo “Segue em anexo a última versão da cozinha para aprovação.
Agradecia que confirmasse o desenho no sentido de fechar as alterações todas, pois existe uma alteração ao valor da cozinha que estou a negociar com o homem que as faz, mas preciso de saber se é a versão final.”
1.66. A ré “H...”, no decorrer da obra, em data não concretamente apurada, foi confrontada com a limitação na realização dos trabalhos, em vários dias, da parte da manhã, no sentido de não fazer ruídos ou de fazer o menos ruido possível nesse período, uma vez que uns vizinhos da autora (médicos), moradores no andar inferior, pediram ao representante da ré para não fazer ruído durante as manhãs, pois, presumiu a ré, precisariam de descansar de manhã.
1.67. O representante da ré acedeu a esse pedido, facto de que deu conhecimento à autora que não levantou qualquer objeção.
1.68. A situação a que se alude em 1.66. levou a um atraso na execução da obra.
1.69. O representante da ré enviou à filha da autora o email de 11.04.2018, às 14:55, junto a fls. 118 verso, no qual refere “(…) quero apresentar novamente o nosso pedido de desculpas pelo atraso na execução dos trabalhos, mas penso que não sairá defraudada com a situação.
Em conformidade com a última mensagem que enviei, remeto a fatura dos 2ºs 40%, que não necessita de pagar na totalidade, apenas pedia algum para poder fazer face a compras de última hora (…). Pretende agendar hora para segunda-feira?”.
1.70. No dia 16.04.2018 a autora viria a Portugal e iria encontrar-se com o representante da ré “H...” no imóvel.
1.71. No dia 11.04.2018, às 15:25, a filha da autora, através do email junto a fls. 119, respondeu ao email a que se alude em 1.69., dizendo que “Vou enviar 30% e a hora já estava marcada desde que lhe informei que iria mos á Portugal. Isto é às 9H da manhã no apartamento segunda feira dia 16 de Abril ..até breve”.
1.72. No dia 13.04.2018 a autora efetuou uma transferência no montante de 7.000,00€ por conta da fatura n.º 16, junta aos autos a fls. 121 verso, com data de 11.04.2018, no valor de 11.687,70€, referente a 40% do valor orçamentado.
1.73. A autora, no dia 16.04.2018, esteve no imóvel com o representante da ré “H...”, onde viram o estado das obras.
1.74. A autora voltou para o Luxemburgo no dia 18.04.2018.
1.75. Após a adjudicação da obra, a ré “H...” emitiu e enviou à autora a fatura n.º 46, junta aos autos a fls. 120, com data de 21.09.2017, no valor de 11.687,00€, referente ao primeiro pagamento e a 40% do valor do orçamento, a qual foi liquidada pela autora.
1.76. Com o pagamento a que se alude em 1.23., a autora liquidou a totalidade da fatura n.º 16.
1.77. A ré “H...” não recebeu o email a que se alude em 1.24., uma vez que na data de 19.04.2018 já não usava o endereço de email para o qual o mesmo foi enviado (H...@......pt).
1.78. Quando considerou a obra finalizada a ré “H...” considerou “Trabalhos a menos” e “Trabalhos a mais”, tendo emitido as faturas n.ºs 19 e 20 a que se alude em 1.27. e 1.28.
1.79. No dia 08.05.2018, às 09:58, o representante da ré “H...” enviou à autora o email junto a fls. 123 verso, onde refere que “em conformidade com a entrega da obra no dia de ontem, vimos por este meio remeter o fecho de contas e a fatura referente aos 20% finais da obra”, ou seja, a fatura n.º 19, mais referindo que “relativamente ao fecho de contas, caso não exista impugnação ao teor do mesmo será emitida dentro de 3 dias a respetiva fatura referente aos trabalhos a mais efetuados por inerência da obra e por v/ solicitação.”
1.80. No dia 14.05.2018, às 21:51, a ré “H...” enviou à autora, com conhecimento ao seu mandatário, o email a que se alude em 1.26., com o qual remeteu a última fatura, com o n.º 20.
1.81. Na sequência do email a que se alude em 1.26. a autora não pediu à ré “H...” que corrigisse, nem lhe deu oportunidade de corrigir eventuais desconformidades da obra.
1.82. A autora, através do seu mandatário, enviou à ré “H...”, no dia 15.05.2018, às 15:35, o email junto a fls. 124 verso e ss., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, no qual, designadamente, refere:
“certamente por lapso envia novamente uma fatura para pagamento, designada por fatura n.º 20-2018, no valor de €4.150,00, diferentemente da enviada anteriormente, o que só demonstra a falta de zelo e retidão de V/ Parte. Uma vez mais declina-se toda e qualquer responsabilidade no pagamento de tal quantia, atento o incumprimento reiterado e definitivo de V/ Parte (…)
Olvida-se certamente V. Ex.ª do prazo de entrega da obra, cifrado nos 2 meses e meio, e não obstante ter feito a M/ Signatária se deslocar de propósito do Luxemburgo (quando V.ª Ex.ª bem sabia e foi devidamente informado para tal), e ter a obra ainda num estado lastimável (nem tão pouco estava assente o chão, pinturas por fazer, portas por lacar, encontrando-se praticamente na fase inicial da obra, volvidos que eram 7 meses do início).
Foi por diversas vezes informado de que não poderia sofrer mais delongas a finalização da obra (…) deixou a “alegada” obra num estado lastimável (e com danos consideráveis que não existiam aquando da entrega da obra), tal como se pode constatar de fotos em anexo (…).”
1.83. Com esse email são juntas 14 fotografias das desconformidades que a autora aponta à obra.
1.84. Na sequência, no dia 17.05.2018, às 18:11, a ré, através do email junto aos autos a fls. 126 verso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, respondeu ao mandatário da autora, com conhecimento à autora e à sua filha, referindo:
“Talvez por lapso não reparou que no fecho de contas se encontrava um valor de acerto de trabalhos não contratualizados, pelo que não são uma, mas duas faturas. A primeira fatura enviada a 8 de Maio no montante de 5.843,84 € referia-se ao fecho da obra (20% que se encontrava em falta), sendo que com a mesma foi enviado um fecho de contas (que se anexa novamente) e que acresce ao valor de 4.150,30 €, perfazendo um valor total em dívida de 9.994,14€.
Relativamente ao atraso na execução da obra, quero aproveitar para realçar que na reunião de adjudicação com a D. AA, foi-me transmitido por ela que apenas necessitaria da obra em Agosto de 2018. Além disso a obra teve alguns constrangimentos, nomeadamente a execução de trabalhos que não se encontravam previstos, nem seria possível prevê-los. A juntar a estas situações tivemos da parte dos vizinhos do edifício, nomeadamente os médicos que residem no piso inferior um pedido especial para não realizarmos barulho até às 14h00, pelo que condicionou-nos muito o desenrolar dos trabalhos, (…). Relativamente à frase em que refere que a obra se encontrava num estado lastimável, quase no início, volvidos 7 meses após a sua execução, devo discordar da mesma, pois a sua cliente após verificar o ponto de situação dos trabalhos liquidou até 80% da execução da obra. Ou seja se ela estivesse com o atraso que refere, nunca teria sido liquidada a até essa fase.
Relativamente às fotografias que remete, venho por este meio informar o seguinte:
Fotografia fachada – podemos alterar a janela quando pretender (…).
Foto 5838 e 5849 grelhas de ventilação em falta. Apenas foi verificado aquando da entrega. De qualquer forma este trabalho não foi adjudicado nem orçamentado. Ainda assim podemos realizá-lo sem qualquer custo para a DO.
Fotografia 5842 – o remate do flutuante não pode ficar por baixo do rodapé. Pode-se contudo aplicar massa acrílica para rematar entre o flutuante e o rodapé. Esta situação advém da madeira das portas e rodapés que não foi substituída.
Fotografia 5848 – pode-se melhorar um pouco este local.
Fotografia 5860 – limpeza, apesar de não estar contratualizada, podemos fazer a mesma.
Foto 5856 5857 – não foi contratualizado este serviço, mas foi pedido que fosse colocada uma calha de pequenas dimensões. Podemos trocá-la por outra maior, pois esta não se encontra conforme.
Foto 5865 5866 5888 – pode-se melhorar neste local qualquer coisa.
5922 e 5925 – não fizemos tetos falsos, apenas pintamos e colocamos focos, pelo que o defeito que sugerem não temos qualquer responsabilidade.
Relativamente à reparação dos defeitos que enumera, os mesmos podem ser corrigidos num dia de trabalho, pelo que apenas necessito que agende com 2 semanas de antecedência (para poder colocar o perfil da janela).”
1.85. No dia 21.05.2018, às 18:06, a autora, através do seu mandatário, enviou à ré “H...” o email junto aos autos a fls. 128, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, no qual, designadamente, refere:
“Quanto ao teor do V/ e-mail infra, sou pelo presente a refutar uma vez mais a responsabilidade do pagamento das M/Signatárias seja de que valor for. Não assumem as mesmas, desta forma, qualquer pagamento de valor de trabalho, quer sejam contratualizados quer não contratualizados.
Relativamente às restantes afirmações de V/ Parte, nomeadamente relativamente ao prazo de entrega da obra, tais reputam-se como completamente falsas (…).
As M/ Signatárias liquidaram os valores contratualizados, sendo certo que nada poderá apontar à postura das mesmas relativamente ao pontual pagamento das obras “alegadamente” a realizar. Pasma-nos, de facto, o argumento de V.ª Ex.ª de que “Relativamente à frase em que refere que a obra se encontrava num estado lastimável, quase no início, volvidos 7 meses após a sua execução, devo discordar da mesma, pois a sua cliente após verificar o ponto de situação dos trabalhos liquidou até 80% da execução da obra. Ou seja se ela estivesse com o atraso que refere, nunca teria sido liquidada e até essa fase”, aproveitando-se, desta forma, de toda a diligência e cumprimento nos deveres atinentes às mesmas, por forma a V.ª Ex.ª não se escudar na falta de pagamento para terminar a obra (…).”
1.86. Em resposta, no dia 28.05.2018, às 13:12, a ré dirigiu ao mandatário da autora, com conhecimento e esta e à sua filha, o email junto a fls. 129, no qual refere, designadamente:
“Tendo em consideração que não pretendem que seja efetuada qualquer correção aos trabalhos realizados e contratualizados, assim como não contratualizados no apartamento, vimos por este meio informar que damos este processo por terminado. (…)
Assim iremos aguardar 5 dias úteis para liquidação das faturas no montante total de 9.994,14€, sendo que, findo esse tempo, entregaremos ao nosso departamento jurídico para cobrança (…).”
1.87. A obra implicou remodelações que obrigaram a demolições e a trabalhos não previstos inicialmente.
1.88. O custo estimado para a correção que a ré “H...”, no email identificado em 1.84., se disponibilizou a fazer, incluindo a mão-de-obra, não ultrapassaria o montante de 500,00 € e seriam trabalhos a realizar durante apenas um dia.
1.89. Na data que consta do orçamento identificado em 1.4. e 1.5., o contrato de seguro titulado pela apólice que nele é identificada já não se encontrava em vigor, constando do mesmo apenas por lapso.
1.90. Com referência ao período de 20.09.2017 a 20.09.2018, a ré “H...” havia celebrado com a “Companhia de Seguros K..., S.A.” um contrato de seguro do ramo “R. C. Geral”, titulado pela apólice n.º ....
1.91. A ré “H...” foi segurada da ré “V...” ao abrigo da apólice de seguro n.º ..., cujas “Condições Particulares” e “Condições Gerais” estão juntas a fls. 81 a 88, aqui se dando o seu teor por integralmente reproduzido.
1.92. Na contratação do seguro interveio a mediadora de seguros “B..., Lda”.
1.93. O contrato de seguro tinha por objeto “a garantia da responsabilidade que, ao abrigo da lei civil, seja imputável ao Segurado por erros ou faltas profissionais cometidas no exercício da sua atividade profissional expressamente referida nas Condições Particulares ou na Condição Especial da apólice”, sendo que das referidas Condições Particulares consta “Atividade: Engenheiros”.
1.94. O seguro tinha um capital seguro de 250.000,00€ com uma franquia de 10% do valor da indemnização, num mínimo de 750,00€.
1.95. O seguro teve o seu início no dia 01.01.2013 e era válido até 30.12.2013, podendo ser prorrogado por iguais períodos de um ano.
1.96. O prémio do seguro (inicial) foi pago e o seguro esteve em vigor durante o ano de 2013.
1.97. O prémio de seguro correspondente ao ano seguinte (período de 30.12.2013 a 30.12.2014) não foi pago, tal como também não foi pago o prémio referente às anuidades subsequentes.
1.98. Atento o não pagamento da anuidade de 2014, não se verificou a prorrogação do seguro.
1.99. Em 2017 e 2018 o seguro já não estava em vigor.
1.100. Por carta registada com aviso de receção datada de 04.06.2018, as faturas identificadas em 1.27. e 1.28. foram novamente remetidas à ré AA.
1.101. Essa carta foi recebida pela ré AA no Luxemburgo no dia 18.06.2018, na sequência de pedido de reexpedição.
1.102. Nenhuma das rés procedeu ao pagamento das faturas identificadas em 1.27. e 1.28.
*
2. Factos Não Provados:
Não resultou provado qualquer outro facto de entre os alegados com interesse para a decisão da causa, designadamente, não se provou que:
2.1. A ré “H...” deu a garantia de que o prazo a que se alude em 1.5. iria ser cumprido.
2.2. O prazo de realização da obra a que se alude em 1.5. apresentou-se como condição essencial para a adjudicação da obra à ré “H...”.
2.3. Volvidos que foram os 2 meses e meio para a finalização da obra, começaram a ser veiculadas desculpas por parte do Eng.º BB para a não finalização da mesma, sendo que teve a autora de reformular a sua vida no sentido de ser impossível habitar a fração no tempo acordado.
2.4. Atendendo ao atraso na obra a que se alude em 1.8. e 1.9., a ré “H...” decidiu propor novo prazo para finalização da obra, para Março de 2018.
2.5. Atendendo ao estado em que a obra se encontrava aquando da visita da sua amiga em Fevereiro, e por duvidar que a mesma estaria pronta na data a que se alude em 2.4., proposta pela ré, decidiu a autora, tal como se refere em 1.12., prolongar o prazo da entrega da obra até dia 16 de Abril de 2018, por forma a que tudo corresse dentro da normalidade.
2.6. As desconformidades apresentadas pela obra em 07.05.2018, para além das que se elencam em 1.22. consistiam no seguinte:
a) Tomada escondida por detrás do espelho da casa de banho que foi desfeita e feita de novo, o que não permite o acesso à mesma; e,
b) Tomadas existentes com buracos, fruto de uma deficiente abertura do “rasgo” para colocação das mesmas.
2.7. Com a deslocação a que se alude em 1.13., a autora teve custos com o aluguer de um veículo.
2.8. A autora, no dia 07.05.2018, foi alertada por um dos condóminos para a situação a que se alude em 1.22. ll), o qual a informou que tal assunto iria ser discutido em Assembleia de Condóminos, atenta a diferença/mudança da “traça” da fachada do edifício.
2.9. Devido à ausência a que se alude em 1.47., a autora e a sua filha deixaram de auferir o montante global de 1.000,00€.
2.10. As alterações aos trabalhos e as obras a mais e a menos solicitadas pela autora e pela sua filha CC implicaram atrasos na realização da obra.
2.11. A autora e a sua filha CC só precisariam do apartamento pronto no Verão de 2018, concretamente em Agosto, como chegaram a referir expressamente ao representante da ré, eng.º BB.
2.12. No decurso da obra, para além do transporte do frigorífico a que se alude em 1.55., vieram a suceder transportes de equipamentos e eletrodomésticos por parte da ré “H...”, a pedido da autora, que contribuíram para o atraso da obra.
2.13. O transporte do frigorífico identificado em 1.55. contribuiu para o atraso da obra.
2.14. O representante da ré – eng.º BB – fez questão de saber a data exata em que a autora precisaria do imóvel, desde logo questionando a mesma nas várias conversas telefónicas que iam mantendo, recordando-se perfeitamente que logo no início da obra questionou se a autora precisaria do imóvel no Natal de 2017 (cerca de 3 meses após a data de adjudicação), ao que esta respondeu que não, exatamente por só precisar do imóvel em Agosto de 2018.
2.15. A remoção do cilindro da casa de banho a que se alude em 1.56. não estava prevista no orçamento, o qual só previa a remoção do armário da casa de banho mas não do cilindro que se encontrava dentro do mesmo, o qual a ré “H...” desconhecia na altura da realização do orçamento, tendo percebido esse facto mais tarde, quando abriram o dito armário.
2.16. A alteração referida em 1.56., não prevista, acabou por atrasar a obra.
2.17. As alterações à cozinha a que se alude em 1.57. implicaram um atraso na execução da obra.
2.18. O representante da ré, eng.º BB, falou diversas vezes com a autora e com a sua filha CC ao telefone, tendo ele próprio informado dos atrasos que a obra estava a sofrer, nomeadamente devido às contingências ocorridas, sem que tenha havido por parte daquela qualquer reclamação ou descontentamento.
2.19. A autora, na altura a que se alude em 1.69., sabia que a obra, na data de 16.04.2018, não estaria pronta.
2.20. (a matéria passou a incluir-se entre os factos provados, sob o nº 1.24-A).
2.21. Nem na data de 07.05.2018, nem antes, a autora reclamou de quaisquer defeitos na obra, pois os mesmos não existiam.
2.22. A autora e a sua filha nunca se queixaram relativamente aos trabalhos realizados pela ré “H...”.
2.23. O facto a que se alude em 1.77. era do conhecimento da autora e da sua filha.
2.24. Só a partir do momento em que o representante da ré enviou as faturas a que se alude em 1.28. e 1.29. à autora, com vista ao seu pagamento, esta iniciou um conjunto de reclamações, com o único objetivo de não pagar as mesmas.
2.25. No email a que se alude em 1.82., a autora, pela primeira vez, vem reclamar dos atrasos da obra e de desconformidades da mesma.
2.26. A apólice identificada no orçamento a que se alude em 1.4. e 1.5. reportava-se à responsabilidade por defeitos e execução em obra, segundo o transmitido pelo eng.º BB.
2.27. A ré “H...” fez crer à autora que era portadora de um seguro válido de cobertura própria para o acordo celebrado entre elas, como forma de lhe transmitir uma segurança acrescida na celebração de tal acordo, pois se algum problema houvesse, haveria sempre a salvaguarda da cobertura dos mesmos por parte da companhia de seguros.
2.28. Tal segurança era ainda acrescida, atenta a inserção no orçamento identificado em 1.4. e 1.5. do montante pelo qual estariam incluídos os prejuízos/danos segurados, que se cifravam em 250.000,00€.
2.29. Por demonstrar que possuía Alvará de Obra, bem como apólice de seguro perante a “V...”, identificando inclusivamente o n.º da referida apólice, a autora transmitiu às rés uma segurança acrescida perante os demais prestadores de serviços, sendo que, ademais, o valor do orçamento se cifrava em montante superior ao expectável por parte das rés.
2.30. Atendendo ao facto de as rés se encontrarem a residir no estrangeiro, mostraram-se confortáveis e confiantes com o facto de a autora possuir Alvará, bem como seguro de responsabilidade civil válido para a realização da obra.
2.31. Não obstante o valor em muito superior ao esperado por parte das rés para realização da obra de remodelação, a autora, atento o que se refere em 2.29. e 2.30., fez criar naquelas a expectativa de que a diferença de valor seria justificada.
2.32. As rés confiaram que, na hipótese de surgir algum defeito ou responsabilidade por força da execução da obra, poderiam acionar os seguros de responsabilidade da autora.
2.33. O prazo de cumprimento de obra, bem como o facto de a autora possuir alvará e seguros de responsabilidade de boa execução de obra, apresentaram-se como condições essenciais para que as rés contratassem com a autora.
2.34. Se soubessem da inexistência de seguro válido, bem como de alvará, e da falta de cumprimento do prazo acordado para execução da obra, nunca as rés teriam contratado com a autora.
*
A primeira questão colocada pela apelante refere-se ao enunciado do dispositivo da sentença, quanto ao pedido da acção apensa, pois que afirma que o mesmo procedeu integralmente e não apenas em parte, como ficou declarado, com reflexo na imputação das custas, pois também não houve qualquer decaimento que justifique a sua responsabilização tributária.
Porém, esta sua alegação só pode proceder de menor atenção na leitura da sentença. Com efeito, depois de concluir pela falta de pagamento das facturas que titulam o crédito alegado pela ora apelante, bem como pela ocorrência de mora, o tribunal afirmou, quanto à indemnização dos inerentes prejuízos: “Estando em causa uma obrigação pecuniária com prazo certo, a indemnização corresponde aos juros legais contabilizados desde a data da constituição em mora (cfr. art.º 805, nº 2, al. a) e 806º, do CC). Esses juros devem ser contabilizados à taxa de juro civil, a qual é de 4% (e não de 7% como pretende a autora).”
Analisado o requerimento de injunção, com que se iniciou aquela acção, verifica-se que, com efeito, a apelante pediu a condenação das RR. no pagamento de juros a contabilizar à taxa anual de 7%, os quais, calculados quanto a 48 dias, contabilizou em 92,00€.
Conclui-se, assim, que – embora em proporção diminuta – aquela pretensão da ora apelante não procedeu integralmente, ocorrendo decaimento na parte relativa à diferença da taxa de contabilização dos juros que, de resto, nem é posta em causa neste recurso.
É, pois, acertado o dispositivo da sentença, improcedendo a apelação nesta parte.
*
A segunda questão refere-se à condenação em custas, na acção principal, que apresenta o seguinte enunciado, depois de ter declarado apenas parcialmente procedente a pretensão da autora AA: “Custas pela autora e pela ré “H...” na proporção dos respetivos decaimentos, os quais, considerando a condenação em custas já contida no despacho proferido em 29.10.2019, se fixam na proporção de 1/3 para cada uma delas.”
Alega a apelante que essa decisão sobre a imputação da responsabilidade por custas esqueceu o despacho de 4/10/2019, que já decidira quanto a custas.
Antes de mais, cumpre afirmar que a decisão em causa – que consubstancia o despacho saneador – data de 29/10, sob conclusão de 4/10, e não de 4/10, como erradamente vem apontar (embora sem qualquer relevância) a apelante.
Para além disso, resulta da própria decisão sob análise que de maneira nenhuma foi esquecida aquela anterior condenação em custas. Pelo contrário, ela é expressamente invocada.
Naquele despacho saneador, o tribunal absolveu da instância uma das rés demandadas pela autora, designadamente a ré “X...”. Então, imputou à autora a responsabilidade pelo correspondente decaimento, que fixou em 1/3 do valor da acção.
Na sentença final, o tribunal salvaguardou necessariamente essa decisão. Podendo fazê-lo em termos diversos, adoptou a solução acima transcrita, da qual resulta que, dos 2/3 que sobejaram para integral satisfação das custas devidas em função do valor atribuído à acção, repartiu em termos iguais a responsabilidade das partes: mais 1/3 daquele total para a autora e o restante 1/3 para a ré. Ou seja, das custas remanescentes após a imputação à autora da responsabilidade por 1/3, no saneador, dividiu a meias a responsabilidade restante, imputando a autora e ré a mesma proporção.
Considerando o teor do pedido da autora e o resultado decretado para a acção, entendeu o tribunal que a adequada proporção para a repartição das custas, em observância da regra geral do nº 2 do art. 527º do CPC, era a da imputação do remanescente, em partes iguais, a ambas as partes.
Contra esta solução não pode ser argumentada a procedência do pedido reconvencional da ora apelante, do que resultaria, na sua tese, a redução da sua condenação ao pagamento de menos de 2.000,00€.
Com efeito, parece a apelante esquecer que o pedido reconvencional, após ser admitido, veio a ser alvo de um juízo de litispendência, que culminou com a decisão de extinção da respectiva instância. A litispendência resultou da prévia instauração do requerimento injuntivo que evoluiu para a acção que foi apensa aos autos e que supra se referiu. Tal decisão, que julgou verificada a litispendência, transitou in totum, incluindo quanto a custas, não cabendo reapreciá-la.
Assim – e em termos que desde já resolvem a terceira das questões do objecto do recurso – o que é certo é que inexiste qualquer pedido reconvencional por apreciar ou cuja resolução seja relevante em sede de repartição das custas decidida na sentença final. Para além disso, tendo o pedido correspondente (i.é, o da acção apensa) sido julgado quase integralmente procedente, o tribunal não deixou de se pronunciar, em sede adequada, sobre a responsabilidade pelas custas respectivas, como supra já se mencionou.
Acresce que a apelante não invoca qualquer outra razão para que se conclua pelo desacerto da decisão decretada a final, quanto a custas, a qual, não se reduzindo a puro cálculo de valores económicos, não carece de referir-se exclusivamente aos montantes pretendidos pela autora, pois que a acção improcedeu quanto a outras questões (designadamente a da invalidade do contrato). Daí, aliás, a superior imputação de responsabilidade tributária à autora, do que a que resultaria da mera ponderação dos valores económicos pedidos.
Inexistem, pois, razões para criticar a decisão recorrida, também em relação às segunda e terceira questões, improcedendo também quanto a elas a apelação.
*
Resolvidas estas questões, certo é que a essência do recurso se prende com a alteração da decisão da matéria de facto.
Por um lado, a ré aponta que a prova produzida deverá ser avaliada em termos que impõem diferente decisão sobre a matéria de facto provada e não provada.
Por outro, alega que a decisão sobre alguns factos resulta contraditória com a proferida quanto a outros, cumprindo verificar se ocorre contradição entre os factos provados 1.16, 1.19 e 1.20 e os 1.38, 1.46 e 1.74; entre o facto provado 1.24 e os 1.58 e 1.77; e entre os factos provados 1.52, 1.57 a 1.62 e 1.65 e o não provado 2.17.
Como se sabe, a impugnação da decisão sobre a matéria de facto exige o cumprimento de um regime processual estabelecido com rigor no art. 640º do CPC, designadamente nas alíneas do seu nº 1. Aí se impõe a obrigação de se especificarem os pontos concretos da matéria de facto que se têm por incorrectamente julgados, bem como a decisão que, sobre esses pontos, haveria de ser proferida. E, quanto aos meios de prova, exige-se não menor individualização, quanto àqueles cuja reapreciação deve motivar aquela alteração.
No caso, embora de forma pouco organizada, sem especificar, como deveria, os segmentos dos meios de prova em que sustenta cada uma das suas discordâncias e misturando a análise desses elementos com considerações de vária ordem, designadamente jurídica, a apelante terá satisfeito com um mínimo de suficiência aquele regime, em relação a todos os seus pressupostos, pois que não deixam de se compreender quer a matéria que é alvo da discordância da apelante, quer os meios de prova em que se baseia. Cabe, assim, apreciar esse segmento do recurso.
Em qualquer caso, afigura-se-nos ser logicamente precedente a questão sobre a contradição intrínseca da decisão quanto ao juízo probatório sobre alguns dos factos descritos, pelo que será essa a questão que de imediato se passará a analisar.
Vejamos, então, se ocorre alguma contradição entre os factos provados 16, 19 e 20 e os 38, 46 e 74. Têm eles o seguinte teor:
16 - Foi então que, atento o estado atrasado da obra, a autora decidiu agendar uma reunião para o dia 19 de Abril de 2018, com a presença do seu mandatário, para que pudessem obter uma solução consensual face ao atraso na execução da obra por parte da ré “H...”.
19. Na data de 19.04.2018 o pavimento ainda não se encontrava colocado.
20. Desde a chegada da autora e da sua filha à fração no dia 16.04.2018 e até ao dia 19.04.2018, foram realizados trabalhos na obra pela ré “H...”.
38. Com a deslocação a que se alude em 1.13., a autora teve custos com as viagens de avião e a estadia em hotel.
46. As despesas da autora com as viagens e a estadia em hotel a que se alude em 1.38. ascenderam aos montantes de, respetivamente, 91,66€ e 104,70€.
74. A autora voltou para o Luxemburgo no dia 18.04.2018.
Sendo inequívoco que a autora viajou de volta para o Luxemburgo a 18 de Abril, como resulta dos documentos de fls. 35 (bilhetes de avião) e se dá por provado no ponto 74, só pode proceder de lapso a alegação da autora segundo a qual aprazou uma reunião com a ré para o dia 19. Aliás, no próprio facto 24º, do email aí referido e enviado pelo advogado da autora a 19/4, se situa temporalmente tal reunião na véspera, i.é, no dia 18. Já a factualidade constante dos pontos 19 e 20 e a sua referência à data de 19/4 não resulta incompatível com a viagem da autora, na véspera, para o Luxemburgo e se tais factos se verificavam a 18/4, também se verificariam no dia seguinte. Deve, por isso, proceder a pretensão da ré (conclusão 11) quanto a especificar-se a data de 18/4, em vez da de 19/4, no texto do facto 16º, correcção esta que de imediato se inserirá no lugar próprio. Em qualquer caso, se tal rectificação se faz para reparar algo que não haverá de passar de lapso na alegação da autora – atentos os documentos juntos por si própria, que demonstram esse lapso – e na subsequente decisão recorrida, não deixa de se assinalar a completa inconsequência da questão para a decisão a proferir.
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Mais alega a apelante que se verifica uma contradição entre o facto provado 24 e os 58 e 77. Afirma não ter sentido a referência ao envio e ao teor do email a que se refere aquele item 24º dos factos provados, que foi remetido para o endereço H...@......pt quando no item 58 se dá por provado que a ré já usava outro endereço de email na sua comunicação com a autora e sua filha (h....engenharias@gmail.com) e no facto 77 se dá por provado que, devido à alteração de endereços de email, a ré não recebeu aquela correspo0ndência electrónica.
No entanto, inexiste aqui qualquer contradição, pois que é da expressa descrição de toda a factualidade descrita que se torna compreensível toda a dinâmica daquela comunicação: quer o envio, quer a frustração da comunicação.
Nada cumpre, pois, alterar na decisão recorrida, a este propósito.
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Por fim, alega a apelante que é contraditória a decisão que deu por provados os factos 52, 57 a 62 e 65 e que deu por não provada a matéria do item 2.17.
Naqueles primeiros itens dos factos provados, refere-se o objecto da empreitada (“…trabalhos gerais, caixilharias, carpintarias e pinturas, implicaram a remodelação total ou parcial de várias divisões da fração, nomeadamente, da cozinha e de duas casas de banho.”), o acordo quanto a alterações das obras a executar, designadamente na cozinha, onde a troca de informações quanto ao seu lay out final decorreu entre 16/10/2017 e 23/3/2018.
Já no item 2.17 se deu por não provado que as alterações pretendidas para a cozinha tivessem implicado um atraso na execução da obra.
Sem prejuízo de se discutir da bondade do juízo negativo sobre este facto, certo é que da pretensão de alterações ao desenho da cozinha não deriva necessariamente um atraso na execução da obra, integrando esta outros trabalhos para além do da cozinha. Com efeito, nada impede que se pondere que toda a discussão sobre o lay out da cozinha se tenha processado antes do momento próprio de executar as correspondentes tarefas, sendo que a tal respeito nada alegou e demonstrou a ré, para justificar qualquer demora na entrega da obra.
Por outro lado, da sequência de emails trocados com a ré a esse respeito resulta que, tendo a filha da autora motivado as alterações no desenho da cozinha, prontamente respondia às interpelações da ré a esse respeito, (factos provados 60, 62, 64) sendo, pelo contrário, a ré que demorava a responder às suas mensagens.
Cumpre, pois, rejeitar a tese da apelante segundo a qual as alterações pretendidas pela autora sempre teriam de determinar um prolongamento do prazo de execução da obra, o que resultava difícil ab inito, pois que a ré jamais havia explicitado que trabalhos, em que termos e em que dimensão haviam dado azo a qualquer atraso.
Improcederá, pois, a apelação também quanto a esta questão.
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Importa, de seguida, sindicar o juízo probatório do tribunal a quo, em relação à matéria de facto indicada pela apelante.
Pretende ela que se dêem por não provados os factos 7, 9, 12, 13, 14, 16, 17, 18, 21, 22, 24, 29, 30, 31, 32, 35, 37, 39 a 44 (no texto da sentença, antecedidos pelo algarismo 1.), que o tribunal apreciou positivamente. E, bem assim, que se julguem provados os factos que o tribunal considerou não provados sob os nºs 10 e 11, 14 a 25 (no texto da sentença, antecedidos pelo algarismo 2.).
O método usado pela apelante para justificar a sua pretensão, não especificando, em relação a factos ou grupos de factos, os meios probatórios aptos a motivarem diferente juízo probatório, antes discorrendo sobre a forma como alguns meios probatórios (teor de vários emails, declarações de parte da autora e do representante da ré e depoimento testemunhal de DD, entre outros) deveriam ser considerados para conduzirem a diferente solução, dá azo a que este tribunal de recurso, por considerar – apesar de tudo – inteligível a motivação do recurso, proceda da mesma forma.
Constata-se, assim, que a discordância da apelante se dirige a três matérias distintas, que integram os factos sob impugnação:
A) O atraso na execução da obra (factos provados 7,9, 12, 13, 14, 16, 17, 35, 37, 39 e não provados 10 e 11, 14 a 20);
B) A existência de defeitos e os termos da sua denúncia (factos provados 18, 21, 22, 24, 29, 30, 31, 32 e não provados 21, 22, 23, 24 e 25)
C) A obra de eliminação de defeitos 40 a 44 e o estado de espírito da autora, motivada pela forma como a obra decorreu.
Importa, então, começar pelo leque de factos respeitantes à existência, ou não, de um prazo para a execução da obra e, sendo caso disso, às circunstâncias relativas à sua inobservância.
A este propósito, é incontroverso que foi a própria ré a apontar como prazo para a realização da obra orçamentada por si o período de dois meses e meio, sendo que a mesma lhe foi adjudicada em 20/9/2017 (facto provado 51). É isso que consta do facto provado 5, também ele não impugnado. Nestas condições, é razoável entender que – tal como a própria e a sua filha CC declararam em termos credíveis - a autora tivesse expectativa de que a obra lhe fosse entregue no início de 2008. Para além disso, resulta igualmente claro dessas declarações de ambas que, em Fevereiro, incumbindo uma amiga de vir verificar o estado da obra, esta constatou – e lhes relatou – que a mesma se encontrava longe da conclusão, designadamente sem pavimentos. Nada cumpre, por isso, criticar na decisão de dar por provada a matéria dos factos 7 e 9.
De resto, que a ré havia assumido uma obrigação de entrega da obra no prazo referido, sem prejuízo das sucessivas extensões que lhe foram sendo toleradas e mesmo expressamente consentidas, resulta também da interpretação do seu email de 11/4/2018, dirigido à filha da autora, no qual afirma “(…) quero apresentar novamente o nosso pedido de desculpas pelo atraso na execução dos trabalhos, mas penso que não sairá defraudada com a situação. (…)”.(facto nº 1.69). Com efeito, desta comunicação só se pode inferir não só a assunção da responsabilidade pelo incumprimento de um prazo estabelecido, para o que era pedida desculpa, mas também que esse pedido já constituía uma renovação de desculpas anteriores.
Em qualquer caso, a matéria em questão nenhuma relevância assume para a questão a decidir, pois é a própria autora a admitir que concedeu sucessivos prolongamentos do prazo para entrega da obra: primeiro, até 16/4/2018; depois, até 7/5/2018. Rejeita-se, assim, a tese da ré, nos termos da qual a obra nem sequer tinha prazo certo, pois que a autora só precisaria da casa em Agosto, para que a filha se instalasse quando viesse passar férias. Se é certo que existia esta intenção, também o é que, para a casa ficar pronta para habitar, outras questões haveriam de ser resolvidas, tais como a das mobílias.
É inequívoco, em coerência com tudo isto e segundo o que AA e CC declararam de forma isenta e convincente, que tinham a expectativa de, em face do prolongamento do prazo para além dos dois meses e meio que lhes haviam sido prometidos, verem a obra ser entregue em Abril, designadamente na data para a qual aprazaram o seu encontro com o representante da ré. De resto, ainda em coerência com isso mesmo, aprazaram identicamente uma visita de uma empresa de mobiliário, para que viesse tirar medidas, para fazerem móveis. Por tudo isso, não merece qualquer crítica o juízo positivo sobre a factualidade descrita nos pontos 1.12, 1.13 e 1.14.
Sobre o encontro, o estado da obra e a frustração da sua entrega, com novo agendamento para 7/5/2018, além das declarações ainda isentas e convincentes de AA e CC temos a demonstração resultante do email de 19/4/2018, referido no ponto 1.24 dos factos provados. Se é certo que este email não chegou ao conhecimento da ré (conforme facto provado nº 77), da sua composição e envio não deixa de resultar a intenção de fixação da factualidade verificada, por parte da autora, já por intervenção do seu advogado. Cumpre, assim, rejeitar a crítica ao juízo de comprovação sobre os factos 1.16, 1.17, 1.35 e 1.39 e a utilidade da referência à comunicação constante do facto 1.24., não obstante a correspondente comunicação não ter chegado ao destinatário.
Quanto ao facto 1.37, evidente se tornava que a obra não estava pronta a ser entregue e recepcionada no dia 16/4. Para além disso, mesmo que o estivesse, também é certo que a habitação se mostraria incapaz de acomodar a autora, a sua filha e o seu genro, pois que não estaria mobilada. Foi, de resto, de acordo com essas circunstâncias que AA havia convocado uma empresa de Paços de Ferreira para encomendar mobiliário (facto 1.13), pois que antes a casa estava desabitada (facto 1.53).
Nestas circunstâncias, a ida da autora AA, da filha e do genro para o hotel sempre seria inevitável, isto é, independente da circunstância de a obra ser entregue, ou não, nessa data. Parece, assim, que o motivo para a autora reclamar o pagamento das despesas suportadas com a deslocação a Portugal, em Abril de 2018, resulta da frustração dos objectivos dessa deslocação, pois que se deve ter por certo que não resulta da urgência de satisfação de necessidades pessoais da autora e seus acompanhantes que não ocorreriam se a obra lhes tivesse sido entregue. Elas sempre ocorreriam ainda que a obra estivesse perfeita e lhes tivesse sido então entregue. Por isso, em concordância com a apelante, entendemos não poder manter-se a asserção constante do item 37 dos factos provados, pois que esta induz uma relação de causalidade entre as despesas em questão, incluindo o recurso à estadia num hotel, e a falta de entrega da obra que não pode ter-se por demonstrada.
Por conseguinte, no item 1.37 do rol dos factos provados, dar-se-á apenas por provado que “Aquando da deslocação a que se alude em 1.13., efetuada pela autora na expectativa de rececionar a obra, a mesma ficou instalada num hotel, sendo que nessa data era impossível habitar a fração.” Tal alteração será introduzida imediatamente no lugar próprio.
Pelas razões já referidas se recusa, por outro lado, que deva dar-se por provada a matéria apreciada negativamente sob os itens 2.11 e 2.14, designadamente na perspectiva de que a ré não teria prazo para entregar a obra antes de Agosto de 2018, pois só para essa altura a autora tinha interesse na disponibilidade da habitação, bem como dos itens 2.18 e 2.19, sobre o conhecimento que a autora teria sobre a incompletude da obra em 16/4/2018.
Por outro lado, não é natural – e inexiste qualquer outra prova que justifique tal conclusão – que numa obra prevista para vários meses, e cujo prazo mereceu ainda aditamentos consentidos, se considere como facto relevante para o prolongamento da obra as tarefas de remoção de um cilindro e a sua reinstalação noutro local, com reposição da correspondente tubagem. Na falta de prova que permita concluir em termos diferentes, tais trabalhos são objectivamente simples, rápidos, fáceis de executar. Rejeita-se, ainda e pelas mesmas razões de ausência de qualquer prova que o explique e demonstre, se deva dar por provada a matéria dos itens 2.10, 2.15, 2.16, bem como a conversa a que se alude em 2.18.
Já quanto à matéria do item 2.17, respeitante ao processo de escolha do lay out final dos móveis de cozinha, o que se constata é que, sob as interpelações da ré, a filha da autora prontamente respondia e assinalava as suas opções. É isso que se descreve sob os itens 1.57 a 1.65. A demora no tratamento da solução sempre ocorreu do lado da ré, como resulta, já na fase final, da circunstância de a ré ter demorado 5 meses (de 23/10/2017 a 23/3/2018) a corresponder à comunicação de CC, de 23/10, esta por si própria respondendo a uma interpelação da ré desse mesmo dia. Dessa factualidade e perante a ausência de outra explicação e demonstração, é inviável concluir que as opções da autora em relação á cozinha, tratadas entre a sua filha e a ré, possa justificar o prazo de execução da obra ou qualquer prolongamento deste.
Improcederá, por isso, também nesta parte a apelação.
Por fim, pretende a apelante que se dê por provado que “Na altura a que se alude em 1.73., autora e ré “H...” agendaram a entrega do imóvel para o dia 07.05.2018.” (facto dado por não provado sob o nº 2.20).
Essa “altura”, recorde-se, corresponde à visita ao imóvel em 16/4. Ora é o próprio advogado da autora que, no email que emitiu em 19/4/2018, afirma que a ré deverá cumprir impreterivelmente o prazo combinado para entrega da obra, fixado para terminar em 7/5/2018 (facto provado 1.24.). Só pode, por isso, ter-se por provada essa matéria, que se inserirá entre os itens 1.24 e 1.25., sob o nº 1.24-A, o que de imediato se efectuará no local próprio, com a correspondente remoção de entre os factos não provados.
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De seguida, vem a ré impugnar a decisão quanto às anomalias da obra, classificadas como defeitos, bem como aos termos da sua denúncia pela autora.
Neste âmbito, em termos gerais, alega a apelante ser inadequado concluir pela verificação das apontadas anomalias na ausência de uma peritagem que oportunamente as tivesse identificado, meio de prova esse entretanto inviabilizado pelo facto de a autora ter ordenado a realização das obras que entendeu, mas que nada permite verificar que fossem exigidas para a eliminação de quaisquer defeitos da obra por si realizada.
A prática judiciária evidencia a mais valia que tende a constituir, em sede instrutória, em acções como a presente, a produção de prova pericial, apta a diagnosticar, segundo apurados critérios técnicos, as anomalias de uma obra, as suas causas, os seus efeitos, o seu significado económico, bem como as formas e os custos da sua superação. Todavia, também é claro que o recurso a esse meio de prova não se torna essencial quando as questões assumem densidade técnica diminuta, assentando em matéria perceptível à maioria das pessoas com mediana experiência, representáveis por imagem e passíveis de esclarecimento, quanto a causas, efeitos e formas de resolução, por profissionais do meio, a intervirem na instrução da causa como testemunhas. Por outro lado, sempre será desproporcional defender a necessidade produção de meios de prova tendentes a fazer disparar os custos de uma acção, quando o próprio valor da acção não o justifica. Tudo isto para dizer, em suma, que a actividade instrutória produzida neste processo, ainda que sem recurso a peritos, se revela suficiente e adequada para apurar a matéria controvertida, designadamente quanto às anomalias que a obra entregue pela ré apresentou.
Ora, a este propósito, a sequência factual já adquirida é a seguinte: em 16/4/2018 a autora e seus familiares estiveram na obra, sendo que esta ainda apresentava um grau de finalização incipiente e não foi entregue. As partes acordaram, então, que a entrega se verificaria no dia 7/5. E, nesta data, a obra foi entregue com diversas anomalias.
Neste contexto, a ré discute que se possam dar por provadas as anomalias descritas no ponto 1.22.
Verifica-se, porém, que tais anomalias – isto é, resultados da obra que não deveriam acontecer, por ser exigíveis outros – estão documentadas fotograficamente, o que acresce que DD, ao longo do seu depoimento, todas descreveu, explicando-as, bem como os trabalhos que a sua empresa executou para os superar.
Cumpre dizer que o depoimento de DD, muito sereno, contido e, também por isso, esclarecedor, não resulta menos relevante perante a sua confirmação – sob instância do Il. Mandatário da ré – de que não conhecia o estado anterior do apartamento, nem conhecia o teor dos trabalhos cometidos à ré.
Com efeito, não obstante isso, a natureza da obra, de remodelação de um apartamento de acordo com o orçamento referido no facto 1.4., tinha um óbvio caracter amplo, mencionado no facto 1.52: trabalhos gerais, caixilharias, carpintarias e pinturas, a implicarem a remodelação total ou parcial de várias divisões da fracção, nomeadamente, da cozinha e de duas casas de banho. Perante este objecto, aos factos descritos no ponto 1.22. só pode ser reconhecida a natureza de defeitos, pois a obra final, a entregar à autora, qualquer que fosse o estado anterior do apartamento, não os poderia apresentar. Recorde-se, a título de exemplo, a aplicação de azulejos “descasados”, no WC (fotos de fls. 64 e 66), prejudicando o padrão que a sua colocação correcta ofereceria, as deficientes junções entre as mais diversas superfícies (entre pavimentos, entre pavimentos e paredes, entre pilares e tectos), a utilização de uma caixilharia diferente na fachada do prédio, resultado uma solução diferente entre o apartamento em questão e os restantes (fls. 42), o desalinhamento da caixilharia (foto de fls. 48), a solução da calha, com quebra de azulejo da parede, conforme foto de fls. 46, a quebra de azulejos nas paredes, em resultado da aplicação de pavimento cerâmico (fls. 46), paredes e tectos com pintura deficiente e manchas, caixas de electricidade e espelhos de tomadas mal aplicados, deficiente emassamento e pintura de madeiras, entre o mais ali descrito. Acresce que de nenhum outro meio de prova resulta que já existissem algumas dessas anomalias (ex: azulejos da cozinha partidos junto ao chão, conforme al. m) do facto 22), sendo de presumir que ocorreram no âmbito dos trabalhos da ré que incluíram a remoção do pavimento anterior, o que é compatível com os danos que resultaram para os azulejos, sendo que, em qualquer caso, a ré jamais poderia deixar o trabalho no estado em que ficou. Daí não se alterar a matéria dos factos 29 e 30.
A matéria dos factos 31 e 32 resulta da análise do orçamento (fls. 109 v., ponto 1.4. do orçamento) e da verificação das fotografias de fls. 65, onde os estores exibidos não assumem as características de “blackout”.
Toda esta factualidade, caracterizando o estado de diversos elementos da obra entregue pela ré em 7/5/2018, deve considerar-se provada, estando mais que suficientemente demonstrada em resultado da conjugação dos meios de prova referidos. Ao que acresce não dever enjeitar-se a sua qualificação como defeito, por traduzir um resultado intolerável para os trabalhos de construção cometidos à ré.
Rejeita-se, pois, qualquer crítica ao juízo positivo do tribunal a quo, sobre a factualidade em causa.
Diferente disto é saber-se se, na reunião de 16/4/2018, alguns desses defeitos foram logo denunciados à ré [a) Inexistência de grelhas de ventilação nas duas casas de banho; c) Juntas entre cerâmicos mal betumadas em ambas as casas de banho; d) Cerâmicos que revestem as paredes de uma das casas de banho mal colocados, no sentido de não ser assegurada a correta conjugação do desenho exibido pelos mesmos; e) Junções entre os sanitários colocados nas casas de banho e os revestimentos cerâmicos mal betumadas] sendo certo que os demais não o poderiam ter sido, pois que não se conhece – nem a ré o alegou – o que já estivesse feito e o que, em concreto, tivesse sido aceite pela autora, sendo inconsequente a alegação de que logo ali esta se absteve de reclamar qualquer defeito, perante a não ocorrência da entrega da obra nessa altura.
Sobre a questão, a autora AA declarou que, aquando da visita ao apartamento em 16/4, a ré considerava que as casas de banho estavam prontas. Se assim era, então as anomalias que são evidenciadas nas fotografias tiradas após a entrega da obra e que acabam de se referir, já lá estavam, por natureza. E são tão evidentes (caso, por exemplo, dos azulejos “descasados”) que não se pode acreditar que a autora nada tivesse então referido a esse respeito, tanto mais que só pode presumir-se, já então, o seu desagrado perante a situação. Desagrado esse naturalmente indutor da vontade de reclamar e protestar, para o que não haveria de perder aquela oportunidade. É, por isso, de acreditar nas suas declarações, onde referiu ter denunciado ao representante da ré tais defeitos, ao invés de se acreditar na versão deste de que as reclamações só apareceram quando apresentou as facturas de trabalhos a mais. De resto, contra esta conclusão não colhe o argumento da ré, segundo o qual o facto de a autora lhe ter feito pagamentos logo após essa data demonstra a sua satisfação com a obra e a ausência de defeitos. Pelo contrário, esses pagamentos só podem interpretar-se como a vontade e incentivo da autora para que a ré terminasse a obra como se comprometeu, e com a qualidade contratada.
Daí dever dar-se por provada a matéria dos factos 1.18 e 1.21, tal como bem entendeu o tribunal recorrido.
Para além disso, pretende a ré que se retire do elenco dos factos provados a matéria do facto 24º, respeitante ao envio, pelo advogado da autora, do já falado email de 19/4/2018. Já se deu por verificado que a ré não usava o email para onde foi remetida aquela correspondência. Assim, sendo verdadeiro o facto, é o mesmo inconsequente, na medida em se sabe que tal comunicação não chegou ao conhecimento da ré (facto provado 77). Sendo tal matéria inconsequente, deve este tribunal abster-se de sobre ela intervir, sob pena de desenvolver uma actividade inútil. Nesta medida, nada se alterará em relação ao texto da sentença, nessa parte.
Ainda a este respeito, defende a ré que se dêem por provados os factos julgados negativamente sob os nºs 2.21 a 2.25.
O aí referido tende à negação de que a autora tivesse denunciado quaisquer defeitos, em qualquer momento.
Ora, no que respeita aos defeitos notados em 16/4/2018, já se confirmou a decisão do tribunal recorrido quanto a ter a autora concretizado a sua denúncia.
Quanto aos defeitos verificados após a entrega da obra, o acto de denúncia dado por provado foi unicamente o constituído pelo email enviado pelo advogado da autora, conforme descrito nos factos 1.82. e 1.83, o que surge ainda complementado pelo facto 1.81 (“Na sequência do email a que se alude em 1.26. a autora não pediu à ré “H...” que corrigisse, nem lhe deu oportunidade de corrigir eventuais desconformidades da obra.”).
Daí resulta, sem possibilidade de outra interpretação, que mesmo aquela denúncia constituída pelo envio de fotografias de diversos defeitos, a que a ré respondeu como consta do facto 1.84, não visava que a ré viesse reparar os defeitos em questão, sabendo-se ainda que de imediato essa obra foi atribuída a outra empresa.
Em qualquer caso, neste contexto, está excluída a realidade das afirmações enunciadas sob 2.21, 2.22 e 2.25, que não podem classificar-se como factos provados.
Por outro lado, é irrelevante para a decisão a proferir a matéria descrita no item 2.23, pelo que sobre ela se não intervirá.
No que respeita ao item 2.24, de facto algum se pode inferir que as reclamações da autora visavam não pagar quaisquer facturas, pelo que não cabe levar tal conclusão aos factos provados.
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Por fim, quanto a um terceiro grupo de factos, vem a apelante impugnar também a decisão recorrida. Referem-se eles às obras executadas para reparação dos defeitos apresentados pela obra entregue pela ré, em 7/5/2018 e ao estado de espírito da autora, motivada pela forma como a obra decorreu.
Como já se referiu, das declarações sinceras e convincentes da autora AA e da filha CC, bem como dos fundamentos descritos supra para se confirmar a decisão sobre o rol de defeitos evidenciados na obra produzida pela ré, resulta a necessidade da sua reparação, para que o apartamento pudesse cumprir o fim a que era destinado, nas condições que se pretendia que existissem e para o que tinha sido contratada a obra da sua remodelação. DD, representante da A..., justificou a justeza e adequação das obras que a empresa ali realizou, para superar tudo o que de mau fora deixado pela ré, designadamente por estar em desconformidade com o que o resultado de uma tal obra deveria constituir.
Por outro lado, já se referiu qual o principal objectivo da autora: assegurar que, em Agosto, o apartamento estivesse pronto para receber a sua filha, em férias, o que implicava, além da conclusão das obras de remodelação, a instalação de mobiliário.
Para além disso, o valor e o pagamento feito à A... pelas obras de reparação das anomalias descritas resulta do documento de fls. 38 e foi confirmado pelo referido DD de forma – repete-se – isenta e convincente. O recibo desse pagamento consta a fls. 171.
Por conseguinte, nenhuma crítica merece a decisão positiva sobre a factualidade descrita nos factos 40, 41, 42 e 43.
Que a autora tenha ficado preocupada, angustiada e desgostosa com o processo de remodelação da fracção e com o resultado da obra, tanto mais por não poder acompanhar a sua execução, é de presumir, por tal ser natural neste quadro de circunstâncias, perante tudo o que se apurou sobre o tempo do decurso da obra, os seus incidentes, anomalias e resultados apresentados.
Pelo exposto, nada cumpre alterar quanto à decisão de dar por provada a matéria do facto 1.44.
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Fica, assim, decidida a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, com a inclusão das alterações supra determinadas, sendo em função dela que cumpre, sucessivamente, apreciar a adequação da solução jurídica decretada.
Neste âmbito, é incontroversa a qualificação do contrato celebrado entre as partes: trata-se de um típico contrato de empreitada, tal como definido no art. 1207º do Código Civil.
Para além disso, trata-se de uma “empreitada de consumo”, a que são aplicáveis as disposições previstas especificamente para relações de consumo (onde o dono da obra é um consumidor final, que a destina a uso não profissional), na Lei de Defesa do Consumidor ( LDC, i.é, Lei nº 24/96, de 31/7) e no D.L. 67/2003, de 8/4 (neste sentido, entre outros, cfr. Ac. do TRL de 21/10/2021, proc. nº 225/20.2T8LNH.L1-2; Ac. do STJ de 17/10/2019, proc. nº 1066/14.1T8PDL.L1.S1, ambos em dgsi.pt). De referir que, no caso em apreço, este regime é ainda aplicável, apesar da sua revogação desde 1/1/2022, decretada pelo D.L. 84/2021, de 18/10, porquanto esta nova regulamentação só é aplicável a contratos celebrados após a sua entrada em vigor. Em qualquer caso, sempre se dirá que as soluções de ambos os diplomas, no respeitante a bens imóveis, são idênticas.
Constata-se, aliás, que a própria apelante acompanha a aplicabilidade, ao caso sub judice, de um tal regime, já que expressamente o invoca, para arguir a relevância da falta de denúncia dos defeitos que, na sua, tese, a autora só em sede judicial vem elencar para se eximir à obrigação de pagamento das facturas que lhe deve.
No entanto, a solução aplicada na sentença recorrida não recorreu a um tal regime, assentando na conclusão por um incumprimento definitivo do contrato de empreitada em causa, como se conclui dos seguintes excertos:
“No dia 07.05.2018 a ré entregou a obra à autora, sendo que a mesma apresentava, para além dos defeitos comunicados no dia 16.04.2018, que se mantinham, novos defeitos, todos já acima assinalados. Ou seja, dentro do último prazo que pela autora lhe foi concedido para finalizar a obra e eliminar os defeitos que já lhe haviam sido comunicados, a ré não logrou concluir a obra sem defeitos, muito menos eliminar os defeitos cuja existência já lhe havia sido comunicada.
(…) o não cumprimento da prestação será definitivo se a obra ou a eliminação dos seus defeitos, não tendo sido realizada, já o não puder ser, por o dono da obra ter nela perdido o interesse (1ª parte, do n.º 1, do artigo 808), ou por não ter sido realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo dono da obra (2ª parte do n.º 1 do artigo 808).
O art.º 808, nº 1, do CC, equipara ao incumprimento definitivo a perda do interesse do credor que seja subsequente à mora e a não realização da prestação no prazo que razoavelmente foi concedido ao devedor para cumprir a obrigação.
Na situação dos autos, entendemos ser lícita a conclusão de que existe um incumprimento definitivo, pois dentro do último prazo que para o efeito lhe foi concedido pela autora para concluir a obra e eliminar os defeitos de que a mesma já padecia - prazo esse que atento o atraso que a obra já registava não pode deixar de ser considerado como razoável -, a autora não só não procedeu à eliminação desses defeitos como não logrou concluir os trabalhos em falta sem novos defeitos.”
Vejamos, então, se pode concordar-se com tal solução.
O cumprimento perfeito de um contrato de empreitada implica que a obra convencionada seja entregue sem vícios que excluam ou reduzam o seu valor, ou a sua aptidão para o uso a que é destinada (art. 1208º do C.C).
No mesmo sentido, em face do D.L. 67/2003 [art. 2º,nº 2, al. d)][1], o cumprimento corresponde a que a obra seja entregue em conformidade com o contratado, o que não se verificará se a mesma não apresentar a qualidade que o consumidor pode razoavelmente esperar, atenta a natureza da obra em questão.
Perante tais definições, fácil é constatar que as anomalias descritas nas muitas alíneas do item 1.22 dos factos provados constituem defeitos da obra ou, segundo o conceito da legislação de defesa do consumidor, desconformidades. Com efeito, numa empreitada com o conteúdo da que foi adjudicada à ré, não é admissível que as pinturas tenham ficado no estado descrito, que os materiais aplicados (v.g., pavimentos, azulejos, caixilharia, armário da casa de banho, estores interiores, etc.) tenham apresentado o resultado descrito, que nos revestimentos não intervencionados tenham ocorrido danos como os constatados, sem que tenham sido reparados (v.g. os azulejos da cozinha, que ficaram partidos por consequência da remoção e colocação de novo pavimento), que não tenha sido assegurada a adequada ligação entre as paredes intervencionadas e os tectos pré-existentes, com os rodapés ou entre os pavimentos das diferentes divisões, o que, tudo, se afasta do que se antecipa como resultado de uma obra devidamente executada, tal como a autora a pretendia e tal como a ré lho assegurara.
Temos, em suma, que a obra executada pela ré foi entregue com toda uma série de defeitos ou desconformidades.
A ré, ora apelante, vencida quanto à negação dessa realidade, alega ainda que, em qualquer caso, ela não poderá determinar os direitos reconhecidos à autora na sentença apelada, pois que tais defeitos não só não lhe foram denunciados, como não lhe foi proporcionada a hipótese de reparar os que se constatassem existir, sendo que só no caso de incumprimento de um tal dever poderia ser condenada na indemnização fixada.
Não é controverso o regime legal aplicável ao cumprimento defeituoso do contrato de empreitada. Essencial é, como bem refere a apelante, que os defeitos verificados pelo dono da obra, aquando da sua entrega pelo empreiteiro, lhe sejam denunciados, como condição do ulterior exercício de qualquer direito. Estabelecem-no os arts. 1220º e 1225º, nº 2 do Código Civil, sendo esse acto igualmente essencial na hipótese no caso especial das empreitadas de consumo, nos termos dos nºs 1 e 2 do art- 5º-A do D.L. 67/2003 (cfr. Cura Mariano, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, 4ª ed, pg. 223).
Denunciados os defeitos, divergem os regimes, consoante se trate de um normal contrato de empreitada, ou de um contrato de empreitada de consumo.
Na primeira hipótese, segundo o disposto nos arts. 1221º e 1222º do C. Civil, o dono da obra tem o direito a exigir a eliminação dos defeitos ou, se isso não for eficaz, uma nova construção. No caso de o empreiteiro não cumprir esta obrigação, poderá exigir a redução do preço ou operar a resolução do contrato, exigindo a indemnização dos danos que a entrega da obra com tais defeitos lhe determine (art. 1223º do C. Civil), danos esses recorrentemente correspondentes aos custos da eliminação desses mesmos defeitos por outrem.
Tal como ponderou o tribunal recorrido, a resolução do contrato e a obtenção de tal indemnização exige previamente que o empreiteiro incorra em incumprimento definitivo do contrato, designadamente por recusar o seu cumprimento, por não cumprir a sua obrigação de reparação dos defeitos em prazo razoável que lhe seja fixado ou por, atenta a mora em que incorra na satisfação dessa obrigação, se puder reconhecer objectivamente uma perda de interesse do dono da obra em que o empreiteiro o faça.
Diferente é o regime previsto no D.L. 67/2033, de cariz expressamente protector para com o dono da obra, em homenagem ao seu estatuto naturalmente mais frágil de consumidor, num relacionamento com uma entidade profissional, habituada a actuar no mercado respectivo.
Com efeito, apesar de os direitos resultantes para o dono da obra, segundo esse regime, terem idêntico conteúdo aos previstos no C. Civil (cfr. Cura Mariano, ob cit, pg. 224), os mesmos não são de exercício sucessivo, mas sim independentes uns dos outros. Como se refere no mesmo texto (pg. 226) “Em princípio, perante a existência de faltas de conformidade na obra realizada, o dono desta pode exercer livremente qualquer um dos direitos conferidos pelo art. 4.º, n.º 1, do D.L. n.º 67/2003. Essa liberdade de opção pelo direito que melhor satisfaça os seus interesses deve, contudo, respeitar os princípios da boa fé, dos bons costumes e a finalidade económico-social do direito escolhido (art. 334.º, do C.C.).”
Tendo presente esta realidade, verifica-se que, no caso, a apelante alega que qualquer direito da autora se mostra prejudicado por jamais lhe terem sido denunciados quaisquer defeitos.
Não tem, porém razão. Como se provou sob o item 1.18, logo em 16/4/2018 a autora comunicou à ré constatar os seguintes defeitos, numa das casas de banho, não obstante a mesma se encontrar pronta, segundo a ré:
a) Inexistência de grelhas de ventilação nas duas casas de banho;
c) Juntas entre cerâmicos mal betumadas em ambas as casas de banho;
d) Cerâmicos que revestem as paredes de uma das casas de banho mal colocados, no sentido de não ser assegurada a correta conjugação do desenho exibido pelos mesmos;
e) Junções entre os sanitários colocados nas casas de banho e os revestimentos cerâmicos mal betumadas.
Para além disso, tendo a ré entregue a obra em 7/5, sem ter reparado os defeitos referidos, comunicou à autora, por email de 14/5, a sua disponibilidade para “…eventual correção de qualquer situação que não tenha ficado de acordo com as V/ expectativas, nomeadamente a colocação das grelhas de ventilação das casas de banho e os retoques nas tintas dos rodapés.” Ou seja, desde logo quanto ao problema mais complexo de resolver, a implicar a remoção é reposição dos azulejos mal colocados, por desalinhados para com o desenho de demais, a ré nada fez nem admitiu fazê-lo (facto 1.26.).
Acresce que a autora, através do seu advogado, na sequência da entrega da obra, logo comunicou à ré uma série de defeitos que verificou, remetendo-lhe diversas fotografias de várias das anomalias descritas nas alíneas do facto provado 1.22. (cfr. factos provados 1.82. e 1.83.).
Nessas fotografias não se ilustram todos os defeitos que estão elencados no item 1.22.
Todavia, cumpre afirmar que nenhum efeito útil tem essa falta de coincidência plena.
Tal só aconteceria se o tratamento da situação evoluísse para a exigência de reparação dos defeitos denunciados, pois que – logicamente – se alguns não fossem denunciados, jamais poderia sobrevir qualquer responsabilização para o empreiteiro, em razão da sua apenas ulterior identificação.
Não assim quando a solução passe por uma resolução do contrato que se tenha por legítima, e pela indemnização do prejuízo causado pelos defeitos verificados, pois nesta hipótese o que haverá que determinar ulteriormente é o conteúdo desse prejuízo, já que a denúncia dos defeitos só relevará em sede de legitimação da resolução.
Importa, assim, indagar se, em face dos defeitos existentes na obra entregue, quer os denunciados em 16/4, quer os identificados após 7/5/2018, foi legítima a decisão da autora, ao declarar a resolução do contrato e ao pretender a indemnização do prejuízo correspondente ao custo de superação de tais defeitos.
Neste contexto, cumpre afirmar expressamente que o referido email remetido à ré, em 15/5/2018, onde se qualifica a actuação contratual da ré como um “incumprimento reiterado e definitivo” mais não é do que uma declarada resolução do contrato de empreitada em causa, com a inerente recusa de pagamento de qualquer outro valor reclamado a esse título.
Ora, perante a regulamentação constante do D.L. 67/2003 já referida, e nada havendo sido demonstrado que permita classificar como abuso de direito a pretensão da autora, em face da falta de qualidade da prestação contratual da ré, tem de reconhecer-se que, nas concretas circunstâncias do caso, perante o desenvolvimento da prestação contratual de ambas as partes e o respectivo resultado, lhe assistia o direito à resolução do contrato, sem prejuízo do direito à indemnização do prejuízo causado.
Com efeito, segundo este regime legal, designadamente em razão das regras dos nºs 1 e 5 do respectivo art. 4º, a resolução do contrato não fica dependente de uma prévia interpelação para a correcção dos defeitos existentes/denunciados, e da inobservância, pelo empreiteiro, de um tal dever.
Assim, perante tal regime – que é o aplicável em razão da sua especialidade em relação ao regime geral do contrato de empreitada do Código Civil – cumpre afirmar que, no caso sub judice, assistia à autora o direito que se apresentou a exercer, isto é, o de resolver o contrato celebrado com a ré, exigindo desta, sucessivamente, a indemnização dos danos que o incumprimento contratual lhe acarretou. Este direito surge-lhe assegurado nos termos do nº 1 do art. 12º da Lei nº 24/96, de 31/7 – Lei de Defesa do Consumidor: (“O consumidor tem direito à indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do fornecimento de bens ou prestações de serviços defeituosos.”).
Em qualquer caso, mesmo perante o enquadramento legal geral do Código Civil, cumpriria reconhecer à autora o mesmo direito, tal como concluiu o tribunal recorrido: a entrega da obra no estado em que ocorreu, sem reparação dos defeitos pré-denunciados no prazo que intercalou a sua denúncia (16/4/2028) e a última data fixada para essa entrega (7/5/2018), depois de há muito ultrapassado o prazo inicial acordado para a realização dos trabalhos (dois meses e meio, a partir de finais de Setembro de 2017), e comportando a obra entregue ainda diversos outros defeitos, legitima que se conclua pelo incumprimento definitivo da prestação devida pelo empreiteiro, nos termos do art. 808º, nº 1 do C. Civil. Desproporcional seria exigir à autora que, nessas circunstâncias, ainda tivesse de fixar à ré um novo prazo para reparar os defeitos que então a obra apresentava, parte dos quais esta já se abstivera de corrigir (os das als. a), c), d) e e) do facto 1.22.) bem como os outros que deixou que permanecessem na obra entregue e em relação a parte dos quais veio depois rejeitar qualquer responsabilidade, como ressuma do email de 17/5/2018, descrito no ponto 1.84.
Assim, repete-se, é insusceptível de crítica a conclusão do tribunal recorrido quanto á classificação da situação como de incumprimento definitivo das obrigações da ré, em termos que, segundo o disposto no nº 1 do art. 1222º do Código Civil legitimavam a autora a declarar a resolução do contrato, como o fez.
Subsequentemente, nos termos do art. 1223º, caberia à autora o direito a ser indemnizada nos termos gerais.
Conclui-se, assim, que independentemente do regime aplicado, sempre seria esta a solução a decretar.
A indemnização, segundo os critérios gerais do 562º do Código Civil, deve ser adequada a colocar a autora na situação que se verificaria se não tivesse ocorrido a actuação ilícita da ré, isto é, o seu incumprimento contratual. No caso, isso equivale a colocar a obra no estado em que a mesma deveria ser entregue, ou seja, sem os defeitos identificados.
Para o efeito, a autora contratou outra empresa, que reparou os defeitos em questão, cobrando 10.209,00€, que a autora pagou. Sendo o seu pedido, quanto a tal prejuízo, o do pagamento, pela ré, de 10.100,00€, deve esta ser condenada a prestar-lhe essa indemnização, tal como concluiu o tribunal a quo.
Note-se que a indemnização haverá de ser fixada segundo tal critério, não estando limitada, por exemplo, em função dos defeitos que tiverem sido objecto de denúncia, como refere a apelante, nas alegações do presente recurso. Com efeito, inexiste regra de que isso resulte, sendo que a denúncia dos defeitos, constituindo condição do exercício ulterior dos direitos conferidos ao dono da obra e condicionando o prazo para o respectivo exercício, não tem a virtualidade de limitar a indemnização dos prejuízos que a obra defeituosa determine.
Haverá, pois, de confirmar-se a decisão, nesta parte.
A autora pediu ainda que a ré fosse condenada a pagar-lhe as despesas com a sua deslocação a Portugal, no dia 16.04.2018, que liquidou no valor de 1.093,75€, bem como uma indemnização no valor de 5.000,00€, para compensação de danos não patrimoniais.
A sentença recorrida considerou que tais despesas ascenderam a 196,36€ e que os danos morais verificados deveriam ser compensados mediante o pagamento de 1.500,00€.
No que respeita às referidas despesas, sendo inequívoco que a autora as suportou, considerámos supra que as mesmas não foram determinadas pela conduta contratual da ré. Por isso foi alterado o texto do item 1.37 dos factos provados. Foi entendido, como acima se justificou, inexistir uma relação de causalidade entre a actuação da ré e aqueles gastos. Por conseguinte, nesta parte a apelação deverá proceder, absolvendo-se a ré do pagamento daquele montante de 196,36€ e juros respectivos.
No que respeita aos danos não patrimoniais, assentava a alegação da ré na impugnação da decisão positiva sobre a factualidade descrita no facto 1.44., afirmando que, não tendo incorrido em qualquer atraso, se não justifica admitir que a autora ficou preocupada, desgostosa e angustiada com a situação do imóvel.
Em momento próprio se rejeitou essa sua tese, sendo que nenhuma outra razão aponta a apelante para que se reveja a decisão nessa parte, por exemplo, quanto à falta de gravidade dos danos para justificarem tutela jurídica, ou quanto aos critérios de quantificação da correspondente indemnização.
Por conseguinte, inexiste qualquer razão para criticar a sentença recorrida nessa parte.
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Resta, assim e em suma, concluir pela procedência parcial da apelação, na parte relativa à condenação da ré a pagar à autora a quantia de 196,36€ e juros respectivos, que se extrairá do dispositivo da sentença recorrida. Esta será, porém, mantida em tudo o mais, improcedendo no restante a presente apelação.
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Sumariando:
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3 - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes que constituem este Tribunal em julgar parcialmente procedente a presente apelação, em razão do que, alterando a decisão recorrida, a substituem por outra nos termos da qual absolvem a ré do pagamento do valor de 196,36€ (cento e noventa e seis mil e trinta e seis cêntimos), excluindo tal montante do valor da condenação decretada, o que se estende aos juros respeitantes a tal valor. Em tudo o mais julgam improcedente a apelação, confirmando o restante da sentença recorrida.

Custas por apelante e apelada, na proporção do decaimento.


Porto, 13/09/2022
Rui Moreira
João Diogo Rodrigues
Anabela Miranda
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[1] Norma idêntica à constante do art. 7º, nº 1, al. d) do D.L. 84/2021, de 18/10.