Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
550/22.8T8VLG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RITA ROMEIRA
Descritores: ALEGAÇÕES DE RECURSO
EXIGÊNCIAS
AUDIÊNCIA PRÉVIA
Nº do Documento: RP20230123550/22.8T8VLG.P1
Data do Acordão: 01/23/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A DECISÃO.
Indicações Eventuais: 4. ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I – A, eventual, não satisfação pelo recorrente nas conclusões das alegações das exigências previstas no art. 639º, não se enquadra no prescrito no art. 641º, em concreto na al. b) do seu nº 2, ambos do CPC e, desse modo não gera o indeferimento do recurso. Tal só ocorre quando as alegações não tenham aquelas.
II – Estando em causa uma situação em que, em sede de tentativa de conciliação, realizada previamente à prolação do despacho saneador, se anuncia a intenção de conhecer do mérito da causa naquele, em especial, da excepção de aceitação de despedimento deduzida pela empregadora e até o sentido da procedência da mesma, por se considerar que o processo reúne já as condições para conhecimento e prolação da decisão final, nada opondo as partes e, em despacho prévio àquele, dispensa-se a realização da audiência prévia, tendo em conta a realização daquela e a oportunidade que as partes tiveram de se pronunciar em sede de articulados sobre as questões a conhecer, o despacho saneador que, depois disso, vem a ser proferido não enferma de qualquer vício (relacionado com a falta de audiência prévia, violação do contraditório ou decisão surpresa) que possa determinar a sua anulação ou revogação no âmbito de recurso dele interposto.
III – No Código de Processo do Trabalho, ao contrário do previsto no Código de Processo Civil, a audiência prévia é convocada quando a complexidade da causa o justifique.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo: 550/22.8T8VLG.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho de Valongo - Juiz 2

Recorrente: AA
Recorrida: D..., SA



Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I - RELATÓRIO
O A./Trabalhador, AA, com NIF ..., residente na Rua ..., ... ... intentou contra a R./Entidade Empregadora, D..., SA, com NIPC ..., sede no Parque Industrial ..., Lote – ... Moimenta da Beira e citada no Loteamento ..., ..., ... Moimenta da Beira, acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, através da apresentação de requerimento no formulário próprio a que se referem os art.s 98º-C e 98º-D do CPT, (Código de Processo do Trabalho, diploma a que pertencerão os demais artigos a seguir referidos, sem outra menção de origem) opondo-se à sanção de despedimento que lhe foi aplicada por aquela, sua Entidade Empregadora.
Designado dia e realizada a audiência de partes a que alude o art. 98º-F, nº 1, conforme consta da acta datada de 09.03.2022, não se logrou alcançar o acordo entre as partes, tendo a Ré sido notificada para apresentar o articulado motivador do despedimento, o que fez nos termos do requerimento junto em 24.03.2022, previamente, alegando, que promoveu pela extinção do posto de trabalho adstrito ao A./trabalhador, tendo para o efeito, conforme lhe era exigível, colocado à disposição daquele, a correspondente compensação na data de 14 de Fevereiro de 2022, ou seja, em momento anterior ao termo do aviso prévio, não tendo, até ao momento, tal compensação paga, sido restituída à aqui Ré. Nem em simultâneo com o seu pagamento, nem até à data agendada para a realização da audiência de partes, nem mesmo posteriormente.
Por essa razão alega e defende que deve, sem mais, a extinção do posto de trabalho em causa ser julgada lícita e aceite pelo Réu, que não logrou ilidir a presunção de aceitação do despedimento a que se refere o nº 4 do artigo 366º do Código de Trabalho, convocando ainda o nº 5 desse mesmo normativo, artigo esse aplicável ao caso ex vi artigo 372º do mesmo diploma legal.
Prossegue, alegando que ao trabalhador, aqui autor, que pretenda ver apreciada a regularidade e licitude do despedimento por extinção do posto de trabalho, para além de lançar mão da competente acção, deverá proceder à restituição integral dos montantes recebidos, sob pena de lhe ser vedada essa faculdade e ser o despedimento tacitamente aceite pelo mesmo.
Mais, alega que o hiato temporal decorrido até àquele momento sem que o autor tenha procedido à devolução de qualquer valor não é subsumível no conceito de “prazo razoável”, concluindo que por essa razão deve, sem mais, a extinção do posto de trabalho ser julgada aceite pelo réu que não logrou ilidir a presunção em causa.
Por fim, cita e remete para a jurisprudência, no sentido de, não bastar a ocorrência de uma manifestação de não aceitação do despedimento por parte do trabalhador, exigindo-se também que este adote, em simultâneo, ou seja, ao mesmo tempo ou num curto espaço de tempo, uma atitude que signifique recusa de recebimento, devolução ou colocação à disposição da sua entidade empregadora da compensação que desta haja recebido àquele título.
Termina “QUE DEVE O PRESENTE DESPEDIMENTO POR EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO SER JULGADO LÍCITO E REGULAR E EM FUNÇÃO DISSO, SER A ENTIDADE EMPREGADORA ABSOLVIDA DO PEDIDO APRESENTADO PELO TRABALHADOR, TENDO EM CONTA:
A) QUE ATÉ AO MOMENTO O TRABALHADOR NÃO PROCEDEU À DEVOLUÇÃO DA TOTALIDADE DA COMPENSAÇÃO RECEBIDA E, PORTANTO, NÃO LOGROU ILIDIR A PRESUÇÃO DE ACEITAÇÃO A QUE SE REFERE O N.º 5 DO ART. 366º DO CÓDIGO DO TRABALHO.
AD CAUTELAM;
B) ENCONTRA-SE LEGAL, TEMPESTIVA E FORMALMENTE CUMPRIDO O PROCEDIMENTO DE EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO, O QUAL SE DEVEU A MOTIVAÇÕES DE MERCADO E QUEBRA DE FATURAÇÃO DA ENTIDADE EMPREGADORA, SENDO IMPOSSÍVEL A SUBSISTENCIA DA RELAÇÃO LABORAL, INEXISTINDO NA ESTRUTURA EMPRESARIAL OUTRO POSTO DE TRABALHO COMPATIVEL. NEM CONTRATOS A TERMO, NÃO SENDO APLICÁVEL O DESPEDIMENTO COLETIVO, NEM A PRESENTE EXTINÇÃO SE DEVEU A CONDUTA CULPOSA DO TRABALHADOR OU ENTIDADE EMPREGADORA, ENCONTRANDO-SE CUMPRIDOS OS REQUISITOS PREVISTOS NO N.º 1 DO ART. 368º DO CÓDIGO DO TRABALHO”.
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Através do requerimento com a refª citius 41880289, apresentado no dia 06.04.2022, a ré veio expor que constatou a devolução pelo autor da indemnização paga àquele por efeitos do procedimento de extinção do posto de trabalho, referindo que tal devolução apenas ocorreu após a notificação ao autor da apresentação do articulado motivador do despedimento onde a ré alega precisamente a não devolução daquele montante. Mais, refere e conclui que, o autor foi notificado da apresentação do articulado motivador do despedimento em 25.03.2022 e procedeu à devolução daquele valor apenas, em 04.04.2022, pelo que não deve ser considerada ilidida a presunção acima referida e o despedimento por extinção do posto de trabalho deve ser considerado aceite pelo autor.
Requer, assim, que se julgue, “o despedimento por extinção do posto de trabalho lícito e aceite pelo trabalhador.”.
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O A. apresentou contestação com reconvenção, no dia 11.04.2022, através do requerimento com a refª citius 41923234, impugnando em parte a factualidade alegada pela ré e manifestando a sua não aceitação à decisão que lhe foi comunicada de extinção do posto de trabalho, sustentando que devem improceder os motivos invocados pela ré para justificar a extinção do seu contrato de trabalho e que a proposição da presente ação corrobora a sua oposição àquela decisão tomada pela entidade empregadora.
Alega que foi contra a sua vontade que, em 14.02.2022, foi colocada à sua disposição a compensação devida, bem como os créditos vencidos e exigíveis, por efeito da cessação do contrato de trabalho, a qual restituiu em 01.04.2022.
Remete para a jurisprudência que cita, no sentido de dever ser atribuída à expressão “em simultâneo” utilizada no nº 5 do artigo 366º a maleabilidade necessária para contemplar a realidade que se prende com um aspeto crucial para o trabalhador que consiste no direito de dispor de algum tempo para se poder aconselhar, com vista a poder tomar a decisão se aceita o montante da compensação e consequentemente o despedimento.
Alega, ainda, que não pode a não devolução imediata da compensação acionar a presunção de aceitação de despedimento e impedir o autor de lançar mão da competente ação, visto que a elisão da presunção deve ser feita em momento judicialmente exigível.
Em sede de reconvenção, requer que o despedimento seja declarado ilícito, sendo a ré condenada a reintegrá-lo, sem prejuízo da sua antiguidade e categoria profissional, bem como no pagamento das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à sua reintegração.
Ainda em sede de reconvenção, peticiona, em alternativa, a condenação da ré no pagamento de uma indemnização pela antiguidade, caso por ela venha a optar.
Termina requerendo que, “A) DEVERÃO IMPROCEDER OS MOTIVOS INVOCADOS PELA RÉ PARA JUSTIFICAR A EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO DO AUTOR,
E EM RECONVENÇÃO
b) SEJA O PRESENTE DESPEDIMENTO POR EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO JULGADO ILÍCITO,
c) SEJA A RÉ CONDENADA A REINTEGRAR O TRABALHADOR NA EMPRESA, SEM PREJUÍZO DA SUA ANTIGUIDADE E CATEGORIA PROFISSIONAL,
D) BEM COMO NO PAGAMENTO DE:
- €482,14 A TÍTULO DE RETRIBUIÇÃO DO MÊS DE FEVEREIRO,
- €264, A TÍTULO DE SUBSÍDIO DE ALIMENTAÇÃO,
- E AS RETRIBUIÇÕES INTERCALARES QUE DEIXOU DE AUFERIR DESDE A DATA DO DESPEDIMENTO ATÉ AO TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO JUDICIAL QUE DECLARE A ILICITUDE DO DESPEDIMENTO, OU, EM ALTERNATIVA,
E) A CONDENAÇÃO DA RÉ NO PAGAMENTO DA RETRIBUIÇÃO DO MÊS DE FEVEREIRO E SUBSÍDIO DE ALIMENTAÇÃO NO MONTANTE DE €746,14 E €5.691,04, A TÍTULO DE COMPENSAÇÃO, CASO POR ELA VENHA A OPTAR, E OUTROS CRÉDITOS LEGALMENTE EXIGÍVEIS, TUDO ACRESCIDO DE JUROS DE MORA À TAXA LEGAL ATÉ INTEGRAL PAGAMENTO.”.
*
A R. respondeu, em 02.05.2022, através do requerimento com a refª citius 42098954, reiterando que se verificou uma aceitação do despedimento por parte do trabalhador, designadamente, a partir do momento em que este manteve na sua posse, por mais de cinquenta dias, a compensação paga a título de despedimento, remetendo tal entendimento para o disposto no nº 5 do artigo 366º do Código do Trabalho e jurisprudência já citada, nomeadamente, aquando da apresentação do articulado motivador de despedimento e requerimento datado de 06.04.2022.
Alega que, nada mais tem a pagar ao trabalhador, desde a data do despedimento (com exceção daqueles créditos laborais que o trabalhador recebeu e integrou na sua esfera jurídica e apenas após a alegação da entidade empregadora quanto à sua não devolução, veio devolver), referindo quanto aos pontos 44º e 45º da contestação-reconvenção do autor, os valores requeridos correspondem, precisamente, às importâncias pagas ao trabalhador, aquando do despedimento e até ao termo do prazo do aviso prévio, pelo que se verifica que não é, nem nunca foi intenção da entidade empregadora faltar às suas obrigações legais para com o trabalhador, tendo já colocado à disposição do trabalhador aquando do despedimento, por transferência bancária, os valores que o autor agora peticiona. Nessa medida, impugna o pedido que consta dos pontos 44º e 45º da contestação-reconvenção, argumentando que constitui facto provado pelo referido recibo de vencimento que essas quantias já foram pagas ao trabalhador autor.
Mais, impugna o invocado pelo autor quanto à alegação de não ter sido concedida formação por parte da entidade empregadora e o valor da compensação peticionada, nomeadamente, invocando que o trabalhador se encontrou incapacitado para o exercício da atividade profissional no período compreendido entre agosto de 2020 e novembro de 2021.
Conclui que, “DEVE A PRESENTE RÉPLICA SER JULGADA PROCEDENTE E, EM FUNÇÃO DISSO, SER O DESPEDIMENTO POR EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO JULGADO LÍCITO E, CONSEQUENTEMENTE, SER A RECONVINDA ABSOLVIDA DO PEDIDO APRESENTADO PELO RECONVINTE, TENDO EM CONTA:
A) QUE O TRABALHADOR PROCEDEU À DEVOLUÇÃO EXTEMPORÂNEA DA TOTALIDADE DA COMPENSAÇÃO RECEBIDA E, PORTANTO, NÃO LOGROU ILIDIR A PRESUNÇÃO DE ACEITAÇÃO A QUE SE REFERE O ART.º 366º N.º 5 DO CÓDIGO DO TRABALHO.
B) ENCONTRA-SE LEGAL, TEMPESTIVA E FORMALMENTE CUMPRIDO O PROCEDIMENTO DE EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO, NÃO TENDO A ENTIDADE EMPREGADORA QUALQUER INTENÇÃO DE REINTEGRAR O RECONVINTE.
C) A ENTIDADE EMPREGADORA PROCEDEU AO PAGAMENTO DE TODAS AS QUANTIAS LEGALMENTE PREVISTAS, CORRESPONDENTES A TODOS OS DIREITOS DO TRABALHADOR, PELO QUE NADA MAIS É DEVIDO PELA RECONVINDA AO RECONVINTE.”.
*
Oportunamente, a Mª Juíza “a quo”, por a considerar oportuna, ordenou a realização de uma tentativa de conciliação.
E, nos termos que constam da acta de 14.07.2022, frustrada que ficou a hipótese de conciliação entre as partes, a Mmª Juíza, como ficou assente naquela, ao abrigo do dever de gestão processual (artigo 27º do Código de Processo Civil) e da economia processual, auscultou os ilustres mandatários das partes sobre a possibilidade de a presente diligência ser aproveitada para as partes assentarem desde já na matéria de facto por acordo das partes, sendo que os ilustres mandatários responderam positivamente. Nessa sequência, prosseguiram os trabalhos no sentido de ser fixada a factualidade assente por acordo das partes, sendo que nessa decorrência, pelos Ilustres Mandatários das partes foi dito que as partes estavam de acordo em dar já como assente por acordo das partes a matéria de facto que nela consta.
De seguida, como igualmente ficou documentado naquela acta, “Perante a matéria de facto acordada, a Mmª Juíza comunicou aos ilustres mandatários que representam as partes que, salvo melhor entendimento, o processo reunia já condições para conhecimento da exceção de aceitação de despedimento deduzida pela entidade empregadora no articulado motivador de despedimento, conhecimento esse que como já anunciado aquando da tentativa de conciliação será no sentido da procedência de tal exceção, sendo certo que o trabalhador teve já oportunidade de se posicionar perante tal questão no respetivo articulado.
A Mmª Juíza comunicou aos ilustres mandatários que, salvo melhor opinião, os autos reuniam já elementos para prolação de decisão final tendo em conta a factualidade acordada nesta diligência e as questões a decidir, nada tendo sido dito pelos ilustres mandatários das partes.
Nesse seguimento, e perante a anunciada intenção do tribunal proferir decisão final, a Mmª Juíza, deu neste momento a oportunidade ao trabalhador/autor para, face às soluções plausíveis da questão de direito e ao disposto no artigo 391º do Código do Trabalho, fazer a opção prevista naquele normativo.
Nessa sequência, pela ilustre mandatária do trabalhador/autor foi dito que o trabalhador opta pela reintegração.”. (sublinhado nosso – dado o relevo para apreciação da questão colocada pelo recorrente)
Após, a Mª Juíza proferiu o seguinte despacho. “Tendo-se frustrado a conciliação, deverão os autos ser oportunamente conclusos.
Notifique.”.
*
Conclusos que foram os autos, em 16.10.2022, a Mª Juíza proferiu o seguinte:
«A - Resulta do artigo 98º-M, nº 1, do Código de Processo do Trabalho, que no âmbito do processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, “terminada a fase dos articulados, o processo segue os termos previstos nos artigos 61º e seguintes…».
Por seu turno, decorre do artigo 62º, nºs 1 e 2 do mesmo diploma que a audiência prévia apenas é convocada quando a complexidade da causa o justifique.
No presente caso, entende-se que é de dispensar a convocação da audiência prévia, sendo certo que foi já realizada uma tentativa de conciliação, conforme ata refª citius 438671308 em que o tribunal teve já oportunidade de auscultar os ilustres mandatários das partes sobre as questões que se colocam no âmbito dos presentes autos e nessa diligência foi possível que as partes acordassem em dar como assente por acordo das partes a factualidade que se mostra vertida na ata referente a tal diligência. Do mesmo passo, as partes tiveram já oportunidade de se pronunciar em sede de articulados sobre as questões em causa.», continuou com a admissão da reconvenção deduzida pelo autor/trabalhador, a prolação de saneador tabelar e considerando o seguinte:
«D - Conforme já anunciado às partes na diligência de tentativa de conciliação, considera o tribunal que o processo reúne já condições para conhecimento da exceção de aceitação de despedimento por parte do autor e, bem assim, para prolação de decisão final com apreciação do peticionado, tendo em conta a factualidade assente por acordo das partes e as questões a decidir.
As partes nada opuseram.
O autor no âmbito dessa diligência manifestou optar pela reintegração (cfr. refª citius 438671308).
Considerando as posições das partes e a factualidade assente por acordo das partes, porque se entende que os autos contêm já todos os elementos necessários à decisão do mérito – artigo 595º, nº 1, al. b) do Código de Processo Civil, ex vi artigos 98º-M, nº 1 e 49º, nº 2, do Código de Processo do Trabalho, e artigo 61º deste último diploma -,», a Mª Juíza “a quo” proferiu sentença que terminou com a seguinte «DECISÃO:
Pelo exposto, decide-se:
1 - Julgar procedente a exceção perentória de aceitação do despedimento pelo autor e, em consequência:
a) Absolver a ré dos pedidos de declaração de ilicitude do despedimento, de reintegração e de pagamento de retribuições intercalares;
b) Reconhecer ao autor o direito à compensação legal pelo despedimento por extinção do posto de trabalho que lhe foi oportunamente paga pela ré em 14-02-2022, mencionada nos pontos 8 dos factos provados, e que o autor devolveu à ré em 1-04-2022;
2 - Condenar a ré no pagamento ao autor da quantia de €778,50 a título de créditos pela formação que não lhe foi prestada, acrescida de juros de mora legais (atualmente de 4%), contados desde a cessação do contrato (15-02-2022) até efetivo e integral pagamento;
3 – Reconhecer ao autor o direito aos créditos de vencimento e subsídio de alimentação, férias não gozadas, proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal e remanescente de aviso prévio, melhor discriminados no ponto 9 dos factos provados, os quais foram oportunamente pagos pela ré ao autor em 14-02-2022 e que o autor, certamente por lapso, entretanto, transferiu para a ré na pendência dos presentes autos.
***
Fixa-se aÌ presente causa o valor de €2.770,80.
Custas por autor e ré, na proporção do respetivo decaimento, fixando-se a responsabilidade do autor em 72% e a responsabilidade da ré em 28%, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário concedido ao autor (artigos 527º e 607º, nº 6, do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi artigo 1º, nº 2, al. a), do Código de Processo do Trabalho).
Registe e notifique.».
*
Inconformado com esta sentença, o A. apresentou recurso, nos termos das alegações juntas, com a referência citius 33780668, que finalizou com as seguintes Conclusões:
“1.º Não teve, o Tribunal a quo em consideração, quer a prova apresentada, quer documental, quer testemunhal apresentada pelo A. quer pela R.,
2.º Reitera-se que a pretensão do A. é a reintegração do trabalhador e não a obtenção da compensação que tanto se debateu ao longo da sentença.
Pelo exposto e com o douto suprimento de V/ Exas., deve ser concedido provimento ao presente recurso, deve a presente sentença ser considerada nula, permitindo-se a realização de julgamento, agendando-se para tal a audiência prévia.
JUSTIÇA!”.
*
A R. apresentou contra-alegações, com a referência citius 33993724 as quais terminou com as seguintes: “CONCLUSÕES
a) As conclusões formuladas nas alegações de recurso antecedentes e apresentadas pelo Recorrente não satisfazem as exigências previstas no art. 639º do C.P.C.
b) Daquelas conclusões não resulta qualquer síntese das razões e fundamentos do recurso que impunham uma decisão diversa.
c) São as conclusões que delimitam e balizam o objeto do recurso, não resultando daquelas aprenderás qualquer baliza ou limite.
d) A nossa jurisprudência tem vindo a entender, de forma pacífica, que as conclusões da alegação do recurso devem ser um resumo, explícito e claro, da fundamentação das questões equacionadas pelo recorrente, visando, à luz do princípio da cooperação, facilitar a realização do contraditório e o balizamento do objecto do recurso.
e) O âmbito do recurso será dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da motivação respectiva:
f) O Recorrente limita-se a alegar que o Tribunal a quo não teve em consideração a prova apresentada, e que a sua pretensão é a reintegração no local de trabalho e não a obtenção da compensação.
g) Não fazendo qualquer indicação aos concretos pontos de facto cuja alteração pretende e qual o sentido dessa alteração.
h) Não cumprindo, por completo, o ónus de sobre o mesmo impendia.
i) Verificando-se a falta da indicação sintética das questões colocadas pelo recorrente, que define e delimita o objeto do recurso, o apelante tem de suportar a consequência do incumprimento do ónus de as formular.
j) Isto é, a rejeição do recurso, em obediência ao consagrado na al. b), do nº2, do art. 641º,
k) O Recorrente, no corpo das suas alegações, faz referência a normas que não se transluzem em dispositivos legais de Diplomas em vigor - exemplo disso é o “art. 508º A nº 1 al. b) do CPC, o qual se encontra revogado.
SEM PRESCINDIR
l) Entende, sem razão, o Recorrente que o Tribunal a quo, proferiu um despacho saneador-sentença surpresa, consubstanciando tal, uma nulidade, por preterição da convocação da audiência prévia.
m) Nas ações de impugnação da regularidade e ilicitude do despedimento, a audiência prévia apenas deve ser convocada quando a complexidade da causa o justifique – cfr. art. 98º-M e 62º do Código Processo do Trabalho.
n) O que não era o caso, tendo em conta a simplicidade do objeto em discussão, a verificação de uma excepção peremptória e o agendamento de uma tentativa de conciliação na qual todas as diligências foram encaradas de modo a obter uma posição conciliadora.
o) Nos casos de manifesta simplicidade, como é o caso das situações em que a matéria em questão é suficientemente discutida nos autos, a causa não assume complexidade e a sua apreciação não carece de produção de prova visto depender apenas da aplicação do direito.
p) Nesses casos, o Juiz pode (e deve) conhecer do mérito da causa quando entenda que os Autos contêm os elementos necessários à decisão do mérito.
q) O que se verificou.
r) Recorrente e Recorrido tiveram oportunidade de se pronunciarem aquando da na tentativa de conciliação, que se realizou no pretérito dia 14 de julho, do qual resultou inequívocas, as condições necessárias ao conhecimento do mérito da causa.
s) Verificando-se e reconhecendo-se a exceção de aceitação de despedimento deduzida pela entidade empregadora no articulado motivador de despedimento e que obstava à propositura da ação pelo Recorrente, por aceitação tácita do despedimento.
t) O Recorrente lançou mão de uma ação de Impugnação Judicial da Regularidade e Ilicitude do Despedimento, a 16 de fevereiro do 2022, porquanto a Recorrida, tendo em conta as suas necessidades, estruturais, económicas e de mercado, promoveu pela extinção do posto de trabalho adstrito àquele trabalhador.
u) Tendo, para o efeito, colocado à disposição do Recorrente, a correspondente compensação – 14 de fevereiro de 2022.
v) O Recorrente apenas efetuou a devolução da compensação a 04 de abril de 2022.
w) Ou seja, 50 dias após a propositura da ação que correu os seus termos junto do Juízo de Trabalho de Valongo – Tribunal a quo.
x) E apenas procedeu àquela devolução da compensação, após ter sido notificado da apresentação pela Recorrida do articulado motivador do despedimento, onde aquela [a Recorrida – Entidade Empregadora] alega a não devolução daquele montante e consequente aceitação tácita do despedimento.
y) De acordo com o art. 366º nº4 do Código do Trabalho, presume-se que o trabalhador aceita o despedimento quando aceita a compensação.
z) Presunção essa que pode ser ilidida, se o trabalhador não aceitar a compensação, ou a colocar a totalidade daquela à disposição do empregador em simultâneo com a ação de impugnação da licitude e regularidade do despedimento.
aa) Sendo jurisprudência assente que, para que a presunção se considere ilidida, a devolução da compensação deve ser efetuada num espaço muito curto de tempo.
bb) Contudo, tal conduta não se compadece com a atuação do Recorrente que vem esgrimir, agora, com o devido respeito, questões que bem sabe não ter legitimidade, por factum proprium.
cc) Ignorantia legis neminem excusat,
dd) Sendo certo que o Recorrente adormeceu à sombra de um direito que estava convencido ter, não tendo.
ee) De adormecidos não cuida o Direito - Dormientibus non sucurrit ius
ff) ORA, a decisão que verse sobre a procedência de uma exceção peremptória, pode ser proferida imediatamente no despacho saneador se o estado do processo o permitir, sem necessidade de mais provas.
gg) O Tribunal a quo considerou (e bem) reunir, aquando da diligência de tentativa de conciliação, as condições para conhecimento da exceção peremptória de aceitação de despedimento por parte do Recorrente, tendo em conta o lapso temporal para a devolução daquele montante, jurisprudência pacífica e assente e dispositivo legal.
hh) Tendo, inclusive, anunciado a intenção de conhecer do mérito da causa no despacho saneador, sem realização da audiência prévia.
ii) Sendo essa faculdade atribuída ao Exmo(a). Sr(a). Juíz(a) “ao abrigo dos poderes de gestão processual que estão atribuídos ao juiz no sentido de adotar mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam a justa composição do litígio em prazo razoável, nos termos dos arts. 6º e 547º do CPC” – cfr. Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra, processo nº 1628/18.8T8CBR-A.C1, datado de 03 de março de 2020.
jj) No entanto, incompreensivelmente, alega o Recorrente ter sido proferida decisão surpresa.
kk) Sendo de realçar que foi dada oportunidade às partes para se pronunciarem nos articulados competentes, bem como na tentativa de conciliação.
ll) A Sentença recorrida não enferma ou padece de qualquer vício.
Termos em que deve o Recurso de Apelação ora interposto ser julgado totalmente improcedente e, em função disso, manter-se e confirmar-se a douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo, como é de JUSTIÇA!”. *
O recurso foi admitido como apelação, com efeito meramente devolutivo e foi ordenada a sua subida a este Tribunal.
*
O Ministério Público emitiu parecer, pronunciando-se no sentido de ser negado provimento ao recurso.
Notificadas deste, respondeu a R., acompanhando o entendimento exposto naquele e pugnando pela confirmação da sentença recorrida.
E respondeu o A./recorrente dizendo que, “não acompanha o douto entendimento do Ministério Público, uma vez que se sente lesado, no sentido em que, o Tribunal a quo não teve em ponderação a prova documental e testemunhal apresentada pelo Recorrente, assim como, a não convocatória de uma audiência prévia.
2. Os factos aludidos no ponto anterior poderiam ter preponderância na douta sentença recorrida.
Nestes termos e nos demais de direito, requer a V/ Exa. a admissão do recurso apresentado e, deve a sentença proferida pelo Tribunal a quo não ser confirmada.”.
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Cumpridos, electronicamente, os vistos legais, há que apreciar e decidir.
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Questão Prévia
Veio a R./recorrida suscitar a questão do indeferimento do recurso, porque, segundo alega, “as conclusões formuladas nas alegações apresentadas pelo Recorrente, não satisfazem as exigências previstas no art. 639º do C.P.C.,” e, prossegue, “Porquanto aquela apenas vem alegar nas conclusões formuladas, que o Tribunal a quo não teve em consideração a prova apresentada, e que a pretensão do A. é a reintegração no local de trabalho e não a obtenção da compensação., Deste modo, salvo entendimento diverso, nas conclusões apresentadas o Recorrente não faz qualquer síntese das razões e fundamentos por si alegados no corpo das alegações. Tendo-se limitado a alegar o referenciado no ponto 6º da sua peça processual, não fazendo qualquer indicação aos concretos pontos de facto cuja alteração pretende e qual o sentido e termos dessa alteração. O que dificulta o exercício do contraditório à Recorrida”, pelo que diz ser seu entender que, “perante tal omissão, deve o presente Recurso ser liminarmente recusado, por se mostrar inepto e incumprido o ónus de alegar e concluir.”.
Que dizer?
Desde já, que não concordamos com a recorrida, quando defende que é de recusar liminarmente o recurso, alegadamente, por se mostrar incumprido o ónus de alegar e concluir.
Que fosse desse modo não o entendeu a Mª Juíza “a quo” e não o entendemos nós, nem o que alega a recorrente, ao contrário do que defende, se enquadra no prescrito no art. 641º, do CPC, em concreto na al. b) do seu nº 2.
Pois, como decorre deste e é sabido, a alegada não satisfação pelo recorrente nas conclusões das alegações das exigências previstas no art. 639º, do CPC, não gera o indeferimento do recurso. Tal só ocorre quando as alegações não tenham aquelas.
Efectivamente, como resulta do disposto no nº 1, daquele art. 639º, quando o recorrente interpõe recurso de uma decisão judicial passível de apelação fica automaticamente vinculado à observância de dois ónus, se pretender prosseguir com a impugnação de forma válida e regular:
1º- ónus de alegar: o apelante deve fazer uma análise crítica da sentença recorrida, identificando os erros, de facto e/ou de direito, de que enferma essa decisão, expondo os seus argumentos e razões que poderão conduzir à revogação ou alteração da sentença recorrida, recorrendo, porventura, a invocação de Jurisprudência ou Doutrina em abono da sua posição.
2º- ónus de formular conclusões: o apelante deve finalizar as alegações recursivas com a formulação sintética de conclusões, em que resuma os fundamentos pelos quais pretende que o tribunal Superior anule, modifique ou revogue a decisão recorrida.
E, segundo o nº 2 al. b) do art. 641º, já referido, apenas, a falta absoluta de alegações ou de conclusões gera o indeferimento do recurso.
O que é manifesto não é o que se verifica no caso. Aliás nem esse é o entendimento da recorrida. Segundo a mesma alega, as alegações têm conclusões, o que se verifica é que “As conclusões formuladas nas alegações de recurso antecedentes e apresentadas pelo Recorrente não satisfazem as exigências previstas no art. 639º do C.P.C.”.
Ora, sendo desse modo, ainda na hipótese de tal ocorrer, tal não é motivo de indeferimento do recurso.
Com efeito, quanto à exigência de conclusões, dispõe, em termos claros, o já citado art. 639º que:
«1. O Recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos porque pede a alteração ou anulação da decisão.
(…)
3. Quando as conclusões sejam deficientes, obscuras ou complexas ou nelas não se tenha procedido às especificações a que alude n.º 2 do artigo 639º, o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, no prazo de cinco dias, sob pena de não conhecer do recurso, na parte afetada.».
Ou seja, como se verifica deste e segundo o nº 2 al. b) daquele art. 641º, só a falta absoluta de conclusões gera o indeferimento do recurso.
Tal passou a ocorrer, com a reforma do regime de recursos introduzida pelo DL n.º 303/2007 de 27.08, passando a prever-se que a falta de conclusões, a par com a ausência de alegações, constitui motivo de rejeição de recurso (art. 685º-C, nº 2 al. b) do CPC, na redação anterior).
Pelo que, onde anteriormente se admitia o convite ao recorrente para suprimento daquela falta de conclusões, agora, tal convite só ocorre quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou quando nelas não se tenha procedido às especificações previstas no referido nº 2 do art. 639º (indicação das normas jurídicas violadas; o sentido em que as normas deveriam ter sido interpretadas e aplicadas; ou, invocando o recorrente erro na determinação da norma aplicada, a norma jurídica alternativa que deveria ter sido aplicada ao caso).
Do mesmo modo que se estipulou que só a falta absoluta de conclusões é geradora de indeferimento do requerimento de recurso.
Sobre a omissão, como diz, falta absoluta, de conclusões, refere (Abrantes Geraldes in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2014, 2ª Edição, pág 122), que, “Estabelecendo o paralelismo com a petição inicial, tal esta está ferida de ineptidão quando falta a indicação do pedido, também as alegações destituídas em absoluto de conclusões são “ ineptas “, determinando a rejeição do recurso (art. 641º, n.º 2 al. b), sem que se justifique a prolação de qualquer despacho de convite à sua apresentação.”.
De referir, ainda, que se as conclusões exercem a importante função de delimitação do objecto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do art. 635º, nº 3, do CPC, devendo corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que se pretende obter do Tribunal Superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal “a quo” é sobre o recorrente que incide o específico ónus de especificar nas conclusões da sua alegação quais as questões a decidir, nomeadamente os pontos de facto ou de direito que pretende que sejam reapreciados pelo Tribunal “ad quem”.
Em suma, a cominação legal para o, eventual, incumprimento das exigências previstas no art. 639º, do CPC não é a rejeição do recurso, ou seja, o seu indeferimento, nos termos prescritos no art. 641º, nº 2 al. b), do mesmo código.
O incumprimento do ónus de formulação de conclusões, nos termos prescritos na lei, cai no âmbito do princípio da autorresponsabilização das partes, destinando-se a cominação legal do indeferimento do recurso, apenas, para a falta de conclusões.
Improcede, assim, a questão prévia suscitada pela recorrida.
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É sabido que, salvas as matérias de conhecimento oficioso, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, não sendo lícito a este Tribunal “ad quem” conhecer de matérias nelas não incluídas (cfr. art.s 635º, nº 4, 639º, nº 1 e 608º nº 2, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável “ex vi” do art. 1º, nº 2, al. a), do CPT aprovado pelo DL 295/2009, de 13.10).
Assim, a questão, única, suscitada e a apreciar consiste em saber se, a decisão proferida pelo Tribunal “a quo”, no despacho Saneador/Sentença, é nula por preterição da convocação de uma audiência prévia, como defende o recorrente.
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II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos a considerar para apreciação da questão, são os que decorrem do relatório que antecede e que se encontram devidamente demonstrados nos autos.
E os que a Mª Juíza “a quo” considerou e fixou, na decisão recorrida, para os quais se remete, nos termos do nº 6, do art. 663º, do CPC.
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Pois, diga-se, antes de mais, que o que se verifica, pese embora, o referido na conclusão, é que o recorrente limitou o seu recurso, à questão única supra enunciada, não tendo deduzido qualquer impugnação à decisão de facto, desde logo, por total incumprimento do disposto no art. 640º, do CPC, como o demonstram quer as alegações quer as conclusões do recurso.
Assim, apenas, uma questão se coloca à apreciação deste Tribunal “ad quem”, saber se deve a sentença recorrida ser considerada nula por não ter sido agendada a audiência prévia.
Analisemos.
Não sendo despiciendo repetir que, estamos em presença de acção, cuja tramitação se encontra prevista, nos art.s 98º-B e ss., onde conforme dispõe o art. 98º-M, terminada a fase dos articulados, o processo segue os termos previstos nos art.s 61º e ss., todos do CPT. Acção, através da qual o A./trabalhador impugnou o despedimento que lhe foi comunicado pela empregadora, com efeitos a partir de 15.02.2022, declarado lícito na decisão recorrida, por força da procedência da excepção de aceitação do despedimento por aquele. Defendendo, agora, que deve ser considerada nula por preterição da realização de audiência prévia.
Impugna, assim, através do presente recurso, por considerar que deve ser agendada uma audiência prévia, a decisão que julgou a acção, no despacho saneador e, além do mais, absolveu a ré dos pedidos de declaração de ilicitude do despedimento e reintegração do A., sem realização daquela.
Assistir-lhe-á razão?
Podemos, desde já, adiantar que não.
No entanto, comecemos, por umas breves considerações sobre a figura da audiência prévia, importando referir que, sendo ela um acto que a lei prescreve que, pode influir na decisão da causa, a sua preterição é susceptível de integrar a prática de uma nulidade processual, de acordo com o nº 1, do art. 195º do CPC (diploma a que pertencerão os demais artigos a seguir citados, sem outra indicação de origem) que, dispõe, sob a epígrafe “Regras gerais sobre a nulidade dos atos” que, “Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa” e, atento o disposto no art. 196º, não é de conhecimento oficioso do Tribunal, competindo à parte interessada, prejudicada com tal omissão, arguir a competente reclamação junto do Tribunal onde foi praticada. Sendo que, nos casos, em que a nulidade se encontra coberta por decisão judicial, entende-se que pode, ela, ser impugnada, não por via da reclamação, mas antes em sede de recurso. Ou seja, como se lê no (Acórdão desta Relação de 14.07.2021, Proc. nº1173/20.1T8VNG-A.P1, relatado pela Desembargadora Paula Leal de Carvalho, ao que supomos inédito), “Trata-se, todavia, de nulidade processual que, por estar coberta pela própria sentença, já que foi nesta que a mesma foi cometida, é impugnável por via de recurso a interpor da sentença, acabando por equivaler ou consubstanciar nulidade da sentença”. Assim, sendo, “por não fazer sentido a sua arguição, autonomamente, perante o tribunal recorrido quando o interessado tem de recorrer da sentença, sob pena de esta transitar em julgado”, neste sentido, o (Ac. do TRE de 25.09.2014, Proc. nº 380/12.5T2STC.E1).
Ora, a audiência prévia, no âmbito da reforma operada ao Código de Processo Civil pela Lei 41/2013, de 26 de junho, no seguimento do anterior regime (reforma do processo civil decorrente do DL 329-A/95, de 12 de Dezembro), passou a constituir um dos momentos mais relevantes da acção declarativa, como se verifica da análise dos fins a que se destina, elencados nas alíneas do nº 1, do art. 591º. Através da mesma, como referem, (João Correia, Paulo Pimenta e Sérgio Castanheira, in “Introdução ao Estudo e à Aplicação do Código de Processo Civil de 2013”, Almedina, pág. 73), foi propósito do legislador concretizar aspetos estruturantes do processo civil, onde se contam a visão participada do processo, a cultura do diálogo, a oralidade e a cooperação entre todos, numa verdadeira comunidade de trabalho.
Mas, pese embora isso, o legislador não deixou de prever, também, os casos em que não há lugar à realização da audiência prévia, enunciando-os no art. 592º, sob a epígrafe “Não realização da audiência prévia”, assim, como não deixou de enunciar as hipóteses em que a mesma pode ser dispensada, lendo-se no nº 1 do art. 593º, quando esta se destine apenas aos fins indicados nas alíneas d), e) e f) no nº 1 do artigo 591º.
Assim sendo, compreende-se que, além daquelas situações referidas, não possa a audiência prévia ser dispensada, sem audição das partes, sob pena de nulidade, nomeadamente, quando o juiz tencione conhecer imediatamente, no todo ou em parte, do mérito da causa. Neste sentido, veja-se, entre outros, o (Acórdão desta Relação de 12.09.2019, Proc. nº 2470/09.2TBMAI.A.P1 in www.dgsi.pt), em cujo sumário se lê: “I- Entendendo o juiz, após a fase dos articulados, que os autos contêm os elementos necessários a habilitá-lo a proferir decisão de mérito que ponha termo ao processo, deverá convocar audiência prévia para o fim previsto no artigo 591.º, n.º 1, b) do Código de Processo Civil.
II - A não realização desse acto processual só será consentida no âmbito do exercício do dever de gestão processual, a título de adequação formal, se o juiz entender que a matéria a decidir foi objecto de suficiente debate nos articulados, justificando a dispensa dessa diligência. Sobre o propósito de dispensar a audiência prévia deverá, porém, ouvir as partes, de acordo com o disposto nos artigos 6.º, nº 1 e 3.º, n.º 3, ambos do Código de Processo Civil.
III - A não realização de audiência prévia, impondo a lei a sua realização, constitui nulidade processual, podendo ser arguida em sede de recurso, conduzindo à anulação da decisão que dispensou a sua convocação e do saneador-sentença que se seguiu a essa decisão.”.
No mesmo sentido, no (Ac. do TRC de 03.03.2020, Proc. nº 1628/18.8T8CBR.-A.C1, no mesmo sítio da internet), sintetizou-se o seguinte: “I – A situação em que o juiz tencione conhecer do mérito da causa no despacho saneador não está incluída nos casos em que, nos termos previstos no nº 1 do art. 593º do CPC, a audiência prévia pode ser dispensada; nessa situação, a audiência prévia – que, nos termos da lei, se apresenta como obrigatória por não figurar nos casos em que pode ser dispensada – apenas poderá ser dispensada ao abrigo dos poderes de gestão processual que estão atribuídos ao juiz no sentido de adoptar mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam a justa composição do litígio em prazo razoável, nos termos dos arts. 6º e 547º do CPC, devendo essa dispensa ser precedida de audiência das partes.”.
É deste modo no âmbito do processo civil. Por isso, a doutrina e a jurisprudência tendem maioritariamente a considerar, por um lado que a realização de audiência prévia é obrigatória e, por outro, para a consequente asserção de que não tendo sido determinada antes, o juiz conhecendo do mérito da causa ou de qualquer excepção na fase do saneador, sem conceder às partes o direito de se pronunciarem previamente sobre essas questões, comete uma nulidade que, por afectar a boa decisão da causa, invalida a decisão em causa (saneador/sentença), nos termos conjugados, por um lado, dos art.s 590.º, nºs 1 e 2, 591º, nº 1, al. b) e 593º, nº 1 e, por outro, 195º, nº 1, ver neste sentido, (José Lebre de Freitas in Código de Processo Civil, Anotado, 2017, 3ª Edição, Almedina, Coimbra, volume 2º, pág. 641 e, entre outros, os Acórdãos desta Relação de 27.09.2017, no Proc. nº 136/16.6T8MAI-A.P1, de 05.11.2018, no Proc. nº 1425/17.8T8GDM.P1, de 12.09.2019, no Proc. nº 2470/09.2TBMAI-A.P1 e de 03.12.2020, no Proc. nº 11255/19.7T8PRT.P1, todos publicados in www.dgsi.pt).
Mas, sendo assim, no âmbito do processo civil, já, no processo laboral, atentas as características que o enformam e a sua especial natureza face ao processo civil, no que a esta questão respeita, a realidade é outra.
Refira-se que, pese embora, nos encontrarmos no âmbito laboral, o recorrente, apenas, invoca a legislação processual civil e com indicação, certamente por lapso, de normas de diplomas que já se encontram revogados.
Com efeito, no âmbito laboral, a este respeito, dispõe o art. 62º nº 1 do CPT, que, “Concluídas as diligências resultantes do preceituado no n.º 1 do artigo anterior, se a elas houver lugar, é convocada uma audiência prévia quando a complexidade da causa o justifique”.
Ou seja, neste âmbito, segundo este normativo, a audiência prévia é convocada “quando a complexidade da causa o justifique”, significando que, o juiz laboral, ao contrário do congénere civil, a possa dispensar e logo conhecer do mérito da causa quando a causa não assuma complexidade (ou seja simples), juízo esse a fazer pelo julgador de acordo com as características do processo em questão. Decisivo é que, disponha de todos os elementos necessários e a simplicidade da causa o permita.
Pois, segundo o disposto no art. 61º do mesmo CPT, “1- Findos os articulados, o juiz profere, sendo caso disso, despacho pré-saneador nos termos e para os efeitos dos n.ºs 2 a 7 do artigo 590.º do Código de Processo Civil, sem prejuízo do disposto no artigo 27.º do presente Código.
2- Se o processo já contiver os elementos necessários e a simplicidade da causa o permitir, pode o juiz, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 3.º do Código de Processo Civil, julgar logo procedente alguma exceção dilatória ou nulidade que lhe cumpra conhecer, ou decidir do mérito da causa”.
Ou seja, permitindo-o a simplicidade da causa e dispondo de todos os elementos necessários, no foro laboral, ao contrário do civil, o juiz pode dispensar a convocação de audiência prévia e conhecer logo do mérito da causa. Esta é a regra, só tendo aquela lugar “quando a complexidade da causa o justifique”, neste sentido (Ac. desta Relação de 04.05.2022, Proc. nº 1116/21.5T8AVR.P1, relator Desembargador Jerónimo Freitas, com intervenção da aqui relatora como Adjunta, in www.dgsi.pt) em cujo sumário se lê: “IV - A recorrente não tem fundamento para dizer ter “sido apanhada de surpresa” com a decisão recorrida. A excepção de incompetência material do Tribunal a quo foi por si arguida na contestação e, como a própria reconhece, por decorrência da lei, no âmbito da tramitação própria da acção cabia ao Tribunal a quo apreciar e decidi-la na fase de saneamento do processo.
V - Nem tão pouco poderia contar com a realização de audiência prévia para discussão dessa excepção, pois o CPT dispõe de norma própria, nomeadamente, o art.º 62.º 1, de onde resulta que só há lugar à convocação de audiência prévia “quando a complexidade da causa o justifique”, ou seja, não podia deixar de ter em conta que no processo laboral, a que só subsidiariamente se aplicam as normas do processo civil sobre o processo comum de declaração [art.º 49.º 1 e 2, do CPT], a regra é a dispensa da audiência preliminar, que só terá lugar quando a “quando a complexidade da causa o justifique”.
E pode ocorrer a dispensa daquela, sem que para tal tenha de existir um despacho prévio, atenta a redacção do referido art. 62º do CPT, que fala apenas em convocação da mesma quando a complexidade da causa o justifique, conforme se lê, no (Acórdão do TRE, de 26.01.2010, Proc. nº 834/08.8TTSTB.E1, in www.dgsi.pt). Assim, em sede de processo do trabalho, pautando-se a realização da audiência prévia por aquele critério da complexidade da causa, sendo, pois, excepcional e não a regra como sucede no processo civil (cfr. os referidos art.s 591º a 593º), como refere, (Joana Vasconcelos “Direito Processual do Trabalho”, Universidade Católica, 2017, pág. 86), “ao juiz cabe justificar a sua convocação, não a sua não realização”.
Em processo laboral, de acordo com o acabado de referir, findos os articulados, em caso de dispensa de realização da audiência prévia, sendo caso disso, o juiz profere despacho pré-saneador nos termos ali prescritos. E caso o processo contenha os elementos necessários e a simplicidade da causa o permita, sem que tenha de justificar a não realização daquela, pode decidir do mérito da causa, sem prejuízo do disposto nos nº s 3 e 4 do CPC.
Pois, neste aspecto o regime processual laboral aproxima-se do civil, estabelecendo a necessidade de facultar às partes que se pronunciem sobre a questão decidenda tal como o juiz configura vir a decidi-la, como decorre da ressalva do nº 2 do referido art. 61º: “… pode o juiz, sem prejuízo do disposto nos nºs 3 e 4 do artigo 3.º do Código de Processo Civil…” onde se dispõe:
“3- O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.
4- Às exceções deduzidas no último articulado admissível pode a parte contrária responder na audiência prévia ou, não havendo lugar a ela, no início da audiência final”.
Regressando ao caso, alega o recorrente que, “Foi proferida sentença sem que as partes fossem notificadas para a finalidade prevista no art. 508º A. nº 1 al. b) do C.P.Civil, pelo que, foram confrontadas com um despacho saneador-sentença, relativamente ao qual nem tiveram oportunidade processual de se pronunciarem sobre a selecção da matéria de facto que serviu de fundamento à sentença ora impugnada.
2. A formulação legal determina que, não constituindo a decisão convocatória das partes para a audiência preliminar, caso julgado que vincule o juiz a tal apreciação, o juiz só estará habilitado processualmente a conhecer do mérito da causa, se convocar as partes, obrigatoriamente, para a audiência preliminar em despacho que expressamente contenha o objectivo e/ou finalidade previsto no art. 508º nº 1 al. b) do C.P.C., sob pena de o não fazendo, violar o disposto no art. 3º nº 3 do mesmo código.
3. Não tendo as partes sido convocadas com essa específica finalidade, existe uma nulidade processual, tendo a decisão recorrida violado o disposto no art. 3º nº 3 do C.P.C. e de modo geral, o princípio do contraditório, constituindo uma decisão surpresa que é atentatória do princípio do processo justo e equitativo, garantido no n.º 4 do citado art.º 20.º, da Constituição da República Portuguesa.”.
Mas, como já dissemos supra, não tem qualquer razão.
Pois, transpondo para o caso, o que deixámos exposto, sobre a realização da audiência prévia no âmbito laboral, é manifesto que o entendimento do recorrente não tem qualquer fundamento, nomeadamente, quando considera que o Tribunal “a quo” proferiu um despacho saneador-sentença surpresa, consubstanciando tal, uma nulidade, por preterição da convocação da audiência prévia.
Ora, sempre com o devido respeito, em nosso entender, por a causa não se revestir de complexidade, a realização daquela podia ser dispensada, como bem o considerou e fez a Mª Juíza “a quo”.
Pois, o Tribunal pode e deve conhecer do mérito da causa quando entenda que os autos contêm os elementos necessários à decisão do mérito, o que se verificou.
A demonstrá-lo, basta analisar os autos, desde logo do teor da acta de 14.07.2022 e o teor da decisão recorrida, acima transcrita, onde a Mª Juíza “a quo” entendeu e fez anteceder a prolação da sentença do seguinte: “A - Resulta do artigo 98º-M, nº 1, do Código de Processo do Trabalho, que no âmbito do processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, “terminada a fase dos articulados, o processo segue os termos previstos nos artigos 61º e seguintes…».
Por seu turno, decorre do artigo 62º, nºs 1 e 2 do mesmo diploma que a audiência prévia apenas é convocada quando a complexidade da causa o justifique.
No presente caso, entende-se que é de dispensar a convocação da audiência prévia, sendo certo que foi já realizada uma tentativa de conciliação, conforme ata refª citius 438671308 em que o tribunal teve já oportunidade de auscultar os ilustres mandatários das partes sobre as questões que se colocam no âmbito dos presentes autos e nessa diligência foi possível que as partes acordassem em dar como assente por acordo das partes a factualidade que se mostra vertida na ata referente a tal diligência. Do mesmo passo, as partes tiveram já oportunidade de se pronunciar em sede de articulados sobre as questões em causa.
(…).
D - Conforme já anunciado às partes na diligência de tentativa de conciliação, considera o tribunal que o processo reúne já condições para conhecimento da exceção de aceitação de despedimento por parte do autor e, bem assim, para prolação de decisão final com apreciação do peticionado, tendo em conta a factualidade assente por acordo das partes e as questões a decidir.
As partes nada opuseram.
O autor no âmbito dessa diligência manifestou optar pela reintegração (cfr. refª citius 438671308).
Considerando as posições das partes e a factualidade assente por acordo das partes, porque se entende que os autos contêm já todos os elementos necessários à decisão do mérito – artigo 595º, nº 1, al. b) do Código de Processo Civil, ex vi artigos 98º-M, nº 1 e 49º, nº 2, do Código de Processo do Trabalho, e artigo 61º deste último diploma – profere-se a seguinte SENTENÇA…”.
Legitimamente a Mª Juíza dispensou a realização da audiência prévia, justificando a razão do seu entendimento, o que nem necessitaria fazer, conforme supra se deixou exposto. E, também, à saciedade, demonstram os autos que não houve qualquer violação do contraditório nem de nenhum princípio constitucionalmente protegido, basta analisar os articulados e o teor da acta da tentativa de conciliação realizada em 14.07.2022. O que se verifica é que, o autor teve oportunidade de se pronunciar acerca da questão (fundamento da decisão), acordando em dar por assente a matéria de facto que nela consta e, nessa medida influenciar a decisão no sentido mais conveniente aos seus interesses, pelo que não se pode dizer, ou concordar, que tenha sido uma decisão surpresa mas, sim, respeitado o princípio do contraditório (ao contrário do que veio alegar). Mais, foi-lhe anunciado qual seria o sentido da decisão quanto à excepção invocada pela ré.
Em suma, o Tribunal “a quo” não estava vinculado à realização de audiência prévia, não existindo qualquer ilegalidade na sua dispensa (donde por esta via, nem por qualquer outra, nunca se poderia ter por cometida a apontada nulidade processual) e, logo, impunha-se-lhe que apreciasse e decidisse a arguida excepção, de aceitação de despedimento pelo Autor, como fez. Aliás, note-se, também, que nem o mesmo, agora, recorrente ataca aquela decisão do Tribunal “a quo”, dispensando aquele acto, questionando-a com a indicação de eventuais razões concretas que levassem a concluir pela complexidade da causa e, logo, pela justificação da necessidade de realização da audiência prévia.
Por conseguinte, não assiste fundamento quanto ao invocado pelo recorrente.
Além de que, também, como já referimos, não pode concordar-se que a solução jurídica encontrada no saneador-sentença foi uma decisão surpresa para aquele, no sentido de que não era para ele espectável que fosse proferida, já que como bem o disse a Mª Juíza “a quo” e se verifica dos autos, a mesma foi-lhe anunciada aquando da tentativa de conciliação e o mesmo teve oportunidade de quanto a ela se posicionar no respectivo articulado em que respondeu aos factos alegados pela apelada que foram os que serviram de base à decisão.
Como se lê no (Ac. do STJ de 24.02.2015, Proc. nº 116/14.6YLSB, in www.dgsi.pt), “A decisão surpresa faz supor que a parte possa ser apanhada em falta por uma decisão que embora pudesse ser juridicamente possível, não esteja prevista nem tivesse sido por si configurada”. No caso, tudo indica o contrário, ao A. foram dadas todas as possibilidades de se pronunciar e contar com o sentido da decisão que foi proferida. A excepção, arguida pela ré, em relação à qual o mesmo teve oportunidade de se pronunciar, por decorrência da lei, no âmbito da tramitação própria da acção, cabia à Mª Juíza “a quo” apreciá-la e decidi-la na fase de saneamento do processo. De modo, que o recorrente não podia deixar de contar com a apreciação e decisão da mesma, no momento em que foi proferida e que antecipadamente lhe havia sido anunciado que iria acontecer, além do sentido da mesma. Daqui resultando, ter tido o A. a oportunidade de influenciar o sentido da decisão em seu favor.
Donde só podemos, sem necessidade de outras considerações, concluir que, a decisão do Tribunal “a quo”, sem dúvida, mostra-se conforme aos princípios que o recorrente alega, sem razão, terem sido violados e dessa forma, não merece qualquer censura. A matéria da excepção, em causa, foi suficientemente discutida nos autos, não assume complexidade, não carecendo a sua apreciação da produção de prova visto depender apenas da aplicação do direito.
Assim, improcede a arguida nulidade da sentença e, consequentemente, improcede a apelação.
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III – DECISÃO
Face ao exposto, acorda-se nesta secção em julgar a apelação improcedente e mantém-se a decisão recorrida.
*
Custas a cargo do Autor, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie.
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Porto, 23 de Janeiro de 2023
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O presente acórdão é assinado electronicamente pelos respectivos,
Rita Romeira
Teresa Sá Lopes
António Luís Carvalhão