Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3790/17.8T8VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CARLOS PORTELA
Descritores: SOCIEDADE POR QUOTAS
ASSEMBLEIAS GERAIS
FUNÇÕES DO GERENTE
RELATÓRIO DE GESTÃO
DIREITO À INFORMAÇÃO
DIREITO DE VOTO
DELIBERAÇÃO SOCIAL
ALIENAÇÃO
BENS IMÓVEIS
Nº do Documento: RP202001233790/17.8T8VNG.P1
Data do Acordão: 01/23/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Segundo o disposto no art.º 248º, nº 1 do CSC é aplicável às assembleias-gerais das sociedades por quotas o disposto sobre as assembleias-gerais das sociedades anónimas, em tudo o que não estiver especificamente regulado para aquelas.
II - Face ao prescrito no art.º 376º, nº 1, alínea d), do CSC, a assembleia-geral dos accionistas deve reunir para proceder às eleições que sejam da sua competência.
III - Nas sociedades por quotas e sem prejuízo do contrato de sociedade ou o acto de designação poder fixar a sua duração (cf. art.º256º do CSC), as funções dos gerentes subsistem enquanto não terminarem por destituição ou renúncia.
IV - Da análise conjugada dos artigos 65º, nºs 1 e 3 do CSC o que a lei exige é que o relatório de gestão, as contas do exercício e os demais documentos de prestação de contas estejam assinados quando forem submetidos ao órgão competente para deliberar sobre esses documentos, que, no caso, é a assembleia-geral de sócios.
V - Segundo o disposto no art.º 21º, nº1, alínea b), do CSC todo o sócio tem direito a obter informações sobre a vida da sociedade, nos termos da lei e do contrato.
VI - O direito à informação desdobra-se em quatro vertentes distintas e complementares, integrando: um direito a obter informações; um direito de consulta dos livros e documentos da sociedade; um direito de inspecção de bens sociais; e, embora noutro plano, um direito de requerer inquérito judicial.
VII - Nas sociedades por quotas o direito à informação está previsto no nºs 1 e 3 do artigo 214º do CSC, para as informações não prestadas em assembleia geral, e no artigo 290º (ex vi do nº 7 do artigo 214º) para as informações solicitadas em assembleia geral.
VIII - Quando não está em causa uma deliberação social subsumível na previsão legal do art.º251º, nº1 do CSC, os sócios da sociedade que sejam simultaneamente seus gerentes, não estão impedidos de exercer o seu direito de voto na assembleia-geral realizada nos termos e para os efeitos sobreditos.
IX - No art.º246º do CSC estão identificadas as matérias que estão dependentes de deliberação dos sócios.
X - Por força do disposto na alínea c) do nº2 do supra citado artigo, a deliberação social só é exigida nos casos de alienação ou oneração de bens imóveis e alienação, oneração e locação de estabelecimento, cabendo os restantes nos poderes da gerência.
XI - O direito de participação nas deliberações da sociedade, previsto na alínea b) nº 1 do artigo 21º do CSC, está condicionado às restrições previstas no artigo 251º do mesmo diploma.
XII - Para excluir a possibilidade de votação do sócio, mostra-se necessário que este tenha na deliberação em causa um interesse que analisado objectivamente, seja um interesse directo, imediato e oposto ao da sociedade.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação nº 3790/17.8T8VNG.P1
Tribunal recorrido: Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo de Comércio de Vila Nova de Gaia
Relator: Carlos Portela (987)
Adjuntos: Joaquim Correia Gomes
António Paulo Vasconcelos
Acordam na 3ª Secção do Tribunal da Relação do Porto
I. Relatório:
B…, S.A., com sede na Avenida …, n.º …, …, no Porto, instaurou a presente acção de anulação de deliberações sociais, com processo comum, contra C…, Limitada, com sede no mesmo local, pedindo que sejam declaradas nulas ou anuladas as deliberações tomadas na assembleia geral da ré realizada no dia 31 de Março de 2017 quanto aos pontos um, dois, três, quatro, cinco, seis e sete da ordem de trabalhos.
Alegou, para o efeito, que é sócia da ré e que não esteve representada na assembleia geral de 31 de Março de 2017, sucedendo que a convocatória para tal assembleia geral não está completa, por faltar o ponto relativo às eleições, que os documentos de prestação de contas não estavam assinados por todos os gerentes e que não lhe foi apresentado o relatório de gestão do exercício de 2016.
Por outro lado, os sócios que votaram favoravelmente estavam impedidos de o fazer, por serem gerentes, existindo um conflito de interesses (as contas apresentam um prejuízo para a ré e para os restantes sócios e aqueles têm interesse na sua aprovação), sendo certo que os documentos de prestação de contas violam os princípios do direito contabilístico, nada constando acerca do valor da dívida ao advogado a cujos serviços aqueles sócios e gerentes têm recorrido e não incluindo todas as despesas que a autora, na sua qualidade de gerente, já suportou com as acções de impugnação das deliberações sociais.
Mais referiu que o ponto três da ordem de trabalhos foi aprovado, mas os gerentes merecem ser criticados pela gestão, ofendendo a deliberação correspondente os bons costumes, a boa-fé e os limites do razoável.
Diz também que a deliberação tomada relativa ao ponto quarto não reuniu o quórum exigido pela lei, ao passo que a deliberação tomada quanto ao ponto cinco é nula – devido à simulação de obras e de outras desnecessárias com valores simulados, os gerentes apoderaram-se de cerca de dinheiro da sociedade comercial, para além de não promoverem o arrendamento, nem a exploração do estabelecimento comercial, pretendendo, antes, pedir dinheiro aos sócios e vender o equipamento, o que contribuirá para a desvalorização do arrendamento ou da cessão de exploração.
Alegou ainda que a venda do equipamento de luz e som – ponto seis da ordem de trabalhos – equivale a esvaziar a actividade da sociedade comercial, desvalorizando o valor do arrendamento e da exploração do estabelecimento comercial ou impedindo-a.
No que diz respeito ao ponto sétimo da ordem de trabalhos, afirmou que não foi levado em conta o interesse da sociedade comercial, nem dos sócios, é contrária aos interesses da autora (que pode até estar interessada em tomar a cessão da exploração do estabelecimento) e só deixará de o ser se a ré lhe ceder a exploração pelo preço e nas condições semelhantes às que vigoram para um outro estabelecimento comercial.
Mais alegou que se verificam situações que não foram rectificadas pela ré, pelos seus gerentes, como a falta de registo da renúncia da gerente J…, representante da autora, e da sua posterior designação, bem como a inexistência de reuniões dos gerentes e das actas correspondentes.
Por outro lado, os sócios e gerentes reembolsaram-se a si próprios dos empréstimos erradamente contabilizados como suprimentos, mas a autora não foi reembolsada, sendo certo que esta impugnou judicialmente todas as deliberações de aprovação de contas tomadas desde 2008, pelo que, enquanto não forem decididos os processos pendentes, as contas do ano de 2016 não podem ser aprovadas.
Disse ainda que os gerentes da ré não observam deveres de cuidado e de lealdade, não revelam disponibilidade, competência e conhecimento da actividade da ré, sendo incapazes de assegurar a sua sustentabilidade e a sua continuidade, apresentando sistematicamente prejuízos, actuando em conluio no seu interesse e em prejuízo da autora e dos credores, o que constitui justa causa de destituição.
Aleou também que os gerentes continuam a esbanjar o dinheiro da ré em almoços, jantares, despesas de deslocação, coimas, simulação de obras e outras despesas, o que é contabilizado com violação das leis fiscais.
A ré contestou por excepção, invocando o erro na forma de processo quanto ao pedido de suspensão das deliberações sociais, e por impugnação, pugnando pela validade das deliberações tomadas na assembleia geral de 31 de Março de 2017.
Alegou que o ponto relativo às eleições não tinha que constar da convocatória, os documentos de prestação de contas submetidos à apreciação estavam devidamente assinados, todos os documentos solicitados pela autora, nomeadamente o relatório de gestão, foram-lhe entregues, não se verifica qualquer situação de impedimento de voto, as contas relativas ao exercício de 2016 espelham a realidade económico-financeira da ré, não se verifica a invocada falta de quórum, uma vez que não está em causa a alteração do pacto social, sendo certo que, quanto aos pontos quinto, sexto e sétimo, apenas ressalta da alegação da autora que a mesma não concorda com o deliberado, inexistindo factos que permitam concluir pelo seu carácter abusivo ou pela existência de qualquer prejuízo.
A ré concluiu pedindo a condenação da autora em multa e indemnização a seu favor como litigante de má-fé.
A autora respondeu à excepção invocada pela ré, pugnando pela sua improcedência.
Os autos prosseguiram os seus termos proferindo-se despacho no qual se dispensou a realização de audiência prévia.
No mesmo despacho decidiu-se julgar procedente a defesa por excepção da ré que teve por base o erro na forma do processo e, em consequência, absolveu-se a ré da instância relativamente ao pedido de suspensão das deliberações sociais tomadas na assembleia-geral da ré realizada a 31 de Março de 2017.
Saneou-se ainda o processo e proferiu-se decisão se julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência se declarou a anulabilidade da deliberação relativa ao ponto quarto da ordem de trabalhos da assembleia geral da ré realizada a 31 de Março de 2017.
Mais se decidiu absolver a ré do demais peticionado.
A autora B… veio interpor recurso desta decisão, apresentando nos termos legalmente prescritos as suas alegações.
A ré C…, Lda.contra alegou.
Foi proferido despacho no qual se considerou o recurso tempestivo e legal e se admitiu o mesmo como sendo de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito devolutivo.
Recebido o processo nesta Relação emitiu-se despacho que teve o recurso como próprio, tempestivamente interposto e admitido com efeito e modo de subida adequados.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Enquadramento de facto e de direito:
Ao presente recurso são aplicáveis as regras processuais da Lei nº41/2013 de 26 de Junho.
É consabido que o objecto do presente recurso, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso obrigatório, está definido pelo conteúdo das conclusões vertidas pela autora/apelante nas suas alegações (cf. artigos 608º, nº2, 635º, nº4 e 639º, nº1 do CPC).
E é o seguinte o teor dessas mesmas conclusões:
1ª - O tribunal recorrido proferiu sentença, com a qual a Recorrente não se conforma, pela qual julgou parcialmente procedente a ação de anulação de deliberações sociais que a Autora instaurou contra a Ré e em consequência:
a) Declarou a anulabilidade da deliberação social relativa ao ponto quarto da ordem de trabalhos da assembleia-geral da ré realizada a 31 de Março de 2017;
b) Absolveu a ré do demais peticionado.
Custas pela autora e pela ré, na proporção de 85% para a primeira e de 15% para a segunda.
2ª - A sentença não faz qualquer referência à matéria de facto alegada pela Autora no requerimento que apresentou em 04/02/2019 com a referência 31440970 que veio dar cumprimento ao despacho proferido em 18/01/2019 com a referência 400273569, uma vez que a acção foi instaurada em 02/05/2017 (ou seja no limite do prazo legal de 30 dias a que se refere o nº 2 do artigo 59º do CSC) sem que a Autora tivesse conhecimento prévio da acta da assembleia-geral; pelos factos provados nas alíneas x) e y), verifica-se que a Ré apenas respondeu à solicitação da Autora (que por carta registada datada de 05/04/2019 pediu uma cópia da ata da assembleia em causa) através de carta datada de 08/05/2017 com a remessa da cópia da acta da assembleia-geral de 31/03/2019.
3ª - A Autora tem a maior participação social na Ré (40,29%), é gerente de direito da Ré, mas não exerce de facto a gerência da sociedade por ter sido afastada de todas as decisões da empresa por todos os demais sócios da empresa desde o dia 01/01/2008.
4ª - A convocatória da assembleia-geral de 31/03/2017 não incluiu o ponto relativo às eleições, o qual é obrigatório por força do disposto no artigo 376º do CSC, norma de natureza imperativa, que não pode ser derrogada pela norma do artigo 256º, sendo esta uma norma de carácter geral que regula meramente sobre a duração da gerência; por essa razão, o tribunal recorrido deveria ter entendido que na convocatória da assembleia-geral anual de 31/03/2017 falta o ponto relativo às eleições dos gerentes; a convocatória assim elaborada viola a norma imperativa da alínea d) do nº 1 do artigo 376º do CSC, exprimindo um vício procedimental e de violação da lei gerador de anulabilidade ao abrigo do disposto no artigo 58º nº 1 do CSC, por afectar o dever de a sociedade proceder a eleições previsto na pretérita referida norma.
5ª – No momento em que a Autora se deslocou ao contabilista certificado da Ré para consultar os documentos das contas do ano de 2016 no período anterior à realização da assembleia e exercer o seu direito á informação, verificou que nenhum dos documentos de prestação de contas que lhe foram apresentados estavam assinados por todos os gerentes, e deles não constava qualquer declaração das razões pelas quais os documentos em falta não estavam assinados por todos os gerentes; a falta de assinaturas dos gerentes, assim como a ausência das razões que justificam aquela falta, são causa de anulabilidade conforme o disposto nos artigos 65º nº 3 e 69º nº 1 do CSC.
6ª - Como decidiu a Relação de Lisboa no acórdão que proferiu por unanimidade em 17/04/2007 no processo 2034/2006-7 disponível e consultável em www.dgsi.pt “A falta de assinaturas nas contas de exercício é sancionada com a anulabilidade da deliberação social (artigos 65.ºnº 3 e 69.º nº 1 do CSC) não se devendo considerar sanado o vício pelo facto de todos os elementos da administração terem participado na assembleia em que foi tomada a deliberação nem pelo facto de ser pouco grave a omissão”.
7ª - No período anterior à realização da assembleia-geral a Ré também não forneceu à sócia B…, Lda. as informações do relatório de gestão do exercício de 2016 para a assembleia-geral de sócios da sociedade, tendo a Ré posteriormente invocado no âmbito dos presentes autos no seu requerimento de 25/01/2019 com a referência 31334460 que tal documento deixou de ser obrigatório com a entrada em vigor do DL nº 98/2015 de 2 de Junho.
8ª - O disposto no DL 98/2015 de 2 de Junho regula os procedimentos contabilísticos adoptados pelo sistema de normalização contabilística, mas o âmbito dos presentes autos não está delimitado pelo que o sistema de normalização contabilística impõe ou deixa de impor; deveria o tribunal recorrido ter tomado posição sobre a falta de apresentação de tal documento nos autos, antes valorou o facto de a Autora não ter rebatido a posição da Ré quanto ao que a esse propósito alegou no requerimento de 25/01/2019, com a agravante de ter reconhecido na sentença que a Ré manifestou contradição entre o que alegou na contestação e o argumento que posteriormente utilizou no requerimento de 25/01/2019.
9ª - A falta de apresentação do relatório de gestão no período anterior à realização da assembleia-geral da Ré violou o direito do sócio à informação sendo, por isso, susceptíveis de anulabilidade as respectivas deliberações para os efeitos do disposto no artigo 58º nº 1 alínea c) do CSC por violação do direito do sócio à informação; atenta a falta de fornecimento ao sócio B…, Lda. dos elementos de informação mínimos relativos aos pontos um e dois da ordem de trabalhos, a deliberação tomada que aprovou o relatório de gestão e as contas do ano de 2016 é anulável nos termos do artigo 58º nº 1 c) do CSC.
10ª - A convocatória da assembleia-geral de 31/03/2017 é enganosa porquanto refere estarem disponíveis para consulta todos os documentos de prestação de contas do ano de 2016, o que não se verificou relativamente ao relatório de gestão de 2016 e às informações quanto às condições mínimas de cedência temporária da exploração da discoteca referidas no ponto sétimo da ordem de trabalhos; estas situações viola o disposto nos artigos 65º nº 1 e 3, 69º nº 3, 214º, 289º nº 1 alínea e), e os artigos 263º nº 1, do CSC, e tornam susceptíveis de anulabilidade as deliberações dos pontos 1, 2 e 7 da assembleia-geral de 31/03/2017 ao abrigo do disposto no 58º nº 1, alínea c), e nº 4 alínea b), do CSC, pelos vícios da falta de assinaturas em documentos de prestação de contas e de violação do direito dos sócios à informação.
11ª - A sentença recorrida afirma que não se verifica qualquer impedimento de voto dos sócios presentes na assembleia-geral de 31/03/2017 no que diz respeito aos pontos 1, 2 e 3 da ordem de trabalhos da assembleia-geral.
12ª – Os sócios que são gerentes estão impedidos de votar nas deliberações quando que se encontram em conflito de interesses com a sociedade relativamente à matéria da deliberação, tal como decidiu o Acórdão do STJ de 12/06/1996 disponível e consultável em www.dgsi.pt.
Quanto ao ponto 3, quando esteja em causa a destituição por justa causa, os sócios destituendos não podem votar por força do disposto na alínea f) do nº 1 do artigo 251º do CSC.
13ª - A Ré apresenta resultados económicos negativos consecutivamente desde o exercício de 2010, levando a empresa a uma situação de insolvência técnica demonstrada na conta de resultados transitados no balanço e no balancete de 31/15/2016 e sem liquidez de tesouraria (veja-se a deliberação social tomada no ponto quinto da assembleia quanto à necessidade de os sócios igualarem proporcionalmente os suprimentos da Autora), e fez aprovar um voto de confiança e de louvor aos sócios-gerentes de facto; esta situação, analisada objectivamente, ofende flagrantemente os princípios da boa-fé e os bons costumes, sendo um abuso de direito por exceder manifestamente os limites daqueles princípios.
14ª - A situação da Ré é sui generis, na medida em que todos os sócios são gerentes, por consagração do nº 1 do artigo 4º do contrato de sociedade, com excepção da Autora, que não exerce de facto a gerência da Ré por dela ter sido afastada pelos demais sócios-gerentes e posteriormente se ter demitido em consequência de não ser convocada para as decisões da empresa e não concordar com a gestão dos gerentes de facto.
15ª - Os sócios que também são gerentes de facto têm todo o interesse em fazer aprovar as suas contas quando estas apresentam resultados negativos, como é o caso do exercício de 2016, e como têm sido os exercícios da Ré desde pelo menos 2010, aplicando-os na conta de resultados transitados.
16ª - A Ré tem sido mal gerida na medida em que os gerentes têm utilizado os capitais que os sócios colocaram à sua disposição para realizar o principal e fundamental fim da sociedade, que é o da obtenção de lucro para distribuir aos sócios, e a empresa não apresenta resultados positivos; essa má gestão é intencional com o sentido de prejudicar a Autora, que é a sócia com maior participação social na sociedade, e a própria Ré.
17ª - No corpo do artigo 251º do CSC cabe o caso dos presentes autos em que é nítida a verificação de um conflito de interesse dos sócios que exercem a gerência de facto com o interesse da sociedade, que é o de conseguir obter um lucro, e com o interesse da sócia B… Lda., que lhe vem sendo negado anual e sucessivamente pela gestão dos sócios que também são gerentes; os interesses dos sócios que exercem a gestão de facto da Ré são interesses próprios, pessoais, morais, já que particularizaram e individualizaram o confronto, de modo conjunto e conluiado, contra a sócia Autora e contra a própria empresa.
18ª - A Relação do Porto no acórdão que proferiu em 02/10/2006 no processo 0653793 disponível e consultável em www.dgsi.pt no seu sumário decidiu que, só é anulável a deliberação social se um dos sócios vota deliberação que exprima conflito de interesses entre a sua posição pessoal e a matéria objecto da deliberação, conflito esse que deve ser apreciado objectivamente.
19ª - Pelos fundamentos invocados, entendemos que no caso dos autos, apesar de se tratar de matéria de aprovação de contas (pontos 1 e 2 da ordem de trabalhos) os sócios da Ré que votaram favoravelmente as contas e a aplicação de resultados do exercício económico de 2016, assim como o voto de louvor e de confiança aos sócios que são gerentes deliberado no ponto 3 da ordem de trabalhos, consubstanciam conflito de interesses entre os mesmos e a sociedade e o sócio B…, Lda., o que o tribunal recorrido não vislumbrou; as referidas deliberações são susceptíveis de nulidade ou de anulabilidade ao abrigo do disposto nos artigos 56º nº 1 alínea d) e/ou 58º nº 1 alíneas a) e b) do CSC por violação do disposto no artigo 251º nº 1 alíneas a) e b) do CSC.
20ª - Não existem motivos sérios que justifiquem a deliberação de votos de confiança e de louvor aos sócios que são gerentes pela forma como têm orientado os negócios da sociedade; nestas condições, ao que acresce um resultado económico negativo de €11.878,73, a deliberação tomada no ponto 3 da ordem de trabalhos que atribuiu um voto de confiança e de louvor aos sócios que são gerentes de facto no exercício económico de 2016 ofende claramente os princípios da boa-fé e os bons costumes, e constitui um abuso de direito; a deliberação tomada pela Ré no ponto 3 da ordem de trabalhos que aprovou um voto de louvor e de confiança aos sócios gerentes deve ser declaradas nulas nos termos do disposto no artigo 56º nº 1 alínea d) do CSC ou anuladas ao abrigo do disposto no artigo 58º nº 1 alíneas a) e b) do CSC.
21ª - No âmbito do ponto sexto da ordem de trabalhos a assembleia procedeu à apreciação e votou favoravelmente a venda do equipamento de luz e som da Ré com os votos dos sócios que representavam 59,71 % do capital social; tendo em conta o facto descrito na alínea d) (de que “A ré rege-se pelos “estatutos” cuja cópia se encontra junta a fls. 43 e 43 verso, cujo teor se dá aqui por reproduzido.”) e o disposto na cláusula 4ª nº 3 do contrato de sociedade (“Todavia, todos os actos e contratos que impliquem a oneração ou alineação do património pertencente à sociedade terão de ser aprovados por uma maioria de sócios representativa de setenta e cinco por cento do capital social.”) e na alínea s) dos factos provados, apenas com uma votação igual ou superior a 75% é que a deliberação social quanto ao ponto 6 da ordem de trabalhos poderia ser validada.
22ª - O tribunal recorrido não julgou adequadamente o deliberado no ponto 6 da ordem de trabalho, na medida em que a deliberação social não teve o quórum necessário para ser validada e ofende o disposto no contrato de sociedade, e como tal é perfeitamente anulável ao abrigo do disposto no artigo 58º nº 1 alíneas a) e b) do CSC, sofrendo a deliberação do vício de violação da lei por flagrante ofensa do estabelecido no nº 3 do artigo 4º do contrato de sociedade da Ré; o tribunal recorrido cometeu erro de julgamento, devendo a sentença ser revogada ad quem e anular-se a deliberação social do ponto 6 da assembleia-geral de 31/03/2016.
23ª – A deliberação social tomada no ponto 7 da ordem de trabalhos não foi precedida do fornecimento aos sócios de elementos mínimos de informações, pois, dos elementos que a Ré disponibilizou aos sócios no período anterior à realização da assembleia, nomeadamente, à Autora, não constavam quaisquer propostas sobre as condições mínimas de cedência temporária da exploração da discoteca para fazer face às despesas de manutenção do imóvel; a deliberação afronta o direito de informação dos sócios e exprime um vício procedimental gerador de anulabilidade, nos termos do disposto no artigo 58º nº 1 alínea c), por afectar o direito de informação dos sócios previsto nos artigos 248º nº 1 e 289º nº 1 alínea c) do CSC.
24ª - O sócio D… estava impedido de votar a deliberação do ponto 7, mas votou-a conforme consta da redacção da ata; o disposto no artigo 251º nº 1 alíneas a), b) e g) do CSC impede que o sócio D… votasse na deliberação em causa por haver conflito de interesses com a sociedade na liberação de uma obrigação como gerente e como sócio assim como de qualquer relação a estabelecer entre o sócio e a sociedade estranha ao contrato social.
25ª – O sócio D… fez um negócio consigo mesmo, tal como configurado no artigo 261º do C. Civil, e deste modo entrou em conflito de interesses com a Ré, e com os demais sócios que não votaram a deliberação, como a Autora; tratando-se de um acto que implica a transmissão temporária de um bem do património da Ré as respectivas condições deveriam obrigatoriamente ter sido apresentadas e fornecidas aos sócios durante o período anterior à realização da assembleia, o que não se verificou.
26ª - A deliberação tomada no ponto 7 da ordem de trabalhos é apropriada a satisfazer o propósito de um sócio da Ré (D…) de conseguir, através do seu direito de voto, vantagens especiais para si, em prejuízo da sociedade e dos demais sócios como a Autora, prejudicando a empresa, nos termos do disposto no artigo 58º nº 1 alínea b) do CSC, por afectar a obrigação implícita de não concorrência dos sócios com a sociedade Ré, consubstanciando também abuso de poder e voto abusivo.
27ª – O tribunal recorrido cometeu erro de julgamento ao não declarar a nulidade ou anulabilidade, conforme as conclusões do recurso, das deliberações tomadas pela Ré nos pontos 1, 2, 3, 6 e 7 da assembleia-geral anual de 31/03/2017, o que deve ser modificado ad quem.
28ª – A douta sentença recorrida violou as normas expressamente referidas como violadas nas alegações e nas conclusões de recurso.
Termos em que, deve o recurso ser julgado procedente em razão as suas conclusões, com as legais consequências.
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Por seu turno a ré/apelada conclui do seguinte modo as suas contra alegações:
I - Não ocorre a invalidade da convocatória da assembleia-geral de sócios da Ré de 31.03.2017 por omissão do disposto no artigo 376º, nº 1, alínea d), do CSC, porquanto, sendo a Ré uma sociedade por quotas, não se verifica nenhuma das situações previstas no artigo 256º do CSC.
II - Os documentos de prestação de contas submetidos à aprovação dos sócios na referida assembleia-geral foram assinados pelos gerentes da Ré, como ressalta do documento nº 1 junto com a contestação, não impugnado pela recorrente, não sendo aqui aplicável o disposto no artigo 69º, nºs 1 e 3, do CSC.
III - De todo o modo, a não assinatura dos documentos de prestação de contas pelos gerentes não é causa de nulidade ou anulabilidade da deliberação que os aprovou, mas, quando muito, de mera irregularidade, que pode ser sanada, mediante suprimento, nos termos do artigo 69º, º 2, in fine, do CSC.
IV - Quanto à invocada violação do direito à informação, resultou demonstrado que a recorrente exercitou, e bem, o direito à consulta dos documentos que iam ser submetidos à assembleia-geral em causa, conforme confessou nos itens 14 e 15 do douto articulado inicial.
V - A recorrente - em momento algum - alegou ter pedido directamente à recorrida qualquer documento ou informação que lhe tenha sido recusado, tanto mais que, como também se demonstrou, a recorrente não compareceu na assembleia-geral em causa.
VI - O direito à informação da recorrente não foi, assim, preterido ou violado, inexistindo razão ou fundamento para invalidar as deliberações sociais tomadas na assembleia-geral da Ré de 31.03.2017, até porque não está nem foi minimamente demonstrado que a invocada falta de informação tenha viciado a manifestação de vontade sobre os assuntos sujeitos a deliberação.
VII - Quanto ao invocado impedimento de voto por conflito de interesses, as deliberações sociais tomadas a respeito dos pontos um, dois e três da ordem de trabalhos não tinham por objecto nenhuma das matérias elencadas no artigo 251º, nº 1, do CSC, pelo que os sócios da Ré, que são simultaneamente gerentes, não estavam impedidos de exercer o seu direito de voto quanto a essas deliberações.
VIII - Até porque, se assim não fosse, também a recorrente, que é gerente da Ré, estaria impedida de votar as mesmas deliberações.
IX - No tocante à invocada ofensa dos princípios da boa-fé e dos bons costumes e abuso de direito, a recorrente não alegou nem provou qualquer facto concreto e objectivo do qual se pudesse concluir que as deliberações sociais são abusivas e/ou susceptíveis de causar prejuízo para si ou para a sociedade ou de corresponder a uma vantagem especial para os sócios presentes na assembleia-geral em causa.
X - A (também) invocada violação de deveres fundamentais pelo gerente – que, ainda assim, não foi demonstrada – não é, naturalmente, causa de invalidade das deliberações tomadas na assembleia, tratando-se, antes, de questão a ser discutida em acção própria.
XI - Não existe, pelo exposto, fundamento para declarar a anulação ou nulidade das deliberações sociais tomadas quanto aos pontos um, dois e três da ordem de trabalhos da assembleia-geral de sócios da Ré de 31.03.2017.
XII - No que tange à deliberação social tomada quanto ao ponto sexto da ordem de trabalhos, os recursos ordinários visam o reexame da decisão proferida dentro dos mesmos pressupostos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento em que a proferiu.
XIII - A matéria suscitada pela recorrente nas conclusões 21ª a 22ª do seu recurso apenas o foi em sede de recurso, pelo que estamos inequivocamente perante uma questão nova (concretamente, a questão de saber se a deliberação em causa viola os estatutos sociais da Ré), que não foi presente ao tribunal recorrido que, por inerência, também não a ponderou, apreciou ou decidiu.
XIV - Essa questão não pode, por isso, ser apreciada por este Venerando Tribunal, por a mesma lhe estar vedada em face do disposto no artigo 608º, nº 2, do CPC.
XV - De todo o modo, estamos perante uma matéria (equipamento de luz e som em permanente desactualização e desvalorização) que não se enquadra no disposto no citado artigo 246º do CSC, ou seja, que não está dependente de prévia deliberação dos sócios (vd., a contrario sensu, a alínea c) do nº 2 do preceito legal citado), estando, antes, compreendida nas funções e competências dos gerentes.
XVI - Deste modo, estando em causa um assunto ou questão que não estava legalmente dependente de (prévia) deliberação social, a deliberação social em causa não padece de qualquer vício conducente à sua invalidade, como defende a recorrente.
XVII - O disposto no artigo quarto, nº 3, dos estatutos sociais da Ré não prejudica ou infirma esta conclusão, porquanto: esse artigo respeita, apenas, aos gerentes sociais, identificando-os (nºs 1 e 4) e definindo e delimitando os seus poderes e competências (nºs 2 e 3); os estatutos sociais da Ré (e, concretamente, o citado artigo quarto, nº 2) não dispõem, expressa ou implicitamente, sobre deliberações sociais nem definem quóruns ou maiorias qualificadas para determinados assuntos ou matérias, que também não identifica; o citado artigo quarto, nº 3, dos estatutos, ao referir-se aos actos e contratos que impliquem a oneração ou alineação do património pertencente à sociedade, está a referir-se, apenas e tão só, ao património imobiliário da sociedade, em consonância, aliás, com o disposto no artigo 246º, nº 2, alínea c), do CSC, acima citado.
XVIII - De todo o modo, e conforme flui da acta da referida assembleia-geral, estava em causa um equipamento já obsoleto e em permanente desactualização e desvalorização, tendo sido ponderado pelos sócios, na deliberação que tomaram, o facto de a discoteca estar encerrada sem que se preveja a sua reabertura, o que, conjugado com o teor da deliberação tomada quanto ao ponto quinto da ordem de trabalhos - onde, para além do mais, se deliberou a reposição de suprimentos levantados pelos sócios para fazer face às despesas correntes da sociedade, nelas se incluindo as decorrentes dos vários processos judiciais instaurados pela sócia B… contra a sociedade, actualmente pendentes em juízo, e, bem assim, à necessidade de proceder a obras de manutenção e limpeza do prédio, sem que se deslumbre a possibilidade da discoteca funcionar a curto prazo –, permite que se extraia a conclusão de que a deliberação em causa não causou qualquer prejuízo, nem à Ré nem aos seus sócios – bem pelo contrário!
XIX - A deliberação tomada quanto ao ponto seis da ordem de trabalhos não é, assim, inválida e, como tal, deverá manter-se na ordem jurídica.
XX - No que tange à deliberação social tomada quanto ao ponto sete da ordem de trabalhos, a recorrente não alegou nem provou qualquer facto, concreto e objectivo, através do qual se pudesse concluir que essa deliberação é suscetível de causar prejuízo ou corresponder a uma vantagem especial para os sócios que a aprovaram ou que a mesma é materialmente abusiva, com o propósito de a prejudicar enquanto sócia.
XXI - Não se provou, de igual modo, que a recorrente – que nem sequer esteve presente na assembleia-geral ajuizada – tenha, previamente a essa assembleia, solicitado qualquer informação ou esclarecimento acerca de qualquer um dos pontos da ordem de trabalhos que iam ser submetidos a deliberação dos sócios (e, concretamente, quanto ao seu ponto sete).
XXII - Não se verifica, de igual modo, o invocado conflito de interesses do sócio D… com a matéria constante do ponto sete da ordem de trabalhos.
XXIII - De facto, o objecto dessa deliberação social foi, apenas e tão só, uma proposta, cuja concretização passará pela gerência, integrada pela própria autora (recorrente), não se podendo falar, apenas pelo facto de o proponente ser um sócio, de negócio consigo mesmo (art.º 261º do Código Civil e art. 5º do Código das Sociedades Comerciais), como defende a recorrente.
XXIV - Para além disso, mesmo que o sócio D… estivesse impedido de votar, e não estava, a deliberação social em causa, ainda assim, não deixaria de ser aprovada com os votos dos restantes sócios.
XXV - Não existe, assim, fundamento para declarar a invalidade (nulidade ou anulabilidade) da deliberação tomada quanto ao ponto sete da ordem de trabalhos.
XXVI - A douta sentença recorrida subsumiu correctamente os factos ao direito aplicável, não havendo razão ou motivo para alterar, agora, essa decisão.
NESTES TERMOS e nos melhores de direito aplicáveis, requer-se se dignem julgar totalmente improcedente, por não provado, o presente recurso, mantendo, por conseguinte, a douta sentença proferida nos autos, condenando-se a recorrente nas custas do processo.
Assim decidindo, farão V. Exas. a HABITUAL JUSTIÇA!
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Perante o antes exposto, resulta claro que são as seguintes as questões suscitadas no âmbito deste recurso:
1ª) A invalidade da convocatória da assembleia-geral de 31.03.2017 – conclusões 4ª e 10ª;
2ª) A invalidade das deliberações tomadas na mesma assembleia por falta de assinatura das contas de exercício e por violação do direito dos sócios à informação – conclusões 5ª a 9ª;
3ª) A invalidade das deliberações sociais tomadas quanto aos pontos um e dois da ordem de trabalhos por conflito de interesses – conclusões 11ª a 19ª;
4ª) A invalidade da deliberação social tomada quanto ao ponto três da ordem de trabalhos por ofensa dos princípios da boa-fé e dos bons costumes e por abuso de direito – conclusão 20ª;
5ª) A invalidade da deliberação social tomada quanto ao ponto sexto da ordem de trabalhos por falta de quórum – conclusões 21ª e 22ª;
6ª) A invalidade da deliberação social tomada quanto ao ponto sétimo da ordem de trabalhos por violação do direito dos sócios à informação, por conflito de interesses do sócio D… e por abuso de poder – conclusões 23ª a 26ª.
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Perante tais questões importa recordar aqui o conteúdo da decisão de facto que foi proferida.
Assim:
Ficou assente que:
a) A ré “C…, Lda.” está registada na Conservatória do Registo Comercial com o NIPC ………., com sede na Avenida …, n.º …, …, no Porto, tendo por objecto a promoção de espectáculos e divertimentos públicos, restaurante, snack-bar e bar, com o capital de 20.000,00 euros;
b) São sócios da ré E…, titular de uma quota no valor nominal de 4.028,83 euros, “B…, S.A.”, titular de três quotas nos valores nominais de 2.014,41 euros, 2.014,42 euros e 4.028,83 euros, F… e G…, titular de uma quota no valor nominal de 2.789,19 euros, H…, titular de uma quota no valor nominal de 2.324,32 euros, D…, titular de uma quota no valor nominal de 1.400,00 euros, e I…, titular de uma quota no valor nominal de 1.400,00 euros;
c) Do registo comercial constam como gerentes E…, J…, F… e G…, H…, D…, I… e “B…, S.A.”, representada por J…;
d) A ré rege-se pelos “estatutos” cuja cópia se encontra junta a fls. 43 e 43 verso, cujo teor se dá aqui por reproduzido;
e) A ré remeteu à autora, por carta registada com aviso de recepção, a convocatória, datada de 10 de Março de 2017, para a assembleia geral anual a realizar no dia 31 de Março de 2017, pelas 19 horas, na Rua …, n.º …, em Caminha, cuja cópia se encontra junta a fls. 14 e cujo teor se dá aqui por reproduzido, com a seguinte ordem de trabalhos:
“Ponto um: Deliberar sobre o relatório de gestão e as contas do exercício de 2016;
Ponto dois: Deliberar sobre a proposta de aplicação de resultados do exercício de 2016;
Ponto três: Proceder à apreciação geral da gerência da sociedade no exercício de 2016;
Ponto quarto: Deliberar sobre a mudança da sede social da empresa;
Ponto quinto: Deliberar sobre a necessidade de reposição de suprimentos levantados pelos sócios, face às necessidades de tesouraria da empresa;
Ponto sexto: Deliberar sobre a venda do equipamento de luz e som, em permanente desactualização e desvalorização;
Ponto sétimo: Deliberar sobre as condições mínimas de cedência temporária da exploração da discoteca, para fazer face às despesas de manutenção do imóvel.”;
f) Da referida convocatória consta, ainda, o seguinte: “Não estando quórum suficiente para deliberar fica, desde já, convocada nova reunião, no mesmo local e com a mesma ordem de trabalhos, para o dia 31 de Março de 2017, pelas 19.30 horas.
A reunião celebra-se na Rua …, n.º …, (…) Caminha, em virtude de desconhecer - mos a possibilidade da sua realização na sede social.
Todos os documentos e contas estão disponíveis para consulta nos escritórios da firma responsável pela contabilidade (K…, Lda.), tal como já é do conhecimento de todos os sócios.”;
g) Na assembleia geral realizada a 31 de Março de 2017 estiveram presentes ou representados os seguintes sócios, titulares de quotas representativas de 59,71% do capital social:
- E…, representado por F… e G…;
- F… e G…;
- D…;
- I…;
- H…;
h) Exerceu as funções de presidente da mesa da assembleia geral o sócio F… e G…;
i) Relativamente a tal assembleia geral foi elaborado o documento denominado “Acta Avulsa”, cuja cópia se encontra junta a fls. 36 verso a 38 verso e cujo teor se dá aqui por reproduzido;
j) Relativamente ao ponto um da ordem de trabalhos foram apresentados os documentos de prestação de contas do ano de 2016, compostos pelo balanço, anexo e demonstração individual dos resultados por natureza, tendo as contas sido aprovadas com os votos a favor dos sócios E…, F… e G…, H…, D… e I…;
k) No âmbito da apreciação do ponto dois da ordem de trabalhos foi proposta a seguinte aplicação dos resultados do exercício de 2016: “O resultado negativo de onze mil oitocentos e setenta e oito euros e setenta e três cêntimos fosse transferido para a conta de Resultados Transitados a fim de ser coberto em exercícios futuros”;
l) Tal proposta foi aprovada com os votos a favor dos sócios E…, F… e G…, H…, D… e I…;
m) Na discussão do ponto três da ordem de trabalhos o sócio F… e G… propôs um voto de confiança e de louvor a todos os sócios gerentes da sociedade pela forma como têm orientado os negócios, o que foi aprovado com os votos a favor dos sócios E…, F… e G…, H…, D… e I…;
n) Na apreciação do ponto quarto da ordem de trabalhos foi “discutida e apreciada a proposta de alteração da sede social da empresa para uma morada próxima das instalações da sociedade e das moradas habituais de todos os sócios, concluindo-se não fazer qualquer sentido que a sede da sociedade esteja numa morada no Porto onde nenhum dos sócios tem acesso a não ser a B…”;
o) Posta à votação a alteração da sede para Caminha, para a Rua …, …, … (…), foi a mesma aprovada com os votos a favor dos sócios E…, F… e G…, H…, D… e I…;
p) Relativamente ao ponto quinto da ordem de trabalhos foi proposto que “face às despesas correntes da sociedade, nelas se incluindo as decorrentes dos vários processos judiciais instaurados pela sócia B… contra a sociedade, actualmente pendentes em juízo, e, bem assim, à necessidade de proceder a obras de manutenção e limpeza do prédio, sem que se deslumbre a possibilidade da discoteca funcionar a curto prazo, seria prudente a reposição dos suprimentos levantados pelos sócios, de modo a proporcionalmente os igualar aos suprimentos da sócia B…. A reposição dos suprimentos poderá ser feita em prestações, de acordo com as necessidades de tesouraria.”;
q) Tal proposta foi aprovada com os votos a favor dos sócios E…, F… e G…, H…, D… e I…;
r) No que diz respeito ao ponto sexto da ordem de trabalhos consta o seguinte: “Considerando o facto da discoteca estar encerrada, sem que se preveja a sua reabertura, foi apresentada proposta para a venda do equipamento de luz e som, já obsoleto e em permanente desactualização e desvalorização. Consultado o mercado constatamos que neste momento o seu valor ronda os 4.500€. Um dos sócios, nomeadamente o sócio D… manifestou o interesse na aquisição do referido material, pelo referido valor de mercado.”;
s) Posta à votação a proposta de venda do referido material ao sócio D…, pelo montante de 4.500,00 euros, foi a mesma aprovada com os votos a favor dos sócios E…, F… e G…, H…, D… e I…;
t) Quanto ao ponto sétimo da ordem de trabalhos lê-se o seguinte. “Considerando a urgente necessidade de se proceder à limpeza do prédio e a algumas obras de manutenção, foi proposta a cedência de exploração da discoteca pelo montante de 500 euros por sessão. À gerência da sociedade compete avaliar o custo das obras de manutenção e propor a um possível interessado em avançar com a realização das obras e limpezas a suas custas, deduzindo-se futuramente no valor da renda estabelecida para a cedência de exploração. O sócio D… mostrou-se eventualmente interessado nesta solução, ficando de em tempo útil apresentar proposta por escrito para apreciação da gerência. Neste contexto, foi submetida à votação uma proposta de cedência de exploração ao sócio D… pelo valor de 500€ por sessão, sendo deduzidas ao valor da renda um valor a determinar para a realização das obras e limpezas.”;
u) Submetida a proposta à votação, foi a mesma aprovada com os votos a favor dos sócios E…, F… e G…, H…, D… e I…;
v) Relativamente ao exercício de 2016 não foi elaborado o relatório de gestão;
w) Os documentos de prestação de contas elaborados e objecto de apreciação na assembleia geral de 31 de Março de 2017 constam de fls. 35, 36 e 79;
x) A autora, por carta datada de 5 de Abril de 2017, expedida no dia 8 dos mesmos mês e ano e dirigida ao gerente F… e G…, cuja cópia se encontra junta a fls. 14 verso e cujo teor se dá aqui por reproduzido, solicitou o envio de cópia da acta assinada por todos os sócios presentes e representados na assembleia geral de 31 de Março de 2017;
y) A ré, por carta datada de 8 de Maio de 2017, expedida na mesma data, cuja cópia se encontra junta a fls. 39 verso e cujo teor se dá aqui por reproduzido, remeteu à autora a cópia da acta da assembleia geral de 31 de Março de 2017.
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O Tribunal “a quo” fundamentou do seguinte modo esta decisão:
“O tribunal teve em consideração a posição assumida pelas partes nos respectivos articulados, bem como o teor dos documentos juntos, com relevo para a acta da assembleia geral da ré em causa nos autos e para os documentos de prestação de contas de fls. 35, 36 e 79.
O tribunal teve, ainda, em atenção a declaração prestada pela ré no requerimento de 25 de Janeiro de 2019, no que diz respeito ao relatório de gestão, e que não foi objecto de impugnação pela autora.”
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É pois com tais factos que devem ser analisadas as questões agora suscitadas.
Como todos já vimos, neste seu recurso a autora/apelante começa por reiterar a tese da invalidade da convocatória da assembleia-geral de sócios da Ré do dia 31.03.2017.
E isto pelo facto de a mesma não incluir o ponto relativo às eleições dos órgãos sociais (conclusão 4ª) e por ter sido omitido o dever de informação prévio (conclusão 10ª).
Vejamos, pois, se tem razão nesta sua pretensão.
É consabido que segundo o art.º 248º, nº 1 do CSC é aplicável às assembleias-gerais das sociedades por quotas o disposto sobre as assembleias-gerais das sociedades anónimas, em tudo o que não estiver especificamente regulado para aquelas.
Por seu lado, o art.º 376º, nº 1, alínea d), do CSC, prescreve que a assembleia-geral dos accionistas deve reunir para proceder às eleições que sejam da sua competência.
Sabe-se, igualmente, que nas sociedades anónimas, os administradores são eleitos por mandatos de um, dois, três ou quatro anos civis (cf. art.º 391º, nº 3, do CSC) e que no final desses mandatos, a assembleia-geral de accionistas elege novos administradores ou reconduz os anteriores.
Já nas sociedades por quotas, as funções dos gerentes subsistem enquanto não terminarem por destituição ou renúncia.
E isto, sem prejuízo do contrato de sociedade ou o acto de designação poder fixar a sua duração delas (cf. art.º 256º do CSC).
Ora no caso concreto da ré aqui apelada, o seu pacto social (cf. a alínea d) dos factos provados), não delimita temporalmente as funções dos seus gerentes.
E a ser assim, os mesmos devem manter-se em funções até serem destituídos ou renunciarem ao cargo.
Sendo deste modo e não se verificando no caso, nenhuma das situações previstas no artigo 256º do CSC, deve concluir-se que na ordem de trabalhos constante do aviso convocatório para a assembleia-geral da ré de 31.03.2017 não tinha que constar o disposto no artigo 376º, nº 1, alínea d), do CSC.
Só assim não seria se a ré/apelada fosse uma sociedade anónima e se os seus gerentes cessassem o seu mandato em 2017, que não se verifica.
Em conclusão, a convocatória em questão não padece de qualquer vício que a invalide, razão pela qual, neste ponto, improcede o recurso aqui interposto pela autora/apelante.
Mas como se verifica a mesma autora/apelante também defende a ideia de que a convocatória é enganosa por nela se referir que estavam disponíveis para consulta todos os documentos de prestação de contas do ano de 2016, o que não se verifica no que toca ao relatório de gestão de 2016 e às informações quanto às condições mínimas de cedência temporária da exploração da discoteca referidas no ponto sétimo da ordem de trabalhos.
E a ser assim, tal vício acarretaria a anulação das deliberações tomadas na respectiva assembleia-geral, relativamente aos pontos um, dois e sete da ordem de trabalhos pela falta de assinaturas em documentos de prestação de contas e pela violação do direito dos sócios à informação.
Importa, pois, saber, se tal argumentação merece ou não ser acolhida.
Desde logo e no que respeita à falta de assinaturas em documentos de prestação de contas, cabe chamar à colação o art.º 65º, nº 1, do CSC segundo o qual, “os membros da administração devem elaborar e submeter aos órgãos competentes da sociedade, o relatório de gestão, as contas do exercício e demais documentos de prestação de contas referidos na lei”.
Por outro lado, o seu nº3 prescreve que o relatório de gestão e as contas do exercício “devem ser assinados por todos os membros da administração.”
Da análise conjugada destas regras o que se deve concluir é que a lei o que exige é que os documentos em causa estejam assinados quando forem submetidos ao órgão competente para deliberar sobre esses documentos, que, no caso, é a assembleia-geral de sócios.
Ora no caso concreto foi devidamente cumprida, como se constata do documento nº1 junto com a contestação da recorrida, documento esse que a autora não impugnou.
Deste modo e contrariamente ao que agora se afirma, à situação em análise, não é pois aplicável o disposto no artigo 69º, nºs 1 e 3, do CSC.
Por outro lado, tem razão a ré/apelada quando na sua resposta às alegações da autora/apelante, afirma que “de qualquer modo, a não assinatura do relatório de gestão e contas de exercício pelos gerentes não é causa de nulidade ou anulabilidade da deliberação que os aprovou, mas, quando muito, de mera irregularidade, que pode ser sanada, mediante suprimento, nos termos do artigo 69º, º 2, in fine, do CSC.”
Quanto à invocada violação do direito à informação, dispõe o art.º 21º, nº 1, alínea b), do CSC que todo o sócio tem direito a obter informações sobre a vida da sociedade, nos termos da lei e do contrato.
Tem vindo a ser aceite a ideia de que o direito à informação se desdobra em quatro vertentes distintas e complementares, integrando: um direito a obter informações; um direito de consulta dos livros e documentos da sociedade; um direito de inspecção de bens sociais; e, embora noutro plano, um direito de requerer inquérito judicial.
Sabe-se por outro lado que nas sociedades por quotas, o direito à informação se encontra previsto no nºs 1 e 3 do artigo 214º do CSC, para as informações não prestadas em assembleia geral, e no artigo 290º (ex vi do nº 7 do artigo 214º) para as informações solicitadas em assembleia geral.
Mais, no art.º 58º, nº 1, alínea c), do CSC está prevista a anulabilidade das deliberações que não tenham sido precedidas do fornecimento ao sócio de elementos mínimos de informação.
Já segundo o disposto no nº4 do mesmo artigo, está prescrito que são elementos mínimos de informação, os seguintes:
a) As menções exigidas pelo artigo 377º, nº 8, do CSC;
b) A colocação de documentos para exame dos sócios no local e durante o tempo prescritos pela lei ou pelo contrato.
No caso dos autos e como consta da alínea f) dos factos provados, da convocatória para a assembleia-geral em causa constava, para além do mais, o seguinte:
“Todos os documentos e contas estão disponíveis para consulta nos escritórios da firma responsável pela contabilidade (K…, Lda.”), tal como já é do conhecimento de todos os sócios.”
Mostra-se igualmente confirmado que a autora/apelante exercitou, o seu direito à consulta dos documentos que iam ser submetidos à assembleia-geral em causa, (cf. o que alegou nos artigos 14 e 15 da petição inicial).
Mais, está demonstrado que a ré/apelada veio juntar aos autos os documentos de prestação de contas que foram submetidos à aprovação dos sócios na assembleia-geral da Ré de 31.03.2017, assinados pelos seus gerentes, justificando, ainda, a não elaboração – e consequente exibição à recorrente – do relatório de gestão referente a 2016, em face do disposto no artigo 66º, nº 6, do CSC, em termos que não foram impugnados ou contraditados pela recorrente (cf. as alíneas v) e w) dos factos provados.
Valem igualmente os argumentos vertidos pela ré/apelada nas suas contra- alegações e segundo os quais a autora/apelante nunca alegou ter pedido directamente à recorrida qualquer documento ou informação que lhe tenha sido recusado, sendo por outro lado certo que a mesma não chegou a comparecer na assembleia-geral em discussão nos autos.
Perante tudo o que ficou dito, também nós entendemos que o direito à informação da autora/apelante não foi preterido ou violado.
E mesmo que assim se não entendesse o certo é que ficou por demonstrar que a alegada falta de informação tenha viciado a eventual manifestação de vontade sobre os assuntos que na assembleia-geral foram sujeitos a deliberação.

Não existe, pois, qualquer fundamento para invalidar as deliberações sociais tomadas na mesma assembleia-geral de 31.03.2017.
Está também visto que a autora/apelante veio defender a tese da invalidade das deliberações sociais tomadas quanto aos pontos um, dois e três da ordem de trabalhos, agora por conflito de interesses (cf. conclusões 11ª a 19ª).
Vejamos, pois:
Está confirmado que as deliberações sociais em causa tinham por objecto a aprovação dos documentos de prestação de contas de 2016, a proposta de aplicação dos resultados desse exercício e a apreciação anual da gerência.
Verifica-se, assim, que não estava em causa deliberação social que recaísse sobre qualquer uma das matérias elencadas no artigo 251º, nº 1, do CSC.
A ser deste modo, cabe concluir que os sócios da ré, que são simultaneamente gerentes, não estavam impedidos de exercer o seu direito de voto na assembleia-geral, não padecendo pois as deliberações sociais nela tomadas do vício agora invocado.
Para além disso, vale também a ideia vertida na sentença recorrida segundo qual, a proceder a tese da autora, também ela, por ser gerente da ré, estava impedida de votar as deliberações em causa.
A autora/apelante invoca, ainda, a invalidade da deliberação social tomada quanto ao ponto três da ordem de trabalhos por ofensa dos princípios da boa-fé e dos bons costumes e por abuso de direito (cf. conclusão 20ª).
Ora, segundo o disposto no artigo 58º, nº 1, alínea b), do Código das Sociedades Comerciais, são anuláveis as deliberações que “Sejam apropriadas para satisfazer o propósito de um dos sócios de conseguir, através do exercício do direito de voto, vantagens especiais para si ou para terceiros, em prejuízo da sociedade ou de outros sócios ou simplesmente de prejudicar aquela ou estes, a menos que se prove que as deliberações teriam sido tomadas mesmo sem os votos abusivos.”
Está, assim previsto nesta norma o princípio do abuso de direito do art.º 334º do Código Civil.
Da leitura mais apressada da referida norma parece resultar a ideia de que o abuso recai no abuso no voto.
No entanto, deve entender-se que o que é abusivo é antes a deliberação.
Ou seja, a tese a sufragar é a de que não há votos abusivos, mas o que pode haver, sim, são deliberações abusivas.
Ora no caso dos autos, tem razão a ré/apelada quando afirma que a autora/apelante não alegou nem provou qualquer facto concreto e objectivo do qual se pudesse concluir que as deliberações sociais são abusivas e/ou susceptíveis de causar prejuízo para si ou para a sociedade ou de corresponder a uma vantagem especial para os sócios presentes na assembleia-geral em causa.
Também quando refere que a invocada violação de deveres fundamentais pelo gerente, não é causa de invalidade das deliberações tomadas naquela assembleia, sendo antes questão que deve ser discutida em acção própria.
Assim também por aqui não existe fundamento para declarar a anulação ou a nulidade das deliberações sociais em causa.
A autora/apelante vem invocar, ainda, a invalidade da deliberação social tomada quanto ao ponto sexto da ordem de trabalhos por falta de quórum (cf. conclusões 21ª e 22ª).
Da leitura dos autos pode constatar-se que a mesma não foi alegada em nenhum momento processual da acção (cf. os artigos 67º a 73º da petição inicial).
Estamos, pois, claramente, perante “questão nova”.
Ora, segundo os ensinamentos de A. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, a pág.87, “a natureza do recurso, como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina outra importante limitação ao seu objecto decorrente do facto de, em termos gerais, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o tribunal ad quem com questões novas”.
Mais, os recursos destinam-se à apreciação de questões já antes levantadas e decididas no processo, e não a provocar decisões sobre questões que não foram antes submetidas ao contraditório e decididas pelo tribunal recorrido, a menos que se trate de questões de conhecimento oficioso.”
Não pode, pois, tal questão ser objecto de apreciação no âmbito deste recurso atento o que para além do mais, decorre do disposto no art.º 608º, nº 2, do CPC.).
No entanto e mesmo que se possa considerar que não estamos perante uma “questão nova”, nunca a pretensão da autora/apelante poderia proceder,
Se não, vejamos:
No âmbito do ponto seis da ordem de trabalhos – Deliberar sobre a venda de equipamento de luz e som em permanente desactualização e desvalorização (vd. alínea e) dos factos provados – o que ficou exarado em acta foi o seguinte:
“Considerando o facto de a discoteca estar encerrada, sem que se preveja a sua reabertura, foi apresentada proposta para a venda do equipamento de luz e som, já obsoleto e em permanente desactualização e desvalorização. Consultado o mercado constatamos que neste momento o seu valor ronda os 4.500€. Um dos sócios, nomeadamente o sócio D…. manifestou o interesse na aquisição do referido material, pelo referido valor de mercado.”, sendo que, posta à votação a proposta de venda do referido material ao sócio D…, pelo montante de 4.500,00 euros, foi a mesma aprovada com os votos a favor dos sócios E…, F… e G…, H…, D… e I….”
Ora, com o sabemos, no art.º246º do CSC estão identificadas as matérias que estão dependentes de deliberação dos sócios.
Assim e no mais concretamente respeita à alienação ou oneração de património social, a alínea c) do nº 2 do supra citado artigo, exige deliberação social apenas nos casos de alienação ou oneração de bens imóveis e alienação, oneração e locação de estabelecimento.
No caso, a deliberação social tomada quanto ao ponto seis da ordem de trabalhos teve por objecto a alineação de bens móveis (equipamento de luz e som em permanente desactualização e desvalorização), ou seja, sobre matéria que não se enquadra no disposto no citado artigo 246º do CSC.
A ser deste modo e não estando em causa um assunto ou questão que não dependia legalmente de (prévia) deliberação social, mas que, pelo contrário, estava contido nos poderes da gerência, a deliberação social em causa não padece de qualquer vício que conduza à sua invalidade.
Mais, o disposto no artigo quarto, nº3, dos estatutos sociais da Ré não prejudica nem questiona tal conclusão.
E isto porque por um lado, tal artigo diz respeito, apenas, aos gerentes sociais, tal como estão identificados nos nºs 1 e 4 e definindo e delimitando os seus poderes e competências, atento o que se mostra dos seus nºs 2 e 3.
Por outro lado, os estatutos sociais da Ré (e, concretamente, o citado artigo quarto, nº3) também não dispõem, de modo expresso ou implícito, sobre deliberações sociais nem definem quóruns ou maiorias qualificadas para determinados assuntos ou matérias, aspectos que também não são aí identificados.
Concluindo, como a ré/apelada nas suas contra alegações, “finalmente porque o citado artigo quarto, nº 3, dos estatutos, ao referir que todos os actos e contratos que impliquem a oneração ou alineação do património pertencente à sociedade, está a referir-se, apenas e tão só, ao património imobiliário da sociedade, em consonância, aliás, com o disposto no artigo 246º, nº2, alínea c), do CSC.
De todo o modo, e conforme flui da ata da referida assembleia-geral, estava em causa um equipamento já obsoleto e em permanente desactualização e desvalorização, tendo sido ponderado pelos sócios, na deliberação que tomaram, o facto de a discoteca estar encerrada sem que se preveja a sua reabertura”, o que, conjugado com o teor da deliberação tomada quanto ao ponto quinto da ordem de trabalhos – onde, para além do mais, se deliberou a reposição de suprimentos levantados pelos sócios para fazer face às despesas correntes da sociedade, nelas se incluindo as decorrentes dos vários processos judiciais instaurados pela sócia B… contra a sociedade, actualmente pendentes em juízo, e, bem assim, à necessidade de proceder a obras de manutenção e limpeza do prédio, sem que se deslumbre a possibilidade da discoteca funcionar a curto prazo –, permite que se extraia a conclusão de que a deliberação em causa não causou qualquer prejuízo, nem à Ré nem aos seus sócios – bem pelo contrário!”.
Em suma e por tudo que ficou referido, importa concluir pela validade da deliberação tomada quanto ao ponto seis da ordem de trabalhos.
Por último, veio a autora/apelante invocar a invalidade da deliberação social tomada quanto ao ponto sétimo da ordem de trabalhos por violação do direito dos sócios à informação, por conflito de interesses do sócio D… e, finalmente, por abuso de poder – vd. conclusões 23ª a 26ª do recurso.
A este propósito, valem integralmente os argumentos antes subscritos e nos quais se sustentou a decisão relativa às deliberações tomadas quanto aos pontos um, dois e três da ordem de trabalhos da assembleia-geral do dia 31.03.2017.
Assim e como então se referiu, a autora/apelante não alegou nem provou qualquer facto, concreto e objectivo, com base no qual se pudesse concluir que a deliberação tomada quanto ao ponto sétimo da ordem de trabalhos é susceptível de causar prejuízo ou de corresponder a uma vantagem especial para os sócios que a aprovaram ou que a mesma deliberação é materialmente abusiva, sendo seu propósito o de a prejudicar na sua qualidade de sócia.
Para além disso, tem razão a ré/apelada quando recorda o facto de não se ter provado que a autora/apelante – que aliás nem esteve presente na assembleia-geral ajuizada – tenha, previamente a essa assembleia, solicitado qualquer informação ou esclarecimento acerca de qualquer um dos pontos da ordem de trabalhos que iam ser submetidos a deliberação dos sócios.
Por isso, nenhum fundamento existe, também aqui para invalidar a mesma deliberação social.
A autora/apelante alega, também, que o sócio D… estava impedido de votar o ponto sete da ordem de trabalhos.
Ora todos sabemos que o direito de participação nas deliberações da sociedade, previsto na alínea b) nº 1 do artigo 21º do CSC, está condicionado às restrições previstas no artigo 251º do mesmo diploma.
Neste âmbito, a tese que cabe subscrever é a de que para que se verifique tal impedimento se mostra necessário, antes do mais, que o seja relativamente à matéria da deliberação, devendo-se apurar-se o interesse do sócio relativamente à matéria da própria deliberação, de modo objectivo e nunca de forma subjectiva.
Ou seja, para excluir a possibilidade de votação do sócio, mostra-se necessário que este tenha na deliberação um interesse directo, imediato e oposto ao da sociedade.
Ora, tem razão a ré/apela quando afirma que no caso, não se vislumbra o invocado conflito de interesses entre o sócio e a recorrida.
Isto e desde logo, porque o objecto da deliberação social sindicada foi, apenas e tão só, uma proposta, cuja concretização passará, necessariamente, pela gerência, da qual a própria autora/apelante faz parte, não valendo o argumento assente no facto de o proponente da mesma ser um sócio e nas regras que prevêem o negócio consigo mesmo (cf. os artigos 261º do Código Civil e 5º do Código das Sociedades Comerciais).
A este propósito vale ainda um último argumento que é o seguinte:
Assim e mesmo que se aceitasse que o sócio D… estava impedido de votar, a verdade é que a deliberação social em causa, ainda assim, acabaria sempre por ser aprovada com os votos dos restantes sócios que votaram a mesma favoravelmente.
Em suma, não existe, pois, fundamento para declarar a invalidade (nulidade ou anulabilidade) da deliberação tomada quanto ao ponto sete da ordem de trabalhos.
Improcede assim, totalmente, o recurso aqui interposto.
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Sumário (cf. art.º663º nº7 do CPC):
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III. Decisão:
Pelo exposto, julga-se improcedente o presente recurso de apelação e, em consequência, confirma-se a sentença recorrida.
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Custas a cargo da autora/apelante (cf. art.º527º, nºs 1 e 2 do CPC).
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Notifique.
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Porto, 23 de Janeiro de 2020
Carlos Portela
Joaquim Correia Gomes
António Paulo Vasconcelos