Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP00041607 | ||
Relator: | JOÃO PROENÇA | ||
Descritores: | ARROLAMENTO PRELIMINAR DE DIVÓRCIO REGISTO | ||
Nº do Documento: | RP200807140822966 | ||
Data do Acordão: | 07/14/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | AGRAVO. | ||
Decisão: | PROVIDO. | ||
Indicações Eventuais: | LIVRO 280 - 34. | ||
Área Temática: | . | ||
Sumário: | I- Para obter o arrolamento de bens comuns, ou de bens próprios que estejam sob a administração do outro cônjuge, basta ao requerente alegar e provar o seu casamento com o requerido, anunciar que propôs ou vai propor acção de divórcio e invocar a probabilidade séria de os bens que pretende ver arrolados serem comuns ou próprios do requerente, embora sob a administração do requerido, oferecendo prova sumária. II- Não obsta ao arrolamento o registo efectuado a favor de terceiro, desde que o requerente ilida a presunção da titularidade daí decorrente. | ||
Reclamações: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
B…………….. intentou procedimento cautelar de arrolamento especial, como preliminar da acção de divórcio litigioso, contra C…………., pedindo o arrolamento, além de outros, de quatro prédios urbanos, uma fracção autónoma de prédio urbano e uma quota social em sociedade comercial por quotas. O Mmo. Juiz, sem ter procedido à inquirição das testemunhas arroladas, proferiu decisão que decretou o arrolamento dos demais bens indicados, indeferindo, todavia, o procedimento cautelar em causa quanto àqueles prédios urbanos e fracção autónoma e quota social. Inconformada, nesta parte, interpôs a requerente recurso de agravo, tendo, nas correspondentes alegações, concluído nos seguintes termos: I - Vem o presente recurso de Agravo interposto do Douto Despacho de fls. 145 e segs., de 15 de Fevereiro de 2008, na parte que indeferiu o arrolamento dos seguintes bens: a) Prédio Urbano sito da freguesia de ………., concelho de Loulé, descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o n.° 2733/110592, inscrito a favor de terceiros, que não a requerente e requerido, pela cota 6-4, bem como inscrito na matriz com o n.° 445; b) Prédio Urbano sito na freguesia de ………, concelho de Lousada, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lousada sob o n.° 190/061088, inscrito a favor de D………….., Lda., através da apresentação n.° 8/160104, bem como inscrito na matriz com o n.° 1136 (cfr. fls. 71 e 72); c) Prédio Urbano sito na freguesia de ………., concelho de Lousada, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lousada sob o n.° 547/220104, inscrito a favor de D………….., Lda., através da apresentação n.° 12/110305, bem como inscrito na na matriz com o n.° 905 (cfr. fls. 74 e 75); d) Prédio Urbano sito na freguesia de ……., concelho de Lousada, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lousada sob o n.° 7/140285, inscrito a favor de D………., Lda.. através da apresentação n.° 8/160104, bem como inscrito na matriz com o n.° 1135 (cfr. fls. 78 e 79); e) fracção autónoma designada pela letra "Q", sita na freguesia de ………, concelho de Lousada, descrita na Conservatória do Registo Predial de Lousada sob o n.° 159/231090-Q, e inscrita a favor de D……….., Lda., através da apresentação n.° 16/010992. bem como inscrito na matriz com o n.° 743-Q (cfr. fls. 81 a 91); f) quotas da sociedade por quotas designado "E……….., Lda.", matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lousada, com o n.° 502118032 (certidão permanente junta a fls. 134 e ss., com o código de acesso 4432-6046-0185). II - Quanto aos prédios urbanos pelo facto de no registo constar a titularidade dos mesmos em nome de terceiros e quanto às quotas da referida sociedade "E……….., Lda." por não constar do registo que o requerido seja titular de qualquer quota. III - No arrolamento de bens do casal, como preliminar de acção de divórcio ou separação litigiosa de pessoas e bens, tem-se em vista, essencialmente, obviar ao seu extravio ou dissipação, o que se atinge com a descrição, avaliação e depósito dos bens, não deixando estes de produzir as utilidades para que estão vocacionados, nem havendo lugar à privação da sua posse. IV - Ora. o Despacho recorrido não só violou o disposto nos arts. 423.°, n.°s 1 e 4 e 427.°, n.° l, ambos do C. P. Civil, como impediu ao não decretar o arrolamento sobre os referidos bens. a concretização da finalidade que o arrolamento especial dos autos teria caso fosse decretado, isto é, "prevenir o perigo de extravio ou dissipação dos bens que fazem parte do património do casal". V - Disposições legais estas a que a Agravante obedeceu escrupulosamente nomeadamente, quanto à alegação e prova do "fumus boni júris" pois, dúvidas não há de que a aqui Agravante alegou e provou que contraiu matrimónio com o Agravado no dia 20/07/1975. sem convenção antenupcial. VI - Alegou também a Agravante em sede de petição de arrolamento tratarem-se de bens comuns, aqueles que pretendia arrolar (vide a título de exemplo arts. 18° e 26.° da P.I.). VII - Mas, ainda que, o Sr. Juiz "a quo" entendesse que tal alegação era deficiente, sempre se justificaria um convite ao aperfeiçoamento da petição, nos termos legais. VIII - Até porque, com a petição a aqui Agravante apresentou prova sumária do direito relativo aos bens. nos termos das disposições conjugadas dos arts. 423.°. n.° 1 e 427.°, n.° 1 do C. P. Civil (vide parte final da P.I.). IX - Prova esta (testemunhal) que o Tribunal recorrido só não ouviu porque não quis. X - E certo que a Agravante sempre dispõe de acções próprias para reconhecimento do direito de que se arroga nomeadamente, da propriedade sobre os bens em questão, contudo, a morosidade própria deste tipo de acções não se compadece com a finalidade que se pretende com o arrolamento dos autos e que é a conservação dos bens. XI - Por outro lado, o que apenas por hipótese de patrocínio se concede, a confirmar-se a propriedade de terceiros dos bens cujo arrolamento foi recusado, sempre estes teriam a possibilidade de a defender através de meios próprios tais como embargos de terceiro. XII - Para além do que, sendo entre nós o arrolamento visto como um verdadeiro direito de sequela isto é, como a faculdade conferida ao titular da coisa de fazer valer o seu direito sobre ela onde quer que esta se encontre, direito este que a Agravante pretendia fazer valer e não pôde quanto aos referidos bens no que foi impedida pelo despacho recorrido. XIII - Assim, se os bens supra referidos in conclusão I, que a Requerente invoca serem comuns, se mantêm no património do Requerido, então a providência adequada, prévia à acção que visa o reconhecimento pelo Requerido e terceiros desse mesmo facto, é a do arrolamento, precisamente porque a providência se destina a evitar o extravio ou dissipação de bens, móveis ou imóveis, ou de documentos. *** Não foram apresentadas contra-alegações. O Mmo. Juiz sustentou, por forma tabelar, a decisão agravada. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. *** O objecto do recurso é, em princípio, delimitado pelo teor das conclusões, nos termos dos artºs 684º, nº 3, 690º, nº 3, e 713º, nº 2, todos do CPC, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso. E em face das conclusões apresentadas pela agravante, acima transcritas, importa tão só determinar se o Tribunal “a quo” decidiu ou não acertadamente ao rejeitar o arrolamento dos bens em questão baseando-se apenas na sua situação registral. Dispõe o art.º 427º, nºs 1 e 3, do CPC que: 1. Como preliminar ou incidente da acção de separação judicial de pessoas e bens, divórcio, declaração de nulidade ou anulação de casamento, qualquer dos cônjuges pode requerer o arrolamento de bens comuns, ou de bens próprios que estejam sob a administração do outro. 3. Não é aplicável aos arrolamentos previstos nos números anteriores o disposto no número 1 do artigo 421.º. Por onde se alcança que, para obter o arrolamento de bens comuns, ou de bens próprios que estejam sob a administração do outro cônjuge, bastará ao requerente alegar e provar o seu casamento com o requerido, anunciar que propôs ou vai propor acção de uma das referidas espécies, e invocar a probabilidade séria os bens que pretende ver arrolados serem comuns ou próprios do requerente, embora sob a administração do requerido, oferecendo prova sumária. Tal medida visa a conservação desses bens, enquanto estiver pendente a acção de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação de casamento, que levará à partilha, por forma a serem posteriormente relacionados, uma vez que, decretada a providência, serão devidamente descritos, avaliados e depositados, de acordo com o estipulado no art.º 424, nºs 1 e 2, do mesmo diploma, salvaguardando-se esse interesse. O requisito legal do justo receio de extravio, ocultação ou dissipação de bens, móveis ou imóveis, ou de documentos, estabelecido pelo n.º 1 do artigo 421.º para outras modalidades de arrolamento, é dispensado para o arrolamento a que se refere o art.º 427.º. Ao arrolamento são aplicáveis as disposições da penhora, em tudo quanto não contrarie o estabelecido na respectiva subsecção ou a diversa natureza das providências - n.º 5 do art.º 424.º do CPCiv.. Isto posto, tendo a requerente requerido, além de outros, o arrolamento dos prédios urbanos, fracção autónoma e quota social discriminados na conclusão I), foi a providência, nessa parte, indeferida por não constar do registo que o requerido seja titular da quota e por constar do teor das inscrições referentes aos prédios que são da titularidade de terceiros que não o requerido ou a requerente. Será este fundamento bastante para a rejeição da providência? Afigura-se que não. Do mesmo modo que, nos termos do n.º 1 do artigo 821.º do CPC, estão sujeitos à execução todos os bens do devedor susceptíveis de penhora que, nos termos da lei substantiva, respondem pela dívida exequenda, ao arrolamento encontram-se sujeitos todos os bens próprios do requerente e os bens comuns susceptíveis de partilha, independentemente do respectivo titular registral. É que, nos termos do artigo 7º do Cód Registo Predial, o registo definitivo apenas constitui presunção ilidível de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define. Presunção equivalente decorre do artigo 11º do Cod. Reg. Comercial. Não obsta, pois, ao arrolamento o registo efectuado a favor de terceiro, desde que ilidida a presunção de titularidade daí decorrente. De resto, o n.º 1 do artigo 119º do Cód. do Registo Predial prevê expressamente a possibilidade de penhora de bens inscritos a favor de pessoa diversa do requerido ou executado; ordenando-se então, para acautelar a respectiva posição, a citação do titular inscrito para declarar, no prazo de 10 dias, se o prédio ou o direito lhe pertence, seguindo-se, após, os termos previstos nos n.ºs 3 e 4 do mesmo artigo. Crê-se, pois, que tendo a requerente apresentado prova sumária (testemunhal) da titularidade daqueles bens e direito, deveria o Tribunal recorrido ouvi-la, e só após decidir sobre a admissibilidade ou rejeição do arrolamento de tais activos. Por onde se afigura assistir razão à requerente, não lhe podendo ser recusado o arrolamento sem que lhe seja dada oportunidade de produzir prova sumária da titularidade dos bens e direito em causa. Decisão. Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em conceder provimento ao agravo, em consequência do que revogam o despacho recorrido, devendo o mesmo substituir-se por outro que designe data e hora para produção da prova requerida, decidindo-se, após, quanto ao arrolamento dos bens supra referidos. Sem custas, por não serem devidas.
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