Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
839/11.1TTPRT.P4
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JERÓNIMO FREITAS
Descritores: LEGITIMIDADE PROCESSUAL
LEGITIMIDADE SUBSTANTIVA
DOCUMENTOS PARTICULARES
ARTICULADO MOTIVADOR DE DESPEDIMENTO
ILICITUDE DO DESPEDIMENTO
DEDUÇÕES NA RETRIBUIÇÃO
OFICIOSAMENTE
Nº do Documento: RP20171106839/11.1TTPRT.P4
Data do Acordão: 11/06/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO 2ª
Decisão: PARCIALMENTE PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL), LIVRO DE REGISTOS N.º263, FLS.225-248)
Área Temática: .
Sumário: I - As nulidades da sentença não incluem o “chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário”. A nulidade da sentença e o erro de julgamento são realidades diversas que não devem ser confundidas.
II - A legitimidade processual constituiu um pressuposto processual relativo às partes, que se afere, na falta de indicação da lei em contrário, face à relação material controvertida tal como configurada pelo A., e cuja falta, determina a verificação da correspondente exceção dilatória, dando lugar à absolvição do Réu da instância (artigos 30.º, 278.º n.º 1 al. d), 576.º 1 e 2, e 577.º al. e), todos do CPC). Outra, bem diferente, é a legitimidade substancial ou substantiva, que tem que ver com a efetividade da tal relação material, interessando já ao mérito da causa.
III - Dos artigos 387.º n.º 3, do CT/09 e 98.º J n.º1, do CPT, resulta que o empregador, no articulado motivador do despedimento “apenas pode invocar os factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador”. Significa isto, que caso o empregador venha alegar factos e fundamentos à margem dos que fez constar na decisão de despedimento, isto é, extravasando o núcleo delimitado por aqueles, essa alegação não pode ser atendida pelo tribunal na acção de apreciação da regularidade e licitude do despedimento.
IV - Os documentos particulares assinados pelo seu autor, se não existir a impugnação a que aludem os arts. 374º e 375º, fazem prova plena em relação às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo, porém, da arguição e prova da sua falsidade. Fica, assim, plenamente provado que o autor proferiu essas declarações.
V - Sendo certo que R. nunca impugnou o documento por si subscrito e entregue autora, nos termos dos artigos 374.º e 375.º, do CC, o mesmo faz prova plena do conteúdo que a mesma dele fez constar, na parte que lhe é desfavorável, nomeadamente, ao afirmar-se como entidade empregadora da autora, nessa qualidade assumindo de forma inequívoca estar a declarar àquela “que o posto de trabalho da funcionária em referência, foi extinto”.
VI - De acordo com o disposto no n.º1, do art.º 98 N, sem prejuízo de se proceder às deduções previstas no n.º2, do art.º 390.º, do CT, na decisão que declara a ilicitude do despedimento, o juiz deve ainda determinar “que o pagamento das retribuições devidas ao trabalhador após o decurso de 12 meses desde a apresentação do formulário referido no artigo 98.º-C até à notificação da decisão de 1.ª instância seja efectuado pela entidade competente da área da segurança social”.
VII - Visou-se através desta norma desonerar o empregador da responsabilidade pelo pagamento de retribuições intercalares que sejam devidas ao trabalhador para além do que seria razoável, entendendo-se como tal 12 meses, na consideração de que não deve recair sobre as partes a consequência da morosidade na obtenção de decisão final, quando tal não seja resultado da sua conduta.
VIII - Aplicação deste regime é imposta oficiosamente ao tribunal, bastando atentar no n.º1, do art.º 98.º N, quando diz que “o tribunal determina”.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: APELAÇÃO n.º 839/11.1TTPRT.P4
SECÇÃO SOCIAL

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO
I. RELATÓRIO
I.1 B…, deu início à presente acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, através da apresentação do requerimento em formulário próprio a que se referem os artigos 98.º C e 98.º D do Código de Processo do Trabalho, demandando C…, L.da, com o propósito de impugnar o despedimento por extinção do posto de trabalho que por esta lhe foi comunicado.
Foi designado dia para a audiência de partes a que alude o art.º 98º-F, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, a qual veio a ser realizada, mas sem que se tenha logrado alcançar o acordo entre as partes.
Notificada para o efeito, a Ré apresentou articulado motivador do despedimento, alegando, no essencial, o seguinte:
- Procedeu à extinção do posto de trabalho da A. devido a quebra financeira da empresa fruto da conjuntura económica adversa e crise do comércio tradicional na cidade do Porto.
- Não era possível manter a situação de emprego da A., o que era do seu conhecimento.
- A A. prestava serviço como empregada de balcão, mas à sociedade D…, lda, entidade proprietária do estabelecimento sito na Rua …, n.º …, Porto, sociedade que era e é detida pelos mesmos sócios que detém a sociedade C…, Lda.
- Termina, dizendo que a A. bem conhece essa situação, assim como as razões que levaram a ponderar o encerramento do estabelecimento e consequentemente à extinção do posto de trabalho.
Pugna pela improcedência da ação e consequente absolvição dos pedidos.
A trabalhadora apresentou contestação, contrapondo, em síntese:
- Prestava serviço como empregada de balcão para a Ré C…, lda, sendo esta a sua empregadora;
- Desde há 12 anos essas funções eram desempenhadas no estabelecimento sito na Rua …, …;
- Foi-lhe apresentado um acordo de revogação do contrato de trabalho que recusou.
- À data do despedimento encontrava-se por liquidar a quantia de €986,90 referente ao subsídio de férias e de natal de 2010, quantia à qual acresce a de €492,54 de proporcionais de férias, subsídios de férias e de natal do ano de 2011 e, ainda, a indemnização que não deve ser inferior a €9.429.
A empregadora veio apresentar resposta, alegando, também em síntese, que a autora prestava serviço no estabelecimento da empresa D…, Lda. desde o ano de 2000, sendo esta a sua entidade empregadora e, quanto aos valores reclamados, afirmando que o subsídio de natal relativo a 2010 foi integralmente pago.
Conclui propugnando pela sua ilegitimidade e absolvição da instância.
I.2 Por despacho de 29/07/2011, foi ordenado o desentranhamento do articulado motivador do despedimento, por falta de pagamento da taxa de justiça devida.
Foi proferido despacho saneador.
E, em audiência de julgamento, face a àquele despacho, foi declarado nulo o processado a partir de 24-11-2011.
A empregadora interpôs recurso deste despacho -proferido em 13/06/2012 - declarando nulo todo o processado a partir de 24-11-2011.
Os autos subiram a esta Relação, tendo o recurso sido objeto da decisão de fls. 129, da qual consta que a decisão em causa só pode ser impugnada no recurso que venha a ser interposto da decisão final.
Os autos baixaram à 1.ª instância.
I.3 Subsequentemente foi proferida sentença ao abrigo do disposto no artigo 98.º-J, n.º 3, do C.P.T., condenando a empregadora a pagar à trabalhadora uma indemnização em substituição da reintegração, à razão de 30 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo e fração de antiguidade e as retribuições que a trabalhadora deixou de auferir desde a data do despedimento, até ao trânsito em julgado da sentença.
Foi, ainda, determinada a notificação da trabalhadora para os efeitos do n.º 3, c), do artigo 98.º-J, do C.P.T.).
Na sequência dessa notificação, a trabalhadora veio peticionar créditos emergentes do contrato de trabalho - fls. 156.
A empregadora contestou este pedido (fls. 182).
E, veio interpor recurso da sentença.
O Recurso foi admitido e os autos subiram esta Relação.
Mais uma vez, mas agora em separado, o presente processo subiu a este Tribunal e foi objeto do despacho de fls. 299 que ordenou a sua devolução ao tribunal recorrido para oportuna apreciação de ambos os recursos.
Entretanto, o Tribunal a quo proferiu novo despacho saneador (fls. 185).
E, procedeu ao julgamento, fixando a matéria de facto, para depois proferir sentença.
A empregadora, notificada desta sentença veio interpor o recurso da mesma, o qual foi objecto de acórdão proferido em 20 de Outubro de 2014, tendo sido decidido julgar parcialmente procedente a apelação, revogando-se o despacho recorrido proferido em audiência de discussão e julgamento de 13/06/2012 e anulando-se todo o processado posterior ao mesmo (inclusive), para ser designada nova data para audiência de discussão e julgamento.
I.4 Os autos baixaram à 1.ª instância e, em cumprimento do decidido, procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento.
Foi decidida a matéria de facto.
E, subsequentemente, foi proferida sentença cujo dispositivo é o seguinte:
Pelo exposto e tudo ponderado:
- julga-se improcedente o pedido de declaração de licitude do despedimento, deduzido pela entidade empregadora C…, Lda.;
- declara-se ilícito o despedimento efectuado pela entidade empregadora C…, L.da relativamente à trabalhadora requerente B…;
- condena-se a entidade empregadora C…, L.da a pagar à trabalhadora requerente B… a quantia global de €26.291,20 (vinte e seis mil, duzentos e noventa e um euros e vinte cêntimos) a título de indemnização por despedimento ilícito, por retribuições vencidas desde a data do despedimento até à presente data e por proporcionais de férias de 2011, subsídio de férias de 2011 e de proporcionais de subsídio de Natal de 2011, já deduzida do montante que a trabalhadora requerente auferiu a título de subsídio de desemprego.”
A empregadora, notificada dessa sentença veio interpor recurso.
O recurso foi decidido por acórdão de 12-09-2016, culminado com o dispositivo seguinte:
- «Nestes termos, sem outras considerações, na procedência do recurso acorda-se:
- em declarar nula a decisão sobre a matéria de facto e restantes atos posteriores, incluindo a sentença recorrida, devendo ser proferida uma nova decisão em conformidade com o supra decidido».
I.5 Os autos baixaram à 1.ª instância. Dando cumprimento ao determinado, o senhor Juiz proferiu nova sentença, culminada com o dispositivo seguinte:
-“julga-se improcedente o pedido de declaração de licitude do despedimento, deduzido pela entidade empregadora C…, Lda.;
- declara-se ilícito o despedimento efectuado pela entidade empregadora C…, L.da relativamente à trabalhadora requerente B…;
- condena-se a entidade empregadora C…, L.da a pagar à trabalhadora requerente B… a quantia global de €26.291,20 (vinte e seis mil, duzentos e noventa e um euros e vinte cêntimos) a título de indemnização por despedimento ilícito, por retribuições vencidas desde a data do despedimento até à presente data e por proporcionais de férias de 2011, subsídio de férias de 2011 e de proporcionais de subsídio de Natal de 2011, já deduzida do montante que a trabalhadora requerente auferiu a título de subsídio de desemprego.
Custas da acção e da reconvenção pela entidade empregadora C…, Lda.
Valor da acção: €26.291,20.
*
Notifique».
I.6 Inconformada com a sentença a Ré apresentou recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito adequados. As alegações foram finalizadas com as conclusões seguintes:
1) A sentença contém um erro de escrita no segundo parágrafo, linha dois, da fundamentação da matéria de facto (pág. 7), quando refere “...1987...”, onde deve ler-se “...1997...”, e na seguinte linha quatro, pois onde se lê “... … ...”, deve ler-se “... … ...”;
2) A correcção do último determina novo lapso (linhas 5 e 6), onde se diz que a D…, Lda. adquiriu o “...estabelecimento em causa...” do n.º … em 1998. A redação que deve constar é “esclareceu que os estabelecimentos dos n.ºs … e … foram adquiridos em 1998, com a aquisição das participações sociais da D…, Lda. pelos novos sócios”;
3) Tal foi confirmado pelos depoimentos da Autora e de E…, e da testemunha F… (identificados em 3. das alegações), que coincidiram que a loja do nº … era propriedade da C…, Lda., encerrou e foi entregue ao senhorio, tendo a trabalhadora depois ido trabalhar para o estabelecimento do n.º … da D…, Lda., cujas participações sociais foram adquiridas em 1998 aos anteriores sócios (de nome G…) e não têm qualquer ligação com a C…, Lda., e cujas lojas (… e …) abriram em Dezembro de 1998, por altura do Natal, tendo a D.ª H… dito ter entrado ao mesmo tempo (para o …) e para lançar a loja (gravações identificadas em 7.);
4) Como tal, no ponto 5 da matéria de facto, que refere “... a partir de data não concretamente apurada do ano de 2000, a trabalhadora requerente passou a prestar o seu trabalho em outro estabelecimento comercial, sito igualmente na Rua …, …, pertencente à referida sociedade D…, Lda.”, deve ler-se “... data não concretamente apurada anterior ao ano de 2000 ...”, ao encontro do ponto 2.
5) A requerida correcção destes erros foi totalmente deferida pelo Despacho de 17/07/2015, já constando da fundamentação da matéria de facto provada e da sentença de 31/08/2015 corrigidos, o mesmo aqui se requerendo, nos termos do 614º do C.P.C.
6) A sentença recorrida está ferida de nulidade por falta de fundamentação e condenação superior ao pedido (art. 615º, n.º 1, al. b), c), e e), do C.P.C).
7) O total da indemnização não deduziu às retribuições que a Autora deixou de auferir do despedimento até trânsito em julgado os momentos em que a instância esteve parada por motivo não imputável às partes, a suspensão da instância entre as sessões de julgamento de 17/03/2015 e 04/05/2015 e todos os montantes de subsídio de desemprego recebidos (violando os arts. 98º-N e O do C.P.T. e 390º, n.º 2, do Código do Trabalho), tendo-se baseado quanto a estes no alegado no Incidente de liquidação da Autora (de 04/03/2013), o que não poderia suceder pois o Acórdão da Relação de 20/10/2014 declarou nulo todo o processado posterior ao despacho de 13/06/2012.
8) Não tendo sido produzida outra prova que permita concluir que o valor a deduzir seriam apenas 18 meses x €419,10, num total de €7.543,80 (ponto 16. da matéria de facto), a decisão enferma de falta de fundamentação, bem como a sentença nele baseada.
9) A matéria de facto provada deu como assente que a trabalhadora prestou serviço de 2000 a 2011, pelo que, segundo o regime da protecção no desemprego então vigente (DL 220/2006, de 3 de Novembro, arts. 37º e 38º), teve direito a 900 dias de subsídio de desemprego e a subsídio social de desemprego subsequente por metade do tempo atribuído do primeiro (atenta a idade à data do término deste), logo, mais 450 dias, num total de 1350 dias de prestações (45 meses).
10) Destarte, o ponto 16. deveria dizer que “A trabalhadora requerente recebeu, no mínimo, o subsídio de desemprego e subsídio social de desemprego subsequente no valor de €18.859,50 (€419,10 x 45 meses)”, devendo a Relação proceder conforme o art. 662º, n.ºs 2, al. c) e 3 do C.P.C. e anular a decisão proferida na 1.ª instância, por não constarem do processo quaisquer elementos que permitem a alteração da decisão sobre a matéria de facto, e a decisão sobre o único ponto desta (o 16.) que fala sobre o subsídio ser, além da já aludida falta de fundamentação, manifestamente deficiente e obscura, tratando-se tal de elemento essencial para a sentença final.
11) Assim não entendendo, deverá a Relação considerar indispensável a ampliação da matéria de facto, visto tratar-se de elemento essencial para prolação da decisão, ou, se tal não entender, só poderá decidir que a conclusão retirada no ponto 16. (e o decidido que nela se baseou) é nula, por ausência total de fundamentação (art. 615º, n.º 1, al. b), CPC), tendo determinado condenação em quantia superior à pedida (art. 615º, n.º 1, al. e).
12) Quanto à resolução da excepção dilatória de ilegitimidade passiva, o ponto B. da sentença refere que a entidade empregadora invocou que “Jamais existiu vínculo entre si (C…) e a trabalhadora”, o que nunca foi dito, antes que esta nunca trabalhou para a C…, Lda. na loja de C1…, na esteira dos pontos da matéria de facto 1., 4. e 5., que referem que a trabalhadora desempenhava funções ao serviço da C…, Lda., “desde data não concretamente apurada de 1997, mas não posterior a Março desse ano”, que no início esse trabalho foi prestado “em um estabelecimento comercial da C…, L.da, sito na Rua …, …” e que, em data não apurada anterior a 2000, passou a prestá-lo noutro, “igualmente na Rua …, …, pertencente à referida sociedade D…, L.da”.
13) No ponto 5. existe o erro de escrita a corrigir (contextualizado em 5. a 7.), que foi objecto de reclamação (em 06/07/2015) e esta deferida no despacho que a decidiu (de 17/07/2015), assim constando da sentença de 31/08/2015 como provado que trabalhava de facto na D…, Lda.. “...a partir de data não apurada, anterior ao ano de 2000.”, o mesmo devendo suceder na sentença ora recorrida.
14) Os factos permitem estabelecer data mais aproximada em fim de 1998, conforme referiram os sócios E… e F… (identificação da gravação em 29. do corpo alegatório) e a D.ª H…, que trabalhava na loja da D…, Lda. ao lado da da Autora (n.º …), e disse que ali o fez 13 a 14 anos, i.e., de 2011 para trás, desde 1998 (gravação em 29.).
15) A trabalhadora, após o fecho da loja do …, aceitou ir trabalhar para a do …, tentando justificar tal com o argumento de não saber a quem pertencia, quando a sua colega do … o sabia desde que ali trabalhava, impondo-se, na ausência de contrato escrito, determinar os titulares desta nova relação laboral, que durou de fim de 1998 a 2011, tendo o julgador entendido não ser o exposto suficiente para considerar a trabalhadora como o sendo da D…, Lda., em contravenção com a jurisprudência de que é a realidade factual que determina a qualificação contratual e não o inverso, quando se trata de subordinação jurídica na execução do contrato (vide acórdãos identificados em 32.).
16) Impunha-se, então, fundamentar a que título a Autora trabalhou no … a maioria do tempo. Sendo uma questão a decidir e apenas sido dito de passagem no ponto F. (segundo parágrafo), sem fundamentar, que “Não pode assim proceder a tese da C…, L.da. em como não era a entidade empregadora da trabalhadora requerente, nem a arguida pluralidade de entidades empregadoras”, tal configura uma não decisão (608º, n.º 2 do C.P.C.) de questão essencial para a decisão final sobre os sujeitos do vínculo jurídico, pelo que tendo o juiz a quo deixado de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar (art. 615º, nº 1, al. d), do CPC), o que deve ser declarado.
17) Posto isto, entendendo tratar-se de cedência ocasional, esta é temporária e a Autora prestou serviço 14 anos no nº …; se outra, ou no mínimo pluralidade de empregadores, a vinculação teria de decidir-se por métodos indiciários, convocando o critério da subordinação jurídica, visto o regime ser o anterior à vigência do Código Trabalho (neste sentido, Acórdão STJ citado em 35.), e por tais critérios o local de trabalho era a loja do …, da D…, Lda., conforme referido no ponto 5. da matéria de facto provada e C. da sentença, pelos sócios e pela própria colega H… (vide 26., 27., 29., 30.; 68, 71., 73. e 75., 92., 93., de entre os demais citados em 38.); as ordens e instruções sobre o serviço, gozo de férias e o horário cumprido eram os do estabelecimento da D…, Lda., n.º … (conforme melhor explanado de 43 a 47 das Conclusões); os instrumentos de trabalho eram os existentes naquele estabelecimento, como os documentos de vendas a dinheiro com o timbre da D…, Lda., conforme corroborado pela própria e pelas citadas testemunhas (85., 86., 88., 93., e 154. a 156.).
18) Preenchidos os critérios por aquelas circunstâncias de facto, pode concluir-se que a trabalhadora, desde 1998, cumpria tudo em função da loja da D…, Lda., pelo que atenta a jurisprudência do S.T.J. (citada em 35.), teria o julgador que se decantar por esta sociedade como entidade empregadora, pelo que limitando-se a dizer em D. da sentença, que alguma da prova aponta no sentido da vinculação a uma ou outra sociedade e que outra é ambivalente; em E. que “Efectuando uma ponderação global e conjugada dos factos”, é lícito concluir que a trabalhadora laborava para a empregadora C…, Lda; e fazendo em E. e F. referências genéricas a documentos, numa lógica de que é a forma que determina a situação de facto, ao arrepio da jurisprudência superior (vide 32.), o tribunal recorrido não analisa criticamente os factos que fundamentariam de facto a sentença, não bastando indicar e numerá-los e dizer que são os que a fundamentam, impõe-se interpretá-los e justificar o peso decisivo para aquela conclusão e aplicação de certa norma, sob pena de coartar à recorrente a possibilidade de impugnar as razões específicas da decisão dum ponto essencial do processo, que terá presidido à tal “ponderação global e conjugada”.
19) Da mesma forma, surgem, na matéria de facto, sete factos não provados, limitando-se, no fim, a referir que “Relativamente à matéria de facto não provada, tal resultou de não ter sido feita prova sobre a respectiva factualidade.”, assim não cumprindo, de todo, com as exigências de fundamentação do art. 607º, n.º 4 do C.P.C. (vide Ac. Relação do Porto, citado em 43.), o que determina a nulidade.
20) A livre apreciação da prova e a formação da prudente convicção do julgador não são um espaço de discricionariedade não vinculada, pelo que entende-se enfermar a sentença de falta de fundamentação, de facto e de direito (art. 615º, n.º 2, al. b) do CPC).
21) A sentença recorrida suprimiu (em relação à de 31/08/2015) o terceiro parágrafo (pág. 1), onde se referia que a entidade patronal alegou que a trabalhadora prestava trabalho para a sociedade D…, Lda. e não para a C…, Lda., o que foi alegado no articulado motivador da entidade empregadora (de 06/07/2011), ponto i), e nas alegações finais, assim como alterou o primeiro parágrafo (pág. 2), o qual referia que a trabalhadora, na sua contestação, sustentara que a empregadora para quem sempre trabalhou foi a C…, Lda., constando agora algo inexistente na contestação da Autora, que esta alegou que aquela a “despediu, sem mais, sem precedência de procedimento disciplinar e sem justa causa”, o que se estranha, dada não ter sustento nos articulados referidos, dando-lhe o tribunal ad quem a relevância que entender.
22) O ponto A. da matéria de facto não provada diz que “Desde a sua admissão ao serviço, a trabalhadora requerente estava colocada no estabelecimento referido na Rua …, …”, cujo alcance não se compreende, pois foi dito que trabalhou na loja da C…, na R. …, … e depois passou para a da D…, do … (pontos 4. e 5. da matéria de facto provada), além do que nesta, a própria disse que fazia encomendas para a loja “onde eu estava, na loja C2…” (gravação identificada em 52.).
23) Assim, deve ser suprimido este ponto e aditado um aos factos provados que refira que “Desde que a loja do … fechou, a trabalhadora requerente prestou serviço no estabelecimento referido na Rua …, …”, ou a sua redação, já corrigida, ou alterada (conforme requerido em 27. e de 69. a 72.), ser completada para “Posteriormente, desde que a loja do … fechou e a partir de data não apurada, anterior ao ano de 2000, a trabalhadora requerente passou a prestar o seu trabalho em outro estabelecimento comercial, sito igualmente na Rua …, …, pertencente à referida sociedade comercial, D…, L.da”.
24) O ponto B. refere que “Era do conhecimento da trabalhadora que o seu posto de trabalho era na Rua …, …, e que a sua manutenção era insustentável”, mas a A. tinha, sim, conhecimento, porque não só era aí que prestava trabalho desde 1998 e as demonstrações financeiras juntas confirmam o exíguo volume de negócio; como passava recibos em papel timbrado da D… e cumpria os horários deste estabelecimento, gozava férias em referência ao seu funcionamento, fazia encomendas atentas as necessidades do mesmo, conforme depoimento da própria, das colegas H… e I…, e de F… (identificados em 55.).
25) Assim, este ponto deve ser dado como provado com a redação “Era do conhecimento da trabalhadora que o posto da Rua …, … onde prestava trabalho era da empresa D…, Lda., e que a sua manutenção era insustentável.”
26) O ponto C. diz que “Na ocasião referida no ponto 20. dos factos provados, referiu a trabalhadora requerente ao gerente do mesmo que “- Se não dá para si, como é que dá para mim?” ”, mas tal sucedeu aquando da conversa com o gerente na presença da sócia F…, bastando, para o comprovar, consultar o depoimento de E…, que referiu que a trabalhadora lhe respondeu “Se não dá para si, vai dar para mim?!”, o mesmo sendo confirmado pela testemunha F… (ambos depoimentos identificados em 58.), pelo que este ponto deve ser aditado à matéria de facto provada com a mesma redação, i.e., “Na ocasião referida no ponto 20. dos factos provados, referiu a trabalhadora requerente ao gerente do mesmo que “- Se não dá para si, como é que dá para mim?”.
27) O ponto D. da matéria de facto não provada refere “A partir do momento em que foi encerrado o estabelecimento comercial sito na Rua …, …, a trabalhadora requerente não se apresentou ao serviço na firma C…, Lda.”, mas tal ficou provado, bastando consultar o que a própria disse, “não me apresentei ao serviço...” na loja da C... de C1…, e o depoimento de E… (ambos identificados em 61.), para dever ser dado como provado, com igual redação: “A partir do momento em que foi encerrado o estabelecimento comercial sito na Rua …, …, a trabalhadora requerente não se apresentou ao serviço na firma C…, Lda.”.
28) O ponto F. da matéria de facto não provada refere que “A trabalhadora requerente, quando recusou a proposta da entidade empregadora referida no ponto 17. dos factos provados, disse-lhe que, com o encerramento do estabelecimento onde laborava, iria apresentar-se nas instalações da aqui Ré.”, mas a verdade é que o disse, sim, que “ia para cima”, bastando atentar nas declarações da própria, de F… (identificadas em 64.), ambas nesse sentido, pelo que deve o ponto F. ser dado como provado, com igual redação, “A trabalhadora requerente, quando recusou a proposta da entidade empregadora referida no ponto 17. dos factos provados, disse-lhe que, com o encerramento do estabelecimento onde laborava, iria apresentar-se nas instalações da aqui Ré.”.
29) A sentença refere no ponto B. que a entidade empregadora invocou que “Jamais existiu vínculo entre si (C…) e a trabalhadora”, o que nunca foi dito, apenas que nunca trabalhou para a C…, Lda. na loja de C1… (tal é suportado em 1., 4. e 5. da matéria de facto).
30) Refere o ponto 1. que a trabalhadora esteve ao serviço da C…, Lda. desde data não apurada de 1997, e que (ponto 4.) inicialmente prestou trabalho num estabelecimento comercial daquela sito na Rua …, …, e que depois, a partir de data não apurada anterior a 2000, passou a prestar o seu trabalho em outro estabelecimento, sito na Rua …, …, pertencente à sociedade D…, Lda., indo também neste sentido o ponto C. da sentença e o dito pelo Sr. E… e a sócia F… (identificação das gravações em 68.).
31) O ponto 5. tem o erro de escrita a corrigir (contextualizado de 5. a 7.), que diz que a trabalhadora passou a trabalhar no estabelecimento da Rua …, …, “...a partir de data não apurada do ano de 2000...”, o qual foi objecto de reclamação (em 06/07/2015), e consta da sentença de 31/08/2015 (pág. 3) já corrigido, tendo sido dado como provado que trabalhava de facto na D…, Lda.. “...a partir de data não apurada, anterior ao ano de 2000.”, o mesmo devendo aqui suceder.
32) Caso se entenda não proceder à correcção, refira-se que os factos demonstram inequivocamente que a Autora trabalhava na D…, Lda. antes de 2000, permitindo fixar data mais aproximada em fins de 1998, como relatado pelos sócios, e pela funcionária H…, que trabalhava na loja ao lado, também pertença da H…, Lda., e disse ali tê-lo feito cerca de 13, 14 anos, logo, de 2011 para trás, desde 1998 (identificação das gravações em 71.).
33) Pelo que, no ponto 2. da matéria de facto provada, onde se lê “Os sócios da C…, L.da e da sociedade D…, L.da passaram a ser os mesmos, a partir de data não apurada, anterior ao ano de 2000.”, deve ler-se “Os sócios da C…, L.da e da sociedade D…, L.da passaram a ser os mesmos, a partir de fim de 1998.”; e no ponto 5., caso não seja recebida a correcção, deve ler-se “...a partir de data não apurada, anterior ao ano de 2000...”
34) A Autora, após fechar a loja do …, aceitou ir trabalhar para a loja do …, tentando, à revelia do que é razoavelmente crível, justificá-lo com o facto de não saber a quem pertencia, quando a colega do lado o sabia desde que foi trabalhar para o …, na mesma altura (identificação das gravações em 74. e 75.).
35) Aqui chegados, não existindo contrato de trabalho escrito, importa determinar os titulares desta nova relação jus-laboral, que se manteve de fim de 1998 até 2011.
36) Na página 10 da douta sentença (último parágrafo) e no ponto 6. dos factos provados, diz-se que o Sr. E… “dirigiu à trabalhadora requerente a ordem para esta passar a trabalhar no estabelecimento comercial pertencente à D…, Lda.”, mas não foi uma ordem, disse-lhe que a loja do … ia fechar e que tinha adquirido duas lojas em frente que pertenciam ao Sr. G… e gostava que ela passasse para lá para as lançar (identificação da gravação em 78.), e só como gerente da D…, Lda. o poderia ter feito, porque só como tal teria legitimidade, face ao destino, tendo a Autora confirmado isto (gravação em 80.), e que, inclusive, iam fazer uma liquidação total no …, o mesmo confirmando a sócia F… (gravação em 79.).
37) Se a D.ª H… entrou ao mesmo tempo e sabia que a D…, Lda. explorava as lojas, se a D.ª I… só lá ia ocasionalmente substituir uma ou outra e também o sabia (identificação das gravações em 81.), não parece razoável admitir que a Autora, no mínimo, não pudesse diligentemente conhecê-lo, quando até sabia que as duas ficaram por metade do preço do aluguer da outra (citação e gravação em 82.).
38) Mais, os documentos de vendas a dinheiro usados no … e … tinham o timbre da D…, Lda., como corroborado por aquelas duas testemunhas (identificação da gravação em 85., 155. e 156.) e originais juntos aos autos, o que a Autora também sabia porque os assinava, pois disse que a sua loja era de lingerie e a do … pronto-a-vestir (gravações em 155.), e nas Vendas a dinheiro (n.ºs …., de 4/1/2000 e ….., de 31/1/2000) aparecem itens de lingerie (“Sutiã” e “Collants”), pelo que o ponto 7. Dos factos provados não tem sustento probatório e é contraditório com o que foi produzido, devendo ser alterado e nele ler-se “A trabalhadora requerente, quando prestou trabalho nesse estabelecimento comercial, fazia encomendas e emitia documentos de vendas em documentos timbrados da D…, L.da.”..
39) A D.ª H… confirmou que não trabalhava ao Sábado à tarde, em oposição ao que sucedia na C…, Lda., e que a D.ª I… a vinha substituir e à Autora ao … e … (D…, Lda.), por motivo de férias ou outro, mas que o inverso não sucedia, o mesmo sendo dito por esta (identificação das gravações em 91. e 92.), e que, quando para lá ia, os documentos das vendas tinham o timbre desta (gravações em 93.), e que o horário era diferente ao Sábado.
40) Só de 12/1998 em diante, a H… (gravação identificada em 71.), e de 04/2011, a I… (gravação em 92.), tinham conhecimento directo de quaisquer factos, confirmando apenas desde quando a Autora trabalhava na D…, Lda., i.e., 1998, o que permite de forma lógica firmar que trabalhou no n.º … da C…, Lda. desde 1997 (quando esta surgiu) e o fez até passar para a D…, Lda. do estabelecimento do n.º …, ou seja, até fim de 1998, quando a C… fechou e esta abriu, não tendo ido trabalhar para outra loja da C…, mas sim aceite o convite do Sr. E… para ir lançar e trabalhar (gravações em 96. e 75.) no estabelecimento da Rua …, …, propriedade da D…, Lda., pelo que, deve ser alterada a redação do ponto 6., no qual deverá ler-se “A trabalhadora requerente aceitou o convite do Sr. E… para passar a prestar trabalho no referido estabelecimento comercial”.
41) A Autora limitou-se a exaustivamente repetir que era funcionária da D…, Lda., constituindo tais afirmações, repetidas por quem alegadamente as ouviu (as D.ªs H… e I…), conhecimento indirecto, sem razão de ciência, devendo o julgador valorá-lo segundo o prescrito nos arts. 516º, n.º 1 (antigo 638º, n.º 1) do C.P.C. e 396º do Código Civil, (ex vi art. 1º, n.º 2 do C.P.T.), i.e., não pode ser tido como prova (suficiente) sobre os factos.
42) Além do mais, vigorando na produção de prova o princípio da imediação e não sendo a livre apreciação (art. 396º C.C.) e a formação da convicção do julgador espaços discricionários sem vinculação, reduzidos a inferências genéricas, antes exigindo um suporte claro, suficiente e coerente na prova produzida, a jurisprudência tem entendido não se poder suprir por via da presunção judicial a carência de prova dum facto sujeito a julgamento, pois tal violaria o princípio do dispositivo (neste sentido, o Ac. S.T.J., de 29.11.2005, no proc. 05B3162, in dgsi.pt, que vem de se citar).
43) Do que existe conhecimento directo e foi feita prova, é que todos os depoimentos disseram conhecer a Autora do estabelecimento da Rua … n.º …, (da D…, Lda.), e aí a colocaram a trabalhar.
44) No ponto 3 da contestação (de 31/01/2012), a Autora diz que “nem sempre desempenhou as suas funções no estabelecimento da Rua …, …”, assim admitindo que era aí que prestava o seu trabalho, para completar no ponto 5, “estando neste estabelecimento há apenas 12 anos” (um apenas enorme). No ponto 17 diz que afirmou à Ré que, “com o encerramento do estabelecimento onde laborava, iria apresentar-se nas instalações da aqui Ré”, sendo que o que encerrou foi o da D…, Lda., que era, nas suas palavras, aquele “onde laborava”. E nunca se apresentou, como a própria, o Sr. E… e a D.ª F… confirmaram (identificação das gravações em 106.).
45) A Autora cumpria os horários da loja da Rua …, a qual estava fechada ao Sábado à tarde, ao invés da da C…, Lda, o que foi referido pela própria, a D.ª H… que ali trabalhava, e a D.ª I… (gravações em 107., 91., 92. e 93.).
46) As necessidades de stock e encomendas de material, ordens e instruções dadas, bem como à D.ª H…, versavam a gestão corrente da loja da Rua …, onde trabalhava, conforme a própria referiu (gravações em 108. e 109.).
47) As férias eram gozadas de acordo com o período de laboração da loja da Rua …. A própria, a H… e a I… referiram que esta ia amiúde cobrir as férias das pessoas que ali trabalhavam, mas o inverso nunca sucedeu (gravações em 110., 91. e 92.).
48) Visto que cumpria à Autora o onus probandi de que trabalhava na C…, Lda., resultando claro da prova produzida que prestava o seu trabalho na e para D…, Lda. (Rua …, n.º …), e que para estabelecer os contornos da relação laboral existente, não havendo contrato escrito, recorre-se, como refere o Acórdão S.T.J. no processo 170/09.2TTOAZ.P1.S1, 4ª Secção, de 28/01/2015 (citação em 117. e 118.), ao critério da subordinação jurídica, a qual, conforme se contextualizou, era-o inequivocamente à D…, Lda., resulta líquido que a Autora não logrou provar o que se propunha.
49) Ainda que se considere, como na sentença, que, no máximo, estaríamos perante uma situação de dúvida, afastado o argumento dos documentos pelos já aduzidos motivos e jurisprudência citada (de 129. a 148.), atenta a fixada em em 113., e segundo o disposto no art. 414º (antigo 516º) do C.P.C., o qual diz que “A dúvida sobre a realidade de um facto e sobre a repartição do ónus da prova resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita.”, sempre teriam que se dar como não provados tais factos.
50) Face ao exposto, se não se considerar que a Autora era funcionária só da D…, Lda., ela nunca poderá ser considerada apenas funcionária da C…, Lda, antes que existia uma situação de pluralidade de empregadores, pois é decisivo, neste âmbito, o critério da subordinação jurídica (vide Ac. S.T.J. no processo 170/09.2TTOAZ.P1.S1, 4ª Secção, em 35. e 117.).
51) Não existindo vínculo de trabalho escrito, quer se entenda que ficou provado que a Autora prestava, de facto, o seu trabalho no estabelecimento propriedade da D…, Lda., apenas e só por essa via, pois recorrendo à subordinação jurídica para contextualizar a relação laboral, a concretização de todos os elementos já descritos apontam nesse sentido; ou que existia um caso de pluralidade de empregadores, em que, conforme o referido aresto do S.T.J., se deve atender, no período anterior à entrada em vigor do Código do Trabalho (factos prévios a 2003), à subordinação jurídica, os critérios de determinação acabam por ser os mesmos, e não por acaso.
52) Face ao já descrito e prova produzida quanto à concretização daqueles critérios (em 16, 17, e 43 a 47 Conclusões), i.e., que os deveres e direitos, maxime, a subordinação, era-o para com a D…, Lda., fica esclarecido que a entidade empregadora à luz da vigência da L.C.T. (DL 49408, de 24 de Novembro de 1969), era a sociedade D…, Lda., a qual deveria ter sido a demandada e, como tal, a Ré jamais despediu a Autora, pela circunstância de não ser a sua entidade patronal.
53) Mesmo que se entendesse que o hiato entre Fevereiro de 1997 e fim de 1998, em que a Autora exerceu funções na loja da Rua …, n.º … (da C…, Lda.), poderia consubstanciar uma situação de facto que permitisse invocar a existência de uma relação laboral com a Ré, a ida para a loja do n.º …, da D…, Lda., veio alterá-lo, constituindo uma clara declaração de revogação de uma eventual relação prévia com a Ré (vide Acórdãos S.T.J., processos 163/09.0TTMTS.P1.S1, citado em 124., e 08S3254, citado em 128.).
54) Na situação sub judice não existia nem veio a existir, aquando da passagem para a D…, Lda., contrato escrito, tendo-se o estabelecimento de uma nova relação laboral com esta efectivado com recurso ao método indiciário (vigência L.C.T.), corporizado no preenchimento dos elementos constitutivos da existência do contrato de trabalho já versados (aqui, de 43 a 47), os quais apontam todos no sentido do vínculo com a D…, Lda. e evidenciam a subordinação jurídica para com esta.
55) A sentença proferida relevou a qualificação contratual sobre a realidade factual, ao arrepio da jurisprudência citada (em 146.), omitindo o conhecimento da vontade das partes, nuclear num conflito em que discordam da vinculação jurídica existente, e desconsiderando os efeitos da autonomia da vontade e liberdade contratual, enquanto determinantes da actuação daquelas (neste sentido, Acórdão S.T.J., processo 163/09.0TTMTS.P1.S1, em 124. e 130.), assim violando os arts. 342°, 405°, 406° e 1152º do C.C., bem como o art. 5º do C.P.C. e ainda o art. 1º do DL 49408, de 24 de Novembro de 1969 (LCT, na versão em vigor), concretizado pelo critério da subordinação.
56) Não sendo a D…, Lda. a demandada, houve não só um erro notório na apreciação da prova, pois esta é manifestamente insuficiente, como nunca poderia fundamentar a decisão no sentido em que o foi (art. 640º CPC), pelo que deve ser julgada procedente a excepção dilatória de ilegitimidade passiva arguida pela Ré e ser esta absolvida da instância, nos termos dos arts. 278º, n.º 1, al. d) (antigo 288º, n.º 1, al. d), 576º, n.º 2 (antigo 493º, n.º 2) e 577º, al. e) (antigo 494º, al. e) do C.P.C.
57) Importa referir que, face aos pontos D. e E. da sentença, não se compreende o decidido: o julgador não faz, de novo, uma análise crítica das provas que o levaram àquela conclusão, nem fundamenta as respostas negativas, conforme passou a ser exigido com a reforma do Processo Civil de 1995/96, limitando-se a referir genericamente que “Efectuando uma ponderação global e conjugada dos factos que acima se descrevem...”, e, quanto aos factos não provados, que “tal resultou de não ter sido feita prova quanto à respectiva factualidade”, retirando à recorrente a possibilidade de impugnar as razões específicas que determinaram a decisão sobre um essencial ponto do processo, em contravenção com o Acórdão de 12/09/2016 (vide 43.).
58) Quanto aos recibos emitidos pela C…, Lda. aludidos em E. da sentença, foi explicado que a Autora começou a trabalhar na loja do C… da Rua … (da C…, Lda.), em 1997 (ponto 1. da matéria de facto provada) e, quando esta fechou, passou para a do … na mesma rua, pertença da D…, Lda. (ponto 5. da matéria de facto), tendo aqueles continuado a ser emitidos pela C…, Lda. por inércia desta e mera questão burocrática, não porque continuasse a laborar para a primeira, como já demonstrado, não podendo aquela ignorar estar a trabalhar para uma loja pertença de outra sociedade, não só pela já explicada situação das vendas a dinheiro em papel timbrado, como pelo episódio do cheque no banco, ocorrido logo no início de ter ido para o …, portanto 1998 (identificado em 74. e 143., com referências de gravação).
59) Os recibos aludidos na sentença, não poderiam, apenas como tal, ser decisivos na qualificação jurídica da situação uma vez estabelecido o vínculo da subordinação jurídica a outra entidade, como já demonstrado, pois é a realidade factual que determina a qualificação contratual e não o inverso, pelo que atento este critério legal acolhido nos tribunais superiores (vide 146.), e que não existia contrato escrito, o argumento daqueles serem emitidos pela C…, Lda. e que foi esta que deu conhecimento à trabalhadora da extinção do posto de trabalho e entregou o mod. …. ter sido o que fez pender a decisão para ser funcionária da C…, viola a lei e subverte aquele critério, além do que foi a extinção do posto de trabalho relativa ao estabelecimento do n.º … (D…, Lda) que foi comunicada e este que deixou de laborar, precisamente em Abril de 2011, ao invés da C…, Lda., que não fechou.
60) Não sendo a discricionariedade da apreciação da prova ausente de vinculação, trata-se também aqui de prova que, conforme os critérios legais explanados nos arestos citados em 146., não poderia ter prevalecido como o foi, inquinando decisivamente a decisão, pelo que estaríamos, então, perante uma situação de dúvida, como o próprio julgador refere no ponto D., e que de acordo com o art. 414º do C.P.C., dever-se-ia ter resolvido contra a Autora, e ter sido a D…, Lda. declarada a empregadora da trabalhadora, não a C…, Lda., assim violando a norma do artigo citado.
61) O tribunal a quo refere em E. que “O ter passado a trabalhar no estabelecimento da D…, fazer encomendas e emitir notas de venda em papel timbrado daquela não é suficiente para se considerar trabalhadora daquela”, mas não só foi confirmado mais do que isto (vejam-se os factos já versados em 16, 17, e 43 a 47 das Conclusões), como não se cuida de suficiência, mas de factos confirmados pela própria, que disse que, quando saiu da loja do … da Rua …, foi trabalhar para uma outra do lado contrário, pertença da D…, Lda., e pelas D.ªs H… e a I…, dizendo a Autora que só teve conhecimento onde estava muito tempo depois, alicerçando-se em os documentos do dia-a-dia da loja não serem em papel timbrado da sociedade, e no episódio do banco, pontos já aflorados e desmontados de 153 a 161).
62) Neste contexto e convocando o referido em 38. (das Conclusões) e o episódio dos talões descrito de 87. a 89., não se compreende como o tribunal deu como provado, no ponto 7. da matéria de facto, que a Autora “emitia documentos vendas indistintamente em documentos timbrados da D…, Lda. ou em documentos sem qualquer indicação”, quando nada foi produzido em contrário e os documentos juntos e testemunhos prestados falam por si, i.e., que os documentos tinham timbre daquela.
63) O comportamento da trabalhadora até ao fim foi de funcionária da D…, Lda., não se tendo apresentado ao serviço na C…, Lda. e aceitando a saída subsequente ao encerramento da loja daquela (conforme circunstanciado em 106., com referência às gravações), bem sabendo que assim era, pois foi a extinção do posto de trabalho da loja do … da D…, Lda. que despoletou toda esta situação, pois que era para esta que trabalhava.
64) Atento o exposto, deve ser dado como demonstrado que a Autora foi admitida na C…, Lda. em 03/1997, aí tendo trabalhado apenas até 11/1998 (quando fechou), data em que o passou a fazer para D…, Lda., na qual se manteve até 04/2011, ficando patente que a Autora trabalhou a maioria do tempo em questão no estabelecimento da D…, Lda. e para esta (12/1998 a 2011), de quem era, de facto, funcionária, o que deve ser tido em consideração à luz do imperativo da subordinação jurídica e, como tal, dado como provado.
65) Destarte, a sentença de 04/11/2016 está inquinada por nulidades e erros de julgamento, maxime fundamentação manifestamente insuficiente para estabelecer a titularidade da relação jus-laboral com a C…, Lda., bem como erros de apreciação da prova e da matéria de facto que determinaram conclusões inconsubstanciadas e errada aplicação da lei, devendo o tribunal ad quem revogá-la e proferir decisão em que se declare a excepção dilatória de ilegitimidade passiva, oportunamente arguida pela ora recorrente.
Conclui pedindo a procedência do recurso e, e assim:
- sejam rectificados os erros de escrita identificados em I;
- sejam declaradas as nulidades invocadas em II e a sentença declarada nula, com todas as demais e legais consequências;
- sejam alteradas as redacções da matéria de facto, conforme pugnado (pontos 2., 5., 6., 7., 16. e A., B., C., D., F.);
- seja revogada a sentença recorrida, substituindo-se esta por decisão que declare a excepção dilatória de ilegitimidade passiva da Ré e respectiva absolvição da instância, com todas as legais e demais consequências;
- sem prescindir, seja corrigido o valor total da indemnização, pois que não teve em consideração, na contagem das retribuições que a Autora deixou de auferir, os momentos em que a instância esteve parada por motivo não imputável às partes; bem como não deduziu a totalidade dos valores de subsídio de desemprego que a Autora auferiu (900 dias, de acordo com as regras então em vigor), mas apenas 18 meses, com base no por esta alegado no requerimento do incidente de liquidação de 04/03/2013, o qual nunca poderia ser atendido porque havia sido declarado nulo todo o processado posterior ao despacho de 13/06/2012, pelo Acórdão da Relação de 20/10/2014.
I.7 A Recorrida autora não apresentou contra alegações.
I.8 O Ministério Público emitiu parecer nos termos do art.º 87.º3, do CPT, pronunciando-se no sentido da improcedência do recurso, na consideração, no essencial, do seguinte:
- Os erros de escrita foram corrigidos pelo Tribunal a quo e a apelante não veio invocar qualquer outro erro;
- A sentença não enferma das alegadas nulidades, para além do mais, pelas razões já referidas no anterior acórdão de 12-09-2016;
- A impugnação da matéria de facto deve improceder: sobre o facto não provado A, não há indicação dos meios de prova; quanto ao facto não provado B, o que se pretende ver provado é inadmissível por conclusivo; o facto não provado C, é irrelevante para a discussão da causa e o que se pretende provado é, também, conclusivo; e, quanto aos factos não provados D e F, face à globalidade da prova produzida, não há fundamento para a pretendida alteração.
I.8.1 A recorrente respondeu àquele parecer, reiterando a posição assumida no recurso.
I.9 Cumpridos os vistos legais determinou-se que o processo fosse inscrito para ser submetido a julgamento em conferência.
I.10 Delimitação do objecto do recurso
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso [artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e artigos 639.º, 635.º n.º 4 e 608.º n.º2, do CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho] as questões suscitadas pela recorrente para apreciação consistem em saber o seguinte:
i) Se a sentença recorrida contém um erro de escrita;
ii) Se a sentença recorrida está ferida de nulidade por falta de fundamentação e condenação superior ao pedido (art. 615º, n.º 1, al. b), c), e e), do C.P.C);
iii) Se o tribunal a quo errou a decisão sobre a matéria de facto;
iv) Se deve ser declarada a excepção dilatória de ilegitimidade passiva da Ré, com a consequente absolvição da instância;
v) Se o Tribunal a quo errou na aplicação do direito aos factos, ao concluir que a Ré é a entidade empregadora da autora;
II.1. MOTIVAÇÃO DE FACTO
O Tribunal a quo fixou o elenco de factos provados adiante transcritos:
1. A trabalhadora requerente desempenhava funções de empregada de balcão ao serviço da sociedade comercial C…, L.da desde data não concretamente apurada de 1997, mas não posterior a Março desse ano, sob as ordens e vigilância daquela.
2. Os sócios da C…, L.da e da sociedade comercial D…, L.da passaram a ser os mesmos, a partir de data não apurada, anterior ao ano de 2000.
3. Um desses sócios é o Sr. E….
4. Inicialmente, a trabalhadora requerente prestou esse trabalho em um estabelecimento comercial da sociedade comercial C…, L.da, sito na Rua …, …, no Porto.
5. Posteriormente, a partir de data não apurada anterior ao ano de 2000, a trabalhadora requerente passou a prestar o seu trabalho em outro estabelecimento comercial, sito igualmente na Rua …, …, pertencente à referida sociedade comercial D…, L.da.
6. Foi por ordem e instrução do referido sócio E… que a trabalhadora requerente passou a prestar trabalho no referido estabelecimento comercial.
7. A trabalhadora requerente, quando prestou trabalho nesse estabelecimento comercial, fazia encomendas e emitia documentos de vendas, indistintamente em documentos timbrados da D…, L.da ou em documentos sem qualquer indicação.
8. Os recibos de vencimento da trabalhadora requerente foram sempre emitidos pela C…, L.da.
9. Era com cheques sacados sobre conta bancária titulada pala C…, L.da que sempre foram pagas as retribuições da trabalhadora requerente.
10. A C…, L.da pagou à trabalhadora requerente o montante de €449,45 por cheque sacado sobre conta bancária titulada por aquela, referente ao subsídio de Natal de 2010.
11. A C…, L.da propôs à trabalhadora requerente, em data não apurada, anterior a 30.ABR.11, a revogação por mútuo acordo do seu contrato de trabalho, que não foi aceite pela trabalhadora requerente.
12. Por comunicação escrita datada de 30.ABR.11, a C…, L.da levou ao conhecimento da trabalhadora requerente que o seu posto de trabalho havia sido extinto “…em virtude da quebra financeira da empresa e fruto da conjuntura económica adversa e à crise do comércio tradicional na cidade do Porto.”.
13. O impresso modelo 5044 (Declaração da Situação de Desemprego) foi preenchido e entregue à trabalhadora requerente pela C…, L.da, figurando esta como entidade empregadora.
14. Auferia a trabalhadora requerente, à data da cessação do seu contrato de trabalho (30.ABR.11), a retribuição mensal de €505,00.
15. À data da cessação do contrato de trabalho da trabalhadora requerente a C…, Lda não lhe havia pago os proporcionais de férias de 2011, subsídio de férias de 2011 e de proporcionais de subsídio de Natal de 2011.
16. A trabalhadora requerente auferiu o subsídio de desemprego no valor de €7.543,80 (18 meses x €419,10).
17. Aquando da comunicação pela C…, L.da da extinção do posto de trabalho da trabalhadora requerente, aquela propôs-lhe o pagamento em 12 prestações mensais, da quantia de cerca de 1.300 euros, a título de compensação pela cessação do seu contrato de trabalho e de pagamento de créditos salariais vencidos e não pagos, que a trabalhadora requerente não aceitou.
18. O estabelecimento referido no ponto 5. Encerrava aos sábados, a partir das 13h.00.
19. A C…, L.da tinha um estabelecimento comercial sito na Av.ª … que, aos sábados, se encontrava aberto ao público da parte da tarde.
20. À trabalhadora requerente foi apresentada pela Ré a proposta de adquirir para si a exploração do estabelecimento onde a mesma laborava na data da cessação do seu contrato de trabalho, na Rua …, ….
21. A trabalhadora requerente não aceitou tal proposta da sua entidade empregadora.
*
Não se provou que:
A. Desde a sua admissão ao serviço a trabalhadora requerente estava colocada no estabelecimento referido na Rua …, ….
B. Era do conhecimento da trabalhadora requerente que o seu posto de trabalho era na Rua …, … e que a sua manutenção era insustentável.
C. Na ocasião referida no ponto 20. dos factos provados, referiu a trabalhadora requerente ao gerente do mesmo que “Se não dá para si, como é que dá para mim?”.
D. A partir do momento em que foi encerrado o estabelecimento comercial sito na Rua …, …, a trabalhadora requerente não se apresentou ao serviço na firma C…, Lda.
E. A ré retirou a proposta por si apresentada, referida no ponto 20 dos factos provados, antes que a trabalhadora requerente se pudesse pronunciar sobre a mesma.
F. A trabalhadora requerente, quando recusou a proposta da entidade empregadora referida no ponto 17. dos factos provados, disse-lhe que, com o encerramento do estabelecimento onde laborava, iria apresentar-se nas instalações da aqui Ré.
G. Ao que foi dito pelo ré, que a sua entrada nas instalações não seria permitida.
II.2 Questões prévias: erros de escrita; nulidades da sentença; excepção dilatória de ilegitimidade passiva da Ré.
Começaremos por nos debruçar sobre os alegados erros de escrita e nulidades da sentença, invocados, respectivamente, nas conclusões 1 a 5 e 6 a 11, 16, 19 e 20. É de assinalar verificar-se que ao longo das conclusões há repetição de conclusões sobre a primeira daquelas questões, nas conclusões 13, 31 e 32.
E, em seguida, seguindo-se a ordem que se nos afigura impor-se em termos lógicos, caberá apreciar o alegado erro de julgamento, na perspectiva da recorrente, em razão do tribunal a quo não ter declarado a excepção dilatória de ilegitimidade passiva da Ré, com a sua consequente absolvição da instância. Com efeito, se porventura a Recorrente tiver razão, ficará imediatamente prejudicada a apreciação das demais questões.
I.2.1 Erros de escrita
Nas conclusões 1 a 5, 13, 31, 32 e 33, a recorrente veio alegar a existência de erros de escrita na sentença e por via destes no ponto 5 da matéria de facto, onde refere “... a partir de data não concretamente apurada do ano de 2000, a trabalhadora requerente passou a prestar o seu trabalho em outro estabelecimento comercial, sito igualmente na Rua …, …, pertencente à referida sociedade D…, Lda.”, devendo ler-se “... data não concretamente apurada anterior ao ano de 2000 ...”,
O tribunal a quo antes de se pronunciar sobre a admissibilidade do recurso, em despacho de 13-02-2017, dizendo terem sido “apontados lapsos de escrita à decisão recorrida, que existem efectivamente e que, por isso, importa expurgar”, passou a reproduzir a sentença, agora corrigida desses lapsos.
Com efeito, no facto provado 5, passou a constar “(..) a partir de data não apurada anterior ao ano de 2000 (…)”.
A sentença corrigida foi notificada às partes – em 15-02-2017 - e ao Ministério Público.
A recorrente nada mais veio dizer a este propósito e a recorrida nada opôs.
Assim, verificando-se que o tribunal a quo proferiu à rectificação dos erros de escrita antes da subida do recurso, bem assim que posteriormente nada foi alegado pelas partes a esse propósito (art.º 614.º n.º2, do CPC), considera-se a questão sanada, nada cumprindo aqui apreciar ou decidir a esse propósito.
II.2.2 Nulidades da sentença
Vem a recorrente sustentar que a sentença “está ferida de nulidade por falta de fundamentação e condenação superior ao pedido (art. 615º, n.º 1, al. b), c), e e), do C.P.C)” [conclusão 6).
A recorrente observou o disposto no art.º 77.º n.º1, do CPT, arguindo as nulidades da sentença expressa e separadamente no requerimento de interposição do recurso dirigido ao tribunal a quo, nada obstando ao seu conhecimento.
As causas de nulidade da sentença constam previstas no art.º 615.º n.º 1 do CPC resultando das nas normas das alíneas invocadas pela recorrente, que a sentença é nula quando:
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
Em primeiro lugar cabe assinalar que a recorrente faz apelo à alínea c), mas depois não se encontra nas demais conclusões, nem tão pouco nas alegações, argumentos que visem sustentar a alegada contradição entre os fundamentos e a decisão ou apontada ambiguidade ou obscuridade que a torne ininteligível.
Mais, na conclusão 6, apesar de no final invocar as três mencionadas alíneas do n.º1, do art.º 615.º do CPC, na parte inicial apenas refere que a sentença “está ferida de nulidade por falta de fundamentação e condenação superior ao pedido”, causas de nulidade que se reconduzem às alíneas b) e e).
Por conseguinte, fica-se sem saber se a recorrente invoca também a alínea c), do n.º1, por mero lapso, ou se o faz por deficiente enquadramento jurídico.
Seja como for, recordando que as causas de nulidade constantes do elenco do n.º1, do art.º 668.º, não incluem o “chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário” [Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª Edição revista e Actualizada, Coimbra Editora, Almedina, 1985, pp. 686], a indagação que nos cumpre fazer, desde logo em razão do objecto do recurso ser delimitado pelas conclusões, incidirá apenas na alegada nulidade por falta de fundamentação e condenação superior ao pedido.
Vejamos então.
A falta de fundamentação é uma das causas de nulidade substancial ou de conteúdo da decisão e verifica-se quando o tribunal julgar procedente ou improcedente um pedido e não especifique quais os fundamentos de facto ou de direito com base nos quais formou essa convicção e decidiu.
A nulidade decorre da violação do dever de motivação ou fundamentação de decisões judiciais (art.º 208.º n.º1 da CRP e 154.º n.º1 e 607.º n.ºs 3 e 4 do CPC).
O artigo 154.º n.º1, do CPC, sob a epígrafe “Dever de fundamentar a decisão”, dispõe no seu n.º1, que “As decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas”.
Por seu turno, o art.º 607.º do CPC, que rege sobre a elaboração da sentença, impõe ao juiz o dever de “discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final” (n.º3).
Porém, essa nulidade só ocorre se existe falta absoluta de motivação. A não ser assim, a existência de motivação ainda que deficiente, medíocre ou errada é o suficiente para excluir a nulidade, apenas ficando a sentença sujeita ao risco de revogação ou alteração em sede de apreciação de recurso.
A propósito do sentido e alcance desta norma, provinda do CPC de 1939 e mantendo o mesmo conteúdo, o Professor Alberto dos Reis, elucidava “Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto” [Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, Reimpressão, 1984, pp. 140].
Esse mesmo entendimento vem sendo acolhido, unânime e pacificamente, pela doutrina e jurisprudência.
Assim, na mesma linha e apoiando-se em Acórdão no Supremo Tribunal de Justiça, de 5-1-1984 (BMJ 333, 398] o Professor Antunes Varela escreve o seguinte:
- “Para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito.
(..)
Para que haja falta de fundamentação, como causa de nulidade da sentença, torna-se necessário que o juiz não concretize os factos que considera provados e coloca na decisão. Relativamente aos fundamentos de direito, dois pontos importa salientar.
Por um lado, o julgador não tem que analisar todas as questões jurídicas que cada uma das partes invoque em abono das suas posições, embora lhe incumba resolver todas as questões suscitadas pelas partes; a fundamentação da sentença contenta-se com a indicação das razões jurídicas que servem de apoio à solução adoptada pelo julgador.
Por outro lado, não é indispensável, conquanto seja de toda a conveniência, que na sentença se especifiquem as disposições legais que fundamentam a decisão: essencial é que se mencionem os princípios, as regras, as normas em que a sentença se apoia” [Manual de Processo Civil, 2.ª Edição, Coimbra Editora, 1985, pp. 667 a 669].
O mesmo autor esclarece, ainda, que a necessidade de fundamentação da sentença assenta em duas ordens de razões. A primeira, tem em vista a persuasão das partes sobre a legalidade da solução encontrada, procurando convencer a parte vencida através da argumentação. A segunda, prende-se directamente com a recorribilidade das decisões: “(..) para que a parte lesada com a decisão que considera injusta a possa impugnar com verdadeiro conhecimento de causa, torna-se de elementar conveniência saber quais os fundamentos de direito em que o julgador se baseou” [Op. cit., ibidem].
Na mesma linha de entendimento pronuncia-se José Lebre de Freitas, escrevendo que “[H]á nulidade quando falte em absoluto a indicação dos fundamentos de facto ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão, não a constituindo a mera deficiência de fundamentação”, assinalando igualmente que “[A] fundamentação da sentença é, além do mais, indispensável em caso de recurso: na reapreciação da causa, a Relação tem de saber em que se fundou a sentença recorrida” [A Acção Declarativa Comum, À Luz do Código de Processo Civil de 2013, 3.ª Edição, Coimbra Editora, 2013, p. 332].
Como decorre do exposto, a falta de fundamentação pode referir-se só aos fundamentos de direito ou só aos fundamentos de facto.
No caso, a recorrente sustenta que «surgem, na matéria de facto, sete factos não provados, limitando-se, no fim, (a sentença) a referir que “Relativamente à matéria de facto não provada, tal resultou de não ter sido feita prova sobre a respectiva factualidade.”, assim não cumprindo, de todo, com as exigências de fundamentação do art. 607º, n.º 4 do C.P.C.”, depois rematando, dizendo que “A livre apreciação da prova e a formação da prudente convicção do julgador não são um espaço de discricionariedade não vinculada, pelo que entende-se enfermar a sentença de falta de fundamentação, de facto e de direito (art. 615º, n.º 2, al. b) do CPC)” [conclusões 19 e 20].
De acordo com esta parte final afirma a recorrente entender que a sentença é nula por “falta de fundamentação de facto e de direito”.
O argumento aduzido consiste, em primeiro lugar, em pôr em causa a fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, nomeadamente, sobre os “sete factos não provados”, isto é, os constantes sob as alíneas A) a G), apontando a recorrente que o tribunal a quo limita-se “a referir que “Relativamente à matéria de facto não provada, tal resultou de não ter sido feita prova sobre a respectiva factualidade”.
Nos factos considerados não provados, correspondentes a alegação da recorrente no articulado apresentado com vista à motivação do despedimento, consta o seguinte:
A. Desde a sua admissão ao serviço a trabalhadora requerente estava colocada no estabelecimento referido na Rua …, ….
B. Era do conhecimento da trabalhadora requerente que o seu posto de trabalho era na Rua …, … e que a sua manutenção era insustentável.
C. Na ocasião referida no ponto 20 dos factos provados, referiu a trabalhadora requerente ao gerente do mesmo que “-Se não dá para si, como é que dá para mim?”.
D. A partir do momento em que foi encerrado o estabelecimento comercial sito na Rua …, …, a trabalhadora requerente não se apresentou ao serviço na firma C…, Lda.
E. A ré retirou a proposta por si apresentada, referida no ponto 20 dos factos provados, antes que a trabalhadora requerente se pudesse pronunciar sobre a mesma.
F. A trabalhadora requerente, quando recusou a proposta da entidade empregadora referida no ponto 17. dos factos provados, disse-lhe que, com o encerramento do estabelecimento onde laborava, iria apresentar-se nas instalações da aqui Ré.
G. Ao que foi dito pelo ré, que a sua entrada nas instalações não seria permitida.
Confrontando estes factos “não provados” com o elenco dos facto provados, constata-se que os mesmos resultam do alegado pela recorrente no articulado que apresentou para motivar o despedimento comunicado à trabalhadora.
Não cuidaremos, por ora, de nos debruçar sobre a relevância destes factos, ou pelo menos de parte deles para a apreciação da causa, nem tão pouco sobre a admissibilidade da sua invocação atento o disposto nos artigos 387.º n.º 3, do CT/09 e 98.º J n.º1, do CPT, normas que, compaginando-se, consagram o princípio de apenas poderem ser invocados pelo empregador “os factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador”.
Cingindo-nos à questão da nulidade da sentença por falta da fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, antecipamos já que a mesma não se verifica.
Esses factos não provados são, no essencial, o reverso do que se considerou provado, nomeadamente, por via da alegação da autora em resposta àquele articulado da Ré.
Na fundamentação da decisão sobre a matéria de facto o tribunal a quo pronunciou-se nos termos seguintes:
A matéria de facto provada e não provada que antecede resultou da ponderação conjugada e crítica audiência dos depoimentos das testemunhas inquiridas em audiência de julgamento, as quais, sendo ou tendo sido trabalhadores da C… ou da D…, L.da, revelaram ter conhecimento directo dos factos sobre que depuseram.
Assim, F… (que disse ser sócia da entidade empregadora), explicando que a C… foi criada em 1997; explicou que a trabalhadora requerente trabalhava na Rua …, …, em uma loja aí situada, a partir de 1997; esclareceu que os estabelecimentos com os n.ºs … e … foram adquiridos pela referida D…, L.da em 1998, com a aquisição das participações sociais da D…, Lda. pelos novos sócios; disse que a trabalhadora requerente era trabalhadora da sociedade comercial C…, admitida por esta em Fevereiro ou Março de 1997, pouco depois de esta ter sido constituída e onde trabalhou até 1998 num estabelecimento sito na Rua …, tendo transitado para a D…, L.da, aí desempenhando funções até 2011; disse que os horários que a trabalhadora requerente observava eram aqueles praticados na loja para onde transitou depois de deixar de trabalhar na outra loja do outro lado da rua …; afirmou que nas férias, a trabalhadora requerente e a outra colega que aí trabalhavam eram substituídas por outra colega, funcionária da C…, que trabalhava na Av.ª …; disse que as encomendas efectuadas pela trabalhadora requerente eram dirigidas ao gerente E… e que os documentos das vendas por si efectuadas na loja da rua … eram emitidos em papel timbrado da D…, L.da; confirmou serem os mesmos os gerentes da C… e da D…, L.da; referiu que quando o estabelecimento da rua … encerrou, em 2011, foi proposto à trabalhadora requerente ficar com essa loja, o que a mesma recusou, tendo-lhe sido igualmente proposto acordo de revogação do seu contrato de trabalho, o que a mesma igualmente recusou, sendo certo não ter a mesma comparecido na loja depois do encerramento desta, nem igualmente compareceu na Av.ª …; H… (que disse ter sido trabalhadora da sociedade comercial D…, L.da até 2011), tendo explicado que a trabalhadora requerente inicialmente era empregada do sr. J…, depois passando a trabalhar na sociedade comercial C…; explicou que a trabalhadora requerente também desempenhou funções no estabelecimento comercial onde a depoente trabalhava, ainda que aquela tivesse vínculo com a C…, facto que teve conhecimento quendo, em determinada ocasião, se apercebeu que o cheque do ordenado daquela era emitido pela C…; disse que a carta de despedimento da testemunha lhe foi endereçada pela sociedade comercial D…, L.da; explicou que os talões das vendas efectuadas na loja onde a testemunha e a trabalhador requerente trabalhavam, na rua …, eram emitidas pela D…, L.da, sendo certo que na loja onde a trabalhadora requerente trabalhava existissem talões em branco; referiu que a loja da rua … encerrava aos sábados à tarde; I… (que disse ter sido trabalhadora da sociedade comercial D…, L.da a partir de finais de 2000), tendo referido que habitualmente prestava o seu trabalho na Av.ª …, fazendo-o ocasionalmente no estabelecimento da rua … em substituição das colegas que lá trabalhavam, nomeadamente a trabalhadora requerente; explicou receber ordens do sr. E…, que era sócio da C… e da D…, L.da; explicitou que a comunicação de despedimento que recebeu lhe foi endereçada pela D…, L.da, sendo que os recibos do seu vencimento eram igualmente emitidos por esta sociedade comercial; disse saber que os cheques pelos quais era paga a retribuição da trabalhadora requerente eram emitidos pela C…; disse que os recibos das vendas efectuadas na loja da Rua … eram emitidas em nome da D…, L.da; explicou que a loja da rua … estava aberta ao público até às 13h.00 de sábado, ao contrário da loja da Av.ª …, que estava aberta até às 19h.00.
Relativamente à matéria de facto não provada, tal resultou de não ter sido feita prova sobre a respectiva factualidade.
Também os documentos juntos aos autos se revelaram instrumentais para a descoberta da verdade».
Como se constata através de uma leitura atenta que procure acompanhar o percurso lógico seguido nesta decisão pelo Tribunal a quo, ao referir-se aos factos provados e justificar o porquê de assim os considerar, está em consequência a afastar a possibilidade de se provar do mesmo passo - posto que seria contraditório - o que se considerou não provado. Atente-se, desde logo, que o Tribunal a quo começa por dizer que “A matéria de facto provada e não provada que antecede resultou da ponderação conjugada e crítica audiência dos depoimentos das testemunhas inquiridas em audiência de julgamento, as quais, sendo ou tendo sido trabalhadores da C… ou da D…, L.da, revelaram ter conhecimento directo dos factos sobre que depuseram”, depois prosseguindo elencando esses testemunhos, referindo o essencial e valorando-os.
Por conseguinte, a parte final invocada da decisão não pode ser vista isoladamente, como pretende a recorrente, sugerindo a ideia de que surge sem mais, antes devendo ser conjugada com a fundamentação que antecede, assim se percebendo que mais não é do que a afirmação do desfecho lógico do percurso seguido na parte precedente.
Não há, pois, a alegada falta de fundamentação da decisão sobre a matéria de facto.
Em segundo lugar, vem a recorrente sustentar que o tribunal a quo não deduziu na indemnização fixada as retribuições “que a Autora deixou de auferir do despedimento até trânsito em julgado os momentos em que a instância esteve parada por motivo não imputável às partes (..) e todos os montantes de subsídio de desemprego recebidos (violando os arts. 98º-N e O do C.P.T. e 390º, n.º 2, do Código do Trabalho) [conclusão 7]. No seu entender, não tendo sido produzida outra prova que permita concluir que o valor a deduzir seriam apenas 18 meses x €419,10, num total de €7.543,80 (ponto 16. da matéria de facto), a decisão enferma de falta de fundamentação, bem como a sentença nele baseada.
Defende, ainda, que o ponto 16 deveria ter redacção diferente (conclusão 10), ou caso assim não se entenda, que deverá esta Relação considerar indispensável a ampliação da matéria de facto (conclusão 11).
Não tem razão a recorrente quando pretende ver aqui uma alegada nulidade da sentença por falta de fundamentação. Aliás, tal decorre do seu próprio argumento.
Com efeito, se a própria recorrente acaba por se estribar na alegada violação “[d]os arts. 98º-N e O do C.P.T. e 390º, n.º 2, do Código do Trabalho”, o que poderá estar em causa é um eventual erro de julgamento na aplicação do direito aos factos.
Por outro lado, se o que está em causa é a redacção do ponto 16 da matéria de facto provada, entendendo a recorrente que deverá ser outra, então haverá um eventual erro na apreciação da prova e fixação dos factos, que também se reconduz a erro de julgamento.
Ora, como logo começou por se dizer, as nulidades da sentença não incluem o “chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário”. A nulidade da sentença e o erro de julgamento são realidades diversas que não devem ser confundidas.
Mais, note-se que nem tão pouco na alegação se concretiza qual seria então a falta de fundamentação, antes reconduzindo os argumentos exclusivamente a alegados erros de julgamento.
Concluindo, improcedendo a nulidade da sentença arguida com fundamento na alínea b), do n.º1, do art.º 615.º CPC.
Prosseguindo para o fundamento seguinte, está em causa saber se a sentença condenou para além do pedido, violando o art.º 609, n.º 1.º do CPC.
É sabido que o “Tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a acção pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes (..)” [art.º 3.º n.º1 do CPC].
Trata-se do princípio do pedido ou princípio da iniciativa da parte, significando tal, nas palavras do Prof. Anselmo de Castro, que “(..) a invocação da tutela jurisdicional em matéria cível representa o conteúdo de um direito estritamente individual, cabendo ao respectivo titular a livre determinação do seu exercício em defesa dos seus próprios interesses. Por outro lado, condicionada a actividade jurisdicional pelo pedido, nunca o juiz poderá estender a sua actividade decisória para além dele (..)” [Direito Processual Civil Declaratório, Vol.III, Almedina; Coimbra, 1982, pp. 153].
Importa ainda ter presente o princípio do dispositivo, consagrado no art.º 5.º n.º1 do CPC, onde se dispõe que “Às partes cabe alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções”.
Como corolário desse princípio, a sentença deve conter-se dentro dos limites definidos pela pretensão do autor, bem como da reconvenção, nos casos em que é deduzida pelo réu. Assim resulta do n.º 1 do art.º 609.º, do CPC, onde se dispõe que ”A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir”.
O pedido é o meio de tutela jurisdicional pretendido pelo autor ou, dito por outras palavras, o efeito jurídico que pretende fazer valer com a acção.
Justamente por isso, como assinalam Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “A formulação do pedido reveste a maior importância, porque o juiz não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir” (..)” [Manual de Processo Civil, 2.ª Edição, Coimbra Editora, 1985, pp. 244].
A violação deste limite, ou seja, a não coincidência da decisão por excesso de pronúncia determina a nulidade da sentença, como decorre do n.º1 e al. e) do art.º 615.º do CPC..
Os argumentos da recorrente são mais uma vez os que constam das conclusões 7 a 11, aos quais acabámos de nos referir na fundamentação imediatamente antecedente.
Ora, em primeiro lugar, com os mesmos fundamentos, a sentença não pode ser nula do mesmo passo por falta de fundamentação e por condenar para além do pedido. Dito por outras palavras, os dois alegados vícios da sentença não podem coexistir com os mesmos fundamentos.
Em segundo lugar, como dissemos acima, a recorrente confunde eventual erro de julgamento, quer quanto à apreciação da prova e fixação dos factos quer quanto à aplicação do direito. No primeiro caso, visto vir discordar do que consta provado no facto 16 (conclusões 8, 9, 10 e 11); e, no segundo, ao invocar a alegada violação dos arts. 98º-N e O do C.P.T. e 390º, n.º 2, do Código do Trabalho (conclusão 7).
Concluindo, também com este fundamento – alegada condenação em quantidade superior ao pedido – improcede a arguida nulidade da sentença.
II.2.3 Excepção dilatória de ilegitimidade passiva da Ré.
A recorrente encerra as conclusões pedindo, para além do mais, que “;seja revogada a sentença recorrida, substituindo-se esta por decisão que declare a excepção dilatória de ilegitimidade passiva da Ré e respectiva absolvição da instância, com todas as legais e demais consequências”.
Procurando descortinar nas conclusões quais os argumentos da recorrente para sustentar aquela pretensão, se bem as interpretamos, crê-se que procura reportar-se a essa questão nas conclusões 12 a 18. Após várias considerações sobre a prova produzida em julgamento, questiona a possibilidade de se entender estar-se perante uma “cedência ocasional” ou “no mínimo pluralidade de empregadores”, refere que a “a vinculação teria de decidir-se por métodos indiciários, convocando o critério da subordinação jurídica” (conclusão 17), para defender o seguinte:
[conclusão 18] “Preenchidos os critérios por aquelas circunstâncias de facto, pode concluir-se que a trabalhadora, desde 1998, cumpria tudo em função da loja da D…, Lda., pelo que atenta a jurisprudência do S.T.J. (citada em 35.), teria o julgador que se decantar por esta sociedade como entidade empregadora”. Na sua perspectiva, “o tribunal recorrido não analisa criticamente os factos que fundamentariam de facto a sentença”.
Recuando ao articulado motivador do despedimento, neste veio a Ré sustentar que a A. prestava serviço como empregada de balcão, mas à sociedade D…, Lda, entidade proprietária do estabelecimento sito na Rua …, n.º …, Porto, sociedade que era e é detida pelos mesmos sócios que detém a sociedade C…, Lda, situação que era bem conhecida da trabalhadora.
O articulado é concluído nos termos seguintes:
- «São estas as razões que nos levaram a ponderar o encerramento do estabelecimento e consequentemente a extinção do posto de trabalho.
Talvez a decisão tenha pecado por ser tardia.
São reflexões que deixamos à v/ Douta Consideração”.
Serve esta nota para deixar bem claro que em parte alguma daquele articulado a Recorrente veio perante o tribunal a quo arguir a excepção dilatória de ilegitimidade processual.
A legitimidade processual constituiu um pressuposto processual relativo às partes, que se afere, na falta de indicação da lei em contrário, face à relação material controvertida tal como configurada pelo A., e cuja falta, determina a verificação da correspondente exceção dilatória, dando lugar à absolvição do Réu da instância (artigos 30.º, 278.º n.º 1 al. d), 576.º 1 e 2, e 577.º al. e), todos do CPC). Outra, bem diferente, é a legitimidade substancial ou substantiva, que tem que ver com a efetividade da tal relação material, interessando já ao mérito da causa.
Ora, o que a R. questionou no articulado apresentado foi a legitimidade substantiva, ao alegar que a autora prestava serviço como empregada de balcão, mas à sociedade D…, lda.
Como mencionado no relatório inicial, a autora respondeu ao articulado da R. e deduziu pedido reconvencional, vindo depois a Ré responder.
Nesse articulado a Ré densifica a argumentação anterior e no final conclui dizendo:
- «Termos em que deverá ser declarada a ilegitimidade passiva da ré e ser esta absolvida da instância, com todas as legais consequências”.
É certo que a Ré usa aqui a expressão “ilegitimidade passiva da ré” e pede a consequência própria da ilegitimidade processual. Contudo, em parte alguma deste último articulado aduz qualquer argumento jurídico de onde decorra que está a arguir a sua ilegitimidade processual.
Acresce que, ainda que o estivesse, a arguição seria extemporânea.
Pese embora as especificidades da acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, o articulado motivador do despedimento, a que se refere o artigo 98.º J, do CPT, equivale no processo comum à contestação, significando isso que essa peça processual seria o local próprio e exclusivo para atempadamente arguir a excepção de ilegitimidade processual.
A acção inicia-se com a apresentação do requerimento a que aludem os artigos 98-º C e 98.º D, do CPT, acompanhado, sendo que este só pode ser apresentado nos casos em que “seja comunicada por escrito ao trabalhador a decisão de despedimento individual, seja por facto imputável ao trabalhador, seja por extinção do posto de trabalho, seja por inadaptação” [n.º1, art.º 98.º C].
Foi o que aqui aconteceu, tendo a autora apresentado a declaração de despedimento que lhe foi entregue pela Ré C…, Lda, a que se refere o facto provado 12, onde consta:
- “Por comunicação escrita datada de 30.ABR.11, a C…, L.da levou ao conhecimento da trabalhadora requerente que o seu posto de trabalho havia sido extinto “…em virtude da quebra financeira da empresa e fruto da conjuntura económica adversa e à crise do comércio tradicional na cidade do Porto.”.
Assim, se a Ré queria arguir a excepção de ilegitimidade processual passiva, deveria tê-lo feito no articulado motivador do despedimento, a que se refere o artigo 98.º J.
E, tanto assim é, que o artigo 98.º L, do CPT, ao reportar-se à resposta que o empregador pode apresentar ao articulado do autor, diz:
- «[n.º4] Se o trabalhador se tiver defendido por excepção, pode o empregador responder à respetiva matéria no prazo de dez dias; havendo reconvenção, o prazo de resposta é alargado para 15 dias”.
Resultando com clareza que a norma baliza os limites da resposta a duas situações distintas: i) à defesa por excepção eventualmente deduzida pelo autor; ii) ao pedido reconvencional.
Portanto, da articulação destes preceitos retira-se que a defesa contra a “declaração do trabalhador de oposição ao despedimento” (art.º 98.º C, n.º1, parte final), seja por impugnação seja por excepção, só pode ter lugar naquele articulado. E, caso não seja deduzida, fica precludida essa possibilidade.
Mas, como se disse, o que aqui acontece é que a Ré confunde a legitimidade processual com a legitimidade substantiva. Confusão que persiste nas alegações de recurso, pese embora os termos em que expressa a pretensão final.
Ora, da legitimidade substantiva ocupou-se o tribunal a quo no ponto B. da fundamentação de direito, onde refere ir proceder á “análise da titularidade da relação jurídica discutida nestes autos”, vinco a concluir, no ponto E, “que a trabalhadora requerente, á data em que foi despedida, trabalhava para a qui entidade empregadora C…, lda”.
Aliás, no que respeita à legitimidade processual, refira-se, na fase de saneamento o Tribunal a quo julgou as partes legítimas, mas numa decisão tabelar, ou seja, assumindo que essa não era uma questão controvertida.
Neste contexto, se não se entender que a Recorrente incorre em confusão, então sempre a agora invocada “excepção dilatória de ilegitimidade passiva da Ré e respectiva absolvição da instância”, consubstancia a introdução de uma questão que não foi submetida à apreciação da 1.ª instância.
Significando isso estarmos perante uma questão nova e, logo, por essa razão, que não pode este tribunal de recurso dela conhece. Como tem sido entendimento corrente da doutrina e da jurisprudência, apenas nos casos expressamente previstos (cfr. artigo 665º nº 2, 608º, nº 2, in fine, CPC), pode o tribunal superior substituir-se ao tribunal que proferiu a decisão recorrida.
Com efeito, a jurisprudência tem reiteradamente entendido que os recursos não visam criar e emitir decisões novas sobre questões novas (salvo se forem de conhecimento oficioso), mas impugnar, reapreciar e, eventualmente, modificar as decisões do tribunal recorrido, sobre os pontos questionados e “dentro dos mesmos pressupostos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento em que a proferiu” [Cfr. Acórdãos do STJ (disponíveis em www.dgsi.pt): de 22-02-2017, proc.º 519/15.4T8LSB.L1.S1, Conselheiro Ribeiro Cardoso; de 14-05-2015, proc.º 2428/09.1TTLSB.L1.S1, Conselheiro Melo Lima; de 12-09-2013, proc.º 381/12.3TTLSB.L1.S1 e de 11-05-2011, proc.º786/08.4TTVNG.P1.S1, Conselheiro Pinto Hespanhol].
Por tudo isto, também quanto a esta questão improcede o recurso.
II.3 Impugnação da decisão sobre a matéria de facto
A recorrente insurge-se contra a decisão sobre a matéria de facto do tribunal a quo na parte respeitante às alíneas A, B, C, D e F.
Cumpre, como primeiro passo, indagar se nada obsta à apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, verificando se foram observados ónus exigidos pelo art.º 640.º do CPC.
Conforme decorre do n.º1 do art.º 662.º do NCPC, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Pretendendo a parte impugnar a decisão sobre a matéria de facto, deve observar os ónus de impugnação indicados no art.º 640.º do CPC, ou seja, é-lhe exigível a especificação obrigatória, sob pena de rejeição, dos pontos mencionados no n.º1 e n.º2, enunciando-os na motivação de recurso, nomeadamente os seguintes:
- Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados[n.º1, al. a)];
- Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [n.º1, al. b)];
- A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [n.º 1, al. c)];
- Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, a indicação com exactidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes [n.º2, al. a)].
A propósito do que se deve exigir nas conclusões de recurso quando está em causa a impugnação da matéria de facto, sendo estas não apenas a súmula dos fundamentos aduzidos nas alegações, mas atendendo sobretudo à sua função definidora do objeto do recurso e balizadora do âmbito do conhecimento do tribunal, é entendimento pacífico da jurisprudência, mormente do Supremo Tribunal de Justiça, que as mesmas devem conter sob pena de rejeição do recurso, pelo menos uma síntese do que consta nas alegações da qual conste necessariamente a indicação dos concretos pontos de facto cuja alteração se pretende e, também, o sentido e termos dessa alteração [cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça: de 23-02-2010, Proc.º 1718/07.2TVLSB.L1.S1, Conselheiro FONSECA RAMOS; de 04/03/2015, Proc.º 2180/09.0TTLSB.L1.S2, Conselheiro ANTÓNIO LEONES DANTAS; de 19/02/2015, Proc.º 299/05.6TBMGD.P2.S1, Conselheiro TOMÉ GOMES; de 12-05-2016, Proc.º 324/10.9TTALM.L1.S1, Conselheira ANA LUÍSA GERALDES; de 27/10/2016, Proc.º 110/08.6TTGDM.P2.S1, Conselheiro RIBEIRO CARDOSO; e, de 03/11/2016, Proc.º 342/14.8TTLSB.L1.S1, Conselheiro GONÇALVES ROCHA (todos eles disponíveis em www.dgsi.pt)].
Atentos estes princípios, vejamos então.
Nas conclusões 22 a 28, a recorrente indica não só os factos que impugna, que já acima indicámos, como também diz qual a redação alternativa que entende dever ser-lhes conferida.
Por conseguinte, no que respeita às conclusões, a recorrente observa o que se exige como suficiente para dar cumprimento ao disposto nos artigos 639.º e 640.º do CPC.
O mesmo se diga quanto à indicação dos meios de prova, nomeadamente, os depoimentos de parte da autora e do representante legal da Ré - E… -, e os testemunhos de F…, H… e I…, de tudo sendo feita indicação sumária do que terão dito e indicação dos pontos da gravação onde se encontram os depoimentos no sentido invocado.
Conclui-se, pois, que nada obsta à apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Nas conclusões 22 a 23, a recorrente insurge-se contra a alínea A), dos factos não provados, onde se lê: [A] Desde a sua admissão ao serviço a trabalhadora requerente estava colocada no estabelecimento referido na Rua …, ….
No seu entender devendo ser suprimido para se aditar à matéria de facto provada um ponto onde conste «“Desde que a loja do … fechou, a trabalhadora requerente prestou serviço no estabelecimento referido na Rua …, …”, ou a sua redação, já corrigida, ou alterada (conforme requerido em 27. e de 69. a 72.), ser completada para “Posteriormente, desde que a loja do … fechou e a partir de data não apurada, anterior ao ano de 2000, a trabalhadora requerente passou a prestar o seu trabalho em outro estabelecimento comercial, sito igualmente na Rua …, …, pertencente à referida sociedade comercial, D…, L.da”.
Nos pontos 4 e 5 dos factos provados, este último com a redacção após a rectificação introduzida ao texto primitivo, lê-se o seguinte:
4. Inicialmente, a trabalhadora requerente prestou esse trabalho em um estabelecimento comercial da sociedade comercial C…, L.da, sito na Rua …, …, no Porto.
5. Posteriormente, a partir de data não apurada anterior ao ano de 2000, a trabalhadora requerente passou a prestar o seu trabalho em outro estabelecimento comercial, sito igualmente na Rua …, …, pertencente à referida sociedade comercial D…, L.da.
Se bem atentarmos no facto provado 5, em relação à redacção que é pretendida pela recorrente para a hipótese de ser atendido o pedido de rectificação, como o foi, apenas falta a expressão “desde que a loja do … fechou”.
Ora, esta expressão é manifestamente irrelevante para a boa decisão da causa.
Mas mesmo que assim não se entenda, sustentando-se a recorrente no depoimento de parte da autora, nomeadamente nos artigos 51, 52 e 53 das alegações, em nenhum deles refere que a autora tenha feito aquela referência, mas apenas que do depoimento terá resultado que primeiro trabalhou na loja da R., sita no n.º…, e posteriormente em um outro estabelecimento, este propriedade da sociedade D…, Lda.
O depoimento de parte visa obter a prova através da confissão da própria parte, apenas podendo ter por objecto factos pessoais ou de que o depoente tenha conhecimento [cfr. art.º 453.º, CPC].
Como elucida José Lebre de Freitas, “Diz-se confissão o reconhecimento da realidade dum facto (passado, ou presente duradoiro) desfavorável ao declarante (art.º 352.º CC), isto é, dum facto constitutivo dum seu dever ou sujeição, extintivo ou impeditivo dum seu direito ou modificativo duma situação jurídica em sentido contrário ao seu interesse, ou, ao invés, a negação da realidade dum facto favorável ao declarante, isto é, dum facto constitutivo dum seu direito, extintivo ou impeditivo dum seu dever de sujeição ou modificativo” [A Acção Declarativa Comum, 3.ª edição, Coimbra Editora, 2013, p.255].
O mesmo autor assinala, ainda, que “O art. 352 CC, ao definir a confissão, não se limita a enunciar a desfavorabilidade do facto ao confitente: acrescenta-lhe a favorabilidade do mesmo à parte contrária. O sacrifício do interesse do autor da declaração tem o seu correlato na satisfação do interesse de quem, no âmbito da relação jurídica em causa, é titular da situação jurídica que lhe opõe (..)” [Op. cit, p. 256, nota 3].
Na acta da audiência de julgamento consignou-se o que resultou do depoimento de parte da autora, nomeadamente, nos termos seguintes:
Trabalhou cerca de 20 anos para o sr. J…, primeiro em um estabelecimento sito na Av.ª …, depois noutro na Rua …, nesta cidade: ao cabo desse período desse tempo, aceitou uma proposta do Sr. E… e do referido filho sr. J…, no sentido de ir trabalhar para uma sociedade comercial de que este era sócio e que a depoente veio posteriormente a saber ser a C…, ao serviço desta sociedade comercial trabalhou até ao momento em que foi despedida na Rua …, primeiro em um estabelecimento pertencente á C…e, depois, em um outro que veio a saber ser propriedade da sociedade comercial D…, Lda; disse que os recibos de vencimento referentes ás suas retribuições eram emitidos, primeiro pelo referido sr. J…, depois pela C…, mas nunca pela referida D…, Lda.
E, como resulta com clareza, em parte alguma se menciona que a Autora tenha feito alusão ao encerramento da loja do ….
Por conseguinte, crê-se que a redacção corrigida do facto provado 5 satisfaz a pretensão da recorrente, inexistindo fundamento para se lhe acrescentar ainda “desde que a loja do … fechou”.
Passamos para a alínea B, dos factos não provados, onde se lê “Era do conhecimento da trabalhadora que o seu posto de trabalho era na Rua …, … e que a sua manutenção era insustentável”.
Reportam-se-lhe as conclusões 24) e 25), pretendendo a recorrente que seja dado como provado o seguinte: “Era do conhecimento da trabalhadora que o posto da Rua …, … onde prestava trabalho era da empresa D…, Lda., e que a sua manutenção era insustentável.
Quanto à primeira parte da redacção sugerida, a mesma nada vem acrescentar de relevante, dado constar já provado do facto 5 que o estabelecimento sito na Rua …, …, “ pertencente à referida sociedade comercial D…, L.da.
Mas como resulta das conclusões como das alegações (54 a 56), a pretensão da recorrente não visa essa parte, antes fazendo enfoque na parte final, isto é, o que pretende é que passe a considerar-se provado que a autora sabia que a manutenção daquele estabelecimento “era insustentável”.
Ora, pretensão da recorrente com esse propósito não pode ser atendida, dado que a redacção que pretende ver provada consubstancia um juízo conclusivo. Saber se a manutenção do estabelecimento era insustentável é um juízo que deve retirar-se na sentença, com base em factos provados que tenham sido alegados. Acresce que a alegação reconduz-se ao thema decidendum, pois na acção está em causa saber se a extinção do posto de trabalho configura um despedimento ilícito.
Este é o entendimento pacífico da jurisprudência dos tribunais superiores, mormente do Supremo Tribunal de Justiça. As conclusões apenas podem extrair-se de factos materiais, concretos e precisos que tenham sido alegados, sobre os quais tenha recaído prova que suporte o sentido dessas alegações, sendo esse juízo conclusivo formulado a jusante, na sentença, onde cabe fazer a apreciação crítica da matéria de facto provada. Dito de outro modo, só os factos materiais são susceptíveis de prova e, como tal, podem considerar-se provados. As conclusões, envolvam elas juízos valorativos ou um juízo jurídico, devem decorrer dos factos provados, não podendo elas mesmas serem objecto de prova [cfr. Acórdão de 23.9.2009, Proc. n.º 238/06.7TTBGR.S1, Bravo Serra; e, mais recentemente, reiterando igual entendimento jurisprudencial: de 19.4.2012, Proc.º 30/08.4TTLSB.L1.S1, Pinto Hespanhol; de 23/05/2012, proc.º 240/10.4TTLMG.P1.S1, Sampaio Gomes; de 29/04/2015, Proc .º 306/12.6TTCVL.C1.S1, Fernandes da Silva; de 14/01/2015, Proc.º 488/11.4TTVFR.P1.S1, Fernandes da Silva; 14/01/2015, Proc.º 497/12.6TTVRL.P1.S1, Pinto Hespanhol; todos disponíveis em http://www.dgsi.pt/jstj].
Assim, as afirmações de natureza conclusiva devem ser excluídas do elenco factual a considerar, se integrarem o thema decidendum. Quando tal não tenha sido observado pelo tribunal a quo e este se tenha pronunciado sobre afirmações conclusivas, deve tal pronúncia ter-se por não escrita.
Assim sendo, também nesta parte sucumbe a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Na conclusão 26, a recorrente insurge-se por não ter sido considerado o que consta em C : “Na ocasião referida no ponto 20. dos factos provados, referiu a trabalhadora requerente ao gerente do mesmo que “ Se não dá para si, como é que dá para mim?”. Pretende que o que ai conste passe a considerar-se provado.
Para tanto, sustenta que tal resulta do depoimento de E… e do testemunho F….
Em primeiro lugar, sendo certo que E… é o representante legal da Ré, nessa qualidade tendo prestado depoimento de parte, este só poderá servir de prova relativamente a factos que lhe sejam desfavoráveis e favoráveis à autora. Não é esse o caso.
Em segundo lugar, o que se pretende ver provado é manifestamente inócuo para a apreciação da causa, sendo certo que já consta provado o seguinte:
20. À trabalhadora requerente foi apresentada pela Ré a proposta de adquirir para si a exploração do estabelecimento onde a mesma laborava na data da cessação do seu contrato de trabalho, na Rua …, ….
21. A trabalhadora requerente não aceitou tal proposta da sua entidade empregadora.
Neste quadro, sempre com o devido respeito, mal se percebe até qual é o propósito que a recorrente visa salvaguardar nesta parte da impugnação.
Mas seja ele qual for, improcede.
Segue-se a alínea D dos factos não provados, onde se lê: “A partir do momento em que foi encerrado o estabelecimento comercial sito na Rua …, …, a trabalhadora requerente não se apresentou ao serviço na firma C…, Lda.”.
Pretende a recorrente que passe a considerar-se provado.
Diz a recorrente que tal ficou provado, “bastando consultar o que a própria disse, “não me apresentei ao serviço...” e o depoimento de E….
No articulado motivador do despedimento a Ré alegou que a autora “não se apresentou ao serviço na firma C…, lda. [Porque sabia, tinha perfeito conhecimento, que o seu posto de trabalho era na Rua … n.º … e que a sua manutenção era insustentável”.
Ora, com o devido respeito, esta alegação é absolutamente irrelevante e, mais, contraditória com os factos praticados pela Recorrente, pois parece esquecer que entregou à autora a declaração a que se refere o facto provado 12, onde se lê que “ Por comunicação escrita datada de 30.ABR.11, a C…, L.da levou ao conhecimento da trabalhadora requerente que o seu posto de trabalho havia sido extinto “…em virtude da quebra financeira da empresa e fruto da conjuntura económica adversa e à crise do comércio tradicional na cidade do Porto.” e, por essa razão, que o que se discute aqui é a regularidade e licitude do despedimento concretizado por via dessa declaração.
Em suma, se a Ré C…, Lda, que assim se identificou clara e expressamente no aludido documento, comunicou a extinção do posto de trabalho da autora, que sentido lógico tem vir questionar que a A., na sequência dessa comunicação, não se apresentou na “firma C…, lda”?
Acresce que a alegação é ambígua, pois não se percebe o quer significar a Ré ao dizer que a A. não se apresentou na firma C…. A firma é a denominação social de uma sociedade comercial, nada mais. Se a Ré queria significar um lugar em concreto, deveria tê-lo concretizado na alegação, o que não fez.
Daí que, também por essa razão, ainda que a alegação tivesse relevância, não era idónea a ser dada como provada.
Mas ainda que assim não fosse, esquece também a recorrente que o depoimento de parte do seu legal representante não pode ser aproveitado para prova de factos alegados por si. A explicação consta acima e dá-se qui por reproduzida.
Por último, o extracto que a recorrente invoca ter sido dito pela autora é apenas este: “não me apresentei ao serviço...”. A parte que segue (conforme consta na conclusão 27), isto é, “na loja da C… de C1…”, é já uma dedução da própria recorrente.
E, conforme resulta do que se consignou relativamente ao depoimento de parte da autora, não consta que ela tenha confessado o que pretende a recorrente.
Portanto, neste contexto, não pode pretender que aquela afirmação tenha o significado que lhe é dado por si.
Conclui-se, pois, pela improcedência de mais este ponto da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Resta a impugnação dirigida à alínea F. dos factos não provados, onde se lê: “A trabalhadora requerente, quando recusou a proposta da entidade empregadora referida no ponto 17. dos factos provados, disse-lhe que, com o encerramento do estabelecimento onde laborava, iria apresentar-se nas instalações da aqui Ré.”.
Defende a Recorrente que “a verdade é que o disse, sim, que “ia para cima”, fazendo apelo às declarações da própria e de F….
Começaremos por assinalar não se perceber com que base, ou dito de outro modo, porque razão, o tribunal a quo menciona aquela matéria como não provada.
Com efeito, percorrido o articulado motivador do despedimento não consta dele em parte alguma tal alegação, nem tão pouco algo que se possa dizer semelhante.
Ora, não tendo sido alegado o facto, não deveria constar como não provado.
O que poderia acontecer é o inverso, isto é, dar-se como provado facto não alegado, desde que verificados os pressupostos do art.º 72.º do CPT. Não é esse o caso. Se assim fosse, estaríamos perante um facto não alegado dado como provado e o que aqui acontece é o oposto.
Mas também não tem relevância procurar indagar a razão que levou o tribunal a quo a fazer aquela menção nos facos não provados. Pelas razões já avançadas, a mesma é irrelevante para a apreciação da causa.
Mas ainda que assim não fosse, se porventura a Autora no seu depoimento de parte disse que “ia para cima”, o uso dessa expressão, que é invocada isoladamente, não pode significar nada em concreto. Nem tão pouco serve a invocação do testemunho de H…, dizendo-se simplesmente coincidir nesse sentido, isto é, sem se invocar exactamente o que disse a testemunha a este propósito.
Por tudo isto, também aqui improcede a impugnação.
Concluindo, a impugnação dirigida à impugnação da decisão sobre a matéria de facto improcede na totalidade.
II.4 MOTIVAÇÃO de DIREITO
Nas conclusões 29) e seguintes a recorrente insurge-se contra a sentença, na parte em que se debruça sobre a questão de saber sobre quem recaía a “titularidade da relação jurídica discutida” - equacionada no segmento B da fundamentação de direito -, por ter concluído que a R. C…, L.da era a entidade empregadora da autora.
No entender da recorrente [conclusão 64[ “deve ser dado como demonstrado que a Autora foi admitida na C…, Lda. em 03/1997, aí tendo trabalhado apenas até 11/1998 (quando fechou), data em que o passou a fazer para D…, Lda., na qual se manteve até 04/2011, ficando patente que a Autora trabalhou a maioria do tempo em questão no estabelecimento da D…, Lda. e para esta (12/1998 a 2011), de quem era, de facto, funcionária, o que deve ser tido em consideração à luz do imperativo da subordinação jurídica e, como tal, dado como provado”.
Na fundamentação do tribunal a quo, na parte que aqui releva, lê-se o seguinte:
- «D. Deste acervo factual resulta que alguma da prova aponta no sentido da vinculação da trabalhadora requerente à D…, L.da (caso dos factos elencados sob o ponto 5.), outra aponta no sentido de a trabalhadora requerente se encontrar vinculada à C…, Lda (a descrita nos pontos 1., 4., 8. e 9.) e outra é ambivalente (pontos 2., 3., 6. e 7.).
E. Efectuando uma ponderação global e conjugada dos factos que acima se descrevem, é lícito concluir que a trabalhadora requerente, à data em que foi despedida, trabalhava para a aqui entidade empregadora C…, L.da.
Com efeito, a circunstância de ter passado a trabalhar no estabelecimento da D…, L.da em data não apurada, anterior ao ano de 2000, e de – ainda que não exclusivamente - efectuar encomendas e emitir documentos de venda em documentos timbrados da D…, Lda não é suficiente para que possa ser havida como trabalhadora desta, sobretudo quando se considera que os recibos de vencimento sempre foram emitidos pela C…, Lda. e que era com cheques sacados sobre conta bancária titulada pela C…, L.da que sempre foram pagas as retribuições da trabalhadora requerente.
F. E se ainda dúvidas restassem, as mesmas seriam definitivamente afastadas quando se atenta na factualidade vertida nos pontos 11. a 13.: foi a C…, L.da, quem tomou a iniciativa de propor à trabalhadora requerente a cessação do seu contrato de trabalho por mútuo acordo, foi essa sociedade comercial que levou ao conhecimento da trabalhadora requerente que o seu posto de trabalho havia sido extinto “…em virtude da quebra financeira da empresa e fruto da conjuntura económica adversa e à crise do comércio tradicional na cidade do Porto.” e foi a mesma que surgiu como entidade empregadora no impresso mod. 5044…
Não pode assim proceder a tese da C…, L.da em como não era a entidade empregadora da trabalhadora requerente».
O percurso seguido pela recorrente para chegar à conclusão acima indicada não prima pela clareza e organização, intercalando considerações sobre a interpretação que faz da prova produzida e da matéria de facto provada, com outras de direito. Procurando objectivar o essencial, no entender da recorrente:
- não existindo contrato de trabalho escrito, importa determinar os titulares desta nova relação jus-laboral, que se manteve de fim de 1998 até 2011 (conclusão 35):
- “Cumpria à Autora o ónus probandi de que trabalhava na C…, Lda.” e para tanto haveria que recorrer ao “critério da subordinação jurídica”, resultando “líquido que a Autora não logrou provar o que se propunha” [conclusão 48]..
- Se não se considerar que a Autora era funcionária só da D…, Lda., ela nunca poderá ser considerada apenas funcionária da C…, Lda, antes que existia uma situação de pluralidade de empregadores (conclusão 50).
- A concretização de todos os elementos apontam nesse sentido; ou que existia um caso de pluralidade de empregadores (conclusão 51);
- Não existia nem veio a existir, aquando da passagem para a D…, Lda., contrato escrito, tendo-se o estabelecimento de uma nova relação laboral com esta efectivado com recurso ao método indiciário (conclusão 54).
- Os recibos aludidos na sentença, não poderiam, apenas como tal, ser decisivos na qualificação jurídica da situação uma vez estabelecido o vínculo da subordinação jurídica a outra entidade, pois é a realidade factual que determina a qualificação contratual.
Vejamos então.
Em primeiro lugar, não podemos deixar de assinalar que o tribunal a quo permitiu que a acção seguisse um rumo incerto, desviando-se do que seria admissível discutir, ao considerar válidas as alegações da Ré no articulado motivador do despedimento e, para além disso, também ao interpretá-las como sendo dirigidas a pôr em causa a qualidade de entidade empregadora da autora.
Passamos a explicar esta asserção.
Como referimos inicialmente, embora sem ai aprofundar a questão por não ser o lugar próprio, dos artigos 387.º n.º 3, do CT/09 e 98.º J n.º1, do CPT, resulta que o empregador, no articulado motivador do despedimento “apenas pode invocar os factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador”.
Significa isto, que caso o empregador venha alegar factos e fundamentos à margem dos que fez constar na decisão de despedimento, isto é, extravasando o núcleo delimitado por aqueles, essa alegação não pode ser atendida pelo tribunal na acção de apreciação da regularidade e licitude do despedimento.
É ponto assente (facto 12), que a Ré C…, Lda jamais pôs em causa que por si foi entregue à autora um documento escrito, comunicando-lhe a extinção do posto de trabalho. Para sermos mais precisos, nesse documento, onde expressamente vem indicado “C…, Lda, a morada da mesma e número de identificação fiscal, seguindo-se depois a identificação da autora e os seus números de identificação fiscal e da segurança social, é mencionado como assunto “Extinção do posto de trabalho”, para depois constar o seguinte:
- «Para os devidos efeitos declaramos que o posto de trabalho da funcionária em referência, foi extinto em virtude da quebra financeira da empresa e fruto da conjuntura económica adversa e á crise do comércio tradicional na cidade do Porto.
Para os efeitos tidos por convenientes, a empresa declara que esta extinção se encontra nos limites previstos no art.º10.º do DL 220/2006, de 2/11”.
Segue-se a data: “Porto, 30 de Abril de 2011”.
E, por baixo, sob a menção “A gerência”, consta aposta uma assinatura.
Este documento corporiza uma declaração de despedimento, da qual resulta com clareza, para qualquer destinatário de normal diligência, que a empresa que está a extinguir ”o posto de trabalho da funcionária em referência (..)” é a C…, Lda. Assim como resulta, que é essa empresa, a C…, que alega como fundamento para a extinção do posto de trabalho comunicada a quebra financeira da empresa e fruto da conjuntura económica adversa e á crise do comércio tradicional na cidade do Porto.”, bem assim que declara que esta extinção se encontra nos limites previstos no art.º10.º do DL 220/2006, de 2/11”.
Portanto, é bem claro que dessa declaração não consta nada que permita englobar o que depois veio a ser alegado no articulado motivador do despedimento, como de seguida se ilustrará.
Antes, porém, note-se que o articulado é apresentado pela Ré “C…, Lda,”, dizendo o seguinte:
- “tendo sido citada para comparecer no tribunal do trabalho do Porto a fim de se proceder a audiência de partes no processo acima referido, vem, após audiência das partes, apresentar as suas justificações quanto às razões aduzidas para a extinção do posto de trabalho , quais sejam:
- quebra financeira da empresa fruto da conjuntura económica adversas;
- crise do comércio tradicional na cidade do Porto”.
Daqui resultando logo, com meridiana clareza, que quem vem “apresentar as suas justificações quanto ás razões aduzidas para a extinção do posto de trabalho”, depois indicadas, é, como não podia deixar de ser face à comunicação que foi entregue à autora, a C…, Lda e não qualquer outra sociedade comercial, nomeadamente a D…, lda, que depois passa a ser referida na alegação.
Mas sobre o alegado no articulado, prossegue este, com um título “Questão Prévia”, sob o qual se passa a ler o seguinte:
- «Antes de mais, porque relevante para a análise de toda a situação, refira-se que:
i) A Autora: B…, prestava de facto serviço, como empregada de balcão à sociedade D…, Lda, entidade proprietária do estabelecimento sito na Rua …, n.º … da cidade do Porto;
ii) A referida sociedade D…, lda era e é detida pelos mesmos sócios que detém a sociedade aqui citada – C…, Lda;
iii) Desde sempre, isto é, desde a sua admissão ao serviço que a Autora estava colocada no estabelecimento referido, o sito na Rua …, n.º ….
iv) E já lá vão 14 anos;
v) Mais, a Autora tinha perfeito conhecimento da situação uma vez que como encarregada do estabelecimento, encomendava, recepcionava e conferia a mercadoria sendo certo que, em virtude disso, não podia desconhecer a entidade a quem as mesmas mercadorias eram facturadas.
vi) A situação financeira da entidade D…, lda era do perfeito e cabal conhecimento da Autora uma vez que, todos os dias fazia o encerramento do caixa e infelizmente constatava que em muitos deles não entrava qualquer valor em caixa”.
Como se pode constatar, também não resulta desta parte da exposição que a R. C…, lda, esteja a pôr em causa ser ela a entidade empregadora da autora. Vem dizer é que a autora “prestava de facto serviço, como empregada de balcão à sociedade D…, lda” , que é coisa bem diferente de rejeitar a qualidade de empregadora, e afirmar que aquela conhecia a alegada razão invocada na decisão de despedimento para a extinção do posto de trabalho, em concreto, a “quebra financeira da empresa e fruto da conjuntura económica adversa e á crise do comércio tradicional na cidade do Porto”.
Esta alegação, na parte em que vem dizer que a Autora “prestava de facto serviço, como empregada de balcão à sociedade D…, lda” não podia ser atendida, uma vez que não foi feita constar da decisão de despedimento comunicada à autora.
Segue-se a segunda parte do articulado, com o título “Quanto à quebra financeira da empresa”, na qual a Ré vem sucintamente alegar breves dados relativos ao volume de negócios, para concluir que “Da sua leitura é por demais evidente que não era possível manter a situação de emprego da Autora”.
Sendo certo que nada disso consta da decisão de despedimento, também estas alegações não podiam ser atendidas.
Neste contexto, com o devido respeito, mal se compreende que o tribunal a quo, no segmento B da fundamentação de direito da sentença, tenha considerado como questão controvertida saber quem era a entidade empregadora da autora, equacionando-a nestes termos:
- «A entidade empregadora sustenta igualmente que jamais existiu vinculação laboral entre si e a trabalhadora requerente, uma vez que esta fora contratada pela D…, Lda. a partir do ano de 2000, pelo que não deveria ter sido demandada pela trabalhadora reconvinte.
Como a dilucidação desta questão assume precedência sobre a apreciação da alegada (i)licitude do despedimento da trabalhadora requerente, proceder-se-á de imediato à análise e à definição da titularidade da relação jurídica discutida nestes autos”.
Com efeito, como cremos resultar com clareza do que foi acima referido e ilustrado com a transcrição da comunicação de despedimento e do articulado motivador do despedimento, a R. C…, Lda, não veio, nesta última peça processual, sustentar que “jamais existiu vinculação laboral entre si e a trabalhadora requerente”. Disse é, repete-se, que “prestava de facto serviço, como empregada de balcão à sociedade D…, lda , que é uma realidade bem diferente.
De resto, sublinha-se, a própria recorrente reconhece-o, ao vir pôr em causa aquela afirmação, dizendo o seguinte:
[Conclusão 29]: A sentença refere no ponto B. que a entidade empregadora invocou que “Jamais existiu vínculo entre si (C…) e a trabalhadora”, o que nunca foi dito, apenas que nunca trabalhou para a C…, Lda. na loja C1… (tal é suportado em 1., 4. e 5. da matéria de facto).
Por conseguinte, constata-se que o tribunal a quo não só ignorou a disciplina contida nos artigos 387.º n.º 3, do CT/09 e 98.º J n.º1, do CPT, atendendo a alegações do articulado motivador do despedimento que não encontram respaldo na comunicação da extinção do posto de trabalho, como para além disso fez uma incorreta interpretação daquelas, iniciando um percurso para apreciação de questão que considerou suscitada pela Ré, sem que sequer isso resulte o alegado.
Por seu turno, a recorrente, aproveitando a oportunidade proporcionada pelo facto de o tribunal a quo ter atendido a alegações de factos e fundamentos que não podia atender, se por um lado afirma que “a Ré jamais despediu a Autora, pela circunstância de não ser a sua entidade patronal” [conclusão 52]., por outro vem agora procurar defender que “se não se considerar que a Autora era funcionária só da D…, Lda., ela nunca poderá ser considerada apenas funcionária da C…, Lda, antes que existia uma situação de pluralidade de empregadores” [Conclusão 50].
Estamos, pois, perante um percurso contraditório, pois a recorrente acaba por não tomar posição concreta sobre o que deve prevalecer para rebater o juízo a que chegou o tribunal a quo, vindo até introduzir uma questão nova, qual seja a de que existia uma pluralidade de empregadores.
Na verdade, oscilando entre a possibilidade da D…, Lda ser a entidade empregadora da autora e a alvitrada situação de pluralidade de empregadores, acaba por rematar o seu percurso sem tomar posição definida sobre a sua posição na relação jurídico laboral com a autora, limitando-se concluir pela defesa de uma solução no plano dos factos, isto é, o que no seu entender “deve ser dado como demonstrado”. Para que melhor se perceba, transcreve-se de novo a conclusão 64:
- «Atento o exposto, deve ser dado como demonstrado que a Autora foi admitida na C…, Lda. em 03/1997, aí tendo trabalhado apenas até 11/1998 (quando fechou), data em que o passou a fazer para D…, Lda., na qual se manteve até 04/2011, ficando patente que a Autora trabalhou a maioria do tempo em questão no estabelecimento da D…, Lda. e para esta (12/1998 a 2011), de quem era, de facto, funcionária, o que deve ser tido em consideração à luz do imperativo da subordinação jurídica e, como tal, dado como provado».

II.4.1 É este, pois, o quadro com que nos deparamos no recurso.
Pois bem, impõe-se repor o rigor das coisas, retirando os efeitos da regra estabelecida nos artigos 387.º n.º 3, do CT/09 e 98.º J n.º1, do CPT.
Na comunicação de despedimento que entregou à trabalhadora a Ré assume-se clara e objectivamente como entidade empregadora.
Mais, também nada disso veio alegar no articulado motivador do despedimento. O que vem dizer é apenas que a autora “prestava de facto serviço, como empregada de balcão à sociedade D…, lda”, nada mais adiantando no restante alegado para afirmar que é esta a entidade empregadora ou que havia uma pluralidade de empregadores.
Mas ainda que o tivesse feito, o que viesse alegar não seria atendível, por extravasar “os factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador” [artigos 387.º n.º 3, do CT/09 e 98.º J n.º1, do CPT].
Por conseguinte, como se deixou dito, o Tribunal a quo não atendeu a esta regra quando se lançou a indagar sobre quem é a entidade empregadora da autora, atendendo a factos que não podia atender e, mais do que isso, fazendo até uma interpretação que não pode ter apoio no que foi alegado.
Significa isto, pois, que o tribunal a quo ao debruçar-se indevidamente sobre essa questão errou o julgamento da aplicação do direito aos factos. A correcta aplicação do direito impunha-lhe, antes, que tivesse tomado posição relativamente ao alegado, aplicando o disposto nos artigos 387.º n.º3 do CT/09 e 98.º J n.º1, do CPT.
Não sendo atendíveis as alegações que interpretou naquele sentido, apenas lhe cabia indagar sobre a regularidade e licitude do despedimento da autora, pela R. C…, lda, concretizado exclusivamente com a entrega da comunicação da extinção do posto de trabalho. Era esse, e nada mais do que isso, o ponto de partida para a apreciação da causa, delimitado pela própria Ré por efeito da declaração de extinção do posto de trabalho que entregou à autora.
Em suma era inquestionável e continua a sê-lo, por força do disposto naquelas disposições legais, a qualidade da Ré C…, Lda, com entidade empregadora da autora.
Apenas cabia ao tribunal a quo apreciar a regularidade e licitude do despedimento, questão que veio a apreciar mais adiante, após ter concluído pela improcedência da “tese da C…, L.da em como não era a entidade empregadora da trabalhadora requerente”, passando a pronunciar-se nos termos seguintes:
- «G. Assente esta questão prévia, é então chegado o momento de proceder à apreciação dos pedidos formulados por ambas as partes.
Conforme foi anteriormente referido, a C…, Lda. fez cessar o contrato de trabalho que a vinculava à trabalhadora requerente mediante a alegação de extinção do posto de trabalho desta.
H. A extinção do posto de trabalho autoriza a cessação do contrato de trabalho quando esta seja devida “…a motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos, relativos à empresa.” (art.º 367.º, n.º 1 do C. Trab.).
Por outro lado, e ainda de acordo com o preceituado pelo art.º 368.º, n.º 1 do C. Trab., “O despedimento por extinção de posto de trabalho só pode ter lugar desde que se verifiquem os seguintes requisitos:
a) Os motivos indicados não sejam devidos a conduta culposa do empregador ou do trabalhador;
b) Seja praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho;
c) Não existam, na empresa, contratos de trabalho a termo para tarefas correspondente às do posto de trabalho extinto;
d) Não seja aplicável o despedimento colectivo.”.
I. Novamente por apelo aos factos provados, verifica-se que a única diligência efectuada pela aqui entidade empregadora relativamente ao despedimento da trabalhadora requerente foi a referida comunicação escrita datada de 30.ABR.11; nada mais.
Ora, segundo o art.º 369.º, n.º 1 do C. Trab., “1 - No caso de despedimento por extinção de posto de trabalho, o empregador comunica, por escrito, à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão intersindical ou comissão sindical, ao trabalhador envolvido e ainda, caso este seja representante sindical, à associação sindical respectiva:
a) A necessidade de extinguir o posto de trabalho, indicando os motivos justificativos e a secção ou unidade equivalente a que respeita;
b) A necessidade de despedir o trabalhador afecto ao posto de trabalho a extinguir e a sua categoria profissional.”, sendo que, após essa comunicação, a entidade empregadora deve proceder às consultas prescritas no art.º 370.º do mesmo código, só depois podendo emitir a decisão de despedimento, da qual, de todo o modo, deve constar:
“a) Motivo da extinção do posto de trabalho;
b) Confirmação dos requisitos previstos no n.º 1 do artigo 368.º, com menção, sendo caso disso, da recusa de alternativa proposta ao trabalhador;
c) Prova da aplicação do critério de prioridades, caso se tenha verificado oposição a esta;
d) Montante, forma, momento e lugar do pagamento da compensação e dos créditos vencidos e dos exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho;
e) Data da cessação do contrato.” (art.º 371.º, n.º 2 do C. Trab.).
J. Nada disso a entidade empregadora invocou ou provou ter feito, porém.
Ora, de acordo com o preceituado no art.º 381.º, al. c) e no art.º 384.º do C. Trab. o despedimento da aqui trabalhadora requerente não pode deixar de ser havido como ilícito, com as legais consequências.
K. As consequências dessa ilicitude são as que se acham descritas nos art.ºs 389.º a 392.º do C. Trab.: indemnização do trabalhador despedido por todos os danos, patrimoniais e não - patrimoniais por ele sofridos e sua reintegração no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade.
No caso em apreço, considerando a intenção manifestada pela trabalhadora requerente em ser indemnizada em vez de reintegrada, será calculada a correspondente indemnização (art.º 391.º, n.º 1 do C. Trab.)».
Sendo certo que quanto a esta parte não se insurgiu a Ré, a mesma transitou em julgado, estando por isso vedada qualquer apreciação por este tribunal ad quem.
Assim sendo, nesta parte improcede o recurso.
Não obstante, para afastar qualquer dúvida por parte da Ré em razão de ver desatendida a sua argumentação pelas razões que se aduziram, iremos mais adiante.
Em suma, mesmo que se entenda que são aqui atendíveis os argumentos opostos no recurso à sentença pelo facto de o tribunal a quo se ter debruçado sobre a questão de saber se a Ré era, ou não, entidade empregadora da autora nunca assistiria razão à Recorrente.
Em primeiro lugar, a hipótese agora levantada pela R. sobre a possibilidade de se estar perante uma pluralidade de empregadores, nunca poderia ser objecto de apreciação, por se tratar de uma questão nova que não foi sujeita à apreciação do tribunal de 1ª instância, por isso não podendo este tribunal de recurso dela conhecer. Como tem sido entendimento corrente da doutrina e da jurisprudência, apenas nos casos expressamente previstos (cfr. artigo 665º nº 2, 608º, nº 2, in fine, CPC), pode o tribunal superior substituir-se ao tribunal que proferiu a decisão recorrida.
Com efeito, a jurisprudência tem reiteradamente entendido que os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais (artigos 627.º 1 e 639.º 1), através dos quais se visa reapreciar e modificar decisões e não criá-las sobre matéria nova, salvo quanto às questões de conhecimento oficioso [Cfr. Acórdãos do STJ (disponíveis em www.dgsi.pt): de 14-05-2015, proc.º 2428/09.1TTLSB.L1.S1 , Conselheiro Melo Lima; de 12-09-2013, proc.º 381/12.3TTLSB.L1.S1 e de 11-05-2011, proc.º786/08.4TTVNG.P1.S1, Conselheiro Pinto Hespanhol].
A este propósito, explica Abrantes Geraldes o seguinte:
- «A natureza do recurso como meio de impugnação de uma anterior decisão judicial, determina outra importante limitação ao seu objecto, decorrente do facto de, em regra, apenas poder incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o tribunal ad quem com questões novas. Na verdade, os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando, nos termos já referidos, estas sejam de conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha todos os elementos imprescindíveis.
Compreendem-se perfeitamente as razões por que o sistema assim foi arquitectado. A diversidade de graus de jurisdição determina que, em regra, os tribunais superiores apenas devam ser confrontados com questões que as partes discutiram nos momentos próprios» [Recursos no Novo Código de Processo Civil, Regime, Almedina, Coimbra, 2013, p. 87].
Por conseguinte, não se estando perante um dos casos em que é possível o conhecimento oficioso, sempre seria de rejeitar a apreciação dessa questão.
Restaria, pois, a questão de saber se a Ré é, ou não, entidade empregadora da autora.
Ora, salvo o devido respeito, pese embora os esforçados argumentos da Recorrente para pretender vir assumir uma posição que contraria a assumida na comunicação de despedimento, a mesma não tem cabimento.
Na verdade, a recorrente não pode esquecer um dado objectivo e essencial para apreciação dessa questão, ou seja, que entregou à autora uma declaração de extinção do posto de trabalho, da qual resulta inequivocamente que se assume como entidade empregadora.
Essa declaração consubstancia um documento particular, no qual, soba menção “A gerência” consta uma assinatura.
No que concerne à força probatória dos documentos particulares, estabelece o art.º 376º nº 1 do Código Civil: “o documento particular cuja autoria seja reconhecido nos termos dos artigos antecedentes faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento”. Acrescentando depois o nº 2 do mesmo artigo que “os factos compreendidos na declaração consideram-se provados na medida em que sejam contrários aos interesses do declarante; mas a declaração é indivisível, nos termos prescritos para a prova por confissão”.
Aquele nº 1, do art.º 376.º, refere-se expressamente à autoria do documento reconhecida nos termos dos artigos antecedentes, isto é, os documentos particulares devem ser assinados nos termos indicados pelo art.º 373º, sendo que, conforme estabelecido no art.º 374.º n.º1, “[A] letra e a assinatura, ou só a assinatura, de um documento particular consideram-se verdadeiras, quando reconhecidas ou não impugnadas pela parte contra quem o documento é apresentado, ou quando esta declare não saber se lhe pertencem, apesar de lhe serem atribuídas, ou quando sejam havidas legal ou judicialmente como verdadeiras”. Acrescentando o nº 2 desse mesmo artigo, que “se a parte contra quem o documento é apresentado impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, ou declarar que não sabe se são verdadeiras, não lhe sendo elas imputadas, incumbe à parte que apresentar o documento a prova da sua veracidade”. Por fim, “se estiverem reconhecidas presencialmente, nos termos das leis notariais, a letra e assinatura do documento, têm-se por verdadeiras”; e, “Se a parte contra quem o documento é apresentado arguir a falsidade do reconhecimento presencial da letra e assinatura, ou só da assinatura, a ela incumbe a prova dessa falsidade” (art.º 375.º n.ºs 1 e 2).
Como elucida o Ac. do STJ de 07/05/2009 [Proc.º n.º 09A0664, Conselheiro Garcia Calejo, disponível em www.dgsi.pt], deste regime decorre que “os documentos particulares assinados pelo seu autor, se não existir a impugnação a que aludem os arts. 374º e 375º, fazem prova plena em relação às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo, porém, da arguição e prova da sua falsidade. Fica, assim, plenamente provado que o autor proferiu essas declarações”.
Ora, revertendo ao caso, sendo certo e seguro que a R. nunca impugnou o documento por si subscrito, nos termos dos artigos 374.º e 375.º, do CC, o mesmo faz prova plena do conteúdo que a mesma dele fez constar, na parte que lhe é desfavorável, nomeadamente, ao afirmar-se como entidade empregadora da autora, nessa qualidade assumindo de forma inequívoca estar a declarar àquela “que o posto de trabalho da funcionária em referência, foi extinto”.
Mais, o mesmo é de dizer quanto à declaração de situação de desemprego entregue pela R. C…, lda, à autora, ai se indicando e identificando como entidade empregadora (facto 13).
Em conclusão, sempre improcederia o recurso nessa parte.
II.5 Resta a questão de saber se o tribunal a quo errou na fixação do valor me que condenou a R. a pagar à autora a título de retribuições que esta deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da sentença (conclusões 7 a 10).
Como deixámos afirmado inicialmente, a Recorrente colocou incorrectamente essa questão, confundindo o eventual erro de julgamento com nulidades da sentença.
A discordância da recorrente é dirigida à parte da sentença que se passa a transcrever:
- «N. A trabalhadora requerente demanda ainda da sua ex-entidade empregadora as retribuições desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da presente sentença.
Neste particular há que sublinhar que as retribuições são devidas – nos termos do art.º 390.º, n.º 1 do C. do Trabalho – até ao trânsito em julgado da decisão que declarou ilícito o despedimento; ou seja, e no caso vertente, até 30.AGO.15 (nos termos do art.º 390.º, n.º 2, al. b) do C. do Trabalho).
Assim, o montante em causa ascende, neste momento, a €26.260,00 (€505,00 x 52 meses).
O. Aos montantes acima referidos, há que deduzir a quantia de €7.543,80 que auferiu a título de subsídio de desemprego, que a trabalhadora requerente recebeu desde a cessação do seu contrato de trabalho (ponto 16.): art.º 390.º, n.º 2, al. c) do C. do Trabalho».
Argumenta a recorrente que não tendo sido produzida outra prova que permita concluir que o valor a deduzir seriam apenas 18 meses x €419,10, num total de €7.543,80 (ponto 16. da matéria de facto), deveria ter-se antes considerado provado que “A trabalhadora requerente recebeu, no mínimo, o subsídio de desemprego e subsídio social de desemprego subsequente no valor de €18.859,50 (€419,10 x 45 meses)”, sustentando que tendo resultado provado “que a trabalhadora prestou serviço de 2000 a 2011, pelo que, segundo o regime da protecção no desemprego então vigente (DL 220/2006, de 3 de Novembro, arts. 37º e 38º), teve direito a 900 dias de subsídio de desemprego e a subsídio social de desemprego subsequente por metade do tempo atribuído do primeiro (atenta a idade à data do término deste), logo, mais 450 dias, num total de 1350 dias de prestações (45 meses)”.
Noutra linha de argumentação, defende que não foram deduzidas “as retribuições que a Autora deixou de auferir do despedimento até trânsito em julgado os momentos em que a instância esteve parada por motivo não imputável às partes, a suspensão da instância entre as sessões de julgamento de 17/03/2015 e 04/05/2015 e todos os montantes de subsídio de desemprego recebidos (violando os arts. 98º-N e O do C.P.T. e 390º, n.º 2, do Código do Trabalho)”.
Vejamos então, começando por deixar nota das disposições jurídicas a atender.
O art.º 390.º do CT/09, estabelece o seguinte:
1 - Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento.
2 - Às retribuições referidas no número anterior deduzem-se:
a) As importâncias que o trabalhador aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento;
b) A retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento;
c) O subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período referido no n.º 1, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social.
Mas estando-se perante a acção especial de impugnação da regularidade e ilicitude do despedimento, cabe também atender ao disposto nos artigos 98.º N e 98.º O, do PT, onde se estabelece, no que aqui releva:
[Artigo 98.º-N Pagamento de retribuições intercalares pelo Estado
1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 390.º do Código do Trabalho, o tribunal determina, na decisão em 1.ª instância que declare a ilicitude do despedimento, que o pagamento das retribuições devidas ao trabalhador após o decurso de 12 meses desde a apresentação do formulário referido no artigo 98.º-C até à notificação da decisão de 1.ª instância seja efectuado pela entidade competente da área da segurança social.
2 - A entidade competente da área da segurança social é sempre notificada da decisão referida no número anterior, da interposição de recurso da decisão que declare a ilicitude do despedimento, bem como da decisão proferida em sede de recurso.
(..).
[Artigo 98.º-O Deduções]
1 - No período de 12 meses referido no artigo anterior não se incluem:
a) Os períodos de suspensão da instância, nos termos do artigo 276.º do Código de Processo Civil;
b) O período correspondente à mediação, tentativa de conciliação e ao aperfeiçoamento dos articulados;
c) Os períodos de férias judiciais.
2 - Às retribuições referidas no artigo anterior deduzem-se as importâncias referidas no n.º 2 do artigo 390.º do Código do Trabalho.
De acordo com o disposto no n.º1, do art.º 98 N, sem prejuízo de se proceder às deduções previstas no n.º2, do art.º 390.º, do CT, na decisão que declara a ilicitude do despedimento, o juiz deve ainda determinar “que o pagamento das retribuições devidas ao trabalhador após o decurso de 12 meses desde a apresentação do formulário referido no artigo 98.º-C até à notificação da decisão de 1.ª instância seja efectuado pela entidade competente da área da segurança social”.
Visou-se através desta norma desonerar o empregador da responsabilidade pelo pagamento de retribuições intercalares que sejam devidas ao trabalhador para além do que seria razoável, entendendo-se como tal 12 meses, na consideração de que não deve recair sobre as partes a consequência da morosidade na obtenção de decisão final, quando tal não seja resultado da sua conduta.
Os 12 meses contam-se a partir da apresentação do formulário referido no artigo 98.º-C até à notificação da decisão de 1.ª instância.
Por força do disposto no art.º 98.º O, no cômputo desses 12 meses não se incluem os períodos referido nas alíneas a) a c), do n.º1 do artigo.
A recorrente diz que não foi levado em consideração o período de suspensão da instância em 2015, não tendo por isso sido observado o disposto na alínea a), do n.º1, daquele artigo.
É certo que a instância foi declarada suspensa pelo período de dez dias, por decisão que acolheu o requerimento apresentado pelas partes nesse sentido, tendo em vista alcançarem a resolução do litígio por acordo. O despacho foi proferido no início da audiência de julgamento, em 17-03-2015.
Acontece, porém, que tendo a autora apresentado o requerimento a que alude o art.º 98.º D, do CPT, em 30-05-2011, quando foi requerida a suspensão da instância há muito que decorrera o prazo de 12 meses, ficando por isso prejudicada a aplicação do preceito.
Não tem, pois, razão a recorrente no argumento que invoca.
Contudo, como se constata pela fundamentação da sentença transcrita, o Tribunal a quo não fez, como devia, aplicação do disposto no artigos 98.º N e 98.º O, do CPT.
Com efeito, não determinou que as retribuições devidas à autora nos termos revistos no art.º 390.º, desde que vencidas “após o decurso de 12 meses deste a apresentação do formulário referido no art.º 98.º C, até à notificação da decisão de 1.ª instância” fossem efectuadas “pela entidade competente da área da segurança social” [art.º 98.º N.º 1]. Decidiu foi, contrariando o disposto naquela norma, condenar a Ré no pagamento de todas as retribuições intercalares, mesmo as vencidas após aqueles 12 meses.
Para aplicação desse preceito há que atender ao disposto no artigo 98.º O, aqui relevando a alínea c), que manda deduzir no cálculo daqueles 12 meses “Os períodos de férias judiciais”.
Cumprindo também assinalar que a aplicação deste regime é imposta oficiosamente ao tribunal, bastando atentar no n.º1, do art.º 98.º N, quando diz que “o tribunal determina”.
Na verdade, o Tribunal a quo apenas aplicou o art.º 390.º n.º2, al. c), mas também aqui, diga-se, incorrectamente, visto que procedeu à dedução da “quantia de €7.543,80 que [a A] auferiu a título de subsídio de desemprego”, mas não determinou que a Ré procedesse à entrega do correspondente montante à segurança social, quando aquela norma expressa claramente “devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social”.
Impõe-se, pois, alterar a sentença na parte em que não cumpriu o disposto nos artigos 98.º N e 98.º O, CPT.
Para a aplicação do disposto na alínea c), do art.º 98.º C, que manda deduzir os períodos de férias judiciais no cômputo dos 12 meses referidos no n.º1, do art.º 98.º N, cabe atender à Lei 3/99, de 13 de Janeiro, por ser a então vigente, na versão que vigorava à data por força das sucessivas alterações de que foi objecto, relevando aqui a introduzida pela Lei 43/2010, de 3 de Setembro, alterando os períodos de férias judiciais. Mais precisamente, o art.º 1.º, da lei 43/2010, veio estabelecer o seguinte:
- «O artigo 12.º da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, que aprova a Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, na redacção dada pela Lei n.º 42/2005, de 29 de Agosto, passa a ter a seguinte redacção:
«Artigo 12.º
[...]
As férias judiciais decorrem de 22 de Dezembro a 3 de Janeiro, do domingo de Ramos à segunda - feira de Páscoa e de 16 de Julho a 31 de Agosto.
Aplicando esse preceito ao caso, após a apresentação do requerimento previsto no art.º 98.º C, pela autora, em 30-05-2011, tiveram lugar as férias judiciais de 16 de Julho a 31 de Agosto – 47 dias -, as de 22 de Dezembro a 3 de Janeiro – 13 dias – e, já no ano de 2012, as do domingo de Ramos à segunda-feira de Páscoa -7 dias. O somatório daqueles valores parciais perfaz um total de 67 dias de férias a serem deduzidos aos 12 meses. Feita essas deduções nos períodos em causa, verifica-se que em 15 de Julho de 2012, isto é, quando se iniciou novo período de férias judiciais – de 15 de Julho a 31 de Agosto - ainda faltavam 5 dias para se completarem 12 meses. Assim, há que deduzir ainda esse período, pelo que os 12 meses concluíram-se a 5 de Setembro de 2012.
Significa isto, pois, que a partir de Setembro de 2012 (inclusive) tem aplicação o disposto no n.º 1 do art.º 98.º N e, logo, deveria a 1.ª instância ter determinado que o pagamento das retribuições intercalares devidas à trabalhadora, deduzidas do que houver recebido nos termos previstos no art.º 390.º 2, do CT/09, passasse a ser efectuado pela entidade competente da segurança social. Como assim não procedeu, deve ser agora determinado por esta instância de recurso, em substituição do tribunal a quo.
Até aquela data, ou seja, 5 de Setembro de 2012, a responsabilidade pelo pagamento das retribuições intercalares recai sobre a recorrente, naturalmente também sem prejuízo do disposto no artigo 390.º2 do CT, isto é, de se operar a dedução do subsídio de desemprego que foi auferido pela Autora. Porém, para além disso, pela mesma ordem de razões, cabe determinar que a R. proceda à entrega do montante que for deduzido à segurança social.
Consta provado que [16] A trabalhadora requerente auferiu o subsídio de desemprego no valor de €7.543,80 (18 meses x €419,10). Não resulta do facto quando se iniciou o pagamento, mas em regra o mesmo é devido desde o despedimento. Mas a eventual dúvida pode ser dissipada com segurança, dado que o facto resulta do alegado pela autora no artigo 10.º do requerimento apresentado em 4-03-2013, com o propósito de liquidar os valores devidos pela Ré, lendo-se: “Sendo que desde a data de despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença auferiu o subsídio de desemprego no valor de €7.543,80 (18 meses x 419,10)” [a autora referia-se à sentença proferida 98.º J,n.º3, posteriormente englobada nos actos anulados pelo primeiro acórdão desta Relação].
O despedimento concretizou-se a 30 de Abril de 2011, pelo que aqueles 18 meses estendem-se até Outubro de 2012, indo para além de 5 de Setembro de 2012, ou seja, da data em que se considerou terem-se completado 12 meses após a apresentação pela autora do requerimento a que alude o art.º 98.ºD.
Em suma, ao montante das retribuições devidas à autora deve ser deduzido o valor que aquela recebeu a título de subsídio de desemprego desde o despedimento, mas passando a recair sobre a Ré o dever de entregar essa quantia à segurança social [alínea c), do n.º2, do artigo 390.º, CT]. Por outro lado, como haverá que aplicar o n.º1, do art.º 98.º N, para efeitos dos cálculos releva apenas o período até 5 de Setembro de 2012.
Procedendo aos cálculos, desde 30 de Abril de 2011 até Setembro de 2012 (quando se completaram os 12 meses a que alude o art.º 98.º N], decorreram 15 meses. E, para além disso, venceram-se os subsídios de férias e de Natal de 2011, que igualmente integram as retribuições intercalares devidas à trabalhadora em consequência da ilicitude do despedimento.
A trabalhadora auferia à data da cessação do seu contrato de trabalho (30.ABR.11), a retribuição mensal de €505,00. Assim, as retribuições intercalares da responsabilidade da R. perfazem €8.585,00 [17 x €505,00].
Como a Autora até Setembro recebeu da segurança social, a título de subsídio de desemprego a quantia mensal de €419,10, perfazendo €6.286,50 em 16 meses, será este o valor a deduzir àquele, mas significando apenas que não será pago à autora, visto que já o recebeu da segurança social, por isso devendo ser entregue pela Ré à segurança social.
Apura-se, pois que o valor a ser pago pela Recorrente à autora é de €2.298,50.
E, assim, fica definida a responsabilidade da Ré no que concerne ao direito da autora a receber as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento, uma vez que entretanto não ocorreu o trânsito em julgado de decisão declarando a ilicitude do despedimento.
Mas como se deixou explicado, esse direito da autora não fica prejudicado, sendo assegurado a partir de Setembro e até ao trânsito em julgado da presente decisão, pela segurança social, nos termos determinados pelo artigo 98.º N. do CPT n.º1.
No entanto, ao montante das retribuições que entretanto deixou de auferir e que serão asseguradas pela segurança social, caberá deduzir, nos termos das alíneas a) e c), do n.º2, do art.º 390.º, CT:
i) As importâncias que a trabalhadora entretanto tenha auferido, a partir de Setembro de 2012.
ii) O subsídio de desemprego que lhe tenha sido atribuído a partir de Setembro de 2012.
Visa-se assim, como bem se percebe, obstar à percepção de rendimentos pela trabalhadora em duplicado e sem justificação.
Por conseguinte, ainda que com fundamento diverso do invocado pela recorrente, nesta parte a impugnação procede parcialmente. Por outro lado, fica prejudicada a outra linha de argumentação da recorrente, sobre o montante que no seu entender deveria ser deduzido ao que lhe cabe pagar à autora a título de retribuições, visto que as mesmas passam a ser asseguradas pela segurança social a partir de 5 de Setembro de 2012.
Retiremos, pois as consequências do decidido.
O Tribunal a quo, por efeito da declaração de ilicitude do despedimento, condenou a recorrente C…, L.da “a pagar à trabalhadora requerente B… a quantia global de €26.291,20 (vinte e seis mil, duzentos e noventa e um euros e vinte cêntimos) a título de indemnização por despedimento ilícito, por retribuições vencidas desde a data do despedimento até à presente data e por proporcionais de férias de 2011, subsídio de férias de 2011 e de proporcionais de subsídio de Natal de 2011, já deduzida do montante que a trabalhadora requerente auferiu a título de subsídio de desemprego”.
Recorrendo à fundamentação para se perceber quais foram os valores fixados respeitantes a cada um daqueles títulos, resulta o seguinte:
i - A indemnização em função da antiguidade foi fixada em €7.070,00 (14 anos x €505,00).
ii- Os proporcionais de férias de 2011, subsídio de férias de 2011 e proporcionais de subsídio de Natal de 2011 (ponto 15.), fora fixados em €505,00 (€505,00/12 meses x 4 meses x 3 retribuições).
ii - As retribuições intercalares foram fixadas em €26.260,00 (€505,00 x 52 meses), considerando o período que decorreu desde o despedimento até à prolação da sentença, tendo sido deduzido àquele valor o montante a quantia de €7.543,80 auferida a título de subsídio de desemprego.
Recorde-se, apenas é objecto de recurso esta última parte da condenação.
Por conseguinte, aquela parte do dispositivo deve ser alterada para, em conformidade com o que se vem expondo, a Ré C…, lda, passar a ser condenada a pagar à autora a quantia global de €9.873,50, resultando dos valores seguintes: a título de indemnização por despedimento [€7.070,00]; por retribuições vencidas desde a data do despedimento e até 12 meses sobre a apresentação do formulário referido no art.º 98.º C, do CPT [€8.585,00], deduzidas do montante que a A. auferiu naquele período a título de subsídio [€6.286,50], perfazendo €2.298,50; proporcionais de férias de 2011, subsídio de férias de 2011 e de proporcionais de subsídio de Natal de 2011, no valor de €505,00 (€505,00/12 meses x 4 meses x 3 retribuições).
Para além disso, impõe-se acrescentar dois pontos.
i) Determinando que a R. proceda à entrega à segurança social da quantia de €6.286,50, deduzida ao valor das retribuições intercalares vencidas desde a data do despedimento e até 12 meses sobre a apresentação do formulário referido no art.º 98.º C, do CPT [€8.585,00].
ii) Determinando que as retribuições que seriam auferidas pela A., não fora o despedimento ilícito, a partir de Setembro de 2012 (inclusive), no montante de €505,00 mensais, acrescidas de subsídios de férias e Natal em igual montante, vencidas até à notificação da sentença recorrida, efectuada em 15-02-2017, sejam asseguradas pela segurança social, nos termos previstos no art.º 98.º N, n.º1, do CPT em conjugação co o art.º 390.º n.º2, do CT, mas deduzidas das importâncias que a trabalhadora entretanto tenha auferido e que não receberia se não fosse o despedimento, bem como do subsídio de desemprego que desde aquele mês lhe tenha continuado a ser pago.
No mais será mantida a sentença.
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Considerando o disposto no art.º 527.º n.º1 e 2, do NCPC, a responsabilidade pelas custas recai sobre a recorrente e a recorrida, na proporção do decaimento, que se entende fixar, respectivamente, em 9/10 e 1/10.
III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar o recurso parcialmente procedente, em consequência alterando a sentença na parte em que condena “a entidade empregadora C…, L.da a pagar à trabalhadora requerente B… a quantia global de €26.291,20 (vinte e seis mil, duzentos e noventa e um euros e vinte cêntimos) a título de indemnização por despedimento ilícito, por retribuições vencidas desde a data do despedimento até à presente data e por proporcionais de férias de 2011, subsídio de férias de 2011 e de proporcionais de subsídio de Natal de 2011, já deduzida do montante que a trabalhadora requerente auferiu a título de subsídio de desemprego”, para em substituição se decidir o seguinte:
A. (decisão em substituição).
i) Condenar a Ré C…, lda, a pagar à autora a quantia global de €9.873,50, resultando dos valores seguintes: a título de indemnização por despedimento [€7.070,00]; por retribuições vencidas desde a data do despedimento e até 12 meses sobre a apresentação do formulário referido no art.º 98.º C, do CPT [€8.585,00], deduzidas do montante que a A. auferiu naquele período a título de subsídio [€6.286,50], perfazendo €2.298,50; proporcionais de férias de 2011, subsídio de férias de 2011 e de proporcionais de subsídio de Natal de 2011, no valor de €505,00 (€505,00/12 meses x 4 meses x 3 retribuições).
ii) Mais se condenando a R. C…, Lda a entregar à segurança social a quantia de €6.286,50;
iii) Determinando-se, ainda, que as retribuições que seriam auferidas pela A. não fora o despedimento ilícito, a partir de Setembro de 2012 (inclusive), no valor de €505,00 mensais, acrescidas de subsídios de férias e Natal em igual montante, vencidas até à notificação da sentença recorrida, efectuada em 15-02-2017, sejam asseguradas pela segurança social, nos termos previstos no art.º 98.º N, n.º1, do CPT em conjugação com o art.º 390.º n.º2, do CT, mas deduzidas das importâncias que a trabalhadora entretanto tenha auferido e que não receberia se não fosse o despedimento, bem como do subsídio de desemprego que desde aquele mês lhe tenha continuado a ser pago.
B. Quanto ao mais decidido, mantém-se a sentença recorrida.
Custas pela recorrente pela recorrida, na proporção do decaimento, que se entende fixar, respectivamente, em 9/10 e 1/10, mas sem prejuízo de apoio judiciário.

Porto, 6 de Novembro de 2017
Jerónimo Freitas
Nelson Fernandes
Rita Romeira
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SUMÁRIO
I - As nulidades da sentença não incluem o “chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário”. A nulidade da sentença e o erro de julgamento são realidades diversas que não devem ser confundidas.
II - A legitimidade processual constituiu um pressuposto processual relativo às partes, que se afere, na falta de indicação da lei em contrário, face à relação material controvertida tal como configurada pelo A., e cuja falta, determina a verificação da correspondente exceção dilatória, dando lugar à absolvição do Réu da instância (artigos 30.º, 278.º n.º 1 al. d), 576.º 1 e 2, e 577.º al. e), todos do CPC). Outra, bem diferente, é a legitimidade substancial ou substantiva, que tem que ver com a efetividade da tal relação material, interessando já ao mérito da causa.
III - Dos artigos 387.º n.º 3, do CT/09 e 98.º J n.º1, do CPT, resulta que o empregador, no articulado motivador do despedimento “apenas pode invocar os factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador”. Significa isto, que caso o empregador venha alegar factos e fundamentos à margem dos que fez constar na decisão de despedimento, isto é, extravasando o núcleo delimitado por aqueles, essa alegação não pode ser atendida pelo tribunal na acção de apreciação da regularidade e licitude do despedimento.
IV - Os documentos particulares assinados pelo seu autor, se não existir a impugnação a que aludem os arts. 374º e 375º, fazem prova plena em relação às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo, porém, da arguição e prova da sua falsidade. Fica, assim, plenamente provado que o autor proferiu essas declarações.
V - Sendo certo que R. nunca impugnou o documento por si subscrito e entregue autora, nos termos dos artigos 374.º e 375.º, do CC, o mesmo faz prova plena do conteúdo que a mesma dele fez constar, na parte que lhe é desfavorável, nomeadamente, ao afirmar-se como entidade empregadora da autora, nessa qualidade assumindo de forma inequívoca estar a declarar àquela “que o posto de trabalho da funcionária em referência, foi extinto”.
VI - De acordo com o disposto no n.º1, do art.º 98 N, sem prejuízo de se proceder às deduções previstas no n.º2, do art.º 390.º, do CT, na decisão que declara a ilicitude do despedimento, o juiz deve ainda determinar “que o pagamento das retribuições devidas ao trabalhador após o decurso de 12 meses desde a apresentação do formulário referido no artigo 98.º-C até à notificação da decisão de 1.ª instância seja efectuado pela entidade competente da área da segurança social”.
VII - Visou-se através desta norma desonerar o empregador da responsabilidade pelo pagamento de retribuições intercalares que sejam devidas ao trabalhador para além do que seria razoável, entendendo-se como tal 12 meses, na consideração de que não deve recair sobre as partes a consequência da morosidade na obtenção de decisão final, quando tal não seja resultado da sua conduta.
VIII - Aplicação deste regime é imposta oficiosamente ao tribunal, bastando atentar no n.º1, do art.º 98.º N, quando diz que “o tribunal determina”.

Jerónimo Freitas