Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
11285/15.8T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MIGUEL BALDAIA DE MORAIS
Descritores: CONTRATO DE EMPREITADA
DIREITOS DE TERCEIROS
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
Nº do Documento: RP2020120911285/15.8T8PRT.P1
Data do Acordão: 12/09/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Num contrato de empreitada, para além da responsabilidade civil contratual, ou seja, a que respeita à execução da empreitada e se inscreve no âmbito das suas relações com o dono da obra, o empreiteiro é também responsável no âmbito dessa sua actividade se na execução dos trabalhos para a realização da obra, desrespeitar ilicitamente e com culpa direitos de terceiro, provocando-lhe danos. Neste caso, a responsabilidade civil do empreiteiro assume, essencialmente, uma natureza delitual, seguindo o regime geral do artigo 483º do Código Civil.
II - Na aferição da culpa do empreiteiro perante o terceiro deve atender-se a um critério do profissional razoável, tomando como medida da diligência exigível a do profissional medianamente diligente.
III - O facto que atuou como condição do dano só deixará de ser considerado como causa adequada se, dada a sua natureza geral, se mostrar de todo indiferente para a verificação do dano, tendo-o provocado só por virtude das circunstâncias excecionais, anormais, extraordinárias ou anómalas que intercedam no caso concreto.
IV - Em princípio, o prazo da prescrição da responsabilidade civil extracontratual fixado no artigo 498º, nº 1 do Código Civil inicia-se logo a partir do momento em que a infracção foi cometida.
V - No entanto, em relação aos danos não verificados à data em que ocorreu o facto ilícito e este assuma natureza de facto continuado, esse prazo só começa a correr a partir do momento em que o lesado tomou conhecimento da produção efectiva dos novos danos.
VI - Nesse contexto, para operar a prescrição, compete ao prescribente - em conformidade com os critérios gerais de repartição do ónus da prova estabelecidos no art. 342º do Código Civil - a demonstração dos factos tendentes ao preenchimento dos elementos da norma que convocou em arrimo da sua tese defensional, ou seja, caber-lhe-á alegar e provar que um concreto dano (resultante de facto continuado) ocorreu e chegou ao conhecimento do lesado em determinada data, e que entre essa data e o momento em que foi citado para a ação já haviam decorrido mais de três anos, sem prejuízo da prescrição ordinária.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 11285/15.8T8PRT.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Porto –Juízo Local Cível, Juiz 1
Relator: Miguel Baldaia Morais
1º Adjunto Des. Jorge Miguel Seabra
2º Adjunto Des. Pedro Damião e Cunha
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Sumário
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I- RELATÓRIO

B… e C… intentaram a presente acção declarativa com processo comum contra “D…, Lda.” e “E…, Sucursal em Portugal” na qual concluem pedindo a condenação solidária destas a pagar-lhes a quantia de 23.896,89 €.
Para substanciarem tal pretensão alegam que por força das obras levadas a cabo pela “D…” no edifício onde se situa a sua fracção autónoma, no âmbito de contrato de empreitada celebrado entre aquela e a administração do condomínio, a sua referida habitação sofreu infiltrações e humidades.
Mais alegam que tais humidades danificaram a fracção, designadamente, as paredes e o soalho de alguns cómodos, bem como diversos bens que aí se encontravam, sendo que para reparação desses danos pagaram a entidade terceira a quantia de 13.551,89 €, tendo ainda despendido 450 € na reparação do mobiliário aí existente.
Referiram, igualmente, que o estado em que a fracção se encontrava impossibilitava a sua permanência na mesma, pelo que tiveram necessidade de se ausentar da mesma, tendo pago, em arrendamento temporário, a quantia de 2.895 €.
Deram conta, além disso, que da situação descrita lhes advieram danos morais, cuja compensação estimam em 7.000,00€.
Finalmente alegam terem celebrado com a R. “E…” contrato de seguro nos termos do qual esta se obrigou ao pagamento dos danos ocorridos na sua habitação.
A ré “D…” apresentou contestação, invocando, desde logo, a excepção de litispendência, sustentando que o objecto da presente acção coincide com o da ação que, então, corria termos, sob o nº 984/12.6 TJPRT, pelo Juízo Central Cível do Porto (J5), no âmbito da qual o condomínio do edifício onde se situa a fracção dos autores (réu nessa acção) deduziu pedido reconvencional, peticionado a erradicação das anomalias ora invocadas. Defendeu-se ainda por exceção peremptória, invocando a excepção de prescrição, pelo decurso do prazo de três anos previsto no art. 498º do Cód. Civil e bem assim a caducidade do direito dos autores, caso se entenda estar em causa responsabilidade contratual, nos termos do art. 1225º, nº 2, do Cód. Civil.
No mais, impugnou a factualidade alegada pelos autores, afirmando, designadamente, que as anomalias que provocaram a infiltração já existiam antes da realização das obras que levou a cabo na sequência do contrato de empreitada que celebrou com o condomínio.
Pugnou, finalmente, pela condenação dos autores como litigantes de má-fé.
Por seu turno, a R. “E…”, em contestação, admitiu a celebração do contrato de seguro celebrado com os autores, sustentando, no entanto, que os danos em causa nesta ação não se encontram cobertos pelo mesmo.
Por despacho de fls. 151 foi rejeitada a verificação da excepção de litispendência aludida pela R. “D…”. Nesse despacho, determinou-se, igualmente, a suspensão da instância até ao trânsito da decisão a proferir no processo referido pela aludida ré. Após, cessada a suspensão, foi proferido despacho saneador em termos tabelares, definiu-se o objecto do litígio e fixaram-se os temas da prova.
Realizou-se a audiência final, vindo a ser proferida sentença na qual se decidiu:
. «Julgara presente acção parcialmente procedente e, em consequência, condenar a R. “D…, Lda.” a pagar aos AA. B… e C… a quantia de 13 551,89 € (treze mil, quinhentos e cinquenta e um euros e oitenta e nove cêntimos);
. Absolver a R. “D…, Lda.” dos restantes pedidos contra si formulados pelos AA.;
. Absolver ainda a R. “E…” da totalidade dos pedidos contra si formulados pelos AA.».
Não se conformando com o assim decidido, veio a R. “D…, Lda. interpor o presente recurso, que foi admitido como apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes
CONCLUSÕES:
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Os autores apresentaram contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.
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Após os vistos legais, cumpre decidir.
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II- DO MÉRITO DO RECURSO
1. Definição do objeto do recurso

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil[1].
Porque assim, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pela apelante, são as seguintes as questões solvendas:
. determinar se o tribunal a quo incorreu num error in iudicando, por deficiente avaliação ou apreciação das provas e assim na decisão da matéria de facto;
. decidir em conformidade face à alteração, ou não, da matéria factual, mormente se se mostram verificados os pressupostos para responsabilizar civilmente a ré/apelante;
. da prescrição do direito dos autores.
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2. Recurso da matéria de facto
2.1. Factualidade considerada provada na sentença

O tribunal de 1ª instância considerou provada a seguinte matéria de facto:
1 – Os AA. são donos e proprietários, encontrando-se registada a seu favor, desde 2-3-2011, a respectiva aquisição, da fracção autónoma designada pela letra “G”, correspondente ao 1º andar direito do prédio urbano, constituído em propriedade horizontal, sito na Rua …, nº …, freguesia …, concelho do Porto, descrito na Conservatória de Registo Predial do Porto sob o nº 1853 e inscrito na matriz urbana sob o art. 12368º.
2 – A R. “D…, Lda.” é uma empresa de construção civil.
3 – No dia 8-10-2010, foi celebrado entre “Edifício F…, sito na Rua …, nº …/… (…)”, representado pela “G…”, na qualidade de dono da obra, e a R. “D…, Lda”, na qualidade de empreiteiro, o “contrato de empreitada” de fls. 12-verso e segs..
4 – Por força desse contrato, a R. “D…” obrigou-se a executar trabalhos de reabilitação do “Edifício F…”, onde se situa a fracção referida em 1).
5 – Além do mais, nos termos do documento anexo a esse contrato, constante de fls. 15-verso e segs., a R. “D…” obrigou-se:
- à “Substituição soleiras portas acesso ao terraço: Desmontagem e posterior montagem de caixilharia. Remoção das soleiras existentes de forma a realizar um encastramento correcto da impermeabilização. Fornecimento e aplicação de novas soleiras idênticas às existentes de acordo com disponibilidade do mercado”; e
- à “Desmontagem dos Tubos de Queda existentes e remoção a vazadouro. Fornecimento e aplicação de novos tubos de queda e acessórios de fixação, em “PVC”, incluindo lixagem prévia das superfícies e pintura em duas demãos com tinta de esmalte tipo “Sintecin” da CIN”.
6 – Após a realização, pela R. “D…”, das obras referidas, começaram a surgir manchas de humidade e bolhas de água nas paredes das divisões adjacentes ao terraço da fracção autónoma referida em 1), designadamente, no escritório e no quarto.
7 – Passado algum tempo, a tinta das paredes dessas divisões começou a apodrecer e a ceder.
8 – Os locais das paredes onde surgiram tais humidades situavam-se em zona próxima de tomadas eléctricas e interruptores.
9 – No solo, o pavimento revestido a soalho de madeira começou a levantar-se.
10 – O rodapé descolou-se da parede.
11 – O guarda-vestidos embutido existente no quarto ficou com a madeira estragada.
12 – A entrada de humidade acima referida na fracção mencionada em 1) ficou a dever-se à acumulação de águas pluviais no terraço adjacente a tal fracção, a qual entrou na fracção pela soleira da porta que dá acesso a tal terraço, soleira esta que apresentava uma configuração que não impedia tal entrada da água.
13 – A entrada de humidade e a consequente deterioração das paredes e do pavimento do escritório e do quarto acima referidos iniciou-se em data não concretamente apurada, mas situada anteriormente a 2-4-2012.
14 – Em 2014, os AA. tinham um filho com dois anos, encontrando-se a A. mulher grávida de um segundo filho, o qual veio a nascer em 29-8-2014.
15 – Em dia não concretamente apurado mas situada em Abril de 2014, os AA. solicitaram a “H…, Lda.”, que aceitou, a reparação das paredes, do tecto e do pavimento dos mencionados quarto e escritório.
16 – A referida “H…, Lda.” levou a cabo as referidas obras de reparação.
17 – O custo da reparação das anomalias aludidas em 6) a 11) ascende a 13 551,89 €.
18 – Entre os AA., na qualidade de tomadores, e a R. “E…”, na qualidade de seguradora, foi celebrado o contrato de seguro do ramo “Lar”, com a apólice nº ……., constante de fls. 123 e segs. e 219 e segs..
19 – Tal contrato teve o seu início de vigência em 2-3-2011.
20 – Tal contrato teve por objecto a garantia dos danos causados aos bens seguros decorrentes dos riscos, entre outros, de incêndio, raio e explosão, tempestades, inundações e danos por água, ocorridos no interior da fracção referida em 1), tendo tais riscos, como limite de indemnização, o valor de 281 066,24 €, sendo aplicável uma franquia de 10%, no mínimo de 50 €.
21 – Consta da cláusula 2.4 das “Condições gerais” desse contrato que a cobertura “danos por água” garante “os danos causados aos bens seguros, de carácter súbito e imprevisto, em consequência de ruptura, defeito, entupimento ou transbordamento da rede interior de distribuição de água e esgotos do edifício (incluindo nestes os sistemas de esgotos de águas pluviais), assim como dos aparelhos ou utensílios ligados à rede de distribuição de água e esgotos do mesmo edifício e respectivas ligações”.
22 - Consta da cláusula 6ª, nº 4, das condições gerais desse contrato que se consideram excluídos da cobertura de danos por água os danos resultantes de:
“(…)
b) entrada de água das chuvas através de telhados, portas, janelas, clarabóias, terraços e marquises, e ainda o refluxo de águas provenientes de canalizações ou esgotos não pertencentes ao edifício;
c) infiltrações através de paredes e/ou tectos, humidade e/ou condensação, excepto quando se trate de danos resultantes das coberturas contempladas nesta cláusula.”.
23 – A R. “D…” deu a obra por concluída em data não concretamente apurada, mas situada entre Julho de 2011 e Outubro de 2011.
24 – Antes da realização da obra levada a cabo pela “D…”, a fracção referida em 1) já havido sofrido infiltrações decorrentes da deficiente configuração das soleiras das portas que dão para o terraço e da configuração inadequada dos sistemas de drenagem de águas pluviais ao nível dos terraços acessíveis.
25 – Por carta remetida à R. em 17-2-2014, constante de fls. 65, o A. B… comunicou-lhe o surgimento de danos na fracção referida em 1), materializados em infiltrações e humidades que surgiram nas paredes de dois quartos e deterioração do pavimento dos mesmos, mais solicitando a respectiva reparação no prazo de 10 dias.
26 – A R. “D…” instaurou acção judicial contra o “Condomínio” do edifício onde se situa a fracção referida em 1), a qual correu termos sob o nº 984/12.5 TJPRT, no Juízo Central Cível do Porto - J 5.
27 – Nessa acção, em sede de reconvenção, o “Condomínio” alegou a existência de defeitos da obra, designadamente, a ocorrência de “infiltrações de águas em todas as divisões da fracção “G” [a referida em 1)] e subsequentes deteriorações dos respectivos pavimentos, paredes e tectos”, mais pedindo a condenação da “D…” a repará-los.
28 – Na sentença proferida nessa acção, em 13-12-2016, transitada em julgado em 20-12-2017, foi dado como provado, além do mais, o seguinte:
“XXXVIII – Verificam-se infiltrações em um dos quartos da fracção “G”, habitação no 1º andar com entrada pelo nº … da Rua …, e subsequentes deteriorações dos revestimentos de pavimentos e paredes.
Sendo a causa destas a humidade ascendente associada à deficiente solução adoptada para a substituição do tudo de queda de águas pluviais, que descarrega sem espalhador para o terraço (art. 71º da contestação”).”
29 – Nessa sentença, foi a aqui R. “D…” condenada a proceder à reparação da infiltração acima referida.
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2.2. Factualidade considerada não provada na sentença

O tribunal de 1ª instância considerou não provados os seguintes factos:
1 – Por força da humidade surgida na fracção referida em 1), um espelho que se encontrava colocado numa das paredes ficou com a moldura de madeira empolada, cascada e suja.
2 - Por força da humidade surgida na fracção referida em 1), uma cómoda ali existente ficou com a madeira húmida e suja.
3 – E um equipamento eléctrico de aquecimento central fixo numa das paredes ficou avariado.
4 - As cortinas ficaram com manchas de humidade.
5 – Na reparação das peças referidas em 1) a 4), os AA. despenderam 450 €.
6 – Por força da humidade surgida na fracção referida em 1) dos “factos provados”, o cheiro decorrente dos focos de humidade era nauseabundo, ficando o ar existente nessas divisões carregado de humidade e irrespirável.
7 – Todas as ligações eléctricas das referidas divisões, designadamente, tomadas e interruptores, foram desligadas.
8 - O restante mobiliário que se encontrava no interior das divisões teve de ser retirado com vista a evitar a sua deterioração.
9 – Atentas as condições que a fracção apresentava por força daquela humidade, os AA. ausentaram-se da mesma e procederam ao arrendamento de uma outra habitação.
10 – No arrendamento dessa habitação, os AA. despenderam 2.895 €.
11 – A título de retribuição pelas reparações efectuadas, os AA. pagaram à referida “H…, Lda.” a quantia de 13 551,89 €.
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2.3. Apreciação da impugnação da matéria de facto

Nas conclusões recursivas veio a apelante requerer a reapreciação da decisão de facto, em relação a um conjunto de factos julgados provados, com fundamento em erro na apreciação da prova.
Como é consabido, o art. 640º estabelece os ónus a cargo do recorrente que impugna a decisão da matéria de facto, nos seguintes termos:
1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3. […]
O presente regime veio concretizar a forma como se processa a impugnação da decisão, reforçando o ónus de alegação imposto ao recorrente, prevendo que deixe expresso a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação em sede de reapreciação dos meios de prova.
Recai, assim, sobre o recorrente, face ao regime concebido, um ónus, sob pena de rejeição do recurso, de determinar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar – delimitar o objeto do recurso -, motivar o seu recurso através da transcrição das passagens da gravação que reproduzem os meios de prova, ou a indicação das passagens da gravação que, no seu entendimento, impunham decisão diversa sobre a matéria de facto - fundamentação - e ainda, indicar a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação.
No caso concreto, realizou-se o julgamento com gravação dos depoimentos prestados em audiência e a apelante impugnou a decisão da matéria de facto, com indicação dos pontos de facto impugnados, prova a reapreciar e decisão que sugere, mostrando-se, assim, reunidos os pressupostos de ordem formal para proceder à reapreciação dessa decisão.
Tal como dispõe o nº 1 do art. 662º a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto “[…] se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”, o que, na economia do preceito, significa que os poderes para alteração da matéria de facto conferidos ao tribunal de recurso constituem apenas um remédio a utilizar nos casos em que os elementos constantes dos autos imponham inequivocamente (em termos de convicção autónoma) uma decisão diversa da que foi dada pela 1ª instância.
No presente processo a audiência final processou-se com gravação da prova pessoal prestada nesse ato processual.
A respeito da gravação da prova e sua reapreciação, haverá que ter em consideração, como sublinha ABRANTES GERALDES[2], que funcionando o Tribunal da Relação como órgão jurisdicional com competência própria em matéria de facto, nessa reapreciação tem autonomia decisória, devendo consequentemente fazer uma apreciação crítica das provas, formulando, nesse julgamento, com inteira autonomia, uma nova convicção, com renovação do princípio da livre apreciação da prova.
Assim, competirá ao Tribunal da Relação reapreciar as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações do recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados.
Decorre deste regime que o Tribunal da Relação tem acesso direto à gravação oportunamente efetuada, mesmo para além dos concretos meios probatórios que tenham sido indicados pelo recorrente e por este transcritos nas alegações, o que constitui uma forma de atenuar a quebra dos princípios da imediação e da oralidade suscetíveis de exercer influência sobre a convicção do julgador, ao mesmo tempo que corresponderá a uma solução justificada por razões de economia e celeridade processuais[3].
Cumpre ainda considerar a respeito da reapreciação da prova, que neste âmbito vigora o princípio da livre apreciação, conforme decorre do disposto no art. 396º do Cód. Civil.
Daí compreender-se o comando estabelecido na lei adjetiva (cfr. art. 607º, nº 4) que impõe ao julgador o dever de fundamentação da materialidade que considerou provada e não provada.
Esta exigência de especificar os fundamentos decisivos para a convicção quanto a toda a matéria de facto é essencial para o Tribunal da Relação, nos casos em que há recurso sobre a decisão da matéria de facto, poder alterar ou confirmar essa decisão.
É através dos fundamentos constantes do segmento decisório que fixou o quadro factual considerado provado e não provado que este Tribunal vai controlar, através das regras da lógica e da experiência, a razoabilidade da convicção do juiz do Tribunal de 1ª instância.
Atenta a posição que adrede vem sendo expressa na doutrina e na jurisprudência, quando o Tribunal da Relação é chamado a pronunciar-se sobre a reapreciação da prova, no caso de se mostrarem gravados os depoimentos, deve considerar os meios de prova indicados pela partes e confrontá-los com outros meios de prova que se mostrem acessíveis, a fim de verificar se foi cometido ou não erro de apreciação que deva ser corrigido[4].
Tendo presentes estes princípios orientadores, cumpre agora dilucidar se assiste razão à apelante, neste segmento recursório da impugnação da matéria de facto, nos termos por ela sufragados.
Como emerge das respetivas conclusões recursivas, a apelante advoga que: i) deve ser alterada a redacção dos pontos nºs 6, 8, 9, 11 e 13 dos factos provados; ii) devem ser dadas como não provadas as afirmações de facto vertidas nos pontos 7, 10 e 12 dos factos provados.
Nos pontos nºs 6, 8, 9, 11 e 13 deu-se como provado que:
. “Após a realização, pela R. “D…”, das obras referidas, começaram a surgir manchas de humidade e bolhas de água nas paredes das divisões adjacentes ao terraço da fracção autónoma referida em 1), designadamente, no escritório e no quarto” (ponto nº 6);
.“Os locais das paredes onde surgiram tais humidades situavam-se em zona próxima de tomadas eléctricas e interruptores” (ponto nº 8);
. “No solo, o pavimento revestido a soalho de madeira começou a levantar” (ponto nº 9);
. “O guarda-vestidos embutido existente no quarto ficou com a madeira estragada” (ponto nº 11);
. “A entrada de humidade e a consequente deterioração das paredes e do pavimento do escritório e do quarto acima referidos iniciou-se em data não concretamente apurada, mas situada anteriormente a 2-4-2012” (ponto nº 13).
Sustenta a apelante que a redacção dos referidos pontos factuais deve ser alterada de molde a deles constar:
. “Em data não concretamente apurada mas situada em Abril de 2014 a fracção autónoma referida em 1) apresentava manchas de humidade nas paredes das divisões adjacentes ao terraço da fracção autónoma referida em 1), designadamente no escritório e no quarto” (ponto nº 6);
. “A humidade visível nas paredes situava-se em zona próxima de tomadas eléctricas e interruptores” (ponto nº 8);
. “No solo, o pavimento revestido a soalho de madeira apresentava-se levantado” (ponto nº 9);
. “O guarda-vestidos embutido existente no quarto apresentava madeira estragada” (ponto nº 11);
. “A entrada de humidade e consequente deterioração das paredes e do pavimento do escritório e do quarto acima referidos ocorreu em data não concretamente apurada, mas situada anteriormente a 2/4/2012” (ponto nº 13).
Por seu turno, defende que devem ser dados como não provados os pontos nºs 7, 10 e 12 que têm a seguinte redacção:
. “Passado algum tempo, a tinta das paredes dessas divisões começou a apodrecer e a ceder” (ponto nº 7);
. “O rodapé descolou-se da parede” (ponto nº 10);
.“A entrada de humidade acima referida na fracção mencionada em 1) ficou a dever-se à acumulação de águas pluviais no terraço adjacente a tal fracção, a qual entrou na fracção pela soleira da porta que dá acesso a tal terraço, soleira esta que apresentava uma configuração que não impedia tal entrada da água” (ponto nº 12).
Resulta, assim, que a impugnação da matéria de facto diz essencialmente respeito ao momento a partir do qual se passaram a registar infiltrações no interior da fracção autónoma dos autores, causa dessas mesmas infiltrações e bem assim quanto à extensão dos danos nela registados.
Vejamos, antes do mais, em que termos o juiz a quo sustentou o sentido decisório relativamente às mencionadas afirmações de facto, sendo que na motivação de facto sentença recorrida discorreu nos seguintes termos: «[O]s factos provados nºs 6 a 11 resultam, essencialmente, do depoimento da testemunha I…, engenheira civil e funcionária de “H…, Lda.”, que levou a cabo a reparação da fracção.
Numa primeira ocasião, esta testemunha deslocou-se à fracção em causa com vista a constatar o estado em que a mesma se encontrava, tendo elaborado, nessa sequência, o orçamento de fls. 32.
Deu conta que essa deslocação terá ocorrido “por alturas da Páscoa de 2014”, suportando esta afirmação na data constante da elaboração do orçamento (ou seja, 17-4-2014), o qual foi elaborado pouco tempo depois.
Descreveu a referida testemunha o cenário com que, nessa ocasião, se deparou, nos exactos moldes tidos como provados. Deu conta das infiltrações existentes e das consequências que daí advieram quer para as paredes do quarto e escritório, quer para o pavimento e rodapés, quer para o guarda-vestidos existente no quarto, tudo nos termos referidos naqueles “factos provados”.
Confirmou que as fotografias de fls. 21 a 31-verso retratam o local tal como o mesmo se apresentava aquando daquela sua primeira visita. Estas fotografias suportam, assim, a demonstração de tal factualidade, sendo de realçar que a de fls. 30 retrata o guarda-vestidos referido no “facto provado” nº 11, bem como o estado de deterioração em que o mesmo se encontrava.
Note-se que as consequências tidas como provadas são, igualmente, suportadas pelas regras da normalidade: a ocorrência de infiltrações numa fracção autónoma provoca, em regra, aquelas consequências.
Mais deu conta esta testemunha que as infiltrações em causa provinham do terraço, nos moldes referidos no nº 12 dos “factos provados”.
Explicou que a água que permanecia no terraço entrava na fracção pela soleira da porta que dá acesso a tal terraço. Precisou que tal soleira estava construída de uma forma que não impedia a entrada dessa água na fracção.
Mencionou que também acompanhou presencialmente a execução das obras na fracção dos AA.. Adiantou que chegou a constatar a entrada dessa mesma água na sequência de um teste efectuado com vista a apurar a causa desse fenómeno. Pormenorizou que uma outra empresa, que se encontrava a realizara obras no terraço a mando do condomínio, também efectuou tal teste, do qual resultou, igualmente, a certificação a entrada da água na fracção pelo motivo acima exposto.
Assim, não teve o Tribunal qualquer dúvida em afirmar que a água que se acumulava no terraço adjacente à fracção acabava por nela penetrar, pelos motivos acima expostos.
Mais: esta factualidade é comprovada pelo facto de, antes de a R. realizar a empreitada, tal anomalia na soleira (e no sistema de drenagem das águas no terraço) já se verificar, nos moldes que infra se esmiuçarão aquando da motivação do facto provado nº 24.
Neste âmbito, importa frisar que o facto de tais infiltrações já terem ocorrido antes da intervenção da R. (conforme consta do mencionado facto provado nº 24) não obsta a que as mesmas tenham ressurgido após essa mesma intervenção. Assim, inexistirá contradição entre o teor dos factos provados nºs [6 a 11] e 24.
Neste ponto, não relevou o depoimento da testemunha António Santos, que exerceu funções como gerente da empresa administradora do Condomínio do edifício até Maio de 2019. Mencionou que só iniciou tais funções em 2014 (ou seja, depois das obras levadas acabo pela R.) e que entrou pela primeira vez na fracção dos AA. depois de esta ter sido reparada. Ou seja, a referida testemunha não percepcionou directamente a factualidade mencionada naqueles factos provados, sendo que o seu conhecimento adveio, de forma indirecta, do teor das actas das assembleias de condóminos relativas a esse período de tempo, do teor dos relatórios técnicos que antecederam a realização da obra pela R. e do que ouviu dizer a terceiras pessoas. Tal falta de contacto directo com a factualidade em apreço diminuiu, drasticamente, o relevo probatório do seu depoimento no que a esta matéria concerne.
Quanto ao facto provado nº 13, entendeu o Tribunal que a mencionada entrada de humidade e a consequente deterioração das paredes e do pavimento do escritório e do quarto da fracção dos AA. iniciou-se em data não concretamente apurada, mas situada anteriormente a 2-4-2012.
Atendeu-se, para o efeito, ao relatório de fls. 56 e segs., que descreve os “defeitos visíveis, a prováveis causas e os danos emergentes” que o edifício apresentava após a realização da obra pela R..
Tal relatório, elaborado pela administradora do condomínio, é datado, precisamente, de 2-4-2012.
Nessa data – ou seja, em 2-4-2012 – e tal como consta do ponto 2, al. a), do referido relatório, já se verificavam infiltrações de água na fracção “G”, “atenta a aparente insuficiência de altura das soleiras das entradas para os respectivos terraços”.
Aí se menciona, igualmente, que os pavimentos da referida fracção já apresentavam “deteriorações”. Ora, se os pavimentos estavam danificados, também as paredes, segundo a normalidade das regras do acontecer, já teriam sido afectadas, uma vez que, dada a força da gravidade, a água começará a espalhar-se, primeiramente, pelo solo.
Noutra perspectiva, inexiste qualquer elemento probatório que permita afirmar que tais infiltrações ocorreram anteriormente à data mencionada naquele “facto provado».
Colocada perante a transcrita motivação da decisão de facto, a recorrente, com vista ao seu rebatimento, considera que os meios de prova a que o tribunal recorrido atendeu (concretamente o depoimento prestado pela testemunha I… e as fotografias juntas aos autos) não permitam, na leitura que deles faz, fixara materialidade em crise nos termos que foram acolhidos nos pontos factuais alvo de impugnação, argumentando, para tanto, que “as fotografias não se encontram datadas, pelo que nada nos é dado saber sobre o momento em que foram captadas”, enquanto a referida testemunha apenas “se deslocou à fracção autónoma dos autores em 2014, na sequência da qual elaborou o orçamento de fls. 32 para execução de obras de reparação no seu interior, limitando-se a atestar que as fotos retractavam o local como se apresentava aquando da sua visita”.
Na decorrência dessa leitura advoga a alteração da redacção dos pontos nºs 6, 8, 9, 11 e 13 nos termos por si preconizados, por não ter sido produzida prova que permita caracterizar o estado da fracção em data anterior à deslocação da mencionada testemunha e sequer concretizar o momento em que se terão verificado as infiltrações que, nessa ocasião, aí se registavam. Já em relação aos pontos nº 7 e 10 defende que devem, pura e simplesmente, transitar para o elenco dos factos não provados, na medida em que não foi produzida qualquer prova que confirmasse que a tinta das paredes tenha começado a apodrecer e a ceder e que o rodapé se deslocou da parede. Por último, no concernente à proposição factual acolhida no ponto nº 12, argumenta que o mesmo deverá ser dado como não provado, porquanto o testemunho de I… não é, na sua perspectiva, suficiente para permitir que essa materialidade seja dada como demonstrada.
Começando pela mencionada prova pessoal, depois de se proceder à audição integral do registo fonográfico contendo o depoimento da testemunha I…, constata-se que nas suas alegações recursivas a apelante se limita a transcrever alguns excertos desse depoimento sem correspondência com o sentido global do mesmo, procurando diminuir o seu valor probatório mediante o argumento de que a testemunha apenas se deslocou à fracção dos autores no ano de 2014, não podendo, nessa medida, o seu depoimento ser valorado relativamente a factos que terão ocorrido anteriormente a essa deslocação.
É certo que a mencionada testemunha referiu que apenas se deslocou à fracção dos autores em 2014 (julga que por ocasião da Páscoa), descrevendo os danos que então visionou nas paredes e pavimentos em moldes muito próximos daqueles que o decisor de 1ª instância considerou provados nos pontos nºs 6 a 11, o que se mostra corroborado pela visualização das fotografias juntas aos autos.
A referida testemunha acrescentou ainda que esses danos eram resultado de infiltrações verificadas no interior da fracção, sendo que, neste conspecto - e ao contrário do que defende a apelante -, será de relevar o seu depoimento já que (dada a sua formação em engenharia civil) possui um especial conhecimento sobre a matéria em debate nestes autos e foi apelando à sua experiência profissional e conhecimentos nesta área que atestou que a causa dessas infiltrações se devia à acumulação de águas pluviais no terraço adjacente à fracção, as quais se infiltravam no seu interior através da soleira da porta que dá acesso a esse terraço, trabalho esse que foi incorrectamente executado por apresentar uma configuração que não impedia a entrada dessas águas pluviais, situação essa que constatou in loco através de teste que, nessa ocasião, efetuou.
Esses trabalhos foram levados a cabo pela apelante na execução do contrato de empreitada que firmara com o condomínio do prédio onde se integra a ajuizada fracção autónoma. É facto que já anteriormente à sua intervenção tinham ocorrido infiltrações na fracção dos autores (como consta do facto provado nº 24), tendo sido, aliás, essa uma das razões que motivou a sua contratação, que teve como propósito debelar, entre outras, essas patologias (cfr. o contrato de empreitada e o orçamento anexo que consta como documento nº 3 junto com a contestação, onde se previa, para além de outros trabalhos, “o tratamento das coberturas, remoção dos elementos amovíveis existentes no terraço, colocação de um filme de polietileno de protecção, aplicação de camada de betão e substituição de soleiras de forma a realizar um encastramento correto da impermeabilização”).
Ora, se a intervenção da ré se destinou a solucionar esse problema, se as infiltrações continuaram a verificar-se algum tempo após a realização desses trabalhos – como o atesta o relatório que se mostra junto a fls. 56 e seguintes dos autos elaborado em 2 de abril de 2012 (na sequência de litígio gerado entre o condomínio do prédio onde se integra a fracção dos autores e a ora ré a respeito da forma defeituosa como esta terá executado a impermeabilização dos terraços do piso 1) – e se mantinham por ocasião da visita da referida testemunha, é razoável considerar que na sua génese estará a forma deficiente como os ditos trabalhos de impermeabilização foram realizados. Consequentemente – ao invés do que é sustentado pela apelante – enquanto não fosse solucionada a causa dessas infiltrações, seria perfeitamente expectável que as mesmas ocorressem sempre que se registassem níveis de pluviosidade que ultrapassassem a soleira (aliás isso mesmo constatou a testemunha no teste que realizou no local) e que as humidades existentes no interior da fracção fossem resultado de um processo de verificação continuada e sucessiva dessas infiltrações.
De facto, apesar de não se ter realizado uma perícia com esse objecto no âmbito do presente processo (a qual não seria viável – como a própria apelante acaba por reconhecer -, porquanto na data da propositura da ação já haviam sido levadas a cabo obras na fracção e no terraço, retirando, assim, qualquer utilidade na concretização dessa diligência probatória), afigura-se-nos, ainda assim, que, de acordo com as regras da experiência e da normalidade das coisas, os enunciados elementos de caráter objetivo permitem uma inferência no apontado sentido.
O tribunal recorrido não estava, pois, impedido de apelar (como o fez) a uma presunção judicial estribada nos mencionados factos indiciários, sendo que se é certo que as presunções judiciais não se sobrepõem à prova testemunhal, também não é menos certa a situação inversa, ou seja, que a prova testemunhal se sobreponha às presunções judiciais, havendo, aliás, coincidência no seu âmbito de aplicação (cfr. art. 351º do Cód. Civil). Por isso, a prova dos factos tanto pode resultar de presunções judiciais como do depoimento das testemunhas, dependendo sempre da prudente convicção do julgador.
Deste modo, não se revela desajustado o raciocínio dedutivo a que o juiz a quo recorreu para dar como demonstrada a materialidade que fez verter nos pontos 6, 8, 9, 12 e 13.
Daí que aderindo aos fundamentos explanados na motivação da decisão da matéria de facto, sem nunca esquecer que o julgamento deve guiar-se por padrões de probabilidade e nunca de certezas absolutas e tendo ainda em atenção que o juiz a quo teve oportunidade de apreciar a prova pessoal produzida na audiência final, com recurso aos instrumentos que lhe foram proporcionados pelos princípios da imediação e da oralidade, entendemos não haver fundamento para alterar a materialidade que a apelante impugnou em sede recursiva já que a prova produzida não impõe (como é suposto pelo nº 1 do art. 662º) decisão diversa.
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4. FUNDAMENTOS DE DIREITO
4.1. Da (in)verificação dos pressupostos normativos para responsabilizar civilmente a ré/apelante

Como emerge da peça processual com que deram início ao presente processo, os demandantes filiam a concreta pretensão de tutela jurisdicional que aduziram contra a ré “D…” no facto de as humidades que surgiram no interior da fracção autónoma de que são proprietários (e que importaram os danos cuja reparação reclamam) resultarem de infiltrações motivadas pela forma defeituosa como essa demandada executou os trabalhos de reabilitação/impermeabilização que levou a cabo em cumprimento do contrato de empreitada outorgado, a 8 de outubro de 2010, com o condomínio do edifício onde se integra essa fração.
Como a este propósito tem sido assinalado pela doutrina[5], para além da responsabilidade civil contratual, ou seja, a que respeita à execução da empreitada e se inscreve no âmbito das suas relações com o dono da obra, o empreiteiro é também responsável perante terceiro se, na realização da obra, desrespeitar ilicitamente e com culpa direitos deste, provocando-lhe danos. Neste caso, a responsabilidade civil do empreiteiro assume, essencialmente, uma natureza delitual, seguindo o regime geral do art. 483º do Cód. Civil.
Tal foi o entendimento perfilhado pelo juiz a quo que, depois de afirmar a qualidade de terceiro dos ora autores (por não serem parte no aludido contrato de empreitada), concluiu pela verificação dos pressupostos normativos estabelecidos nesse inciso[6], julgando procedente (ainda que parcialmente) o pedido por estes formulado no âmbito deste processo.
É, precisamente, em relação à afirmação da ocorrência, in casu, dos requisitos da culpa e do nexo de causalidade entre o facto e o dano que ora se insurge a apelante,por entender que a materialidade apurada não permite considerar preenchidos esses pressupostos.
Quid juris?
Como é consabido, para que exista obrigação de indemnizar, baseada em responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito, torna-se mister que se verifiquem todos os enunciados pressupostos, sendo que, por força do critério geral estabelecido no art. 342º do Cód. Civil, complementado neste particular pelo comando vertido no art. 487º do mesmo diploma legal, incumbe a quem invoque a seu favor o direito à indemnização alegar e provar os factos pertinentes.
No caso subjudice, atenta a forma como a ré baliza o presente recurso, a questão que desde logo se coloca e que importa decidir prende-se em determinar se o seu comportamento assume carácter ilícito e culposo, sendo certo que no âmbito das garantias juscivilísticas por factos ilícitos, a ilicitude surge normalmente associada a culpa do lesante, embora sejam elementos distintos. Aquela, virada para a conduta objectivamente considerada, enquanto negação de valores tutelados pelo direito (que no caso se traduziu na violação do direito de propriedade dos autores, integrando-se, pois, na primeira variante de ilicitude prevista no nº 1 do art. 483º) e, portanto, como elemento logicamente anterior à culpa, olhando esta sobretudo para o lado subjectivo do facto jurídico. E embora tradicionalmente a culpa fosse definida em sentido psicológico como o nexo de imputação do acto ao agente, que se considerava existir sempre que o acto resultasse da sua vontade, ou seja, lhe fosse psicologicamente atribuível, facto é que tal concepção tem vindo, no entanto, a ser substituída por uma definição da culpa em sentido normativo como um juízo de censura ao comportamento do agente[7].
Assim a culpa pode ser definida como o juízo de censura ao agente por ter adoptado a conduta que adoptou, quando de acordo com o comando legal estaria obrigado a adoptar conduta diferente. Deve, por isso, ser entendida em sentido normativo, como a omissão da diligência que seria exigível ao agente de acordo com o padrão de conduta que a lei impõe. Nestes termos, como salienta MENEZES CORDEIRO[8], o juízo de culpa representa um desvalor atribuído pela ordem jurídica ao facto voluntário do agente, que é visto como axiologicamente reprovável.
No que tange à apreciação deste pressuposto, o nosso Código Civil consagrou o critério que aponta para a apreciação da culpa em abstracto, exigindo a lei ao agente a diligência padrão dos membros da sociedade, a qual é naturalmente a diligência do homem médio ou, como diziam os romanos, do bónus pater familias.
Dispõe, com efeito, o art. 487º, nº 2 do Cód. Civil que “[a] culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, segundo as circunstâncias do caso”.
Este padrão abstracto não deixa de exigir, no entanto, que se atenda às particularidades do caso concreto, designadamente às qualidades e qualificações do agente e às circunstâncias em que se encontrava, desde logo porque a diligência exigida a um profissional qualificado na sua atividade não poderá ser a mesma que se exige a um cidadão não qualificado na matéria[9]. Daí que na aferição da culpa do empreiteiro perante o terceiro deve atender-se a um critério do profissional razoável, tomando como medida da diligência exigível a do profissional medianamente diligente.
Assim sendo, apelando ao tecido fáctico apurado, dele flui, com relevo para a questão que ora nos ocupa, que após a realização das obras que a ré levou a cabo em cumprimento de contrato de empreitada que celebrou com o condomínio do edifício onde se integra a fracção dos autores, começaram a surgir manchas de humidade no seu interior, o que se ficou a dever à acumulação de águas pluviais no terraço adjacente a tal fracção, as quais nela entravam através da soleira da porta que dá acesso a esse terraço, já que a mesma - que foi colocada pela ré - apresentava uma configuração que não impedia a entrada da água.
A ré não observou, assim o dever de cuidado e diligência que, enquanto profissional, lhe era imposto na execução dos ditos trabalhos desrespeitando as regras de bem construir e a boa prática profissional que impunham que no terraço fossem executados os trabalhos tendentes a evitar a acumulação excessiva de águas pluviais, colocando outrossim soleira que tivesse uma configuração que, em condições normais, impedisse a entrada dessas águas na fração, o que, no caso em apreço, se justificava especialmente já que, como se referiu, a empreitada teve por objecto, entre outros, a realização dos trabalhos necessários para impedir a ocorrência das infiltrações que aí se vinham registando. A ré estava, pois, constituída no dever de tomar as providências adequadas a evitar a entrada de águas pluviais na fracção dos autores, o que, todavia, não realizou de forma correta e em conformidade com as regras da arte.
Ter-se-á, assim, de considerar que o seu comportamento é susceptível do apontado juízo de censura ético-jurídica que a lei substantiva erige como fundamento da responsabilidade subjectiva.
Vejamos agora se, na espécie, se pode (ou não) considerar provado o nexo causal entre o facto (ilícito) e a produção do resultado danoso.
A este propósito, vem constituindo entendimento claramente dominante que a lei substantiva (cfr. art. 563º do Cód. Civil) acolheu a denominada teoria de causalidade adequada (que a dogmática moderna tende a substituir pela designação de teoria ou doutrina da adequação), cuja ideia fulcral é a de que se considera causa de um dano o facto que se revele, em concreto, condição necessária desse dano, mas também que constitua, em abstracto, segundo o curso normal das coisas, causa adequada da sua produção. Assim, para que se possa afirmar que um facto é (ou não) causa de um dano torna-se mister, antes de mais, que, no plano naturalístico, ele seja condição sem o qual o dano não se teria verificado e depois que, em abstracto ou em geral, seja causa adequada do mesmo, relevando, neste domínio, a causalidade adequada na sua formulação negativa, ou seja, a condição deixará de ser causa do dano sempre que, segundo a sua natureza geral, era de todo indiferente para a produção do dano e só se tornou condição dele em virtude de outras circunstâncias extraordinárias, sendo, portanto, inadequada para esse dano.
Por conseguinte, a referida formulação negativa não pressupõe a exclusividade do facto condicionante do dano, nem exige que a causalidade tenha de ser direta e imediata, admitindo não só a ocorrência de outros factos condicionantes, como ainda a denominada causalidade indireta, na qual é suficiente que o facto condicionante desencadeie outro que diretamente suscite o dano.
Ora, como resulta da materialidade apurada, os danos cuja reparação os autores impetram nesta demanda resultaram de infiltrações de águas pluviais, as quais tiveram na sua génese a forma deficiente como a ré executou os trabalhos de impermeabilização/reparação no terraço adjacente à fracção daqueles.
Verifica-se, pois, o necessário nexo causal e bem assim os demais pressupostos normativos de que depende a procedência do pedido aduzido pelos demandantes, na vertente de pretensão indemnizatória decorrente de responsabilidade aquiliana, legitimando consequentemente a condenação decretada no ato decisório sob censura de ressarcimento dos danos patrimoniais que o comportamento da ré gerou na sua (deles, autores) esfera jurídica.
Improcedem, assim, as conclusões XXVI a XXXI.
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4.2. Da prescrição do direito dos autores

Como se referiu, no sentido de neutralizar o pedido indemnizatório que os autores contra ela direccionam, a ré “D…” defendeu-se invocando a prescrição desse direito, porquanto na data em que foi citada para os termos da presente ação (11 de maio de 2015) já se havia consumado o prazo prescricional estabelecido no nº 1 do art. 498º do Cód. Civil.
Na sentença recorrida julgou-se improcedente essa exceção perentória, por se ter considerado que na data em que a ré foi citada ainda não havia decorrido o prazo previsto no referido normativo, por se estar em presença de um facto continuado.
A apelante rebela-se contra esse segmento decisório, sustentando que estando provado que a entrada de humidade na fracção autónoma dos autores é anterior a 2 de abril de 2012, começou, pois, a correr a partir dessa data o aludido prazo de prescrição, o qual já se tinha completado no momento em que se operou a sua citação.
Que dizer?
Como resulta do anteriormente decidido, no caso vertente estamos perante uma situação de responsabilidade civil extracontratual, o que, em matéria de prescrição, conduz à aplicação do citado art. 498º, que no seu nº 1 preceitua que “[O] direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso”.
Portanto, como emerge deste inciso, em regra, o lesado deve exercer o seu direito no prazo de três anos a contar da data em que teve conhecimento do direito que lhe compete, sendo que,concatenando esse normativo com o comando vertido no nº 1 do art. 306º do mesmo diploma legal, esse prazo começa a correr quando o direito puder ser exercido, o que significa que o início da sua contagem não está dependente do conhecimento jurídico, pelo lesado, do respectivo direito, antes pressupõe, apenas, que o lesado conheça os factos constitutivos desse direito, isto é, que saiba que o ato foi praticado ou omitido por alguém – saiba ele, ou não, o seu carácter ilícito – e dessa prática ou omissão resultarem danos para si.
Ora se em relação aos factos instantâneos não se colocam especiais dúvidas na determinação do dies a quo do respectivo prazo prescricional (posto que, nesse caso, o mesmo se inicia, em princípio, logo a partir do momento em que a infracção foi cometida), já quando estejam em causa factos continuados a solução não surge com a mesma evidência, dado que o carácter permanente do dano dificulta a valoração do decurso do tempo, uma vez que esse dano se renova constantemente e a todo o tempo pode o mesmo considerar-se presente[10].
O Código Civil - contrariamente ao que sucede noutras áreas do Direito[11] - não contempla uma regra específica para as infracções de natureza continuada ou permanente nas quais o processo de violação do direito de outrem se mantém em aberto alimentado pelo comportamento (positivo ou omissivo) ilícito e persistente do infractor.
Para situações desse jaez, vêm sendo defendidas na casuística soluções que ora preconizam que não se inicia a contagem do prazo prescricional enquanto não cessar a violação do direito[12], ora sustentando que - uma vez que o facto só se torna danoso quando o dano efectivamente se produz - em relação aos danos não verificados à data em que ocorreu o facto ilícito (quando este é continuado) o prazo de prescrição somente começa a contar-se a partir do momento em que o lesado tomou conhecimento da produção efetiva desses novos danos[13].
Isto posto, descendo ao caso sub judicio, perante o quadro factual que logrou demonstração temos por certo estarmos em presença de um facto que não é instantâneo mas antes continuado, sendo que, ao invés do que argumenta a apelante, esse substrato fáctico permite razoavelmente suportar a afirmação de que o problema das infiltrações no interior da fracção autónoma dos autores se manteve para além de abril de 2012, não se tratando, pois, de um (único) episódio de infiltrações verificado em data anterior a esse momento temporal.
Com efeito, o que resulta da materialidade provada (cfr. pontos nºs 6 e 13) é que a entrada de humidade “começou” ou “teve o seu início” em data anterior a 2 de abril de 2012, o que aponta no sentido de que essas humidades continuaram a registar-se no interior da fracção depois dessa data já que, apelando às regras da experiência comum, não se encontrando debelada a causa das mesmas (que, como se notou, se prendia com a forma incorrecta como a ré executou os trabalhos de impermeabilização no terraço adjacente à fracção autónoma dos autores, mormente no que tange à soleira que aí colocou) seria expectável que em situação de maior pluviosidade ocorressem novas e sucessivas infiltrações.
Sob este enfoque é, pois, perfeitamente justificada a conclusão firmada na sentença recorrida de que a degradação das paredes e pavimento da fracção dos autores foi resultado de infiltrações ocorridas ao longo dos anos.
É certo que, como se referiu, ficou provado que a entrada de humidade que desencadeou esse processo de degradação se iniciou em data anterior a 2 de abril de 2012. Desconhece-se, contudo, quais os concretos danos no interior da fracção dos autores que se registaram até essa data e qual a extensão dos que se verificaram em data posterior, designadamente até ao momento em que os demandantes – depois de terem interpelado a ré[14] para reparar esses danos e perante a atitude silente e omissiva que esta assumiu face a tal interpelação – decidiram, de motu proprio, levar a cabo os trabalhos necessários para esse efeito, contratando para tanto, em abril de 2014, os serviços da sociedade “H…, Ldª” (cfr. factos provados nºs 15, 16 e 25).
Ora, como emerge do princípio geral enunciado no art. 562º do Cód. Civil, o facto só se torna danoso quando o mesmo efectivamente se produz. Daí que,em relação aos danos ainda não verificados à data em que ocorreu o facto ilícito de que emerge a responsabilidade civil extracontratual, quando este revista, como é o caso, natureza de facto continuado – prolongando-se no tempo, mantendo-se igualmente a produção de novos danos -, o referido prazo trienal só começa a contar a partir do momento em que o lesado tomou conhecimento da produção efectiva dos danos, posto que, como se sublinha no citado acórdão do STJ de 18.04.2002, as obrigações futuras só prescrevem no prazo de três anos contados do momento em que cada uma seja exigível (ou conhecida) pelo lesado.
Nesse contexto, para operar a prescrição, competiria à ré - em conformidade com os critérios gerais de repartição do ónus da prova estabelecidos no art. 342º do Cód. Civil - a demonstração dos factos tendentes ao preenchimento dos elementos da norma que convocou em arrimo da sua tese defensional, ou seja, caber-lhe-ia alegar e provar que um concreto dano (resultante de facto continuado) ocorreu e chegou ao conhecimento do lesado em determinada data, e que entre essa data e o momento em que foi citada para a ação já haviam decorrido mais de três anos[15]. Certo é que nada alegou (e consequentemente nada provou) nesse sentido, desconhecendo-se, como se notou, quais os concretos danos no interior da fracção dos autores que se registaram até 2 de abril de 2012, qual a extensão dos que se verificaram em data posterior e qual o momento em que os autores tomaram conhecimento dos mesmos.
Como assim, a luz do descrito enquadramento normativo e respectiva teleologia, não pode proceder a invocada exceção perentória, improcedendo, nessa medida, as conclusões XXXII a XLIV.
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III- DISPOSITIVO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas a cargo da apelante (art. 527º, nºs 1 e 2).

Porto, 9.12.2020
Miguel Baldaia Morais
Jorge Seabra
Pedro Damião e Cunha
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[1] Diploma a atender sempre que se citar disposição legal sem menção de origem.
[2] In Recursos no Novo Código de Processo Civil, pág. 225; no mesmo sentido milita REMÉDIO MARQUES (in A ação declarativa, à luz do Código Revisto, 3ª edição, págs. 638 e seguinte), onde critica a conceção minimalista sobre os poderes da Relação quanto à reapreciação da matéria de facto que vem sendo seguida por alguma jurisprudência.
[3] Isso mesmo é ressaltado por ABRANTES GERALDES, in Temas da Reforma de Processo Civil, vol. II, 3ª ed. revista e ampliada, pág.272.
[4] Assim ABRANTES GERALDES Recursos, pág. 299 e acórdãos do STJ de 03.11.2009 (processo nº 3931/03.2TVPRT.S1) e de 01.07.2010 (processo nº 4740/04.7TBVFX-A.L1.S1),ambos acessíveis em www.dgsi.pt.
[5] Cfr., sobre a questão e por todos, ROMANO MARTINEZ, in Contrato de Empreitada, Almedina, 1994, págs. 179-183 e PEDRO ALBUQUERQUE/ASSIS RAIMUNDO, in Direito das Obrigações – Contratos em Especial, vol. II, Almedina, 2012, págs. 376 e seguintes.
[6] Segundo o entendimento, entre nós, dominante (cfr., inter alia, ANTUNES VARELA, in Das Obrigações em geral, vol. I, 10ª edição, Almedina, págs. 526 e seguintes, ALMEIDA COSTA, in Direito das Obrigações, 12ª edição, Almedina, págs. 557 e seguintes e MENEZES LEITÃO, in Direito das Obrigações, vol. I, 9ª edição, Almedina, págs. 295 e seguintes) esses pressupostos, de verificação cumulativa, são cinco, concretamente: i) facto voluntário; ii) ilicitude; iii) nexo de imputação do facto ao lesante; iv) dano; v) nexo de causalidade entre o facto e o dano.
[7] Cfr., sobre a questão, inter alia, ALMEIDA COSTA, ob. citada, págs. 521 e seguinte; MENEZES CORDEIRO, Obrigações, Vol. II, págs. 309 e seguintes.
[8] Ob. citada, pág. 308.
[9] Isso mesmo tem sido particularmente enfatizado por alguns dos nossos civilistas, designadamente por MENEZES LEITÃO, ob. citada, pág. 323 e CALVÃO DA SILVA, Responsabilidade civil dos administradores não executivos, in O Direito, ano 2007, Vol. III, pág. 588.
[10] Isso mesmo é enfatizado por PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, in Código Civil Anotado, vol. I, 4ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, pág. 580, onde escrevem que “os danos continuados são simultaneamente presentes e futuros”.
[11] Por exemplo, o Código Penal, quando estejam em causa factos continuados, expressamente postula que o início da prescrição só se inicia quando cessar o comportamento delitual (art. 119º, nº 2 al. b)).
[12] Cfr., neste sentido, acórdão do STJ de 14.03.2019 (processo nº 2446/15.0T8BRG.G2.S1) e acórdão desta Relação de 2.07.2013 (processo nº 1567/09.3TBAMT.P1), acessíveis em www.dgsi.pt.
[13] Cfr., inter alia, acórdãos do STJ de 3.12.98 (BMJ nº 482, pág. 212) e de 18.04.2002 (processo nº 02B950), acórdão da Relação de Lisboa de 2.07.2009 (processo nº 387/08-6), acórdãos da Relação de Guimarães de 23.10.2012 (processo nº 5108/08.1TBBRG.G1) e de 25.01.2018 (processo nº 369/13.7TBPRG.G1), acessíveis em www.dgsi.pt.
[14] A qual, por mor, designadamente, do disposto nos arts. 483º, 486º e 562º, do Cód. Civil, estava constituída no dever legal de realizar as obras necessárias tendo em vista a reparação dos estragos e evitar novas infiltrações.
[15] Em sentido próximo se pronunciam os acórdãos da Relação de Guimarães de 23.10.2012 (processo nº 5108/08.1TBBRG.G1) e de 25.01.2018 (processo nº 369/13.7TBPRG.G1), acessíveis em www.dgsi.pt, onde se sumaria “competir à pessoa que invoca a prescrição, quando estejam em causa factos continuados, invocar e provar factos que permitam efectuar uma descriminação temporal entre as omissões que lhe são imputadas e os respectivos danos, de forma a que alguns possam caber no aludido prazo de três anos”.