Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
6601/16.8T8VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: NELSON FERNANDES
Descritores: ARTIGO 17º-E
N.º1 DO CIRE
ACÇÃO
CRÉDITOS EMERGENTES DO CONTRATO DE TRABALHO
CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS
CRÉDITOS LABORAIS
PER
APROVAÇÃO
HOMOLOGAÇÃO
SENTENÇA
TRÂNSITO EM JULGADO
CRÉDITO LABORAL
VALOR SUPERIOR DO CREDITO DO TRABALHADOR AO DO PER
EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA
COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO COMÉRCIO
DENEGAÇÃO DE JUSTIÇA
Nº do Documento: RP201906276601/16.8T8VNG.P1
Data do Acordão: 06/27/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NÃO PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ªSECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º295, FLS.237-249)
Área Temática: .
Sumário: I - Inclui-se na categoria de “acções para cobrança de dívidas” e “acções em curso com idêntica finalidade” a que se alude no n.º1 do artigo 17.º-E do CIRE, uma ação em que um trabalhador peticiona créditos emergentes do contrato e da sua cessação, já que a procedência desses pedidos se reflete obrigatoriamente no património da empregadora/ré.
II - Tendo sido aprovado e homologado um PER, por sentença transitada em julgado, na pendência de uma ação, na qual se discute a cobrança de créditos laborais por parte de trabalhador que figura no PER como credor a reclamar da Ré o pagamento desses créditos, não estando previsto no plano a continuação daquela ação, impõe-se que seja declarada extinta a instância, nos termos do art.º 17 -E n.º 1 do CIRE, por impossibilidade legal de prosseguir, mesmo que nessa ação esteja um causa a obtenção da condenação da Ré num crédito superior ao reconhecido no PER.
III - Face ao disposto na Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (LOSJ), assim no seu artigo 128.º, n.º 1, alínea a), competindo aos juízos de comércio preparar e julgar “Os processos de insolvência e os processos especiais de revitalização”, competência essa que, aliás, de acordo com o seu n.º 3, “abrange os respetivos incidentes e apensos, bem como a execução das decisões”, independentemente da natureza dos créditos, assim a diversa competência que em princípio dessa poderia resultar caso não estivesse pendente o processo especial de revitalização, estando este pendente a lei atribuí a competência para o seu conhecimento aos juízos de comércio.
IV - O regime que decorre do referido em I a III não consubstancia uma situação de denegação da justiça, violadora do artigo 20.º da Constituição da Republica Portuguesa.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação 6601/16.8T8VNG.P1
Tribunal Judicial: Comarca do Porto - Juízo do Trabalho de Vila Nova de Gaia
Autor: B…
: Sociedade C…, S.A.
_______
Relator: Nelson Fernandes
1º Adjunto: Des. Rita Romeira
2º Adjunto: Des. Teresa Sá Lopes

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto
I - Relatório
1. B… instaurou ação declarativa sob a forma de processo comum contra Sociedade C…, S.A., formulando o pedido que seguidamente se transcreve:
“a) Ser declarada e reconhecida a existência de justa causa de resolução do contrato de trabalho operada pelo trabalhador aqui autor, com fundamento nas alíneas a) e e) do Nº 2 do artº 394, conjugado com o artº 396º do Código do Trabalho;
b) Ser a R. condenada a pagar ao A. a quantia de 9.684,83€; a título de salários em atraso, conforme supra requerido;
c) Ser a R. condenada a pagar ao A. a quantia de líquida de 6.165,13€, referente à remuneração de 16 dias do mês de Junho e valores relativos às férias e proporcionais decorrentes do contrato de trabalho;
d) Condenar a R a pagar ao Autor a quantia mínima de 100.903,89€ a título de compensação pela resolução do contrato, conforme o artº 396º;
e) Condenar a R a pagar ao Autor a quantia de 20.000,00€, a título de indemnização por danos morais;
f) Condenar a R no pagamento dos respectivos juros legais desde a citação até efectivo e integral pagamento.”

1.1 Com data de 6 de setembro de 2016 foi proferido o seguinte despacho:
“(...) notifique o A. do anúncio de nomeação de administrador judicial provisório à R. no processo especial de revitalização documentado a fls. 38 e de que, em face dessa decisão judicial e ao abrigo do art. 17º E, nº 1, do CIRE, se considera suspensa a presente ação, destinada à cobrança de dívidas laborais, até ao termo das negociações para a revitalização da R..
Decorridos dois meses – cfr. art. 17º D, nº 5, do CIRE -, solicite informação sobre o estado do processo de revitalização.”

1.2 Com data de 4 de julho de 2017 foi proferido novo despacho com o teor que se transcreve:
“Tendo sido recusada a homologação do plano de recuperação apresentado no termo das negociações ocorridas no PER da Ré com o nº 6628/16.0T8VNG, mas não tendo ela sido declarada insolvente e havendo anuncio de um novo PER, agora com o nº 4689/17.3T8VNG e com a nomeação de novo administrador judicial provisório, subsiste o motivo aludido no 2º despacho de 6/09/2016 para a suspensão da presente instância até ao termos das novas negociações a empreender para a revitalização da R. – cfr. o art. 17º E, nº 1, do CIRE..
Como tal e decorridos dois meses, solicite nova informação sobre o estado do novo processo de revitalização.
Notifique.”

1.3 Posteriormente, em 5 de dezembro de 2018, foi proferido despacho determinando a notificação do Autor “para, em 10 dias, se pronunciar, querendo, sobre o prosseguimento dos autos”, vindo aquele, no seguimento, a pronunciar-se, defendendo ser “absolutamente indispensável o prosseguimento dos autos para uma análise não perfunctória da matéria fáctica alegada e da prova documental já produzida, a fim de ser declarada a existência de justa, com a consequente condenação da Ré ao pagamento das importâncias peticionadas”.

1.4 Veio, por fim, com data de 14 de março de 2019, a ser proferida a decisão recorrida, com o seguinte teor:
“Através da certidão junta a fls. 109 verso e seguintes, relativa ao Processo Especial de Revitalização da aqui Ré que correu termos sob o nº 4689/17.3T8VNG, verifica-se que:
- O Plano de Recuperação conducente à revitalização da Ré foi aprovado, com trânsito em julgado;
- O crédito aqui reclamado pelo Autor foi ali graduado e ponderado;
- Não foi expressamente consignado no Plano o prosseguimento da presente acção.
Em consequência, e ao abrigo do disposto no artigo 17º-E nº 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, julgo extinta a presente acção, por inutilidade superveniente da lide.
Assim sendo, as questões levantadas pelo Autor no requerimento de fls. 102 e 103 apenas poderão ser apreciadas no âmbito do Processo Especial de Revitalização.
Custas pela Ré, a qual deu causa à lide - artigo 536º nºs 2 “a contrario” e nº 3 “in fine”.
Notifique.
Valor da acção: 136.753,85€.”

2. Não se conformando com o assim decidido, apresentou o Autor recurso de apelação,
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2.1 Não foram apresentadas contra-alegações.
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3. O Ministério Público emitiu parecer no sentido de não ser provido o recurso, parecer esse a que o Recorrente respondeu, manifestando a sua discordância e mantendo a posição que assumira no recurso.
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Cumpridas as formalidades legais, nada obstando ao conhecimento do mérito, cumpre decidir:
II – Questões a resolver
Sendo pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil (CPC) – aplicável “ex vi” do artigo 87º/1 do Código de Processo do Trabalho (CPT) –, integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, é a seguinte a questão a decidir:---------; (2) conhecimento do recurso: (2.1) âmbito de aplicação do artigo 17.º-E, n.º 1, do CIRE; (2.2) integração da presente ação do plano aprovado no PER; (2.3) competência do tribunal; (2.4) invocada denegação de justiça.
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III – Fundamentação
A. De facto
Não tendo o Tribunal a quo definido expressamente quais os factos que podem considerar-se provados, suprindo-se aqui tal omissão, para efeitos da apreciação do presente recurso, para além dos que constam do relatório anteriormente elaborado, considera-se suficientemente documentado nos autos o seguinte:
1 - No âmbito do Processo Especial de Revitalização da Ré Sociedade de Construções C…, S.A., que correu termos no Juízo de Comércio de Vila Nova de Gaia - Juiz 2 - sob o n.º 4689/17.3T8VNG, intentado em 30/05/2017, foi nomeado o Administrador Judicial Provisório em 07/06/2017;
2 - Nesse mesmo processo o aqui Autor reclamou os créditos de natureza laboral que considerava deter sobre a Ré, tendo-lhe sido reconhecido o crédito total de €105.964,24
3 - Ainda no âmbito do mesmo processo foi homologado, por sentença proferida em 12/02/2018 e transitada em julgado em 06/03/2018, o plano de recuperação da devedora Sociedade C…, S.A., tudo conforme consta da cópia da sentença homologatória junta aos autos, prevendo-se no aludido plano, além do mais, o seguinte:
«(…) e) Créditos laborais/privilegiados
No que respeita a créditos laborais propõe-se:
1) Pagamento dos créditos laborais no prazo máximo de 90 dias após a data da homologação do Plano, com excepção dos montantes correspondentes a indemnizações por resolução ou revogação de contrato de trabalho que são pagos de acordo com o ponto seguinte;
2) Montantes correspondentes a indemnizações por resolução ou revogação do contrato de trabalho:
i. Reembolso do capital em 5 prestações anuais sucessivas e fixas (cada uma no montante de 20% do saldo inicial), vencendo-se a primeira 90 dias após o trânsito em julgado da sentença de homologação do Plano; e
ii. Perdão total dos juros vencidos e vincendos.
As dívidas a funcionários detêm privilégio creditório geral ou especial e, ao abrigo do Plano de Recuperação, são considerados créditos privilegiados, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 47.º, n.º 4, alínea a) do CIRE e 333.º do Código do Trabalho. (…)».
[…]
«(…) D. Efeitos Legais sobre as acções pendentes:
Todas as acções declarativas e procedimentos cautelares que têm em vista o reconhecimento de créditos sobre a C…, deverão prosseguir os seus termos, ao abrigo da prorrogativa legal prevista no disposto na parte final do n.º 1, do artigo 17.º-E, do CIRE, aplicando-se a tais créditos, uma vez reconhecidos, os termos previstos no Plano para créditos de igual natureza.
No que respeita às acções pendentes à data da apresentação a PER, destinadas à cobrança de créditos (com exceção das execuções fiscais e das execuções por dívidas ao Instituto da Segurança Social, I.P.) − e que se encontrem suspensas − serão consideradas extintas logo que seja aprovado e homologado o presente Plano, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 17.º-E, n.º 1, do CIRE. (…)».”
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B. Discussão
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2. Conhecimento das questões levantadas no recurso
2.1 Âmbito de aplicação do artigo 17.º-E, n.º 1, do CIRE
A primeira questão colocada à nossa apreciação passa por saber se, como decidido em 1.ª instância, a presente ação se encontra abrangida pela previsão do n.º 1, do artigo 17.º-E, do Código de Insolvências e Recuperação de Empresas (CIRE), sustentando o Recorrente que assim não é, por não ser essa disposição legal aplicável à presente ação, no entendimento, que sufraga, de que a expressão “acções para cobrança de dividas contra o devedor” abrange apenas as ações executivas para pagamento de quantia certa”, não sendo esse o caso, pois que a presente ação “visa o reconhecimento da existência de justa causa para resolução do contrato pelo trabalhador, aqui recorrente e, nessa medida, do reconhecimento do crédito do valor da compensação”.
Tendo em vista a apreciação da questão colocada, começaremos por acompanhar o Acórdão desta Secção proferido no processo nº 523/12.9TTBRG.P1[1], a propósito da expressão “acções para cobrança de dívidas”, nos termos que se transcrevem:
“(...) Segundo os ensinamentos de Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora “a distinção entre o processo declaratório e o processo executivo apenas se estabelece em relação às acções de condenação ou relativamente ás acções de outro tipo (de mera ou simples apreciação ou constitutivas), em que haja uma sentença de condenação. Há nesses casos uma cisão nítida entre o processo de cognição, que finda com a sentença de condenação, e o processo executivo, que conduz à realização coactiva de uma ou mais pretensões” – Manual de Processo Civil, 1984, página 71.
Jorge Augusto Pais do Amaral defende que “A distinção entre acções declarativas e acções executivas equivale à diferença entre o simples declarar e executar, entre o dizer e o fazer. No processo declarativo é declarada a vontade concreta da lei, visando o executivo a execução dessa vontade” – Direito Processual Civil, 9ªedição, página 19.
O legislador da Lei nº16/2012 de 20.04 não podia desconhecer a distinção entre as acções declarativa e executiva e dentro das primeiras aquelas a que se refere o artigo 4º, nº 2 do CPC, não tendo, contudo, «abraçado» o critério seguido no referido artigo quando emprega a expressão acções para cobrança de dívidas.
Por outras palavras: no artigo 17º-E nº1 o legislador não fez distinção entre a acção declarativa e/ou executiva, a significar que nele estão incluídos ambos os tipos de acções, desde que visem a cobrança de dívidas contra o devedor, na medida em que são estas que atingem o património do devedor [para além da expressão «acções para cobrança de dívida» o legislador emprega também a expressão «acções em curso com idêntica finalidade», não se referindo, concretamente, à espécie de acção mas à sua concreta finalidade].
Em auxílio à interpretação a que chegámos podemos referenciar, ainda, o DL nº178/2012 de 03.08 – diploma que criou o Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (SIREVE) – concretamente o seu artigo 11º, onde se faz referência expressa às acções executivas para pagamento de quantia certa e às acções destinadas a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias instauradas contra a empresa [determina o nº2 do artigo 11º que «O despacho de aceitação do requerimento de utilização do SIREVE obsta à instauração contra a empresa de quaisquer acções executivas para pagamento de quantia certa ou outras acções destinadas a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias enquanto o procedimento não for extinto e suspende, automaticamente e por igual período, as acções executivas para pagamento de quantia certa ou quaisquer outras acções destinadas a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias, instauradas contra a empresa que se encontrem pendentes à data da respectiva prolação»].
João Aveiro Pereira defende que “embora não exista na lei adjectiva nenhuma espécie de acções de cobrança de dívidas, deve entender-se que esta expressão se reporta a acções declarativas para cumprimento de obrigações pecuniárias e a acções executivas para pagamento de quantia certa” (…) – A revitalização económica dos devedores, em O Direito, ano 145º, 2013, I/II, página 37.
Em suma: conhecendo o legislador o tipo de acções previstas no CPC., ao se referir no artigo 17º-E nº1 da Lei nº16/2012 de 20.04 às acções que tem por fim a cobrança de dívidas, aí fez incluir quer as acções declarativas/de condenação, quer as acções executivas desde que atinjam o património do devedor” - (fim de citação).”
No mesmo sentido, ou seja sobre a mesma questão do âmbito da aplicação da norma, se pronunciou já este coletivo, por diversas vezes, assim ainda muito recentemente no acórdão de 22 de maio de 2019 – apelação 6180/17.9T8VN.P1 –, reafirmando então o entendimento que, como então o dissemos, também sufragámos anteriormente, entre outros no Acórdão de 5 de março de 2018[2], em que fizemos constar o seguinte:
“(…) Ora, no caso em apreciação, embora estando em causa direitos emergentes da relação de trabalho, o certo é que esse direitos (designadamente quanto à indemnização e retribuições), são quantificáveis, e foram quantificados, em dinheiro, o que significa que constituem um direito de crédito sobre o devedor, contendendo com o património deste, e, por isso, a acção em que os mesmos estão em causa devem ser suspensas nos termos do referido artigo 17.º-E, n.º 1, do CIRE.
Este é também o entendimento que se colhe dos Processos n.º 523/12.9TTBRG.P1 e n.º 516/12.6TTBRG.P1, deste tribunal, encontrando-se este disponível em www.dgsi.pt)” (fim de citação).
Face ao que ficou dito, por ser idêntico o caso em análise e não vislumbrarmos qualquer fundamento para divergir desta jurisprudência, entendemos que a presente ação se encontra abrangida pelo disposto no artigo 17.º-E, do CIRE, pois que, relembrando o que se disse anteriormente, não obstante a lei não distinguir quais as acções que se suspendem (por exemplo se acções declarativas e/ou executivas) nem o que deve entender-se (para efeitos legais, naturalmente) por cobrança de dívidas, considera-se no entanto que, pretendendo-se que o devedor através do processo de revitalização obtenha acordo (unânime ou maioritário) com os credores, tendo em vista a sua recuperação económica, esse objectivo só poderá ser alcançado se aí estiverem previstas todas as acções que contendam com o património do devedor[3].
No caso que se aprecia, não existindo dúvidas sobre a anterioridade dos créditos peticionados na ação em relação à data da propositura do PER, contendendo esses como se disse anteriormente com o património da Ré, por força do já referido artigo 17.º-E, n.º 1, do CIRE, uma vez proferida a decisão a que se refere a alínea a), do nº3, do artigo 17º-C do CIRE, tal decisão obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as ações em curso com idêntica finalidade [4].
Escreveu-se no Acórdão desta Secção de 08/09/2014[5] – que acompanhamos aqui de muito perto, incluindo com citações do seu texto:
“(...) se, como se disse, com o PER se pretende obter o acordo dos credores e a revitalização do devedor, tal só adquirirá pleno sentido se todos os credores que possam contender com o património do devedor forem chamados à acção.
Este é, de resto, ao que se conhece, o entendimento uniforme da secção social deste Tribunal da Relação, como pode constatar-se, por exemplo, através do acórdão supra mencionado e dos acórdãos proferidos nos Proc. n.º 523/12.9TTBRG.P1 e n.º 516/12.6TTBRG.P1, encontrando-se este último disponível em www.dgsi.pt).
O PER inicia-se com a manifestação de vontade do devedor e de, pelo menos, um dos seus credores, por meio de declaração escrita (n.º 1 do artigo 17.º - C). Como assinalam Carvalho Fernandes e João Labareda (Código da Insolvência…, pág. 152), (…) a exigência de que pelo menos um credor declare, por escrito, a vontade de iniciar negociações [ ] dirige[-se] a prevenir a inutilidade do processo, usando-o até, porventura, como mero expediente dilatório”.
O devedor, munido da declaração referida deve dar início às negociações conducentes à sua recuperação ao juiz do tribunal competente para declarar a sua insolvência [n.º 3, alínea a), do mesmo artigo].
E na tramitação subsequente (n.º 1 do artigo 17.º- D), o devedor comunica aos credores que não subscreveram o pedido de revitalização que deu início às negociações com vista à referida revitalização, convidando-os a participar nas negociações em curso.
Qualquer credor dispõe então do prazo de 20 dias a contar da publicação no portal do CITIUS do despacho a que se refere a alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º- C para reclamar créditos (n.º 2 do artigo 17.º- D).”
Ora, no caso que se aprecia, tendo sido proferido o despacho a que alude a alínea a), do n.º 3, do artigo 17º-C, do CIRE – foi nomeado administrador judicial provisório à Ré –, por decorrência direta do que preceitua a lei (artigo 17.º- E, n.º 1, do CIRE), não temos dúvidas de que aquela nomeação obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor, suspendendo-se ainda, durante o tempo em que durarem as negociações, quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade, as quais se extinguem logo que seja aprovado e homologado o plano de recuperação, excepto se este prever a continuação de tais ações – por outro, os artigos 17.º-F e 17.º-G, regulam a conclusão das negociações com ou sem a aprovação do plano e, sentindo-se um credor lesado nos seus direitos, pode e deve intervir tendo em conta o desfecho do processo. (...)”
Aplicando pois ao caso o citado entendimento, nos termos expostos, sem necessidade de outras considerações, não encontramos razões para não concluir no mesmo sentido, ou seja que a presente ação se encontra abrangida pela previsão do n.º 1 do artigo 17.º-E do CIRE.
2.2 Da integração da presente ação do plano aprovado no PER
Num segundo argumento, invoca o Recorrente que, “ao contrário do que se afirma na decisão recorrida que “não foi expressamente consignado no Plano o prosseguimento da presente acção”, está mesmo expressamente previsto, na pagina 49 e segs. do Plano alínea D - Efeitos legais sobre as acções Pendentes – do Capitulo VI que a presente acção tem que prosseguir” (conclusão 13ª), “aí se se prevendo que “Todas as acções declarativas que têm em vista o reconhecimento de créditos sobre a C…, deverão prosseguir os seus termos, ao abrigo da prerrogativa legal prevista no disposto na parte final do n.º 1, do artigo 17.º - E, do CIRE, aplicando-se a tais créditos, uma vez reconhecidos, os termos previstos no Plano para créditos de igual natureza.”, distinguindo-as claramente das meras acções executivas, incluindo-as na prerrogativa prevista na parte final daquela disposição legal” (conclusão 14ª). Conclui depois que, “sendo a presente acção de reconhecimento do direito do recorrente a resolver o seu contrato de trabalho com justa causa e do consequente direito ao crédito da respectiva compensação e não de uma simples acção de cobrança de dívida é manifesto que a mesma se inclui na previsão do plano e, portanto, tem de prosseguir” (conclusão 15ª).
Apreciando, e desde logo, constata-se que está afinal aqui em apreciação em parte o mesmo argumento que já apreciámos anteriormente, referente às ações que devem ter-se por integradas na previsão do citado artigo 17.º-E, n.º 1, do CIRE, razão pela qual, face à solução que sufragamos, esse argumento temos por respondido de modo bastante.
Cumprindo avançar pois, faremos de seguida uma abordagem ao caso concreto que se aprecia, por referência ao que se fez constar do PER, em termos de ser respondido ao demais argumentado.
Em primeiro lugar para dizermos que o Autor reclamou no âmbito desse PER os créditos de natureza laboral que considerava deter sobre a Ré, tendo-lhe sido reconhecidos esses apenas em parte, assim no montante de € 105.964,24, sendo que o plano foi homologado por sentença proferida em 12/02/2018 e transitada em julgado em 06/03/2018.
Como se retira da decisão recorrida, aí teria sido considerado[6] que a presente ação se integraria na previsão do plano, quando nesse fez constar que as ações “pendentes à data da apresentação a PER, destinadas à cobrança de créditos (com exceção das execuções fiscais e das execuções por dívidas ao Instituto da Segurança Social, I.P.) − e que se encontrem suspensas − serão consideradas extintas logo que seja aprovado e homologado o presente Plano, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 17.º-E, n.º 1, do CIRE. (…)”.
Também se constata, agora face aos elementos que neste acórdão considerámos demonstrados nos autos, que o plano homologado, depois de se pronunciar sobre os créditos de natureza laboral, aí reconhecidos[7], para além da previsão antes citada, inclui ainda o seguinte: Todas as acções declarativas e procedimentos cautelares que têm em vista o reconhecimento de créditos sobre a C…, deverão prosseguir os seus termos, ao abrigo da prorrogativa legal prevista no disposto na parte final do n.º 1, do artigo 17.º-E, do CIRE, aplicando-se a tais créditos, uma vez reconhecidos, os termos previstos no Plano para créditos de igual natureza.
É precisamente nesta última previsão que o Recorrente, em sede de recurso, insere a presente ação.
Não obstante algumas dúvidas que aqui se possam colocar, consideramos porém que não lhe assiste razão.
As aludidas dúvidas assentarão, importa dizê-lo, em particular na circunstância de se poder retirar do elemento literal, na parte do texto em que num caso consta a referência a ações declarativas que visem o “reconhecimento de créditos” e no outro a ações “destinadas à cobrança de créditos”, numa primeira abordagem, que poderia ter existido uma intenção de distinguir os dois tipos de ações, na consideração, ainda, de que possa ser tido como frequente na linguagem comum[8] uma distinção que aponte mais às ações declarativas, no caso de discussão de direitos de crédito, o seu reconhecimento, e às ações executivas, baseadas pois já em título, a sua cobrança coerciva (sentido que, de algum modo, pode ainda ser tido também como reforçado pelo facto de se ter acrescentado, quanto às últimas, entre parênteses, logo a seguir à menção “destinadas à cobrança de créditos, a expressão “com exceção das execuções fiscais e das execuções por dívidas ao Instituto da Segurança Social, I.P”, ou seja, parecendo referir-se apenas a ações executivas).
No entanto, salvaguardando o respeito que nos merece outro entendimento, tais dúvidas são no caso ultrapassadas com recurso a outros elementos, quer do texto, quer ainda relacionados com o contexto, assim normativo, em que aquele se insere, com recurso às regras de interpretação da declaração, ou seja com respeito pelos critérios enunciados no n.º 1 do artigo 236.º do Código Civil (CC) – assim que o sentido terá de corresponder àquele que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, deduziria do teor da declaração e do contexto factual em que a mesma foi emitida, sendo que, como é consabido, face à teoria da impressão do destinatário que aqui foi acolhida, que assenta numa interpretação objetiva, a declaração vale segundo a vontade exteriorizada pelo declarante e não segundo a sua vontade real, ou seja, com o sentido que um declaratário normal, medianamente informado, extrairia da declaração, salvo se, como no mesmo preceito se exceciona, esse sentido não puder, razoavelmente, ser imputado ao declarante (n.º 1, in fine) ou, ainda, se o declaratário conhecer a vontade real do declarante (n.º 2).
De facto, e em primeiro lugar, importando também ter presente, como se disse, o que resulta do quadro normativo aplicável, a que aludimos anteriormente, consideramos que o conteúdo do plano, assim a previsão antes citada, não permite alicerçar a aludida intenção de distinguir ações declarativas de ações executivas.
É que, e desde logo, vista a previsão legal, assim a redação do n.º 1 do artigo 17.º-E do CIRE, aí se incluem, como se concluiu, e temos entendido, quer as ações declarativas quer as executivas, daí decorrendo, assim, que para efeitos da norma não residirá diferença de regimes no mero facto de se tratar de ação executiva ou declarativa, pois que, em ambas as situações, desde que pendentes à data da nomeação do administrador provisório, a lei prevê a respetiva suspensão. Não permite pois a natureza da ação, ou seja o ser declarativa ou antes executiva, fundamentar, nesse normativo, uma qualquer diferença legal de tratamento. De resto, como resulta dos autos, aquela suspensão, imposta pela norma, foi determinada também quanto à presente ação – de natureza declarativa, face ao seu objeto –, pelo despacho de 6 de setembro de 2016.
De resto, esclareça-se, tendo em conta a referência constante do plano homologado, na previsão que se analisa, a ações que se destinem à “cobrança de créditos”, por contraponto com a previsão legal, assim “acções para cobrança de dívidas” utilizada pelo legislador no n.º 1 do artigo 17.º-E do CIRE, considera-se que aquela não diverge afinal propriamente desta, por residir a diferença existente apenas na substituição da expressão “dívidas” por “créditos”, que aqui não assume particular relevância, pois que assenta tão somente da perspetiva como é vista a questão, assim do devedor ou do credor (o direito de crédito que assiste ao credor tem inerente, por contraponto, na perspetiva do devedor, a dívida correspondente).
Avançando na apreciação, ainda a propósito dessa (como se viu) imposta suspensão das ações, como também referente ao requisito que essas se encontrem pendentes à data da nomeação do administrador provisório, a verdade é que se constata que, afinal, tais menções não constam da primeira das previsões analisada (em que o Recorrente pretende ver inserida a presente ação), mas constam já, expressamente, da última das previsões (em que o Tribunal a quo inseriu esta ação). Do exposto decorre, assim o entendemos, sendo necessário perguntar sobre qual a razão para não se ter incluído, no primeiro caso, os aludidos requisitos, quando esses se fizeram constar no segundo caso, que a resposta passará por considerar que teria havido intenção de distinguir os dois casos, também em função da verificação ou não daqueles requisitos (se assim não fosse qual a razão para essa diferença de redação?), do que resulta, se aplicado ao caso, que a presente ação, ao reunir aqueles, estará assim incluída na segunda das previsões analisadas. Aliás, ainda a propósito do que agora se referiu, a entender-se que seria inócua a referência ou não na previsão que se analisa à verificação desses requisitos, sempre será de perguntar se, não se fazendo constar aqueles, aí não poderão afinal ser inseridas quaisquer ações declarativas ou procedimentos, mesmo que não se insiram na previsão da norma, ou seja do citado n.º 1 do artigo 17.º-E do CIRE?
Apontando pois o que se referiu anteriormente já para a solução a que chegou o Tribunal recorrido, ainda outras razões também encontramos que mais reforçam esse entendimento.
É que, e como fator também relevante, a tudo o que se disse acresce, ainda, que a referência constante da citada previsão a ações declarativas “que têm em vista o reconhecimento de créditos”, também permitirá, mesmo por argumento lógico, dessa excluir as ações declarativas pendentes (suspensas) cujos credores reclamaram no PER os respetivos créditos e aí foram já reconhecidos, no todo ou em parte – o que aqui não releva, pois que o CIRE estabelece o regime aplicável, incluindo para, se for o caso, impugnar a não inclusão de créditos, nos termos do artigo 17.º-D do CIRE –, situação em que se encontra assim o aqui Autor/recorrente. Dito de outro modo, se os créditos foram reconhecidos já no PER, então será caso para perguntar para quê o prosseguimento da ação para os reconhecer? Assim o perguntamos, esclareça-se, precisamente por estarem em causa créditos reclamados e apreciados no PER, não se tratando pois de ação que verse “sobre créditos litigiosos que não foram objeto de reconhecimento (com eventual modificação) no PER”, a que se alude no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Setembro de 2018[9] – em que se refere, citando, ser “de concluir que a devida interpretação da lei vai no sentido de que as ações que versem sobre créditos litigiosos que não foram objeto de reconhecimento (com eventual modificação) no PER estão excluídas da extinção imposta pelo n.º 1 do art. 17.º-E do CIRE. Mesmo que esta interpretação não procedesse, sempre a desaplicação da lei se imporia em caso que tal, isto por violação do art. 20º da Constituição da República Portuguesa”. Ou seja, face à factualidade apurada, resulta que no âmbito do PER em que a Ré figura como devedora, o plano de recuperação da empresa foi homologado por sentença transitada em julgado, encontrando-se aí reconhecido o crédito do aqui Autor, já que em sede do processo especial de revitalização, reclamou os seus créditos, que foram parcialmente reconhecidos (na sede própria, o PER, foram já apreciados os seus créditos). Deste modo, face ao que se referiu, reconhecidos no PER os créditos reclamados pelo aqui Recorrente na presente ação, ainda que com modificação, não faria grande sentido, salvo o devido respeito, por não ser propriamente lógico, afirmar que necessitassem de reconhecimento jurisdicional, como consta da previsão analisada (“...que têm em vista o reconhecimento de créditos”), sendo que, por último, a ser intenção abranger ações em que estivessem em apreciação créditos apenas reconhecidos parcialmente no PER, neste caso com vista a prever-se a continuação das ações na parte dos créditos que não tivessem sido reconhecidos (por se ter entendido que fossem nessa parte litigiosos e a necessitar de apreciação jurisdicional na ação), então, admitindo-se ainda que tal não contrariasse o regime legal, sempre se imporia que, nesse caso, isso mesmo fosse dito expressamente, de um modo claro, o que não é minimamente o caso.
Porque assim é, para efeitos de aplicação dos critérios interpretativos aplicáveis, teremos de reconhecer que a previsão do plano aponta, sem que se coloquem na nossa ótica dúvidas com relevância tal que o impeçam, no sentido de que a presente ação se incluirá não na previsão do plano a que alude o Apelante e sim, noutros termos, naquela em que foi inserida pelo Tribunal a quo.
Concluindo do mesmo modo, incidindo aliás sobre caso similar ao que aqui se aprecia, assim referente a ação de outro trabalhador interposta contra a também aqui Ré, em que discutiam direitos/créditos de idêntica natureza, ação essa também suspensa no âmbito do mesmo PER (processo), e pois com inclusão, exatamente, da previsão que aqui se aprecia, escreveu-se no Acórdão da Relação de Guimarães de 21 de Março de 2019[10]’[11], para além do mais, o seguinte:
“(...) No que respeita à extinção de acções, resulta ainda do citado no art.º 17º-E, n.º 1, do CIRE, que para ser decretada a extinção da acção (declarativas ou executivas), destinadas à cobrança de créditos de devedores que apresentem Per, é necessário o preenchimento de dois requisitos cumulativos:
- que seja aprovado, por decisão transitada em julgado, plano de recuperação apresentado;
-
que não se preveja no plano de recuperação a continuação da acção.
Desde que não existam razões que obstem à homologação do plano de recuperação este deve ser homologado e uma vez homologado tem de produzir os respectivos efeitos que não respeitam apenas ao processo especial de revitalização, mas que se entendem a “quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor” e “às acções em curso com idêntica finalidade”, exceptuando apenas as situações em que no próprio plano se preveja a sua continuação.
No caso dos autos perante a factualidade apurada temos por certo que estamos perante o denominado “PER de homologação”, o que significa que o processo termina logo que seja proferida decisão judicial que homologue o plano apresentado pelo devedor.
Assim, em face da aprovação pela Assembleia de Credores do plano e sua homologação pelo juiz competente, logo que tal decisão transite em julgado fica apta a produzir os seus efeitos legais.
Da factualidade apurada resulta que no âmbito do PER em que a Ré figura como devedora, o plano de recuperação da empresa foi homologado por sentença transitada em julgado, encontrando-se reconhecido o crédito do ora aqui Autor, já que em sede do processo especial de revitalização, reclamou os seus créditos, que foram parcialmente reconhecidos. Ou seja na sede própria, o PER, foram já apreciados os seus créditos.
Por outro lado, resulta ainda da factualidade apurada o inequívoco preenchimento dos dois requisitos cumulativos acima enunciados que conduzem à extinção da instância, ou seja o plano de recuperação apresentado foi aprovado por decisão transitada em julgado e neste não se prevê a continuação da presente acção.
Ora, tendo sido aprovado e homologado o PER, por sentença transitada em julgado, vinculando esta decisão todos os credores e resultando do plano que as acções destinadas à cobrança de créditos que se encontrem suspensas serão consideradas extintas, daqui resulta inequívoca a impossibilidade da continuação das acções em curso, nas quais esta se inclui.
Na verdade, o Recorrente figurou no PER como credor e reclamar da Ré o pagamento destes mesmos créditos, que depois de apreciados e considerados definitivos não foram por si impugnados.
É certo que o Autor não obteve o reconhecimento do montante total do crédito reclamado, mas também não é menos certo que depois apreciado o seu pedido no processo de revitalização, com ele se conformou, pois que não a impugnou junto do Tribunal superior.
Neste sentido decidiu o STJ, no acórdão de 26/11/2015, proc. n.º 1190/12.5TTLSB.L2S1, referindo o seguinte: “3.3. Ora, estando aqui em causa a cobrança de créditos laborais por parte dos AA. contra a Ré devedora, e uma vez que já foi aprovado e homologado o PER, por sentença transitada em julgado, esta decisão vincula todos os credores, não permitindo, assim, a continuação das acções em curso contra os aqui AA. que figuram igualmente no PER como credores, a reclamar da Ré o pagamento desses créditos.”
Mas ainda que se entendesse que a acção declarativa deveria prosseguir e admitindo, o que não é o caso, até que se obtivesse uma decisão favorável na acção declarativa, tal não teria qualquer significado útil, atento o impedimento legal contido no citado art. 17-E n.º 1 do CIRE, de instaurar acção executiva.(...)”

Nos termos expostos, voltando ao caso, pelas razões anteriormente afirmadas, o recurso terá assim de improceder quanto a este argumento do Recorrente.
2.3 Da competência do tribunal
Na sua conclusão 16.ª invoca o Recorrente que “a competência para apreciar as questões emergentes das relações de trabalho subordinado é dos Juízos de Trabalho, nos termos da al. b) do nº 1 do artº 126º da LOSJ, pelo que só por estes tribunais poderiam ser apreciadas as questões levantadas pelo recorrente, ao contrário do afirmado na decisão recorrida”.
Salvo o devido respeito, não se acompanha o entendimento do Recorrente, pois que, de acordo com o disposto na Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário - LOSJ) – que revogou a Lei n.º 3/99, de 13 de janeiro (artigo 187.º, al. b), desta lei), entrada em vigor em 1 de setembro de 2014 (artigo 168.º, n.º 1, com a entrada em vigor do DL n.º 49/2014, de 27 de Março, quanto a este o seu artigo 118.º, n.º 1) –, assim o artigo 128.º, n.º 1, alínea a), “Compete aos juízos de comércio preparar e julgar: a) Os processos de insolvência e os processos especiais de revitalização”, competência essa que, aliás, de acordo com o seu n.º 3, “abrange os respetivos incidentes e apensos, bem como a execução das decisões.”
Ou seja, independentemente da natureza dos créditos, assim a diversa competência que em princípio dessa poderia resultar caso não estivesse pendente o processo especial de revitalização, caso este esteja pendente a lei atribuí a competência para o seu conhecimento aos juízos de comércio, assim quanto ao Per, como ainda respetivos incidentes e apensos.
Não assiste, face ao exposto, razão ao Recorrente.
2.4 Da invocada denegação de justiça
Por último, na sua conclusão 17.ª, sustenta o Recorrente que a decisão de julgar a presente ação extinta por inutilidade superveniente da lide, com base no artito17.º nº 1 do CIRE, consubstancia uma denegação da justiça violadora dos artigos 2.º e 20.º da Constituição da Republica.
Porque também sobre a questão levantada nos pronunciámos no recente acórdão que proferimos em 22 de maio de 2019 (anteriormente identificado), remetemos, como nesse, para o que a esse propósito se fez constar no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de setembro de 2016[12], no qual se pode ler o seguinte:
“(...) Na verdade, o A. intentou a presente ação que seguiu os seus trâmites e começou por ver o seu invocado direito apreciado, sendo que o facto de ocorrer agora a extinção da instância nos presentes autos, tal não implica uma denegação de justiça, porquanto o A. teve a oportunidade legal, que usou, de no PER reclamar os seus créditos.
Vale isto por dizer, que criando a lei um mecanismo que pode implicar a extinção das ações em que os credores peticionem os seus créditos, confere-lhes, por outro, a possibilidade e o direito de reclamarem os mesmos créditos em sede de PER. Não podemos assim falar de negação de acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva.
Aliás, tenham-se presentes os n.ºs 4 e 5 do supra referido art. 20.º, onde se pode ler:
“4. Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo.
5. Para defesa dos direitos liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos”
Ora, como já vimos supra, o PER é, nos termos do disposto no artigo 17.º-A, n.º 3 do CIRE, um processo com carácter urgente e, sendo certo que o principal e mais imediato objetivo do mesmo não é a garantia de todos os créditos de todos os credores, o que é certo, é que, conferindo às empresas devedoras um período de proteção em que não podem ser surpreendidas com ações que ponham ainda mais em causa a estabilidade financeira, também não deixa de ser verdade que o PER, como instrumento com carácter negocial que é, precisa do acordo entre a empresa devedora e a maioria dos credores.
Por outro lado, ainda que alguns credores possam ficar prejudicados, o legislador entendeu que tais prejuízos estão legitimados pelos fins do PER, que se situam na viabilidade das empresas, na manutenção de postos de trabalho e na satisfação de alguns créditos, visando impedir que as empresas caiam na inevitabilidade de se apresentarem à insolvência, com consequências bem mais gravosas para todos os credores.”

Valendo todos os citados argumentos também para o caso, daí decorre, em conformidade, que não obtêm sustentação os argumentos em contrário do Apelante.
Improcede, pelo exposto, também o presente recurso quanto a esta questão.
*
Decaindo, a responsabilidade pelas custas impende sobre o Recorrente (artigo 527.º do CPC).
***
IV - DECISÃO
Acordam os juízes que integram esta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto, na improcedência do recurso, em manter a decisão recorrida.
Custas pelo Recorrente.
Anexa-se sumário (artigo 663.º, n.º 7, do CPC)
*
Porto, 27 de junho de 2019
Nelson Fernandes
Rita Romeira
Teresa Sá Lopes
______________
[1] Ao que se sabe não publicado, Relatora Desembargadora Fernanda Soares.
[2] Apelação 1866/17.0T8PNF-A.P1, mesmo relator e Adjuntas.
[3] Com efeito, não pode também olvidar-se que o acordo, depois de homologado judicialmente, vincula todos os credores, mesmo que não hajam participado nas negociações com o devedor (n.º 6, do artigo 17.º-F do CIRE).
[4] Decorre do n.º 1 do artigo 17.º-E, a comunicação ao juiz, pelo devedor, da pretensão de dar inicio às negociações com os credores tendentes à (sua) recuperação, «[…] obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade […]».
[5] Disponível em www.dgsi.pt.
[6] Dizemos teria sido, pois que a questão não foi expressamente tratada, limitando-se a afirmar que no plano não ficou previsto o prosseguimento da presente ação.
[7] Assim: “1) Pagamento dos créditos laborais no prazo máximo de 90 dias após a data da homologação do Plano, com excepção dos montantes correspondentes a indemnizações por resolução ou revogação de contrato de trabalho que são pagos de acordo com o ponto seguinte; 2) Montantes correspondentes a indemnizações por resolução ou revogação do contrato de trabalho: i. Reembolso do capital em 5 prestações anuais sucessivas e fixas (cada uma no montante de 20% do saldo inicial), vencendo-se a primeira 90 dias após o trânsito em julgado da sentença de homologação do Plano; e ii. Perdão total dos juros vencidos e vincendos. As dívidas a funcionários detêm privilégio creditório geral ou especial e, ao abrigo do Plano de Recuperação, são considerados créditos privilegiados, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 47.º, n.º 4, alínea a) do CIRE e 333.º do Código do Trabalho”.
[8] Independentemente pois do seu sentido jurídico, anteriormente mencionado.
[9] Relator Conselheiro José Rainho, in www.dgsi.pt.
[10] Relatora Desembargadora Vera Maria Sottomayor, disponível em www.dgsi.pt.
[11] No mesmo sentido, incidindo também sobre o mesmo plano e ação proposta por trabalhador contra a mesma Ré, também em www.dgsi.pt, acórdão da mesma Relação de 24.04.2019, Relator Desembargador Eduardo Azevedo.
[12] Relator Conselheiro António Leones Dantas, in www.dgsi.pt.