Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | RITA ROMEIRA | ||
Descritores: | CÚMULO JURÍDICO ADMISSIBILIDADE DE RECURSO COIMAS PARCELARES | ||
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Nº do Documento: | RP202306051597/22.0T8MTS.P1 | ||
Data do Acordão: | 06/05/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL; CONTRA-ORDENAÇÃO LABORAL | ||
Decisão: | PARCIALMENTE ADMITIDO; IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A DECISÃO. | ||
Indicações Eventuais: | 4. ª SECÇÃO SOCIAL | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - Nos processos de contra-ordenação em que esteja em causa a aplicação de uma única coima, em cúmulo jurídico, pela prática de várias infracções, a admissibilidade de recurso, para o Tribunal da Relação, afere-se em função de cada uma das coimas parcelares que devem ser superiores a 25 Ucs ou, independentemente desse valor, abranger sanção acessória. II - Do teor da conjugação dos n.ºs 1 al. a) e 3 do do art. 49.º, da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro resulta a inadmissibilidade de recurso relativamente às contra-ordenações cuja coima aplicada seja inferior a 25 UC ou valor equivalente. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Proc. Nº 1597/22.0T8MTS.P1 Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo do Trabalho de Matosinhos - Juiz 2 Recorrente: Lipor – Serviço Intermunicipalizado de Gestão de Resíduos do Grande Porto Recorrida: ACT – Autoridade para as Condições do Trabalho Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto I - RELATÓRIO Lipor – Serviço Intermunicipalizado de Gestão de Resíduos do Grande Porto, com sede em Baguim do Monte, impugnou judicialmente a decisão administrativa proferida pela Autoridade para as Condições de Trabalho que a condenou como autora material, na forma negligente na coima única de €11.500,00, pela prática das seguintes contraordenações: - 2 contraordenações graves p. e p. pelo art. 34º, nº 5, al. b) do Regulamento UE 165/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho de 24/02 e pelo art. 25º da Lei 27/2010 de 30/08, traduzida na comutação errada pelo motorista dos grupos de tempo, por nos dias 26/04/2021 e 27/04/2021 ter registo de outros trabalhos no período de refeição, que deveria ter comutado como pausa; - 1 contraordenação grave p. e p. pelo art. 25º, nº 1 da Lei 27/2010 de 30/08, conjugado com o art. 36º, nº 1 do Reg. (EU) 165/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho de 24/02, traduzida na falta dos registos tacográficos respeitantes à totalidade dos 28 das anteriores ao da fiscalização, faltando o registo de 29/04/2021; - 1 contraordenação muito grave p. e p. pelo art. 4º do DL 237/2007 de 19/06 em conjugação com o art. 14º do DL 237/2007 de 19/06, traduzida na falta de LIC para registo da actividade diária do ajudante de motorista. Fundamenta a sua impugnação alegando, em síntese, que o veículo em causa está dispensado de utilização de tacógrafo nos termos do art. 2º al. g) da Portaria nº 222/2008 de 05/03, já que os resíduos que transportava são resíduos urbanos cujo conceito actual coincide com o conceito de lixo doméstico a que se refere aquela disposição legal, motivo pelo qual não se pode ser imputada a prática das 3 primeiras contraordenações supra referidas. Quanto à última contra-ordenação a arguida reitera o alegado quanto à isenção de tacógrafo relativa ao veículo em causa e acrescenta que o ajudante de motorista no caso não estava obrigado à utilização de LIC porque tinha horário fixo, estando a arguida apenas obrigada à afixação nos locais de trabalho (nas suas instalações e veículo) do horário de trabalho, de acordo, aliás, com as orientações da própria ACT expressas no ofício circular nº 12/DirACT/14 de 17/03/2014. * Recebida no Tribunal ora, recorrido, foi admitida a impugnação com efeito suspensivo, dado se ter comprovado o pagamento do valor da coima e das custas, realizada a audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença, de cujo dispositivo consta:“Por todo o exposto julgo a impugnação totalmente improcedente e em consequência decido manter a decisão administrativa que condenou a arguida na coima única de €11.500,00 (onze mil e quinhentos euros), pela prática as contraordenações que lhe foram imputadas. * Custas pela arguida com 2 UC de taxa de justiça nos termos do art. 59º da Lei 107/2009 de 14/09, do 8º, nº 2 do Regulamento das Custas Processuais e da Tabela III anexa ao referido Regulamento.”. * Inconformada com esta decisão a arguida interpôs recurso, nos termos da motivação junta que terminou com as seguintes CONCLUSÕES“1.ª – DECORRENTE DA AÇÃO DE FISCALIZAÇÃO LEVADA A EFEITO PELA GNR, NO DIA 21/05/2021, PELAS 09H50M, NA A28, NO SENTIDO SUL/NORTE, NA ÁREA DE SERVIÇO DE ..., ..., 2.ª - FORAM IMPUTADAS À RECORRENTE A PRÁTICA DE QUATRO INFRAÇÕES, TODAS REPORTADAS À CIRCULAÇÃO DO SEU VEÍCULO AUTOMÓVEL PESADO DE MERCADORIAS COM A MATRÍCULA ..-..-OT, 3.ª - SENDO TRÊS DELAS RELATIVAS AO MANUSEAMENTO DO TACÓGRAFO INSTALADO NESSE VEÍCULO E OUTRA PELO FACTO DE O TRABALHADOR QUE SEGUIA A BORDO DO IDENTIFICADO VEÍCULO, AO LADO DO MOTORISTA, NÃO POSSUIR O LIVRETE INDIVIDUAL DE CONTROLO (LIC) PARA REGISTO DA ATIVIDADE DIÁRIA. 4.ª – A IMPUGNAÇÃO APRESENTADA PELA, AGORA, RECORRENTE FOI CONSIDERADA IMPROCEDENTE E, EM CONSEQUÊNCIA, MANTIDA A DECISÃO ADMINISTRATIVA QUE CONDENOU A ARGUIDA NA COIMA ÚNICA DE €11.500,00, PELA PRÁTICA DAS CONTRAORDENAÇÕES QUE LHE FORAM IMPUTADAS. 5.ª – ENTENDE, PORÉM, A RECORRENTE QUE A DOUTA SENTENÇA PROFERIDA ENFERMA QUER DE NULIDADE (ART. 379.º, N.º 1, ALS. B) E C), DO CPP), QUER DE APLICAÇÃO INCORRETA DA LEI. 6.ª – DO ELENCO DOS FACTOS DADOS COMO PROVADOS CONSTA QUE “NA DATA DA FISCALIZAÇÃO O VEÍCULO ESTAVA A SER UTILIZADO PARA TRANSPORTE DE RESÍDUOS ORGÂNICOS PROVENIENTES DE UMA EXPLORAÇÃO AGRÍCOLA, NO CASO CONCRETO, UM HORTO”. (PARTE DO N.º 5) 7.ª – CONTUDO TAL FACTO NÃO CONSTA DA ACUSAÇÃO. 8.ª – NA VERDADE, O QUE CONSTA DA ACUSAÇÃO QUANTO À UTILIZAÇÃO DO VEÍCULO É QUE ESTE, GENERICAMENTE, “É USADO PARA TRANSPORTE DE RESÍDUOS ORGÂNICOS (LIXO NÃO DOMÉSTICO) ENTRE PRODUTORES AGRÍCOLAS E A SEDE DA EMPRESA”. (FACTO 8. CONSTANTE DO PROCESSO N.º ...05) 9.ª – NADA CONSTANDO DA ACUSAÇÃO QUANTO À UTILIZAÇÃO QUE LHE ESTAVA A SER DADA NA DATA DA FISCALIZAÇÃO. 10.ª – ALIÁS, NO MOMENTO EM QUE OCORREU A FISCALIZAÇÃO O CAMIÃO NÃO TRANSPORTAVA QUALQUER TIPO DE RESÍDUO. 11.ª – E A ENTIDADE QUE SOLICITOU A RECOLHA DOS RESÍDUOS É UMA SOCIEDADE QUE SE DEDICA AO COMÉRCIO POR GROSSO DE PRODUTOS ALIMENTARES, ENTRE ELES HORTÍCOLAS E AGRÍCOLAS, AO COMÉRCIO A RETALHO EM FEIRAS DE PRODUTOS ALIMENTARES E AINDA À IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO DE TAIS PRODUTOS ALIMENTARES, NÃO SENDO, COMPROVADAMENTE, UMA EXPLORAÇÃO AGRÍCOLA. 12.ª – BEM COMO A RECORRENTE NÃO É UMA EMPRESA, MAS SIM UMA ASSOCIAÇÃO DE MUNICÍPIOS, CONFORME DADO COMO PROVADO. 13.ª – ACRESCE QUE, ESTANDO EM CAUSA QUATRO PROCESSOS CONTRAORDACIONAIS, FOI A RECORRENTE CONDENADA NA COIMA ÚNICA DE €11.500,00, MAS OMITINDO O TRIBUNAL A QUO A FORMA COMO CALCULOU ESSE CÚMULO JURÍDICO. 14.ª – DESTA FORMA, É NULA A SENTENÇA PORQUE CONDENOU A RECORRIDA POR FACTO DIVERSO DO DESCRITO NA ACUSAÇÃO E PORQUE NÃO SE PRONUNCIOU O TRIBUNAL A QUO SOBRE UMA QUESTÃO DE QUE DEVIA APRECIAR. SEM PRESCINDIR: 15.ª – A ARGUMENTAÇÃO DA RECORRENTE RELATIVA À NATUREZA DO RESÍDUO A QUE O CAMIÃO INSPECIONADO ESTÁ AFETO TRANSPORTAR, TEM RELEVÂNCIA PARA A AFERIÇÃO DA SUA DISPENSA, OU NÃO, DA INSTALAÇÃO E CORRETA UTILIZAÇÃO DO APARELHO DE CONTROLO (TACÓGRAFO). 16.ª – A RECORRENTE ENTENDE E DEFENDEU NOS PRESENTES AUTOS QUE O VEÍCULO INSPECIONADO ESTÁ DISPENSADO DO USO DE TAL APARELHO. 17.ª – NA VERDADE, CONFORME ESTATUI A PORTARIA 222/2008, DE 5.03, - QUE AO ABRIGO DO REGULAMENTO (CE) N.º 561/2006, DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO, DE 15.03 E DO REGULAMENTO (CEE) N.º 3821/85, DO CONSELHO, DE 20.12, REDEFINE REDEFINIR, DE ACORDO COM AS CONDIÇÕES ESPECÍFICAS DO TERRITÓRIO PORTUGUÊS, OS TRANSPORTES QUE DEVEM FICAR ISENTOS DA APLICAÇÃO DAS DISPOSIÇÕES SOBRE TEMPOS DE CONDUÇÃO E REPOUSO E DA OBRIGAÇÃO DE UTILIZAR APARELHO DE CONTROLO (TACÓGRAFO) - ESTÃO ISENTOS DA UTILIZAÇÃO DO TACÓGRAFO “VEÍCULOS AFECTOS A SERVIÇOS DE RECOLHA E TRATAMENTO DE LIXO DOMÉSTICO”. 18.ª – A TERMINOLOGIA “LIXO DOMÉSTICO” CORRESPONDE, ATUALMENTE, NO REGIME GERAL DE GESTÃO DE RESÍDUOS, APROVADO PELO DECRETO-LEI N.º 102-D/2020, DE 10 DE DEZEMBRO, AO CONCEITO DE “RESÍDUOS URBANOS” [(ARTIGO 3.º, N.º 1, AL. EE)]. 19.ª – ORA, INTEGRA A CATEGORIA DE RESÍDUOS URBANOS, ENTRE OUTROS, OS “BIORRESÍDUOS”. 20.ª – E CONSTA DOS FACTOS DADOS COMO PROVADOS QUE “A DITA VIATURA HABITUALMENTE TRANSPORTA BIORRESÍDUOS PARA TRATAMENTO E VALORIZAÇÃO ORGÂNICA.” (N.º 4 DA LISTA DOS FACTOS PROVADOS) 21.ª – ASSIM SENDO, E TENDO SIDO IGUALMENTE DADO COMO PROVADO QUE O TRANSPORTE EM CAUSA ESTAVA A SER EFETUADO COM UM CARIZ PORTA-A-PORTA, MOSTRAM-SE PREENCHIDOS OS REQUISITOS FIXADOS PELO ARTIGO 13.º, AL. H) DO REGULAMENTO (CE) N.º 561/2006, DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO, DE 15.03 E N.º 2, AL. G) DA PORTARIA N.º 222/2008, DE 05.03, PARA CONSIDERAR QUE A VIATURA INSPECIONADA ESTAVA ISENTA DA INSTALAÇÃO E USO DO TACÓGRAFO. 22.ª – POR OPOSIÇÃO NÃO PODERIAM, JAMAIS, SER CLASSIFICADOS OS RESÍDUOS A TRANSPORTAR COMO “AGRÍCOLAS” NO SENTIDO JURÍDICO DO TERMO (RESÍDUOS PROVENIENTES DE EXPLORAÇÃO AGRÍCOLA) 23.ª – DESDE LOGO PORQUE A ENTIDADE QUE SOLICITOU A RECOLHA NÃO ERA, COMO JÁ REFERIDO, UMA “EXPLORAÇÃO AGRÍCOLA”. 24.ª – DEPOIS, TENDO SIDO DADO COMO PROVADO QUE SE TRATAVA DE RESÍDUOS ORGÂNICOS (LOGO BIORRESÍDUOS) PARA SE AFERIR SE SE INCLUÍAM, OU NÃO, NA GESTÃO DOS RESÍDUOS URBANOS, ERA NECESSÁRIA AFERIR O CUMPRIMENTO DAS ESPECIFICAÇÕES DO ARTIGO 10.º DO D.L. N.º 102-D/2020, ISTO É, 25.ª – O ÂMBITO DA GESTÃO DOS RESÍDUOS URBANOS NÃO INCLUI OS RESÍDUOS AGRÍCOLAS (DEIXAM DE SER “URBANOS”) APENAS E SÓ NOS CASOS NÃO ENQUADRÁVEIS NO N.º 3. ISTO É, QUANDO TAIS RESÍDUOS AGRÍCOLAS NÃO SEJAM SEMELHANTES EM TERMOS DE NATUREZA E COMPOSIÇÃO AOS DAS HABITAÇÕES, E NÃO SEJAM PROVENIENTES DE UM ÚNICO ESTABELECIMENTO QUE PRODUZA MENOS DE 1100 L DE RESÍDUOS POR DIA. 26.ª – E O PREENCHIMENTO, OU NÃO, DE TAIS PRESSUPOSTOS NÃO CONSTAM, DE FORMA ALGUMA DA ACUSAÇÃO, LOGO NUNCA PODERIAM SER CONSIDERADOS COMO DEMONSTRADO E, EM CONSEQUÊNCIA, CLASSIFICADO O RESÍDUO COMO RESÍDUO AGRÍCOLA PROVENIENTE DE EXPLORAÇÃO AGRÍCOLA. 27.ª – POR ÚLTIMO É TOTALMENTE IMPERCETÍVEL A CONSIDERAÇÃO CONSTANTE DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA, DE QUE “ASSIM, DO PONTO DE VISTA DO TRIBUNAL, IMPÕE-SE A CONCLUSÃO DE QUE OS RESÍDUOS PROVENIENTES DE EXPLORAÇÕES AGRÍCOLAS, AINDA QUE SEJAM RESÍDUOS URBANOS, NÃO SE CONFUNDEM, EM CASO ALGUM, COM RESÍDUOS PROVENIENTES DAS HABITAÇÕES, ESSES SIM, SUBSUMÍVEIS AO CONCEITO LIXO DOMÉSTICO A QUE REFERE A PORTARIA N.º 222/2008”. (SUBLINHADO NOSSO) 28.ª – É COMPLETAMENTE INADMISSÍVEL O ENTENDIMENTO DE QUE “LIXO DOMÉSTICO” É APENAS O PROVENIENTE DAS HABITAÇÕES. CASO ASSIM FOSSE, COMO SE CLASSIFICARIA O LIXO QUE OS CAMIÕES MUNICIPAIS RECOLHEM DOS CONTENTORES INSTALADOS NAS RUAS OU DO LIXO DE UM RESTAURANTE? 29.ª – NA VERDADE, O QUE MOTIVOU A INSPEÇÃO DO CAMIÃO NÃO FOI A AFERIÇÃO DO TIPO DE RESÍDUO QUE O MESMO TRANSPORTARIA – ATÉ PORQUE NÃO TRANSPORTAVA NENHUM – MAS SIM O FACTO DE, ESTAR ELE DOTADO DE TACÓGRAFO (APESAR DE ISENTO). 30.ª – CONTUDO, NA VERDADE A AQUI RECORRENTE, TENDO EM CONTA A SUA ATIVIDADE E O SEU ESCOPO SOCIAL, ESTÁ ISENTA DE INCLUIR NOS VEÍCULOS QUE SE DESTINAM À RECOLHA DE RESÍDUOS SÓLIDOS URBANOS O USO TACÓGRAFO, TUDO CONFORME JÁ PREVIAMENTE DECIDIDO PELA ACT (MESMA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA QUE AQUI ACUSOU A RECORRENTE), AO ABRIGO DO PROCESSO DE CONTRAORDENAÇÃO LABORAL N.º ...58 – 2.ª SECÇÃO. 31.ª – SE O FAZ, E SEM QUALQUER OBRIGAÇÃO LEGAL QUE O DITE, É PARA PROTEGER OS SEUS TRABALHADORES. 32.ª – RELATIVAMENTE AO PROCESSO ...05, IMPUTOU-SE À RECORRENTE O FACTO DE O TRABALHADOR QUE SEGUIA A BORDO DO IDENTIFICADO VEÍCULO NÃO SE FAZER ACOMPANHAR DO LIVRETE INDIVIDUAL DE CONTROLO (LIC) PARA REGISTO DA ATIVIDADE DIÁRIA. 33.ª – TAL COMPORTAMENTO CONSTITUIRIA UMA VIOLAÇÃO DO ARTIGO 4.º, N.º 1, DO DECRETO-LEI N.º 237/2007, DE 19 DE JUNHO E DA PORTARIA N.º 983/2007 DE 27 DE AGOSTO. 34.ª – ASSIM, ESTÁ EM CAUSA, NOS PRESENTES AUTOS, ENTRE OUTRAS, A DECISÃO DE APLICAÇÃO DE UMA COIMA À RECORRENTE POR INCUMPRIMENTO DE UM SEU TRABALHADOR QUE SEGUIA A BORDO DO IDENTIFICADO VEÍCULO, NÃO POSSUIR O LIVRETE INDIVIDUAL DE CONTROLO (LIC) PARA REGISTO DA ATIVIDADE DIÁRIA, VIOLANDO O PRECEITUADO NA PORTARIA N.º 983/2007, DE 27 DE AGOSTO. 35.ª – ACONTECE QUE A PORTARIA N.º 983/2007 DE 27.08, FOI REVOGADA PELA PORTARIA N.º 7/2022 DE 4 DE JANEIRO, TENDO ENTRADO EM VIGOR NO DIA 01.01.2022. 36.ª – ESTA RECENTE PORTARIA ELIMINA A OBRIGATORIEDADE DE O REGISTO DO TEMPO DE TRABALHO SER EFETUADO ATRAVÉS DO LIVRETE INDIVIDUAL DE CONTROLO (LIC). 37.ª – ASSIM E DADO QUE EM MATÉRIA CONTRA-ORDENACIONAL, VIGORA POR IMPERATIVO CONSTITUCIONAL E LEGAL A REGRA DA APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI MAIS FAVORÁVEL AO ARGUIDO (MESMO QUE OS FACTOS CONSTANTES DA ACUSAÇÃO TENHAM SIDO PRATICADOS EM DATA ANTERIOR À DA ENTRADA EM VIGOR DA NOVA LEI) 38.ª – O CONHECIMENTO E O AJUIZAR DAS CONSEQUÊNCIAS DA ENTRADA EM VIGOR DA NOVA PORTARIA QUE REGULA AS CONDIÇÕES DE PUBLICIDADE DOS HORÁRIOS DE TRABALHO E A FORMA DE REGISTO DOS RESPETIVOS TEMPOS DE TRABALHO SÃO DO CONHECIMENTO OFICIOSO. 39.ª – MOTIVO PELO QUAL, SEM PRESCINDIR DA INVOCADA NULIDADE DA SENTENÇA, SEMPRE PODERÁ DESDE JÁ ESTE ALTO TRIBUNAL CONSIDERAR NÃO PUNÍVEL A CONDUTA IMPUTADA À RECORRENTE E, EM CONSEQUÊNCIA, ABSOLVER DA RESPETIVA COIMA APLICADA POR INCUMPRIMENTO DO SEU TRABALHADOR, QUE SEGUIA A BORDO DO IDENTIFICADO VEÍCULO JUNTAMENTE COM O MOTORISTA, NÃO SE FAZER ACOMPANHAR DO LIVRETE INDIVIDUAL DE CONTROLO (LIC) PARA REGISTO DA ATIVIDADE DIÁRIA. 40.ª – A DECISÃO RECORRIDA NÃO APLICOU, ASSIM, OFICIOSAMENTE A LEI MAIS FAVORÁVEL À RECORRENTE, BEM COMO ENFERMA, COM A DEVIDA VÉNIA, DE NULIDADES E ERROS DE JULGAMENTO AFETANDO, EM CONSEQUÊNCIA, A APLICAÇÃO DO DIREITO, MOSTRANDO-SE VIOLADAS, PELO MENOS, AS NORMAS CONSTANTES DOS SEGUINTES ARTIGOS E DIPLOMAS LEGAIS: - 34.º, N.º 5, AL. B), SUBALS. I), II) E III), E 36.º, N.º 1 AMBOS DO REGULAMENTO (EU) N.º 165/2014, DE 4.02 - 13.º, AL. H) DO REGULAMENTO (CE) N.º 561/2006, DE 15.03 - 25.º, N.º 1, AL. B) E N.º 2 DA LEI N.º 27/2010, DE 30.08 - 2.º, AL. G) DA PORTARIA N.º 222/2008, 5.03 - 3.º, N.º 1, ALS. D) E EE), E 10.º DO DECRETO-LEI N.º 102-D/2020, DE 10.12 - 4.º, N.º 1, DO DECRETO-LEI N.º 237/2007, DE 19.06 - ARTIGO 60.º DA LEI N.º 107/2009, DE 14 DE SETEMBRO; - ARTIGO 3.º, N.º 2, DO D.L. N.º 433/82, DE 27.10 E - PORTARIA N.º 7/2022, DE 4.01, NOMEADAMENTE O ARTIGO 7.º NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO QUE V.ª EX.ª ENTENDA SUPRIR DEVE SER CONCEDIDO SUPRIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA, DEVE SER: A) DECRETADA NULA A SENTENÇA QUANTO À DECISÃO RELATIVA AOS PROCESSOS N.ºS ...13, ...89 E ...90 (DISPENSA DO USO DO TACÓGRAFO), B) APLICADA À RECORRENTE A LEI MAIS FAVORÁVEL QUANTO À MATÉRIA CONSTANTE DO PROCESSO N.º ...05 (LIC); E C) REVOGADA A APLICAÇÃO DA COIMA ÚNICA NO VALOR DE €11.500,00. ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA!”. * Admitido o recurso, com efeito devolutivo, respondeu o Ministério Público apresentando contra-alegações, que finalizou com as seguintes CONCLUSÕES:“1- é inadmissível recurso relativamente à contra-ordenação cuja coima aplicada seja inferior a 25 UC ou valor equivalente; 2- sendo o valor das coimas aplicadas pela prática de cada uma das contra-ordenações p. pelo art. 34.º, n.º 5, al. b) do Regulamento (EU) n.º 165/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de fevereiro de 2014, e punível pelo art. 25.º, n.º 2 da Lei 27/2010, de 30 de agosto, e pela contra-ordenação p. no art. 36, n.º 1 do Regulamento (EU) n.º 165/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de fevereiro de 2014, e punível pelo art. 25.º, n.º 1, al. b) da Lei 27/2010, de 30 de agosto, inferior a 25 UC, o recurso interposto pela arguida é de rejeitar quanto a elas; 3- a “alteração substancial” dos factos pressupõe uma diferença de identidade, de grau, de tempo ou espaço, que transforme o quadro factual descrito na acusação em outro diverso, ou manifestamente diferente no que se refira aos seus elementos essenciais, ou materialmente relevantes de construção e identificação factual, e que determine a imputação de crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis. 4- já a “alteração não substancial” constitui uma divergência ou diferença de identidade que não transformem o quadro da acusação em outro diverso no que se refere a elementos essenciais, mas apenas de modo parcelar e mais ou menos pontual, e sem descaracterizar o quadro factual da acusação, e que, de qualquer modo, não têm relevância para alterar a qualificação penal ou para determinar a moldura penal; 5- todavia, o cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 358.º do C.P.P. apenas se efetuará quando se tratar de uma modificação relevante, o que sucede quando a alteração divirja do que se encontra descrito na acusação ou na pronúncia e a subsequente comunicação se mostre útil à defesa; 6- pois, no caso em apreço, para a imputação das contra-ordenações por que a arguida foi condenada, é irrelevante para a defesa da arguida se o veículo da arguida “é usado para transporte de resíduos orgânicos (lixo não doméstico) entre produtores agrícolas e a sede da empresa” ou se “Na data da fiscalização estava a ser utilizado para transporte de resíduos orgânicos provenientes de uma exploração agrícola”; 7- por isso, não se verifica a nulidade prevista no art. 379.º, n.º 1, al. b) do C.P.P.; 8- e também não se verifica a nulidade prevista na alínea c) do mesmo artigo, porque a arguida/recorrente, no recurso de impugnação que interpôs, não só não colocou em causa a medida concreta de cada uma das coimas aplicadas pela autoridade administrativa, assim como também não impugnou o calculo do seu cumulo jurídico; 9- por isso, o tribunal a quo não tinha que se pronunciar sobre o calculo do cumulo jurídico; 10- os veículos da arguida que não façam a recolha de lixo doméstico porta à porta não estão isentos de utilização de tacógrafo; 11- o tipo objetivo da infração p. no 14.º, n.º 3, al. a) do D.L. n.º 237/2007, de 19 de julho, preenche-se com a não utilização de suporte de registo dos tempos de trabalho de trabalhador móvel não sujeito ao aparelho de controlo previsto no Regulamento (CEE) n.º 3821/85, de 20 de dezembro, alterado pelo Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março; 12- através da Portaria nº 7/2022, de 4 de janeiro, o legislador consolidou “(…) num único instrumento as exigências regulamentares referenciadas, clarificaram-se os conteúdos e os momentos em que há publicitação do horário de trabalho e em que se procede ao registo dos tempos de trabalho, disponibiliza-se um leque de opções ao empregador na escolha dos suportes que mais se adaptem ao seu modelo de negócio e à sua frota, acolhendo-se a possibilidade de uso de suportes digitais, eliminando-se, assim, a existência do livrete individual de controlo físico e o inerente requisito administrativo da autenticação pela Autoridade para as Condições do Trabalho, e revogando-se a Portaria n.º 983/2007, de 27 de agosto.”; 13- a Portaria 7/2022 não eliminou a obrigatoriedade da publicidade dos horários de trabalho dos trabalhadores com horários fixos e dos horários dos trabalhadores móveis, nem a obrigatoriedade do seu registo; 14- apenas deixou nas mãos do empregador o direito de escolher a publicidade – e apenas esta – dos horários de trabalho de tais trabalhadores e de outros através de qualquer uma das modalidades previstas no art. 3.º, n.º 1 e nas alíneas a), c) e d) do art. 4º ou, até 28 de fevereiro de 2023, pela utilização do livrete individual de controlo previsto no art. 3º da Portaria 983/2007; 15- mas já não o seu registo que, no que toca aos trabalhadores afetos à exploração de veículo automóvel, incluindo os trabalhadores móveis, continua a ser obrigatório, podendo ser realizado através de sistema informático ou através de qualquer outro meio, nomeadamente através do livrete individual de controle; 16- por isso, com a sua publicação, não foi despenalizada a infração p. no 14.º, n.º 3, al. a) do D.L. n.º 237/2007, de 19 de julho. Nestes termos e nos demais que Vossas Excelências sabiamente suprirão, deverá o recurso interposto ser parcialmente rejeitado e negado provimento ao demais.”. * Os autos subiram a esta Relação e, na sequência de promoção do Ex.mº Procurador-Geral Adjunto, foram os autos devolvidos à 1ª instância para efeitos de prolação pela Mª Juíza “a quo”, do despacho previsto no nº 4 do art. 414º do CPP, que se pronunciou nos seguintes termos: «A arguida interpôs recurso da sentença proferida nos autos, invocando, além do mais a nulidade daquela decisão com fundamento nas alíneas b) e c) do art. 379º, nº 1 do Código de Processo Penal, uma vez que o tribunal manteve a decisão da autoridade administrativa com base num facto não constante da acusação, no caso a decisão administrativa e que o tribunal omitiu o cálculo do cúmulo jurídico das coimas parcelares.Dispõe aquele preceito legal (aplicável por força do disposto pelo art. 60º da lei 107/2009 de 14/09 e pelo art. 40 do Regime Geral das Contra Ordenações) que: “1- É nula a sentença: (…) b) Que condenar por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, fora dos casos e das condições previstos nos artigos 358.º e 359.º; c) Quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.” Do ponto de vista do tribunal a sentença não enferma de qualquer das nulidades que lhe são imputadas. No que respeita à nulidade por omissão de pronuncia invocada por o tribunal não se ter pronunciado sobre o cálculo do cúmulo jurídico das coimas parcelares, importa apenas referir que tal questão não foi suscitada na impugnação da decisão administrativa, motivo pelo qual o tribunal não se pronunciou, nem devia pronunciar-se, estando o tribunal limitado pelo objecto da impugnação. Por isso, a decisão recorrida não enferma no vício invocado pela recorrente. No que respeita à manutenção da decisão administrativa com base num facto não constante da decisão administrativa, importa referir que o facto que se considerou provado em 5) da sentença recorrida, não é susceptível, nem foi esse o sentido da decisão, de configurar uma alteração substancial dos factos constantes da acusação, leia-se para o que interessa nos autos na decisão administrativa. Na verdade, de acordo com o art. 1º, nº 1, al. f) do Código de Processo Penal, considera-se “«Alteração substancial dos factos» aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis”, o que não aconteceu no caso dos autos, já que, quer as contra-ordenações imputadas, quer as sanções aplicadas foram confirmadas pelo tribunal, não tendo havido qualquer modificação relativamente o que constava da decisão administrativa. Por outro lado, não é também aplicável o disposto pelo art. 358º, nº 1 do Código de Processo Penal, relativo à alteração não substancial dos factos, face ao disposto pelo nº 2 da mesma disposição legal, já que o facto em causa, foi expressamente invocado pela recorrente na impugnação, designadamente no último parágrafo da página 23, pelo que, mesmo que se considerasse que tal factualidade constitui uma alteração não substancial, nunca haveria lugar à aplicação do regime previsto pelo art. 358º, nº 1, pelo que, não está configurada a nulidade a que se refere o art. 379º, nº 1, al. b) do Código de Processo Penal. Consequentemente, do ponto de vista do tribunal não se verificam as nulidades da sentença invocadas pela arguida, mantendo-se, assim, na íntegra a decisão recorrida. Notifique.». * Novamente, nesta Relação o Ex.mº Procurador-Geral Adjunto, emitiu parecer, aderindo à resposta apresentada pelo Sr. Procurador da República, em 1ª instância, conclui que no sentido de o presente recurso não obter provimento, mantendo-se a sentença recorrida, no essencial, por considerar que, «a suscitada “questão prévia”, merece a nossa concordância a tese do nosso Exmo. Colega junto da 1ª. Instância, quanto às três contra ordenações que identifica e, que por via do valor das coimas concretamente aplicadas, não são passíveis de serem sindicáveis por via de recurso.Nessa parte terá de improceder o recurso por falta de pressupostos legais para sua admissão. Quanto às invocadas nulidades, responderam adequadamente a Mma. Juíza “a quo” e o recorrido Mº. Pº., cujas respostas merecem a nossa concordância e donde resulta a sem razão da recorrente. No mais, quanto à quarta contra ordenação, ressalvado o respeito devido por melhor opinião em contrário, nenhum reparo ou censura há que ser feito à douta sentença recorrida, que, deverá ser confirmada, atento o rigor dos fundamentos que nela foram consignados e que determinaram a improcedência da impugnação administrativa. Relativamente à questão da despenalização acompanhamos a sentença recorrida e as contra alegações do recorrido Mº. Pº.. Vale aqui ainda, “mutatis mutandis” a orientação do Ac. TRLX., de 17-10-2018, segundo a qual “… deve-se considerar que o respectivo motorista é um “trabalhador móvel”, pelo que dever-se-ia fazer acompanhar de livrete individual de controlo.”, que, agora, terá de ser vista à luz da recente Portaria nº. 7/2022, que permite um novo regime de publicidade dos horários de trabalho.». * Notificada deste Parecer, a arguida não apresentou resposta.* Foi cumprido o disposto no art. 418º do CPP, remetendo-se o processo aos vistos e o projecto de acórdão por via electrónica. * Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso (cfr. art.s 403º, nº 1 e 412º, nº 1, do CPP), as questões colocadas pela recorrente para apreciação consistem em saber, se a decisão recorrida deve ser revogada, por, como defende aquela: 1. a sentença proferida é nula por ter condenado a recorrente por factos diversos dos descritos na acusação e por omitir a realização do cúmulo jurídico das coimas parcelares, conforme o estatuído no artigo 379.º, n.º 1, als. b) e c) do C.P.P.; 2. a atividade de transporte da recorrente enquadra-se nas situações de isenção de utilização de tacógrafo nos seus veículos, isenção prevista na al. g) do n.º 2 da Portaria n.º 222/2008, de 5 de março, pelo que não lhe poderá ser, em consequência aplicável o regime sancionatório pela violação do disposto no Regulamente (CE) n.º 561/2006, nem em consequência, punida, por violação do disposto nos artigos 34.º, n.º 5, al. b) e 36.º, n.º 1 do Regulamento EU 165/2012, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de abril; 3. em virtude da Portaria n.º 983/2007, de 27 de agosto, ter sido revogada pela Portaria n.º 7/2022, de 4 de janeiro, que entrou em vigor em 1.1.2022, a qual eliminou a necessidade e a obrigação de registar o tempo de trabalho no Livrete Individual do Condutor, a sua falta deixou de ser punível. * II - FUNDAMENTAÇÃO A) OS FACTOS: O tribunal a quo, decidiu e fixou os seguintes: “Factos Provados 1) A arguida é uma Associação de Municípios que associa os Municípios de Espinho, Gondomar, Maia, Matosinhos, Porto, Póvoa de Varzim, Valongo e Vila do Conde. 2) A arguida tem como objecto social imediato a reciclagem, valorização, tratamento e aproveitamento final dos resíduos sólidos entregues pelos municípios seus associados e por outras entidades que a associação venha a admitir, bem como a gestão, manutenção e desenvolvimento de infraestruturas necessárias para o efeito. 3) No dia 21/05/2021, pelas 09h50, a arguida mantinha em circulação na A28, sul/norte, área de serviço de ..., ..., o veículo pesado de mercadorias, de matrícula ..-..-OT, sua propriedade, conduzido por AA, tendo tal veículo sido objecto de uma fiscalização efectuada pela GNR. 4) A dita viatura habitualmente transporta biorresíduos para tratamento e Valorização Orgânica. 5) Na data da fiscalização o veículo estava a ser utilizado para transporte de resíduos orgânicos provenientes de uma exploração agrícola, no caso concreto, um horto, a pedido expresso do próprio, com dia e hora marcados, entre as instalações do dito produtor e a sede da empresa 6) No dia 27/04/2021, o condutor do dito veículo realizou pausa para o almoço, por volta das 12h, no entanto não comutou o aparelho tacográfico para pausa, tendo aquele período ficado registado como “outros trabalhos. 7) No dia 26/04/2021, o referido condutor realizou pausa para o almoço entre as 12h e as 13h, no entanto não comutou o aparelho tacográfico para pausa, ficando aquele período registado como “outros trabalhos”. 8) No momento da fiscalização o condutor não apresentou a totalidade dos registos de actividade referentes aos últimos 28 dias, estando em falta o registo tacográfico do dia 29/04/2021. 9) A bordo do mesmo veículo, no dia da fiscalização seguia, além do condutor, BB, que exercia as funções de ajudante de motorista. 10) O referido BB não possuía livrete individual de controlo (LIC) para registo da actividade diária. 11) O referido ajudante de motorista apresentou declaração com horário de trabalho das 7h às 15h. 12) Em 2020 a arguida apresentou um volume de negócios de € 49 176 227,98. 13) Em Outubro de 2021, a arguida ministrou 8 horas de formação profissional ao condutor do veículo sobre Regulamentação Social e Transportes. * Não houve factos alegados com relevo para a decisão da causa que não se tenham demonstrado.”.* B) O DIREITOAplica-se, ao caso, o regime processual das contra-ordenações laborais e de segurança social aprovado pela Lei nº 107/2009 de 14 de Setembro (designado de ora em diante RPCOL e diploma a que pertencerão os demais artigos a seguir referidos sem outra indicação de origem) e, por determinação do seu art. 60º, subsidiariamente, desde que o contrário dela não resulte, “…,são aplicáveis, com as devidas adaptações, os preceitos reguladores do processo de contra-ordenação previstos no regime geral das contra-ordenações.”, ou seja, no Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro, (RGCO, forma como será designado de ora em diante) com as alterações introduzidas pelos Decretos-Lei nº 356/89, de 17 de Outubro e nº 244/95, de 14 de Setembro, e pela Lei n.º 109/2001, de 24 de Dezembro. * A primeira questão a apreciar, consiste em saber:- Se o recurso é parcialmente inadmissível A recorrente pretende recorrer da sentença que a condenou em quatro coimas, uma delas no valor de €620,00 pela prática da contraordenação prevista no art. 34.º, n.º 5, al. b) do Regulamento (EU) n.º 165/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de fevereiro de 2014, e punível pelo art. 25.º, n.º 2 da Lei 27/2010, de 30 de agosto, traduzida na comutação errada pelo motorista dos grupos de tempo de trabalho no dia 26/4/2021, outra no valor de €2.050,00 pela prática da contraordenação prevista no art. 36, n.º 1 do Regulamento (EU) n.º 165/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de fevereiro de 2014, e punível pelo art. 25.º, n.º 1, al. b) da Lei 27/2010, de 30 de agosto, traduzida na falta dos registos tacográficos respeitantes à totalidade dos 28 das anteriores ao da fiscalização, faltando o registo de 29/04/2021, uma outra, no valor de €620,00 pela prática da contraordenação prevista no art. 34.º, n.º 5, al. b), do Regulamento (EU) n.º 165/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de fevereiro de 2014, e punível pelo art. 25.º, n.º 2 da Lei 27/2010, de 30 de agosto, traduzida na comutação errada pelo motorista dos grupos de tempo de trabalho no dia 27/4/2021 e outra no valor de €9.200,00 pela prática da contra-ordenação prevista e punida pelas disposições conjugadas dos arts. 4.º e 14º, n.º 3, al a) do DL 237/2007, de 19/06, traduzida na falta de LIC para registo da actividade diária do ajudante de motorista. O Exmo. Procurador-Geral Adjunto, no parecer que emitiu, defende que o recurso não deve ser admitido quanto às três primeiras coimas aplicadas, cujo valor é inferior a €2.550,00 (€102,00 x 25 UC). Que dizer? Como dissemos, é aplicável, ao caso, a Lei nº 107/2009, de 14.09, a qual dispõe no seu art. 49º sob a epígrafe “Decisões judiciais que admitem recurso” que: “1 – Admite-se recurso para o Tribunal da Relação da sentença ou do despacho judicial proferidos nos termos do artigo 39º, quando: a) For aplicada ao arguido uma coima superior a 25 UC ou valor equivalente; b) A condenação do arguido abranger sanções acessórias; (...) 2 – Para além dos casos enunciados no número anterior, pode o Tribunal da Relação, a requerimento do arguido ou do Ministério Público, aceitar o recurso da decisão quando tal se afigure manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência. 3 - Se a sentença ou o despacho recorrido são relativos a várias infracções ou a vários arguidos e se apenas quanto a alguma das infracções ou a algum dos arguidos se verificam os pressupostos necessários, o recurso sobe com esses limites.”. Transpondo, o que decorre deste, para o caso, é manifesta, a razão do Ministério Público ao pugnar pela não admissibilidade parcial do presente recurso. Senão, vejamos. Como decorre daquele, art. 49º, 1, al.s a) e b), a admissibilidade de recurso contra-ordenacional para o Tribunal da Relação pressupõe a aplicação de coima superior a 25 unidades de conta (€2.550,00) ou, independentemente desse valor, caso abranja sanções acessórias. Verifica-se, assim, que os Tribunais de Trabalho funcionam como primeira instância de recurso - impugnação judicial - das decisões proferidas pela autoridade administrativa, cfr. art.s 32º e 33º do RPCOL e o Tribunal da Relação, por sua vez, funciona como uma instância de revista que julga em definitivo, sendo nesta matéria contra-ordenacional mais restritiva a admissibilidade de recurso, comparativamente ao que acontece no recurso penal ou civil. Por via do que se vem a expor, no caso, apenas a coima aplicada no valor de €9.200,00 é superior a 25 UC, sendo que, diversamente, tal não se verifica com as demais, respectivamente, duas de €620,00 e uma de €2.050,00, não se verificando, quanto a estas os pressupostos necessários à admissão do recurso. E se é certo que existe, ainda, a possibilidade, nos termos do nº 2, do referido art. 49º de o Tribunal da Relação poder aceitar o recurso a pedido do arguido ou do Ministério Público quando “… tal se afigure manifestamente necessário á melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência”, o certo, também, é que a arguida não a invocou. Assim, pese embora, o recurso ter sido admitido na 1ª instância, porque tal decisão não vincula esta Relação (art. 414º, nº 3 do CPP), não sendo a decisão recorrível no que concerne às aludidas contraordenações em que foi aplicada coima não superior a 25 UCs., não se admite o recurso, nessa parte, atento o que decorre, também, do nº 3, do mesmo art. 49º. Pois, deste, resulta que a recorribilidade se afere em função das coimas individuais e não da coima única e se apenas quanto a alguma das infracções ou a algum dos arguidos se verificam os pressupostos necessários, o recurso sobe com esses limites. Conforme com este entendimento, de que é pressuposto de admissibilidade de recurso que, em caso de condenação em coima única decorrente de concurso de infracções, o montante de 25 UCs se afira em relação à coima parcelar (tendo de ser superior a 25 UCs, excepto se acompanhadas de sanção acessória -art.49º, nº 1, a), b) e nº 3-) e não pela coima única, vejam-se, entre muitos outros, os (Ac.s desta Relação de 08.09.2020, Proc. nº 4203/19.6T8MTS.P1, de 15.12.2021, Proc. nº 37/21.6Y3VNG.P1, de 12.09.2022, Processo n.º 118/22.4T8MTS.P1 (com intervenção como adjuntas da, agora, relatora e 1ª adjunta), in www.dgsi.pt.). Donde, no caso concreto, não tendo a condenação abrangido penas acessórias, não ser admissível o recurso relativamente às condenações nas coimas parcelares de €620,00 e €2.050,00. E, em consequência, o recurso só é admissível quanto à contra-ordenação em que foi aplicada a coima no valor de €9.200,00, pela prática da contra-ordenação, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 4.º e 14.º, n.º 3, al a) do DL 237/2007, de 19/06, não se admitindo quanto às demais. * Analisemos, agora, tendo em conta que o recurso está limitado à apreciação da coima aplicada no montante de €9,200,00, a questão:- Da nulidade da sentença Relativamente a esta, refere a arguida o seguinte: “ENTENDE, PORÉM, A RECORRENTE QUE A DOUTA SENTENÇA PROFERIDA ENFERMA QUER DE NULIDADE (ART. 379.º, N.º 1, ALS. B) E C), DO CPP), QUER DE APLICAÇÃO INCORRETA DA LEI. DO ELENCO DOS FACTOS DADOS COMO PROVADOS CONSTA QUE “NA DATA DA FISCALIZAÇÃO O VEÍCULO ESTAVA A SER UTILIZADO PARA TRANSPORTE DE RESÍDUOS ORGÂNICOS PROVENIENTES DE UMA EXPLORAÇÃO AGRÍCOLA, NO CASO CONCRETO, UM HORTO”. (PARTE DO N.º 5). CONTUDO TAL FACTO NÃO CONSTA DA ACUSAÇÃO. NA VERDADE, O QUE CONSTA DA ACUSAÇÃO QUANTO À UTILIZAÇÃO DO VEÍCULO É QUE ESTE, GENERICAMENTE, “É USADO PARA TRANSPORTE DE RESÍDUOS ORGÂNICOS (LIXO NÃO DOMÉSTICO) ENTRE PRODUTORES AGRÍCOLAS E A SEDE DA EMPRESA”. (FACTO 8. CONSTANTE DO PROCESSO N.º ...05). NADA CONSTANDO DA ACUSAÇÃO QUANTO À UTILIZAÇÃO QUE LHE ESTAVA A SER DADA NA DATA DA FISCALIZAÇÃO. ALIÁS, NO MOMENTO EM QUE OCORREU A FISCALIZAÇÃO O CAMIÃO NÃO TRANSPORTAVA QUALQUER TIPO DE RESÍDUO. E A ENTIDADE QUE SOLICITOU A RECOLHA DOS RESÍDUOS É UMA SOCIEDADE QUE SE DEDICA AO COMÉRCIO POR GROSSO DE PRODUTOS ALIMENTARES, ENTRE ELES HORTÍCOLAS E AGRÍCOLAS, AO COMÉRCIO A RETALHO EM FEIRAS DE PRODUTOS ALIMENTARES E AINDA À IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO DE TAIS PRODUTOS ALIMENTARES, NÃO SENDO, COMPROVADAMENTE, UMA EXPLORAÇÃO AGRÍCOLA. BEM COMO A RECORRENTE NÃO É UMA EMPRESA, MAS SIM UMA ASSOCIAÇÃO DE MUNICÍPIOS, CONFORME DADO COMO PROVADO. ACRESCE QUE, ESTANDO EM CAUSA QUATRO PROCESSOS CONTRAORDACIONAIS, FOI A RECORRENTE CONDENADA NA COIMA ÚNICA DE €11.500,00, MAS OMITINDO O TRIBUNAL A QUO A FORMA COMO CALCULOU ESSE CÚMULO JURÍDICO. DESTA FORMA, É NULA A SENTENÇA PORQUE CONDENOU A RECORRIDA POR FACTO DIVERSO DO DESCRITO NA ACUSAÇÃO E PORQUE NÃO SE PRONUNCIOU O TRIBUNAL A QUO SOBRE UMA QUESTÃO DE QUE DEVIA APRECIAR. Apreciando. Desde logo, diga-se que, a arguida nulidade da sentença – com fundamento na condenação por diversos factos dos descritos na acusação – prende-se com os factos imputados à arguida relativamente às contraordenações previstas e punidas pelo art. 25º da Lei nº27/2010 de 30.08 e que, aqui, se considerou não admissível o recurso. Por isso, nessa parte não se conhece, pelos mesmos motivos, de tal fundamento. Mas, a arguida veio ainda arguir a nulidade da sentença por ter omitido o cálculo do cúmulo jurídico das coimas parcelares. No entanto, a este propósito, podemos dizer, desde já, que não tem razão a recorrente. Com efeito, tendo a decisão da 1ª instância mantido o teor da decisão administrativa que aplicou as coimas e sufragando também o cálculo do cúmulo jurídico não tinha que proceder à indicação das coimas parcelares, a não ser que a recorrente tivesse impugnado a decisão administrativa quanto à fixação de cada uma das coimas parcelares, o que não foi o caso. Por isso, improcede a arguida nulidade da sentença por omissão de pronúncia. * Passemos, à questão:- Da aplicação da lei mais favorável relativamente à contraordenação aqui em apreciação – prevista e punida pelo art. 4º conjugado com o art. 14º, ambos do DL nº237/07 de 19.06. Na decisão recorrida consta o seguinte: «Deste modo, aquele trabalhador, na medida em que exerce as funções de ajudante de motorista da arguida, não estando sujeito ao aparelho de controlo conhecido como tacógrafo, devia fazer uso do Livrete Individual de Controlo para registo do número de horas de trabalho prestadas, nos termos do art. 4.º, n.ºs 1 e 2 daquele decreto-lei e dos arts. 1.º, n.ºs 2 e 3 e 3.º da Portaria n.º 983/2007, de 27 de Agosto. Na verdade, tratando-se de trabalhador móvel, ou seja, de trabalhador integrante do pessoal viajante, mas não condutor, o registo do número de horas de trabalho prestadas pelo mesmo, pela própria natureza do trabalho, não podia ser efectuado e controlado através de tacógrafo – que, quando obrigatório, exerce tal finalidade relativamente ao condutor –, mas sim através do Livrete Individual de Controlo, o qual visa permitir a verificação dos tempos de trabalho, de disponibilidade e de descanso que o trabalhador efectivamente observou, de modo a permitir apurar o número de horas de trabalho prestadas, adaptando ao trabalhador móvel não sujeito a controlo por tacógrafo o disposto no art. 202.º do Código do Trabalho de 2009. Uma última nota para referir que apesar do alegado em contrário pela arguida este o entendimento que resulta do Ofício-Circular nº 12/DirACT/14 de 17/03/2014, relativo à Consolidação das Orientações Internas – Harmonização dos Regimes Legais Aplicáveis no Domínio dos Transporte Rodoviários e Respectivo Quadro Sancionatório, que a arguida juntou aos autos e cujo quadro sinóptico a arguida transpôs mesmo para o requerimento de impugnação judicial, pelo que, a errada interpretação que a arguida fez de tais orientações, é totalmente irrelevante do ponto de vista de uma eventual exclusão da ilicitude da sua atuação. Em face do exposto, conclui-se que a arguida violou o disposto no art. 4.º, n.º 1 e 2 do DL n.º 237/2007, de 19 de Junho, conjugado com os arts. 1º, nº e 3.º da Portaria n.º 983/2007, de 27 de Agosto, incorrendo na contra-ordenação muito grave prevista no art. 14.º, n.º 3, al. a) daquele primeiro diploma.». A recorrente discorda dizendo o seguinte: “RELATIVAMENTE AO PROCESSO ...05, IMPUTOU-SE À RECORRENTE O FACTO DE O TRABALHADOR QUE SEGUIA A BORDO DO IDENTIFICADO VEÍCULO NÃO SE FAZER ACOMPANHAR DO LIVRETE INDIVIDUAL DE CONTROLO (LIC) PARA REGISTO DA ATIVIDADE DIÁRIA. TAL COMPORTAMENTO CONSTITUIRIA UMA VIOLAÇÃO DO ARTIGO 4.º, N.º 1, DO DECRETO-LEI N.º 237/2007, DE 19 DE JUNHO E DA PORTARIA N.º 983/2007 DE 27 DE AGOSTO. ASSIM, ESTÁ EM CAUSA, NOS PRESENTES AUTOS, ENTRE OUTRAS, A DECISÃO DE APLICAÇÃO DE UMA COIMA À RECORRENTE POR INCUMPRIMENTO DE UM SEU TRABALHADOR QUE SEGUIA A BORDO DO IDENTIFICADO VEÍCULO, NÃO POSSUIR O LIVRETE INDIVIDUAL DE CONTROLO (LIC) PARA REGISTO DA ATIVIDADE DIÁRIA, VIOLANDO O PRECEITUADO NA PORTARIA N.º 983/2007, DE 27 DE AGOSTO. ACONTECE QUE A PORTARIA N.º 983/2007 DE 27.08, FOI REVOGADA PELA PORTARIA N.º 7/2022 DE 4 DE JANEIRO, TENDO ENTRADO EM VIGOR NO DIA 01.01.2022. ESTA RECENTE PORTARIA ELIMINA A OBRIGATORIEDADE DE O REGISTO DO TEMPO DE TRABALHO SER EFETUADO ATRAVÉS DO LIVRETE INDIVIDUAL DE CONTROLO (LIC). ASSIM E DADO QUE EM MATÉRIA CONTRA-ORDENACIONAL, VIGORA POR IMPERATIVO CONSTITUCIONAL E LEGAL A REGRA DA APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI MAIS FAVORÁVEL AO ARGUIDO (MESMO QUE OS FACTOS CONSTANTES DA ACUSAÇÃO TENHAM SIDO PRATICADOS EM DATA ANTERIOR À DA ENTRADA EM VIGOR DA NOVA LEI). O CONHECIMENTO E O AJUIZAR DAS CONSEQUÊNCIAS DA ENTRADA EM VIGOR DA NOVA PORTARIA QUE REGULA AS CONDIÇÕES DE PUBLICIDADE DOS HORÁRIOS DE TRABALHO E A FORMA DE REGISTO DOS RESPETIVOS TEMPOS DE TRABALHO SÃO DO CONHECIMENTO OFICIOSO. MOTIVO PELO QUAL, SEM PRESCINDIR DA INVOCADA NULIDADE DA SENTENÇA, SEMPRE PODERÁ DESDE JÁ ESTE ALTO TRIBUNAL CONSIDERAR NÃO PUNÍVEL A CONDUTA IMPUTADA À RECORRENTE E, EM CONSEQUÊNCIA, ABSOLVER DA RESPETIVA COIMA APLICADA POR INCUMPRIMENTO DO SEU TRABALHADOR, QUE SEGUIA A BORDO DO IDENTIFICADO VEÍCULO JUNTAMENTE COM O MOTORISTA, NÃO SE FAZER ACOMPANHAR DO LIVRETE INDIVIDUAL DE CONTROLO (LIC) PARA REGISTO DA ATIVIDADE DIÁRIA. A DECISÃO RECORRIDA NÃO APLICOU, ASSIM, OFICIOSAMENTE A LEI MAIS FAVORÁVEL À RECORRENTE, BEM COMO ENFERMA, COM A DEVIDA VÉNIA, DE NULIDADES E ERROS DE JULGAMENTO AFETANDO, EM CONSEQUÊNCIA, A APLICAÇÃO DO DIREITO.”. Vejamos. Comecemos por lembrar, aqui, os factos que ficaram provados, com interesse para esta questão, a saber: “– a bordo do mesmo veículo, no dia da fiscalização (21.05.2021) seguia, além do condutor, BB, que exercia as funções de ajudante de motorista. O referido BB não possuía livrete individual de controlo (LIC) para registo da atividade diária. O referido ajudante de motorista apresentou declaração com horário de trabalho das 7h às 15h.”. E, perante esta factualidade, mais uma vez, sempre com o devido respeito, a recorrente não tem razão. A decisão recorrida não merece censura. Justifiquemos seguindo, aqui, os argumentos e fundamentos apresentados nas contra alegações, já que com os mesmos concordamos, onde se lê que, o legislador consolidou através da Portaria nº 7/2022, de 4 de Janeiro, “(…) num único instrumento as exigências regulamentares referenciadas, clarificaram-se os conteúdos e os momentos em que há publicitação do horário de trabalho e em que se procede ao registo dos tempos de trabalho, disponibiliza-se um leque de opções ao empregador na escolha dos suportes que mais se adaptem ao seu modelo de negócio e à sua frota, acolhendo-se a possibilidade de uso de suportes digitais, eliminando-se, assim, a existência do livrete individual de controlo físico e o inerente requisito administrativo da autenticação pela Autoridade para as Condições do Trabalho, e revogando-se a Portaria n.º 983/2007, de 27 de agosto. (…), da regulamentação prevista na Portaria 7/2022 resulta que o legislador não eliminou a obrigatoriedade da publicidade dos horários de trabalho dos trabalhadores com horários fixos e dos horários dos trabalhadores móveis, nem a obrigatoriedade do seu registo (…) apenas deixou nas mãos do empregador o direito de escolher a publicidade – e apenas esta – dos horários de trabalho de tais trabalhadores e de outros através de qualquer uma das modalidades previstas no art. 3.º, n.º 1 e nas alíneas a), c) e d) do art. 4º ou,” (até 28 de Fevereiro de 2023), “pela utilização do livrete individual de controlo previsto no art. 3º da Portaria 983/2007. Mas já não o seu registo que, no que toca aos trabalhadores afetos à exploração de veículo automóvel, incluindo os trabalhadores móveis, continua a ser obrigatório e, de harmonia com o disposto no art. 7.º, n.º 4 da Portaria 7/2022, pode ser realizado através de sistema informático ou através de qualquer outro meio, nomeadamente através do livrete individual de controle,…”. Ou seja, podendo ser realizado através de sistema informático ou através de qualquer outro meio, nomeadamente através do livrete individual de controle. Por isso, considerarmos que com a sua publicação, não foi despenalizada a infração p. no 14.º, n.º 3, al. a) do D.L. n.º 237/2007, de 19 de julho. Pois, a arguida/recorrente foi condenada pela prática da contra-ordenação prevista pelas disposições conjugadas dos arts. 4.º, n.º 1 e 14.º, n.º 3, al. a) do D.L. n.º 237/2007, de 19 de julho. O primeiro artigo dispõe: “1 — No caso de trabalhador móvel não sujeito ao aparelho de controlo previsto no Regulamento (CEE) n.º 3821/85, de 20 de Dezembro, alterado pelo Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março, ou previsto no AETR, o registo do número de horas de trabalho prestadas a que se refere o artigo 162.o do Código do Trabalho indica também os intervalos de descanso e descansos diários e semanais e, se houver prestação de trabalho a vários empregadores, de modo a permitir apurar o número de horas de trabalho prestadas a todos eles. 2 — A forma do registo referido no número anterior é estabelecida em portaria conjunta dos membros do Governo responsáveis pela área laboral e pela área dos transportes. (…).”, e o segundo: “3 — Constitui contra-ordenação muito grave: a) A não utilização de suporte de registo; (…).” O tipo objetivo da infração preenche-se com a não utilização de suporte de registo dos tempos de trabalho de trabalhador móvel não sujeito ao aparelho de controlo previsto no Regulamento (CEE) n.º 3821/85, de 20 de dezembro, alterado pelo Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março. A forma do registo dos tempos de trabalho encontrava-se regulada pela Portaria n.º 983/2007, de 27 de agosto, portaria que foi revogada pela Portaria n.º 7/2022, de 4 de janeiro, que entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 2022, com exceção do disposto nos seus arts. 4.º, n.º 1, al. b), 5.º, n.º 3 e 6.º, n.º 2 que passaram a produzir efeitos a partir do dia 1 de Setembro de 2022. Concluímos, deste modo, que não ocorreu “despenalização” da referida contra- ordenação, mas antes foi dada a possibilidade ao empregador de efetuar o registo dos horários de trabalho por outra modalidade que não o livrete individual de controlo. Tal conclusão é reforçada pelo teor da Portaria nº216/022 de 30.08, com publicação no (Diário da República n.º 167/2022, Série I de 2022-08-30) cujo preâmbulo aqui transcrevemos “Com a publicação da Portaria n.º 7/2022, de 4 de janeiro, passou a disponibilizar-se um leque de opções ao empregador na escolha dos suportes que mais se adaptarem ao seu modelo de negócio e à sua frota, incluindo a possibilidade de uso de um sistema informático, tendo em vista a eliminação do livrete individual de controlo físico e o inerente requisito administrativo da autenticação pela Autoridade para as Condições do Trabalho. Esta portaria prevê uma norma transitória que concede ao empregador que pretenda optar pela utilização do sistema informático, a possibilidade de, até 31 de agosto de 2022, poder efetuar a publicidade dos horários de trabalho por recurso a qualquer uma das restantes modalidades previstas ou pela utilização do livrete individual de controlo, sendo dispensada a autenticação. Considerando que a opção pelo sistema informático depende da conceção, desenvolvimento e implementação de um sistema informático inovador, sem paralelo no mercado, com sólidas caraterísticas de integralidade, autenticidade e inviolabilidade, o qual deverá ser devidamente certificado por entidade acreditada, justifica-se a prorrogação daquele prazo por seis meses, por forma a garantir capacidade de resposta adequada à respetiva operacionalização nomeadamente com a aquisição do software, instalação nos aparelhos e formação dos utilizadores. Assim, nos termos do n.º 4 do artigo 216.º do Código do Trabalho, do n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 237/2007, de 19 de junho, e do n.º 2 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 117/2012, de 5 de junho, manda o Governo, pelo Secretário de Estado da Economia, no uso de competência delegada pelo Despacho n.º 7476/2022, de 3 de junho, do Ministro da Economia e do Mar, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 114, de 14 de junho de 2022, pelo Secretário de Estado do Trabalho, no uso de competência delegada pelo Despacho n.º 7910/2022, de 21 de junho, da Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 123, de 28 de junho de 2022, pelo Secretário de Estado da Mobilidade Urbana, no uso de competência delegada pelo Despacho n.º 9520/2022, de 29 de junho, do Ministro do Ambiente e da Ação Climática, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 149, de 3 de agosto de 2022, e pelo Secretário de Estado das Infraestruturas, no uso de competência delegada pelo Despacho n.º 8871/2022, de 12 de julho, do Ministro das Infraestruturas e da Habitação, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 139, de 20 de julho de 2022, o seguinte: Artigo 1.º Objeto A presente portaria procede à primeira alteração da Portaria n.º 7/2022, de 4 de janeiro, retificada pela Declaração de Retificação n.º 4/2022, de 28 de janeiro, que regulamenta as condições de publicidade dos horários de trabalho e a forma de registo dos respetivos tempos de trabalho. Artigo 2.º Alteração da Portaria n.º 7/2022, de 4 de janeiro Os artigos 10.º e 12.º da Portaria n.º 7/2022, de 4 de janeiro, retificada pela Declaração de Retificação n.º 4/2022, de 28 de janeiro, passam a ter a seguinte redação: «Artigo 10.º [...]1 - Até 28 de fevereiro de 2023, o empregador pode optar por efetuar a publicidade dos horários de trabalho por recurso a qualquer uma das modalidades previstas no n.º 1 do artigo 3.º e nas alíneas a), c) e d) do artigo 4.º ou pela utilização do livrete individual de controlo previsto na Portaria n.º 983/2007, de 27 de agosto, sendo dispensada a autenticação.(sublinhados nossos) 2 - [...] Artigo 12.º [...] 1 - [...] 2 - Sem prejuízo do número anterior, a alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º, o n.º 3 do artigo 5.º e o n.º 2 do artigo 6.º produzem efeitos a partir de 1 de março de 2023.» Artigo 3.º Entrada em vigor A presente portaria entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação». Termos em que, resta concluir, também, pela improcedência do recurso relativamente à contraordenação muito grave de que a arguida vinha acusada. * III - DECISÃOEm face do exposto: - Não se admite o recurso relativamente às contra-ordenações referentes aos processos nº...13, ...89 e ...90. - Julga-se improcedente o recurso relativamente à contra-ordenação referente ao processo ...05. -E confirma-se, em consequência, a decisão recorrida. * Custas a cargo da recorrente. Após trânsito em julgado deste Acórdão, comunique à ACT, com cópia certificada do mesmo. * Porto, 5 de Junho de 2023* O presente acórdão é assinado electronicamente pelos respectivos,Rita Romeira Teresa Sá Lopes António Luís Carvalhão |