Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2227/19.2YIPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANA LUCINDA CABRAL
Descritores: INJUNÇÃO
TAXA DE JUSTIÇA
PAGAMENTO
Nº do Documento: RP202003092227/19.2YIPRT.P1
Data do Acordão: 03/09/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: A falta de comprovação do pagamento da taxa de justiça por parte do requerente em procedimento de injunção se rege pelo disposto no citado artigo 570º, do Código de Processo Civil, só sendo processualmente viável o desentranhamento previsto no n.º 6 deste preceito e no artigo 20º do regime anexo ao decreto-lei nº 269/98, de 01/09, depois de lhe ser dada a oportunidade prevista no n.º 5 normativo em referência.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. nº 2227/19.2YIPRT.P1

Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro
Juízo Local Cível de Ovar
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I - Relatório
Nos presentes autos supra epigrafados, foi proferido, em 24/9/2019, o seguinte despacho:
“Através do ofício de 09.09.2019, a autora foi notificada para, no prazo de dez dias após a distribuição do requerimento de injunção, proceder ao pagamento do remanescente da taxa de justiça inicial devida, nos termos previstos no n.º 6 do artigo 7.º do Regulamento das Custas Processuais.
Essa notificação foi efetuada com a cominação de desentranhamento da peça processual apresentada, nos termos previstos no artigo 20.º do regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de setembro, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro.
A distribuição ocorreu em 10.09.2019.
Já decorreram mais de dez dias e não está comprovado nos autos o pagamento do remanescente da taxa de justiça inicial (apesar de autora referir no requerimento de 19.09.2019 ter pago a quantia em questão).
Face ao exposto (sem contraditório prévio, por manifesta desnecessidade – cf. o n.º 3 do artigo 3.º do Código de Processo Civil), determino, nos termos previstos no artigo 20.º do regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, o desentranhamento do requerimento de injunção.
Consequentemente, declaro extinta a instância, por impossibilidade superveniente da lide, nos termos previstos na alínea d) do artigo 277.º do Código de Processo Civil.
Fixo à ação o valor de €4.354,77 (cf. o disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 297.º, e nos n.ºs 1 e 2 do artigo 306.º do Código de Processo Civil).
Custas a cargo da autora, nos termos previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do Código de Processo

Em requerimento de 25/9/2019, a autora veio informar que por lapso não indicou no programa citius a referência do DUC que pagou. No entanto, a taxa de justiça foi paga no tempo que lhe foi oportunamente concedido, conforme comprovativo que anexou. Requereu que fosse relevado o seu lapso e que fosse ordenado o prosseguimento dos presentes autos.

Foi então proferido o seguinte despacho:
Como se disse na sentença proferida em 24.09.2019, não foi comprovado nos autos o pagamento do remanescente da taxa de justiça inicial no prazo de 10 dias previsto no n.º 6 do artigo 7.º do Regulamento das Custas Processuais.
Essa omissão de comprovar o pagamento da taxa devida pela autora no prazo fixado na lei tem como consequência o desentranhamento do requerimento inicial, nos termos previstos no artigo 20.º do regime anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de setembro, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro [esta solução legal é paralela à da recusa da petição inicial de uma ação declarativa comum, em caso de falta de comprovativo do pagamento da taxa de justiça – cf. a alínea f) do artigo 558.º do Código de Processo Civil].
Face ao exposto, indefiro o requerido.”

A autora, B…, Lda, veio interpor recurso, concluindo:
a) O lapso de não inserção da referência DUC, tem de ser relevado à parte, quando esta comprove que pagou a taxa de justiça oportunamente.
b) a não junção do comprovativo de pagamento da taxa de justiça não pode determinar sem mais o desentranhamento do requerimento injuntivo.
c) o disposto no artigo 20º do DL nº 269/98, que estabelece o desentranhamento da peça processual, só opera, em qualquer o caso – quer dizer, esteja em causa a petição do autor ou a oposição do réu –, depois de esgotados os mecanismos que se acham previstos no artigo 570º do CPC.
d) impõe-se, portanto, a Revogação da decisão recorrida, substituindo-a por outra que ordene o prosseguimento dos presentes autos,
Assim se fazendo a costumada Justiça!!!

Nos termos da lei processual civil são as conclusões do recurso que delimitam o objecto do mesmo e, consequentemente, os poderes de cognição deste tribunal.
Assim, a questão a resolver consiste em saber se há fundamento para a rejeição/desentranhamento da petição inicial.
II – Fundamentação de facto
Para a decisão do recurso releva a factualidade que se extrai do relatório supra.
III – Fundamentação de direito
No caso estamos perante um processo de injunção que, devido à dedução de oposição, foi à distribuição, no cumprimento do estipulado no artigo 16º/1 do DL nº 269/98.
O procedimento injuntivo transformou-se em acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias.
De acordo com o disposto nos artigos 7° n°1, 13° e 14° do Regulamento das Custas Processuais (RCJ) e 552º nº 7 do Código de Processo Civil, o autor deve apresentar juntamente com a petição inicial documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida ou da concessão do benefício de apoio judiciário, na modalidade de dispensa da mesma.
A jurisprudência deste Tribunal da Relação tem sido constante em afirmar que da conjugação do disposto nos artigos 7º, nº 4 e 13º, nº 1, do Regulamento das Custas Processuais, com os artigos 145º e 570º, do CPC, resulta que a falta de comprovação do pagamento da taxa de justiça por parte do requerente em procedimento de injunção se rege pelo disposto no citado artigo 570º, do Código de Processo Civil, só sendo processualmente viável o desentranhamento previsto no n.º 6 deste preceito e no artigo 20º do regime anexo ao decreto-lei nº 269/98, de 01/09, depois de lhe ser dada a oportunidade prevista no n.º 5 normativo em referência.
O artigo 570º do Código de Processo Civil comporta dois momentos correspondentes a duas sanções tributárias, cumulativas: i) Constatando-se a falta de junção do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça, a secretaria deve notificar oficiosamente a requerente para, em 10 dias, efectuar o pagamento omitido com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 5 UC (n.º 3); ii) persistindo a requerente na omissão do pagamento da taxa de justiça e multa, cabe ao juiz cominar a sanção tributária agravada, prevista no n.º 5 do normativo, proferindo despacho-convite ao suprimento da omissão, com o pagamento da taxa de justiça devida, da multa prevista no n.º 3 e da multa acumulada, de valor igual ao da taxa de justiça inicial, com o limite mínimo de 5 UC e máximo de 15 UC..
Só depois haverá lugar ao desentranhamento do articulado nos termos do disposto n.º 6 deste artigo 570º do CPC e artigo 20.º do regime do procedimento de injunção.
Em suma, perfilha-se a jurisprudência de que não recusando a secretaria a petição e não sendo posteriormente rejeitada a sua distribuição, não deve o juiz decidir logo pela extinção da acção, qualquer que seja a forma pela qual a mesma seja determinada. – v.g. desentranhamento da petição, absolvição da instância ou outra decisão equivalente.
Ao invés, por aplicação devidamente adaptada do regime do artigo 570º do CPC em obediência ao princípio de que terá de dar-se tratamento igualitário a situações em tudo semelhantes, deve dar-se a oportunidade ao requerente para, no prazo de 10 dias, efectuar o pagamento em falta.
Efectivamente, não recusando a secretaria o recebimento da petição e não sendo rejeitada a sua distribuição, como a lei impõe, inviabiliza-se a possibilidade do requerente lançar mão do benefício estabelecido no artigo 560º, sendo que o mesmo não pode ser prejudicado por tais omissões da secretaria, conforme expressamente disposto no artigo 157º, nº 6 do CPC – vide acórdãos desta Relação do Porto, de 23/5/2006, 0622181, de 9/10/2006, processo 0654628 e de 23-11-2017, processo 5087/15.9T8LOU-A.P1, acórdão da Relação de Lisboa de 13/4/2010, processo 2288/09.2TBTVD.L1-1, acórdão da Relação de Coimbra de 16-10-2014, processo 73/14.1TTCBR-A.C1, todos em www.dgsi.pt.
Pelo exposto, delibera-se julgar totalmente procedente a presente apelação e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida, que deverá ser substituída por outra, que determine a notificação prevista no n.º 3 do artigo 570º do CPC.
Não há lugar a custas.

Porto, 9 de Março 2020
Ana Lucinda Cabral
Maria do Carmo Domingues
José Carvalho