Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
35/08.5P6PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA MANUELA PAUPÉRIO
Descritores: ERRO DE ESCRITA
TRIBUNAL COLECTIVO
Nº do Documento: RP2014101535/08.5P6PRT.P1
Data do Acordão: 10/15/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: REMESSA Á 1ª INSTÂNCIA
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: Ocorrendo erro de escrita revelado no texto do acórdão condenatório mas não se sabendo qual a verdadeira vontade do julgador, impõe-se a remessa do processo à 1ªinstancia a fim de que os mesmos juízes subscritores do acórdão do tribunal colectivo procedam à sua correcção, e só depois se conheçam das questões recursivas.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo número 35/08.5P6PRT.P1

Acordam em conferência na Primeira Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:

I) Relatório
No processo comum coletivo com o número acima referido foi o arguido B… condenado:
- pela prática de um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo artigo 256º nº 1 alínea c) do Código Penal, na pena de 10 meses de prisão;
- um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo artigo 256º número 1 alínea e) e 3 do Código Penal, na pena de 10 meses de prisão;
- um crime de burla qualificada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 218º nº 2 alínea a) e 217º do Código Penal, na pena de 3 anos e 6 meses de prisão;
Consta na parte decisória que o arguido foi condenado na pena única de 3 anos e 9 meses de prisão efetiva.

Inconformado com a decisão proferida dela veio o arguido interpor recurso, em súmula, questionando a constitucionalidade da condenação, em concurso efetivo, pelos crimes de burla e de falsificação e, ainda, colocando em causa não ter a pena única aplicada sido suspensa na sua execução.

A este recurso respondeu o Ministério Público junto do tribunal recorrido, conforme emerge de folhas 1358 a 1363 dos autos concluindo pela manutenção do decidido.

Neste Tribunal da Relação o Digno Magistrado do Ministério Público começa por realçar a circunstância de, no acórdão em recurso, existir uma disparidade entre a pena única que primeiramente foi fixada em 4 anos e aquela que consta na parte decisória, onde se refere ser de 3 anos e 9 meses a pena única aplicada. Existe, assim, uma desconformidade entre o que se encontra escrito e aquilo que o tribunal coletivo deliberou e queria ter escrito. Concluiu, o Digno Magistrado, que se tratou de um lapso de escrita que pode ser corrigido, mas que tal correção só pode ser levada a cabo por quem proferiu a decisão.
No mais, quanto às questões suscitadas no recurso sufraga o mesmo entendimento anteriormente expendido pelo Ministério Público na primeira instância.

Cumprido o preceituado no artigo 417º do Código de Processo Penal nada foi acrescentado no processo.

Colhidos os Vistos foram os autos submetidos a conferência.

Questão prévia
Antes de passarmos ao conhecimento do objeto do recurso importa dirimir a questão suscitada pelo senhor Procurador Geral Adjunto, no seu parecer no qual, com a devida vénia, nos louvamos, atentas as judiciosas considerações aí aduzidas as quais igualmente sufragamos e que, portanto, nos escusamos de repetir.
Com efeito, olhada a decisão proferida ressalta com clareza que a mesma contem um lapso; quando o tribunal cuidou da escolha e medida das penas a aplicar ao arguido pelos provados dois crimes de falsificação e um crime de burla qualificada, concretizou as penas parcelares a aplicar-lhe e, de seguida, a pena única, tendo, então, escrito que a mesma se fixava em 4 anos de prisão.
Sucede, porém, que na parte decisória encontra-se escrito que a pena única a aplicar ao arguido é de 3 anos e 9 meses de prisão.
Resulta assim patente a existência dum lapso.
Numa das vezes o juiz subscritor do acórdão escreveu coisa diversa do que tinha sido deliberado pelo tribunal coletivo e do que, seguramente, ele próprio queria ter escrito. Estamos assim perante um erro que se evidencia patentemente dos próprios termos da decisão e que, assim sendo, deve ser corrigido nos termos do estabelecido no artigo 380º do Código de Processo Penal. [1]
Contudo, tal correção não pode ser feita nesta sede porquanto, do texto da decisão, não se evidencia qual terá sido a verdadeira vontade do julgador; em que momento é que ele, na realidade, se equivocou; se quando escreveu que a pena única a aplicar ao arguido era de 4 anos de prisão quando queria dizer 3 anos e 9 meses ou o contrário. Para mais quanto ambas as penas únicas são, em abstrato, admissíveis.
Só quem proferiu a decisão pode, realmente, colmatar este lapso e só depois de tal correção poderemos conhecer das questões que no recurso nos são colocadas.

Assim sendo:
Determina-se a remessa destes autos ao tribunal de primeira instância, a fim de que os juízes que integraram o tribunal coletivo[2] corrijam o lapso de escrita que a decisão recorrida evidencia.
Após devem os autos retornar a este Tribunal a fim de que se conhecerem as questões colocadas no recurso.

Porto, 15/10/2015
Maria Manuela Paupério
Élia São Pedro
___________
[1] Neste sentido ver acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de janeiro de 2007, in processo 3510/06, 5ª relatado pelo Conselheiro Oliveira Rocha.
[2] Ver acórdão desta Relação de 10 de outubro de 2007, relatado pelo Desembargador Pinto Monteiro e disponível em http://www.gde.mj.pt/jtrp.nsf; “Nos casos de julgamento por tribunal coletivo, o pedido de correção ou aclaração do acórdão é decidido por todos os juízes que compõem o tribunal. Sendo-o apenas pelo presidente, gera-se a nulidade da alínea e) do artigo 119º do Código de Processo Penal”