Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1816/08.5TBVLG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: HENRIQUE ARAÚJO
Descritores: COMPETÊNCIA INTERNACIONAL
NULIDADE DA CITAÇÃO
Nº do Documento: RP201202071816/08.5TBVLG.P1
Data do Acordão: 02/07/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - À luz do regulamento comunitário 44/2001 é internacionalmente competente para a acção o Estado-Membro em cujo lugar os serviços contratados foram ou devam ser prestados ou os bens foram ou devam ser entregues.
II – Nos termos do Regulamento 1348/2000 qualquer Estado-Membro tem a faculdade de proceder directamente, por via postal, à citação de actos judiciais destinada a pessoas residentes num outro Estado-Membro;
III – Se a nulidade da citação não for arguida no prazo da contestação considera-se sanada.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: PROC. N.º 1816/08.5TBVLG.P1
Do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Valongo.
REL. N.º 689
Relator: Henrique Araújo
Adjuntos: Fernando Samões
Vieira e Cunha
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ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

I. RELATÓRIO

“B…, Lda.”, com sede na Rua …., ../.., …, Valongo, intentou, no Tribunal Judicial de Valongo, acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato contra “C…”, com sede em …, Rue …, ….., França, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia de 38.678,44 €, acrescida de juros de mora sobre o capital de 35.040,56 €, desde a propositura da acção até efectivo e integral cumprimento, com fundamento no fornecimento de diverso material da indústria de serralharia de precisão que a Ré não pagou.

Em 26.05.2008 foi expedida carta-registada para citação da Requerida na sua sede social, onde foi entregue em 30.05.2008 – cfr. fls. 92/93.
Na sequência dessa carta foi apresentado articulado em língua francesa, subscrito pelos Ex.ºs Advogados D… e E….

Notificada desse articulado, a Requerente veio dizer o seguinte:
“Não obstante parte documento junto a fls. 89 e 90 estar redigida em língua estrangeira, resulta inequivocamente de todo o seu teor, nomeadamente do respectivo cabeçalho, que o mesmo constitui resposta à carta que recebeu, para citação, sendo ainda que o mesmo se encontra subscrito por Advogados, embora de uma sociedade de Advogados de Direito francês.
(…)
Verifica-se, porém, que aquele articulado, por ser apresentado em língua francesa, não respeita o disposto no art. 139º-1, o que impede a Autora de exercer o respectivo contraditório.
Para além disso, a Ré não comprova a autoliquidação da taxa de justiça inicial.
Salvo melhor opinião, deve a Ré ser notificada nos termos e para os efeitos do disposto no art. 486ºA-3 CPC, e bem assim para, no prazo que lhe for concedido, apresentar aos autos cópia traduzida em língua portuguesa, do articulado que produziu, sob a cominação de o mesmo ser desentranhado, com todas as consequências legais.
(…)”.

O Mmº Juiz a quo deferiu esse requerimento e, em 05.01.2009, foi expedida nova carta registada para a Requerida, tendo esta apresentado tradução do articulado apresentado.

Em 18.09.2009, o Mmº Juiz proferiu novo despacho do seguinte teor:
“Constata-se … que não foi junta aos autos procuração outorgada a favor do advogado subscritor da oposição apresentada. Assim, notifique-o nos termos do disposto no art. 40º, n.º 2, do CPC”.

Em 27.01.2010, foi expedida carta-registada à Requerida, notificando-a nos termos do transcrito despacho.

No dia 04.06.2010, o Mmº Juiz exarou o despacho que segue:
“Foram apresentados, em nome da requerida, requerimentos subscritos por mandatário que não juntou aos autos procuração outorgada a seu favor.
Notificado para juntar aos autos procuração, não a juntou em 10 dias nem até ao momento.
Assim, e atento o disposto no art. 40º, n.º 2, do CPC, fica sem efeito tudo o que o mesmo praticou, ordenando-se o desentranhamento de tal processado e sua devolução ao apresentante.
(…)”.

Finalmente, em 26.01.2011, foi proferida decisão que, por falta de oposição da Requerida, conferiu força executiva à petição (fls. 124/125).

Notificada dessa sentença, veio a Ré arguir a incompetência internacional do tribunal português e a nulidade da citação.

Por decisão proferida em 05.04.2011, o tribunal da 1ª instância julgou improcedentes as arguições da Ré que, inconformada, logo recorreu.

O recurso foi admitido como sendo de apelação, com efeito meramente devolutivo.

Nas alegações de recurso a apelante conclui do seguinte modo:
1. A recorrente interveio regularmente pela primeira vez no processo em 4 de Fevereiro de 2011, através de requerimento de arguição de incompetência absoluta e de nulidades da citação.
2. A competência do tribunal afere-se, consabidamente, pela configuração da relação material controvertida feita pelo Autor.
3. O pedido da recorrida emerge de um contrato de compra e venda celebrado entre pessoa colectiva portuguesa, com sede em Portugal (o vendedor) e uma pessoa colectiva francesa, com sede em França (o comprador).
4. Consequentemente, a competência dos tribunais portugueses para conhecer da questão sub judice afere-se à luz do Regulamento (CE) n.º 44/2001, do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, aplicável directa e imediatamente ao caso dos autos.
5. Da aplicação da regra geral prevista no n.º 1 do art. 2º do Regulamento referido, decorre, de forma evidente, que a presente acção devia ter sido intentada nos tribunais do Estado do domicílio da recorrente, ou seja, em França.
6. Essa mesma conclusão, resulta, aliás, da regra especial aplicável aos casos de venda de bens (pela qual a recorrida poderá ter optado, se disso beneficiasse), prevista nas alíneas a) e b), parágrafo 1, do n.º 1 do art. 5º do aludido Regulamento, a presente acção também devia ter sido intentada perante a jurisdição francesa.
7. O Tribunal a quo carece, portanto, de competência internacional absoluta, pelo que a recorrente deve ser absolvida da instância.
8. A incompetência internacional é um tipo de incompetência absoluta, enquadrável no art. 101º do CPC, pelo que a sua arguição pela recorrente antes do trânsito em julgado da sentença foi, à luz do n.º 1 do art. 102º do CPC, tempestiva.
Por outro lado,
9. O acto de citação da recorrente padece da nulidade prevista no art. 198º do CPC, por ter sido realizado com preterição das formalidades legais impostas pelo art. 8º Regulamento n.º (CE) 1348/2000, de 29 de Maio de 2000, relativo à citação e notificação dos actos judiciais e extrajudiciais em matérias civil e comercial nos Estados-Membros.
10. Por um lado, o acto de citação e os documentos processuais respectivos estavam redigidos em Português e não estavam acompanhados de qualquer tradução, de acordo com o art. 8º, n.º 1, do Regulamento n.º 1348/2000.
11. Além de que o acto de citação não continha a indicação da possibilidade de recusa da recepção do acto de citação pela recorrente, de acordo com o art. 8º, n.º 1, do Regulamento n.º 1348/2000.
12. A preterição destas formalidades, tempestivamente invocadas pela recorrente na primeira intervenção regular que teve no processo, acarreta a nulidade do acto de citação, devendo consequentemente ser anulado todo o processado e repetida a citação da recorrente.
13. Acresce ainda que sempre se terá de reconhecer que a recorrente exerceu válida e eficazmente o direito de recusa do acto de citação previsto no art. 8º do citado Regulamento (CE) n.º 1348/2000, já que, independentemente da forma como o fez no processo, assim o declarou, requerendo mesmo que lhe fosse fornecida uma versão em língua francesa da petição.
14. A recusa da citação por parte da recorrente foi exercida de forma válida e eficaz, o que constitui uma situação de falta de citação, à luz do art. 8º do Regulamento (CE) 1348/2000, pelo que, também por este motivo, deve todo o processado ser anulado e renovada a citação.
15. A falta de citação da recorrente obstou à operância da revelia da recorrente (art. 483º do CPC).
16. Por outro lado, ao prazo de defesa de 20 dias previsto no n.º 2 do art. 1º do DL 296/98, de 1 de Setembro, teria de ter acrescido a dilação prevista no n.º 2 do artigo 252º-A do CPC, segundo o qual “quando o réu haja sido citado para a causa no estrangeiro (…) a dilação é de 30 dias”.
17. O artigo 4º do Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, é inconstitucional se interpretado no sentido de afastar a dilação prevista no n.º 3 do artigo 252º-A do CPC (30 dias de dilação) do prazo da defesa previsto no n.º 2 do art. 1º do regime anexo àquele Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro (20 dias de defesa).
18. A indicação desse prazo dilatório deveria ter constado do acto de citação, em face do disposto no n.º 2 do art. 235º do CPC, o que não ocorreu.
19. Sendo omissa tal indicação, verifica-se preterição de formalidade legal que conduz, nos termos do artigo 198º, n.º 1, do CPC à nulidade da citação, devendo ser anulado todo o processado e o acto renovado com observância da formalidade preterida.
Por último,
20. Sendo evidente que o Tribunal Judicial da Comarca de Valongo padecia de competência internacional para conhecer da presente acção e que tal questão devia, ademais, ter sido concretamente conhecida oficiosamente, não poderia a douta sentença ter sido proferida ao abrigo do artigo 2º do Decreto-Lei n.º 296/98, de 1 de Setembro.
21. Na medida em que o foi, a sentença condenatória de que se recorre padece do vício de nulidade, previsto na alínea d) do n.º 1 do art. 668º do CPC, uma vez que o tribunal a quo, a um só tempo, paradoxalmente, deixou de se pronunciar sobre questões que devia ter apreciado e conheceu de questões de que não podia ter tomado conhecimento, nulidade que se arguiu ao abrigo do n.º 4 do art. 668º do CPC.

O DIREITO

a) Da (in)competência internacional
De acordo com o artigo 101º do CPC[1] “a infracção das regras da competência em razão da matéria e da hierarquia e das regras da competência internacional, salvo quando haja mera violação de um pacto privativo de jurisdição, determina a incompetência absoluta do tribunal”.
A incompetência absoluta do tribunal constitui excepção dilatória, cujo conhecimento é oficioso – artigos 494º, alínea a) e 495º, 1ª parte, e ainda o artigo 25º do Regulamento (CE) 44/2001.
A sua procedência conduz à absolvição do réu da instância, nos termos do artigo 288º, n.º 1, alínea a).
Não tendo transitado em julgado a decisão proferida na 1ª instância, em função do recurso interposto pela Ré, é ainda possível o conhecimento da referida excepção invocada por esta.
O artigo 65º, que estabelece os factores de atribuição da competência internacional dos tribunais portugueses (cuja competência exclusiva vem definida no artigo 65º-A), concede, no seu proémio, nítida primazia ao direito comunitário ao referir “sem prejuízo do que se ache estabelecido em tratados, convenções, regulamentos comunitários e leis especiais …”. A mesma prevalência do direito comunitário vem afirmada no Regulamento (CE) 44/2001, convocado para a situação em apreço, quando no artigo 3º, n.º 2, se estatui que contra as regras de competência da normação desse Regulamento não podem ser invocadas as regras de competência nacionais – cfr. ainda o artigo 8º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa[2].
Dado que o presente litígio envolve duas sociedades comerciais sediadas em países diferentes, uma portuguesa (a Autora) e outra francesa (a Ré), sendo ambos os países (Portugal e França) membros da União Europeia aplica-se, necessariamente, o regime do referido Regulamento 44/2001 do Conselho Europeu[3] no que respeita à definição da competência judiciária.
Vejamos o que nele se estipula a esse propósito.
O artigo 2º, n.º 1, inscrito na secção 1, “Disposições Gerais”, do capítulo que disciplina a competência, determina:
“Sem prejuízo do disposto no presente Regulamento, as pessoas domiciliadas no território dum Estado-Membro devem ser demandadas, independentemente da sua nacionalidade, perante os tribunais desse Estado.”
O foro do réu constitui, pois, o regime-regra, mas o Regulamento admite algumas especialidades.
Na secção 2, relativa às “Competências Especiais”, o artigo 5º refere:
“Uma pessoa com domicílio no território de um Estado-Membro pode ser demandada noutro Estado-Membro:
“1. a) Em matéria contratual, perante o tribunal do lugar onde foi ou deva ser cumprida a obrigação em questão;
b) Para efeitos da presente disposição e salvo convenção em contrário, o lugar de cumprimento da obrigação em questão será:
- no caso da venda de bens, o lugar num Estado-Membro onde, nos termos do contrato, os bens foram ou devam ser entregues;
- no caso da prestação de serviços, o lugar num Estado-Membro onde, nos termos do contrato, os serviços foram ou devam ser prestados;
c) Se não se aplicar a alínea b), será aplicável a alínea a)”.
Este artigo 5º, n.º 1, alude, como se vê, às acções que tenham por objecto matéria contratual, como é o caso da presente acção.
A solução consagrada nessa norma é a do foro do lugar onde foi ou deva ser cumprida a obrigação. Na falta de convenção em contrário, a alínea b) concretiza o lugar de cumprimento da obrigação em dois tipos de contratos: a compra e venda de bens, em que o lugar que releva é o da entrega dos bens; e a prestação de serviços, em que o lugar relevante é o da prestação dos serviços.
Tal solução obriga a duas tarefas preliminares: primeiro, que se proceda à caracterização do contrato a que respeita a acção, tendo por referência a configuração descrita na petição inicial (causa de pedir); segundo, que se determine qual o lugar do cumprimento da obrigação em litígio ou da obrigação relevante.
Nos artigos 1º e 2º da petição inicial, a Autora alegou que se dedica à indústria de serralharia de precisão e que, no exercício dessa actividade, forneceu à Ré, sob encomenda desta, mercadorias e serviços das qualidades, quantidades e preços das diversas facturas que junta.
Quer se considere que esta alegação configura a existência de um contrato de fornecimento ou de vários contratos de compra e venda (artigos 874º e seguintes, do CC) e de prestação de serviços, a competência para a acção deve, de facto, ser cometida à jurisdição portuguesa.
Com efeito, todas as facturas apresentadas pela Autora, juntas a fls. 14 e seguintes, indicam como local de carga a “N/morada” e, quanto à forma de expedição das mercadorias, consta “Conta e Risco do Cliente”.
Portanto, as mercadorias eram entregues à Ré nas instalações da Autora e por aquela transportadas por sua conta e risco.
Assim, parece-nos incontroverso, à luz da citada disposição do Regulamento comunitário 44/2001, que o tribunal português é o internacionalmente competente para conhecer do presente litígio.
Improcede, pois, a excepção invocada.

b) Da nulidade da citação
A apelante suscita também a questão da nulidade da citação por inobservâncias de algumas formalidades na sua realização, designadamente a ausência de tradução para a língua francesa do acto de citação e dos documentos processuais respectivos, e a falta de indicação da possibilidade de recusa da recepção do acto de citação pela recorrente, por falta da dita tradução, tudo nos termo do artigo 8º do Regulamento n.º (CE) 1348/2000, de 29 de Maio de 2000.
Apreciando:
A citação é o acto pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi intentada contra ele determinada acção e se chama ao processo para se defender. Deve ser acompanhada de todos os elementos e de cópias legíveis dos documentos e peças do processo necessários à sua compreensão do seu objecto – artigo 228º, n.ºs 1 e 3.
O acto de citação implica a remessa ou entrega ao citando do duplicado da petição inicial e da cópia dos documentos que a acompanhem, a comunicação de ficar citado para a acção a que o duplicado se refere, a indicação do tribunal, juízo, vara e secção por onde corre o processo, o prazo de apresentação da defesa, a necessidade de patrocínio judiciário e as cominações em que incorrerá se ficar em revelia – artigo 235º.
Uma das espécies de citação pessoal é a que ocorre por via da entrega ao citando de carta registada com aviso de recepção, de modelo oficialmente aprovado, dirigida ao citando e endereçada para sua residência ou local de trabalho ou, tratando-se de pessoa colectiva ou sociedade, para a respectiva sede ou para o local onde funciona normalmente a sua administração – artigos 233º, n.º 2, alínea a), e 236º, n.º 1.
Dispõe o artigo 198º, n.º 1, do CPC que é nula a citação quando não hajam sido, na sua realização, observadas as formalidades prescritas na lei.
Contudo, “quando o réu resida no estrangeiro, observar-se-á o que estiver estipulado nos tratados e convenções internacionais” – artigo 247º, n.º 1, do CPC. Só na falta de tratado ou convenção é que a citação é feita por via postal, em carta-registada com aviso de recepção – n.º 2 do mesmo artigo.
Entrou em vigor no dia 31.05.2001, o Regulamento (CE) 1348/2000, de 29.05.2000, que se aplica ao caso vertente – cfr. artigos 1º, n.º 1, e 25º.
Nos termos do artigo 14º do Regulamento, qualquer Estado-Membro tem a faculdade de proceder directamente por via postal à citação de actos judiciais destinada a pessoas residentes num outro Estado-Membro.
Diz-se nesse preceito:
“1. Cada Estado-Membro tem a faculdade de proceder directamente, por via postal, às citações e às notificações de actos judiciais destinadas a pessoas que residam num outro Estado-Membro.
2. Qualquer Estado-Membro pode precisar, nos termos do n.º l do artigo 23°, sob que condições aceitará as citações e notificações por via postal”.
Temos, assim, que o Regulamento não excluiu, antes admite, a citação ou notificação pelo correio, a menos que o Estado-membro comunique à Comissão a sua reserva quanto a tal forma de citação ou notificação, como decorre das disposições conjugadas do n.º 2 do art. 14º e 23º, n.º 1.
O Regulamento prevê, com efeito, várias modalidades de transmissão e de citação ou notificação de actos judiciais, para além da transmissão entre entidades de origem e entidades requeridas com ou sem intervenção auxiliar da entidade central de que se ocupam exclusivamente os artigos 4º a 11º:
- A transmissão por via diplomática ou consular (artigo 12°);
- A citação ou notificação de actos judiciais por agentes diplomáticos ou consulares (artigo 13°);
- A citação ou notificação por correio (artigo 14º); e
- O pedido directo de citação ou notificação (artigo 15°).
No presente caso foi utilizada a via postal, meio de transmissão previsto no artigo 14º do Regulamento.
Vejamos o que se escreveu num acórdão do STJ[4], a propósito de uma situação semelhante à dos autos:
“O artigo 23º do Regulamento, para que o n.º 2 do seu artigo 14º remete, prescreve, além do mais que aqui não releva, que os Estados-Membros devem comunicar à Comissão as informações a que se refere o artigo 14º, e que a última as publicará no Jornal Oficial da Comunidades Europeias.
No que concerne ao artigo 14º do Regulamento, a República Portuguesa comunicou não ter quaisquer reservas a formular, enquanto a República Francesa comunicou sobre a ‘carta registada com aviso de recepção, do qual constem os documentos enviados, ou qualquer outro modo que permita identificar as datas de envio e de recepção, bem como o respectivo conteúdo’ (Jornal Oficial das Comunidades Europeias, C 151/4, de 22 de Maio de 2001).
O que resulta da mencionada comunicação da República francesa em relação à citação por carta registada com aviso de recepção de pessoas domiciliadas em França é que do aviso de recepção devem constar os documentos enviados, ou algum outro modo que permita a identificação da data do envio e da recepção da carta, bem como o respectivo conteúdo.
Se a República Francesa pretendesse consignar a mencionada exigência de tradução em língua francesa da petição inicial, dos documentos e da nota de citação, certamente teria expressado, como o fez a República da Itália, expressando ser condição indispensável para poder aceitar os actos por via postal que eles fossem acompanhados da tradução em língua italiana (Jornal Oficial das Comunidades Europeias, C 151/9, de 22 de Maio de 2001)”.
Ora, no seguimento da carta-registada, com aviso de recepção, expedida à Ré para a sua citação na sede social, em língua portuguesa (artigo 139º, n.º 1), esta apresentou um articulado de oposição, redigido em língua francesa (fls. 171), entretanto traduzido (v. fls. 174). O texto desse articulado[5] denota que a Ré compreendeu perfeitamente o teor da petição inicial e o conteúdo do acto de citação, tendo inclusivamente alegado que as mercadorias fornecidas pela Autora apresentavam graves desconformidades. Esse articulado de defesa foi, porém, mandado desentranhar e considerou-se sem efeito tudo o que havia sido processado pelos Ex.ºs advogados subscritores, uma vez que não foi dado cumprimento ao disposto no artigo 40º, n.º 2 (falta de procuração e de ratificação do processado).
De todo o modo, como o prazo para a arguição dessa nulidade é o que tiver sido indicado para a contestação – artigo 198º, n.º 2, 1ª parte – e como nada foi validamente arguido nesse prazo nem posteriormente, até à arguição deduzida apenas em Fevereiro de 2011, a nulidade invocada, a existir, estaria agora sanada.
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III. DECISÃO

Em razão do exposto, julga-se improcedente a apelação.
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Custas pela apelante.
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PORTO, 7 de Fevereiro de 2012
Henrique Luís de Brito Araújo
Fernando Augusto Samões
José Manuel Cabrita Vieira e Cunha
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[1] Diploma a que pertencem, doravante, todas as disposições legais sem menção contrária.
[2] “As disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo Direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de Direito Democrático”.
[3] A entrada em vigor deu-se no dia 1 de Março de 2002.
[4] Acórdão de 26.02.2004 (Salvador da Costa), no processo n.º 04B277, em www.dgsi.pt
[5] Apresentado em tempo, o que inutiliza qualquer discussão sobre as conclusões 16. a 19. do recurso.