Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
349/12.0TTMAI.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA JOSÉ COSTA PINTO
Descritores: LEI DO ORÇAMENTO DO ESTADO
PROIBIÇÃO DE VALORIZAÇÃO REMUNERATÓRIA
PERÍODO NORMAL DE TRABALHO
ALTERAÇÃO
Nº do Documento: RP20141103349/12.0TTMAI.P1
Data do Acordão: 11/03/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I – A proibição de valorizações remuneratórias fixada pelas Leis do Orçamento de Estado para os anos de 2011 e 2012, tem que ser entendida por reporte aos valores devidos à data da sua entrada em vigor, que não podem ser incrementados.
II – As limitações das LOE’s não afectam os valores salariais devidos tendo em consideração os direitos firmados já nos anos anteriores, ainda que até então o empregador os não reconhecesse.
III - O acordo genérico prestado pelo trabalhador no contrato de trabalho para a alteração do período normal de trabalho semanal de 18 horas convencionado para 36 horas, não pode ser prestado nesses termos por antecipação e por reporte a uma situação eventual que se poderia verificar em qualquer momento da execução do contrato, ainda que com os necessários ajustamentos remuneratórios, devendo ser contemporâneo das concretas alterações que o empregador entenda propor ao trabalhador, sendo neste momento que o trabalhador deve ter a possibilidade de aferir se lhe interessa, ou não, a alteração.
IV - O facto de o empregador ter alterado o período normal de trabalho de 18 horas desde 2006, escudando-se neste antecipado acordo, não confere validade à alteração do período normal de trabalho a que procedeu quando passou a fazê-lo e não implica, por isso, que o período normal de trabalho convencionado de 18 horas se tenha definitivamente fixado em 36 horas.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 349/12.0TTMAI.P1
4.ª Secção

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:
II
1. Relatório
1.1. Na acção de processo comum n.º 349/12.0TTMAI, B…, C…, D…, e E…, demandaram a R. “F…, S.A.”, peticionando a procedência da acção e, em consequência:
a) Declarar-se e ser a ré condenada a reconhecer que os autores têm com ela estabelecido um contrato de trabalho por tempo indeterminado, reportando-se os efeitos do mesmo e a respectiva antiguidade, respectivamente, a 28 de Março de 2005 relativamente ao primeiro autor, 02 de Maio de 2005 relativamente aos segundo e terceiro autores e 01 de Junho de 2005 relativamente ao quarto autor;
b) Ser a ré condenada a reconhecer que os autores têm direito, desde a data de admissão, à categoria de Técnico de Assistência em Escala e que lhes assiste um horário semanal completo de 36 horas;
c) Ser a ré condenada a pagar pelos títulos referidos nos artigos 16º, 17º e 18º da petição inicial – diferenças de remuneração, diferenças do subsídio de férias e de Natal e diferenças do subsídio de turno:
- ao primeiro autor, a quantia de € 15.974,21;
- a cada um dos segundo e terceiro autores, a quantia de € 14.523,56;
- ao quarto autor, € 13.771,84;
d) Ser a ré condenada a pagar aos autores as diferenças salariais de subsídio de férias e de Natal e do subsídio de turno vincendos até à data da decisão que ponha termo ao pleito;
e) Ser a ré condenada a pagar aos autores os juros, à taxa legal, sobre as supra mencionadas quantias desde a data de citação até efectivo pagamento.
Na acção de processo comum n.º 350/12.3TTMAI, G…, H…, I… e J… demandaram também a R. “F…, S.A.”, peticionando a procedência da acção e, em consequência:
a) Declarar-se e ser a ré condenada a reconhecer que os autores têm com ela estabelecido um contrato de trabalho por tempo indeterminado, reportando-se os efeitos do mesmo e a respetiva antiguidade a 01 de novembro de 2005;
b) Ser a ré condenada a reconhecer que os autores têm direito, desde a data de admissão, à categoria de Técnico de Assistência em Escala e que lhes assiste um horário semanal completo de 36 horas;
c) Ser a ré condenada a pagar pelos títulos referidos nos artigos 14º e 15º da petição inicial – diferenças de remuneração, diferenças do subsídio de férias e de Natal e diferenças do subsídio de turno a quantia € 11.182,35 a cada um dos autores;
d) Ser a ré condenada a pagar aos autores as diferenças salariais de subsídio de férias e de Natal e do subsídio de turno vincendos até à data da decisão que ponha termo ao pleito;
e) Ser a ré condenada a pagar aos autores os juros, à taxa legal, sobre as supra mencionadas quantias desde a data de citação até efetivo pagamento.
Em fundamento da sua pretensão, alegam os AA, em síntese: que a R. não os classificou, desde as respectivas datas de admissão e até 01 de Janeiro de 2007 como Técnicos de Assistência em Escala (TAE), mas como Auxiliares, sendo certo que as funções por si sempre desempenhadas na ré são próprias e exclusivas de TAE, tendo por isso os autores direito a esta categoria desde a sua admissão e às correspondentes diferenças salariais, que também abrangem o subsídio de turno e os subsídios de férias e de Natal; que nos sucessivos contratos de trabalho a termo que a ré lhes impôs, assim como em subsequente contrato por tempo indeterminado que todos celebraram, foi-lhes fixado um horário semanal de 18 horas, aí tendo sido igualmente fixado que “o trabalhador dá, desde já, o seu acordo a um eventual aumento do período normal de trabalho para as 36 horas semanais, em qualquer momento de execução deste contrato, com os necessários ajustamentos remuneratórios”; que desde a sua admissão e até ao presente, a ré sempre lhes atribuiu horário de trabalho de 36 horas semanais, o que demonstra que o aumento da prestação de trabalho nunca foi eventual, mas real e permanente, o que viola a noção de horário de trabalho, as condições para a alteração desse mesmo horário de trabalho e a noção de trabalho suplementar, pois que o período de trabalho diário e semanal não é prévia e duradouramente delimitado e as alterações de horário são feitas unilateralmente e sem consulta prévia, pelo que a R. tem que considerar que o horário de trabalho dos AA. é de 36 horas, não o podendo diminuir.
Na contestação apresentada a R. reafirmou a justeza e correcção da classificação dos autores, sustentando que a categoria de Auxiliar é atribuída pela empresa a todos os trabalhadores que iniciam funções, compreendendo uma fase de familiarização com os métodos de trabalho, procedimentos e práticas da empresa; que se trata de uma categoria de ingresso para passagem às categorias mais qualificadas de TAE e OAE, as quais apenas são atribuídas quando os trabalhadores reúnam os respectivos requisitos, pelo que o acesso à categoria de TAE não é de acesso imediato na empresa. Alega ainda que, fazendo a mesma parte do sector empresarial do Estado, está sujeita às limitações fixadas nas Leis do Orçamento do Estado para os anos de 2011 e 2012 – Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro e Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro – as quais vieram proibir a prática de actos que consubstanciem valorizações remuneratórias dos titulares dos cargos e demais pessoal identificado no n.º9 do artigo 19.º da primeira das referidas leis, aí se incluindo as valorizações e outros acréscimos remuneratórios, designadamente, resultantes de alterações de posicionamento remuneratório (artigos 24.º/1 e 2 da Lei n.º 55-A/2010 e 20.º/1 da Lei n.º 64-B/2011), razão por que não atribuiu aos AA. em Janeiro de 2011 o nível 12 que lhes seria devido. Diz finalmente que não há qualquer obrigatoriedade legal de aplicar o AE da K… aos seus trabalhadores e que os AA. foram livres para a aceitar a contratação acordando num eventual aumento do período normal de trabalho semanal até ao limite de 36 horas. Defende a sua absolvição dos pedidos.
Os AA. responderam à contestação, pronunciando-se no sentido da inconstitucionalidade dos preceitos legais citados das Leis do Orçamento do Estado por violação, além de outros, do disposto nos artigos 13.º, 19.º, 26.º, 55.º, 56.º e 59.º da Constituição.
Foi proferido despacho saneador em que se fixou a esta acção n.º 349/12.0TTMAI o valor de € 58.793,25 e foi dispensada a fixação de matéria de facto assente, bem como a organização de base instrutória.
No início da audiência de julgamento que teve lugar em 17 de Março de 2013, foi determinada a apensação a estes autos do processo n.º 350/12.3TTMAI, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 31.º do Código de Processo do Trabalho, 275.º. 30.º e 31.º do Código de Processo Civil.
Em tal acção as partes haviam tomado posições similares às dos presentes autos nos articulados nela apresentados e no despacho saneador ali proferido fixou-se à mesma acção n.º 350/12.3TTMAI o valor de € 44.729,00 e foi também dispensada a fixação de matéria de facto assente, bem como a organização de base instrutória
Realizou-se audiência de discussão e julgamento conjunta das duas acções, com gravação da prova nela produzida (fls. 285 e ss.) e foi ulteriormente proferido despacho a decidir a matéria de facto (fls. 119 e ss.), não tendo havido reclamações.
Após, a Mma. Julgadora a quo proferiu sentença que terminou com o seguinte dispositivo:
«Por tudo o exposto, julga-se a presente ação parcialmente procedente e, em consequência:
Em relação ao processo n.º 349/12.0TTMAI:
I – Condena-se a ré:
1. A reconhecer que os autores têm consigo estabelecido um contrato de trabalho por tempo indeterminado, reportando-se os efeitos dos mesmos e respetivas antiguidades a 28 de março de 2005, em relação ao autor B…; 02 de maio de 2005, relativamente aos autores C… e D…; e 01 de junho de 2005, relativamente ao autor E…;
2. A reconhecer que os autores têm direito, desde a data das suas admissões, à categoria de Técnico de Assistência em Escala;
3. A pagar aos autores, a título de diferenças salariais (remuneração, subsídio de férias, subsídio de Natal e subsídio de turno), as seguintes quantias:
a) Ao autor B…, € 5.156,68, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento;
b) Aos autores C… e D…, € 4.892,17, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento;
c) Ao autor E…, € 4.716,57, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento;
4. A pagar aos autores as quantias que se vierem a apurar, a título de diferenças salariais (remuneração base, subsídio de férias, subsídio de Natal e subsídio de turno), referentes ao período compreendido entre as datas das suas respetivas admissões e até 31.12.2006, nos termos dos artigos 609.º/2 e 358.º/2 do Código de Processo Civil, e que serão acrescidas de juros de mora, à taxa legal, desde a data do trânsito em julgado da decisão do referido incidente de liquidação até efetivo e integral pagamento.
II – Absolve-se a ré do demais peticionado.
Em relação ao processo n.º 350/12.3TTMAI:
I – Condena-se a ré:
5. A reconhecer que os autores têm consigo estabelecido um contrato de trabalho por tempo indeterminado, reportando-se os efeitos dos mesmos e respetivas antiguidades a 01 de novembro de 2005;
6. A reconhecer que os autores têm direito, desde a data das suas admissões, à categoria de Técnico de Assistência em Escala;
7. A pagar a dada um dos autores, a título de diferenças salariais (remuneração, subsídio de férias, subsídio de Natal e subsídio de turno), a quantia de € 3.657,71, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento;
8. A pagar aos autores as quantias que se vierem a apurar, a título de diferenças salariais (remuneração base, subsídio de férias, subsídio de Natal e subsídio de turno), referentes ao período compreendido entre as datas das suas respetivas admissões e até 31.12.2006, nos termos dos artigos 609.º/2 e 358.º/2 do Código de Processo Civil, e que serão acrescidas de juros de mora, à taxa legal, desde a data do trânsito em julgado da decisão do referido incidente de liquidação até efetivo e integral pagamento.
II – Absolve-se a ré do demais peticionado.
Custas da parte líquida por autores e ré, na proporção do vencimento-decaimento e da parte ilíquida de acordo com o que se vier a determinar no incidente de liquidação.»
1.2. A R., inconformada interpôs recurso desta decisão, tendo formulado, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões:
“I. Entende a Recorrente que existem pontos na sentença recorrida que impunham uma decisão diversa, em particular, os pontos 2 e 6 e, consequentemente, os pontos 3 e 4 e 7 e 8, nomeadamente a parte da decisão que reconhece que os autores têm direito, desde a data das suas admissões (sublinhado nosso) até 31.12.2006, à categoria de Técnico de Assistência em Escala e, consequentemente, ao pagamento dos diferenciais remuneratórios correspondentes àquele período.
II. Concede a Recorrente que a descrição funcional de Auxiliar pode não ser a mais indicada possível
III. Porém, o certo é que tal categoria não foi criada de raiz pela F..., estando incluída num Acordo de Empresa que foi outorgado por outra empresa – a K..., S.A. e que, por essa razão, não está, plenamente adaptado às especificidades da ora Recorrente;
IV. Eventualmente, a denominação de estágio, cfr. notado na douta sentença a fls. 17, poderia ter traduzido de forma mais fiel aquilo que a Recorrente pretendia que representasse esta fase – uma fase de aprendizagem das funções e consolidação de conhecimentos/formação para desempenho das funções correspondentes à categoria de TAE/OAE.
V. E consta da fundamentação de facto da douta sentença que a categoria de Auxiliar é atribuída pela empresa a todos os trabalhadores que iniciam funções, sendo o “Auxiliar” uma categoria de ingresso para a passagem às categorias mais qualificadas de TAE e de OAE.
VI. A Recorrente estabeleceu que o acesso à categoria de TAE e OAE era precedido por um período em que o trabalhador adquire o “Know-how” necessário para aceder à referida categoria.
VII. Pelo que, não é de estranhar, sendo antes normal, que os Auxiliares desempenhem funções que integram o descritivo funcional de TAE.
VIII. Ora, não se pode concordar com a douta sentença quando a mesma afirma que todos os Autores desempenharam desde a data de admissão até ao presente, o conjunto de funções que são elencadas no descritivo funcional da categoria de TAE.
IX. Pois é objectivamente impossível ao Auxiliar, no momento da admissão ou nos primeiros tempos, desempenhar todas essas funções, pelo que a sentença, nesse aspecto, incorreu em erro de julgamento.
X. Efectivamente, o ponto 2 da fundamentação de facto, é uma mera reprodução do descritivo funcional, não se podendo aceitá-lo, devendo antes ser alterado.
XI. Objectivamente, não é possível que um trabalhador, recém-admitido na empresa possa desempenhar, em concreto, “(…) a formação técnica dos TAE’s e OAE’s nas fases iniciais da carreira”.
XII. Nem (…) coordenar as actividades exercidas pelas áreas operacionais, tendo em vista a rentabilização dos meios humanos e materiais disponíveis.”
XIII. Tal como não pode “preparar, recolher, e enviar informações e documentos relacionados com o tráfego, explorando sistemas informáticos ou outros meios e equipamentos que para tal se justifiquem” quando não recebeu formação básica para trabalhar com essas ferramentas.
XIV. Porquanto, os Recorridos, à semelhança de todos os contratados para a categoria de Auxiliar, fazem um curso básico de passageiros, antes do qual não desempenham quaisquer tarefas directamente relacionadas com passageiros, como as enunciadas no descritivo funcional da categoria de TAE.
XV. Estão os trabalhadores com a categoria de Auxiliar também vinculados a um on-job training, que os limita na execução de tarefas que, até esse momento, não tenham ainda realizado,
XVI. Acresce, que os mesmos são obrigados a frequentar um curso de check-in, previamente ao qual também não podem desempenhar quaisquer funções no respectivo balcão.
XVII. Como salienta a sentença, os TAE estão integrados no Grupo de Altamente Qualificados e os OAE no Grupo de Qualificados, pelo que nos perguntamos se será correcto atribuir uma categoria de Altamente Qualificado a um trabalhador que acaba de iniciar funções.
XVIII. Não faltou a Recorrente ao que contratualizou com os Recorridos, tendo-lhes sempre atribuído as categorias e as progressões com eles acordados.
XIX. A realidade contratualizada e a realidade de facto não divergem.
XX. Pelo que não deve a Recorrente ser condenada a atribuir aos Recorridos uma categoria para a qual os mesmos não cumprem, no seu entendimento, os pressupostos contratualizados.
XXI. Ainda, considerando o apontado nos testemunhos, nunca seriam os Recorridos merecedores dessa categoria, pelo menos desde a data da admissão, nos termos em que foi a Recorrente condenada.
XXII. Salienta-se que as próprias testemunhas indicam que, com muita probabilidade, só no terceiro mês os trabalhadores começam a desempenhar toda a panóplia de tarefas enunciadas no descritivo supra indicado.
XXIII. E que portanto, sem conceder no restante, pelo menos, neste lapso de tempo inicial, não se pode concordar com a condenação na atribuição da categoria de TAE e correspondente diferenciais salariais, a qual, a ser devida, seria sempre a partir do 4.º mês e nunca antes.”
1.3. Também os AA. interpuseram recurso da sentença, apresentando as seguintes conclusões:
«1ª – Na douta sentença recorrida foi reconhecido a todos os AA. o direito às diferenças salariais reclamadas (remunerações, subsídios de férias, subsídios de Natal e subsídios de Turno) tendo-se na mesma quantificado essas diferenças apenas a partir de 1 de Janeiro de 2007 até 31 de Outubro de 2010.

2ª – Aceitando-se que se tenha relegado a apreciação dessas diferenças para o período entre a data da admissão e 31.12.2006 para posterior liquidação, não existe mínima razão para a não quantificação das diferenças entre 1.11.2010 e 30.4.2012 (última data relacionada na P.I.), já que a Lei de Orçamento de Estado para 2011, só entrou em vigor em 1.1.2011.

3ª – Aceitando-se igualmente que, a partir de 1.1.2011, por força da referida Lei de Orçamento para 2011 (e depois da Lei de Orçamento para 2012) não se pode entrar em linha de conta com valorizações remuneratórias do pessoal da R. (e dos AA.), não faz qualquer sentido que a partir de 1.1.2011 e 30.4.2012, não se tenham apurado as diferenças salariais decorrentes dos valores remuneratórios que cada um dos AA. tinha direito já em 2010 e aquilo que a R. lhes pagou.

4ª – As limitações impostas pelas Leis do Orçamento para 2011 (e para 2012), não corta aos AA. o direito a valores salariais e dos subsídios que já eram devidos desde 2010 e que a R. nunca lhes pagou.

5ª – A douta sentença recorrida fez uma errada interpretação dos Artºs 24, nº 1 e 2 da Lei nº 55-A/2010 e 20, nº 1 da Lei nº 64-B/2011, contendo ainda o apuramento das diferenças erro de cálculo.

6ª – O apuramento correcto das diferenças existentes entre 1.1.2007 e 31.4.2012 é o que consta na demonstração feita supra, pelo que a Douta sentença recorrida deveria ter condenado a R. a pagar as diferenças de remuneração e dos subsídios de férias, de Natal e de Turno naquele período, nos seguintes valores:
Para o A. B… 6.829,94€
Para cada um dos AA. C… e D… 6.675,72€
Para o A. E… 6.514,86€
Para cada um dos AA., G…, H…, I… e J… 5.517,72€

7ª – A douta sentença recorrida não se pronunciou sobre o pedido formulado pelos AA. na alínea d) da Conclusão de cada uma das P.Is. – “deve ser a R. condenada a pagar aos AA. as diferenças salariais, de subsídios de férias e de Natal e de subsídios de turno vincendos até à data da decisão que ponha termo ao pleito”.

8ª - Esta omissão constitui nulidade da sentença, – nos termos do disposto na alínea d) do nº 1 do Artº 615 do NCPC, devendo a R., pelas razões acima referidas, ser condenada neste pedido.

9ª – O tribunal recorrido absolveu a R. do pedido dos AA. para que ela fosse condenada a reconhecer que lhes assiste o direito a um horário semanal completo de 36h, porquanto considera válida a cláusula constante no último contrato celebrado entre a R. e os AA. de que o horário semanal de cada um era de 18h semanais, e que “o trabalhador dá, desde já, o seu acordo a um eventual aumento do período normal de trabalho para as 36h semanais, em qualquer momento da execução deste contrato, com os necessários ajustamentos nas componentes remuneratórias”.
Todavia,

10ª – Tendo em consideração que se encontra provado no item 6º da fundamentação de facto que “a partir de 2006 a R. atribuiu sempre aos AA. horário de trabalho de 36h semanais, tendo-lhes pago no fim de cada mês de trabalho a remuneração correspondente ao trabalho prestado em horário completo de trabalho”, bem como os normativos legais aplicáveis, o pedido dos AA. deveria ter sido julgado procedente.

11ª – Desde logo, porque a previsão contida naquela cláusula nunca foi cumprida – desde 2006 que prestaram sempre 36h semanais, nunca a R. lhes tendo conferido qualquer alteração de horário, não tendo existido, nem podendo existir, portanto, qualquer eventualidade para o pretenso aumento.

12ª – E tendo ainda em consideração o princípio da boa fé e o de que o empregador deve proporcionar aos trabalhadores condições de trabalho que favoreçam a conciliação da actividade profissional com a vida familiar e pessoal (Artºs 126, nº 1 e 127, nº 3 do C.T.), assiste aos AA. o direito de verem o seu horário de trabalho estabilizado nas 36h semanais.

13ª – Além disto, não se encontrando estipulada a possibilidade de redução do horário semanal do trabalho, o horário das 36h encontra-se definitivamente fixado.

14ª – Depois, porque as declarações produzidas pelos AA. nas referidas cláusulas sempre teriam que se considerar ineficazes, produzidas que foram na vigência dos contratos de trabalho, em que se encontravam subordinados e condicionados económica, jurídica e psicologicamente à R., e em situação de manifesto temor reverencial para com ela.

15ª – É público e notório – e não carecendo de prova (Artº 412 do C.P.C.) -, que se os AA. não subscrevessem os referidos contratos – e estes eram iguais para todos eles, da lavra da R. e normalizados -, não seriam aceites pela R. e não teriam trabalho.

16ª – Por fim, porque a referida cláusula relativa à possibilidade de eventual aumento do horário de trabalho de 18h para 36h semanais, é inválida, violando normas imperativas (Artº 121, nº 2 do C.T.).

17ª – Viola a noção de período normal de trabalho (Artº 198) e de horário de trabalho (Artº 200), impedindo a prévia e duradoura determinação do tempo de trabalho nestes artigos enunciados.

18ª – Viola a necessidade de consultas prévias da Comissão de Trabalhadores ou da Comissão ou delegados sindicais (e ainda a Comunicação à Inspecção Geral do Trabalho – Artº 173, nº 2 do C.T. na redacção anterior à sua revisão pela Lei 7/2009) para a alteração de horário de trabalho, pois com a validade de tal cláusula ficaria dispensada de o fazer.

19ª – Viola a noção de trabalho suplementar (Artº 226), pois toda a alteração dentro das 36h semanais será considerada prestação de trabalho normal – o que de resto lhes aconteceu sempre, só sendo pago trabalho suplementar, pelo trabalho prestado para além das 36 (ver recibos de fls…).

20ª – Viola a proibição de redução de retribuição mensal (Artº 129, nº 1 d)), pois se a R. diminuísse o horário de trabalho, a retribuição seria igualmente reduzida.

21ª – E todos estes preceitos legais são de interesse e ordem pública – de natureza imperativa – já que regem os alicerces do trabalho e da sua organização, tendo que ter em consideração a protecção e saúde dos trabalhadores e a conciliação profissional destes com a sua vida pessoal e familiar.

22ª – O pedido formulado pelos AA. de que a R. fosse condenada a reconhecer que lhes assistia um horário semanal completo de 36h, deveria ter sido julgado procedente.

23ª – A este respeito, a douta sentença recorrida, violou por erro de interpretação e de aplicação, além do mais, o disposto nos Artº 126, nº 1, 127, 3, 121, nº 2, 198, 200, 217, 226 e 129 do Código do Trabalho, Artº 412 do C.P.C. e Artº 405, nº 1 do C. Civil.

Nestes termos, e nos mais que V.Exªs doutamente suprirão,
Deve ser revogada a douta sentença recorrida, na parte quantificada de diferenças salariais e de subsídio de férias, de Natal e de Turno em que condenou a R. a pagar aos AA. (nº 3, alínea a), b) e c) em relação ao Proc. nº 349/12.0TTMAI e nº 7 em relação ao Proc. nº 350/12.3TTMAI), e na parte em que absolveu a R. do pedido da sua condenação a reconhecer que os AA. têm direito a um horário semanal completo de 36h, e deve ainda julgar-se nula a mesma sentença por não se ter pronunciado sobre o pedido de condenação da R. no pagamento aos AA. das diferenças salariais e dos subsídios de férias e de Natal e de Turno, vincendos até à data da decisão que ponha termo ao pleito.

A douta sentença deve ser substituída por outra que:

1º - Condene a R. a pagar aos AA. a título de diferenças salariais (remunerações, subsídios de férias, subsídios de Natal e subsídios de Turno), no período entre 1.1.2007 e 30.4.2012, as seguintes quantias:

I – Relativamente ao Processo 349/12.0TTMAI

a) Ao Autor B… 6.829,94€, acrescida de juros de mora, à taxa legal, de 4% ao ano, desde a data de citação e até efectivo e integral pagamento;

b) A cada um dos Autores C… e D… 6.675,72€, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, desde a data de citação e até efectivo e integral pagamento;

c) Ao Autor E…, 6.514,86€, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, desde a data de citação e até efectivo e integral pagamento.

II – Relativamente ao processo 350/12.3TTMAI

- a cada um dos AA., G…, H…, I… e J… 5.517,72€, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, desde a data de citação e até efectivo e integral pagamento;

2º - Condene a R. a pagar aos AA. as diferenças salariais, de subsídios de férias e de Natal e de subsídio de turno vincendos até à data da decisão que ponha termo ao pleito;

3º - Condene a R. a reconhecer que assiste aos AA. o direito a um horário semanal completo de 36horas.»
1.4. A fls., 361 verso, os AA. vieram dizer que concordam com a informação da R. quanto ao horário prestado pelos AA. no período entre as datas de admissão e 31.12.2006, dizendo que se deverá fixar que:
- Os AA. B…, C…, D…, E…, I… e J… efectuaram ininterruptamente horário semanal de 36h desde Março de 2006,
- O A. G… efectuou ininterruptamente horário semanal de 36h desde Maio de 2006,
- A A. H… efectuou ininterruptamente horário semanal de 36h desde Setembro de 2006.
1.5. O A. B… respondeu à alegação da R. nos termos de fls. 363 e ss., defendendo a improcedência do recurso e a manutenção da sentença recorrida na parte em que reconhece o direito dos AA. à categoria profissional de TAE desde a respectiva data de admissão.
1.6. A R. apresentou também contra-alegações à alegação do A.. nos termos de fls. 361 e ss., defendendo a improcedência do recurso dos AA. e a manutenção da sentença recorrida na parte por eles impugnada ou, a julgar-se o mesmo procedente na parte da quantificação das diferenças salariais, defende que o deverá ser nos termos que quantifica.
1.7. Mostra-se lavrado despacho de admissão a fls. 379, vindo a ser conferido efeito suspensivo ao recurso interposto pela R. atenta a caução atempadamente prestada por esta (fls. 402).
1.8. Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se, em parecer que não mereceu resposta das partes, no sentido de se negar provimento a ambos os recursos. Suscitou em tal douto parecer as questões prévias de dever rejeitar-se a impugnação da decisão de facto deduzida na apelação da R. por não ter a recorrente cumprido os ónus impostos pelas alínea b) e c) do n.º 1 e a) do n.º 2 do artigo 640.º do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho (não especificação dos concretos meios probatórios que impõem decisão diferente sobre os pontos de facto de que se discorda e não especificação das decisões que deviam ter sido proferidas) e de se não dever conhecer da nulidade da sentença arguida pelos AA. ora recorrentes por não terem os mesmos cumprido o ónus de arguição no requerimento de interposição di recurso estabelecido no artigo 77.º do Código de Processo do Trabalho.
Colhidos os “vistos” e realizada a Conferência, cumpre decidir.
*
2. Objecto do recurso
O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente – artigo 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, aplicável “ex vi” do art. 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado.
Assim, vistas as conclusões dos recursos, as questões que fundamentalmente se colocam à apreciação deste tribunal são, por ordem lógica da sua apreciação, as seguintes:
1.ª – da nulidade da sentença por omissão de pronúncia quanto ao pedido constante das alíneas d) das petições iniciais - recurso dos AA.;
2.ª – da impugnação da decisão de facto quanto aos factos 2. e 6. e, consequentemente, quanto aos factos 3., 4., 7. e 8. - recurso da R.;
3.ª – do direito dos AA. à categoria profissional de TAE (Técnico de Assistência em Escala) desde as datas das suas admissões ao serviço da R., com a inerente contrapartida remuneratória - recurso da R.;
4.ª – saber se as limitações fixadas nas Leis do Orçamento do Estado para os anos de 2011 e 2012 – Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro e Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro – se aplicam a valores salariais já devidos desde 2010 - recurso dos AA.;
5.ª – da quantificação dos valores devidos aos AA. nos anos de 2007 a 30 de Abril de 2012 - recurso dos AA..
6.ª – do direito dos AA. a um período normal de trabalho semanal de 36 horas - recurso dos AA..
No que diz respeito às 1.ª e 3.ª questões, deverão previamente analisar-se as questões suscitadas pela Exma. Procuradora-Geral Adjunta, a que já se fez referência.
*
3. Da nulidade da sentença
*
Afirmam os AA. recorrentes que a sentença recorrida não se pronunciou sobre o pedido formulado nas alíneas d) da conclusão de cada uma das petições iniciais de que “deve ser a R. condenada a pagar aos AA. as diferenças salariais, de subsídios de férias e de Natal e de subsídios de turno vincendos até à data da decisão que ponha termo ao pleito”, o que implica nulidade da sentença, nos termos do disposto na alínea d) do nº 1 do artigo 615 do NCPC, devendo a R., pelas razões acima referidas, ser condenada neste pedido.
Mas no requerimento de interposição de recurso (fls. 327) não fazem qualquer alusão à nulidade da sentença, limitando-se a dizer, depois de se identificarem, o seguinte:
«…notificados da douta sentença de fls…, e não se podendo conformar com a mesma, pretendem dela apelar para o Tribunal da Relação do Porto.
Assim e porque estão em tempo,
Requerem a V.Exª se digne admitir e considerar interposto o presente recurso, que é de Apelação, seguindo-se os demais termos. E.R.D.»
Ora, por força do estatuído no art. 77.º do Código de Processo de Trabalho, a arguição de nulidades da sentença deve ser feita expressa e separadamente no requerimento de interposição do recurso. Este normativo pressupõe que o anúncio da arguição e a corresponde motivação das nulidades (a substanciação das razões por que se verificam) devem constar do requerimento de interposição do recurso que é dirigido ao órgão judicial “a quo”, permitindo ao juiz recorrido aperceber-se, de forma mais rápida e clara, da censura produzida e possibilitando-lhe o eventual suprimento das nulidades invocadas.
Em consonância com esta especialidade estabelecida pela lei processual laboral, a jurisprudência tem considerado pacificamente que não deve ser conhecida pelo tribunal ad quem a nulidade da sentença em processo laboral que não foi arguida no requerimento de interposição de recurso.
É certo que se tem admitido que aquela exigência se mostrará cumprida, no caso de o requerimento e a alegação constituírem uma peça única, com a indicação no requerimento de interposição de recurso a que se apresenta a arguição de nulidades da sentença e a exposição dos motivos determinantes das nulidades feita na alegação, imediatamente a seguir ao requerimento stricto sensu, de forma perfeitamente clara e autónoma – vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2007.10.31, Recurso n.º 1442/07, de 2008.03.12, Recurso n.º 3527/07, sumariados in www.stj.pt, em consonância com o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 304/05, de 8 de Junho de 2005, in Diário da República, II Série, n.º 150, de 5 de Agosto de 2005 (também em www.tribunalconstitucional.pt), que julgou inconstitucional por violação do princípio da proporcionalidade a norma constante do art. 77.º do CPT/99 “na interpretação segundo a qual o tribunal superior não pode conhecer das nulidades da sentença que o recorrente invocou numa peça única, contendo a declaração de interposição de recurso com referência a que se apresenta a arguição de nulidades da sentença e alegações e, expressa e separadamente, a concretização das nulidades e as alegações, apenas porque o recorrente inseriu tal concretização após o endereço do tribunal superior”.
Mas tem sido igualmente jurisprudência constante do Tribunal Constitucional a de não ser inconstitucional o entendimento de que o tribunal “ad quem” está impedido de apreciar as nulidades da sentença, em processo laboral, sempre que as mesmas não tenham sido expressamente arguidas no requerimento de interposição do recurso (Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 403/2000, in D.R., II Série, de 2000.12.13, reportado ao artigo 72º n.º 1 do CPT/81 e n.º 439/2003, in www.tribunalconstitucional.pt, reportado ao artigo 77º n.º 1 do CPT/99).
No fundo, apenas se admite ser desproporcionado que, relativamente aos recursos interpostos das decisões proferidas em 1.ª instância - em que existe uma unidade formal do requerimento de interposição do recurso e das alegações -, o tribunal ad quem decline o seu conhecimento quando o recorrente referencia genericamente a existência do vício decisório no dito requerimento, mas vem a efectivar a sua substanciação no corpo alegatório de forma clara e autónoma. Embora este comportamento não observe inteiramente o prescrito no art. 77.º do Código de Processo do Trabalho, admite-se que nestas situações o tribunal superior aprecie a questão da nulidade desde que a motivação desta, no corpo da alegação, se mostre explanada de forma expressa e de molde a facilitar ao juiz a percepção, imediata e sem necessidade de maiores indagações, de que está colocada a questão da nulidade da sentença.
No caso sub judice, os recorrentes não chegam sequer a arguir a nulidade no requerimento de interposição de recurso dirigido ao tribunal da 1.ª instância, aí não lhe fazendo qualquer referência, pelo que não pode apreciar-se a sua argumentação no sentido de saber se verifica a nulidade da sentença nos termos do preceituado no artigo 615.º do Código de Processo Civil, procedendo a questão prévia suscitada pela Exma. Procuradora-Geral Adjunta a este propósito.
E não pode igualmente, este tribunal emitir pronúncia sobre o pedido em causa uma vez que a omissão da apreciação da questão em causa não foi oportunamente arguida, como comanda o artigo 77.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, e o âmbito dos poderes do tribunal de recurso não compreende o conhecimento de questões não apreciadas pelo tribunal recorrido, ressalvadas as que sejam de conhecimento oficioso, o que não é o caso[1].
Não se conhece, pois, da arguida nulidade.
*
*
4. Fundamentação de facto
*
4.1. Os factos materiais relevantes para a decisão da causa foram fixados pela sentença recorrida nos seguintes termos:
«[...]
1 – Os AA. entraram para o serviço da R., que se dedica ao exercício da Atividade de Assistência em escala a aeronaves (vulgarmente conhecida por L…), respetivamente em 28.3.2005 o 1º A.; 02.05.2005 a 2ª A.; 02.05.2005 o 3º A.; 1.6.2005 o 4º A.; e 01.11.2005 os AA. do processo apenso.
2 – Todos desempenhando desde a data de admissão até ao presente, nas instalações desta sitas no …, …, Maia, as funções de: receber, acompanhar, encaminhar e assistir passageiros, bagagem, carga e correio; preparar. Recolher e enviar informações e documentos relacionados com o tráfego, explorando sistemas informáticos ou outros meios e equipamentos que para tal se justifiquem; aceitar as reclamações dos passageiros em situações de irregularidade de operação, assistindo e providenciando soluções adequadas; elaborar manifestos e executar tarefas de controlo documental; providenciar documento e assistir as tripulações no que se refere a preparação dos voos; proceder ao balanceamento das aeronaves; organizar, encaminhar e preparar documentação inerente às tarefas exercidas nas plataformas e terminais de passageiros, carga e correio; elaborar relatórios de ocorrências e providenciar registos organizados que facilitem a sua consulta, divulgação e respetivo encaminhamento; assegurar a formação técnica dos TAE´s e OAE´s nas fases iniciais de carreira; coordenar as atividades exercidas pelas áreas operacionais, tendo em vista a rentabilização dos meios humanos e materiais disponíveis; estabelecendo processos de trabalho, especificando meios e métodos em conformidade com normas internas ou diretivas superiores.
3 – Os AA. mantiveram-se ininterruptamente desde a data da admissão até ao presente, no exercício destas funções sob as ordens, direção, fiscalização e autoridade da R..
4 – A R. classificou os AA.:
- desde a admissão de cada um – Auxiliar;
- desde 01 de Janeiro de 2007 – Técnico de Assistência em Escala (TAE).
5 – Nos contratos de trabalho celebrados entre os AA. e a R. consta um horário semanal 18h e ainda que “o trabalhador dá, desde já, o seu acordo a um eventual aumento do período normal de trabalho para as 36h semanais, em qualquer momento da execução deste contrato, com os necessários ajustamentos nas componentes remuneratórias”.
6 – Pelo menos a partir do ano de 2006, a R. atribuiu sempre aos AA. horário de trabalho de 36h semanais, tendo-lhes pago no fim de cada mês de trabalho a remuneração correspondente ao trabalho prestado em horário completo de trabalho.
7 – A R. pagou a cada um dos AA. do processo 349/12.0TTMAI as seguintes remunerações mensais:
- Abril 2005 - 277,35 (apenas ao 1º A.);
- Maio 2005 - 277,35 (só aos 1º, 2ª e 3º AA.);
- Junho 2005 a Agosto 2006 - 398,46 (só aos AA.);
- de Setembro 2005 a Outubro de 2005 - 286,91 (só aos AA.);
- de Novembro 2005 a Fevereiro 2006 - 382,57;
- de Março 2006 a Abril 2006 - 573,82;
- de Maio 2006 a Outubro 2010 - 588,00;
- de Novembro 2006 a Dezembro 2006 - 646,00;
- de Janeiro 2007 a Maio 2007 - 725,00;
- de Junho 2007 a Dezembro 2007 - 743,00;
- de Janeiro 2008 a Junho 2008 - 811,00;
- de Julho 2008 a Dezembro 2008 - 831,00;
- de Janeiro 2009 a Julho 2009 - 879,00;
- de Agosto de 2009 até ao presente - 889,00.
8 – A R. pagou a cada um dos AA. do processo 350/12.3TTMAI as seguintes remunerações mensais:
- de Novembro 2005 a Março 2006 - 286,91;
- de Abril 2006 - 382,57;
- de Maio 2006 a Outubro 2010 - 588,00;
- de Novembro 2006 a Dezembro 2006 - 646,00;
- de Janeiro 2007 a Maio 2007 - 725,00;
- de Junho 2007 a Dezembro 2007 - 743,00;
- de Janeiro 2008 a Junho 2008 - 811,00;
- de Julho 2008 a Dezembro 2008 - 831,00;
- de Janeiro 2009 a Julho 2009 - 879,00;
- de Agosto de 2009 até ao presente - 889,00.
9 – Os AA. são sócios do M....
10 – A R. sempre pagou aos AA. os subsídios de férias e de Natal e os subsídios de turno com base nas remunerações que mensalmente lhes processava.
11 – A R. pagou ao 1º A. do processo n.º 349/12.0TTMAI as seguintes quantias a título de subsídio de férias:
2005 - 321,72;
2006 - 721,08;
2007 - 841,00;
2008 - 940,76;
2009 - 1063,59;
2010 - 1075,69;
2011 - 1075,69.
12 – A R. pagou ao 1º A. do processo n.º 349/12.0TTMAI as seguintes quantias a título de subsídio de Natal:
2005 - 443,78;
2006 - 707,77;
2007 - 861,88;
2008 – 1.005,51;
2009 – 1075,69;
2010 – 1075,69;
2011 – 1075,69.
13 – A R. pagou ao 1º A. do processo n.º 349/12.0TTMAI as seguintes quantias a título de subsídio de subsídio de turno:
De 1.3.2005 a 31.5.2005 - 44,37;
De 1.6.2005 a 31.8.2005 - 63,75;
De 1.9.2005 a 31.10.2005 - 45,90;
De 1.11.2005 a 29.2.2006 - 61,21;
De 1.3.2006 a 31.3.2006 - 91,81;
De 1.4.2006 a 30.4.2006 - 91,81;
De 1.5.2006 a 31.10.2006 - 94,08;
De 1.11.2006 a 31.12.2006 - 103,36;
De 1.1.2007 a 29.2.2007 – 116;
De 1.3.2007 a 31.5.2007 – 116;
De 1.6.2007 a 31.12.2007 - 118,88;
De 1.1.2008 a 30.4.2008 - 129,76;
De 1.5.2008 a 30.6.2008 - 129,76;
De 1.7.2008 a 31.08.2008 - 132,96;
De 1.9.2008 a 31.12.2008 - 174,51;
De 1.3.2009 a 31.3.2009 - 184,59;
De 1.4.2009 a 31.7.2009 - 184,59;
De 1.8.2009 a 28.2.2011 - 186,69;
De 1.3.2011 a 31.3.2011 - 186,69;
De 1.4.2011 a 30.4.2012 - 186,69.
14 – A R. pagou aos 2º e 3º AA. do processo n.º 349/12.0TTMAI as seguintes quantias a título de subsídio de férias:
2005 - 321,72
2006 - 721,08;
2007 - 841,00;
2008 - 940,76;
2009 - 1063,59;
2010 - 1075,69;
2011 - 1075,69.
15 – A R. pagou aos 2º e 3º AA. do processo n.º 349/12.0TTMAI as seguintes quantia, a título de subsídio de Natal:
2005 - 443,78;
2006 - 707,77;
2007 - 861,88;
2008 - 1005,51;
2009 - 1075,69;
2010 - 1075,69;
2011 - 1075,69.
16 – A R. pagou ao 2º e 3º AA. do processo n.º 349/12.0TTMAI as seguintes quantias a título de subsídio de subsídio de turno:
De 1.5.2005 a 31.5.2005 - 44,37;
De 1.6.2005 a 31.8.2005 - 63,75;
De 1.9.2005 a 31.10.2005 - 45,90;
De 1.11.2005 a 29.2.2006 - 61,21;
De 1.3.2006 a 31.3.2006 - 91,81;
De 1.4.2006 a 30.4.2006 - 91,81;
De 1.5.2006 a 31.10.2006 - 94,08;
De 1.11.2006 a 31.12.2006 - 103,36;
De 1.1.2007 a 29.2.2007 – 116;
De 1.3.2007 a 31.5.2007 – 116;
De 1.6.2007 a 31.12.2007 - 118,88;
De 1.1.2008 a 30.4.2008 - 129,76;
De 1.5.2008 a 30.6.2008 - 129,76;
De 1.7.2008 a 31.08.2008 - 132,96;
De 1.9.2008 a 31.12.2008 - 174,51;
De 1.4.2009 a 30.4.2009 - 184,59;
De 1.5.2009 a 31.7.2009 - 184,59;
De 1.8.2009 a 30.4.2011 - 186,69;
De 1.5.2011 a 30.4.2012 - 186,69.
17 – A R. pagou ao 4º A. do processo n.º 349/12.0TTMAI as seguintes quantias a título de subsídio de férias:
2005 - 321,72;
2006 - 721,08;
2007 - 841,00;
2008 - 940,76;
2009 - 1063,59;
2010 - 1075,69;
2011 – 1075,69.
18 – A R. pagou ao 4º A. do processo n.º 349/12.0TTMAI as seguintes quantias a título de subsídio de Natal:
2005 - 443,78;
2006 - 707,77;
2007 - 861,88;
2008 - 1005,51;
2009 - 1075,69;
2010 - 1075,69:
2011 - 1075,69.
19 – A R. pagou ao 4º A. do processo n.º 349/12.0TTMAI as seguintes quantias a título de subsídio de turno:
De 1.6.2005 a 31.8.2005 - 63,75;
De 1.9.2005 a 31.10.2005 - 45,90;
De 1.11.2005 a 29.2.2006 - 61,21;
De 1.3.2006 a 31.3.2006 - 91,81;
De 1.4.2006 a 30.4.2006 - 91,81;
De 1.5.2006 a 31.5.2006 - 94,08;
De 1.6.2006 a 31.10.2006 - 94,08;
De 1.11.2006 a 31.12.2006 - 103,36;
De 1.1.2007 a 31.5.2007 – 116;
De 1.6.2007 a 31.12.2007 - 118,88;
De 1.1.2008 a 30.4.2008 - 129,76;
De 1.5.2008 a 30.6.2008 - 129,76;
De 1.7.2008 a 31.08.2008 - 132,96;
De 1.9.2008 a 31.12.2008 - 174,51;
De 1.4.2009 a 31.5.2009 - 184,59;
De 1.6.2009 a 31.7.2009 - 184,59;
De 1.8.2009 a 31.5.2011 - 186,69;
De 1.6.2011 a 30.4.2012 - 186,69;
20 – A R. pagou aos AA. do processo n.º 350/12.3TTMAI as seguintes quantias a título de subsídio de férias:
2005 - 331,81;
2006 - 686,08;
2007 – 841;
2008 - 1005,51;
2009 - 1063,59;
2010 - 1075,69;
2011 - 1134,78.
21 – A R. pagou aos AA. do processo n.º 350/12.3TTMAI as seguintes quantias a título de subsídio de Natal:
2005 - 332,81;
2006 - 749,36;
2007 - 861,88;
2008 - 1005,51;
2009 - 1075,69;
2010 - 1134,78;
2011 - 1134,78.
22 – A R. pagou aos AA. do processo n.º 350/12.3TTMAI as seguintes quantias a título de subsídio de turno:
De 1.11.2005 a 31.3.2006 - 45,91;
De 1.4.2006 a 30.4.2006 - 61,21;
De 1.5.2006 a 31.10.2006 - 94,08;
De 1.11.2006 a 31.12.2006 - 103,36;
De 1.1.2007 a 31.5.2007 - 118,88;
De 1.6.2007 a 31.510.2007 - 118,88;
De 1.11.2007 a 31.12.2007 - 118,88;
De 1.1.2008 a 30.4.2008 - 129,76;
De 1.5.2008 a 30.6.2008 - 129,76;
De 1.7.2008 a 31.12.2008 - 174,51;
De 1.4.2009 a 31.7.2009 - 184,59;
De 1.11.2009 a 31.10.2009 - 186,69;
De 1.8.2009 a 28.2.2011
De 1.11.2011 a 30.4.2012 - 186,69.
23 – A categoria de Auxiliar é atribuída pela empresa R. a todos os trabalhadores que iniciam funções.
24 – O Auxiliar, por definição, é aquele que executa tarefas que requerem conhecimentos e especialização reduzida e específica para o apoio de outros profissionais, normalmente TAE’s e OAE’s.
25 – A R. considera o “Auxiliar” como uma categoria de ingresso para a passagem às categorias mais qualificadas de TAE e de OAE.
26 – A categoria de Auxiliar contempla 2 níveis: F01 e F03, tendo sido atribuído aos Autores o primeiro nível aquando da sua admissão e o nível F03, em Novembro de 2006.
27 – O acesso à categoria de TAE não é de acesso imediato na empresa, salvo raras excepções.
28 – Para se aceder à categoria de TAE, a R. considera como necessário que estejam reunidos um determinado número de pressupostos, a saber: o exercício das funções inerentes a essa categoria por um período não inferior a dois anos.
29 – A categoria de TAE desenvolve-se também num conjunto de níveis, que evoluem nos seguintes termos:

30 – Os Autores foram promovidos a TAE nível 06, em Janeiro de 2007, tendo permanecido nessa categoria durante 1 ano.
31 – Os Autores foram promovidos a TAE nível 08, em Janeiro de 2008, tendo permanecido nessa categoria durante 1 ano.
32 – Os Autores foram promovidos a TAE nível 10, em Janeiro de 2009, onde deveriam permanecer, pelo menos por 2 anos, ou seja, até Janeiro de 2011.
33 – A R. não atribuiu, em Janeiro de 2011, o nível 12.
34 – A R. pagou aos AA. trabalho suplementar sempre que o mesmo foi prestado para lá das 36 horas semanais.
35 – A Ré insere-se num sector de atividade cujo ciclo anual apresenta irregularidades, variando as necessidades de mão-de-obra em função do aumento e/ou diminuição do número de companhias aéreas assistidas.
36 – O AE da K…, S.A. vem sendo aplicado às relações entre a R. e os seus trabalhadores.
[...]».
O tribunal da 1.ª instância considerou não provado que:
«A – O referido em 5 foi imposto pela R. aos AA.
B – A categoria de auxiliar compreende uma fase de familiarização com os métodos de trabalho, procedimentos e práticas da empresa.
C – As categorias de TAE e OAE apenas são atribuídas quando os trabalhadores reúnem os respectivos requisitos.
D – As excepções referidas em 27 são fundamentadas.
E – Para além do referido em 28, a R. exige ainda o preenchimento dos seguintes pressupostos: formação profissional específica para o desempenho das funções inerentes a tal categoria profissional, normalmente no desempenho de funções de Auxiliar; necessidades funcionais da empresa; um volume de tráfego aéreo que justifique a criação desse posto de trabalho.
F – A empresa tem que assegurar alguma flexibilidade na admissão dos seus colaboradores e adaptabilidade na gestão dos seus horários de trabalho, indispensável para fazer face às necessidades operacionais.»
*
4.2. A R. recorrente inicia as suas alegações e, depois, as suas conclusões, afirmando que existem pontos na sentença recorrida que impunham uma decisão diversa, em particular, os pontos 2 e 6 e, consequentemente, os pontos 3 e 4 e 7 e 8, o que tem reflexos na parte da decisão que reconhece que os autores têm direito, desde a data das suas admissões (sublinhado nosso) até 31 de Dezembro de 2006, à categoria de Técnico de Assistência em Escala e, consequentemente, ao pagamento dos diferenciais remuneratórios correspondentes àquele período.
Suscita a Exma. Procuradora-Geral Adjunta a questão prévia da rejeição da impugnação da decisão de facto por incumprimento dos ónus fixados no artigo 640.º, n.ºs 1, alíneas b) e c) e n.º 2, alínea a) do Código de Processo Civil em vigor, por não ter a recorrente especificado os concretos meios probatórios relativos a cada ponto concreto de facto impugnado e não ter especificado as decisões que deveriam ter sido proferidas.
A propósito dos requisitos para a impugnação da matéria de facto, estabelece o artigo 640.º do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, lei processual aplicável à data em que foram produzidas as alegações[2], o seguinte:
«Artigo 640.º
Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto
1 — Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 — No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
(…).»
Para sindicar o cumprimento destas especificações legais, tal como sempre decidimos à luz do correspondente artigo 685.º-B do Código de Processo Civil revogado, cabe ter presente o objectivo da sua previsão.
Com as normas relativas à interposição de recurso e apresentação da motivação, o legislador pretendeu criar um conjunto de regras de natureza prática a observar pelos recorrentes e que permitam ao tribunal ad quem apreender, de forma clara, as razões que levam o recorrente a atacar a decisão recorrida, de modo a que possam ser apreciadas com rigor (nem mais, nem menos do que é pedido, com ressalva das matérias de conhecimento oficioso). Actualmente, tornou-se claro que é necessária a formulação de um pedido concreto quanto à alteração da decisão de facto, com a indicação pelo recorrente da “decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.
Assim, o critério subjacente à definição da conformidade das conclusões com o comando dos artigos 639.º e 640.º do CPC está necessariamente relacionado com a respectiva aptidão para exercerem a sua função delimitadora e sinalizadora do campo de acção interventiva do tribunal de recurso. É esta função das conclusões que legitima a existência de normas processuais que as exijam.
Na mesma lógica delimitadora e sinalizadora da intervenção do tribunal de recurso se situam os requisitos legais para a impugnação da matéria de facto, cuja inobservância, atenta a especificidade desta impugnação, justifica a rejeição do recurso no que se refere a tal matéria, com vista a prevenir o uso injustificado do recurso e a delimitar o seu objecto e os termos da cognição do tribunal ad quem (pela identificação, precisa, dos pontos de discordância e das razões da discordância), tudo na perspectiva do uso racional e justificado do meio recursório.
Além disso, cabe ter presente que, uma vez que as conclusões delimitam o objecto do recurso – artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC, aplicáveis ex vi do disposto nos artigos 1.º, n.º 2, alínea a), e 87.º do Código de Processo do Trabalho, na redacção aprovada pelo Decreto-Lei n.° 295/2009, de 13.10 –, é necessária a indicação, nas conclusões, pelo menos, dos concretos pontos de facto de cuja decisão a recorrente discorda, embora se admita que a indicação dos meios de prova em que o recorrente sustenta a sua discordância possa ter lugar nas alegações, pois que consubstancia matéria relativa à correspondente fundamentação.
No caso em análise, a R. recorrente especificou nas suas conclusões os concretos pontos de facto elencados na sentença que considera incorrectamente julgados, mas não indicou efectivamente, quer no corpo das alegações, quer nas conclusões, quais os concretos meios probatórios constantes do processo ou do registo da gravação nele realizada que, na sua perspectiva, impunham decisão diferente sobre os pontos da matéria de facto de que discorda.
Ora, analisando os factos que a recorrente impugna, designadamente o facto 2. que se reporta às funções que a sentença da 1.ª instância considerou desempenharem os AA. desde as datas das suas admissões ao serviço da recorrente – pois que é essencialmente sobre este facto que a recorrente despende a sua argumentação conclusiva –, verifica-se que os mesmos foram considerados provados, essencialmente, com base em prova testemunhal que foi produzida na 1.ª instância e aí apreciada (vide a motivação da decisão de facto a fls. 301 e ss.), pelo que a sua alteração teria, necessariamente, que passar, ou pela reapreciação de elementos probatórios com força probatória plena que infirmassem aqueles depoimentos testemunhais, ou por uma reapreciação dos mesmos que eventualmente determinasse uma decisão de facto diferente daquela que ficou plasmada na sentença e a recorrente impugna.
Mas a verdade é que, além de não indicar quaisquer meios com força probatória plena que se sobrepusessem à prova testemunhal, não identifica uma só testemunha cujo depoimento devesse ser reapreciado nesta instância e, consequentemente, não localiza com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso ou, sequer, procede à transcrição de excertos que considere relevantes.
Aliás, é de notar que a referência que faz a depoimentos de testemunhas é uma referência global – “salienta-se que as próprias testemunhas indicam que, com muita probabilidade, só no terceiro mês os trabalhadores começam a desempenhar toda a panóplia de tarefas enunciadas no descritivo supra indicado” (veja-se a conclusão XXII) – não particularizando quais as testemunhas a que se reporta e que é contrária às afirmações constantes da motivação da decisão de facto em que a Mma Julgadora a quo identifica três testemunhas que referiram ao tribunal desempenharem os AA. as funções alegadas “praticamente desde as respectivas datas de admissão”, sendo apoiados por um colega mais velho “apenas nos primeiros dias”, ficando de seguida “por sua conta, podendo sempre pedir auxílio por rádio ou telefone” e estando habilitados a trabalhar sozinhos “no máximo” ao fim de 1 ou 2 meses (fls. 302).
E as considerações que tece para ver alterada a decisão de facto prendem-se com o que reputa de lógico, designadamente com o que entende ser objectivamente “impossível” ou “não possível”, e com a alegação de que os AA. frequentaram cursos antes de realizarem determinadas tarefas (não esclarecendo se os cursos foram anteriores ou posteriores à admissão ao serviço), considerações que poderiam valer na ocasião da reapreciação de cada um dos depoimentos em que o tribunal a quo fundou a sua decisão – caso a reapreciação fosse pedida e fundamentada nos termos já referidos – mas que, por si só, não são suficientes para alterar esta decisão que, profusamente, se fundou nos depoimentos prestados e explicitou as razões da sua convicção.
É pois manifesto que a recorrente não cumpriu os ónus legais prescritos no artigo 640.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, alínea a) do CPC.
Além disso, não indicou a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, pelo que não cumpriu também o prescrito na alínea c) do n.º 1 do mesmo artigo 640.º.
Em suma, a recorrente não deu a conhecer ao tribunal superior os termos precisos em que pretende a alteração da decisão de facto proferida na 1.ª instância e os fundamentos probatórios de tal alteração, não sendo a argumentação que desenvolve, por si só, de molde a lograr ver alterado qualquer dos factos que indica.
De acordo com a parte final do corpo do artigo 640.º, n.º1 do Código de Processo Civil, não é possível o aperfeiçoamento das conclusões quando não se cumpram as especificações legais nele previstas (regime que corresponde ao artigo 685.º-B, n.º 1 do anterior CPC).
Esta maior exigência do legislador tem plena justificação uma vez que, dirigindo o recorrente a sua pretensão a um tribunal que não intermediou a instrução da causa na 1.ª instância e que vai actuar através de um reexame da decisão recorrida quanto a concretos pontos de facto que se consideram incorrectamente julgados, deve cumprir com rigor e precisão as exigências legais, sinalizando correctamente o que pretende, e não limitar-se a uma manifestação inconsequente de inconformismo[3].
Deve assim rejeitar-se o recurso no que respeita à impugnação da decisão de facto.
*
4.3. Os factos a atender para resolver as questões postas nos recursos são, pois, os fixados na 1.ª instância.
*
*
5. Fundamentação de direito
*
5.1. A primeira questão de direito a enfrentar consiste em aferir se os AA. recorridos têm direito, desde as datas das suas admissões e até 31 de Dezembro de 2006, à categoria profissional de técnico de assistência em escala (TAE) e, consequentemente, ao pagamento dos diferencias remuneratórios correspondentes aquele período.
A R. recorrente alega que não pode concordar com a sentença quando ela afirma que todos os AA. desempenharam desde a data da admissão o conjunto de funções que estão compreendidas nas funções de TAE desenvolvendo as suas alegações no sentido de que se alterem os factos – essencialmente o referido facto 2. – nos quais a sentença fundou a sua decisão de reconhecer aos AA. recorridos o direito à categoria profissional de TAE que apenas lhes reconheceu em 1 de Janeiro de 2007, desde as datas das respectivas admissões.
E conclui que, considerando o apontado nos testemunhos, nunca seriam os recorridos merecedores dessa categoria, pelo menos desde a data da admissão, nos termos em que foi a recorrente condenada e, sem conceder, pelo menos no lapso de tempo de 3 meses, mais uma vez invocando genericamente “as próprias testemunhas”, pelo que pelo menos neste lapso de tempo inicial, afirma que “não se pode concordar com a condenação na atribuição da categoria de TAE e correspondente diferenciais salariais, a qual, a ser devida, seria sempre a partir do 4.º mês e nunca antes”– conclusão XXI a XXIII.
Ou seja, de acordo com o modo como estruturou a sua alegação, é na alteração da matéria de facto provada que alicerça a sua pretensão de ser revogada a sentença e de se ver absolvida da condenação nela contida neste preciso aspecto relacionado com o direito dos AA. ao reconhecimento da categoria profissional de TAE (Técnico de Assistência em Escala) desde as datas das suas admissões ao serviço da R., com a inerente contrapartida remuneratória.
Uma vez confirmada a decisão recorrida quanto aos factos nela assentes – o que determina se mantenham inalterados os pressupostos factuais que a determinaram –, e uma vez que os seus fundamentos jurídicos não foram postos em causa nas conclusões da recorrente, deverá a mesma ser mantida neste aspecto questionado pela recorrente.
E, assim, improcede totalmente, a apelação da R. recorrente.
*
5.2. A segunda questão de direito a analisar mostra-se suscitada no recurso interposto pelos AA. e reporta-se aos efeitos da entrada em vigor das Leis do Orçamento do Estado para os anos de 2011 e 2012 nas prestações devidas aos recorrentes a partir de 1 de Janeiro de 2011.
Uma vez que a R. faz parte do sector empresarial do Estado, entendeu a sentença da 1.ª instância que a mesma está sujeita às limitações fixadas nas Leis do Orçamento do Estado para os anos de 2011 e 2012 – Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro e Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro – as quais vieram proibir a prática de actos que consubstanciem valorizações remuneratórias dos titulares dos cargos e demais pessoal identificado no n.º 9 do artigo 19.º da primeira das referidas leis, aí se incluindo as valorizações e outros acréscimos remuneratórios, designadamente, resultantes de alterações de posicionamento remuneratório (artigos 24.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 55-A/2010 e 20.º, n.º 1 da Lei n.º 64-B/2011).
Assim o entendem também os recorrentes, não suscitando já no recurso a questão da inconstitucionalidade de tais preceitos legais por violação do disposto nos artigos 13.º, 19.º, 26.º, 55.º, 56.º e 59.º da Constituição da República Portuguesa, que a sentença sob censura entendeu não se verificar (com invocação do decidido no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 396/2011, in DR, 2ª Série, de 2011.10.17, que não declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes dos artigos 19.º, 20.º e 21.º da Lei n.º 55-A/2010).
Simplesmente, a sentença da 1.ª instância, com fundamento nestes preceitos das Leis do Orçamento, decidiu que não se consideram as diferenças de remuneração reclamadas a partir de 01 de Janeiro de 2011 no apuramento a efectuar, e veio a considerar apenas as devidas “tendo em conta o período temporal de 01.01.2007 a 31.10.2010” (sic.), concluindo que “se encontram em dívida aos autores, a título de diferenças nas suas retribuições base, subsídio de férias, subsídio de Natal e subsídio de turno, as seguintes quantias: ao autor B…: € 5.156,68; aos autores C… e D…: € 4.892,17; ao autor E…: € 4.716,57; aos autores G…, H…, I... e J…: € 3.657,71”, sendo neste aspecto que se verifica o dissenso dos recorrentes.
Segundo alegam os recorrentes, devem quantificar-se as diferenças entre 1 de Novembro de 2010 e 30 de Abril de 2012 (última data constante na petição inicial), explicitando que: quanto ao período de 1 de Novembro de 2010 a 31 de Dezembro de 2010, o tribunal recorrido nenhuma razão tinha para não quantificar as diferenças pedidas, tendo-se verificado um lapso de escrita; quanto ao período que se iniciou em 1 de Janeiro de 2011, não pondo em causa o entendimento do Tribunal de que a partir de 1 de Janeiro de 2011, mercê dos limites fixados pelo Orçamento de Estado para os anos de 2011 e 2012, estão proibidas valorizações remuneratórias do pessoal da R., e de empresas semelhantes, já não faz qualquer sentido que não se tenham apurado as diferenças salariais decorrentes dos valores remuneratórios a que cada A. tinha direito já em 2010 e aquilo que a R. lhes pagou.
Neste aspecto, reconhece-se razão aos AA. recorrentes.
Na verdade, e em primeiro lugar, resulta de evidente lapso da sentença, emergente do próprio texto da mesma, a referência ao termo final do período não abrangido pela eficácia das Leis do Orçamento de Estado para os anos de 2011 e 2012, situando o mesmo “de 01.01.2007 a 31.10.2010”. Tendo em consideração, não só a similitude numérica das datas tal como foram inscritas (31.10.2012, em vez de 31.12.2012), como também o facto de a sentença enunciar que vai considerar o “período temporal de 01.01.2007 a 31.10.2012” logo depois de ter concluído, na sequência da análise de tais leis, que “no apuramento das pretendidas diferenças de remuneração não se considerem as reclamadas a partir de 01 de janeiro de 2011”, ressalta patente o erro material na indicação da data de “31.10.2012”.
Nada justifica, pois, que se não atenda ao período de 1 de Novembro de 2010 a 31 de Dezembro de 2010, pelo que, tendo em consideração o preceituado no artigo 614.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, aplicável “ex vi” do art. 1.º, n.º 2 al. a) do Código de Processo do Trabalho, aqui se corrige o lapsus calami da sentença na indicação do termo final de tal período, consignando-se que o período a atender até que se verificam as restrições da legislação orçamental intercorre entre 1 de Janeiro de 2007 e 31 de Dezembro de 2010. É este período agora traçado que se irá considerar na quantificação dos valores devidos aos recorrentes até à vigência das Leis do Orçamento, por virtude da reclassificação profissional anteriormente operada.
Em segundo lugar, quanto ao período que se iniciou em 1 de Janeiro de 2011, entendemos que os limites fixados pelas Leis do Orçamento de Estado para os anos de 2011 e 2012, proibindo valorizações remuneratórias do pessoal da R., e de empresas semelhantes, têm que ser entendidos por reporte aos valores devidos à data da sua entrada em vigor (que não podem ser incrementados), não fazendo efectivamente sentido que, por força de tais leis, os AA. continuem em 2011 a perceber valores remuneratórios que resultam de uma errada classificação profissional e que já em 2010 deveriam mostrar-se alterados. Cremos mesmo que tal entendimento contraria a filosofia subjacente ao artigo 24.º da Lei n.º 55-A/2010[4], mantido em vigor para o ano de 2012 através do artigo 20.º, n.º 1 da Lei n.º 64-B/2011. Seguindo os cânones hermenêuticos propostos no artigo 9.º do Código Civil, cremos que o referido preceito se reporta a alterações verificadas após a vigência da lei em que se inscreve – 1 de Janeiro de 2011, nos termos do respectivo artigo, 187.º – não colidindo com direitos sedimentados na esfera jurídica dos seus titulares em data anterior àquela entrada em vigor. A quantificação de diferenças salariais existentes em 2011 e 2012, tendo em conta remunerações que já eram devidas desde 2010, não contende, pois, com a proibição de valorização remuneratória imposta pelo Estado, consistindo apenas na liquidação de diferenças entre o que foi pago e valores que já anteriormente eram devidos, os quais não foram objecto de qualquer incremento no ano de 2011.
Concluímos, pois, que as limitações das LOE’s se aplicam aos valores salariais devidos a partir de 1 de Janeiro de 2011, tendo em consideração os direitos firmados já nos anos anteriores.
Se, de acordo com a sentença recorrida, os AA. tinham direito em 31 de Dezembro de 2010 à retribuição base reclamada de € 966,00, a partir de 1 de Janeiro de 2011 é esta retribuição base que não pode sofrer incremento remuneratório, nada justificando que qualquer dos recorrentes regrida a partir de então nos direitos salariais que lhe deveriam ter sido anteriormente reconhecidos.
Assim, se é certo que não pode proceder a pretensão dos AA. formulada na petição inicial de que lhes seja reconhecido em 2011 e 2012 o aumento da retribuição base, sucessivamente, para os valores de € 987,00 e € 998,00, não pode deixar de se lhes reconhecer o direito a manter em tais anos o direito à retribuição base que já deviam auferir em 2010 e que, de acordo com a sua alegação que, neste aspecto, não é questionada pela recorrida, era de € 966,00.
E, apurando-se que a recorrida lhes pagou em 2011 e 2012 valores que não alcançam este valor devido em 2010, devem apurar-se as diferenças salariais decorrentes da discrepância entre os valores remuneratórios a que cada A. tinha direito já em 2010 e aquilo que a R. lhes pagou nestes anos de 2011 e 2012.
Procede, neste aspecto, o recurso dos AA.
*
5.3. Cabe agora quantificar os valores devidos aos recorrentes entre 1 de Janeiro de 2007 e 30 de Abril de 2012, pois que quanto aos vencidos entre a data da admissão de cada um dos AA. e 31 de Dezembro de 2006, a sentença recorrida determinou o seu apuramento em liquidação de sentença, o que não foi questionado por qualquer dos recorrentes.
5.3.1. A Mma. Julgadora a quo liquidou os valores devidos sem explicitar as operações aritméticas efectuadas, concluindo serem devidos aos AA. os valores que fez constar da condenação, sem neles incluir quaisquer valores devidos em 2011 e 2012.
5.3.2. Os pressupostos que se enunciaram quanto à categoria profissional que deveria ser reconhecida aos AA. desde as datas das suas admissões ao serviço da R. (TAE), quanto ao lapso de tempo a atender para o cálculo das diferenças salariais (de 1 de Janeiro de 2007 a 30 de Abril de 2012) e quanto aos valores a atender para a base de cálculo das diferenças tendo em consideração as limitações fixadas nas Leis do Orçamento do Estado para os anos de 2011 e 2012 (Lei n.º 55-A/2010 e Lei n.º 64-B/2011) correspondem aos atendidos pelos recorrentes nos cálculos efectuados nas suas alegações de recurso, pois que em tais cálculos não procedem já a qualquer incremento da remuneração devida nos anos de 2011 e 2012, como haviam feito na petição inicial e os valores efectivamente pagos que enunciam correspondem aos que ficaram a constar dos factos dados como provados na sentença.
Concluíram os recorrentes serem devidas as diferenças de remuneração e dos subsídios de férias, de Natal e de Turno naquele período, nos seguintes valores: ao A. B… - € 6.829,94; a cada um dos AA. C… e D… - € 6.675,72; ao A. E… - € 6.514,86 e a cada um dos AA., G…, H…, I… e J… - € 5.517,72.
A recorrida acolheu na generalidade esta contabilização, imputando-lhe contudo erros que assinalou com vista ao apuramento correcto do que é devido, vindo a concluir que as diferenças salariais no período em causa, a serem devidas, deveriam ser liquidadas pelos seguintes valores: para o Recorrente B… - € 6619,61; para cada um dos Recorrentes C… e D… - € 6510,84; para o Recorrente E… - € 6349,66 e para cada um dos Recorrentes G…, H…, I… e J… - € 5517,72.
5.3.3. Cabe, pois, aferir se tais erros se verificam.
5.3.3.1. No que diz respeito às “diferenças remuneração base até Outubro de 2010” do Autor B…, alega a recorrida que se verifica uma incorrecção na contabilização dos diferenciais relativos ao período de “1 de Julho 2007 a 31 de Dezembro 2007”, pois que estão contabilizados nesse período 7 meses e não 6.
Efectivamente, em tal item é dito o seguinte:

Cremos contudo que não assiste razão à recorrida, pois resulta com clareza do contexto das alegações de recurso que a referência ao mês de Julho (e não Junho, como seria lógico) se deveu a um evidente lapso, que emerge das seguintes circunstâncias:
- o quadro em que os recorrentes efectuam estes cálculos reporta-se, parcelarmente, a todos os meses compreendidos entre 1 de Janeiro de 2007 e 31 de Outubro de 2010, não resultando do corpo da alegação qualquer justificação para que dele se omita um mês, especificamente o mês de Junho de 2007;
- no facto n.º 7 elencado nos factos provados da sentença é justamente em Junho de 2007 (e não em Julho), que o A. B… passa a auferir a retribuição mensal base de € 743,00 referenciada neste quadro no item de “1 de Julho 2007 a 31 de Dezembro 2007”;
- a contabilização final de 7 meses (e não de 6 meses) nesse mesmo item é conforme com o atendimento dos meses de Junho a Dezembro de 2007;
- o item que precede este indicado como “1 de Julho 2007 a 31 de Dezembro 2007”, diz respeito aos meses de “Março a Maio de 2007”, pelo que o mês que se lhe segue é Junho e não Julho, o que também torna incompreensível a omissão do mês de Junho.
Ou seja, entendemos correcto e conforme com os factos provados (facto n.º 7) o cálculo efectuado quanto às diferenças de remunerações de base devidas ao recorrente B… entre Junho e Dezembro de 2007, o qual orça em € 805,00 (€ 858,00 de remuneração devida - € 743,00 de remuneração efectivamente auferida x 7 meses = € 805,00), tal como os recorrentes contabilizaram, não relevando o erro material constatado quanto à indicação do mês de Junho (cfr. o artigo 249.º do Código Civil).
Quanto às “diferenças subsídio de férias”, não colhe a invocação da recorrida de que o subsídio de férias auferido em 2007 foi de € 861,88 (e não € 841,00) e o subsídio de férias auferido em 2009 foi de € 1.075,69 (e não € 1.063,59), o que determinaria uma diferença salarial inferior. Resulta com clareza do facto provado n.º 11, elencado na sentença, que o recorrente B… auferiu em 2007 o subsídio de férias de € 841,00 e em 2009 o subsídio de férias de € 1.063,59, pelo que neste aspecto nada há a corrigir. No que diz respeito à alegação da recorrida de que só em Agosto de 2008, é que o subsídio de turno passou a ser processado com a taxa de 21% e de que o Autor B… recebeu o subsídio de férias em Março de 2008, factos de que a recorrida retira a conclusão de que o valor base para cálculo do subsídio de férias seria € 879 + 16% e não + 21%, cabe dizer que a recorrida alega aqui factos novos, que não cuidou de alegar na 1.ª instância e sobre os quais este tribunal de recurso se não pode pronunciar, pelo que não poderá aos mesmos atender para proceder aos cálculos dos valores devidos.
Quanto às “diferenças subsídio de turno até Outubro de 2010”, ainda do Autor B…, a recorrida assinala lapso similar ao verificado nas “diferenças remuneração base até Outubro de 2010” relativas ao período de “1 de Julho 2007 a 31 de Dezembro 2007”, pois que estão contabilizados nesse período 7 meses e não 6. Sem necessidade de nos repetirmos, deve dizer-se que, também aqui, a referência ao mês de Julho em vez de Junho resulta de lapso evidente, exactamente pelas mesmas razões, não havendo qualquer incorrecção na contabilização dos diferenciais contabilizando nesse período 7 meses e não 6.
É assim devido ao Autor B… a título de diferenças salariais de remuneração e dos subsídios de férias, de Natal e de Turno, no período em causa, o valor global de € 6.829,94.
5.3.3.2. Relativamente aos AA. C… e D…, a recorrida começa por assinalar uma incorrecção no que diz respeito às “diferenças de subsídios de férias”, alegando a mesma que só em Agosto de 2008, é que o subsídio de turno passou a ser processado com a taxa de 21% e que os Autores C… e D… receberam o subsídio de férias em Abril de 2008, factos de que a recorrida retira a conclusão de que o valor base para cálculo do subsídio de férias seria € 879 + 16% e não + 21%. Como se verificou quanto ao primeiro A., a recorrida invoca aqui factos novos, que não cuidou de alegar na 1.ª instância e sobre os quais este tribunal de recurso se não pode pronunciar, pelo que não poderá aos mesmos atender para proceder aos cálculos dos valores devidos.
Já assiste razão à recorrida quando refere que o cálculo das “diferenças de subsídio de natal” apuradas aos recorrentes C… e D…, está incorrectamente apurado, uma vez que tais valores equivalem a € 286,65 (135,40 + 58,08 + 93,17) e não a € 284,65 como concluem os recorrentes.
É assim devido a cada um dos Autores C… e D…, a título de diferenças salariais de remuneração e dos subsídios de férias, de Natal e de Turno, no período em causa, o valor global de € 6.677,72.
5.3.3.3. Relativamente ao recorrente E…, a única incorrecção assinalada pela recorrida reporta-se às “diferenças de subsídios de férias”, também aqui alegando a mesma que só em Agosto de 2008, é que o subsídio de turno passou a ser processado com a taxa de 21% e que o Autor E… recebeu o subsídio de férias em Janeiro de 2008, factos de que a recorrida retira a conclusão de que o valor base para cálculo do subsídio de férias seria € 879 + 16% e não + 21%. Como se verificou quanto aos demais AA. a recorrida alega aqui factos novos, que não cuidou de alegar na 1.ª instância e sobre os quais este tribunal de recurso se não pode pronunciar, pelo que não poderá aos mesmos atender para proceder aos cálculos dos valores devidos.
Nada mais sendo questionado quanto a este Autor, é de concluir que lhe é devido, a título de diferenças salariais de remuneração e dos subsídios de férias, de Natal e de Turno, no período em causa, o valor global indicado pelos recorrentes de € 6.514,86.
5.3.3.4. Finalmente, quanto aos recorrentes H…, I…, G… e J…, a recorridas indica que as contabilizações parecem estar correctas e, a serem devidas as diferenças salariais, deveriam ser liquidadas pelo valor de € 5.517,72, o que coincide com o cálculo feito pelos recorrentes.
5.3.4. Em suma, havendo consenso entre as partes quanto aos cálculos efectuados e ultrapassadas as questões pontuais assinaladas pela recorrida quanto às operações que lhes subjazem e que os recorrentes efectuaram pormenorizadamente nas suas alegações de recurso – que se nos afiguram correctas e conformes, quer com os dados de facto emergentes da sentença, quer com os pressupostos enunciados neste aresto –, concluímos que deve ser alterada a sentença neste aspecto, condenando-se a R. ora recorrida a pagar aos AA. ora recorrentes as diferenças de remuneração e dos subsídios de férias, de Natal e de turno vencidas entre 1 de Janeiro de 2007 e 30 de Abril de 2012, nos seguintes valores:
● ao A. B… - € 6.829,94;
● a cada um dos AA. C… e D… - € 6.677,72;
● ao A. E… - € 6.514,86;
● a cada um dos AA., G…, H…, I… e J… - € 5.517,72.
*
5.4. Resta analisar a questão de saber se os recorrentes têm, como alegam, direito a um período normal de trabalho semanal de 36 horas.
Sustentam os recorrentes que, apesar de terem subscrito os contratos de trabalho em que se fixou um horário semanal de 18 horas, aí sendo igualmente fixado que “o trabalhador dá, desde já, o seu acordo a um eventual aumento do período normal de trabalho para as 36 horas semanais, em qualquer momento de execução deste contrato, com os necessários ajustamentos remuneratórios”, tendo em consideração que a partir de 2006 a ré atribuiu sempre aos AA. horário de trabalho de 36 horas semanais, tendo-lhes pago no fim de cada mês de trabalho a remuneração correspondente ao trabalho prestado em horário completo de trabalho, bem como os normativos legais aplicáveis, o pedido dos AA. deveria ter sido julgado procedente.
A sentença da 1.ª instância, a este propósito, discorreu nos seguintes termos:
«[…]
Como refere João Leal Amado [Contrato de Trabalho – à luz do novo Código do Trabalho, pag. 261], «quando celebra um contrato de trabalho, o trabalhador não vende o seu corpo ao empregador. Nem, decerto, a sua alma. Mas talvez se possa dizer que aquele vende o seu tempo, parte do seu tempo …».
E, porque assim é, compreende-se que a ordem jurídica se preocupe com esse tempo que é alienado, com a determinação de que tempo será esse e quanto tempo será esse. Assim, a lei define no artigo 197.º/1 do Código do Trabalho aquilo que se deve entender por tempo de trabalho - «considera-se tempo de trabalho qualquer período durante o qual o trabalhador exerce a atividade ou permanece adstrito à realização da prestação, bem como as interrupções ou os intervalos previstos no número seguinte».
Deste modo, pois, o tempo de trabalho compreende o tempo de trabalho efetivo e os períodos de inatividade equiparados a tempo de trabalho, sendo que aquele tempo de trabalho efetivo corresponde não apenas ao desempenho da prestação, mas também ao tempo de disponibilidade para o trabalho.
Por seu turno, o período de descanso é recortado negativamente pela lei, consistindo, nos termos do disposto no artigo 199.º do Código do Trabalho, em todo aquele que não seja tempo de trabalho.
O segundo conceito operatório fundamental do regime jurídico do tempo de trabalho é o conceito de período normal de trabalho.
Assim, estabelece o artigo 198.º do Código do Trabalho que «o tempo de trabalho que o trabalhador se obriga a prestar, medido em número de horas por dia e por semana, denomina-se período normal de trabalho».
O período normal de trabalho constitui, assim, a tradução quantitativa ou a medida do tempo de trabalho, com base numa unidade de tempo diária ou semanal – em suma, este conceito reporta-se à duração do trabalho ou da disponibilidade do trabalhador para a sua realização [Maria do Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho, parte II, pag. 515].
A partir da fixação do período normal de trabalho, importa ainda proceder à operação de distribuição do número de horas a que o trabalhador se encontra adstrito ao longo do dia, através da fixação dos momentos de início e termo do trabalho.
E, para proceder a esta concretização, a lei desenvolveu o conceito de horário de trabalho no artigo 200.º do Código do Trabalho, aí se estabelecendo no seu n.º2 que «o horário de trabalho delimita o período normal de trabalho diário e semanal».
O horário de trabalho é, em regra, fixado pelo empregador – artigo 212.º/1, o que se compreende tendo em conta que a distribuição do tempo de trabalho dos diversos trabalhadores tem que ver com a organização da unidade produtiva – resultando do disposto no artigo 217.º/1 e 4 do Código do Trabalho que o empregador pode ainda alterar unilateralmente o horário de trabalho, exceto naqueles casos em que os horários tenham sido individualmente acordados entre o trabalhador e o empregador, situação em que a alteração exige o acordo do trabalhador.
Segundo Monteiro Fernandes [Direito do Trabalho, pag. 353], «a alterabilidade dos horários de trabalho, por decisão unilateral da entidade empregadora, dentro dos apontados condicionalismos legais, só está afastada nos casos em que o horário de trabalho conste (expressamente) do contrato individual, ou tenha sido posteriormente acordado entre as partes (artigo 217.º/4), e ainda naquelas em que haja regra de convenção coletiva aplicável, no sentido de que a alteração de horário só pode operar-se por acordo».
Importa salientar que os conceitos de período normal de trabalho e de horário de trabalho não são confundíveis, pois que, enquanto o período normal de trabalho fixa, como se disse, o número de horas que o trabalhador se compromete a trabalhar em cada dia e em cada semana, o horário de trabalho determina a distribuição dessas horas por cada período de vinte e quatro horas e por cada período de sete dias.
Ora, e como refere Francisco Liberal Fernandes [O Tempo de Trabalho, pag.40], «apesar do intervencionismo legal (artigos 203.º e 213.º/1), a determinação da duração e distribuição do tempo de trabalho radica na autonomia das partes, individual ou coletiva (artigos 198.º e 203.º/4); por isso, dentro dos limites legais, compete aos parceiros sociais e às partes do contrato definir o período normal de trabalho».
Ou seja, dentro dos limites legais, os contraentes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo do contrato, incluindo as cláusulas que lhes aprouver (artigo 405.º/1 do Código Civil), não podendo ser alteradas ou extintas sem mútuo consentimento ou nos casos admitidos na lei, as obrigações a que ficam vinculadas as partes pelo contrato (artigo 406.º do Código Civil).
Ora, no caso presente, e como se apurou, nos contratos de trabalho celebrados entre os autores e a ré consta um horário semanal de 18 horas e ainda que “o trabalhador dá, desde já, o seu acordo a um eventual aumento do período normal de trabalho para as 36 horas semanais, em qualquer momento da execução deste contrato, com os necessários ajustamentos nas componentes remuneratórias”.
Desde já se note que, pese embora se refira a “um horário semanal de 18 horas”, afigura-se-nos que o que aqui se trata é não do horário de trabalho, mas antes do período normal de trabalho. Com efeito, o que as partes acordaram foi em fixar o número de horas em que os trabalhadores se obrigavam a trabalhar durante a semana em 18 horas e não na distribuição dessas mesmas horas pelo período em causa.
Ora, e como já vimos, esta matéria estava na disponibilidade das partes, podendo as mesmas fixar esse mesmo PNT nos termos em que o entendessem, desde que respeitados os limites legais e convencionais a propósito fixados.
E, no âmbito dessa mesma liberdade contratual, deram os autores o seu acordo a que esse mesmo período normal de trabalho, fixado em 18 horas semanais, pudesse aumentar até às 36 horas semanais, desde que houvesse o necessário ajustamento remuneratório.
Tendo em conta que a possibilidade prevista nos contratos em causa não viola qualquer disposição legal ou convencional e que a mesma se mostrou consensual – saliente-se que os autores não lograram provar, como lhes competia, que tal cláusula lhes tivesse sido imposta pela ré – não vemos em que medida a mesma possa ser considerada como ilegal e violadora, designadamente, das normas atinentes ao horário de trabalho e condições para a sua alteração (como se referiu, o que esta em causa não é o horário de trabalho, mas, e de todo o modo, a possibilidade de o empregador alterar o horário de trabalho dos seus empregados, sem necessidade do acordo destes, também ocorre em todos os casos em que tal não ofenda cláusulas dos contratos individuais de trabalho ou normas de convenção coletiva, ou se o trabalhador não tiver sido contratado especificamente para laborar em determinado horário) ou da noção de trabalho suplementar, até porque, como também se provou, a ré pagou aos autores trabalho suplementar sempre que o mesmo foi prestado para lá das 36 horas semanais.
Deste modo, pois, e por carecer de fundamento legal, a pretensão dos autores de que a ré considere os seus horários de trabalho como sendo de 36 horas semanais, não os podendo diminuir, há de ser julgada improcedente.
[…]»
Concordamos, na sua essencialidade, com estas considerações, no que diz respeito ao regime jurídico a atender e à solução final da improcedência da pretensão dos AA.
Mas já se nos suscitam algumas reservas quanto ao iter que precede esta solução final.
Ficou na verdade provado nestes autos que “[n]os contratos de trabalho celebrados entre os AA. e a R. consta um horário semanal 18h e ainda que “o trabalhador dá, desde já, o seu acordo a um eventual aumento do período normal de trabalho para as 36h semanais, em qualquer momento da execução deste contrato, com os necessários ajustamentos nas componentes remuneratórias” (facto n.º 5.).
E é certo que os recorrentes não lograram provar que a Ré lhes tenha imposto a referida cláusula – vide a alínea A) dos factos “não provados”.
Igualmente se nos afigura acertada a sentença quando indica que o convénio em causa se reporta ao período normal de trabalho – ao tempo de trabalho que o trabalhador se obriga a prestar, medido em número de horas por semana – e não ao horário de trabalho, que tem a ver com a distribuição do número de horas a que o trabalhador se encontra adstrito ao longo do dia e da semana, delimitando o período normal de trabalho diário e semanal (artigos 198.º e 200.º do Código do Trabalho de 2009).
Também não sofre contestação que a fixação do período normal de trabalho constitui uma competência das partes do contrato, com as limitações legais ou decorrentes de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho[5] e que os máximos legais sucessivamente impostos nos artigos 163.º, n.º 1 do Código do Trabalho de 2003 e 203.º, n.º 1 do Código do Trabalho de 2009 – 8 horas por dia e 40 horas por semana – não mostram ultrapassados no caso vertente.
Analisando contudo os termos concretos da cláusula em causa, verificamos que na mesma:
1.º - se convenciona um período normal de trabalho semanal “de 18 horas”;
2.º - o trabalhador dá antecipadamente o seu acordo “a um eventual aumento do período normal de trabalho para as 36h semanais, em qualquer momento da execução deste contrato, com os necessários ajustamentos nas componentes remuneratórias”.
Ou seja, o que decorre da cláusula é que as partes convencionaram a prestação de trabalho a tempo parcial (cfr. o artigo 180.º do Código do Trabalho de 2003, em vigor à data da contratação) e que, não obstante, o trabalhador dá antecipadamente o seu acordo ao empregador no sentido de passar a trabalhar a tempo completo, ou o inverso, sempre que o empregador o entender e em qualquer momento da execução do contrato de trabalho.
Ora, como resulta do disposto no artigo 186.º do Código do Trabalho de 2003 e, ulteriormente, do artigo 155.º do Código do Trabalho de 2009, a lei faz depender a alteração do trabalho a tempo parcial para trabalho a tempo completo, ou o inverso, de “acordo escrito” do trabalhador com o empregador.
Uma vez que tal alteração implica a opção por uma diferente modalidade contratual, e tendo em atenção o profundo significado que a mesma sempre tem na vida pessoal e profissional do trabalhador, o legislador tutelou a posição deste em termos coincidentes com os previstos para a revogação do contrato de trabalho, exigindo a forma escrita para o acordo e reconhecendo até ao trabalhador um direito ao arrependimento que, a ser exercido, acarreta a ineficácia do acordo celebrado[6].
Cremos pois que não cumpre o desiderato da lei admitir que o trabalhador contratado a tempo parcial dê o seu acordo, em termos genéricos e por antecipação, a uma alteração do período normal de trabalho de molde a que este possa coincidir com o trabalho a tempo completo, sem avaliar no momento da alteração (quando a questão da modificação contratual se coloca) se a mesma lhe é, ou não, conveniente.
A prestação antecipada do acordo nestes termos não só não garante um consentimento livre, esclarecido e actual, em conformidade com os princípios civilísticos da realização de negócios jurídicos, como não é conforme com a especial e acrescida tutela que a lei laboral confere ao trabalhador que consente na alteração do trabalho a tempo parcial para trabalho a tempo completo, ou o inverso (artigos 186.º do Código do Trabalho de 2003 e 155.º do Código do Trabalho de 2009).
Assim, é de considerar que o acordo prestado pelos AA. para a alteração do período normal de trabalho semanal de 18 horas para 36 horas, nos termos que ficaram plasmados nos contratos individuais de trabalho firmados pela recorrida com os recorrentes, não podia ser prestado nesses termos por antecipação e por reporte a uma situação eventual que se poderia verificar em qualquer momento da execução do contrato, ainda que com os necessários ajustamentos remuneratórios. Tal acordo teria que ser contemporâneo das concretas alterações que o empregador entendesse propor aos trabalhadores, sendo nesse momento que estes deviam ter a possibilidade de aferir se lhes interessava, ou não, a alteração[7].
Trata-se, não o esqueçamos, de uma importante modificação contratual – que no caso poderá implicar que o volume de trabalho prometido seja o dobro do convencionado, com as inerentes repercussões na organização do tempo dos trabalhadores e na necessária conciliação entre as suas vidas familiar e profissional – que a lei rodeia de apertadas cautelas no que diz respeito à prestação de um consentimento livre, esclarecido, actual e reflectido do trabalhador, possibilitando-lhe, inclusivamente, a retratação.
Seja como for, mesmo considerando-se inadmissível a prestação antecipada de acordo para a alteração contratual do período normal de trabalho prometido, das 18 horas convencionadas para 36 horas, tal não determina, no caso vertente, que se possa reconhecer aos recorrentes o direito a um “horário semanal completo de 36 horas”, tal como peticionado.
Com efeito, o período normal de trabalho convencionado nos contratos de trabalho é de “18 horas” e o que os recorrentes questionam é a validade da prestação antecipada do seu acordo a que o empregador aumente este período normal de trabalho para 36 horas semanais, em qualquer momento da execução do contrato.
O facto de o empregador vir assim actuando desde 2006 escudando-se neste antecipado acordo e atribuindo aos trabalhadores um período normal de trabalho de 36 horas semanais, em vez das 18 horas convencionadas, não confere validade à alteração do período normal de trabalho a que procedeu quando passou a fazê-lo e não implica, por isso, que o período normal de trabalho convencionado de 18 horas se tenha definitivamente fixado em 36 horas.
Aliás, de toda a argumentação dos recorrentes resulta que consideram contrária à lei a possibilidade do aumento eventual do período normal de trabalho por iniciativa do empregador, pelo que, em bom rigor, a invalidade por que propugnam – e que acolhemos, como resulta do exposto – tem como consequência que se tenha por fixado, nos contratos em causa, um período normal de trabalho semanal de 18 horas (o efectivamente convencionado), excluindo-se a possibilidade do seu eventual aumento por iniciativa do empregador.
Assim, sem prejuízo de ser ulteriormente convencionada a alteração do regime do trabalho a tempo parcial para trabalho a tempo completo, nos termos prescritos no artigo 155.º do Código do Trabalho de 2009, não pode agora, à face do contrato e da ilegalidade dos aumentos do período normal de trabalho determinados no seu decurso por iniciativa do empregador, reconhecer-se aos recorrentes o reclamado “direito a um horário semanal completo de 36 horas”.
Improcedem as conclusões da apelação dos AA. neste aspecto do período normal de trabalho.
*
5.5. As custas do recurso da R. ficam a seu cargo, uma vez que ficou totalmente vencida no mesmo; as custas do recurso dos AA. são repartidas entre estes e a R., na proporção do vencido (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
*
*
6. Decisão
*
Em face do exposto,
6.1. rejeita-se a impugnação da decisão de facto deduzida pela R. F…, S.A.;
6.2. nega-se provimento ao recurso da R. F…, S.A.;
6.3. concede-se parcial provimento ao recurso dos AA. e, em consequência, alteram-se os pontos I-3. e II-3. da sentença sob censura, decidindo-se, em sua substituição:
6.3.1. em relação ao processo n.º 349/12.0TTMAI, condenar a R. F…, S.A. a pagar aos autores, a título de diferenças salariais (remuneração, subsídio de férias, subsídio de Natal e subsídio de turno), as seguintes quantias:
a) ao autor B…, € 6.829,94, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento;
b) a cada um dos autores C… e D…, € 6.677,72, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento;
c) ao autor E…, € 6.514,86, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento;
6.3.2. em relação ao processo n.º 350/12.3TTMAI, condenar a R. F…, S.A. a pagar a cada um dos autores G…, H…, I… e J…, a título de diferenças salariais (remuneração, subsídio de férias, subsídio de Natal e subsídio de turno), a quantia de € 5.517,72, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento;
no mais se mantendo a decisão final da 1.ª instância.
*
Custas do recurso interposto pela R. por esta.
*
Custas do recurso dos AA. por estes e pela R. na proporção do vencido.
*
Nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil, anexa-se o sumário do presente acórdão.
*
Porto, 3 de Novembro de 2014
Maria José Costa Pinto
João Nunes
António José Ramos
________________
[1] Vide o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Julho de 2010, Processo: 08S3846, in www.dgsi.pt.
[2] Em face do disposto nos artigos 5.º e 8.º da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, que aprovou o novo Código de Processo Civil, é o mesmo aplicável aos processos pendentes nos actos que se desenrolem a partir de 1 de Setembro de 2013. As alegações de recurso foram apresentadas em 19 de Dezembro de 2013.
[3] Vide Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra, 2014, p. 135.
[4] Segundo o qual: “Artigo 24.º (Proibição de valorizações remuneratórias)
1 — É vedada a prática de quaisquer actos que consubstanciem valorizações remuneratórias dos titulares dos cargos e demais pessoal identificado no n.º 9 do artigo 19.º.
2 — O disposto no número anterior abrange as valorizações e outros acréscimos remuneratórios, designadamente os resultantes dos seguintes actos (…)”.
[5] Vide Liberal Fernandes, in “O Tempo De Trabalho, Comentário aos artigos 197º a 236º do Código do Trabalho [revisto pela Lei nº23/2012, de 25 de Junho]”, Coimbra, 2012, p. 61.
[6] Vide Luís Miguel Monteiro, in Código do Trabalho Anotado, sob a coordenação de Pedro Romano Martinez e outros, 8.ª edição, Coimbra, 2009, p. 416.
[7] Vide a propósito também da inadmissibilidade de um consentimento genérico e apriorístico prestado ab initio aquando da contratação, embora a propósito da concordância do trabalhador para a cedência temporária a terceiros, João Leal Amado, in Contrato de Trabalho, 3.ª edição, Coimbra, 2011, p. 130. _________________
Nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, lavra-se o sumário do antecedente acórdão nos seguintes termos:
I – A proibição de valorizações remuneratórias fixada pelas Leis do Orçamento de Estado para os anos de 2011 e 2012, tem que ser entendida por reporte aos valores devidos à data da sua entrada em vigor, que não podem ser incrementados.
II – As limitações das LOE’s não afectam os valores salariais devidos tendo em consideração os direitos firmados já nos anos anteriores, ainda que até então o empregador os não reconhecesse.
III - O acordo genérico prestado pelo trabalhador no contrato de trabalho para a alteração do período normal de trabalho semanal de 18 horas convencionado para 36 horas, não pode ser prestado nesses termos por antecipação e por reporte a uma situação eventual que se poderia verificar em qualquer momento da execução do contrato, ainda que com os necessários ajustamentos remuneratórios, devendo ser contemporâneo das concretas alterações que o empregador entenda propor ao trabalhador, sendo neste momento que o trabalhador deve ter a possibilidade de aferir se lhe interessa, ou não, a alteração.
IV - O facto de o empregador ter alterado o período normal de trabalho de 18 horas desde 2006, escudando-se neste antecipado acordo, não confere validade à alteração do período normal de trabalho a que procedeu quando passou a fazê-lo e não implica, por isso, que o período normal de trabalho convencionado de 18 horas se tenha definitivamente fixado em 36 horas.

Maria José Costa Pinto