Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0211045
Nº Convencional: JTRP00036352
Relator: MARQUES SALGUEIRO
Descritores: CONCURSO REAL DE INFRACÇÕES
BURLA
FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO
USO DE IDENTIFICAÇÃO ALHEIA
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: RP200401280211045
Data do Acordão: 01/28/2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recorrido: T J S JOÃO MADEIRA
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.
Área Temática: .
Sumário: I - Comete, em concurso real, os crimes de burla, de falsificação de documentos e de uso de documento de identificação alheia, aquele que, entrando numa loja, aí adquire diversas peças de vestuário que paga preenchendo e assinando cheques pertencentes a outra pessoa, fazendo-se passar por tal exibindo o bilhete de identidade da mesma.
II - Os acórdãos uniformizadores de jurisprudência não constituem jurisprudência obrigatória para os tribunais judiciais, mas estes só poderão divergir das decisões neles tomadas, se avançarem com novos argumentos que não foram levados à discussão no acórdão que fixou jurisprudência.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam na Relação do Porto:

No Tribunal Judicial da Comarca de....., o arguido JOÃO....., com a identificação dos autos, foi submetido a julgamento, em processo comum singular, tendo sido condenado, em cúmulo jurídico, pela prática, em co-autoria material, de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo artº 256º, nº 3, de um crime de burla, p. e p. pelo artº 217º, nº 1, e de um crime de uso de documento de identificação alheia, p. e p. pelo artº 261º, todos do Cód. Penal, na pena única de 210 (duzentos e dez dias) de multa, à taxa diária de € 5 (cinco Euros), assim no total de € 1050 (mil e cinquenta Euros), formada pelas penas parcelares de multa, impostas por cada um daqueles crimes, respectivamente, de € 180, € 120 e € 40.
Pela mesma sentença e na total procedência dos pedidos de indemnização civil, mais foi condenado a pagar aos demandantes “G....., LDª” e MÁRIO....., respectivamente, as quantias de € 486,33 e de € 336,69, acrescidas de juros vencidos e vincendos.

Inconformado, interpôs recurso o arguido, concluindo assim a sua motivação:
1. Não praticou os crimes públicos por que foi condenado que foram actos exclusivos e integrados na esfera de actuação da acompanhante Maria..... e só desta.
2. No plano de erro ou engano provocados, elementos do tipo legal de burla, sendo o pagamento com cheque, a falsificação do cheque e o uso de documento de identificação alheio não constituem um crime autónomo, mas são peças-base na construção do único crime: a burla.
3. Existe, pois, apenas um crime de burla que consome os outros tipos legais e não três crimes autónomos.
4. A medida da pena deve ser reduzida, não só tendo em conta o que se expôs, mas ainda o facto de o arguido não ter antecedentes criminais e auferir um vencimento baixo.
Assim, apontando como violados os artº 26º, 29º, 30º, 40º, 71º, 217º, 256º e 261º todos do Código Penal, pede a alteração da decisão recorrida em conformidade.

Respondeu o Mº Pº, contrariando a argumentação do recorrente e concluindo pelo não provimento do recurso.
Nesta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto, revendo-se na resposta do Mº Pº em 1ª instância, considera mesmo que é manifesta a improcedência do recurso que, por isso, deve ser rejeitado, parecer a que, notificado, respondeu o arguido.
No exame preliminar também se considerou manifesta a improcedência do recurso que, por isso, devia ser rejeitado, nos termos do artº 420º, nº 1, do C. P. Penal.
Assim, cumpridos os vistos, cabe decidir.
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Sendo pelas conclusões da motivação que o âmbito do recurso se define e atentas as questões ali sumariadas, vejamos, antes de mais, a matéria de facto, provada e não provada, que consta da sentença.

Foram ali dados como provados os factos seguintes:
1. No dia 15 de Dezembro de 1999, o arguido dirigiu-se ao Centro Comercial “.....”, sito em....., acompanhado da sua amiga, Maria....., onde pretendiam executar plano previamente traçado por ambos e que consistia em adquirir peças de vestuário e pagar as mesmas com cheques titulados por outra pessoa, que a Maria..... iria preencher como se da sua verdadeira titular se tratasse, exibindo o bilhete de identidade dessa outra pessoa.
2. Assim, em concretização de tal plano, o arguido e a Maria..... entraram na Loja n° .., “G....., Ldª”, propriedade de Mário....., onde aquele escolheu dois casacos de pele, ambos para homem, no valor total de 67 500$00 (€ 336,69) e transmitiu ao respectivo proprietário que os guardasse, pois viria adquiri-los no dia seguinte.
3. No mesmo dia, entraram na loja n° .. do referido centro comercial, propriedade de Isabel....., onde o arguido escolheu um blusão em pele, para homem, marca “Camel”, e a sua acompanhante dois pares de calças próprias para senhora, marca “Cerruti” e “Valentino”, no valor global de 97 500$00 (€ 486,33), e, do mesmo modo, solicitaram à respectiva proprietária que lhes reservasse tais artigos, pois iriam comprá-los no dia seguinte.
4. Sempre na concretização de tal plano e em conjugação de esforços e intentos, o arguido e a Maria...., no dia 16 de Dezembro de 1999, cerca das 2l.00 h., dirigiram-se à “G....., Lda.” e, para pagamento dos dois casacos em pele acima referidos, o arguido solicitou à sua acompanhante que emitisse um cheque.
5. Munida do bilhete de identidade pertencente a Ana..... e do cheque n° 08303067, referente à conta nº....., do Banco...., balcão de....., de que esta última é titular, documentos que entraram em seu poder de modo não apurado, e acedendo ao pedido que o arguido ali lhe fizera, a Maria..... preencheu-o, apondo-lhe o respectivo valor, datando-o, localizando-o e assinando-o, como se fosse a verdadeira titular da conta.
6. De seguida, a Maria..... entregou este cheque ao ofendido Mário..... e, para que este não tivesse dúvidas quanto à sua legítima proveniência ou quanto ao respectivo meio de pagamento, aquela enunciou um n° de telemóvel que disse ser o seu e exibiu o bilhete de identidade que tinha em seu poder, de que era titular a referida Ana...
7. Ainda no dia 16 de Dezembro de 1999, o arguido e a Maria..... dirigiram-se à loja n°... do mesmo centro comercial, onde haviam estado no dia anterior, e aí solicitaram a entrega das peças de vestuário que ali tinham escolhido.
8. Mais uma vez, sempre em concretização do plano previamente acordado por ambos, a Maria..... preencheu o cheque n° 08350076, referente à conta n°...... do Banco...., balcão de....., datando-o, localizando-o, assinando-o e preenchendo-o de modo a que titulasse a quantia de 97 500$00 (€ 486,33 )
9. De seguida, para que não subsistissem dúvidas quanto a tal meio de pagamento, a Maria..... enunciou um n° de telemóvel que disse ser o seu e exibiu o bilhete de identidade que tinha em seu poder, pertencente à referida Ana......
10. Convencidos de que a assinatura aposta nos cheques acima referidos era a da verdadeira titular e de que o bilhete de identidade que a acompanhante do arguido exibira era o seu, os proprietários das citadas lojas entregaram ao arguido e à sua acompanhante as respectivas peças de roupa, que estes fizeram coisas suas.
11. No entanto, apresentados a pagamento, ambos os cheques foram devolvidos sem que fossem pagos, por motivo de extravio.
12. O arguido logrou, por esse modo, induzir cada um dos ofendidos em erro, por forma a determinar cada um deles a proceder à entrega das peças de vestuário seleccionadas por aquele, com o propósito de enriquecer à custa do correspondente empobrecimento alheio, através de engano em que lograsse fazer cair as vítimas.
13. Sabia o arguido que a assinatura aposta em cada um dos cheques acima identificados não era a da sua acompanhante, nem esta era a verdadeira titular dos mesmos, nem do bilhete de identidade que exibiu, e que todos os restantes elementos apostos em tais títulos de crédito eram falsos e contrariavam a vontade da sua verdadeira titular, e que assim atentava contra a genuinidade daqueles e punha em causa a fé pública inerente à circulação cambiária.
14. O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, na concretização de plano previamente traçado por si e pela referida Maria....., bem sabendo do carácter reprovável e punível das suas condutas.
15. O arguido é solteiro e não tem filhos, reside com os pais, aufere como desenhador projectista o vencimento mensal de cerca de € 798 (setecentos e noventa e oito euros), tem como habilitações literárias o 12° ano de escolaridade e um curso de desenho de projecto mecânico.
16. O arguido não tem antecedentes criminais.
17. Com a devolução dos referidos cheques, a “G......, Ldª” e Mário....., empresário em nome individual, ficaram sem o valor que os mesmos titulam, sofrendo, por isso e respectivamente, um prejuízo patrimonial no valor de € 486,33 (quatrocentos e oitenta e seis euros e trinta e três cêntimos) e de € 336,69 (trezentos e trinta e seis euros e sessenta e nove cêntimos), o qual ainda não foi ressarcido.
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E, como factos não provados, consignaram-se os seguintes:
1. O arguido entregou um cheque ao ofendido Mário..... e, para que este não tivesse dúvidas quanto à sua legítima proveniência ou quanto ao respectivo meio de pagamento, aquele enunciou um n° de telemóvel que disse ser o seu.
2. Quando o arguido e a Maria..... se encontravam na loja n° ... do Centro Comercial “.....”, para pagamento das peças de vestuário solicitadas, o arguido solicitou à Maria..... que preenchesse e assinasse um cheque que a mesma tinha em seu poder.
3. Ainda quando se encontravam na referida loja n°..., para que não subsistissem dúvidas quanto a tal meio de pagamento, o arguido enunciou um n° de telemóvel que disse ser o seu.
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Sustenta, em primeira linha, o recorrente que não praticou os crimes públicos por que foi condenado, pois se tratou de actos exclusivos e integrados unicamente na esfera de actuação da sua acompanhante Maria......
Porém, à luz da matéria de facto provada, não lhe assiste razão alguma, claramente se vendo que toda a acção ali descrita foi resultante de “plano previamente traçado por ambos” e, com maior ou menor preponderância de intervenção do arguido e/ou da sua acompanhante Maria....., ambos entraram nas lojas seleccionadas, aí escolhendo cada um as peças de roupa que pretenderam e solicitando a sua reserva até ao dia seguinte, ambos se tendo depois aí apresentado para efectuar o pagamento e levantar as roupas, sendo ainda na execução desse mesmo plano que ambos traçaram que a Maria..... procedeu àqueles pagamentos com cheque e bilhete de identidade que lhe não pertenciam, mas sim a uma tal Ana......
Com esta matéria de facto - que o recorrente, de resto, não questiona, nem, aliás, podia validamente questionar, por isso que foi oportunamente prescindida a documentação dos actos da audiência, arredando a possibilidade de discussão da decisão sobre a matéria de facto (artº 428º, nº 2, do C. P. Penal), matéria que também se não vê que padeça de algum dos vícios a que alude o nº 2 do artº 410º -, é indiscutível a co-autoria do recorrente em toda a acção (e encenação), desde a escolha e reserva dos artigos de vestuário até ao seu ulterior pagamento e levantamento, sendo manifesta a improcedência da argumentação assim avançada no recurso.
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Sustenta ainda o recorrente que os factos provados integram apenas um crime de burla que consome os outros dois tipos legais, de falsificação de documento e de uso de documento de identificação alheio, não existindo, pois, três crimes autónomos.
Não é de agora a questão de saber se, integrando a conduta do agente a previsão típica dos crimes de burla e de falsificação de documento, estaremos perante a figura do concurso real de crimes ou antes e só perante a figura do concurso aparente, alinhando-se argumentação vária em ambos os sentidos.
E, assim, perante a divergência de correntes jurisprudenciais que, no domínio do C. Penal de 1982, se foi formando, o STJ, chamado a pronunciar-se, fixou jurisprudência pelo Assento de 19/2/1992, DR, Série I-A, de 9/4/1992, nos termos seguintes:
“No caso de a conduta do agente preencher as previsões de falsificação e de burla do artigo 228º, nº 1, al. a), e do artigo 313º, nº 1, respectivamente, do Código Penal, verifica-se concurso real ou efectivo de crimes.”.

Revisto o Código Penal pelo Dec.Lei nº 48/95, de 15 de Março, aquela questão foi retomada, sustentado-se que a versão do Código Penal que saíra da revisão importava o regresso à doutrina anterior, segundo a qual o crime de burla consumia o de falsificação.
E, nesta linha, produzida decisão judicial nesse sentido e que, por isso, contrariava a jurisprudência fixada naquele Assento, o Supremo Tribunal, chamado novamente a sanar a divergência, pelo Assento nº 8/200, de 4/5/2000, DR, Série I-A, de 23/5/2000, reafirmou o anterior entendimento, uniformizando a jurisprudência nos moldes seguintes:
“No caso de a conduta do agente preencher as previsões de falsificação e de burla do artigo 256º, nº 1, alínea a), e do artigo 217º, nº 1, respectivamente, do Código Penal, revisto pelo Decreto-Lei nº 48/95, de 15 de Março, verifica-se concurso real ou efectivo de crimes.”.

Assim fixada jurisprudência, a decisão respectiva tem eficácia no processo em que o recurso foi interposto e naqueles cuja tramitação tiver sido suspensa nos termos do artigo 441º, nº 2, do C. P. Penal - cfr. artº 445º, nº 1, deste Código.
Porém, fora desses processos e consoante o nº 3 deste mesmo artº 445º, tal decisão “não constitui jurisprudência obrigatória para os tribunais judiciais, mas estes devem fundamentar as divergências relativas à jurisprudência fixada naquela decisão”.
O que, se bem se julga, significa que os tribunais judiciais apenas poderão divergir dessa decisão, se avançarem com novos argumentos que não foram levados à discussão no acórdão que fixou jurisprudência e, assim, não terão sido aí ponderados e considerados.
Na verdade, se assim não fosse e essa decisão pudesse deixar de ser acatada com os mesmos argumentos que nela haviam já sido discutidos e afastados, então a função de fixação da jurisprudência que, por este mecanismo, a lei pretende alcançar frustrar-se-ia completamente e a querela, com o repisar da mesma argumentação, manter-se-ia.
Ora, tendo isto presente e volvendo ao nosso caso, nem o recorrente avança com novos argumentos que antes não tenham já sido considerados, nem, por nossa parte, vemos que alguma nova e diferente argumentação se possa ajuntar em sentido adverso ao fixado.
E, sendo assim, na total míngua de razões válidas que contrariem a jurisprudência fixada, manifestamente improcede, também aqui, a posição do recorrente, ao sustentar a existência de concurso aparente entre o crime de burla e o de falsificação de documento, sendo este consumido por aquele.

Mas, se assim é quanto à falsificação do documento - intrinsecamente ligada ao artifício enganoso que integra a burla -, outra não poderá ser a solução quanto ao uso de documento de identificação alheio (no caso, o bilhete de identidade da pessoa titular da conta bancária a que pertenciam os cheques falsificados): ainda que facilitando e reforçando o artifício enganoso da burla, no entanto, o uso de tal documento de identificação alheio, além de se revelar, de algum modo, exterior e complementar desse artifício, ofende ainda um bem jurídico marcadamente diverso, a segurança e a credibilidade no tráfico jurídico-probatório, não só dissimulando a verdadeira identificação da pessoa que pratica o acto enganoso e pondo em causa, obviamente, as possibilidades de êxito da reacção do lesado, como ainda fazendo induzir sobre o titular do documento ilicitamente utilizado a injusta suspeita de ter sido o autor da burla e, enfim, pondo ainda em crise a aceitação e crédito que, em si mesmos, os documentos de identificação têm de merecer.
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Improcedendo manifestamente as duas anteriores questões e sendo, assim, ponto assente que o arguido cometeu, em concurso real, os três crimes por que foi condenado, resta a derradeira questão, a da medida da pena, cuja redução o recorrente reclama, não só na medida em que, como se viu, sustentou haver um só crime, de burla, a considerar, como ainda pelo facto de não ter antecedentes criminais e auferir um vencimento baixo.
Porém, também aqui a sua falta de razão é manifesta.

Quanto à primeira razão invocada para a redução da pena:
Rejeitada que foi a tese do recorrente no sentido de que, no caso, havia a considerar a existência de um só crime e se acolheu o entendimento seguido na sentença, isto é, que o arguido cometera três crimes, em concurso real, daí decorre, necessariamente, que ao arguido têm de ser impostas três penas parcelares que, em cúmulo jurídico, entrarão na formação da pena única.

Resta, pois, a segunda ordem de razões para a reclamada redução da pena, ou seja, a ausência de antecedentes criminais do arguido e a sua condição económica.
Porém, os argumentos invocados são claramente insuficientes para as finalidades que o recorrente persegue.
Com efeito e quanto à ausência de antecedentes criminais, importa reparar também que, na data dos factos, o arguido contava trinta anos, apenas.
Ora, se, só por si, a ausência de antecedentes criminais - que é a condição normal que se espera da generalidade dos cidadãos e que, de todo o modo, apenas pode significar que os que assim se mantêm não foram, até aí, sancionados criminalmente (o que, largas vezes, sucede por simplesmente não terem sido apanhados nas malhas da Justiça), mas já não significa, necessariamente, que tenham uma postura e um comportamento dignos de realce - pouco valor atenuativo tem, a muito pouco se reduz essa valia se se trata, como no caso, de um jovem, ainda com pouco tempo para, nesse âmbito, dar provas seguras de si.
De todo o modo, como se lê na sentença, aquela circunstância foi ponderada e tida em consideração na determinação da medida da pena que veio a ser imposta ao arguido.
Enfim, sendo os crimes pelos quais o arguido foi condenado puníveis com pena de prisão ou com pena de multa e tendo o Tribunal optado - como indubitavelmente se impunha e, aliás, justificou - pela pena não privativa de liberdade, há que convir que, numa tal escala de gravidade das sanções aplicáveis e tendo em conta que, em favor do arguido, apenas se contavam aquela circunstância e o facto do arguido estar integrado na sociedade e que contra ele militavam factores acentuadamente desfavoráveis (grau da ilicitude, dolo directo e não reparação das consequência dos crimes, sendo que da sentença também não ressalta que tenha demonstrado pingo de arrependimento), as penas parcelares de multa se mostram graduadas com equilíbrio, sendo patente que a valoração do passado criminal do arguido não tinha virtualidade para justificar a sua fixação em medida mais modesta.
Não há, pois, qualquer fundamento, nomeadamente o invocado pelo recorrente, para reduzir a medida das penas parcelares e, consequentemente, da pena unitária que a sentença fixou.

Quanto ao apelo que o recorrente faz à sua condição económica:
Trata-se de circunstância que, como se dispõe na Lei (artº 47º, nº 2, do C. Penal), tem o seu campo de influência na fixação da taxa diária da multa.
A sentença fixou em € 5 (cinco Euros) a taxa diária da multa que impôs ao arguido, o que, sendo de 210 dias a pena única fixada, corresponde a uma multa total de € 1050 (mil e cinquenta Euros).
Sem avançar números que, em seu entender, seriam justos, o recorrente considera que essa multa deve ser reduzida, pois aufere um vencimento baixo em termos absolutos.
Mas, também aqui, é patente a sua falta de razão.
Podendo a taxa diária da multa oscilar entre 1 e 498,80 Euros (citado nº 2 do artº 47º do C. Penal, na redacção conferida pelo Dec.Lei nº 323/2001, de 17 de Dezembro) e não esquecendo que, como as demais penas, também a de multa - cujo pagamento suavizado está, aliás, previsto na lei para as situações que o justifiquem - há-de representar um justo sacrifício para o condenado, para que se não traduza, afinal, numa quase-absolvição, com a consequente frustração das finalidades da punição (artº 70º), apenas pode pecar por defeito a taxa diária de € 5 (cinco Euros) que a 1ª instância estabeleceu, bastando reparar que o arguido é solteiro, não tem filhos e vive com os pais, não se vendo que tenha específicos encargos pessoais ou de família e que, como desenhador projectista, aufere um vencimento mensal de cerca de € 798.
A todas as luzes, também esta pretensão do arguido não pode deixar de soçobrar.
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Destarte, improcedendo manifestamente todas as questões suscitadas, o recurso deve ser rejeitado, nos termos do artº 420º, nº 1, do C. P. Penal.
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Porque assim e atenta a sua manifesta improcedência, acorda-se em conferência em rejeitar o recurso do arguido João.......
Conforme o artº 420º, nº 4, do C. P. Penal, condena-se o recorrente no pagamento da importância de 4 (quatro) Ucs e, nos termos do artº 87º, nº 1, al. b), e 3, do C. C. Judiciais, em 3 (três) Ucs de taxa de justiça.

Porto, 28 de Janeiro de 2004
José Henriques Marques Salgueiro
Francisco Augusto Soares de Matos Manso
Manuel Joaquim Braz