Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1242/22.3T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FÁTIMA ANDRADE
Descritores: ARRENDAMENTO
PAGAMENTO DE RENDAS
FIADOR
INCUMPRIMENTO DO ARRENDATÁRIO
Nº do Documento: RP202305081242/22.3T8PRT.P1
Data do Acordão: 05/08/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Indicações Eventuais: 5.ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Por via do afastamento do benefício da excussão prévia, responde o fiador perante o credor em termos solidários com o devedor. Sendo a responsabilidade deste a medida da responsabilidade daquele (artigo 640º do CC).
II - Da leitura conjugada dos nºs 5 e 6 do artigo 1041º do CC, infere-se que a sanção prevista pelo legislador para a não notificação do fiador por parte do senhorio em caso de incumprimento do inquilino (que não faz cessar a mora nos termos do nº 2 deste artigo) é a da impossibilidade de exigir o cumprimento da obrigação em falta junto do fiador.
III - A notificação por parte do senhorio ao fiador é condição para o poder demandar ao cumprimento da dívida afiançada.
Estando o exercício deste direito sujeito a prazo certo, definido por lei, são-lhe aplicáveis as regras da caducidade, atento o disposto no artigo 298º nº 2 do CC.
IV - As rendas “no contrato de locação (…) correspondem a prestações periódicas sucessivas, dependentes da duração do contrato”, e nessa medida a cada novo incumprimento da obrigação “renasce o direito” à interpelação, em respeito pelos prazos previstos nos nºs 2, 5 e 6 do artigo 1041º.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº. 1242/22.3T8PRT.P1
3ª Secção Cível

Relatora – Juíza Desembargadora M. Fátima Andrade
Adjunto - Juíza Desembargadora Eugénia Cunha
Adjunto - Juíza Desembargadora Fernanda Almeida

Tribunal de Origem do Recurso - Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Jz. Local Cível do Porto

Apelante/ AA
Apelados/BB e outra



Sumário (artigo 663º nº 7 do CPC):
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Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto

I - Relatório

AA instaurou ação declarativa sob a forma de processo comum contra BB e CC, formulando pedido condenatório nos seguintes moldes:
“(…) deve a presente ação ser julgada procedente por provada e, consequentemente:
A) Ser decretada a resolução imediata do contrato de arrendamento.
B) A 1.ª Ré ser condenada a despejar de imediato o locado e a entregá-lo à A., livre e devoluto de pessoas e coisas.
C) Ambas as Rés, solidariamente, condenadas no pagamento das rendas em divida, já vencidas, no montante de 3.000,00€ (três mil Euros), respeitantes aos meses de julho, agosto, setembro, outubro, novembro, dezembro de 2021, janeiro e fevereiro de 2022, no montante global de 3.000,00€ e de todas as vincendas até efetivo e integral despejo, à razão de 375,00€/mês, acrescidas dos respetivos juros de mora à taxa legal civil a contar do vencimento até efetivo e integral pagamento.

Para tanto e em suma alegou:
- Ser dona e legítima proprietária da loja comercial identificada em 1º da p.i.;
- À 1ª R. foi cedido o uso e fruição de tal loja para fins não habitacionais pelo período de 5 anos, com início em 01/05/2018 e termo em 30/04/2023, renovável por iguais períodos caso não ocorresse denúncia, tudo conforme contrato de arrendamento entre as partes celebrado;
- A 1.ª Ré não pagou e tem em dívida as rendas correspondentes aos meses de julho, agosto, setembro, outubro, novembro, dezembro de 2021, janeiro e fevereiro de 2022, vencidas nos meses anteriores e que somadas perfazem a quantia global em dívida de 3.000,00€ (três mil Euros) - 8 mesesX375,00€ o que é fundamento de resolução do contrato;
- Assiste assim à A. o direito a pedir a resolução do contrato;
- A 2ª R. assumiu-se, solidariamente, responsável pelo pagamento de todas as quantias da responsabilidade da 1.ª Ré relacionadas com o contrato de arrendamento (cláusula 10.ª) – ut doc. 1, com renúncia ao benefício de excussão Prévia, até à efetiva entrega do locado, pelo que responde por todas as quantias que são peticionadas na presente ação.
Termos em que concluiu nos termos acima mencionados.

Devidamente citadas as RR., manteve-se a 2ª R., demandada na qualidade de fiadora, em situação de revelia absoluta.
A 1ª R. por sua vez juntou requerimento demonstrando ter requerido apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos do processo.
Não contestou.

Na pendência da ação a A. veio ainda informar – por requerimento de 30/06/2022 - ter recebido as chaves do locado no dia 26/06/22, requerendo o prosseguimento dos autos apenas quanto ao pedido de condenação no pagamento das rendas.
Foram os factos alegados pela autora julgados confessados.
Tendo sido observado o disposto no artigo 567º nº 2 do CPC.

Seguidamente foi proferida sentença, decidindo-se
“- Julgo parcialmente extinta a instância por inutilidade superveniente da lide relativamente ao pedido de declaração da resolução do contrato, de restituição do imóvel e de condenação no pagamento de uma indemnização pela mora subsequente à resolução do contrato.
- Julgo, no mais, a ação parcialmente procedente e condeno a primeira ré a pagar à autora as quantias de 4.875,00€, acrescida de juros calculados à taxa de 4% ao ano sobre a quantia de 3.000,00€ desde o dia 19 de janeiro de 2022 até efetivo e integral pagamento, e sobre cada uma das quantias mensais de 375,00€ vencidas nos meses de março, abril, maio e junho de 2022, desde o dia 9 de cada mês até efetivo e integral pagamento.
Custas relativas à pretensão formulada contra a primeira ré a cargo desta; custas relativas à pretensão formulada contra a segunda ré a cargo da autora. Fixo o valor da ação em 14.250,00€”

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Do assim decidido apelou a A., oferecendo alegações e formulando as seguintes
“Conclusões:
I - O facto do senhorio não ter notificado o fiador antes de intentar a ação de despejo, das rendas que estavam em dívida, não faz precludir, de forma definitiva, o direito de exigir a condenação do fiador no valor das rendas em dívida, solidariamente com a arrendatária.
II - Quando o fiador é citado na ação, isso equivale à notificação a que se refere o nº 5 do art. 1041 do C.C..
III - Contudo, o fiador só ficará responsável pelo pagamento das rendas dos 90 dias anteriores à sua citação.
IV - Pois, esta notificação posterior na ação, em nada retira os direitos do fiador, de só ser responsável pela renda vencida nos 90 dias anteriores.
V - Tal como se o Senhorio o tivesse interpelado anteriormente e tivesse dado logo entrada à ação, porque também não tem de esperar que o fiador responda a essa notificação.
VI - Logo, a citação da ação vale como notificação porque não retira qualquer direito ao fiador nem agrava a sua responsabilidade.
Termos em que, por erro de interpretação e aplicação do disposto nos nºs 5 e 6 do artº 1041 e 634, ambos do CC., deve a Sentença, no tocante ao fiador, ser revogada e substituída por outra que o condene, solidariamente com a arrendatária, no pagamento das rendas a partir dos 90 dias anteriores à citação, com o que se fará a esperada JUSTIÇA.”

Não se mostram apresentadas contra-alegações.
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O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito suspensivo.
Foram dispensados os vistos legais.
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II- Âmbito do recurso.
Delimitado como está o recurso pelas conclusões das alegações, sem prejuízo de e em relação às mesmas não estar o tribunal sujeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito nem limitado ao conhecimento das questões de que cumpra oficiosamente conhecer – vide artigos 5º n.º 3, 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3 do CPC – resulta das formuladas pela apelante ser questão a apreciar se o tribunal a quo errou ao decidir absolver a R. fiadora do pedido.
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III- Fundamentação
Estão considerados confessados os factos alegados na p.i. que aqui se reproduzem (em substituição do tribunal a quo):
1- A A. é dona e legítima proprietária da loja comercial, sita no rés do chão do prédio sito na Rua ..., ... PORTO, inscrito na matriz urbana da Freguesia ..., sob o artigo ...08 e descrito na Conservatória de Registo Predial sob a descrição nº ...74.
2- Por contrato de arrendamento com Prazo Certo e com Fiança para fins não habitacionais, celebrado em 26 de Abril de 2018, a A. cedeu o uso e fruição do indicado estabelecimento à 1.ª Ré, pelo período de cinco anos, com início em 1 de Maio de 2018 e termo em 30 de Abril de 2023, renovável por iguais períodos de 5 anos, caso não fosse denunciado por qualquer das partes, mediante a contraprestação mensal de 375,00€, pagável no primeiro dia útil do mês anterior a que respeitar, na conta bancária da A. indicada [cfr. doc. 1, cláusulas 1ª, 3ª e 4ª].
3- A 1.ª Ré não pagou e tem em dívida as rendas correspondentes aos meses de julho, agosto, setembro, outubro, novembro, dezembro de 2021, janeiro e fevereiro de 2022, vencidas nos meses anteriores e que somadas perfazem a quantia global em dívida de 3.000,00€ (três mil Euros) - 8 meses X 375,00€.
4- A 2.ª Ré como fiadora e principal pagadora, declarou renunciar ao benefício da excussão prévia dos bens do afiançado, assumindo solidariamente com a 1ª R. “a obrigação de fiel cumprimento de todas as cláusulas deste contrato, seus aditamentos e suas renovações até à efetiva restituição do locado livre, devoluto e nas condições estipuladas (…)” – vide cláusula 10.ª do contrato junto como doc. 1.
A estes factos importa ainda acrescentar
5- O locado foi entregue à A. em 26/06/2022 [de acordo com o informado nos autos pela A. em requerimento de 30/06/2022].
6- A 2ª R. foi citada para os autos em 13/05/2022[1].

2) Do erro na aplicação do direito.
Em função do acima enunciado cumpre apreciar de direito, tendo presente que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, não obstante e sem prejuízo do limite imposto pelo artigo 609º quanto ao objeto e quantidade do pedido, não estar o tribunal vinculado às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito [vide artigo 5º nº 3 do CPC].
Tal como resulta do relatório supra, intentou a A. uma típica ação de despejo.
Peticionando pela sua procedência – entre o mais – a condenação solidária das RR. ao pagamento das rendas já vencidas, bem como das vincendas até integral e efetivo pagamento, à razão de €375,00/mês.
Em causa no recurso está apenas a absolvição da 2ª R., demandada na qualidade de fiadora. Absolvição fundada na não notificação desta da situação de mora e das quantias em dívida exigida pelo artigo 1041º nº 5 em respeito pelo exigido pelo número 6 do mesmo artigo do CC, na redação introduzida pela Lei 13/2019 de 12/02.
O locado foi entregue, conforme a A. veio informar aos autos, em 26/06/2022 - considerando então a A. o contrato extinto e requerendo a prossecução dos autos apenas quanto ao pedido de condenação no pagamento das rendas.
Pelo que as rendas vencidas após a instauração da ação a considerar são as vencidas precisamente entre março e junho de 2022 inclusive. A que acrescem as peticionadas à data da instauração da ação até então em dívida – julho de 2021 a fevereiro de 2022.
No recurso alega a recorrente que o tribunal a quo interpretou erradamente o previsto no artigo 1041º nº 5 do CC, porquanto do seu teor o que resulta é que, não sendo o fiador notificado em data anterior à citação para a ação, esta notificação (a que alude o nº 5 do artigo 1041º) considerar-se-á feita com a citação e consequentemente o fiador responde pelo pagamento das rendas vencidas desde os 90 dias anteriores à citação. Tal como acaba requerendo seja decidido ora em sede de recurso. É esta pretensão que cumpre apreciar.
O fiador é responsável acessório pelo pagamento de todas as quantias da responsabilidade do devedor, in casu a aqui 1ª R. relacionadas com o contrato de arrendamento (cfr. artigo 627º nº2 do CC). Assumindo o conteúdo da obrigação principal, incluindo as consequências legais e contratuais da mora ou culpa do devedor (artigo 634º do CC).
Como tal, podendo o credor exercer “perante o fiador os mesmos direitos que tem perante o devedor, quer respeitem à ação de cumprimento, quer à indemnização por incumprimento, mora ou cumprimento defeituoso”[2].
Porque a fiadora renunciou ao benefício da excussão prévia [artigo 640º al. a) do CC] e se assumiu como principal pagadora – vide cláusula 10ª do contrato celebrado entre as partes e ponto 4 dos factos assentes - ficou afastada a caraterística da subsidiariedade que regra geral acompanha a fiança e permite ao fiador obstar à execução do seu património enquanto não forem excutidos os bens do devedor ou o bem sobre que recaia garantia real, caso exista (vide artigos 638º e 639º do CC).
Consequentemente e por via do afastamento do benefício da excussão prévia, responde o fiador perante o credor em termos solidários com o devedor. Sendo a responsabilidade deste a medida da responsabilidade daquele (artigo 640º do CC).[3]
Enquanto fiadora, a 2ª Rª é pessoalmente obrigada perante o credor, com o seu património (artigo 627º nº 1 do CC).
No caso dos autos, estamos perante uma fiança prestada ao abrigo de um contrato de arrendamento pelo que importa levar em consideração as normas específicas previstas para este tipo contratual quanto à notificação do fiador da mora e das quantias em dívida.
Falamos do previsto no artigo 1041º nºs 5 e 6 do CC, na redação dada pela lei 13/2019 de 12/02, o qual assim dispõe em concreto sobre a fiança no contrato de arrendamento:
“5 - Caso exista fiança e o arrendatário não faça cessar a mora nos termos do n.º 2, o senhorio deve, nos 90 dias seguintes, notificar o fiador da mora e das quantias em dívida.
6 - O senhorio apenas pode exigir do fiador a satisfação dos seus direitos de crédito após efetuar a notificação prevista no número anterior.”
Da leitura conjugada dos nºs 5 e 6 do artigo 1041º do CC vindos de citar, infere-se que a sanção prevista pelo legislador para a não notificação do fiador por parte do senhorio em caso de incumprimento do inquilino (que não faz cessar a mora nos termos do nº 2 deste artigo) é a da impossibilidade de exigir o cumprimento da obrigação em falta junto do fiador.
Preceituando o nº 2 deste artigo 1041º: “Cessa o direito à indemnização ou à resolução do contrato, se o locatário fizer cessar a mora no prazo de oito dias a contar do seu começo.”.
A notificação que o senhorio deve fazer ao fiador implica, portanto, a observância do prazo de 90 dias após o decurso dos 8 dias de mora mencionados neste nº 2, para que ao mesmo possa exigir o cumprimento da obrigação do seu inquilino desde o início da mora.

A dúvida que se levanta [e respeita ao objeto deste recurso] e o legislador não o esclareceu é qual a consequência de essa comunicação vir a ser efetuada sim, mas posteriormente aos 90 dias da não cessação da mora (do seu início) nos termos do nº 2 do mesmo artigo.
Tem-se como certo, tal como a recorrente o invoca, que a citação para os presentes autos, atento o pedido formulado, satisfaz o dever de notificação e interpelação ao pagamento exigidos pelos nºs 5 e 6 citados, porquanto não só transmite todos os elementos a tanto necessários, como inclui a própria interpelação ao pagamento.

Edgar Valente, in “Arrendamento Urbano”, comentário às alterações legislativas introduzidas ao regime vigente, edição Almedina de abril de 2019, p. 19, perante o não mencionado esclarecimento, expressa o entendimento de que “a comunicação fora do referido prazo será, de igual forma, válida, atento o desiderato de obter o pagamento de rendas cujo direito apenas prescreve no prazo de 5 anos, conforme resulta da alínea b) do artigo 310º do CC”.
Sem prejuízo de concordarmos com a convocação da norma relativa ao prazo de prescrição de 5 anos aplicável às rendas, afigura-se-nos que recorrer a este prazo de prescrição, sem retirar do não exercício tempestivo da exigida interpelação nenhuma consequência para o senhorio remisso, é ignorar a proteção adicional do fiador que a alteração introduzida visou.
Dizemos adicional porquanto a consagração do prazo de prescrição curto a que respeita o artigo 310º, já tem em vista exigir de um lado que o credor seja diligente e não acumule créditos e de outro evitar encargos “excessivos e desmesurados para o devedor”[4] .
O estabelecimento do prazo ora em análise, acrescenta um outro nível de proteção ao fiador, garantindo, quando respeitado o prazo exigido à sua notificação da mora e quantias em dívida, que à data desta nunca estarão vencidas rendas de período superior a 4 meses [o mês da renda em mora, e – no máximo - as 3 subsequentes rendas que se vencem no período máximo de 90 dias]. Evitando a que só muito tardiamente e quando o valor da dívida é já muito elevado da mesma tome conhecimento. Quando em momento anterior poderia ter providenciado pelo pagamento dos valores em falta.

A notificação por parte do senhorio ao fiador é condição para o poder demandar ao cumprimento da dívida afiançada.
Estando o exercício deste direito sujeito a prazo certo, definido por lei, são-lhe aplicáveis as regras da caducidade, atento o disposto no artigo 298º nº 2 do CC[5].
Daqui não deriva, contudo, que o desrespeito por este prazo implique sem mais e tal como decidiu o tribunal a quo a total improcedência da pretensão da autora.
In casu estão em dívida os valores referentes às rendas que se foram vencendo mensal e sucessivamente, mês a mês, e que a inquilina não foi pagando.
As rendas “no contrato de locação (…) correspondem a prestações periódicas sucessivas, dependentes da duração do contrato”[6], e nessa medida a cada novo incumprimento da obrigação “renasce o direito”[7] à interpelação, em respeito pelos prazos previstos nos nºs 2, 5 e 6 do artigo 1041º.
Nesta perspetiva, assiste razão à recorrente quando defende e peticiona que a recorrida seja condenada solidariamente com a 1ª R. e enquanto fiadora a pagar à A. as rendas vencidas a partir dos 90 dias anteriores à citação para a ação, momento em que simultaneamente deu conhecimento ao fiador da mora e quantias em dívida, bem como o interpelou ao pagamento.
Quanto a este período é respeitado o exigido pelos nºs 5 e 6 do artigo 1041º do CC, nos termos que já assinalámos.
Entende-se oportuno apenas deixar aqui referido que o conhecimento oficioso por parte do tribunal a quo do não respeito pelo prazo definido no artigo 1041º nº 5 do CC, enquanto entendido como um prazo de caducidade, é questionável atento o previsto no artigo 333º nº 2 do CC.
Não obstante, esta foi questão não suscitada pela recorrente que pugnou apenas pela parcial procedência da sua pretensão, no que foi atendida.
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IV. Decisão.
Pelo exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em julgar totalmente procedente o recurso interposto, consequentemente e revogando parcialmente a decisão recorrida, decidindo condenar a 2ª R. CC na qualidade de fiadora e solidariamente com a 1ª R., a pagar à A. as rendas vencidas a partir dos 90 dias anteriores à citação para estes autos e devidas até à renda vencida em junho de 2022, acrescidas dos juros de mora legais desde o vencimento de cada uma das rendas e sobre o seu valor até integral e efetivo pagamento.

Custas do recurso pelas recorridas; e custas da ação na proporção do decaimento e vencimento, observando-se o disposto no artigo 528º do CPC.


Porto, 2023-05-08
Fátima Andrade
Eugénia Cunha
Fernanda Almeida
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[1] Cfr. certidão de citação pessoal junta aos autos em 16/05/2022 e lavrada em 13/05/2022, da qual resulta ter a 2ª R. sido citada na mencionada data no seu domicílio profissional – Av. ..., ..., Lisboa (Hospital ... – domicílio profissional onde declarou pretende receber todas as futuras notificações).
[2] Luís Teles M. Leitão in “Garantia das Obrigações”, edição de 2016, p. 109.
[3] Cfr neste sentido Ac. TRP de 14/12/2022, nº de processo 1647/21.7T8MAI-A.P1, onde e apreciando a posição do fiador perante o credor em situação de renúncia ao benefício de excussão prévia se afirma:
«A obrigação do fiador é acessória da que recai sobre o principal devedor (art. 627º/2 CC) e subsidiaria, o que significa que o fiador só responde pelo pagamento da obrigação se e quando se provar que o património do devedor é insuficiente para saldar a obrigação por este contraída. Esta característica pode ser afastada por vontade das partes, o que acontece se o fiador renunciar ao benefício da excussão ou se tiver assumido a obrigação de principal pagador - art. 640 CC.
Nestas circunstâncias na relação credor-fiador a responsabilidade do fiador, será solidária.
ROMANO MARTINEZ e FUZETA DA PONTE referem a este respeito: “[s]empre que assim aconteça, o fiador, ao lado do devedor, apresenta-se como principal pagador; ou seja, o fiador e o devedor tornam-se responsáveis solidários pelo pagamento da dívida. Deste modo, o credor pode exigir a totalidade da dívida ao fiador ou ao devedor”[…].»
Ac. onde é invocada demais jurisprudência no mesmo sentido, incluindo Ac. STJ de 06/12/2018, nº de processo 4739/16.0T8LOU-A.P1.S1, onde de igual modo se afirma «a renúncia do fiador ao benefício da excussão prévia implica simplesmente a derrogação da regra da subsidiariedade da fiança e, nessa medida, a assunção da qualidade de devedor principal, isto é, de fiador solidário».
[4] Cfr. Ac. TRL de 26/04/2022, nº de processo 2518/19.2T8OER-A.L1-7 in www.dgsi.pt onde foi apreciado o fundamento da prescrição de curto prazo ainda que a propósito de outro tipo contratual.
[5] Cujo teor aqui se deixa reproduzido: “2. Quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição.”
[6] Cfr. Ac. TRL acima citado de 26/04/2022.
[7] Neste sentido cfr. Ana Isabel Afonso in “Sobre as mais recentes alterações legislativas ao regime do arrendamento urbano” publicado in “Estudos de Arrendamento Urbano, vol. I, edição Universidade Católica Editora. Porto de março de 2020, p. 21 e segs. cuja posição aqui seguimos.