Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0654628
Nº Convencional: JTRP00039560
Relator: ABÍLIO COSTA
Descritores: TAXA DE JUSTIÇA
PAGAMENTO
EMBARGOS DE EXECUTADO
Nº do Documento: RP200610090654628
Data do Acordão: 10/09/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: PROVIDO.
Indicações Eventuais: LIVRO 274 - FLS 121.
Área Temática: .
Sumário: I - O requerimento de oposição do executado constitui petição de uma acção declarativa enxertada na execução e não a contestação desta.
II - Assim a embargante deveria ter junto com aquele requerimento o comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça inicial – art. 150º-A, nºs 1 e 2 e 467º, nº3, do Código de Processo Civil.
III - Não tendo tal requerimento sido, desde logo, recusado pela secretaria, dispõe o embargante do prazo de 10 dias para proceder ao omitido pagamento da taxa de justiça.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto

Foi movida, no Tribunal Judicial de Paredes, acção executiva, para pagamento de quantia certa, sendo exequente B………, LDA, e executados C………. e outros.
Por requerimento enviado, por telecópia, em 28-4-06, sendo o respectivo original apresentado em 3-5-06, aquela executada deduziu oposição à execução. Não fez acompanhar, todavia, aquele requerimento do comprovativo do pagamento prévio da taxa de justiça inicial.
Assim, escreveu, na parte final daquele requerimento: “protesta juntar em 10 dias comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial”.
Em 5-5-06 são os autos conclusos ao Sr. Juiz com a seguinte informação: “compulsados os autos verifica-se que a executada não procedeu à autoliquidação da taxa de justiça inicial, sendo que o protestou fazer no prazo de 10 dias”.
É, então, proferida decisão considerando-se não apresentada a oposição à execução, ordenando-se o seu desentranhamento.
Com data de 9-5-06, por telecópia, é junto o comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial - pagamento efectuado em 8-5-06 - sendo o respectivo original enviado em 12-5-06.
Inconformada, a executada interpôs recurso.
Conclui assim, além do mais:
-a oposição à execução consubstancia uma verdadeira contestação à acção executiva e, por isso, não é de aplicar o regime previsto para a petição inicial, mas sim para a contestação;
-não sendo cumprida a prova do pagamento prévio, pode ser sanada com a apresentação do pagamento, no prazo previsto no art.150º-A, nº2, do CPC, o que foi efectuado atempadamente;
-mesmo entendendo-se que se aplica o regime legal das petições iniciais, não tendo a secretaria recusado a petição, não podia o Juiz fazê-lo sem antes dar oportunidade à recorrente para suprir a falta;
-a recusa por parte da secretaria na respectiva aceitação não tem necessariamente o significado de uma rejeição semelhante ao indeferimento liminar do Juiz, porque pode ainda o apresentante suprir a deficiência ou insuficiência detectada;
-sempre assistia à recorrente a faculdade concedida no art.476º do CPC;
-neste caso a oposição não chegou a ser recusada pela secretaria e o Juiz decidiu desde logo pelo desentranhamento, mesmo sem dar ao requerente a possibilidade de juntar o comprovativo do pagamento da taxa, conforme havia protestado juntar na oposição;
-foi violado o disposto no art.28º do CCJ e 150º-A, nº2, do CPC.
Não houve contra-alegações.
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A matéria de facto a apreciar já resulta do relatório.
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Questão a decidir:
-tempestividade do pagamento da taxa de justiça inicial na oposição à execução.
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Importa, antes de mais, percorrer as disposições legais pertinentes.
Assim, nos termos do disposto no art.150º-A, nº1, do CPC, “quando a prática de um acto processual exija, nos termos do Código das Custas Judiciais, o pagamento de taxa de justiça inicial ou subsequente, deve ser junto o documento comprovativo do seu prévio pagamento...”.
Esta, a regra geral, portanto, quer se trate de uma petição inicial ou de uma contestação.
E se tal não acontecer?
Dispõe o nº2 daquele preceito legal que “sem prejuízo das disposições relativas à petição inicial, a falta de junção do documento referido no número anterior não implica a recusa da peça processual, devendo a parte proceder à sua junção nos 10 dias subsequentes à prática do acto processual, sob pena de aplicação das cominações previstas nos artigos 486º-A, 512º-B e 690º-B”.
Importa, assim, distinguir entre a petição inicial e a contestação.
No caso da petição inicial, ou a secretaria recusa, desde logo, o seu recebimento- art.474º, al. f), do CPC- ou é ordenado o seu desentranhamento. Isto, sem prejuízo do disposto no art.476º do CPC.
Tratando-se de uma contestação, a falta de junção do comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial “não implica a recusa da peça processual, devendo a parte proceder à sua junção nos 10 dias subsequentes à prática do acto processual, sob pena de aplicação das cominações previstas nos artigos 486º-A, 512º-B e 690º-B”.
Pode, assim, o respectivo pagamento ainda ser efectuado no prazo de 10 dias.
E se não o for?
Prescreve o art.486º-A, nº3, do CPC que “na falta de junção do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça no prazo de 10 dias a contar da apresentação da contestação, a secretaria notifica o interessado para, em 10 dias, efectuar o pagamento omitido, com a acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 10 UC”. Se, mesmo assim, não for efectuado o pagamento devido, ainda ocorre o convite a que alude o nº5 daquele preceito legal. Persistindo o R. naquela omissão, é ordenado o desentranhamento da contestação- nº6 do mesmo preceito legal.
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Chegados aqui, uma primeira questão se coloca: como qualificar o requerimento de oposição à execução? Configura uma petição inicial ou uma contestação?
É entendimento unânime que a oposição à execução constitui uma verdadeira acção declarativa, “...uma contra-acção, tendente a obstar à produção dos efeitos do título e (ou) da acção executiva que nele se baseia...”- LEBRE DE FREITAS in CPC Anotado, 3º, 323. ANSELMO DE CASTRO, por sua vez, escreve in Acção Executiva Singular, Comum e Especial, 47: “sempre, porém, o título executivo é condição suficiente da execução, na medida em que a oposição admitida e assegurada ao executado se apresenta como algo de extrínseco à acção (e não de interno a ela), tomando o carácter de uma contra-acção apenas para os efeitos da execução, tendente a destruir os efeitos do título e da acção executiva”. E mais à frente, “a oposição à execução não se apresenta, assim, como um elemento intrínseco desta e integrante do título, e não pode ver-se nela, como já se disse, mais do que uma contra-acção através da qual se pode pôr em causa a «execução» a tanto se adstringindo. Aliás, a ser de outro modo, o processo executivo teria logicamente de começar pela prévia prova do direito, tal qual como na velha actio judicati romana”. Neste sentido também CASTRO MENDES in Acção Executiva, 66, LOPES CARDOSO, in Manual da Acção Executiva, 275, ALBERTO DOS REIS in Processo de Execução, II, 64, AMÂNCIO FERREIRA in Curso de Processo de Execução, 155 e RODRIGUES BASTOS in Notas ao CPC, IV, 31.
E é assim que a oposição à execução vem regulada no CPC: como um processo declarativo- art.817º, nº2, do CPC- que corre por apenso- art. 817º, nº1, do CPC- a que não é aplicável o disposto no art.486º, nº2, do CPC- art.813º, nº4, do CPC- a que é aplicável, quanto à falta de contestação, o disposto nos art.s 484º, nº1, e 485º do CPC- art.817º, nº3, do CPC- e cuja dedução, em princípio, não suspende a execução- art.818º, nº1, do CPC.
Em conclusão, o requerimento de oposição do executado constitui petição de uma acção declarativa, e não contestação de uma acção executiva.
Pelo que se lhe aplicam as normas legais acima referidas respeitantes à petição inicial, e não à contestação. Ou seja, a recorrente deveria juntar ao requerimento de oposição o comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça inicial- art.s 150º-A, nºs 1 e 2, e 467º, nº3, ambos do CPC.
Diga-se, no entanto, e apesar do que fica dito, que não repugnava, para efeitos de pagamento de taxa de justiça, equiparar o opoente antes ao R.. As razões que levaram a fixar um regime diferente para o R., nesta matéria, parece valerem igualmente para o opoente à execução.
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A recorrente não procedeu àquela junção.
Alega, no entanto, ter, no requerimento de oposição, protestado apresentar, no prazo de 10 dias, documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça, o que não foi tido em conta.
Não se vê, todavia, a relevância disso. Na verdade, a requerente sabia, ou devia saber, como devia proceder, ou seja, que com aquele requerimento devia juntar o comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial. E que, tendo o mesmo sido enviado por telecópia, tinha 5 dias após a respectiva expedição para remeter ao tribunal aquele comprovativo- art.150º-A, nº3, do CPC. Pelo que o tribunal não se pronunciou, nem tinha que se pronunciar, sobre tal questão.
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Alega ainda a recorrente que, não tendo a secretaria recusado o requerimento de oposição, o juiz não podia fazê-lo sem, antes, lhe ter dado oportunidade para suprir a falta.
Aqui assiste-lhe claramente razão.
Vejámos.
Nos termos do disposto no art.474º, nº1, al. f), do CPC, a secretaria recusa o recebimento da petição inicial quando “não tenha sido junto o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça inicial...”. E, nos termos do disposto no art.476º do CPC, “o autor pode apresentar outra petição ou juntar o documento a que se refere a primeira parte do disposto na alínea f) do art.474º, dentro dos 10 dias subsequentes à recusa do recebimento ou de distribuição da petição, ou à notificação da decisão judicial que a haja confirmado, considerando-se a acção proposta na data em que a primeira petição foi apresentada em juízo”.
Ou seja, o requerimento de oposição à execução apresentado pela recorrente devia ter sido recusado pela secretaria, por não junção do documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça inicial. Mas tal não aconteceu e a aquele requerimento, embora mal, acabou por ser recebido. Podia o tribunal, depois, ordenar o seu desentranhamento, sem mais?
Parece que não.
Na verdade, tendo o requerimento de oposição sido recebido, não pode a recorrente ficar em pior posição do que estaria se aquele tivesse sido recusado.
Assim, se o requerimento de oposição à execução tivesse sido recusado, como devia, a recorrente podia prevalecer-se do prazo de 10 dias previsto no art.476º do CPC. Logo, tendo sido, antes, recebido, parece que, por maioria de razão, deve poder prevalecer-se daquele prazo. Não fazia qualquer sentido que, tendo a secretaria recebido aquele requerimento, a recorrente fosse, ainda por cima, penalizada por isso.
Diremos só mais o seguinte.
Os preceitos legais que acabamos de referir não primam pela clareza. Desde logo, uma coisa é o pagamento, outra, bem diferente, é o comprovativo do mesmo.
Pelo que, e literalmente, parece que o pagamento devia ser sempre prévio, podendo a parte, apenas, juntar o respectivo comprovativo depois. E assim, junto o comprovativo, caso se verificasse que o pagamento tinha sido posterior à recusa de recebimento, a parte já não podia prevalecer-se do disposto no art.476º do CPC.
Parece-nos, todavia, que não foi isto o que o legislador quis. Doutro modo, aquele preceito legal perderia grande parte do seu alcance.
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Acorda-se, em face do exposto, e concedendo provimento ao agravo, em revogar a decisão recorrida considerando-se, antes, como apresentada a oposição à execução.
Sem custas- art.2º, nº1, al. g), do CCJ.

Porto, 9 de Outubro de 2006
Abílio Sá Gonçalves Costa
António Augusto Pinto dos Santos Carvalho
Baltazar Marques Peixoto