Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1817/11.6TBPVZ.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CARLOS GIL
Descritores: PROPRIEDADE HORIZONTAL
PRESUNÇÃO REGISTAL
CÂMARA DE VIGILÂNCIA
DIREITO À IMAGEM
USO DAS FRACÇÕES
FIM DIVERSO
HABITAÇÃO
PARTE COMUM
Nº do Documento: RP201605301817/11.6TBPVZ.P1
Data do Acordão: 05/30/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 626, FLS.187-206)
Área Temática: .
Sumário: I.- A presunção iuris tantum emergente do artigo 7º do Código do Registo Predial, como é jurisprudencialmente referido de modo quase unânime, não abarca a composição e as confrontações da descrição predial, cingindo-se à existência do direito registado e à sua titularidade, bem como à existência de eventuais ónus registados.
II.- A colocação de uma câmara de filmar virada para uma zona comum não é de modo algum equiparável à colocação de um óculo numa porta virada para uma parte comum, dependendo a sua colocação de prévia deliberação válida e eficaz da assembleia de condóminos.
III.- A exigência legal de que cada condómino não dê à sua fração autónoma uso diverso do fim a que é destinada, visa a salvaguarda não só de interesses particulares mas também de interesses públicos de segurança e salubridade, entre outros.
IV.- A aferição da conformidade do uso de uma fração autónoma não se deve apenas fazer com referência à sua globalidade, mas sim em função do uso concreto que é dado a cada uma das partes de cada fração, com destinação específica.
V.- O uso de um espaço para arrumos, sito numa cave, para fins habitacionais, além de contender com as exigências públicas de segurança e salubridade, aumenta também os riscos para os restantes condóminos, nomeadamente no que respeita a segurança do prédio.
VI.- A realização esporádica de operações de manutenção de veículos na zona comum de garagem não constitui um uso desse espaço para fim diverso, sendo antes um fim acessório do uso desse espaço.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 1817/11.6TBPVZ.P1

Sumário do acórdão proferido no processo nº 1817/11.6TBPVZ.P1 elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil:
1. A presunção iuris tantum emergente do artigo 7º do Código do Registo Predial, como é jurisprudencialmente referido de modo quase unânime, não abarca a composição e as confrontações da descrição predial, cingindo-se à existência do direito registado e à sua titularidade, bem como à existência de eventuais ónus registados.
2. A colocação de uma câmara de filmar virada para uma zona comum não é de modo algum equiparável à colocação de um óculo numa porta virada para uma parte comum, dependendo a sua colocação de prévia deliberação válida e eficaz da assembleia de condóminos.
3. A exigência legal de que cada condómino não dê à sua fração autónoma uso diverso do fim a que é destinada, visa a salvaguarda não só de interesses particulares mas também de interesses públicos de segurança e salubridade, entre outros.
4. A aferição da conformidade do uso de uma fração autónoma não se deve apenas fazer com referência à sua globalidade, mas sim em função do uso concreto que é dado a cada uma das partes de cada fração, com destinação específica.
5. O uso de um espaço para arrumos, sito numa cave, para fins habitacionais, além de contender com as exigências públicas de segurança e salubridade, aumenta também os riscos para os restantes condóminos, nomeadamente no que respeita a segurança do prédio.
6. A realização esporádica de operações de manutenção de veículos na zona comum de garagem não constitui um uso desse espaço para fim diverso, sendo antes um fim acessório do uso desse espaço.
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Acordam os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:
1. Relatório
Em 12 de julho de 2011, no Tribunal Judicial da Comarca da Póvoa de Varzim, B… e mulher C… instauraram ação declarativa sob forma sumária contra D… e mulher E…, F… e mulher G…, a Herança Ilíquida e Indivisa aberta por Óbito de H…, representada por I…, J… e marido K…, L… e mulher M… pedindo o seguinte:
a) que seja reconhecido o direito de propriedade dos autores sobre a fração autónoma designada pela letra C, inscrita na matriz sob o artigo 7097-C, constituída pelo 1º andar, lado poente, com uma divisão para arrumos na cave e ainda lugar de garagem na cave, a primeira do lado poente-sul, com registo de aquisição a seu favor mediante a Ap. 20, de 06 de junho de 2006;
b) que seja reconhecido que o lugar de garagem pertencente à fração C, é o primeiro ou único, do lado poente-sul do prédio, situando-se imediatamente a seguir à porta de entrada do lado direito da garagem;
c) que sejam os réus condenados a absterem-se de estacionar veículos no referido local, de modo a deixá-lo livre para os autores estacionarem a sua viatura;
d) que sejam condenados os primeiros réus a fecharem de modo definitivo a porta de entrada para a sua cave que têm virada para a zona nascente-sul da garagem, fixando-se quanto a esta prestação um prazo de dois meses ou outro que se repute suficiente e ainda a condenação destes réus a retirarem a câmara de vigilância que colocaram naquele local, no prazo de dez dias;
e) que sejam condenados os primeiros réus a não darem outro uso à cave integrante da sua fração que não seja o de arrumos;
f) que seja condenado o primeiro réu a abster-se da utilização do pátio frontal à entrada das garagens e das garagens para a atividade de reparação, pintura e restauro de automóveis;
g) que sejam condenados os réus a manterem livre e desobstruído o pátio frontal às entradas da garagem;
h) que sejam condenados os primeiros réus a demolirem a parede que construíram na metade anterior ou poente da sua divisão na cave, na zona imediatamente a seguir à porta direita de entrada da garagem, entre esta e a parede poente da caixa de escadas que vem do interior da sua fração, fixando-se quanto a esta prestação um prazo de dois meses ou outro que se repute suficiente;
i) que sejam condenados os primeiros réus a deslocar para sul, ou seja, para o interior dos seus arrumos a caixa ou coletor de águas residuais que colocaram, à direita, no interior da zona da garagem, fixando-se quanto a esta prestação um prazo de três meses ou outro que se repute suficiente;
j) que sejam condenados os primeiros réus a repararem a fuga da sua canalização para a garagem, fixando-se quanto a esta prestação um prazo de dois meses ou outro que se repute suficiente.
Em síntese, os autores alegam que juntamente com os réus são os únicos proprietários das frações autónomas do edifício constituído em propriedade horizontal, composto de edifício com três pavimentos, jardim e logradouro, com seis frações autónomas destinadas a habitação, sito na Avenida …., nº 701, freguesia e concelho da …, descrito na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim sob o nº 4491/20070424 e inscrito na matriz sob o artigo 7097, sendo os autores donos da fração autónoma designada pela letra “C”, inscrita na matriz sob o artigo 7097-C, constituída pelo primeiro andar lado poente, com uma divisão para arrumos na cave e ainda lugar de garagem na cave, a primeira do lado poente-sul, com inscrição de aquisição a seu favor titulada pela apresentação nº 20, de 06 de junho de 2007.
Por seu turno, os réus D… e mulher são os proprietários da fração autónoma designada pela letra “B”, inscrita na matriz sob o artigo 7097-B, constituída pelo rés do chão nascente com divisão para arrumos na cave e ainda lugar de garagem na cave, a primeira do lado nascente-sul, com registo de aquisição a seu favor titulada pela apresentação nº 15, de 24 de julho de 1979, tendo sido estes réus os construtores do imóvel, quem o constituiu em propriedade horizontal e procedeu à venda das restantes frações aos demais réus ou antecessores.
Os réus F… e mulher são os proprietários da fração autónoma designada pela letra “D”, constituída pelo primeiro andar do lado nascente, para habitação, com uma divisão para arrumos na cave e garagem, a segunda nascente-sul, com registo de aquisição a seu favor titulado pela apresentação nº 34, de 18 de junho de 2003.
A fração autónoma designada pela letra “F”, constituída pelo segundo andar do lado nascente, para habitação, sótão amplo e garagem na cave, a terceira do lado nascente-sul, tem registo de aquisição em comum e sem determinação de parte ou direito, a favor de I…, J… e N…, por óbito de H…, titulada pela apresentação nº 24, de 03 de agosto de 1998.
Os réus L… e mulher são os proprietários da fração autónoma designada pela letra “E”, constituída pelo segundo andar do lado poente para habitação e sótão, com registo de aquisição a seu favor pela apresentação nº 17, de 24 de julho de 1995, assim como da fração autónoma designada pela letra “A”, constituída pelo rés do chão do lado poente, para habitação, com uma divisão para arrumos na cave e com registo de aquisição a seu favor pela apresentação nº 3, de 02 de outubro de 1984.
Da fração dos réus D… e mulher faz parte uma cave contígua à parte destinada a garagem, pelo lado sul desta, destinada a arrumos, dividida numa parte a nascente, com acesso pelo interior da fração B, com o comprimento de cerca de 9,20 metros, no sentido nascente-poente, a contar da parede ou alçado nascente do prédio até à parede divisória e noutra parte, a poente desta parede divisória, com o comprimento de cerca de 7,40 metros, até à parede ou alçado poente do prédio.
Todas as frações, com exceção da fração dos réus L… e mulher, têm lugar de estacionamento ou garagem na cave.
Os réus D… e mulher, contra o previsto no projeto, abriram um vão que fecharam com uma porta na parte nascente da sua cave para a garagem, de modo a acederem a esta pelo interior da sua fração, obras que impedem o estacionamento de viatura naquele espaço, obrigando ao estacionamento a nascente da referida porta.
Por cima da porta antes referida, D… colocou uma câmara, através da qual lhe é permitido gravar os movimentos da garagem.
Os réus D… e mulher vêm utilizando a parte nascente da sua cave, destinada a arrumos, para habitação, nela tendo instada uma sala de estar, bar e televisão.
Os réus D… e mulher, contra o previsto no projeto, fecharam com parede a metade anterior ou poente da sua divisão na cave, na zona imediatamente a seguir à porta direita da entrada da garagem, entre esta e a parede poente da caixa das escadas que vem do interior da sua fração, e colocaram um coletor, no interior da zona da garagem, o qual, de acordo com o projeto, devia estar colocado a sul da porta de entrada na garagem, no interior da zona da cave ou de arrumos da fração daqueles réus, a sul da zona da garagem. O coletor retira espaço à garagem, dificultando o estacionamento de viatura no lugar sul poente.
A garagem do prédio tem duas portas de levantar, uma do lado esquerdo e outra do lado direito, servindo a do lado direito, normalmente, para o acesso ao lugar de estacionamento situado na zona poente da garagem e a do lado esquerdo para acesso aos outros três lugares de estacionamento.
Na zona imediatamente a poente das portas de acesso existe uma zona comum, coberta, pela parte poente do edifício, fazendo um pátio destinado à circulação de viaturas e entrada para a zona poente da cave da fração B. O réu D… exerce a atividade de reparação ou restauro e comercialização de viaturas automóveis, utilizando para os trabalhos de restauro, batechapas e pintura, quer a parte poente da sua cave, quer o referido pátio coberto frontal à garagem junto à porta direita da garagem, que osbtrui, aí colocando uma viatura, várias vezes durante a semana e nela fazendo trabalhos e reparação.
Desde maio de 2011, existe uma fuga na canalização da fração B, rés do chão nascente, para o interior da garagem, caindo em consequência dessa fuga água na garagem e, concomitantemente, no veículo que estacione no lado direito ou sul da garagem.
O único lugar de estacionamento possível na zona poente é o lugar imediatamente a seguir à porta da entrada da garagem do lado direito e onde D… e mulher vêm estacionando a sua viatura, apesar de o lugar de garagem da sua fração ser a segunda garagem do lado nascente sul e de aquele lugar se integrar na fração dos autores.
Efetuadas as citações, D… e E… contestaram impugnando que os autores tenham um lugar de garagem como alegam, pois que o lugar de estacionamento que adquiriram é o que fica no lado nascente sul, lugar que desde há vinte e oito anos vêm usando, sendo o lugar do lado poente sul da titularidade do proprietários da fração autónoma “D”, enfermando a escritura de constituição de propriedade horizontal de erro na atribuição dos lugares de estacionamento; mais alegam que os autores intervieram em escritura para alteração do título constitutivo da propriedade horizontal tendente a retirar da fração “F” o lugar de estacionamento, não tendo então suscitado qualquer reparo quanto ao lugar de estacionamento que lhes cabe, sendo abusiva a sua pretensão de se prevalecerem duma referência no título constitutivo da propriedade horizontal que nunca respeitaram ao longo dos anos; alegam ainda que a cave está em perfeita conformidade com o processo administrativo de licenciamento camarário, aí se prevendo uma abertura e uma porta, tal como está construído, não impedindo a porta o estacionamento no primeiro lugar de nascente sul; não foi colocada qualquer câmara de vigilância, mas apenas um alarme, sendo falso que os contestantes utilizem o espaço na cave para fins habitacionais; a parede que os autores pretendem seja demolida pelos contestantes, além de prevista no projecto, constitui uma parede mestra, pelo que a sua eliminação colocaria em causa a segurança do edifício; os coletores e as caixas de visita sempre existiram no local onde se encontram, desde a construção do prédio; o contestante reconheceu fazer trabalhos de reparação em carros antigos nos seus arrumos, estando a fuga de canalização referida pelos autores há muito reparada.
Além de contestarem, D… e E… deduziram reconvenção pedindo que os autores sejam condenados a reconhecer que o seu lugar de estacionamento é o primeiro do lado nascente sul, por ter sido este que lhes foi vendido pelos reconvintes e o que eles quiseram comprar e sempre utilizaram, ao longo de mais de vinte e oito anos.
L… e mulher M… contestaram alegando que o lugar de estacionamento que os autores quiseram adquirir e adquiriram foi o localizado no lado nascente sul da cave, sempre tendo utilizado esse lugar de estacionamento desde há mais de vinte e oito anos, sendo os contestantes quem por si ou por outrem usam o lugar de estacionamento do lado poente sul na cave, tal como vinha sendo utilizado pelos transmitentes da fração aos contestantes.
Além de contestarem, L… e mulher M… deduziram reconvenção contra os autores pedindo que seja retificada a escritura de constituição da propriedade horizontal, atribuindo-se o lugar de estacionamento localizado a nascente sul à fração dos autores e o lugar de estacionamento a poente sul à fração que pertence aos reconvintes L… e M….
Ordenou-se o registo da ação.
Seguidamente ordenou-se a avaliação da fração autónoma “C” e do lugar de estacionamento sito em primeiro lugar do lado nascente sul.
Realizada a avaliação, proferiu-se despacho fixando o valor da causa no montante de € 143.000,00 e determinou-se que os autos seguissem sob a forma ordinária.
Realizou-se audiência preliminar em duas sessões, frustrando-se na primeira sessão a tentativa de conciliação, proferindo-se despacho saneador tabelar, admitindo-se as reconvenções deduzidas pelos réus contestantes e procedendo-se à condensação da factualidade considerada relevante para a boa decisão da causa, discriminando-se os factos assentes dos controvertidos, estes últimos a integrar a base instrutória, tendo na segunda sessão as partes oferecido os seus meios de prova.
Foram dadas sem efeito duas sessões da audiência de discussão e julgamento motivadas por diligências das partes para transacção.
Após audição das partes, invocando-se o uso dos poderes de gestão processual, em 11 de dezembro de 2014, proferiu-se decisão a julgar procedente o primeiro pedido formulado na ação e improcedente o pedido deduzido na alínea h) do petitório final e eliminaram-se os artigos 2, 10, 12, 13, 21, 23, 25, 26, 36, 37, 38, 39 e 40, todos da base instrutória, procedendo-se ao aditamento de matéria à factualidade assente e formulando-se três novos artigos na base instrutória.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento em quatro sessões, após o que, em 16 de novembro de 2015, foi proferida sentença[1] com o dispositivo que seguidamente se reproduz, na parte pertinente:
I. Pelo exposto decide-se julgar a presente acção totalmente improcedente, para além do já decidido nos autos em 11 de Dezembro de 2014 e, em consequência, absolver os réus dos demais pedidos.
II. Mais se decide julgar a reconvenção deduzida por D… e mulher, E… e, em consequência, condenar os autores reconvindos a reconhecer que o seu lugar de estacionamento é o primeiro do lado nascente sul, por ter sido este que lhe quiseram vender os réus reconvintes e estes quiseram comprar e sempre possuíram e utilizaram ao longo de mais de vinte e oito anos.
III. Decide-se ainda julgar a reconvenção deduzida por L… e mulher, M…, totalmente improcedente e, em consequência, absolver os autores reconvindos do pedido.
L… e mulher M… requereram a retificação da sentença, pretensão que foi indeferida.
Em 04 de janeiro de 2016, inconformados com a sentença, B… e mulher C… interpuseram recurso de apelação, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões:
I - Na escritura de propriedade horizontal de 26/7/1983, referida na alínea h) foi afecta à fracção dos autores (fracção C) o primeiro lugar de garagem do lado Poente - Sul, à fracção B) dos RR D… o primeiro lugar de garagem no lado Nascente Sul, à fracção D), do réu F…, a segunda garagem do lado Poente Sul, à fracção F) dos réus I… e filhos a terceira garagem do lado nascente Sul.
II- A simples indicação verbal, em contrário com o titulo de propriedade horizontal, de acordo com a conveniência do réu D…, no momento da entrega do apartamento, ou mesmo posteriormente a este, não tem a faculdade de alterar o titulo constitutivo da propriedade horizontal, nem de alterar o conteúdo de cada uma das escrituras relativamente ao lugar de garagem, que necessariamente define o que consta da propriedade horizontal para a qual remete.
III- Ao contrario do que por erro na apreciação da prova se refere na sentença em parte alguma a autora, cujo depoimento se considerou ser o grande golpe na tese dos autores, reproduz a versão dos réus segundo a qual os lugares de estacionamento na garagem do condomínio foram indicados a cada condómino nas negociações de venda pelo réu D….
IV- Do depoimento da autora C… 16/04/2015 (12:06:01 até 12:32:23) que se transcreveu nestas alegações, conclui-se apenas que o réu D…, 6 meses após a realização da escritura de venda, indicou aos autores como afecto à sua fracção o terceiro lugar de garagem ao fundo da esquerda para a direita, ou seja o primeiro do lado nascente - Sul, dizendo que os restantes já estavam ocupados e os autores acreditaram que aquele seria o lugar afecto à sua fracção, só tendo descoberto em 2011 que afinal o lugar de garagem afecto à sua fracção é o da alinea b) da petição.
V- Foi incorrectamente julgada a matéria de facto referida em Z) e cc) e resposta aos quesitos 28, 32, 33, 34 , 35 e 43 .
VI - A resposta correcta, seria que o primeiro lugar de garagem do lado nascente – Sul foi indicado pelo réu D… aos autores , no Verão de 1984 depois de feita a escritura de venda e ocupados os outros lugares de garagem e que os autores até 2011 não reclamaram o primeiro lugar Poente - Sul, porque tinham sido induzidos em erro pelo réu D…, tendo descoberto em 2011 que o lugar de garagem que lhes estava destinado era afinal o primeiro Poente - Sul.
VII - Quanto à matéria de facto referida em dd) apenas se deveria dar como provado que o réu D… poderá ter indicado contra o que constava da propriedade horizontal o primeiro lugar Poente - Sul a O… e o primeiro lugar Nascente - Sul aos autores, tendo os autores acreditado na correcção dessa indicação.
VII - Também errada está a resposta à matéria de facto referida em gg) e a resposta ao quesito 46 - nada permite concluir que na data da escritura referida em k) os vendedores indicaram os lugares aí referidos
e que os referidos lugares foram os que os primeiros réus enquanto vendedores aos aí compradores que prometeram comprar.
VIII - Do cotejo dos documentos nomeadamente da escritura referida em k) que foi naturalmente lida aos compradores resulta que os vendedores indicaram nessa altura aos aí compradores que o lugar pertencente à fracção C era o primeiro do lado Poente Sul, o da fracção D era o segundo do lado Nascente Sul e o da fracção F era o terceiro do lado nascente Sul.
IX - Ao ir de contrário a isto violou a decisão recorrida o disposto no artigo 238º n.º 1 e 394º do C. Civil.
X- Assim a resposta ao quesito 46º deveria ser a que se deixou expressa na conclusão
VIII, ou então não indicaram qualquer lugar, sendo que quanto aos contratos promessa, nada se pode referir pois não estão juntos quaisquer contratos promessa,
XI - poderia acrescentar-se que, depois da escritura referida em k) o réu D… indicou aos autores que o lugar pertencente à sua fracção era o primeiro à direita ao fundo da garagem, que corresponde ao primeiro Nascente Sul e também em altura que não se pode precisar terá indicado aos compradores da fracção D o primeiro Poente Sul e aos da fracção F o 2º do lado Nascente Sul.
XII - Deve assim e em consequência desta revisão da matéria de facto que se impõe pelas razões e fundamentos supra referidos ser anulada a decisão recorrida quanto à improcedência do primeiro pedido dos autores da alínea b) e c) reconvenção dos réus D… e mulher.
XIII - Os autores como condóminos têm direito a exigir o cumprimento do projecto de construção sendo que os réus D… e mulher não são demandados na mera qualidade de condóminos mas também de construtores do imóvel e portanto de sujeitos da obrigação de cumprimento do projecto.
XIV- Não havendo no projecto de construção porta do arrumo integrante da fracção para a garagem comum, nenhum direito assiste aos réus D… e mulher para manterem a referida abertura de um arrumo a que passaram até a dar destino de habitação, para a garagem, tanto mais que foram os mesmos réus os autores do projecto, assistindo aos réus enquanto condóminos direito a impedirem que os mesmos réus mantenham essa situação de divergência com o projecto e propriedade horizontal.
XV - A filmagem e gravação das zonas comuns afectas aos condóminos ou a determinados condóminos, por um condómino para o interior da sua fracção, que não no âmbito de administração de condomínio e do cumprimento de medidas de segurança geral do edifício por entidade externa, viola as regras mais básicas do direito à privacidade e extravasa notoriamente o exercício legitimo do direito de compropriedade e do uso da parte comum para o fim a que se destina.
XVI - A comparação que se faz da referida câmara de filmar com a colocação dos óculos nas portas dirigidos a zonas comuns, não tem razão de ser, a gravação de imagens e captura de fotografias de pessoas, mesmo em locais públicos, não é livre e pode constituir até crime nos termos do artigo 199º do Código Penal, já a simples observação de outras pessoas, em zonas publicas ou de livre acesso por parte do observador, não merece qualquer restrição, esquecendo a recomendada pelas regras de boa educação.
XVII - Destinando-se determinada parte integrante de uma fracção autónoma a um determinado uso, ainda que acessório do da fracção autónoma, viola o disposto no artigo 1422º do C. Civil a utilização para fim diverso do previsto para essa parte integrante, ainda que o uso dado coincida com o fim a que se destina outra parte da mesma fracção.
XVIII - Pelo mesmo critério da sentença recorrida, quanto à alínea e) do pedido, poderá qualquer dos condóminos instalar uma cozinha, uma sala, ou um quarto, no lugar ou espaço de garagem que cabe à sua fracção.
XIX- A prática ainda que a titulo de passatempo de actividade de reparação e pintura de automóveis antigos em espaço comum, nomeadamente destinado a caminhou ou acesso à garagem constitui utilização de espaço comum para fim diverso daquele a que se destina, proibida pelo n.º 1 do artigo 1406º do C. Civil.
XX- Violou a decisão recorrida entre outros o disposto nos artigos 238º n.º 1 , 394º, 1406º n.º 1 e 1422º todos do C. Civil.
XXI - Deve ser dado provimento ao recurso, alterando-se a resposta à matéria de facto nos termos propostos , revogando-se a decisão recorrida e substituindo-se a mesma por outra que julgue procedentes os pedidos das alíneas b), c), d), e), f), g), e i) e consequentemente improcedente a reconvenção dos réus D… e mulher.
Em 04 de janeiro de 2016, inconformados com a sentença, L… e mulher M… interpuseram recurso de apelação terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões:
1.º
A decisão de que se recorre, relativamente à reconvenção deduzida pelos recorrentes, que julgou esta reconvenção totalmente improcedente, por não provada, deverá ser revogada, devendo a reconvenção ser julgada totalmente procedente, pois
2.º
Os recorrentes defenderam que o lugar de garagem correspondente à sua fração era o poente-sul, e não o nascente –sul que os AA. defendiam,
3.º
O Mº Juiz entendeu exatamente assim, portanto, o lugar de garagem poente-sul pertence à fração dos recorrentes e o nascente-sul é que pertence à fração dos AA.,
4.º
Havendo, porconseguinte, evidente e ostensivo erro na escritura de constituição da propriedade horizontal. Mas depois,
5.º
E apesar de reconhecer a existência deste erro, julga totalmente improcedente a reconvenção dos recorrentes, por, escreve, “tal erro não logrou prova”.
6.º
Há assim, uma contradição insanável nesta douta decisão, pois, por um lado reconhece a existência do erro, e por outro lado, e para julgar totalmente improcedente a reconvenção, diz que “tal erro não logrou prova”.
7.º
Convirá, ainda, atentar no depoimento do R. D…, depoimento este apreciado pelo próprio Mº Juiz, em que este R. explica que entregou um apontamento no Notário onde a escritura foi celebrada, em que identificava as garagens por letras, mas o Notário entendeu utilizar outro tipo de identificação, e mudou a identificação das garagens, de letras para pontos cardeais, assim ocorrendo o lapso na escritura respetiva, escritura esta em que o R. D… não esteve pessoalmente presente, sendo representado por sua mulher, que não se apercebeu do erro cometido.
8.º
Tendo em consideração este depoimento, e o erro efetivamente ocorrido, reconhecido pela própria sentença, também a resposta ao quesito 42º não poderá ser não provado, antes devendo considerar-se como provado, pois não só é bem clara a explicação do erro ocorrido dada pelo R. D…, como esse erro até foi expressamente reconhecido na própria sentença. Ora,
9.º
Reconhecido o erro, e sendo este evidente e ostensivo, importaria, consequentemente, decidir a retificação da escritura de constituição de propriedade horizontal, tal como peticionado, pois na ação intervinham todos os proprietários da totalidade das frações que compõem o prédio, e sem tal retificação nenhum ato (compra e venda, doação ou outro), poderá ser celebrado corretamente, pois a escritura só pode ser celebrada de acordo com o que do registo consta, havendo, portanto, necessariamente, que se proceder a tal retificação.
10.º
A propósito da retificação do título de constituição da propriedade horizontal, o Mº Juiz na decisão que profere, socorre-se do artº 249º do Código Civil para fundamentar a sua decisão, escrevendo que “É pacífico na doutrina que o erro que fundamenta o direito à retificação da declaração atribuída neste artigo pressupõe um erro ostensivo (sublinhado não), que se revela no contexto da declaração ou nas circunstâncias em que é feito”.
11.º
Cremos não haver a menor dúvida de que o erro em causa, que o próprio Mº Juiz reconhece, é claramente ostensivo, e não descortinamos a razão pela qual decidiu que não se logrou provar tal erro, que, como se disse, ele próprio, Mº Juiz, reconhece. Só um evidente lapso justificará esta decisão. Em suma:
12.º
Deve revogar-se a decisão recorrida no que concerne ao pedido reconvencional deduzido pelos recorrentes, decisão esta que viola, além do mais, o próprio artº 294º do Código Civil invocado na decisão recorrida, além dos demais preceitos legais infringidos, dando-se provimento ao presente recurso, deste modo se fazendo a devida JUSTIÇA.
D… e mulher E… e L… e mulher M… contra-alegaram pugnando pela total improcedência do recurso de apelação interposto pelos autores.
Colhidos os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir.
2. Questões a decidir tendo em conta o objeto do recurso delimitado pelos recorrentes nas conclusões das suas alegações (artigos 635º, nºs 3 e 4 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil, na redação aplicável a estes autos), por ordem lógica e sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil
2.1 Da apelação interposta por B… e mulher C…:
2.1.1 Da reapreciação da matéria vertida nas alíneas z), cc), dd) e gg), dos fundamentos de facto da sentença recorrida;
2.1.2 Da revogação da sentença recorrida na parte em que decretou a improcedência dos pedidos deduzidos nas alíneas b), c), d), e), f), g) e i), do petitório final.
2.2 Da apelação interposta por L… e mulher M…:
2.2.1 Da reapreciação da resposta ao artigo 42º da base instrutória;
2.2.2 Da revogação da sentença na parte em que julgou improcedente a reconvenção deduzida por L… e mulher M….
3. Fundamentos
3.1 Da reapreciação das respostas positivas à matéria vertida nas alíneas z), cc), dd) e gg), dos factos provados na sentença recorrida e da resposta negativa ao artigo 42º da base instrutória
Os recorrentes B… e mulher C… impugnam as respostas positivas à matéria vertida nas alíneas z), cc), dd) e gg), dos factos provados na sentença recorrida, enquanto os recorrentes L… e mulher M… impugnam a resposta negativa ao artigo 42º da base instrutória.
Na perspetiva dos recorrentes B… e esposa, a resposta à matéria vertida nas alíneas z) e cc) da factualidade provada nos fundamentos de facto da sentença recorrida deve passar a ser a seguinte:
- O primeiro lugar de garagem do lado nascente-sul foi indicado pelo rei D… aos autores, no Verão de 1984, depois de feita a escritura de venda e ocupados os outros lugares de garagem e os autores não reclamaram o primeiro lugar poente-sul, porque tinham sido induzidos em erro pelo réu D…, tendo descoberto em 2011 que o lugar de garagem que lhes estava destinado era afinal o primeiro poente-sul.
Relativamente à alínea dd) dos fundamentos de facto da sentença recorrida, apenas se poderá dar como provado o seguinte:
- O réu D… poderá ter indicado contra o que constava da propriedade horizontal o primeiro lugar poente-sul a O… e o primeiro lugar nascente-sul aos autores, tendo os autores acreditado na correção dessa indicação.
No que respeita à alínea gg) dos fundamentos de facto da sentença recorrida, os recorrentes C… e mulher pretendem que se dê como provado que os vendedores indicaram aos recorrentes que o lugar pertencente à fração C era o primeiro do lado poente sul, o da fração D era o segundo do lado nascente sul e o da fração F era o terceiro do lado nascente sul ou então que não indicaram qualquer lugar e que depois da escritura referida em k), o réu D… indicou aos autores que o lugar pertencente à sua fração era o primeiro à direita ao fundo da garagem, que corresponde ao primeiro nascente sul, que em altura que não se pode precisar terá indicado aos compradores da fração D o primeiro poente sul e aos da fração F o segundo do lado nascente sul.
Pela sua parte, os recorrentes L… e esposa pretendem que seja dada resposta positiva ao artigo 42º da base instrutória.
Para sustentar a sua pretensão recursória, os recorrentes B… e esposa invocam o depoimento de parte desta, no qual, ao invés do afirmado pelo Sr. Juiz a quo, não corrobora a versão dos factos dos réus, antes referindo que a indicação do lugar de estacionamento foi posterior à venda e foi justificada com a alegação de que todos os outros lugares estavam ocupados, invocando ainda em abono das suas pretensões recursórias em matéria de facto o que resulta da prova documental a que respeita a alínea n) dos factos assentes (alínea k) dos fundamentos de facto da sentença recorrida).
Por seu turno, para sustentar a sua pretensão recursória em matéria de facto, os recorrentes L… e esposa invocam os depoimentos de parte do réu D… e da autora C….
Os pontos de facto impugnados pelos recorrentes são os seguintes:
- “Desde a construção do edifício, em 1983, o primeiro lugar de estacionamento do lado nascente sul tem sido única e exclusivamente utilizado pelos autores, ininterruptamente, à vista de todos os condóminos, sem oposição de quem quer que seja, de forma pacífica, continuada, pública, na intenção e convicção de que os identificados lugares de estacionamento lhes pertencem” (alínea z) dos factos provados na sentença recorrida em resposta aos artigos 28, 32, 33, 34 e 43 da base instrutória);
- “Os autores bem sabem que sempre usaram o primeiro lugar de estacionamento do lado nascente sul, nunca tendo reclamado por esse não ser o seu lugar” (alínea cc) dos factos provados na sentença recorrida em resposta ao artigo 35 da base instrutória);
- “Os primeiros réus D… e mulher, enquanto vendedores das fracções, indicaram aos compradores os lugares de estacionamento que diziam respeito a cada uma das frações, o primeiro lugar de estacionamento localizado no lado nascente-sul, no que respeita aos autores, e a poente-sul no que respeita O…, o que foi aceite pelos mesmos” (alínea dd) dos factos provados na sentença recorrida em resposta ao artigo 41 da base instrutória);
- “À data da escritura referida em k) os aí vendedores indicaram aos aí compradores que o lugar de estacionamento pertencente à fração “C” era o 1.º do lado nascente sul, o da fração “D” o 1.º do lado poente sul, e da fração “F” o 2.º do lado nascente sul, tendo sido estes os lugares que os vendedores pretenderam vender e os compradores pretenderam comprar” (alínea gg) dos factos provados na sentença recorrida em resposta ao quesito 46 da base instrutória);
- “Indagaram o vendedor das frações os Réus L… e M… sobre o lapso existente na escritura de constituição da propriedade horizontal do prédio em causa, e este esclareceu-os que quando foi outorgar a escritura, foi representado pela mulher, tinha um apontamento/planta com os lugares de estacionamento, cada um com uma letra, e o notário, na hora em que estava a ser redigida a escritura, entendeu melhor identificar cada um dos lugares de estacionamento através dos pontos cardeais, e, na altura, a mulher não reparou no erro na identificação de cada um dos lugares de garagem (resposta negativa ao artigo 42º da base instrutória).
Procedeu-se à audição da prova pessoal produzida na audiência final e ao exame da prova documental junta de folhas 15 a 16[2], 17[3], 18 e 19[4], 20[5], 21[6], 22 e 23[7], 24[8], 25[9], 26[10], 27 e 28[11], 101 a 106[12], 107 a 112[13], 113 a 117[14], 118 e 119[15], 120[16], 140 a 143[17], 144 e 145[18], 146 e 147[19], 266 a 271[20], 274 a 276[21], 277 a 279[22], 326 a 328[23], 425[24] e 488 a 489[25].
O tribunal a quo motivou a sua convicção probatória, na parte referente à matéria impugnada pelos recorrentes, nos termos que seguem:
Considerações Gerais
Passaremos a uma análise dos meios de prova que o tribunal reputou mais relevantes no presente julgamento.
Cumpre antes de mais salientar que foi notório durante o julgamento que o verdadeiro litígio em presença referiu-se à disputa sobre lugares de garagem. O restante elenco do petitório passou quase despercebido na discussão, pelo que a análise dos meios de prova centrais passa muito pelas questões factuais respeitantes àquela parte do litígio.
Destaque muito saliente para a inspecção ao local, da qual resultou directa a resposta a vários quesitos, e da qual foram recolhidos dados importantes no acompanhamento e credibilização de alguns depoimentos.
Os depoimentos de parte raramente configuram meios de prova decisivos em favor dos próprios depoentes, mas não deixou de ser impressivo o tom fluído, fiel à razão de ciência e com precisões espontâneas que os réus J… e D…, por contraste com o depoimento de F…, que procurou sustentar a tese dos autores.
Este último depoimento foi desastroso em termos de credibilidade. Afirmou que vinha utilizando o lugar de garagem poente sul, reivindicado pelos autores, por ter autorização para tanto do autor, que reconhece como seu dono. No entanto, confrontado com o teor da transacção junta aos autos em 7/01/2015, admitiu que nessa ocasião reconheceu o réu L… como proprietário deste mesmo lugar de garagem. Indagado como é que compatibilizava este reconhecimento com a consideração do autor como dono do mesmo lugar agarrou-se a argumentos registrais.
Acrescentou que o autor não usava o lugar de estacionamento em questão por que tinha dificuldade em aceder à garagem. Mas se era assim, porquê a presente acção a reivindicar um lugar que afinal não usa, e em que o autor afirma actos de posse sobre o lugar em causa? Esta parte do depoimento de F… foi arrasada pela autora mulher, que afirmou que o lugar utilizado pelo seu marido sempre foi o sul nascente, e que sempre se queixaram da dificuldade de estacionar nesse lugar, quando a utilização de todos os outros lugares era mais fácil. Este depoimento foi tão falho de credibilidade que acabou por pôr seriamente em causa a tese do autor, que vinha defender.
Mas o grande golpe na tese dos autores foi o depoimento de parte da autora. Em termos de posse sobre os lugares de garagem desde 1984 praticamente reproduziu a versão dos réus, segundo a qual os lugares de estacionamento na garagem do condomínio foram indicados a cada condómino nas negociações da venda pelo réu D…, que promoveu a construção do edifício e venda das fracções, e foram desde aí possuídos de forma não coincidente com a atribuição resultante das descrições registrais das fracções. Os autores sempre viveram descontentes com o seu lugar, que implicava maiores dificuldades de estacionamento, até que recentemente descobriram as descrições registrais litigadas, e vieram reivindicar o lugar correspondente a tais descrições.
Se dúvidas existissem ainda, P… e Q…, que já habitaram o prédio, confirmaram a utilização dos lugares de garagem discutida, e forneceram ainda indicações sobre a configuração do local desde a construção do edifício. Foram dois excelentes depoimentos, descomprometidos e fiéis à sua razão de ciência.
Os restantes depoimentos não assumiram particular relevância no quadro já supra traçado que justifiquem uma análise concreta e detalhada.
[…]
Factualidade respeitante ao erro na escritura de compra e venda constituição da propriedade horizontal, a que se referem os quesitos 42) e 46)
Quanto ao quesito 42), embora o tribunal pudesse aceitar a existência de um lapso na escritura de constituição da propriedade horizontal, nomeadamente considerando a utilização subsequente dos lugares de garagem, o tipo de lapso ocorrido e a sua concreta causa foi apenas referido pelo réu D…, o que, por si só, e não obstante as marcas de fiabilidade do depoimento, foi insuficiente para formar uma convicção positiva.
Ouvida toda a prova pessoal produzida na audiência final e analisada criticamente toda a prova documental antes identificada, bem como o auto de inspeção e as fotografias que o instruem, nas suas linhas gerais, a nossa convicção probatória não difere significativamente da do tribunal recorrido.
No entanto, como ressalta da própria motivação do tribunal a quo, a autora[26] apenas reconheceu a indicação do lugar de estacionamento sito a nascente sul, em 1984, já após a celebração da escritura de compra e venda, tendo os autores ficado surpreendidos com as características da garagem e reclamado das mesmas, já que antes tinham visto o espaço destinado às garagens todo amplo.
Também o réu D…, no depoimento de parte que prestou, reconheceu que o autor foi o último dos primitivos condóminos do prédio a tomar contacto com o mesmo e que nessa altura apenas podia escolher uma de duas garagens e que o lugar que coube ao autor é o pior, referindo ainda que o condómino O… escolheu logo a sua garagem em planta. Referiu ainda que os autores chegaram a ceder-lhe o espaço de estacionamento para aí colocar materiais de uma obra que estava a executar na sua fração.
Além destes depoimentos, não foi produzida qualquer prova sobre a indicação da garagem para uso dos autores e o momento em que isso se verificou.
Deste modo, numa apreciação prudente da prova produzida (artigo 607º, nº 5, do Código de Processo Civil), afigura-se-nos que relativamente à matéria vertida na alínea z) dos fundamentos de facto da sentença recorrida, apenas se pode dar como provado que pelo menos desde meados de 1984, o primeiro lugar de estacionamento do lado nascente sul tem sido única e exclusivamente utilizado pelos autores, ininterruptamente, à vista de todos os condóminos, sem oposição de quem quer que seja, na intenção e convicção de que o referido lugar lhes pertence.
No que respeita a matéria vertida na alínea cc) dos fundamentos de facto da sentença recorrida, a única prova de reclamações dos autores que foi produzida na audiência final consistia em queixas quanto às características do lugar (depoimentos de parte do réu D… e da autora), mas nunca por o lugar que foi indicado aos autores não ser o deles.
As queixas com fundamento no lugar de estacionamento que foi indicado aos autores não ser o que resulta do título constitutivo da propriedade horizontal são muito recentes e materializaram-se com a propositura desta ação.
Repare-se que os autores tiveram intervenção, em 23 de dezembro de 1987, em escritura de alteração da propriedade horizontal, a fim de ser desafetada da fração E o lugar de garagem, o que indicia com grande segurança que nessa altura os autores aceitavam o lugar que lhes foi indicado.
Por tudo quanto se acaba de expor, deve manter-se a alínea cc) dos fundamentos de facto, tal como foi respondida pelo tribunal recorrido.
Anote-se que os autores nunca alegaram terem sido induzidos em erro pelo réu D…, quanto à garagem que lhes cabia e que apenas em 2011 descobriram que o lugar de garagem que lhes estava destinado era afinal o primeiro poente sul, matéria que não é instrumental, concretizadora ou complementar daquela que alegaram na petição inicial, razão pela qual nunca poderia ser legalmente dada como provada (veja-se o artigo 5º, nº 2, alínea a) e b), do Código de Processo Civil), se acaso tivesse sido produzida prova da mesma, o que na verdade não se verificou.
Relativamente à alínea dd) dos fundamentos de facto da sentença recorrida, o depoimento de parte do réu E…, no que respeita à totalidade da matéria aí constante e o depoimento de parte da autora, no que respeita à indicação do primeiro lugar de estacionamento a nascente sul como sendo o dos autores, abonam, de forma inequívoca, a resposta que foi dada pelo tribunal recorrido, razão pela qual se deve manter a resposta que foi dada pelo tribunal a quo.
Reapreciemos agora a resposta contida na alínea gg) dos fundamentos de facto da sentença recorrida.
No que respeita esta factualidade, com base nos depoimentos de parte da autora e do réu D…, apenas foi produzida prova de que os vendedores indicaram a B…, P… e O… que o lugar de estacionamento da fração “C” era o primeiro do lado nascente sul, o da fração “D” era o primeiro do lado poente sul e o da fração “F”, o segundo do lado nascente sul, não sendo produzida prova do momento exacto em que se verificou essa indicação, nomeadamente se foi aquando da emissão das declarações de compra e venda.
Deste modo, deve a alínea gg) dos fundamentos de facto da sentença recorrida passar a ter o seguinte conteúdo:
- D… e E… indicaram a B…, P… e O… que o lugar de estacionamento da fração “C” era o primeiro do lado nascente sul, o da fração “D” era o primeiro do lado poente sul e o da fração “F”, o segundo do lado nascente sul.
Para terminar, reapreciemos a resposta negativa ao artigo 42º da base instrutória.
No que respeita esta matéria, apenas foi produzido o depoimento do réu D…, sem qualquer corroboração documental ou pessoal.
Se os factos se passaram conforme este réu descreveu, deveriam estar arquivadas no Cartório Notarial em que foi lavrada a escritura de constituição da propriedade horizontal as minutas que serviram de base ao referido instrumento ou, não sendo esse o caso, deveriam estar na posse do depoente (veja-se o artigo 59º do Código do Notariado, aprovado pelo decreto-lei nº 47619, de 31 de março de 1967, na redação que vigorava à data da constituição da propriedade horizontal).
Por outro lado, à beira-mar, na costa atlântica, como é o caso dos autos, são mais facilmente percetíveis os pontos cardeais e especialmente o poente e o nascente, pelo que impressiona que a outorgante da escritura de constituição da propriedade horizontal não se tenha logo apercebido da alegada troca, ainda para mais num caso de repartição assimétrica de lugares de estacionamento, pois que de um lado ficavam dois lugares de estacionamento e, do lado oposto, ficavam três outros lugares.
Na atribuição das garagens que consta da constituição da propriedade horizontal há uma lógica na medida em que a frações sitas a nascente, são atribuídos lugares de estacionamento a nascente, tal como são atribuídos lugares de estacionamento a poente a frações sitas a poente. Porém, no que respeita a efetiva utilização dos lugares de estacionamento, esta lógica já não se verifica.
Também é certo que não se divisa que interesse se pudesse prosseguir com a constituição de uma propriedade horizontal em contradição com os lugares de estacionamento que foram atribuídos a cada um dos condóminos.
Assim, tudo sopesado, subsiste uma dúvida no que respeita esta matéria, pelo que se nos afigura que o tribunal a quo avaliou de forma prudente a prova produzida, nenhuma razão se divisando para que se altere o juízo negativo quanto ao artigo 42º da base instrutória.
Por tudo quanto precede, conclui-se que procede parcialmente a impugnação da decisão da matéria de facto requerida por B… e C…, nos termos antes expostos e improcede totalmente a reapreciação da decisão da matéria de facto requerida por L… e M….
3.2 Fundamentos de facto exarados na decisão recorrida, na parte em que não foram alterados pela reapreciação que antecede e expurgados de meras referências probatórias
3.2.1 Factos provados
3.2.1.1
Autores e réus são os únicos condóminos, como proprietários da totalidade das frações autónomas do edifício constituído em regime de propriedade horizontal, composto de edifício com três pavimentos, jardim e logradouro, com seis frações autónomas destinadas a habitação, sito na Avenida …, n.º …, freguesia e concelho da …, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número 4491/20070424, inscrito na matriz sob o artigo 7097 (alínea A da matéria de facto assente).
3.2.1.2
A fração autónoma designada pela letra C, inscrita na matriz sob o artigo 7097–C, constituída pelo primeiro andar lado poente com uma divisão para arrumos na cave e ainda lugar de garagem na cave, a primeira do lado poente-sul, encontra-se registada a favor dos autores pela inscrição AP 20 2007/06/06 (alínea B da matéria de facto assente).
3.2.1.3
A fração autónoma designada pela letra B, inscrita na matriz sob o artigo 7097–B, constituída pelo rés do chão lado nascente com divisão para arrumos na cave e ainda lugar de garagem na cave, a primeira do lado nascente-sul, encontra-se registada a favor dos réus D… e E… pela inscrição AP 15 1979/07/24 (alínea C da matéria de facto assente).
3.2.1.4
A fração autónoma designada pela letra D, constituída pelo primeiro andar do lado nascente para habitação, com uma divisão para arrumos na cave e garagem, a segunda nascente-sul, encontra-se registada a favor dos réus F… e G… pela Ap. 34 de 2003/06/18 (alínea D) da matéria de facto assente).
3.2.1.5
Da herança indivisa aberta por óbito de H…, faz parte a fração autónoma designada pela letra “F”, constituída pelo segundo andar do lado nascente para habitação, sótão amplo e garagem na cave, a terceira do lado nascente-sul, com registo de aquisição em comum e sem determinação de parte ou direito a favor dos herdeiros I…, J… e N… pela Ap. 24 de 1998/08/03 (alínea E) da matéria de facto assente).
3.2.1.6
Os réus L… e mulher são os proprietários da fração autónoma designada pela letra E, constituída pelo segundo andar do lado poente para habitação e sótão, com registo de aquisição a seu favor pela Ap. 17 de 1995/07/24, e da designada pela letra A, constituída pelo rés do chão, lado poente, para habitação, com uma divisão para arrumos na cave, que é a quarta, do lado nascente sul, com registo de aquisição a seu favor em Ap. 3 1984/10/02 (alínea F) da matéria de facto assente).
3.2.1.7
Foram os réus D… e E… os proprietários construtores do imóvel e quem o constituiu em regime de propriedade horizontal e vendeu as demais fracções aos demais réus, ou antecessores, por isso o seu registo de aquisição é o que resulta da inscrição de 1979 na descrição principal ou prédio mãe (alínea G) da matéria de facto assente).
3.2.1.8
Por escritura pública de 26 de Julho de 1983, exarada de fls. 2, verso, a 4, verso, do livro de escrituras n.º 34-C do Segundo Cartório Notarial da Póvoa de Varzim, com certidão junta como documento n.º 2 com a contestação dos réus D… e E…, estes mesmos réus declaram nomeadamente instituir o regime de propriedade horizontal no prédio descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 19501 da Póvoa de Varzim, onde pretendiam construir um prédio com três pavimentos, indicando as respectivas frações nos termos aí constantes[27] (alínea M) da matéria de facto assente).
3.2.1.9
Em 23-12-1987 foi lavrada no 1º Cartório da Secretaria Notarial da Póvoa de Varzim escritura de alteração da propriedade horizontal, conforme teor de fls. 113 a 117[28] (alínea J) da matéria de facto assente).
3.2.1.10
No processo de licenciamento administrativo sob o nº 8151/79 da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim consta a planta junta a fls. 119 dos autos[29] (alínea L) da matéria de facto assente).
3.2.1.11
Por escritura pública de 9 de Janeiro de 1984, exarada de fls. 71 a 73, no livro de escrituras diversas n.º 16-D, do Segundo Cartório Notarial da Póvoa de Varzim, com certidão junta como documento n.º 1 com a contestação dos réus D… e E…, estes réus declararam nomeadamente vender a B…, pelo preço de dois mil e quinhentos contos, a fração autónoma identificada com a letra “C”, do prédio sito na Avenida …, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 19501, a P…, pelo preço de dois mil e quinhentos contos, a fração autónoma identificada com a letra “F” do mesmo prédio, e a O…, pelo preço de dois mil e quinhentos contos, a fração autónoma identificada com a letra “D” do mesmo prédio, tendo aqueles B…, P…, e O… que aceitavam cada uma de tais vendas nas referidas condições (alínea N da matéria de facto assente).
3.2.1.12
Nos autos de acção declarativa com processo sumário, que correram termos no 3.º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca da Póvoa de Varzim, em que foram autores L… e M…, e réus F… e G… foi lavrada em ata, declaração de transacção emitida pelas partes, homologada por sentença de 3 de Fevereiro de 2011, das quais consta nomeadamente, referindo-se ao prédio descrito em a): “Autores e réus acordam em desafectar a garagem da fracção “D” atribuindo-a à fracção “A”.
3.2.1.13
A garagem tem duas portas de levantar, uma do lado esquerdo e outra do lado direito (alínea H da matéria de facto assente).
3.2.1.14
A do lado direito serve normalmente para o acesso ao lugar de estacionamento situado na zona poente da garagem e a do lado esquerdo serve para acesso aos outros três lugares de estacionamento (alínea I) da matéria de facto assente).
3.2.1.15
A divisão para arrumos na cave a que se reporta a descrição da fracção “B”, com inscrição de aquisição titulada pelos réus D… e E… encontra-se ampla e sem divisões interiores (resposta ao artigo 1º da base instrutória).
3.2.1.16
Os primeiros réus D… e E… vêm utilizando a parte nascente da sua cave para habitação, nela tendo instalada uma sala de estar, como se de uma zona habitacional e não como meros arrumos se tratasse (resposta ao artigo 11º da base instrutória).
3.2.1.17
Os réus D… e E…, contra o previsto no projeto camarário, fizeram abrir um vão que fecharam com uma porta da parte nascente da sua cave para a garagem de modo a acederem a esta pelo interior da sua fração (resposta ao artigo 4º da base instrutória).
3.2.1.18
Por cima dessa porta foi colocada uma câmara (resposta ao artigo 9º da base instrutória).
3.2.1.19
A porta de acesso à garagem a que se refere o pedido elencado em d) existe desde o início da construção do prédio, há mais de 28 anos (resposta ao artigo 44º da base instrutória).
3.2.1.20
Os primeiros réus D… e E… colocaram um coletor à direita, no interior da zona da garagem, quando de acordo com o projeto deve estar colocado a sul da porta de entrada da garagem no interior da zona da fração dos primeiros réus, a sul da zona de garagem portanto já fora desta (resposta ao artigo 14º da base instrutória).
3.2.1.21
Um pouco a nascente do referido em t) existe um coletor e caixa de vão, que deveriam, conforme o projeto de construção aprovado, ser suspensos no tecto, mas descem ao nível do chão (resposta ao artigo 15º da base instrutória).
3.2.1.22
Os coletores a que se refere o pedido elencado em i) existem no sítio onde se encontram desde o início da construção do prédio, há mais de 28 anos (resposta ao artigo 45º da base instrutória).
3.2.1.23
A cave na parte destinada a garagens tem um comprimento de 12,70 metros e uma largura de 6,71 metros na zona nascente e 6,03 metros na zona poente (resposta ao artigo 3º da base instrutória).
3.2.1.24
O prédio em causa não tem lugares de garagens fisicamente separados, sendo que a cave é ampla, estando pintados no chão, com tinta amarela, os lugares de estacionamento de cada uma das frações autónomas (resposta ao artigo 24º da base instrutória).
3.2.1.25
Desde a construção do edifício, em 1983, o lugar de estacionamento do lado poente sul tem sido única e exclusivamente utilizado pelos réus L… e M…, e antes deles por O… e mulher, S…, ininterruptamente, à vista de todos os condóminos, sem oposição de quem quer que seja, de forma pacífica, continuada, pública, na intenção e convicção de que os identificados lugares de estacionamento lhes pertencem (resposta aos artigos 27º, 29º, 32º, 33º, e 34º, todos da base instrutória).
3.2.1.26
Pelo menos desde meados de 1984, o primeiro lugar de estacionamento do lado nascente sul tem sido única e exclusivamente utilizado pelos autores, ininterruptamente, à vista de todos os condóminos, sem oposição de quem quer que seja, na intenção e convicção de que o referido lugar lhes pertence (resposta aos artigos 28º, 32º, 33º, 34º e 43º, todos da base instrutória).
3.2.1.27
Desde a construção do edifício, em 1983, o segundo lugar de estacionamento do lado nascente sul, ao centro, tem sido única e exclusivamente utilizado pelos réus I…, J… e marido, K…, N…, e antes deles por H… e P…, ininterruptamente, à vista de todos os condóminos, sem oposição de quem quer que seja, de forma pacífica, continuada, pública, na intenção e convicção de que o identificado lugar de estacionamento lhes pertence (resposta aos artigos 30º, 32º, 33º, e 34º, todos da base instrutória).
3.2.1.28
Desde a construção do edifício, em 1983, o terceiro lugar de estacionamento do lado nascente sul, à esquerda de quem entra na garagem, tem sido única e exclusivamente utilizado pelos réus D… e E…, ininterruptamente, à vista de todos os condóminos, sem oposição de quem quer que seja, de forma pacífica, continuada, pública, na intenção e convicção de que os identificados lugares de estacionamento lhes pertencem (resposta aos artigos 31º a 34º da base instrutória).
3.2.1.29
Os autores bem sabem que sempre usaram o primeiro lugar de estacionamento do lado nascente sul, nunca tendo reclamado por esse não ser o seu lugar; (resposta ao artigo 35 da base instrutória).
3.2.1.30
Os primeiros réus D… e mulher, enquanto vendedores das frações, indicaram aos compradores os lugares de estacionamento que diziam respeito a cada uma das fracções, o primeiro lugar de estacionamento localizado no lado nascente-sul, no que respeita aos autores, e a poente-sul no que respeita O…, o que foi aceite pelos mesmos (resposta ao artigo 41 da base instrutória).
3.2.1.31
Na parte anterior da garagem ou seja na zona imediatamente a poente das portas de acesso existe uma zona comum, coberta pela parte poente do edifício, fazendo um pátio destinado à circulação de viaturas e entrada para a zona poente da cave da fração B (resposta ao artigo 17 da base instrutória).
3.2.1.32
O réu D… adquire e mantém automóveis antigos por passatempo e, por vezes, quando faz a manutenção dos veículos, deixa a zona comum de garagem com alguma desarrumação de um dia para o outro, dada a pouca frequência com que a garagem é utilizada pelos restantes condóminos (resposta ao artigo 18 da base instrutória).
3.2.1.33
D… e E… indicaram a B…, S… e O… que o lugar de estacionamento da fração “C” era o primeiro do lado nascente sul, o da fração “D” era o primeiro do lado poente sul e o da fração “F”, o segundo do lado nascente sul (resposta ao artigo 46 da base instrutória).
3.2.2 Factos não provados[30]
3.2.2.1
O que impede o estacionamento de viatura naquele espaço para deixar a possibilidade de passagem por essa porta (com referência à factualidade provada sob o ponto 3.2.1.17) (resposta negativa ao artigo 5 da base instrutória).
3.2.2.2
Para deixar aquela passagem a viatura tem de ser estacionada a nascente da referida porta, ficando sem espaço para sair ou entrar do lado direito ou esquerdo porquanto dado que a garagem só tem 6,70 metros de largura, sendo estacionada como é habitual uma viatura ao centro ao fundo, não fica espaço suficiente para abrir as portas (resposta negativa ao artigo 6 da base instrutória).
3.2.2.3
Sendo o primeiro réu D… quem mais vem usando ultimamente o lugar do centro ao fundo ocupando-o com um ou outro carro de grandes dimensões, ao mesmo tempo que ocupa também o lugar a norte daquele (resposta negativa ao artigo 7 da base instrutória).
3.2.2.4
Para tapar a referida porta necessita de prazo inferior a duas semanas (resposta negativa ao artigo 8 da base instrutória).
3.2.2.5
Para a construção e deslocação do coletor para o interior da cave dos primeiros réus D… e E…, basta um período não superior a dois meses (resposta negativa ao artigo 16 da base instrutória).
3.2.2.6
Desde maio de 2011 existe uma fuga na canalização da fração B, rés do chão nascente, para o interior da garagem (resposta negativa ao artigo 19 da base instrutória).
3.2.2.7
Em consequência dessa fuga cai água na garagem e consequentemente no carro que seja posicionado no lado direito ou sul da mesma (resposta negativa ao artigo 20 da base instrutória).
3.2.2.8
Para a reparação daquela fuga, bastam três dias de trabalho, sendo portanto dois meses um prazo mais que suficiente (resposta negativa ao artigo 22 da base instrutória).
3.2.2.9
Indagaram [junto] do vendedor das frações os réus L… e M… sobre o lapso existente na escritura de constituição da propriedade horizontal do prédio em causa, e este esclareceu-os que quando foi outorgar a escritura, foi representado pela mulher, [que] tinha um apontamento/planta com os lugares de estacionamento, cada um com uma letra, e o notário, na hora em que estava a ser redigida a escritura, entendeu melhor identificar cada um dos lugares de estacionamento através dos pontos cardeais, e, na altura, a mulher não reparou no erro na identificação de cada um dos lugares de garagem[31] (resposta negativa ao artigo 42 da base instrutória).
4. Fundamentos de direito
4.1 Da revogação da sentença recorrida na parte em que decretou a improcedência dos pedidos deduzidos nas alíneas b), c), d), e), f), g) e i), do petitório final
Os recorrentes pugnam pela revogação da sentença recorrida na parte em que julgou improcedentes os pedidos formulados nas alíneas b), c), d), e), f), g) e i), do petitório final.
As razões avançadas pelos recorrentes para estas pretensões são, em síntese, as seguintes:
- no que respeita aos pedidos formulados nas alíneas b) e c) do seu petitório final, por força da alteração da decisão da matéria de facto por que pugnaram e ainda porque estando em causa um negócio formal não pode a declaração valer com um sentido que não encontre um mínimo de expressão no documento formalizador (artigo 238º do Código Civil), não sendo admissível prova testemunhal em contrário de tal documento (artigo 394º do Código Civil);
- no que se refere ao pedido deduzido na alínea d) do petitório final, alegam que têm direito a exigir o cumprimento do projeto de construção, tanto mais que os réus D… e mulher são demandados na qualidade de construtores do imóvel, não tendo estes últimos o direito a manter uma abertura nuns arrumos não prevista no projeto de construção, sendo a manutenção de uma câmara de filmagem num espaço comum uma violação ilícita da privacidade de todos quantos se dirigem àquele espaço;
- no que tange ao pedido deduzido na alínea e) do petitório final, alegam os recorrentes que os réus não podem dar uma utilização habitacional aos arrumos de uma fração destinada à habitação;
- no que respeita às alíneas f) e g) do petitório final, os recorrentes alegam que a prática, ainda que a título de passatempo da atividade de reparação e pintura de automóveis antigos em espaço comum, nomeadamente destinado a caminho ou acesso à garagem, constitui utilização de espaço comum para fim diverso daquele a que se destina.
Os recorrentes não avançam nas conclusões das suas alegações, nem nestas, qualquer razão para a revogação da decisão recorrida, na parte em que julgou improcedente o pedido formulado na alínea i) do petitório final[32]. Por isso, na falta de qualquer crítica efetiva à decisão recorrida, nesta parte, pode concluir-se, com segurança, desde já, pela manutenção da decisão recorrida, neste segmento.
As razões da decisão recorrida para a improcedência das pretensões que os autores deduziram nas alíneas b), c), d), f) e g), são as seguintes, em síntese:
- no que respeita aos pedidos b) e c), a presunção registral de dominialidade de que os autores beneficiam não abarca a área, a composição e as confrontações do bem cuja aquisição consta do registo predial e ainda que se entendesse de modo diverso, foi produzida prova de posse dos autores, boa para usucapião, sobre lugar de estacionamento diverso do que vem identificado no registo predial;
- no que respeita ao pedido deduzido na alínea d) do petitório final, a decisão recorrida sustenta-se na afirmação de que as normas cuja violação é invocada pelos autores não lhe dão o direito a exigir a demolição das obras efetuadas em desconformidade com o projeto, apenas podendo fundar a responsabilidade civil dos prevaricadores, sendo certo que a porta nos arrumos foi logo aberta com a construção original do prédio e, quanto à câmara colocada sobre uma porta e virada para uma zona comum, não integra exercício abusivo do direito de compropriedade de um condómino, nem configura qualquer violação de um direito de personalidade dos restantes condóminos;
- relativamente aos pedidos formulados nas alíneas e), f) e g) do petitório final, a sua improcedência assentou, por um lado, na afirmação de que o uso de uma parte integrante de uma fração autónoma descrita como arrumo para fins habitacionais não implica um uso diverso de toda a fração autónoma do fim para que é destinada e, por outro lado, quanto à utilização da zona comum de garagem para a atividade de reparação de veículos antigos, dada a pouca frequência com que a garagem é usada pelos restantes condóminos, não implica a violação dos direitos dos restantes condóminos, quer por via da violação do artigo 1422º do Código Civil, quer por via da violação dos artigos 1403º, nº 2 e 1405º, nº 1, ambos do Código Civil.
Cumpre apreciar e decidir.
Os recorrentes pugnam pela procedência dos pedidos que formularam nas alíneas b) e c) do seu petitório final, firmando-se, essencialmente, no teor do título constitutivo da propriedade horizontal e nas consequências jurídicas da alteração da matéria de facto por que pugnaram, não procedendo a qualquer crítica da decisão recorrida no que respeita os fundamentos invocados quanto à desconsideração do que resulta do título constitutivo da propriedade horizontal, no que respeita a localização do lugar de estacionamento que se integra na sua fração.
Ora, como bem assinalou o tribunal a quo, a presunção iuris tantum emergente do artigo 7º do Código do Registo Predial, como é jurisprudencialmente referido de modo quase unânime, não abarca a composição e as confrontações da descrição predial, cingindo-se à existência do direito registado e à sua titularidade, bem como à existência de eventuais ónus registados[33].
E bem se compreende o alcance limitado de tal presunção, na medida em que aqueles elementos da descrição, não são percecionados pelo Sr. Conservador do Registo Predial que procede ao registo, antes derivam de declarações dos interessados, ainda que documentadas, mas sem a garantia de fiabilidade dos documentos que titulam a realização dos negócios com eficácia real, por falta da intervenção de uma entidade certificadora e dotada de fé pública na recolha e perceção dos dados de facto que vão instruir as declarações dos interessados.
Por isso, o que consta da descrição do registo predial quanto à área, composição e confrontações da fração autónoma de que os autores se afirmam donos, não está abrangido pela presunção legal vertida no artigo 7º do Código do Registo Predial.
As considerações que os recorrentes tecem sobre a acessão da posse, não sendo sequer juridicamente incontestáveis[34], são sobretudo impertinentes, dado que se prova uma posse por parte deles boa por usucapião há mais de vinte anos sobre o lugar de estacionamento que lhes foi indicado pelos vendedores.
As considerações dos recorrentes B… e mulher sobre a violação do artigo 238º do Código Civil não têm qualquer pertinência, já que, na escritura pública de compra e venda em que se formalizou a aquisição da sua fração autónoma, nem sequer se reproduziu a descrição da mesma, não vindo aí referido o lugar de estacionamento.
A invocação pelos recorrentes B… e mulher da violação do disposto no artigo 394º do Código Civil não colhe porque o que foi admitido pelo tribunal a quo foi a produção de prova tendente a demonstrar os poderes efetivos que os recorrentes B… e mulher têm exercido sobre um lugar de estacionamento, na sequência daquela aquisição, não se tendo por isso admitido qualquer prova contra o conteúdo do título aquisitivo, sendo certo, em todo o caso, que nem sequer consta do referido título a alusão ao lugar de estacionamento.
Finalmente, as alterações ocorridas na decisão da matéria de facto, deixam intocado o exercício de poderes de facto pelos recorrentes B… e mulher, desde há já mais de vinte anos, à vista de toda à gente, sem qualquer violência, sobre o lugar de estacionamento que enjeitam nestes autos, como se fossem donos do mesmo, em termos de resultar demonstrada uma aquisição por usucapião, como se decidiu na decisão recorrida.
Por tudo quanto precede, conclui-se que se deve manter a improcedência das pretensões formuladas pelos recorrentes B… e mulher nas alíneas b) e c) do petitório final.
Apreciemos agora o pedido deduzido na alínea d) do petitório final.
Os recorrentes B… e mulher pugnam pela revogação da decisão recorrida no que respeita a alínea d) do petitório final argumentando que têm direito a exigir o cumprimento do projeto de construção, tanto mais que os réus D… e mulher são demandados na qualidade de construtores do imóvel, não tendo estes últimos o direito a manter uma abertura nuns arrumos não prevista no projeto de construção, sendo a manutenção de uma câmara de filmagem num espaço comum uma violação ilícita da privacidade de todos quantos se dirigem àquele espaço.
Salvo melhor opinião, afigura-se-nos que os recorrentes B… e mulher estão equivocados quando retiram da circunstância dos réus D… e mulher terem sido os construtores do imóvel em que se insere a fração autónoma que lhes adquiriram, o direito a exigir o cumprimento do projeto de construção do referido edifício.
Para que os aludidos recorrentes tivessem esse direito, necessário seria que alegassem e provassem que adquiriram a sua fração no pressuposto da verificação de determinadas caraterísticas previstas no projeto de construção.
Não sendo esse o caso, o aludido projeto de construção faz parte de uma relação jurídica administrativa a que os recorrentes são alheios, cujo cumprimento terá sido verificado pela entidade competente, com a subsequente concessão da licença de habitabilidade.
Só assim não seria se porventura os recorrentes alegassem e demonstrassem a violação de disposições constantes do projeto de construção que lhes causassem prejuízos, o que de todo não se verifica no caso em apreço.
De facto, a porta que os recorrentes B… e mulher pretendem ver tapada existe desde o início da construção do prédio, sendo manifesto que apenas por retaliação pretendem agora reagir contra essa abertura.
Assim, no que respeita esta pretensão de fechamento da porta existente nos arrumos dos réus D… e mulher, deve manter-se intocada a decisão recorrida.
Debrucemo-nos agora sobre a pretensão de remoção da câmara de filmar colocada por cima da porta de acesso aos arrumos dos réus D… e mulher.
Embora a matéria de facto provada seja escassa, é suficiente para inferir que a câmara de filmar colocada sobre a aludida porta permite a captação e gravação de imagens no interior de uma zona comum do prédio de que os recorrentes B… e mulher são condóminos. De facto, é impensável que essa câmara esteja virada para a parede e nem os réus D… afirmaram isso pois que justificaram a sua colocação por razões de segurança.
Nos termos do disposto no artigo 70º, nº 1, do Código Civil, a “lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral.”
“Independentemente da responsabilidade civil a que haja lugar, a pessoa ameaçada ou ofendida pode requerer as providências adequadas às circunstâncias do caso, com o fim de evitar a consumação da ameaça ou atenuar os efeitos da ofensa já cometida” (artigo 70º, nº 2, do Código Civil).
À data da instauração da presente acção existia um processo especial que adjectivava o preceito que se acaba de citar, o processo de Tutela da Personalidade, do Nome e da Correspondência, regulado nos artigos 1474º e 1475º do Código de Processo Civil[35].
No caso em apreço, ultrapassado que está o momento em que foi proferido o despacho saneador, está arredada a possibilidade de conhecimento de eventual erro na forma de processo relativamente à pretensão dos recorrentes ora em análise, ex vi artigo 206º, nº 2, do Código de Processo Civil, na redacção que vigorava quando foi proferida o despacho saneador[36].
Além desta vertente exclusivamente centrada nos direitos de personalidade, importa também considerar que a adoção de medidas de segurança em prédio sujeito ao regime da propriedade horizontal e relativamente a zonas comuns do imóvel, é matéria que cabe na competência própria da assembleia de condóminos (artigo 1430º do Código Civil).
Na decisão recorrida desconsiderou-se a colocação da referida câmara de filmar nos seguintes termos:
A colocação de uma câmara sobre uma porta numa zona comum não configura qualquer exercício abusivo do direito de compropriedade de um condómino, tal como definidos nos arts. 1403.º, n.º 2, e 1405.º, n.º 1, do CC, nem configura qualquer violação de direitos de personalidade dos restantes condóminos, tal como a colocação de óculos nas portas, dirigidos a zonas comuns, para visionar quem pretende entrar não configura.
Discordamos desta interpretação do tribunal recorrido.
A nosso ver, a colocação de uma câmara de filmar virada para uma zona comum não é de modo algum equiparável à colocação de um óculo numa porta virada para uma parte comum.
De facto, um óculo destina-se a uma utilização pontual e dificilmente se imagina alguém que esteja permanentemente “colado” a um óculo, visionando o que se passa nas zonas comuns. Seja como for, é um meio que se destina à captação direta de imagens pela pessoa que usa o óculo, sendo dificilmente configurável que por tal meio se proceda à gravação de imagens.
Pelo contrário, uma câmara de filmar é um processo expedito de captação e gravação de imagens ao longo de todo o dia, tendo aptidão, para violar o direito à imagem (artigo 79º do Código Civil), sem consentimento de quem quer que frequente as zonas comuns passíveis de visionamento e registo por intermédio de tal instrumento técnico.
Acresce ainda que sendo justificada a colocação de tal instrumento técnico por necessidades de segurança em zona comum, trata-se de matéria que cabe na competência própria da assembleia de condóminos (artigo 1430º, nº 1, do Código Civil).
Assim, tudo sopesado, quer tendo em conta o potencial lesivo de direitos de personalidade dos recorrentes B… e esposa, sem o seu consentimento, quer tendo em conta estar em causa matéria da competência própria da assembleia de condóminos, afigura-se-nos que os réus D… e esposa não têm direito a manter a câmara de filmar que colocaram sobre a sua porta, devendo ser condenados a removê-la.
O prazo de dez dias indicado pelos recorrentes para remoção da câmara de vigilância afigura-se-nos proporcionado, começando a correr desde o trânsito em julgado desta decisão.
Apreciemos agora o pedido deduzido na alínea e) do petitório final.
Os recorrentes B… e cônjuge insurgem-se contra a decisão recorrida alegando que uma parte de uma fração destinada a arrumos não pode legalmente ser usada para fins habitacionais. Assim, afirmam que pelo mesmo critério da sentença recorrida, poderá qualquer dos condóminos instalar uma cozinha, uma sala, ou um quarto, no lugar de garagem que cabe à sua fracção.
Na decisão recorrida para firmar a decisão de improcedência escreveu-se o seguinte:
Voltamos de novo ao já parcialmente transcrito art. 1422.º, do CC. O seu n.º 2, alínea c), dispõe que é especialmente vedado aos condóminos dar-lhe uso diverso do fim a que é destinada. Da leitura conjunta com a alínea b) que antecede a transcrita resulta que o uso diverso ao fim ser reporta naturalmente à fracção autónoma.
Ora a utilização de uma parte integrante de uma fracção autónoma que designada descritivamente como arrumo para habitação não implica um uso diverso de toda a fracção autónoma do fim para que é destinada. Tal aconteceria porventura se o arrumo em questão fosse ele próprio uma fracção autónoma, destinada a armazém, e os autores o usassem para habitar. Sendo o arrumo uma parte integrante de uma fracção destinada a habitação, se os réus o habitam, sem com isso causarem qualquer prejuízo ou efeito quanto aos restantes condóminos susceptível de tutela em sede de propriedade horizontal, não há fundamento legal para que os autores os impeçam.
Que dizer?
De acordo com o disposto na alínea c), do nº 2, do artigo 1422º do Código Civil, é especialmente vedado aos condóminos dar uso à sua fração para fim diverso daquele a que é destinada.
Esta exigência legal destina-se à salvaguarda não só de interesses particulares mas também de interesses públicos de segurança e salubridade, entre outros. Na verdade, os riscos e os ruídos inerentes à utilização de uma fração para uma finalidade de habitação são bastantes diversos do uso para restauração, para o comércio ou para armazenamento.
Por isso, tendo em conta esta teleologia legal, afigura-se-nos que a aferição da conformidade do uso de uma fração autónoma não se deve apenas fazer com referência à sua globalidade, como se entendeu na sentença recorrida, mas sim em função do uso concreto que é dado a cada uma das partes de cada fração, com destinação específica.
Deste modo, se uma fração autónoma integra um espaço para arrumos, finalidade complementar da finalidade habitacional da fração em que se integra, não pode, legalmente, ser usada para fins habitacionais.
O uso de um espaço de arrumos, sito numa cave, para fins habitacionais, além de contender com as exigências públicas de segurança e salubridade, aumenta também os riscos para os restantes condóminos, nomeadamente no que respeita a segurança do prédio.
Deste modo, a decisão recorrida deve ser revogada na parte referente ao pedido formulado na alínea e), do petitório final, pedido que procede, com a condenação dos réus D… e esposa a não darem outro uso à cave integrante da sua fração que não seja o de arrumos.
Apreciemos agora a pretensão de revogação do decidido pelo tribunal a quo relativamente aos pedidos deduzidos nas alíneas f) e g) do petitório final.
Os recorrentes alegam para sustentar esta sua pretensão de revogação que a prática, ainda que a título de passatempo, da atividade de reparação e pintura de automóveis antigos em espaço comum, nomeadamente destinado a caminho ou acesso à garagem, constitui utilização de espaço comum para fim diverso daquele a que se destina.
Na decisão recorrida, o juízo de improcedência destas pretensões foi fundamentado da forma que segue:
Quanto à utilização da zona comum de garagem, resultou provado que réu D… adquire e mantém automóveis antigos por passatempo e, por vezes, quando faz a manutenção dos veículos, deixa a zona comum de garagem com alguma desarrumação de um dia para o outro, dada a pouca frequência com que a garagem é utilizada pelos restantes condóminos.
Esta conduta não implica violação de direitos dos restantes condóminos, quer por via do art. 1422.º, do CC, quer por via dos arts. 1403.º, n.º 2, e 1405.º, n.º 1, do CC.
Provou-se o seguinte:
- “O réu D… adquire e mantém automóveis antigos por passatempo e, por vezes, quando faz a manutenção dos veículos, deixa a zona comum de garagem com alguma desarrumação de um dia para o outro, dada a pouca frequência com que a garagem é utilizada pelos restantes condóminos” (resposta ao artigo 18 da base instrutória).
Desta factualidade não resulta que o réu D… pratica, ainda que a título de passatempo, a atividade de reparação e pintura de automóveis antigos em espaço comum, nomeadamente destinado a caminho ou acesso à garagem, nem muito menos que de algum modo obstrua o pátio frontal às garagens.
A realização esporádica de operações de manutenção de veículos na zona comum de garagem não constitui um uso desse espaço para fim diverso, sendo antes um fim acessório desse espaço. De facto, a mudança de um pneu, a verificação do nível do óleo, a realização de uma pequena reparação no espaço destinado à garagem, como seja a mudança de um limpa-vidros ou de uma lâmpada, inserindo-se num conjunto de operações necessárias à plena funcionalidade de um veículo, não exorbitam da finalidade de estacionamento num edifício habitacional.
Assim, no que respeita estas pretensões dos recorrentes B… e esposa, deve a decisão recorrida ser confirmada.
Recapitulando tudo quanto antes se decidiu, conclui-se pela parcial procedência do recurso de apelação interposto por B… e mulher C… e, em consequência, deve a decisão recorrida ser parcialmente revogada na parte em que julgou improcedentes os pedidos formulados nas alíneas d) (na parte relativa à câmara de filmar) e e), do petitório final, improcedendo no mais.
4.2 Da revogação da sentença na parte em que julgou improcedente a reconvenção deduzida por L… e mulher M….
L… e mulher M… apelaram pugnando pela revogação da sentença recorrida na parte em que julgou improcedente a reconvenção por si deduzida.
Para tanto alegam, em síntese, sem arguirem expressamente a nulidade da sentença, que a mesma enferma de contradição entre certos factos provados e a decisão e, além disso, por força da alteração na decisão da matéria de facto por que pugnaram, sempre deve proceder o pedido reconvencional que deduziram.
Na decisão recorrida escreveu-se o seguinte para fundamentar a improcedência da pretensão reconvencional dos réus L… e esposa:
Cumpre antes de mais salientar que o título constitutivo da propriedade horizontal é a escritura pública referida em h) dos factos provados e não qualquer escritura de compra e venda posteriormente celebrada, nomeadamente a referida em k).
Nos termos do art. 249.º, do CC, o simples erro de cálculo ou de escrita, revelado no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita, apenas dá o direito à rectificação desta.
É pacífico na doutrina que o erro que fundamenta o direito à rectificação da declaração atribuído neste artigo pressupõe um erro ostensivo, que portanto se revela no contexto da declaração ou nas circunstâncias que é feita. Neste sentido se pronunciam Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, vol. I, 4.ª edição, p. 234, e Heinrich Ewald Hörster, in A Parte Geral do Código Civil Português, p. 566. Embora o erro de escrita no título em questão tivesse sido objecto de discussão, conforme resulta da redacção do quesito 42), tal erro não logrou prova, pelo que improcede a reconvenção.
Cumpre apreciar e decidir.
Se acaso a pretensão reconvencional dos recorrentes L… e esposa consistisse no reconhecimento da aquisição, por usucapião, do direito de propriedade do lugar de estacionamento situado a poente sul, a contradição entre os fundamentos e a decisão que os recorrentes L… e esposa apontam à sentença recorrida, rectius o erro de julgamento na subsunção dos factos ao direito e na subsequente decisão seriam patentes.
Porém, não foi essa a causa de pedir invocada por estes recorrentes, nem foi esse o pedido que formularam, pois que pediram a retificação da escritura de constituição da propriedade horizontal em virtude de, alegadamente, a mesma enfermar de erro material.
Ora, relativamente à pretendida alteração da decisão da matéria de facto, em momento anterior deste acórdão julgou-se a mesma improcedente, pelo que inexiste qualquer base factual que permita concluir que na escritura de constituição da propriedade horizontal foi cometido erro material na identificação dos lugares de estacionamento que competem a cada uma das frações que dispõe desse espaço.
O exercício de posse reiterada e generalizada de todos os condóminos sobre lugares de estacionamento em total dissonância com o que ficou a constar do título constitutivo da propriedade horizontal não permite inferir pela existência do invocado erro material, sendo certo, além disso, que quer no contexto da própria declaração retificanda ou quer nas circunstâncias em que a mesma foi emitida, não se deteta a ocorrência de um qualquer erro de escrita.
Assim, por tudo quanto precede, conclui-se que bem andou o tribunal recorrido ao julgar improcedente a reconvenção deduzida por L… e mulher M….
As custas do recurso de apelação interposto por B… e mulher C…, bem como da ação, porque procederam parcialmente, são na proporção de dois terços para os recorrentes e de um terço para os recorridos D… e mulher E…, dentro do decaimento de 60% fixado na decisão recorrida, sem qualquer impugnação por qualquer das partes (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
As custas do recurso de apelação interposto por L… e mulher M… são da sua exclusiva responsabilidade por terem decaído totalmente (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
5. Dispositivo
Pelo exposto, os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto acordam no seguinte:
a) em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto por B… e mulher C… e, em consequência, em alterar os fundamentos de facto da decisão recorrida, nos termos antes enunciados e em revogar parcialmente a decisão recorrida proferida em 16 de novembro de 2015, julgando-se a ação parcialmente procedente por provada, condenando-se D… e mulher E… a retirarem, no prazo de dez dias, a câmara de vigilância que colocaram por cima da porta de entrada para a sua cave que têm virada para a zona nascente-sul da garagem, bem como a não darem outro uso à cave integrante da sua fração que não seja o de arrumos, confirmando-se a sentença recorrida nos restantes segmentos impugnados por estes recorrentes;
b) em julgar totalmente improcedente o recurso de apelação interposto por L… e mulher M… e, em consequência, em confirmar a decisão de improcedência da reconvenção por estes deduzida e constante da sentença proferida em 16 de novembro de 2015.
As custas do recurso de apelação interposto por B… e mulher C…, porque procedeu parcialmente, são na proporção de dois terços para os recorrentes e de um terço para os recorridos D… e mulher E…, dentro do decaimento de 60% fixado na decisão recorrida, sem qualquer impugnação por qualquer das partes (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
As custas do recurso de apelação interposto por L… e mulher M… são da sua exclusiva responsabilidade por terem decaído totalmente (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
***
O presente acórdão compõe-se de quarenta páginas e foi elaborado em processador de texto pelo primeiro signatário.

Porto, 30 de maio de 2016
Carlos Gil
Carlos Querido
Alberto Ruço
____
[1] Notificada às partes em expediente eletrónico elaborado em 18 de novembro de 2015.
[2] Informação da Conservatória do Registo Predial de Lousada, referente à descrição nº 4491/20070434, da Conservatória do Registo Predial da …, da mesma freguesia, descrita em livro sob o nº 19501, no livro nº 49 e referente a um prédio urbano sito na Avenida …, inscrito na matriz sob o artigo 7097, composto de edifício com três pavimentos, com jardim e logradouro, a confrontar do norte com U…, do sul com Avenida …, do nascente com T… e do poente com U…, com inscrição de aquisição por doação, a favor de D…, titulada pela apresentação nº 15, de 24 de julho de 1979, constituição de propriedade horizontal com as frações com as letras “A”, “B”, “C”, “D”, “E” e “F”, todas com as mesmas permilagens, titulada pela apresentação nº 7, de 20 de outubro de 1983 e alteração da propriedade horizontal titulada pela apresentação nº 20, de 20 de janeiro de 1988, de acordo com a qual à fração “E” deixou de pertencer a garagem na cave.
[3] Informação da Conservatória do Registo Predial de Lousada, referente à descrição nº 4491/20070434 - C, da Conservatória do Registo Predial da …, da mesma freguesia e referente ao primeiro andar, lado poente, para habitação, com uma divisão para arrumos na cave com 5,20 m2 que é a terceira do lado nascente-sul e ainda garagem na cave, que é a primeira do lado poente-sul, com inscrição de aquisição, por compra, a favor de B…, casado no regime da comunhão de adquiridos com C…, titulada pela apresentação nº 17, de 06 de junho de 2007.
[4] Cópia de certidão de inscrição matricial, referente à fração autónoma “C” do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 7097, no Serviço de Finanças da Póvoa de Varzim, aí descrita como 1º andar poente, para habitação, com seis divisões, dois quartos de banho, divisão para arrumações na cave e garagem, inscrito a favor de B….
[5] Informação da Conservatória do Registo Predial de Lousada, referente à descrição nº 4491/20070434 - B, da Conservatória do Registo Predial da …, da mesma freguesia e referente ao rés do chão, lado nascente, para habitação, com 117 m2, com uma divisão para arrumos, na cave, com a área de 90 m2, que é a primeira do lado sul e ainda garagem na cave, que é a primeira do lado nascente sul.
[6] Informação da Conservatória do Registo Predial de Lousada, referente à descrição nº 4491/20070434 - D, da Conservatória do Registo Predial da …, da mesma freguesia e referente ao primeiro andar, lado nascente, para habitação, com uma divisão para arrumos na cave com 5,20 m2 que é a primeira do lado nascente-sul e ainda garagem na cave, que é a segunda do lado nascente-sul, com inscrição de aquisição por compra a favor de F…, titulada pela apresentação nº 34, de 18 de junho de 2003.
[7] Informação da Conservatória do Registo Predial de Lousada, referente à descrição nº 4491/20070434 - F, da Conservatória do Registo Predial da …, da mesma freguesia e referente ao segundo andar, lado nascente, para habitação, com uma divisão para arrumos na cave com 5,20 m2 que é a segunda do lado nascente-sul, sótão amplo com 70 m2, do lado nascente e ainda garagem na cave, que é a terceira do lado nascente-sul, com inscrição de aquisição em comum e sem determinação de parte ou direito, por dissolução da comunhão conjugal e sucessão por morte a favor de V…, casado no regime da comunhão de adquiridos com W…, de J…, casada no regime da comunhão de adquiridos com K…, I…, viúva e N…, solteiro, titulada pela apresentação nº 24, de 03 de agosto de 1998.
[8] Informação da Conservatória do Registo Predial de Lousada, referente à descrição nº 4491/20070434 - A, da Conservatória do Registo Predial da …, da mesma freguesia e referente ao rés do chão, lado poente, para habitação, com 117 m2, com uma divisão para arrumos, na cave, com a área de 5,20 m2, que é a quarta do lado nascente sul, com inscrição de aquisição, por compra, a favor de L…, no estado de casado com M…, no regime da comunhão de adquiridos, titulada pela apresentação nº 3, de 02 de Outubro de 1984.
[9] Informação da Conservatória do Registo Predial de Lousada, referente à descrição nº 4491/20070434 - E, da Conservatória do Registo Predial da …, da mesma freguesia e referente ao segundo andar, lado poente, para habitação, com sótão amplo com 62 m2, do lado poente e inscrição de aquisição a favor de L…, no estado de casado com M…, titulada pela apresentação nº 17, de 24 de julho de 1995.
[10] Cópia de uma planta sem elementos identificativos e com a indicação, manuscrita, dos pontos cardeais e da escala de 1/100.
[11] Cópias de duas fotografias de uma cave de um prédio.
[12] Cópia de escritura pública de compra e venda celebrada no dia 09 de janeiro de 1984, na Secretaria Notarial da Póvoa de Varzim, na qual D…, por si e na qualidade de procurador de sua esposa, E…, declarou vender a B…, casado com C…, a fração autónoma “C”, correspondente ao primeiro andar, lado poente, destinado a habitação, a S…, casado com Q…, a fração autónoma “F”, correspondente ao segundo andar, lado nascente, destinado a habitação e a O…, casado com P…, a fração autónoma “D”, correspondente ao primeiro andar, lado nascente, destinado a habitação, frações todas parte do prédio urbano constituído em propriedade horizontal situado na Avenida …, da cidade da Póvoa de Varzim, descrito na Conservatória do Registo Predial do concelho da Póvoa de Varzim, sob o nº 19501, no livro B-49 e ainda não inscrito na matriz.
[13] Cópia da escritura de constituição de propriedade horizontal celebrada no dia 26 de julho de 1983, na Secretaria Notarial da Póvoa de Varzim, na qual E… por si e na qualidade de procuradora de D… declarou que o seu casal possui um terreno com a área de quatrocentos e noventa metros quadrados, na Avenida …, Póvoa de Varzim, descrito na Conservatória do Registo Predial do concelho da Póvoa de Varzim, sob o nº 19501, no livro B-49 e ainda não inscrito na matriz por ser destinado a construção urbana e que foi desanexado dos artigos 3471 urbano e 559 e 560 rústicos, no qual o seu casal está a proceder à construção de um prédio com 3 pavimentos, na fase de acabamento e por isso ainda não inscrito na matriz. Esse edifício é constituído pelas seguintes seis frações autónomas independentes, distintas e isoladas entre si, com saída própria para a via pública “ou parte uma parte comum do prédio”. As frações são as seguintes: fração A, rés do chão, lado poente, destinada a habitação, com a área coberta de 117 m2, constituída por 6 divisões, 2 quartos de banho e uma divisão para arrumos na cave, com a área de 5,20 m2, que é a quarta, do lado nascente-sul; fração B, rés do chão, lado nascente, destinada a habitação, com a área coberta de 117 m2, constituída por 5 divisões, 2 quartos de banho, uma divisão para arrumos na cave, com a área de 90 m2, que é a primeira, do lado sul e ainda garagem na cave, que é a primeira do lado nascente-sul; fração C, primeiro andar, lado poente, destinada a habitação, com a área coberta de 117 m2, constituída por 6 divisões, 2 quartos de banho e uma divisão para arrumos na cave, com a área de 5,20 m2, que é a terceira do lado nascente-sul e ainda garagem na cave, que é a primeira do lado poente-sul; fração D, primeiro andar, lado nascente, destinada a habitação, com a área coberta de 117 m2, constituída por 6 divisões, 2 quartos de banho e uma divisão para arrumos na cave, com a área de 5,20 m2, que é a primeira do lado nascente-sul e ainda garagem na cave, que é a segunda do lado nascente-sul; fração E, segundo andar, lado poente, destinada a habitação, com a área coberta de 114 m2, constituída por 5 divisões, 2 quartos de banho, sótão amplo com 62 m2 situado pelo lado poente e ainda garagem na cave que é a segunda do lado poente-sul; fração F, segundo andar, lado nascente, destinada a habitação, com a área coberta de 110 m2, constituída por 5 divisões, 2 quartos de banho, uma divisão para arrumos com 5,20 m2 que é a segunda do lado nascente-sul, sótão amplo com 70 m2 situado pelo lado nascente e ainda garagem na cave que é a terceira do lado nascente-sul. Declarou ainda que são comuns a todas as frações o jardim existente na frente do prédio com 80 m2 e o logradouro situado pelos lados norte, nascente e poente do prédio, com a área de 141 m2.
[14] Cópia de escritura pública de alteração de propriedade horizontal lavrada no dia 23 de dezembro de 1987, na Secretaria Notarial da Póvoa de Varzim, com a intervenção de D… e mulher E…, B… e mulher C…, S… e mulher Q…, O… e mulher P… e X…, na qualidade de procurador de L… e mulher M… e na qual foi acordada a composição da fração “E” do prédio constituído em propriedade horizontal descrito na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim sob o nº 19501 do livro B-49 e inscrito na matriz sob o artigo 6623, no sentido de que a mesma não compreende qualquer lugar na garagem, ficando assim constituída apenas por segundo andar, lado poente, para habitação, com sótão amplo com 62 m2 situado pelo lado poente.
[15] Cópia de uma planta da cave extraída do processo de licenciamento nº 8151/79, titulado por D…, sito na Avenida …, nº …, freguesia e concelho de …, na qual, além do mais, consta um carimbo de entrada no serviço de obras da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim, com data de 04 de abril de 1984.
[16] Cópia incompleta de participação policial datada de 06 de julho de 2010, referente à fratura de uma porta ocorrida na garagem do imóvel sito na Avenida …, nº …, Póvoa de Varzim.
[17] Cópia de ata de assembleia de condóminos realizada a 06 de maio de 2006, no rés do chão do imóvel constituído em propriedade horizontal sito na Avenida …, nº …, Póvoa de Varzim, onde, além do mais, se exarou: “condómina D. Y… que reconhecendo a assinatura anterior do marido, relatou os factos subsequentes na pessoa do Sr. Z… e a falta de apoio que por este lhe foi negado na discussão do problema da não possibilidade de utilização capaz do aparcamento, já que o adquiriu em fase de construção com o citado senhor e hoje se vê impossibilitada de total gozo de usufruto.”
[18] Cópia de carta datada de 15 de março de 2007, por F…, arrogando-se a qualidade de proprietário do 1º andar esquerdo, endereçada à sociedade AB…, Sociedade de Administração de Condóminos, Lda., ao cuidado de AC…, administrador do prédio da Avenida …, …, Póvoa de Varzim, em que, em suma, se queixa do uso abusivo da garagem como stand de exposição e oficina de reparação e do gasto de electricidade nesse espaço, tudo por parte do condómino do rés do chão esquerdo, solicitando a colocação de um contador próprio na garagem, a retirada de todos os objectos pessoais que impeçam a livre circulação na garagem e a saída das condutas de ventilação da garagem para o ar livre.
[19] Cópia de ata de assembleia de condóminos extraordinária realizada em 05 de setembro de 2011, referente ao prédio constituído em propriedade horizontal sito na Avenida …, nº …, Póvoa de Varzim, na qual, além do mais, se deliberou, por unanimidade, a colocação de mola na porta da entrada e a colocação de um automático para a luz da garagem, cujo preço total importa € 160,00, a ser imputado a todas as frações e com vencimento imediato, tendo o proprietário da fração “D” manifestado o entendimento de que não deve participar na despesa referente ao automático para a luz na garagem, porque não tem garagem, tendo a administração referido que deverá comparticipar porque nesse local existem uns arrumos da fração “D”, cujo acesso é feito pela garagem.
[20] Cópias de uma planta da cave, diferente da que consta a folhas 119, de plantas do rés do chão, do aproveitamento do vão do telhado e da cobertura, extraídas do processo de licenciamento nº 8151/79, titulado por D…, sito na Avenida …, nº …, freguesia e concelho da ….
[21] Cópia de escritura pública de compra e venda celebrada na Secretaria Notarial da Póvoa de Varzim, no dia 02 de julho de 1990, por meio da qual S… e mulher, Q… declararam vender a H…, que declarou comprar, casado no regime da comunhão geral de bens com I…, a fração autónoma “E”, correspondente ao segundo andar, lado nascente, destinado a habitação, de um prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na Avenida …, Póvoa de Varzim e descrito na Conservatória do Registo Predial da mesma cidade sob o nº 19501, do livro B-49, inscrito na matriz sob o artigo 6623.
[22] Cópia de escritura pública de habilitação de herdeiros lavrada no dia 18 de maio de 1998, no Cartório Notarial de …, na qual I…, invocando a qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito de seu marido H…, falecido no dia 17 de novembro de 1997, no estado de casado com ela, em primeiras núpcias de ambos e no regime da comunhão geral de bens, sem deixar testamento ou qualquer outra disposição de última vontade, sobrevivendo-lhe a declarante e três filhos: V…, casado com W…, no regime da comunhão de adquiridos, J…, casada com K…, sob o regime da comunhão de adquiridos e N…, no estrado de solteiro.
[23] Resposta do Sr. Vice-Presidente da Câmara Municipal da … ao pedido de informação do tribunal a quo instruída com duas plantas.
[24] Cópia de planta junta em audiência realizada em 20 de junho de 2014 e na qual se decretou a suspensão da instância.
[25] Cópias de fotografias tiradas no decurso da inspeção judicial realizada em 23 de abril de 2015 e cujo auto se acha a folhas 490 e verso.
[26] Isso mesmo foi exarado na assentada que se ordenou ficasse registada em ata (como determina o artigo 463º do Código de Processo Civil e também é exigido pelo artigo 358º, nº 1, do Código Civil), determinação que não foi cumprida, apenas tendo ficado gravado o que foi ditado pelo Sr. Juiz que presidiu à audiência final (ouça-se o ficheiro nº 20150416123208­_11647061_2871558, com a duração de 10 minutos e cinquenta e três segundos).
[27] Veja-se a nota de rodapé nº 13 deste acórdão.
[28] Veja-se a nota de rodapé nº 14 deste acórdão.
[29] Veja-se a nota de rodapé nº 15 deste acórdão.
[30] Além da parte não mencionada dos artigos cuja resposta consta dos factos provados, resultaram também não provados os que de seguida se enumeram.
[31] Salvo melhor opinião, o conteúdo deste artigo seria mais facilmente apreensível se se apresentasse com a seguinte redação, colocando os sujeitos da oração na devida posição: Os réus L… e M… indagaram [junto] do vendedor das frações sobre o lapso existente na escritura de constituição da propriedade horizontal do prédio em causa, e este esclareceu-os que quando foi outorgar a escritura, foi representado pela mulher, [que] tinha um apontamento/planta com os lugares de estacionamento, cada um com uma letra, e o notário, na hora em que estava a ser redigida a escritura, entendeu melhor identificar cada um dos lugares de estacionamento através dos pontos cardeais, e, na altura, a mulher não reparou no erro na identificação de cada um dos lugares de garagem.
[32] Na verdade, apenas no ponto 29º do corpo das alegações, é feita uma alusão à alínea i) do petitório final, alusão que não foi seguida de qualquer concretização de razões, ao invés do que sucedeu relativamente à alínea d), do mesmo petitório, alusão que de todo o modo nem sequer surge em sede de conclusões.
[33] Vejam-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, todos acessíveis no site da DGSI: de 12 de fevereiro de 2008, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Sebastião Póvoas, no processo nº 08A055; de 14 de novembro de 2013, relatado pelo Sr. Juiz conselheiro Serra Baptista, no processo nº 74/07.3TCGMR.G1.S1; de 03 de março de 2015, relatado pelo Sr. Juiz conselheiro Júlio Gomes, no processo nº 210/12.8TBGMR-D.G1.S1 e de 11 de fevereiro de 2016, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Lopes do Rego, no processo nº 6500/07.4TBBRG.G2.S3.
[34] Na doutrina, críticos quanto à exigência de um negócio formalmente válido para que se opere a transmissão da posse e se possa admitir a acessão, vejam-se, A Posse, 3ª edição Atualizada, Almedina 2000, António Menezes Cordeiro, páginas 134 a 137 e Direitos Reais, José Alberto C. Vieira, Coimbra Editora 2008, páginas 415 a 418. Na jurisprudência do Supremo Tribunal de justiça, admitiu-se a acessão de posse em caso de negócio formalmente inválido no acórdão de 02 de Maio de 2012, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Martins de Sousa, no processo nº 1588/06.8TCLRS.L1.S1, acessível no site da DGSI. No acórdão do mesmo tribunal de 01 de Dezembro de 2014, relatado pelo Sr. Juiz Conselheiro Garcia Calejo, no processo nº 94/07.8TBSCD.C1.SI, seguiu-se explicitamente a tese de que para haver acessão de posses não tem que subjazer ao ato translativo da posse um negócio jurídico formalmente válido.
[35] No actual Código de Processo Civil, esse processo especial consta dos artigos 878º a 880º.
[36] Actualmente, a essa previsão legal corresponde o artigo 200º, nº 2, do Código de Processo Civil.