Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
451/17.1T8AMT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FÁTIMA ANDRADE
Descritores: NULIDADE DA SENTENÇA
CONSTITUIÇÃO DE SERVIDÃO POR DESTINAÇÃO DE PAI DE FAMÍLIA
DIREITO DAS ÁGUAS
Nº do Documento: RP20210906451/17.1T8AMT.P1
Data do Acordão: 09/06/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - As causas de nulidade da sentença estão taxativamente previstas no artigo 615º do CPC.
II - Estando o tribunal limitado quanto aos seus poderes de pronúncia e decisão pelo objeto do processo delimitado pelo pedido e causa de pedir tal qual estes são configurados pelo autor, em respeito pelos princípios do dispositivo e do contraditório, apenas quando tais poderes sejam excedidos nomeadamente por condenação para além do que é pedido em desrespeito pelo previsto no artigo 609º do CPC se verifica o vício da nulidade da sentença por condenação ultra petitum a que se reporta o artigo 615º nº 1 al. e) do CPC.
III - São requisitos da constituição da servidão por destinação de pai de família:
- que dois ou mais prédios ou duas ou mais frações de um mesmo prédio pertençam ao mesmo dono;
- que nestes existam sinais visíveis e permanentes em um ou ambos desses prédios que revelem serventia entre os prédios e
- que ocorra dos mesmos separação sem que nesse momento tenha havido declaração no documento que titula esta que afaste a constituição de tal servidão.
IV - Sobre uma água existente ou nascida em prédio alheio é possível quer adquirir a sua propriedade, caso em que o adquirente/proprietário pode usar a mesma como bem entender, desta dispondo e fruindo livremente; quer da mesma fruir ao abrigo de um direito de servidão, caso em que o aproveitamento das suas utilidades está limitado ao conteúdo do seu título constitutivo e das necessidades do prédio dominante em proveito do qual foi constituída.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº. 451/17.1T8AMT.P1
3ª Secção Cível
Relatora: Juíza Desembargadora M. Fátima Andrade
Adjunta - Juíza Desembargadora Eugénia Cunha
Adjunta - Juíza Desembargadora Fernanda Almeida
Tribunal de Origem do Recurso - Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este – Jz. Local Cível de Amarante
Apelantes/ Herança Ilíquida e Indivisa por óbito de B… representada pela cabeça de casal, C… e outros

Sumário (artigo 663º nº 7 do CPC):
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Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto

I- Relatório
D… instaurou ação declarativa sob a forma de processo comum contra Herança Ilíquida e Indivisa por óbito de B…, representada pela cabeça de casal, C… e outros melhor ids. na p.i., peticionando pela procedência da ação e pelos factos que alegou:
A) que seja declarado
“1. Que os prédios identificados nos artigos 5 e 14, anteriores são propriedade de Autora e marido;
2. Que os imóveis identificados nos artigos 17 e 18, anteriores são propriedade dos Réus;
3. Que no interior dos prédios identificados nos artigos 17 e 18, anteriores, está implantado o E…, composto por nascente de água, mina, “pia” e tanque, a que aludem os artigos 39 a 48, anteriores;
4. Que aos prédios identificados nos artigos 5 e 14, anteriores, pertence toda a água, bem como os direitos de uso, consumo, condução e utilização da água que brota do referido E…, a que alude o número anterior, nos termos a que aludem os artigos 33 a 92, anteriores, cujos conteúdos aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais, por terem adquirido esses direitos por servidão constituída por destinação de pai de família, por aquisição do direito de propriedade da água e constituição voluntária de servidão e bem assim por usucapião;”
B) que sejam os RR. condenados a:
“1. A reconhecer os direitos dos imóveis a que alude o número 4, da alínea A), anterior á agua, nos termos e condições aí definidas, cujo conteúdo aqui se invoca para todos os legais efeitos;
2. A reporem a abertura no tanque, bem como a colocarem o tubo, nos termos a que aludem os artigos 51 a 74, anteriores, cujos conteúdos aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos efeitos legais, no prazo de trinta dias, de modo a permitir o uso e condução da água, para efetivação dos direitos a que alude o número 1. anterior;
3. A permitirem o acesso da Autora e seu agregado familiar ao “E…” para captação, transporte, uso e consumo da água para gastos domésticos do prédio identificado no artigo 14, anterior;
4. Absterem-se da prática de atos que obstem a Autora e respetivo agregado familiar de acederem ao interior dos seus prédios a fim de utilizar a água nos termos dos direitos de propriedade, posse, uso e servidão referidos no número 3, anterior e número 4, na alínea A), anterior;
5. A pagar, solidariamente, à Autora, uma indemnização que se vier a liquidar em execução de sentença, para ressarcimento dos prejuízos sofridos, nos termos e com os fundamentos constantes dos artigos 96 e seguintes;”
Citados os RR., contestaram C… por si e na qualidade de legal representante da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de B…, em suma tendo
- invocado a ilegitimidade ativa da A. por a mesma ser casada e ter interposto a ação desacompanhada de seu marido;
- invocado a falta de capacidade judiciária da R. F… por ser portadora de doença incapacitante que a impede de estar sozinha em juízo;
- impugnado a factualidade alegada e a final concluído pela improcedência da ação;
- excecionado a extinção do direito que a A. reclama pelo não uso;
A final tendo concluído pela improcedência da ação por não provada, com a consequente absolvição dos RR. do pedido, com exceção dos pontos 1 e 2 da al. A) do pedido.
No caso de a A. lograr provar os factos constitutivos dos direitos de servidão que invoca, mais tendo pugnado pela declaração da sua extinção pelo não uso nos termos do artigo 1569º nº 1 a. b) do CC.
A A. respondeu às exceções invocadas, tendo requerido a intervenção principal provocada de seu marido H… para o caso de o tribunal o entender necessário para suprir a arguida ilegitimidade ativa. Bem como requereu a nomeação de curador à R. F… para suprimento da arguida incapacidade judiciária desta.
Foi nomeado curador especial à R. F… e esta citada na pessoa daquele, assim se suprindo a arguida incapacidade judiciária.
Foi admitido o incidente de intervenção principal provocado e citado o chamado, assim acautelando a legitimidade ativa.
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Agendada audiência prévia, foi proferido despacho saneador e identificado o objeto do litígio e elencados os temas da prova, sem censura.
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Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença, decidindo o tribunal a quo:
julgo a ação parcialmente procedente por provada e, nesta decorrência, condeno os réus:
- A reconhecer que os prédios identificados nos arts. 5 e 14 são pertença da autora e marido;
- A reconhecer que os prédios identificados nos arts. 17 e 18 são propriedade dos réus;
- A reconhecer que no interior dos prédios dos réus está implantado o E…, composto por nascente de água, mina, pia e tanque;
- A reconhecer que aos prédios dos autores pertence toda a água e todos os direitos de uso, consumo, condução e utilização da água que brota da Poça da Fonte por terem adquirido esses direitos por servidão constituída por destinação de pai de família, por aquisição do direito de propriedade da água e constituição voluntária de servidão e por usucapião;
- A reconhecer os direitos dos imóveis referidos em 4;
- A reporem a abertura no tanque e a colocarem o tubo, no prazo de 30 dias de modo a permitir o uso e a condução da água;
- A permitirem o acesso da autora e seu agregado familiar ao E… para captação, transporte, uso e consumo de água para gastos domésticos do prédio identificado no art. 14;
- A absterem-se da prática de atos que obstem a que a autora e o seu agregado familiar acedam ao interior dos prédios dos réus a fim de utilizarem a água;
Absolvo os réus do restante pedido.”
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Do assim decidido apelaram os RR. oferecendo alegações e formulando as seguintes
V. CONCLUSÕES
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Apresentou a A. contra-alegações em suma tendo pugnado pela improcedência do recurso, face ao bem decidido pelo tribunal a quo.
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O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
Foram colhidos os vistos legais.
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II- Âmbito do recurso.
Delimitado como está o recurso pelas conclusões das alegações, sem prejuízo de e em relação às mesmas não estar o tribunal sujeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito nem limitado ao conhecimento das questões de que cumpra oficiosamente conhecer – vide artigos 5º n.º 3, 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3 do CPC – resulta serem as seguintes as questões a apreciar:
1) Nulidade da decisão por condenação “ultra petitum” – vide conclusões 3 a 5;
2) erro na decisão de facto - em causa os factos provados 3 a 5, 9 a 22 e 24 que os recorrentes pugnam sejam julgados não provados [vide conclusões 6 a 8] e os factos provados 2 e 23 que os recorrentes pugnam seja nos mesmos introduzida uma nova redação [vide conclusões 9 e 10]; ainda os factos não provados a que correspondiam os temas de prova 30 e 31 que os recorrentes pugnam sejam julgados provados [vide conclusão 11];
3) erro na decisão de direito.
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III – FUNDAMENTAÇÃO.
O tribunal a quo julgou como provada a seguinte factualidade:
“Factos Provados Provenientes do Saneador
A) Encontra-se registado a favor da autora e chamado D… e marido H…, por legado de I…, pela Ap. 1777 de 11/08/2014, o prédio rústico composto de terra de cultura, pastagem, ramada e videiras de enforcado, com a área de 9.450 m2, sito na Rua …, n.º …, freguesia …, concelho de Amarante, inscrito na matriz sob o artigo 236 e descrito sob o n.º 1457.
B) Encontra-se registado a favor da autora e chamado D… e marido H…, por legado de I…, pela Ap. 1777 de 11/08/2014, o prédio urbano composto de casa de rés-do-chão e andar, com logradouro, com a área coberta de 38 m2 e descoberta de 20 m2, sito na Rua …, n.º …, freguesia …, concelho de Amarante, inscrito na matriz sob o artigo 426 e descrito sob o n.º 1455.
C) Encontra-se registado a favor da ré C… no estado de casada com B…, por partilha, o prédio rústico denominado “J…”, composto de terra de cultura com ramada, sito em …, freguesia …, concelho de Amarante, inscrito na matriz sob o artigo 240, anterior artigo 125 e descrito sob o n.º 62.
D) Encontra-se registado a favor dos réus K… e marido L…, por doação, o prédio urbano composto de casa de cave (loja), rés-do-chão e dependência (corte) com logradouro (M…), com a área coberta de 90 m2 e descoberta de 2.500 m2, sito em …, freguesia …, concelho de Amarante, inscrito na matriz sob o artigo 483 e descrito sob o n.º 61.
E) Na escritura pública de “Declaração de Sucessão, Partilha e Divisão”, outorgada a 1 de Abril de 1943, a cargo do notário desta cidade, Dr. N…, exarou-se “Que respetivamente em 14 de Março de 1939 e 12 de Fevereiro de 1943, faleceram no …, onde residiam, no estado de casados em primeiras e únicas núpcias, sob o regime de comunhão de bens:- O… e P…, tendo deixado por únicos e universais herdeiros, seus filhos, Q…, S…, T…, U…, I…, V…”.
Na relação de bens anexa à escritura, consta a seguinte verba:
“DÉCIMO QUINTO” – W…, composto de vários prédios e terra lavradia (X… e do Y…), abrangendo as descrições prediais números vinte e oito mil cento trinta e um, vinte e oito mil cento e trinta e dois e vinte e oito mil cento e trinta e três e inscrito na matriz no artigo setecentos e catorze, e mais se exarou que, ao sexto outorgante, I…, em seu pagamento, fica-lhe adjudicado e a pertencer, com suas correspondentes águas, servidões, logradouros e mais pertenças na forma do seu antigo uso, costume e posse, o prédio descrito na citada relação sob o número décimo quinto”.
Mais ficou a constar “Que aos prédios adjudicados a este outorgante, além das águas de uso e costume, fica mais a pertencer duas poçadas de água, do E…, sendo uma de segunda-feira, da parte da tarde e outra às sextas-feiras, da parte da manhã, em cada semana, com servidão de rego e caminho para a sua condução.”
Na relação de bens consta ainda a verba “QUINTO” – J…, composto de diversas leiras, descrito na Conservatória sob o número seis mil quatrocentos e setenta e oito, e inscrito na matriz sob o artigo setecentos e vinte e um que foi adjudicada aos sétimos outorgantes, V… e mulher, em seu pagamento, e ficam-lhes adjudicados e a pertencer com suas correspondentes águas, servidões, logradouros e demais pertenças.
F) Os prédios de autores e réus são provenientes dos prédios rústicos referidos na escritura referida em E, em 15.º e 5.º, respetivamente e pertenceram aos mesmos donos, O… e marido P….
G) Os prédios dos réus situam-se a sul dos prédios dos autores.
H) Em 25 de Maio de 2010 faleceu B… no estado de casado com a ré C…, tendo-lhe sucedido, além da viúva, os três filhos do casal, os réus K…, Z1… e F….
I) A separar os prédios dos réus existe agora o caminho público denominado Rua ….
J) No interior do prédio rústico referido em C existe, desde tempos imemoriais, uma nascente de água denominada “E…” composta por mina, pia e tanque.
A mina tem extensão superior a 50 metros.
A cerca de dois metros da boca da mina está implantada a pia, ou seja, um tanque construído em pedra, com cerca de 1,5 m de comprimento, 1 metro de largura e 70 cm de altura.
Uma das guardas da pia termina em ladeira e é utilizada para lavar roupa.
A água provém do interior da mina através de tubo subterrâneo e cai no interior da pia.
Contíguo à pia situa-se o tanque, também construído em pedra e que tem a altura de 1,5 m, 4 metros de largura e seis metros de comprimento.
Após encher a pia, a água transborda para o interior do tanque.
(Provenientes da Audiência de Julgamento)
1- Há mais de 20 anos que a autora e chamado, por si e antecessores, ocupam os prédios referidos em A e B, explorando-os, utilizando-os como sua habitação e do seu agregado familiar, colhendo os respetivos frutos, pagando os impostos, sem interrupções ou oposição, à vista de toda a gente, com a convicção de serem os únicos donos e de a ninguém prejudicar;
2- O… e marido P… agricultavam todos os prédios, semeando e colhendo batatas, hortaliças, cebolas, vinho, feijão e para a sua rega utilizavam água represada no interior do prédio referido em C;
3- Tendo construído diversos regos e talhadouros para a água circular e que, existindo à data da escritura referida em E ainda hoje se conservam;
4- O casal O… e P… utilizava a água referida em J para consumo doméstico e para rega dos seus prédios rústicos;
5- A água para consumo era captada no final do tubo condutor, junto à pia;
6- A água represada no tanque era utilizada na rega dos seus prédios rústicos;
7- O tanque possuía duas aberturas, uma do seu lado norte e outra do seu lado nascente, correspondendo-lhe um rego para cada uma;
8- O rego com início junto à abertura nascente destinava-se à condução da água para rega do prédio dos réus referido em C;
9- O rego com início junto da abertura norte, conduzia a água para rega do prédio dos autores referido em A;
10- O rego referido em 9 constituía um rego aberto, em terra batida, que se desenvolvia pelo interior do prédio dos autores referido em A, no sentido sul/ norte;
11- O rego referido em 9 possuía trilho e leito definidos;
12- Desde o seu início até ao caminho público, atual Rua …, o rego possuía uma extensão não apurada;
13- E atravessava o caminho público, sob a forma de rego aberto.
14- E desenvolvia-se ao longo do talude aí existente, terminando no interior do prédio referido em A:
15- Aquando da outorga da partilha referida em E subsistiam a mina, a pia, o tanque e os regos, sendo a água levada do E… no prédio referido em C, para rega do prédio referido em A;
16- Há cerca de 30 anos, por acordo entre a autora D… e o marido H… a ré C… e o marido B…, a água deixou de ser conduzida por rego aberto e passou a circular em tubo de plástico soterrado;
17- O tudo de plástico está colocado no interior do rego, desenvolvendo-se desde a abertura existente na parede do E… até à Rua …;
18- A água passou a circular pelo interior do tubo, diretamente do E… até ao aqueduto existente na Rua …:
19- Pois a rua foi pavimentada e, consequentemente, eliminado o rego a céu aberto que a atravessava;
20- A água atravessa a Rua … pelo aqueduto.
21- Na sequência do acordo referido em 16, a condução e uso da água para rega do prédio dos autores referido em A passou a ser do pôr-do-sol de Domingo até ao nascer do sol de segunda-feira; e do nascer ao pôr- do- sol de quinta-feira;
22- Há mais de quarenta anos que o sogro e pai da Autora e marido, H…, construiu a casa referida em B, que passou a ser a sua casa de habitação familiar e o abastecimento de água para lavar e confecionar os alimentos e para consumo próprio, provinha da mina; utilizando a água, tubo e rego, sem interrupção, à vista de toda a gente e com a convicção de que a água lhes pertence naqueles dias, que têm o direito de circular e acompanhar a água pelo rego e tubo;
23- Em 2014 os réus tiraram o tubo de plástico que permitia a condução da água e eliminaram a abertura existente na parede norte do E… e que permitia o abastecimento de água para o prédio referido em A;
24- Desde 2014 que a autora e chamado estão impedidos de aceder ao interior do prédio dos réus referido em C para obter água para rega e consumo em sua casa;
25- A autora e o chamado há mais de 15 anos que dispõem de água da rede pública.”
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Julgou ainda o tribunal a quo como não provada a seguinte factualidade:
“Factos Não Provados:
Temas de Prova: 11 a 14 (parte) no que tange às medidas;
20 parte (provado apenas que a água atravessa a Rua … pelo aqueduto); 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32 e 33 parte (a água da rede pública só foi requisitada há mais de 20 anos).”
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Conhecendo.
1) Em primeiro lugar cumpre apreciar a arguida nulidade da sentença invocada pelos RR. por referência à al. e) do artigo 615º nº 1 do CPC.
As causas de nulidade da sentença estão de forma taxativa previstas no artigo 615º nº 1 do CPC, o qual assim dispõe:
“1 - É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.”
De realçar, desde já, que nestas causas de nulidade se não inclui quer os erros de julgamento da matéria de facto ou omissão da mesma, a serem reapreciados nos termos do artigo 662º do CPC, quando procedentes e pertinentes, quer o erro de julgamento derivado de errada subsunção dos factos ao direito ou mesmo de errada aplicação do direito [cfr. sobre a distinção entre nulidade da sentença e erro de julgamento Ac. STJ de 30/05/2013, nº de processo 660/1999.P1.S1, in www.dgsi.pt/jstj e Ac. TRG de 03/05/2018, nº de processo 2108/17.4T8GMR.G1 in www.dgsi.pt/jtrg].
Conforme resulta das alegações de recurso dos recorrentes RR., imputaram os mesmos à sentença sob recurso o vício de nulidade por condenação em quantidade superior ao pedido, ou seja ultra petitum [al. e) do já citado artigo 615º nº 1 do CPC].
Estando o tribunal limitado quanto aos seus poderes de pronúncia e decisão pelo objeto do processo delimitado pelo pedido e causa de pedir tal qual estes são configurados pelo autor, em respeito pelos princípios do dispositivo e do contraditório, apenas quando tais poderes sejam excedidos nomeadamente por condenação para além do que é pedido em desrespeito pelo previsto no artigo 609º do CPC se verifica o vício da nulidade da sentença por condenação ultra petitum a que se reporta o artigo 615º nº 1 al. e) do CPC.

Definindo causa de pedir poder-se-á dizer que esta consiste no facto concreto ou composto factual concreto que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido pelo A., consubstanciando-se numa indicação de factos suficientes para individualizar o facto jurídico gerador da causa de pedir[1].[2]
Assim e para que o tribunal reconheça ao autor o direito que o mesmo invoca, há de este alegar factos suscetíveis de gerar esse direito, segundo a ordem jurídica constituída.
Esses factos, postos em contacto com a ordem jurídica, é que constituem a causa de pedir, o fundamento ou fundamentos da ação que justificam o consequente pedido formulado.
A causa de pedir exerce portanto «uma função individualizadora do pedido e de conformação do objeto do processo»[3].

Tendo presentes estes considerandos e revertendo agora ao objeto da presente ação, ou seja o pedido definido através da respetiva causa de pedir, temos que o tribunal a quo na sua decisão condenatória excedeu na verdade o pedido que foi formulado pelos AA., pois que no ponto 4 da al. A) do pedido dos AA. peticionaram estes o reconhecimento dos direitos relativos à água nos termos que haviam descrito nos artigos 33 a 92 da p.i. e a consequente condenação dos RR. a tal reconhecerem, tal como consta no ponto 1 da al. B) do mesmo pedido.
Contudo o tribunal a quo no segmento decisório condenou os RR. a reconhecer que aos prédios dos AA. “pertence toda a água e todos os direitos de uso, consumo, condução e utilização da água que brota da E… (…)” sem efetuar qualquer restrição temporal, não obstante os AA. na petição inicial e nomeadamente nos artigos 33 a 92 da p.i. terem delimitado o alegado direito sobre a água para rega a 2 dias – nos termos apurados aliás 21 dos factos provados.
Verifica-se assim assistir aos recorrentes razão quando invocam ter ocorrido condenação para além do pedido, o que constitui nulidade da sentença nos termos da al. e) do artigo 615º nº 1 do CPC.
Nulidade cuja correção se impõe.
Tendo presente, contudo, que os recorrentes mais alegam ter ocorrido erro de julgamento que a seu ver implica a sua total absolvição do pedido, oportunamente e em função do vier a ser decidido quanto ao objeto do recurso, proceder-se-á se tal for o caso, à introdução da restrição temporal que os recorrentes assinalam não ter sido respeitada, assim sanando a nulidade que se julga verificada.
Em suma, julga-se procedente a arguida nulidade da sentença proferida por condenação ultra petitum.
Nulidade que oportunamente será sanada, em função do que vier a ser decidido em sede de mérito do recurso.

2) do erro na decisão de facto
Na reapreciação da matéria de facto – vide nº 1 do artigo 662ºdo CPC - a modificação da decisão de facto é um dever para a Relação, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou a junção de documento superveniente impuser diversa decisão.
Tendo presente que o princípio da livre apreciação das provas continua a ser a base, nomeadamente quando em causa estão documentos sem valor probatório pleno; relatórios periciais; depoimentos das testemunhas e declarações de parte [vide art.ºs 341º a 396º do Código Civil (C.C.) e 607º, n.ºs 4 e 5 e ainda 466º, n.º 3 (quanto às declarações de parte) do C.P.C.], cabe ao tribunal da Relação formar a sua própria convicção mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou que se mostrem acessíveis.
Fazendo ainda[4]:
- uso de presunções judiciais – “ilações que a lei ou julgador tira de um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido” (vide artigo 349º do CC), sem prejuízo do disposto no artigo 351º do CC, enquanto mecanismo valorativo de outros meios de prova;
- ou extraindo de factos apurados presunções legais impostas pelas regras da experiência em conformidade com o disposto no artigo 607º n.º 4 última parte (aqui sem que possa contrariar outros factos não objeto de impugnação e considerados como provados pela 1ª instância);
- levando em consideração, sem dependência da iniciativa da parte, os factos admitidos por acordo, os provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito por força do disposto no artigo 607º n.º 4 do CPC (norma que define as regras de elaboração da sentença) ex vi artigo 663º do CPC (norma que define as regras de elaboração do Acórdão e que para o disposto nos artigos 607º a 612º do CPC remete, na parte aplicável).
Finalmente releva realçar ser ónus do recorrente apresentar a sua alegação e concluir de forma sintética pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão – artigo 639º n.º 1 do CPC - na certeza de que estas têm a função de delimitar o objeto do recurso conforme se extrai do n.º 3 do artigo 635º do CPC.
Estando em causa a impugnação da matéria de facto, obrigatoriamente e sob pena de rejeição deve o recorrente especificar (vide artigo 640º n.º 1 do CPC):
“a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.
Assim e sem prejuízo das situações de conhecimento oficioso que impõem ao tribunal da Relação, perante a violação de normas imperativas, proceder a modificações na matéria de facto, estão estas dependentes da iniciativa da parte interessada tal como resulta deste citado artigo 640º do CPC.
Motivo por que e tal como refere António S. Geraldes in “Recursos no Novo Código do Processo Civil, já supra citado, em anotação ao artigo 662º do CPC, p. 238 “à Relação não é exigido que, de motu próprio, se confronte com a generalidade dos meios de prova que estão sujeitos à livre apreciação e que, ao abrigo desse princípio, foram valorados pelo tribunal de 1ª instância, para deles extrair, como de se tratasse de um novo julgamento, uma decisão inteiramente nova. Pelo contrário, as modificações a operar devem respeitar em primeiro lugar o que o recorrente, no exercício do seu direito de impugnação da decisão de facto, indicou nas respetivas alegações que servem para circunscrever o objeto do recuso. Assim o determina o princípio do dispositivo (…)”.
Sobre a parte interessada na alteração da decisão de facto recai portanto o ónus de alegação e especificação dos concretos pontos de facto que pretende ver reapreciados; dos concretos meios de prova que impõem tal alteração e da decisão que a seu ver sobre os mesmos deve recair, sob pena de rejeição do recurso.
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Tendo presentes os considerandos supra vertidos quanto à reapreciação da matéria de facto e revertendo ao caso concreto, é possível extrair das alegações de recurso dos RR. e respetivas conclusões quer os pontos da decisão de facto quanto aos quais se insurgem, quer quanto à redação pelos mesmos proposta e ainda os concretos meios de prova que a seu ver exigem alteração da decisão, tendo igualmente observado o ónus indicação das passagens da gravação com transcrições parciais dos depoimentos gravados, em obediência ao disposto no artigo 640º nº 2 al. a) do CPC.
Conclui-se portanto terem sido observados todos os ónus de impugnação e especificação que sobre os recorrentes recaem, pelo que cumpre proceder à pretendida reapreciação.
Consigna-se que para o efeito se procedeu à audição integral dos depoimentos prestados e gravados.
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Insurgem-se os recorrentes em suma quanto à valoração que o tribunal a quo efetuou dos depoimentos das testemunhas dos AA. AB…, AC… e AD… por contraposição nomeadamente ao depoimento de parte do co-R. L….
Depoimentos que o tribunal a quo analisou de forma conjugada com o resultado da inspeção judicial e prova documental junta aos autos, nos termos que constam da respetiva fundamentação.
Invocam concretamente os recorrentes que as testemunhas dos AA. mencionadas nada sabiam sobre eventuais sinais de serventia à data do tempo de separação do domínio de ambos os prédios.
E neste ponto cumpre-nos de forma singela reconhecer razão aos recorrentes.
Todas as testemunhas mencionadas - como aliás as demais, com exceção da A. que em declarações de parte confirmou todos os temas de prova de 1 a 29 (vide assentada de 21/11/2018) - declararam nada saber sobre a utilização dos prédios em questão em data anterior a 1943, incluindo a testemunha AD… que apenas afirmou ouvir falar que em 1943 já existia água pia e tanque e que era tudo do mesmo, sendo que então nem sequer era nascida.
Ou seja do tempo em que os prédios pertenciam aos mesmos donos – o casal constituído por O… e P… nada em concreto afirmaram as testemunhas ter conhecimento, sem prejuízo do que evidencia a prova documental.
Neste conspecto, importa realçar que até à escritura de sucessão e partilha celebrada em 1943 e mencionada em E) dos factos provados, pertenciam os prédios em causa nos autos – de AA. e RR. aos mesmos donos O… e P… [vide al. F) dos factos provados].
E foi através da mencionada partilha que os herdeiros deste casal, sendo nela todos intervenientes e de comum acordo declararam constituir – por via contratual portanto – a mencionada servidão a favor dos prédios hoje da A. e marido.
Tal como se extrai desta escritura, nela intervieram os herdeiros do mencionado casal, nomeadamente e no que ora releva I… – pai do A. (chamado) e V… – pai do falecido marido da R..
E por acordo de todos os herdeiros e portanto também dos pais do chamado P… e do falecido marido da R. / B… – foi em tal escritura celebrada em 1943 declarado que aos prédios adjudicados a I… (ora prédio dos AA.):
“ficou a pertencer duas poçadas de água do E… sendo uma de segunda-feira da parte da tarde e outra às sextas-feiras da parte da manhã, em cada semana, com servidão de rego e caminho para sua condução”
Foram portanto os herdeiros do casal falecido quem em 1943 definiu o direito às duas poçadas em dois dias definidos a favor dos prédios adjudicados a I… sobre o E….
E… que faz parte do prédio dos RR. – sobre o que as partes não discutem.
Por via contratual ficou constituída a partir de 1943 servidão de água, aqueduto (pelo rego) e passagem para condução da água em questão nos dias estabelecidos na servidão.
A constituição desta servidão [e não aquisição da propriedade, nos termos que infra justificaremos] nos moldes referidos implica necessariamente a pré-existência da mina e da água da mesma proveniente.
Mas desconhece-se se então já existia rego ou foi na altura criado e mesmo se os anteriores e falecidos proprietários já faziam tal uso das águas.
Certo é que a partir de 1943 passou a estar constituído tal direito por via contratual, na qual foram intervenientes os pais dos maridos das aqui RR., tendo estes por via sucessória ingressado na propriedade destes mesmos prédios e consequentemente na titularidade das relações jurídicas patrimoniais da pessoa falecida – cfr. artigo 2024º do CC [os AA. por legado – vide fls. 42v/43 e 114 e os RR. por partilha extrajudicial – vide fls. 48 nomeadamente].
O assim afirmado implica a alteração dos pontos 2 a 4 dos factos provados que passarão a refletir a realidade apurada após 1943 e na sequência da escritura referida em E) dos factos provados.
Assim se eliminando a referência aos atos praticados pelo falecido casal O… e P…, por desta se não ter feito prova.
Consequentemente, o constante dos factos provados 5 e seguintes, será reapreciado na perspetiva do que passou a ocorrer após 1943 com o que ficou contratualizado na escritura referida em E).
E neste ponto relevam já os depoimentos das testemunhas dos AA. e mesmo dos RR..
Ninguém negou a existência da mina, tanque e pia, nem a utilização das águas dela provenientes para rega dos campos rústicos, pelo menos dos campos dos RR..
A testemunha AB… [casada que foi com AE…, filho de Q…, outro dos herdeiros intervenientes na escritura mencionada em E) dos factos provados] confirmou tal como o tribunal a quo o referiu, que há cerca de 40 anos e como tal nos fins da década de 70 foi caseira juntamente com o marido do prédio dos AA. durante dois anos e nessa altura este prédio era regado pelas águas do tanque mencionado em J) dos factos provados. Águas conduzidas por rego em terra duas vezes por semana, na altura às 5ªs e domingo à noite para segunda de manhã [sustentando assim a existência do invocado acordo mencionado em 16 e 21, com alteração dos dias de rega inicialmente estabelecidos na escritura referida em E) dos factos provados].
Não confirmou contudo que a tal prédio também acedia para ir beber água ou para uso doméstico – a esta questão respondeu “não sei”.
Por sua vez a testemunha AC… [este sem relação familiar com as partes], com 55 anos de idade reiterou a rega dos terrenos dos AA. através do mencionado rego que transportava a água provinda do tanque referido em J), tal como confirmou que à mina iam buscar água para consumo doméstico, nomeadamente os AA..
O que justificou por assim o ter verificado até 1989 – altura em que seu pai vendeu aos AA. um terreno [a que respeita a escritura celebrada em 18/05/1989 e inserta nos autos em fevereiro de 2019 a fls. 152/153].
Portanto durante mais de 30 anos.
Desde então tendo deixado de lá ir.
Ainda assim afirmou ter igualmente conhecimento de que o rego em terra que inicialmente atravessava o caminho para o terreno da A. desapareceu. Tendo entretanto sido substituído por tubo quando fazem a estrada, segundo ouviu falar. Já que não assistiu a esta operação.
Por seu turno a testemunha AD…, filha dos AA. que assumiu estar de relações cortadas com os RR. por causa da questão que os divide, confirmou que sempre utilizaram a água para regar – nos dias em que à mesma tinham direito e também para beber, indo para o efeito buscar essa mesma água com cântaros.
Água para regar que inicialmente vinha através de rego aberto, indo abrir a saída do tanque que dava para o lado dos terrenos da autora nesses dias.
Ainda no tempo do avô tendo sido pedido para a água ser encanada para deixar passar o caminho / Rua …, passando os tubos a levar água por baixo direto para terreno dos AA., para a rega.
Apenas com o falecimento do marido da R. tendo surgido os problemas, tendo sido tapada a saída de água do tanque que dava para a rega dos seus terrenos.
Tendo igualmente sido impedidos de entrar no prédio que entretanto fora vedado para ir buscar água para consumo ou regar (entende-se para abrir a saída do tanque).
Afirmou ainda que só após 2014 e por terem sido impedidos deixaram de ir buscar água e regar.

Em sentido contrário depuseram P…, irmão do marido da R. [e como tal (recorda-se) igualmente filho de V… outorgante na escritura referida em E) dos factos provados].
Afirmou que nos últimos 20 anos a água do tanque era utilizada só pelo pai e filhos, nunca tendo os AA. usado a água para regar os terrenos deles.
Confirmou que o tanque tinha 2 tufos, sendo utilizado para regar os seus campos, já que se situava a meio destes.
Não tendo conhecimento que a água fosse dividida com mais alguém.
O que reiterou mesmo quando confrontado com o teor da escritura de 43 e questionado se outros irmãos de seu pai não iriam ali buscar água.
Esclareceu que viveu no local até aos seus 21 anos, tendo atualmente 65 anos (ou seja já ali não vivendo há 44 anos). Não obstante indo visitar os irmãos normalmente.
Na data em que passou a estrada já ali não vivia e assim afirmou nada saber de colocação de tubos.
Embora posteriormente tenha confirmado que foram colocados tubos para escoamento de águas.
Ainda assim reconheceu que a caseira do prédio dos AA. iria lá buscar água para beber, por antigamente nada mais haver ali o que deixou de acontecer.
AF…, [igualmente familiar, por ter sido casada com AG…, outro irmão do falecido marido da R. e assim filho de V…] afirmou conhecer o J… como as suas mãos.
E afirmou que quando o sogro faleceu, foram feitas partilhas há 33 anos portanto por volta de 1986, dividindo então as águas do tanque entre si e o cunhado (falecido marido da R.). Ficando este com 5 dias e eles com 2 dias, sábado e domingo – note-se que esta divisão assim indicada não colide com os dias entretanto atribuídos aos AA. por acordo nos termos apurados, dando uma vez mais credibilidade ao que assim foi alegado.
Não obstante tendo afirmado nunca ter visto os AA. a usar a água. Nem aliás tendo estes pago quaisquer despesas de manutenção que entre si (testemunha e marido) e cunhado foram divididas.
A divisão de águas mencionada por esta testemunha terá durado 8 anos conforme o mencionou, altura em que chegou a um acordo com o cunhado e deixaram de regar com as águas deste.
Águas que diz são usadas apenas pelos RR. sobrinhos. Nunca tendo visto a A. a lá ir buscar água, nem sequer a queixar-se por esse não uso.
Justificando o seu conhecimento com o facto de nunca se ter afastado de lá, dar-se bem com cunhada e até a ajudar.
V…, filho da anterior testemunha, com 43 anos de idade e ali vivendo próximo desde os 7 anos confirmou que na sequência de partilhas tinham água do tanque em causa nos autos dois dias por semana.
Contrariando as boas relações mencionadas por sua mãe, deu nota que o acordo para cessarem a partilha das águas ocorreu na sequência de uma zanga entre pai e tio precisamente por causa dessa partilha de água. Tendo sido quando se entenderam de novo que decidiram chegar a um acordo relacionado com a partilha de águas, ficando as águas do tanque em causa apenas para o seu tio – ao fim de 10/12 anos.
E durante esse tempo afirmou nunca ter visto os AA. a ir buscar água.
E tendo sido feitas obras na mina – colocando manilhas – quando foi feito o caminho, mais afirmou que nenhum tubo foi colocado.
Não havendo rego nem tubo há mais de 30 anos.
O assim declarado é infirmado não só pelo que as outras testemunhas dos AA. já referidas disseram como também pelo que o R. L… disse, ainda que apresentando outra justificação para a passagem do tubo por debaixo do caminho e pelo que foi constatado pela inspeção ao local.
Afirmou ainda que a A. ia buscar água às … desde que era miúdo para consumo.
Finalmente o R. L…, marido da R. K… em declarações de parte afirmou que conhecendo o local desde há 29 anos, nunca viu ninguém ir buscar água à mina, nem limpar ou reparar.
Confirmou que o tanque tinha 2 tufos. Que quando abriram o caminho (ainda sem paralelos) o sogro pôs um tubo por debaixo do caminho para regar o resto do seu terreno que ficou para esse lado do caminho e que ainda lá está.
E que quando a estrada foi alargada com paralelos – talvez 5 anos depois - comeu o resto do terreno do sogro pelo que mais tarde quando fazem obras para reparar o tanque decidem tapar o outro tufo para não se perder água.
Esclareceu ainda que quando conheceu o local há 29 anos já não havia rego aberto, porque já existia caminho e os tubos passavam por baixo – para regar aquela parte do terreno do sogro que entretanto despareceu.
A súmula destes depoimentos evidencia as versões contraditórias das testemunhas de AA. e RR. e das declarações de partes.
Sendo que da parte dos RR. e respetivos familiares que depuseram como testemunhas, não se pode deixar de estranhar o alegado desconhecimento do que o pai do marido da R. – V… - juntamente com os irmãos declararam na escritura mencionada em E) dos factos provados, constituindo tal como já referimos uma servidão de águas e aqueduto, nestas incluído pela natureza das coisas o necessário para o seu uso e conservação.
E a utilização confirmada pelas testemunhas dos AA. nos termos acima já referidos da água para rega, encontra sustento não só na mencionada escritura, como também nos sinais que em sede de inspeção judicial foram constatados, nomeadamente: o tanque no prédio referido em C) dos factos provados com duas saídas de água, uma das quais inutilizada com cimento; na berma da … na base direita, sentido ascendente, existe uma caixa de água com tubo plástico de onde brota a água do tanque dos réus, sendo que esta zona da Travessa era pertença do prédio dos réus; descida a Rua … e do lado esquerdo, fronteiro à casa dos autores também na borda, existe um tubo de plástico de onde segundo os autores sairia a água do tanque e subindo esta mesma Rua …, existe um outro tubo em cimento que segundo os autores provém do tanque para os seus prédios e segundo os RR. serve para escoar água da chuva [vide auto de inspeção ao local de fls. 164 v./165].
Em suma, a versão dos AA. julgada provada pelo tribunal a quo que beneficiou da imediação e oralidade quanto à agua para rega com o limite temporal reportado à data da escritura de 1943 e à utilização que a partir daí se fez [excluindo a menção aos atos do casal constituído por O… e marido nos termos já supra assinalados], encontra apoio nos meios probatórios mencionados, está conforme às regras da experiência e não evidencia erro que imponha alteração quanto à alegada utilização nos termos apurados.
O mesmo já não se pode dizer no que respeita ao uso e consumo da água para gastos domésticos por parte dos AA. e antecessores.
Aqui, a utilização da água para mina para consumo próprio, lavar e confecionar alimentos sem interrupção e à vista de toda a gente por parte dos AA. não ficou cabalmente demonstrada.
Note-se que se desconhece o uso que os antecessores – o casal formado por O… e P… – faziam dos prédios então na totalidade a eles pertencentes, conforme já antes referido.
A caseira O… não confirmou a utilização de tal água para esse efeito.
A testemunha AC… referiu que o A. P… ia lá buscar água à mina, mas igualmente referiu que também ele ia.
Mais disse que nessa altura ainda não existia a casa da C…. E afirmou desconhecer a que título era feita tal utilização da água.
Neste contexto, sem outro suporte documental, ou sequer evidências físicas no local apuradas, não bastam as declarações da testemunha AD… para dar como provado que a utilização de tal água para consumo doméstico era feita pelos AA. e antecessores na convicção de a tal terem direito por a água ser de sua propriedade, como provado em 22 dos factos provados, ou por se ter constituído a seu favor enquanto titulares dos prédios mencionados em A) e B) dos factos provados um direito de servidão com tal fim.
Embora não exigida na formação da convicção do julgador uma certeza absoluta, por via de regra não alcançável, quanto à ocorrência dos factos que aprecia, é necessário que da análise conjugada da prova produzida e da compatibilização da matéria de facto adquirida, extraindo dos factos apurados as presunções impostas por lei ou por regras da experiência (vide artigo 607º nº 4 do CPC) se forme no espírito do julgador a convicção de que com muito elevado grau de probabilidade tais factos ocorreram.
Este elevado grau de probabilidade não se julga demonstrado no que respeita à água para consumo.
Do supra exposto e apreciado, impõe-se proceder à alteração da redação dos pontos factuais 2 a 4 e 15, 22 e 23 nos seguintes termos:
“2- Na sequência da escritura referida em E) dos factos provados e pelo menos desde então, os prédios dos AA. referidos em A) e B) e dos RR. referidos em C) e D) eram regados utilizando para o efeito a água represada no interior do prédio referido em C).
3- Para o efeito e pelo menos desde então existiam diversos regos e talhadouros para a água circular.
4- A água referida em J) era também usada para consumo doméstico, para além da rega dos prédios rústicos;
(…)
15- Pelo menos a partir da outorga da partilha referida em E existiam mina, pia, o tanque e os regos, sendo a água levada do E… no prédio referido em C, para rega do prédio referido em A;
(…)
22- Há mais de quarenta anos que o sogro e pai da Autora e marido, H…, construiu a casa referida em B, que passou a ser a sua casa de habitação familiar, utilizando a água através de tubo e rego, sem interrupção, à vista de toda a gente e com a convicção de que naqueles dias tinha direito à água em benefício dos seus prédios referidos em A) e B), bem como o direito de circular e acompanhar a água pelo rego e tubo;
23- Em 2014 os réus tiraram o tubo de plástico que permitia a condução da água e eliminaram a abertura existente na parede norte do E… e que permitia a condução da água para o prédio referido em A;
(…).”
Na sequência do assim decidido, mais resulta que o TP 30 invocado pelos RR. não merece qualquer alteração, pois que é o contrário do que se julgou provado no que à rega respeita. E no que ao consumo doméstico respeita, não apurado este, fica prejudicada a alteração pretendida.
Já no que respeita ao TP 31, a própria testemunha AD… confirmou, que não fizeram, nem custearam obras de limpeza ou reparação da mina, pia e tanque. Depondo portanto neste campo no mesmo sentido das testemunhas dos RR. que sobre tal se pronunciaram.
E assim deverá ser aditado aos factos provados um novo facto, com o nº 26 do seguinte teor:
“26- Os AA. há mais de 20 anos que não fazem limpeza e obras de reparação na mina, tanque e pia”.
Conclui-se portanto pela parcial procedência da pretendida alteração da decisão de facto, nos termos expostos.
***
3) Do direito.
Tendo presente a parcial procedência da alteração da decisão de facto, cumpre apreciar agora do invocado erro de julgamento em sede de direito, nomeadamente como consequência das alterações introduzidas.

Pugnam os recorrentes pela revogação do decidido.
Alegam que nenhuma prova foi feita da serventia do prédio dos RR. para o prédio dos AA. ao tempo da separação do domínio de ambos os RR..
Pelo que inexiste servidão por destinação de pai de família.
Igualmente alegam que tais servidões não se constituíram por usucapião.
Pelo que com base na mesma deveria ter sido julgada improcedente a ação.
E ainda que assim se não entendesse, mais alegam que em causa sempre estaria um direito de servidão sobre a água e não um direito de propriedade.
Servidão que sempre estaria extinta por não uso.
Pelo que sempre deveriam ter sido absolvidos de todos os pedidos, com exceção dos pedidos 1 a 3 da al. A) do pedido que nunca foram causa do litígio.
Por apreciar está ainda a amplitude da condenação em função do que foi julgado provado – atento o que inicialmente se decidiu quanto à invocada “condenação ultra petitum”.
As questões suscitadas serão apreciadas pela ordem elencada.
*
“Servidão predial é o encargo imposto num prédio em proveito exclusivo de outro prédio pertencente a dono diferente; diz-se serviente o prédio sujeito à servidão e dominante o que dela beneficia” – artigo 1543º do CC.
Embora a lei mencione o proveito exclusivo a favor de outro prédio, é claro que o beneficiário do encargo estabelecido é o titular do prédio a favor de quem é estabelecido o encargo e não propriamente o prédio, já que este não é sujeito passível de titularidade de situações jurídicas[5].
As servidões prediais podem ser constituídas “por contrato, testamento, usucapião ou destinação do pai de família.” - artigo 1547º nº 1 do CC.
As servidões legais, na falta de constituição voluntária, podem ser constituídas por sentença judicial ou decisão administrativa, conforme os casos – 1547º nº 2 do CC.
Estando contudo excluídas da constituição por usucapião as “servidões não aparentes”, ou seja aquelas que “não se revelam por sinais visíveis e permanentes” – vide artigo 1548º do CC.

Nos termos do disposto no artigo 1549º do CC e sob a epígrafe “Constituição por destinação de pai de família”,:
“Se em dois prédios do mesmo dono, ou em duas frações de um só prédio, houver sinal ou sinais visíveis e permanentes, postos em um ou em ambos, que revelem serventia de um para com outro, serão esses sinais havidos como prova da servidão quando, em relação ao domínio, os dois prédios, ou as duas frações do mesmo prédio, vierem a separar-se, salvo se ao tempo da separação outra coisa se houver declarado no respetivo documento.”
São pois requisitos da constituição da servidão por destinação de pai de família:
- que dois ou mais prédios ou duas ou mais frações de um mesmo prédio pertençam ao mesmo dono;
- que nestes existam sinais visíveis e permanentes em um ou ambos desses prédios que revelem serventia entre os prédios e
- que ocorra dos mesmos separação sem que nesse momento tenha havido declaração no documento que titula esta que afaste a constituição de tal servidão.
Da análise dos factos provados – com as alterações nos mesmos introduzidas, temos que não se mostra apurado que à data em que os prédios em causa eram todos dos mesmos donos existiam sinais visíveis e permanentes que revelassem a existência de qualquer servidão.
E tal é suficiente para ter por afastado, de forma clara, a constituição de qualquer servidão por destinação de pai de família.

Em segundo lugar cumpre apreciar se da factualidade apurada resulta ter-se constituído por usucapião as servidões em causa, ou mesmo ocorrido a aquisição da propriedade das águas.
Sobre uma água existente ou nascida em prédio alheio é possível quer adquirir a sua propriedade, caso em que o adquirente/proprietário pode usar a mesma como bem entender, desta dispondo e fruindo livremente; quer da mesma fruir ao abrigo de um direito de servidão, caso em que o aproveitamento das suas utilidades está limitado ao conteúdo do seu título constitutivo e das necessidades do prédio dominante em proveito do qual foi constituída.
A escritura referida em E) é o título constitutivo do direito em análise.
E como aí expressamente se diz, aos prédios então adjudicados ao pai do marido da A. ficou a pertencer “duas poçadas de água do E…” sendo uma à segunda e outra à 6ª feira em cada semana e com servidão de rego e caminho para sua condução.
Do acima extratado, realça-se a expressa indicação de que as duas poçadas de água tinham um fim concreto – os prédios adjudicados, o benefício destes prédios.
A nosso ver esta indicação visou limitar o uso da água a esses prédios, ou seja definir que em proveito exclusivo dos mesmos se constituiu o direito às poçadas nos dias concretos.
E se assim é, não foi conferida a propriedade da água ao então pai do marido da A., mas um direito de servidão à mesma por limitado a beneficiar esses mesmos dois prédios.
“O direito à água que nasce num prédio em benefício de um terceiro, conforme o título da sua constituição, pode ser um direito ao uso pleno dessa água, sem qualquer limitação por parte do adquirente da mesma – neste caso, está-se perante a aquisição do direito de propriedade à água -, como pode ser apenas o direito de aproveitar essa água noutro prédio, com as limitações inerentes às necessidades desse prédio de água – caso em que se está perante a constituição de uma servidão à água, constituído sobre o prédio onde esta nasce e/ou é captada (prédio serviente) a favor do outro prédio propriedade do terceiro adquirente da água (prédio dominante).”[6]
Servidão validamente constituída por via contratual e respeitando a forma legal – vide artigo 22º do DL 116/2008.
Assim a existência da servidão, e já não de propriedade, constituída por via contratual não merece a nosso ver discussão e obriga os RR. nos termos apurados – servidão de água e aqueduto (rego e caminho) para a sua condução até ao prédio dos AA. nos termos apurados.
Ainda que assim se não entendesse, a factualidade apurada demonstra também a aquisição por via da usucapião da servidão de água e aqueduto, atenta a utilização que da água conduzida por rego e depois por tubo foi efetuada pelos AA. de forma pública e pacífica até há 14 anos atrás e desde 1943. Pelo que se outro meio constitutivo válido não existisse, sempre por esta via igualmente teria de ser reconhecida a constituição da servidão, de acordo com a utilização que ficou apurada.
A usucapião é a posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo que quando mantida por certo lapso de tempo faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua atuação - artigo 1287º do C.C. .
A posse é o poder que se manifesta quando alguém atua por forma correspondente ao exercício de um direito real (artigo 1251º).
Em caso de dúvida estabelece o artigo 1252º n.º 2 do CC uma presunção de posse naquele que exerce o poder de facto, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 1257º [presunção que bem se entende, atenta a dificuldade de prova que sobre este elemento intelectual poderá recair – cfr. sobre esta presunção e a consequente dispensa de prova de quem detém o poder de facto ou “corpus” de provar a “intenção de agir como titular do direito real correspondente”, Ac. TRC de 25/02/2014, Relator José Avelino Gonçalves in www.dgsi.pt].
Diz-se titulada a posse fundada em qualquer modo legítimo de adquirir, independentemente quer do direito do transmitente quer da validade substancial do negócio jurídico (artigo 1259º).
Diz-se de boa-fé quando o possuidor ignora ao adquiri-la que lesa o direito de outrem. Presumindo-se de boa-fé a posse titulada e de má-fé a não titulada (artigo 1260º).
No que concerne aos imóveis [tanto para o direito de propriedade como como para os demais direitos reais de gozo de acordo com o disposto no artigo 1287º do CC que nos dá a noção de usucapião acima já indicada] e conforme decorre do artigo 1294º, havendo título de aquisição e registo deste, a usucapião tem lugar: a) quando a posse, sendo de boa-fé, tiver durado por dez anos contados desde a data do registo; b) quando a posse, ainda que de má-fé, houver durado quinze anos contados da mesma data.
Não havendo registo do título de aquisição, mas registo da mera posse – artigo 1295º - a usucapião tem lugar: a) se a posse tiver continuado por cinco anos, contado desde a data do registo e for de boa-fé; b) se a posse tiver continuado por dez anos a contar da mesma data, ainda que não seja de boa-fé.
Finalmente e quando não haja nem registo do título nem da mera posse, a usucapião só pode dar-se no termo de quinze anos, se a posse for de boa-fé, e de vinte anos, se for de má-fé (artigo 1296º).
Recorda-se que a má-fé se presume quando a posse seja não titulada, por não ser fundada em modo legítimo de adquirir (1260º nº 2 do CC).
Atento o que está provado em 2) e 15) a 22) dos factos provados, resta concluir também pela constituição da servidão de água e aqueduto em favor dos prédios dos AA. por usucapião, tal como já afirmado.
A pelos RR. invocada extinção pelo não uso improcede atenta a factualidade provada.
Desta mesma factualidade apurada já não procede a pretensão dos AA. em ver reconhecido um direito de propriedade, ou servidão constituída por destinação de pai de família, por constituição voluntária de servidão ou sequer por usucapião no que respeita ao consumo da água para fins domésticos.
Neste conspecto não foi feita qualquer prova da aquisição da água para esse efeito, ou da constituição de tal direito. Implicando a improcedência deste pedido.
Finalmente cumpre apreciar a crítica apontada pelos recorrentes à decisão condenatória ao reconhecer aos AA. o direito a toda a água e todos os direitos de uso, condução e utilização da água que brota da E….
De acordo com o apurado e aliás na linha do alegado, o direito dos AA. sobre a água que brota da E… constituído por via contratual e também adquirido por usucapião nos termos apurados está limitado a dois dias por semana – os indicados em 21 dos factos provados e no período aí igualmente indicado.
Pelo que a condenação tem de refletir esta mesma limitação.
Procede nos termos acima analisados parcialmente o recurso interposto.
***
IV. Decisão.
Pelo exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em julgar parcialmente procedente o recurso apresentado pelos RR. consequentemente e revogando parcialmente a decisão recorrida decidindo :
1) Condenar os RR. a reconhecer o direito de servidão das águas e aqueduto da E… inserida no prédio referido em C) dos factos provados, constituído por via contratual e por usucapião em proveito dos prédios dos AA. descritos em A) e B) dos factos provados nos dias indicados em 21) dos factos provados e nos termos descritos nestes mesmos factos provados;
2) Absolver os RR. dos pedidos de reconhecimento da propriedade dos AA. sobre a água da E… seja para rega ou para consumo;
3) Absolver os RR. do pedido de reconhecimento aos AA. do direito de servidão constituída por destinação de pai de família sobre a água da E… seja para rega ou consumo;
4) Absolver os RR. do pedido de reconhecimento do direito de servidão constituído quer por via contratual quer por usucapião sobre a água da E… para consumo/uso doméstico dessa água e assim do pedido de acesso da autora e seu agregado familiar ao “E…” para captação, transporte, uso e consumo da água para os gastos domésticos do prédio dos AA. identificado em B) dos factos provados.
Consequentemente mais se absolvendo os mesmos da condenação a “absterem-se da prática de atos que obstem a que a autora e o seu agregado familiar acedam ao interior dos prédios dos réus a fim de utilizarem a água;” para consumo doméstico.
5) No mais mantém-se o decidido pelo tribunal a quo.
6) Custas da ação e do recurso pelos RR. e AA. na proporção do vencimento e decaimento que se fixa em ambas as instâncias em ½ para cada um.

Porto, 2021-09-06.
Fátima Andrade
Eugénia Cunha
Fernanda Almeida
____________
[1] cfr. art. 581º n.º 4 do N.C.P.C. e Prof. Anselmo de Castro, in “Lições de Processo Civil”, vol. II, p. 764.
[2] A “causa de pedir é o facto juridicamente relevante do qual dimana a pretensão (o pedido)”, no caso das ações de condenação “por incumprimento contratual, a causa de pedir reside no ato jurídico (negócio jurídico) celebrado entre as partes ou no facto jurídico gerador da obrigação de indemnizar”; no caso das ações reais “(as que tenham por finalidade fazer valer um direito sobre coisas, v. g. (…) servidão (artºs 1550 e ss) (…) a causa de pedir reside no título invocado para a aquisição do direito concretamente pretendido fazer valer ”por via de aquisição derivada ou originária (cfr. Direito Processual Civil, vol. II, Francisco Almeida, ed. 2015, p. 70 (citando J. R. Bastos, Notas, vol. III p. 47 – vide ali nota 86).
[3] vide o mesmo autor in ob. cit., p. 71.
[4] vide António S. Geraldes in “Recursos no Novo Código do Processo Civil, 2ª ed. 2014, anotação ao artigo 662º do CPC, págs. 229 e segs. que aqui seguimos como referência.
[5] Assim é feito o realce na anotação ao artigo 1543º no CC Anotado com coordenação de Ana Prata, ed. Almedina de 2019, vol. II, p. 403.
[6] Cfr. Ac. TRG de 03-05-2018, nº de processo 2108/17.4T8GMR.G1 in www.dgsi.pt