Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
14805/14.1T8PRT-C.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: DOMINGOS MORAIS
Descritores: ACÇÃO EXECUTIVA
SÓCIOS LIQUIDATÁRIOS
OPOSIÇÃO À PENHORA
PRECLUSÃO DO DIREITO
INSOLVÊNCIA DA EXECUTADA
SOCIEDADE
Nº do Documento: RP2019062714805/14.1T8PRT-C.P1
Data do Acordão: 06/27/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NÃO PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ªSECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º295, FLS.229-236)
Área Temática: .
Sumário: I - A substituição processual de sociedade executada, por sócio liquidatário, é extemporânea enquanto não estiver comprovada a sua extinção nos respectivos autos.
II – Dos bens do sócio liquidatário apenas respondem, pelas dívidas da sociedade executada, aqueles que lhe advieram da partilha do seu activo.
III – Mesmo que o executado não tenha deduzido oposição à penhora, a venda dos bens pessoais penhorados fica sem efeito, se em momento anterior à venda, o executado tiver protestado pela sua propriedade, nos termos do artigo 839.º, n.º 1, alínea d), do CPC.
IV – Declarada a insolvência da sociedade executada, a responsabilização do sócio liquidatário apenas poderá ter lugar no âmbito do processo de insolvência.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 14805/14.1T8PRT-C.P1
Origem: Comarca Porto Porto Juízo Trabalho J1.
Relator: Domingos Morais – R 812
Adjuntos: Paula Leal de Carvalho
Rui Penha

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:
I – Relatório
1. - B…, por apenso à acção com processo comum n.º 14805/14.1T8PRT, apresentou, em 19.11.2015, requerimento de execução de decisão judicial condenatória contra C…, Ldª.
2. – Por requerimento, datado de 17.12.2015, a exequente requereu a substituição da sociedade executada, pelo sócio D….
3. – Tal requerimento de substituição foi sustentado na deliberação de dissolução da sociedade executada, aprovada em Assembleia Geral de Sócios, de 29 de outubro de 2015 – cf. “Acta n.º 29”, documento junto a fls. 24 dos autos.
4. – Por despacho de 20.01.2016, foi admitido D… como executado, em substituição da sociedade, C…, Ldª.
5. – D… foi citado, em 28.03.2016, para pagar ou deduzir oposição à execução, não tendo pago, nem deduzido embargos de executado.
6. - Por Auto de penhora de 19.12.2016, foi penhorada a fracção “J” do prédio descrito na CRP de Penafiel, freguesia …, sob n.º 750/19971105 – cf. fls. 29 e v.º do apenso.
7. - Por Auto de penhora de 03.05.2017, foi penhorada a fracção “AR” do prédio descrito na CRP de Penafiel, freguesia …, sob n.º 750/19971105 – cf. fls. 36v. e 37 do apenso.
8. – Os bens penhorados são bens comuns do casal, D… e mulher, que notificados de tais penhoras, não deduziram oposição.
9. – Notificados, o executado D… e mulher, em 29.09.2017, da decisão sobre a data de abertura de propostas para a venda, D… apresentou o seguinte requerimento:
“D…, na qualidade de Liquidatário Judicial de C…, Lda. e Executado nos autos em epígrafe e aí melhor identificado, tendo sido notificado para a abertura de propostas em carta fechada do imóvel da sua propriedade, identificado como, Fracção Autónoma designada pela letra AR destinada a habitação do tipo T3, com a área bruta privativa de 108,50 m2, área bruta dependente de 39,50 m2, com lugar de garagem na cave, localizada no …, com entrada pela Av. …, n.º …, … … – …, freguesia de …, concelho de Penafiel, inscrita na matriz predial urbana daquela freguesia sob o artigo 703-AR, descrita na Conservatória do Registo Predial de Penafiel sob o n.º 750/199971105-AR e constando do Auto de Penhora sob a vebra n.º 2, vem expor e a final requerer a V. Ex.a o seguinte:
O Executado, tendo consultado os autos, verificou que por mui douto requerimento da Exequente, datado de 11 de Dezembro de 2015, foi solicitada a sua intervenção como Liquidatário da sociedade Executada, C…, Lda., nos termos do artigo 162º do Código das Sociedades Comerciais.
Porém, e apesar de ter sido nomeado Liquidatário da sobredita sociedade, em Assembleia Geral Extraordinária reunida para o efeito de Liquidação, apenas, e conforme consta de acta junto aos autos a fls., apresentou em 29 de Outubro de 2015, junto da Autoridade Tributária, Declaração de Cessação da Actividade da mesma em termos de I.V.A., uma vez que, a sobredita sociedade, não se encontrava a laborar e continuava a gerar indiciariamente a liquidação de impostos, o que acarretava maior volume de prejuízos.
Ora, de acordo com o artigo 162º, n.º 1 do C.S.C., prevê que “...As acções em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários...”, porém, no caso em apreço tal sociedade não foi dissolvida, nem liquidada pelo executado, D…, pelo que, em nosso modesto entender, não será de aplicar o artigo 162º do C.S.C. à situação dos autos. Pois, só depois de “...Extinta uma sociedade comercial, a acção ou execução, em que seja parte, prossegue com a generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, sem necessidade de suspender a instância e de habilitar os sucessores para com eles prosseguir os termos da demanda (Ac. RP, de 4-2-1988: BMJ, 374º-539)...”, o que não aconteceu nos presentes autos, pois não foi extinta a sociedade, pelo ora executado na qualidade de Liquidatário.
Até porque, no âmbito do Processo n.º 3854/16.5 T8VNG, que corre seus termos pela Instância Central de Vila Nova de Gaia 2ª Secção de Comércio – J3, foi a mesma declarada Insolvente e a Exequente, no âmbito daquele processo, reclamou e viu reconhecido o seu crédito, facto esse, que é demonstrativo de que a própria Exequente é conhecedora da não dissolução e liquidação da sociedade.
Por via disso, não pode então ser de aplicar o artigo 162º do C.S.C. ao processo em questão e, como tal, não pode prosseguir a presente execução contra o ora Executado, D…, uma vez que, apesar da sua nomeação como Liquidatário, não praticou actos passíveis de dissolução e liquidação da Executada, C…, Lda. e, consequentemente, pela extinção da sociedade, que não aconteceu, ocupar por substituição a posição jurídica desta.
Assim, a contrário, não poderá nos termos do artigo 163º, n.º 1 do C.S.C., o Executado e sócio da Executada/Sociedade responder pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, até ao montante que recebeu na partilha, uma vez que, a mesma não se realizou em virtude do supra referenciado, pelo que, a este nada deverá ser exigido e, como tal, não deverá este ocupar a posição de executado nos presentes autos.
Além disso, e face à qualidade a que foi sujeito, viu o aqui Executado, D…, o seu património penhorado e designada a fase da venda do mesmo, o que de todo se nos afigura, salvo o devido respeito por melhor opinião, um atropelar dos direitos e garantias que ao mesmo assistem.
Nestes termos, e nos melhores de direito que V. Ex.a, doutamente suprirá, deverá ser dada sem efeito a diligência agendada para o dia 06 de Dezembro pelas 9.15 horas, para efeitos de abertura de propostas em carta fechada, relativa ao imóvel propriedade do Executado e penhorado no âmbito dos presentes autos, bem como, ser o Executado, D…, ser considerado parte ilegítima nos presentes autos.”.
10. – A exequente respondeu, dizendo, em resumo, e concluindo:
“TERMOS EM QUE deverá o acima exposto ser admitido e, em consequência, ser liminarmente indeferido o requerimento apresentado pelo Executado D…, por o mesmo carecer de manifesto e evidente fundamento legal, devendo ser ordenada a prossecução dos presentes autos, designando-se novo dia e hora para abertura das propostas já apresentadas.”.
11. – Sobre tal requerimento incidiu o seguinte despacho:
“Requerimentos que antecedem, em que D… se opõe à venda das fracções penhoradas nos autos, e resposta da exequente:
Nos termos do disposto no art.º 160.º, n.º 2 do CSC, a sociedade considera-se extinta, mesmo entre os sócios e sem prejuízo do disposto nos artigos 162.º a 164.º, pelo registo do encerramento da liquidação.
Por sua vez, dispõe o art.º 162.º do mesmo diploma, no seu n.º 1, que as acções em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários nos termos dos artigos 163.º, n.º 2, 4 e 5 e 164.º, ns 2 e 5; dispondo no n.º 2 que a instância não se suspende nem é necessária habilitação.
No caso dos autos, encontra-se junta uma Acta da sociedade executada (Acta n.º 29), a fls. 238 verso e seguintes, datada de 29/10/2015, da qual consta a deliberação de dissolução da sociedade com nomeação do gerente D… como liquidatário da sociedade (fl.s 238 verso e ss).
Por sua vez, não consta dos autos a certidão de registo comercial da sociedade, não obstante já solicitada, e resulta do expediente de fls. 350 que a sociedade executada foi declarada insolvente no âmbito dos autos sob n.º 3854/16.5T8VNG da 2.ª secção de comércio da Comarca do Porto (Vila Nova de Gaia), J3, tendo estes autos sido encerrados por decisão proferida em assembleia de credores em 05/07/2016, por insuficiência da massa, nos termos do disposto no art.º 230.º do CIRE.
Entretanto, por despacho proferido em 25 de Janeiro de 2016, nestes autos, foi ordenado o prosseguimento dos autos contra D…, nos termos do disposto no art.º 162.º do CSC e foram penhoradas duas fracções autónomas (letra AR e letra J) do Edifício sito na Avenida …, n.º …, em …, concelho de Penafiel, propriedade deste D…, sem que se mostre que estes imóveis resultaram da distribuição do activo da sociedade, no âmbito da respectiva liquidação.
Ora, o processo de liquidação das sociedades comerciais obedece ao procedimentos previsto nos artigos 146.ºss do CSC, e traduz-se, como refere o Prof. Dr. António Menezes Cordeiro, no “conjunto de actos que visam pôr termo ao modo colectivo de funcionamento do Direito, perante uma pessoa colectiva. Em termos práticos, a liquidação implica o levantamento de todas as situações jurídicas relativas à sociedade em liquidação, a resolução de todos os problemas pendentes que a possam envolver, a realização pecuniária (se for o caso) dos seus bens, o pagamento de todas as dívidas e o apuramento do saldo final, a distribuir pelos sócios”.
O processo de liquidação, que se desconhece se foi levado o cabo em relação à sociedade executada, tudo levando a crer que não, uma vez que a mesma veio a ser declarada insolvente, visa o pagamento do passivo da sociedade através dos bens que constituem o seu activo.
Porém, não obstante a sociedade passar a ser representada pelo liquidatário, nos termos que vimos, previstos no art.º 162.º do CSC, para efeitos de legitimidade em acções pendentes, tal não significa que os liquidatários (ou os sócios) respondam pelo passivo não satisfeito da sociedade com os seus bens pessoais.
Nos termos do disposto no art.º 163.º do CSC, os antigos sócios só respondem pelo passivo social, não satisfeito ou acautelado, até ao montante que receberam na partilha.
Assim, no caso dos autos, a penhora realizada em bens pessoais do liquidatário D…, que não lhe advieram da partilha do activo da sociedade, mostra-se feita contra legem.
É certo, como refere a exequente, que este não deduziu oposição à penhora assim realizada, no prazo legal de que dispunha para o efeito, apenas tendo vindo levantar esta questão na fase da venda.
Sem prejuízo, sempre se dirá, porém, que em face do regime substantivo vigente, e supra exposto, não poderá manter-se a penhora sobre aquelas fracções e respectiva venda, que constituiriam grave ao direito de propriedade do requerente, constitucionalmente garantido, o que sempre poderia vir a determinar a nulidade da respectiva venda, nos termos do disposto no art.º 838.º, n.º 1, als c) e d) do C.P.C..
Assim, há que repor a validade substantiva dos autos, e determinar o levantamento das penhoras realizadas.
Termos em que determino o levantamento da penhora efectuada:
- sobre a fracção “AR” do prédio descrito na CRP de Penafiel, freguesia …, sob n.º 750/19971105, lavrada através da AP. 1391 de 2017/04/11;
- sobre a fracção “J” do prédio descrito na CRP de Penafiel, freguesia …, sob n.º 750/19971105, lavrada através da AP. 2923 de 2016/11/29.”
12. – A exequente, inconformada, apresentou recurso de apelação em separado,
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13. – O executado não contra-alegou.
14. - O M. Público, junto deste Tribunal, não emitiu parecer, nos termos que constam a fls. 84 dos autos.
15. - Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II. - Fundamentação de facto
1. – Para além da factualidade descrita no Relatório que antecede, consigna-se ainda que:
No despacho de 22.03.2018 consta:
Por sentença, transitada em julgado em 9 de junho de 2016, proferida no âmbito do processo 3854/16.5T8VNG, do Juízo de Comércio de Vila Nova de Gaia, foi declarada a insolvência da aqui executada C…, Lda.”.
III. – Fundamentação de direito
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2. - Objecto do recurso
- A preclusão do direito de oposição às penhoras, na fase da venda dos bens penhorados.
3. - Da preclusão do direito de oposição às penhoras.
3.1. - Nas conclusões de recurso, a exequente/apelante alegou, em síntese:
M) A oposição à penhora constitui o meio específico de oposição à penhora objectivamente ilegal (artºs 784.º e ss do CPC);
N) O prazo de oposição à penhora trata-se de um prazo perentório;
O) O prazo previsto no citado art.º 785.º, nº 1, é perentório, no sentido de que o executado dispõe de 10 dias a contar da notificação do ato de penhora para se opor a esta. Expirado este, ou seja, ultrapassado que esteja o dies ad quem, o termo final do prazo, e não se verificando as referidas condições excepcionais dos nºs 4 e 5 do art.º 139º, o ato praticado é extemporâneo, tendo-se por extinto o direito de o praticar; efeito que se produz automaticamente;
P) Deste modo, todo e qualquer direito a que eventualmente o Executado D… tivesse, passe-se o pleonasmo, direito, o mesmo encontra-se precludido pelo seu não exercício nos prazos legalmente definidos;
Q) Sendo certo que entendimento diferente, tal e qual consta do Douto Despacho recorrido, viola um dos mais elementares e basilares princípios constitucionalmente garantidos às partes, quais sejam o da proteção da confiança, certeza e segurança jurídica;”.
Ora, lendo o teor do despacho recorrido, supra transcrito, verifica-se que o fundamento, para o levantamento das penhoras em causa, radicou no direito substantivo regulado no Código das Sociedades Comerciais (CSC) e não no direito adjectivo previsto no Código de Processo Civil, ou seja, a exequente/apelante “ignorou” por completo a fundamentação substantiva do despacho recorrido.
3.2. - Assim, para que não restem dúvidas sobre o acerto da decisão recorrida, impõe-se consignar o seguinte:
O executado, D…, “aparece” nos presentes autos de execução, na sequência da Assembleia Geral de Sócios, realizada em 29 de outubro de 2015, que deliberou a dissolução da sociedade executada, C…, Ldª, e o nomeou como sócio liquidatário.
Nos termos do artigo 146.º, n.º 2, do CSC, “A sociedade em liquidação mantém a personalidade jurídica e, salvo quando outra coisa resulte das disposições subsequentes ou da modalidade da liquidação, continuam a ser-lhe aplicáveis, com as necessárias adaptações, as disposições que regem as sociedades não dissolvidas.”.
Assim, a substituição da sociedadepela generalidade dos sócios”, em acções pendentes, apenas ocorre após a sua extinção, como determina o artigo 162.º - Acções pendentes – do CSC:
“1 - As acções em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, nos termos dos artigos 163.º, n.os 2, 4 e 5, e 164.º, n.os 2 e 5.
2 - A instância não se suspende nem é necessária habilitação.”. (negritos nossos)
Deste modo, a extinção de sociedade comercial é precedida pela sua liquidação, que, por sua vez, é precedida pela deliberação de dissolução – cf. artigos 146.º e segs, do CSC.
O artigo 160.º - Registo comercial – dispõe:
“1 - Os liquidatários devem requerer o registo do encerramento da liquidação.
2 - A sociedade considera-se extinta, mesmo entre os sócios e sem prejuízo do disposto nos artigos 162.º a 164.º, pelo registo do encerramento da liquidação.” (negritos nossos).
Por outro lado, o artigo 163.º estabelece:
“1 - Encerrada a liquidação e extinta a sociedade, os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, até ao montante que receberam na partilha, sem prejuízo do disposto quanto a sócios de responsabilidade ilimitada.”. (negritos e sublinhado nossos).
Decorre, pois, dos citados normativos do C.S.C. que a substituição processual da sociedade executada, C…, Ldª, pelo sócio/liquidatário D…, foi, de todo, extemporânea, ao arrepio de tais normas.
Na verdade, a exequente não só não provou, como lhe competia – cf. artigo 342.º, n.º 1 do C. Civil – o encerramento da liquidação da sociedade executada e respectivo registo, isto é, não provou a sua extinção, como está provado que foi declarada insolvente: “Por sentença, transitada em julgado em 9 de junho de 2016, proferida no âmbito do processo 3854/16.5T8VNG, do Juízo de Comércio de Vila Nova de Gaia, foi declarada a insolvência da aqui executada C…, Lda.”.
E não tendo provado a extinção da sociedade executada, também não podia provar, como parece óbvio, que os bens pessoais penhorados ao liquidatário, D…, lhe advieram da partilha do activo da sociedade executada, com a agravante de tais penhoras terem ocorrido em datas posteriores à referida declaração de insolvência.
Nos termos do artigo 88.º - Acções executivas – n.º 1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), “1 - A declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência; porém, se houver outros executados, a execução prossegue contra estes.”.
No caso em apreço, o “outro executado” é o liquidatário, D…, ao qual foram penhorados bens imóveis pessoais, após a declaração de insolvência da primitiva executada, C…, Ld.ª.
Neste contexto, a questão que se coloca é a de saber qual a sua responsabilidade no âmbito da presente acção executiva.
Sobre esta temática, o acórdão do TRP, de 11.07.2018, proc. n.º 6870/15.0T8PRT.A.P1, relatado pela ora 1.ª Adjunta, por referência ao artigo 189.º do CIRE, pronunciou-se nos seguintes termos: “(…), havendo a sociedade sido declarada insolvente, pela mesma razão que os credores não podem acionar a sociedade em ações autónomas por forma a fazerem valer os seus créditos contra a sociedade, também tal não pode ter lugar, em ações autónomas, contra o gerente ou administrador, devendo a responsabilização destes ter lugar no âmbito do processo de insolvência, mormente no incidente de qualificação da mesma. O princípio da par conditio creditorum (igualdade dos credores) e a integração dos valores indemnizatórios na massa assim o exige, impondo a igualdade entre os vários credores e impossibilitando que alguns deles possam obter, por via distinta do processo de insolvência, uma satisfação mais rápida ou completa dos seus créditos, sendo a massa insolvente a beneficiária direta dos montantes indemnizatórios devidos pelo gerente/administrador, os quais serão depois distribuídos por todos os credores cujos créditos tenham ficado por satisfazer. E, assim sendo, nas situações cobertas pelo art. 189º, nº 2, al. e), fica prejudicada a possibilidade de acionar a responsabilidade do gerente/administrador fora do quadro legal da responsabilidade insolvencial (isto é, fora do quadro legal previsto no CIRE), mormente por via, senão do efeito da autoridade do caso julgado material que seja formado no âmbito da qualificação da insolvência como culposa, também por via da impossibilidade da lide com a preclusão da invocação de tal responsabilidade se o não for nos termos e tempos previstos no incidente de qualificação da insolvência.
Cfr. Acórdão da Relação de Coimbra de 16.12.2015, Proc. 1430/13.3TBFIG-C.C1, em cujo sumário, no ponto IV, se refere que “IV. No silêncio da lei, e recorrendo ao elemento sistemático, tendo em atenção o princípio “par condito creditorum”, afigura-se que os valores indemnizatórios fixados deverão ser integrados na massa e distribuídos pelos credores cujos créditos, reconhecidos, não hajam obtido satisfação.”. – fim de citação.
Em conclusão: a exequente não só não provou a extinção da sociedade executada, C…, Ld.ª, para efeitos do artigo 163.º do Código das Sociedades Comerciais, como a eventual responsabilização do liquidatário, D…, apenas poderia ter lugar no âmbito do processo de insolvência e não no da presente acção executiva.
3.3. – Uma nota final sobre a alegada preclusão do direito de oposição às penhoras.
Se é verdade que o direito de oposição à penhora deve ser exercido “no prazo de 10 dias a contar da notificação do ato da penhora”, conforme dispõe o artigo 785.º, n.º 1, do, também é certo que nos termos do artigo 839.º, n.º 1, alínea d), do mesmo diploma, a venda de bens penhorados fica sem efeito “d) Se a coisa vendida não pertencia ao executado e foi reivindicada pelo dono.”.
No caso dos autos, D… protestou, antes da venda, pela sua propriedade sobre os bens imóveis penhorados, bens esses que a exequente/apelante não provou terem advindo da partilha do activo da sociedade executada, como se impunha, para que se mantivessem as penhoras e respectiva venda. Não provou, inclusive, a liquidação e a extinção da sociedade executada.
Nas descritas circunstâncias, a venda agendada nos presentes autos seria um acto inútil, proibido por lei - cf. artigo 130.º do CPC .
Assim sendo, improcede o recurso da apelante, com a consequente manutenção do despacho recorrido.
IV – Decisão
Atento o exposto, acórdão os Juízes que compõem esta Secção Social, julgar improcedente o recurso da exequente e, em consequência, manter o despacho recorrido.
Custas a cargo da exequente.

Porto, 2019.06.27
Domingos Morais
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha