Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3754/19.7T8MAI.P2
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULA LEAL DE CARVALHO
Descritores: TREINADOR DE FUTEBOL
DESPEDIMENTO ILÍCITO
RETRIBUIÇÕES INTERCALARES
PERDA DE CHANCE
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
LIMITES DA CONDENAÇÃO
Nº do Documento: RP202303203754/19.7T8MAI.P2
Data do Acordão: 03/20/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSOS PARCIALMENTE PROCEDENTES; ALTERADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I . Tendo o A., treinador de futebol, em atividade profissional iniciada posteriormente ao despedimento ilícito auferido ao serviço de clube de futebol estrangeiro o montante líquido global de €13.500,00 [não decorrendo dos factos provados se efetuou ou não descontos e/ou se a eles estava sujeito], este deverá ser descontado ao montante líquido que corresponda ao ilíquido de €83.802,67 a que aquele tem direito a título de retribuições intercalares decorrente da ilicitude do despedimento.
II - O Acórdão do STJ nº 2/2022 fixou jurisprudência no sentido de que O dano da perda de chance processual, fundamento da obrigação de indemnizar, tem de ser consistente e sério, cabendo ao lesado o ónus da prova de tal consistência e seriedade.
III - Tendo-se embora provado que a Ré, ao despedir ilicitamente o A., o impediu que tivesse muito maior visibilidade e, consequentemente, valor de mercado, de que em concreto o Autor passaria a gozar por ir liderar um plantel de uma equipa da 1ª Liga Portuguesa de Futebol Profissional, tal, só por si, não constitui um dano patrimonial, emergente ou lucro cessante, que seja indemnizável.
IV - E também não é indemnizável, como dano patrimonial, com fundamento na perda de chance, sendo que do facto referido em III apenas resulta uma chance abstrata, no campo das possibilidade gerais, mas não uma chance suficientemente séria, concreta e consistente de que, não fora o despedimento ilícito e o mencionado facto, teria o A. um outro benefício patrimonial, mormente a sua posterior contratação em termos remuneratórios mais favoráveis do que os que se verificam por virtude dessa desvalorização profissional.
V - Os limites da condenação contidos no artigo 609º, nº 1, do CPC, não impede que o valor de um pedido de condenação no pagamento de determinada quantia, porém a título de danos patrimoniais, possa ser atendido em sede de indemnização, mas a título de danos não patrimoniais, desde que assente no mesmo facto ilícito e verificados que sejam os demais pressupostos indemnizatórios deste.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Procº nº 3754/19.7T8MAI.P2
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 1320)
Adjuntos: Des. Rui Penha
Des. Jerónimo Freitas

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório

AA intentou ação declarativa de condenação, com processo comum, contra “A..., Futebol SDUQ, Lda”, pedindo que seja o clube Réu condenado a pagar-lhe:
a) a título de danos patrimoniais:
- uma indemnização no montante de € 225.295,67, correspondente ao somatório das seguintes quantias:
- uma indemnização no valor de €83.801,66 correspondente ao valor da retribuição base que lhe seria devida se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo, nos termos e para os efeitos do disposto na primeira parte do nº1 da cláusula 41ª do CCT entre os treinadores profissionais e os clubes ou sociedades desportivas filiados na Liga Portuguesa de Futebol Profissional, sem a aplicação da dedução prevista na última parte do aludido normativo,
Ou, em alternativa,
- a entender-se ser de fazer tal dedução, que o valor a pagar a este título não seja inferior a €56.375,67;
• uma indemnização no valor de € 50.000,00, correspondente ao valor total dos prémios que venham eventualmente a ser devidos em função dos resultados que venham a ser obtidos pelo Clube Réu até ao final da época desportiva .../..., nos termos e para os efeitos do disposto na primeira parte do nº1 da cláusula 41ª daquele CCT, sem que lhe seja aplicada a dedução prevista na última parte do nº1 da cláusula 41ª do CCT;
• uma indemnização no valor de € 91.494,00, correspondente ao valor da desvalorização profissional sofrida pelo Autor em resultado da conduta do Clube Réu, sem que lhe seja aplicada a dedução prevista na última parte do nº1 da cláusula 41ª do CCT, uma vez que tal limitação apenas está prevista por contrapartida aos montantes ganhos a título de retribuição base;
b) a título de danos não patrimoniais, uma indemnização no montante de €10.000, nos termos e para os efeitos do disposto no nº3 da cláusula 41ª daquele CCT e dos artigos 494º e 496º, nºs 1 e 4 do CC, sem que lhe seja aplicada a dedução prevista na última parte do nº1 da cláusula 41ª do CCT, uma vez que tal limitação apenas está prevista por contrapartida aos montantes ganhos a título de retribuição base;
c) a título de juros, à taxa legal a cada momento em vigor, contados desde a citação do Clube Réu para a presente ação judicial e até efetivo e integral pagamento.
Alegou, em síntese, que, como treinador profissional de futebol, foi admitido ao serviço do Réu para as épocas desportivas de .../... e .../..., mediante contrato de trabalho e “aditamento ao contrato de trabalho”, outorgados em 01 de Agosto de 2018; todavia, em 31 de Julho de 2019, sem que existisse justa causa, foi despedido pela ré, facto que o afetou nos termos que descreve.

Na contestação, a Ré nega que o despedimento tenha sido sem justa causa, tendo o despedimento ocorrido na sequência de profunda reestruturação da mesma e após variadas tentativas de conciliação entre as partes, que se malograram, não tendo tido, a Ré, outra alternativa senão comunicar ao Autor, em 31 de julho de 2019, a cessação do contrato de trabalho, mas, conforme propostas que lhe fez, não aceites por este, não o tendo deixado desprotegido e fragilizado enquanto não beneficiasse de um novo vínculo laboral, mais negando que tenha desprestigiado a imagem e o profissionalismo do Autor, jamais ferindo a sua reputação ou lhe causasse dor ou sofrimento
Sustenta que, no caso de se entender que o Autor tenha direito a uma indemnização, apenas será devido pela Ré o montante global de €36.000,00, pela cessação do contrato de trabalho, para tanto referindo o seguinte que “133. (…) a suposta indemnização devida pela Ré ao Autor teria sempre que ser calculada da seguinte forma:
Relativamente aos meses de agosto e Setembro de 2019, o valor devido pela Ré ao Autor cifra-se em €9000 (…) líquidos, ou seja, €4500 + €4500 (…), referente a cada um dos meses em concreto. No que respeita a estes dois meses, o valor das retribuições mensais é tido em conta na totalidade.
Contudo, para as restantes prestações, nomeadamente as que se referem aos meses de outubro de 2019 a Junho de 2020, as mesmas já terão que ser deduzidas das que eventualmente o Autor venha a auferir pela mesma actividade durante o período em causa. Como o Autor celebrou um novo contrato de trabalho em 1 de outubro de 2019, segundo o qual na sua Cláusula Segunda, sob a epígrafe “RETRIBUCIÓN” auferirá mensalmente o montante de €1500 (…) líquidos, sempre se terá que deduzir aos €4500, €1500, ou seja, €4500-€1500= €3000 (…). Este valor deverá ser multiplicado por 9, pois são 9 os meses devidos pela Ré até que o contrato de trabalho tivesse cessado o seu termo. Assim, €3000x9= €27000 (…). Por fim aos €27000 teremos de somar os €9000 referentes aos meses de agosto e Setembro, o que perfaz a quantia global de €36.000 (…).” Mais diz que, eventualmente, a esse valor poderia acrescer o recebimento do prémio relativo à manutenção da Ré na 1ª Liga Portuguesa de Futebol Profissional, caso a mesma venha a ser alcançada pelo clube Réu, de €20.000,00, pelo que retribuições devidas atingiriam no máximo o montante global de €56.000,00. Mais diz que a quantia de €91.420,00 peticionada pelo Autor a título de desvalorização profissional para além de manifestamente infundada e sem qualquer assento legal, é excessiva.

Foi proferido despacho saneador tabelar, com dispensa da identificação do objeto do litígio e a enunciação dos temas da prova e tendo sido fixado à ação o valor de €235.295,67.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, consta da ata da sessão de 28.06.2021 ter sido proferido pelo Mmº Juiz o seguinte despacho: “Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 3º nº3 do CPC determino que as partes se pronunciem, querendo, quanto ao eventual conhecimento pelo Tribunal aquando da apreciação das matérias em causa, mormente do pedido indemnizatório por danos não patrimoniais, acerca da eventual perda de chance e violação dos princípios de boa fé durante a fase negocial entre as partes. Notifique” e, bem assim, o seguinte: “Deste despacho notifiquei os presentes e de seguida foi dada novamente a palavra ao ilustre mandatário do autor e de seguida à ilustre mandatária do réu que dela usaram.”

Após, foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos:
“Pelo exposto, e sem necessidade de ulteriores considerações, julgo parcialmente procedente por parcialmente provada a presente acção e em consequência:
a) declaro ilicito, por manifesta falta de justa causa e por inexistencia de processo disciplinar, o despedimento do Autor operado pelo Clube Réu;
b) Em consequência, condeno o Clube Réu a pagar ao Autor:
b1) uma indemnização no montante de 70.301,67€ (setenta mil, trezentos e um euros e sessenta e sete cêntimos), nos termos do disposto no n.º1 da cláusula 41.ª (aplicável por forca da respectiva clausula 44.ª, nº3) do C.C.T. aplicável, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da citação do Clube Réu para a presente acção judicial e até efectivo e integral pagamento;
b2) uma indemnização no valor líquido de 20.000,00€ (vinte mil euros), correspondente ao prémio previsto na cláusula 10ª do aditamento ao contrato de trabalho, celebrado em 1 de Agosto de 2018, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da citação do Clube Réu para a presente acção judicial e até efectivo e integral pagamento;
b3) uma indemnização no montante de 10.000,00€ (dez mil euros), a título de danos não patrimoniais, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º3 da clausula 41.ª daquele C.T.T. e nos artigos 494.º e 496.º, n.ºs 1 e 4, do Codigo Civil, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos desde a presente data de prolação da presente sentença até efectivo e integral pagamento;
d) Absolvo o Clube Réu do demais contra si peticionado na presente causa.

Custas por ambas as partes, na proporção do decaimento (art.º 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil e 6.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais e Tabela I-B a ele anexa).”

Inconformada, a Ré recorreu, tendo formulado as seguintes conclusões [já aperfeiçoadas na sequência de despacho da relatora]:

“1. A Ré, aqui Recorrente, não se conforma com a Douta Sentença proferida nos presentes autos.

2. A Douta Sentença faz um errado julgamento da matéria de facto e de direito, o que a torna uma sentença injusta.

3. Primo, é mister salientar que a Recorrente entende que bem andou o Douto Tribunal a quo ao decidir que o Recorrido tem o direito a uma indemnização correspondente ao valor das retribuições que lhe seriam devidas se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo, DEDUZIDAS das que eventualmente venha a auferir pela mesma atividade durante o período em causa.

4. Sucede que, in casu, o Tribunal a quo fez uma manifesta e incorreta aplicação do Direito aos factos no que tange à dedução das retribuições auferidas pelo Recorrido.

5. O artigo 41.º do Contrato Colectivo de Trabalho celebrado entre a Associação dos Treinadores de Futebol e a Liga Portuguesa de Futebol Profissional (publicado no BTE, 1.ª Série, n.º 27, de 22-07-97 e com portaria de extensão no BTE, 1.ª Série, n.º 37, de 10-10-97) - doravante abreviadamente designado por CCT - sob a epígrafe “Responsabilidade da entidade empregadora pela resolução do contrato do treinador”, preceitua que “A resolução do contrato com fundamento nos factos previstos no n.º 1 da cláusula anterior confere ao treinador o direito a uma indemnização correspondente ao valor das retribuições que lhe seriam devidas se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo, deduzidas das que eventualmente venha a auferir pela mesma actividade durante o período em causa” (cfr. artigo 41.º, n.º1, do CCT).

6. O referido preceito legal estabeleceu um valor ressarcitório máximo da indemnização a que o Recorrido poderá almejar dos danos patrimoniais e não patrimoniais efetivamente sofridos com a resolução do contrato sem justa causa pela Recorrente.

7. Ora, remetendo-nos aqui ao caso sub judice, configura-se indubitável que no dia 01 de agosto de 2018, a Recorrente e o Recorrido celebraram um contrato de trabalho desportivo, nos termos do qual convencionaram que o Recorrido exerceria, sob a autoridade e direção da Recorrente, as funções de treinador da equipa principal de futebol masculino sénior desta última, durante o período compreendido entre 01/08/2018 e 30/06/2020, correspondente às épocas desportivas de .../... e .../....

8. Na época desportiva .../..., o Recorrido exerceu a sua atividade profissional ao serviço da Recorrente, tendo, consequentemente, a Recorrente liquidado na íntegra ao Recorrido a importância global ilíquida de € 23.485,00 (vinte e três mil e quatrocentos e oitenta e cinco euros). Neste ensejo, no que respeita à época desportiva .../..., o contrato celebrado foi integralmente cumprido.

9. Sucede que, antes do termo da referida época desportiva (.../...), a Recorrente e o Recorrido, honrando o respeito mútuo que partilhavam, encetaram negociações de modo a lograr a celebração de um acordo de revogação do contrato de trabalho desportivo celebrado, com efeitos a partir da época desportiva .../....

10. Atentos os sucessivos acordos malogrados entre a Recorrente e o Recorrido para a cessação do contrato de trabalho desportivo celebrado, no dia 31 de julho de 2019, a Recorrente comunicou ao Recorrido a cessação de contrato de trabalho desportivo celebrado, com efeitos imediatos.

11. À luz das considerações vertidas, atenta a resolução sem justa causa operada pela Recorrente no dia 31 de julho de 2019, ao abrigo do disposto no artigo 41.º, n.º 1, do CCT, efetivamente o Recorrido tem direito a uma indemnização correspondente ao valor das retribuições que lhe seriam devidas se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo, mas DEDUZIDAS das que eventualmente vier a auferir pela mesma atividade durante o período em causa.

12. Ora, o Recorrido celebrou um contrato de trabalho desportivo, com o respetivo termo inicial reportado a 01 de outubro de 2019 – com o B..., do Grupo IX da “Tercera Divisíon” de Espanha, nos termos do qual o Recorrido passou a exercer a sua atividade de treinador de futebol ao serviço desta Sociedade Desportiva, e a auferir uma remuneração base líquida para a época de .../... de € 13.500 (treze mil e quinhentos euros), a pagar em 9 prestações mensais líquidas, iguais e consecutivas, com início em Outubro de 2019 e término em Junho de 2020, à razão de € 1.500 (mil e quinhentos euros) líquidos por cada um desses meses, (facto provado 35).

13. Na época desportiva .../... - rectius no período compreendido entre 01 de Julho de 2019 e 30 de Junho de 2020 - a Recorrente vinculou-se a pagar ao Recorrido, como contrapartida pelo exercício da sua atividade de treinador de futebol, a importância global ilíquida de 91.420,00€ (noventa e um mil, quatrocentos e vinte euros), a pagar em doze (12) prestações mensais iguais, no valor ilíquido de 7.618,33€ (sete mil, seiscentos e dezoito euros e trinta e três cêntimos) cada, de acordo com o convencionado na clausula Sexta, n.º 2 e respetivo § único, do contrato de trabalho desportivo celebrado.

14. A Recorrente procedeu ao pagamento ao Recorrido da primeira daquelas doze prestações, relativa ao mês de julho de 2019 (no valor ilíquido de € 7.618,33), assim ficando em falta o pagamento ao Autor da remanescente quantia ilíquida de € 83.801,67 (oitenta e três mil, oitocentos e um euros e sessenta e sete cêntimos), relativa às prestações salariais referentes aos meses de agosto de 2019 a junho de 2020.

15. Nesta senda, aplicando-se ao caso concreto o disposto no artigo 41.º, n.º 1, do CCT, à quantia ilíquida de € 83.801,67 (oitenta e três mil, oitocentos e um euros e sessenta e sete cêntimos) devida pela Recorrente ao Recorrido cumpre deduzir o valor das remunerações que o Recorrido auferiu ao serviço do B... nos meses de outubro de 2019 a junho de 2020.

16. Ora é precisamente na fixação desta vertente indemnizatória, ou seja, no CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO PARA AFERIR E FIXAR O QUANTUM INDEMNIZATÓRIO devido pela Recorrente ao Recorrido que, salvo o devido respeito, O TRIBUNAL A QUO ERRA GROSSEIRAMENTE E GRITANTEMENTE NA APLICAÇÃO DO DIREITO AO CASO SUB JUDICE!!

17. Isto porque, ao valor das remunerações mensais ILÍQUIDAS devidas pela Recorrente ao Recorrido, o Tribunal a quo deduziu o valor das remunerações mensais LÍQUIDAS auferidas pelo Recorrido ao serviço do B..., durante o período em causa.

18. Com a devida vénia, a aqui Recorrente NÃO PODE concordar com este entendimento pois o mesmo não está correto.

19. Venerandos Senhores Juízes Desembargadores, ora das duas uma:

- OU o Tribunal a quo ao valor das remunerações mensais ILÍQUIDAS devidas pela Recorrente ao Recorrido deduzia o valor das remunerações mensais ILÍQUIDAS auferidas pelo Recorrido ao serviço do B..., no mesmo período;
- OU o Tribunal a quo ao valor das remunerações mensais LÍQUIDAS devidas pela Recorrente ao Recorrido deduzia o valor das remunerações mensais LÍQUIDAS auferidas pelo Recorrido ao serviço do B..., no mesmo período.
20. O que NÃO PODE é o Tribunal a quo AO VALOR ILÍQUIDO devido pela Recorrente ao Recorrido vir deduzir APENAS O VALOR LÍQUIDO que o Recorrido auferiu no mesmo período ao serviço do B..., considerando valores remuneratórios com natureza diferenciada, o que se consubstancia num ILÍCITO, INADMISSÍVEL E INACEITÁVEL LOCUPLETAMENTO E ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DO RECORRIDO À CUSTA DA RÉ!!!

21. Trata-se, aliás, de um raciocínio lógico-dedutivo, reivindicado pela Ré na sua Contestação nos artigos 132.º, 133.º e 133.º, na qual a Ré pugnou que ao valor das remunerações mensais LÍQUIDAS devidas pela Ré ao Autor, fosse deduzido o valor das remunerações mensais LÍQUIDAS auferidas pelo Autor ao serviço do B..., no mesmo período, conforme as remunerações mensais líquidas constantes do contrato de trabalho celebrado entre o Autor e o B..., junto aos autos pelo Autor.

22. Ora, se a douta sentença recorrida entendeu que para se aferir o quantum indemnizatório devido pela Ré ao Autor, em virtude da rescisão sem justa causa do contrato de trabalho celebrado, deveriam ser consideradas as remunerações mensais ILÍQUIDAS auferidas pelo Autor ao serviço da Ré, sempre teria necessariamente de se deduzir a estas retribuições, as remunerações mensais ILÍQUIDAS auferidas pelo Autor ao serviço do B....

23. Com efeito, no caso sub judice só podem ser compatibilizadas remunerações da mesma natureza, POR VALORES ILÍQUIDOS, porquanto estas remunerações compreendem os inerentes encargos fiscais e sociais.

24. Acresce que, se o Tribunal a quo não dispunha dos elementos probatórios necessários para fixar o valor remuneratório ILÍQUIDO auferido pelo Autor ao serviço do B..., maxime os recibos de vencimento do Autor ao serviço do B... no período compreendido entre 01 de outubro de 2019 e 30 de junho de 2020, nos quais constavam os valores das remunerações mensais ilíquidas auferidas pelo Autor no referido período, necessários para se fixar o cômputo indemnizatório devido ao Autor com base nas suas remunerações ilíquidas, sempre impendia sobre o Tribunal a quo o ónus de prover pela obtenção e junção dos sobreditos documentos ao processo para proferir devidamente a sua decisão.

25. Com o devido respeito, a Douta Sentença a quo vem consagrar a uma INJUSTIFICÁVEL ATRIBUIÇÃO AO AUTOR DE UMA VANTAGEM PATRIMONIAL À CUSTA DA RÉ E UM CONSEQUENTE ENRIQUECIMENTO DO AUTOR À CUSTA DA RÉ, INCORRENDO A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA NUM EVIDENTE EXCESSO DE PRONÚNCIA NA MEDIDA EM QUE SE O TRIBUNAL A QUO NÃO DISPUNHA DOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS SUFICIENTES PARA PROFERIR DEVIDAMENTE A DECISÃO, SEMPRE DEVERIA TER DILIGENCIADO E REQUERIDO OS DOCUMENTOS QUE SE AFIGURAVAM NECESSÁRIOS PARA PROCEDER DEVIDAMENTE E EM CONFORMIDADE AOS CÁLCULOS DO QUANTUM INDEMNIZATÓRIO A ATRIBUIR AO AUTOR, DESIGNADAMENTE, OS RECIBOS DE VENCIMENTO DO AUTOR AO SERVIÇO DO B..., NO PERÍODO COMPREENDIDO ENTRE 01 DE OUTUBRO DE 2019 E 30 DE JUNHO DE 2020, NOS QUAIS CONSTAM OS VALORES DAS REMUNERAÇÕES MENSAIS ILÍQUIDAS AUFERIDAS PELO AUTOR NO REFERIDO PERÍODO!!

26. Inequivocamente, a DOUTA SENTENÇA A QUO PROCEDEU A UMA INCORRETA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DA LEI AO CASO CONCRETO, MORMENTE NO CÁLCULO E FIXAÇÃO DO CÔMPUTO INDEMNIZATÓRIO A ATRIBUIR AO AUTOR!!

27. No que respeita ao modo como foi fixada a sobredita indemnização ao Recorrido, cumpre referir que, nos termos conjugados dos artigos 635.º, nº, 4 e 639.º., nº 1, do CPC, estamos perante circunstância de conhecimento oficioso, padecendo a sentença recorrida de vício de nulidade parcial, quanto à fundamentação que suporta o decidido no ponto b1), por ambiguidade ou obscuridade que a torna ininteligível, conforme o artigo 615.º, nº. 1, al. c) do CPC, que expressamente se invoca para os devidos e legais efeitos.

28. Com a devida vénia, a Douta Sentença a quo faz um errado julgamento na aplicação do Direito ao caso sub judice, o que a torna numa sentença injusta, devendo, consequentemente, a decisão recorrida ser revogada e ser substituída por outra sentença que decida que ao valor das remunerações mensais ILÍQUIDAS devidas pela Recorrente ao Recorrido deverá ser deduzido o valor das remunerações mensais ILÍQUIDAS auferidas pelo Recorrido ao serviço do B..., no período compreendido entre 01 de outubro de 2019 e 30 de junho de 2020.

29. Ora, para se descortinar que valores fiscais foram declarados pelo Recorrido no período em apreço e que montantes foram apurados pelas autoridades tributárias, para efeito de compatibilização de rendimentos ilíquidos a considerar para efeito do cálculo da indemnização, a matéria de facto terá de ser ampliada, o que necessariamente implica a repetição do julgamento no que concerne única e exclusivamente a esta temática.

30. Nestes moldes, pugna-se pela anulação parcial da sentença recorrida, circunscrita à fundamentação do segmento “2ª Questão: Indemnização devida ao Autor” e ao decidido no ponto b1), devendo, consequentemente, os autos baixarem à 1ª. instância para repetição do julgamento nesta parte.

31. Acresce que, a Recorrente entende que estão incorretamente julgados os factos dos pontos 19., 20., 30., 36., 37., 38., 40. dados como provados, quer no que concerne à forma como o Recorrido veio a tomar conhecimento de que não iria ser o treinador da equipa de futebol principal sénior masculina para aquela segunda época desportiva (.../...) objeto do contrato de trabalho que havia celebrado com o Clube Réu - mormente que o Recorrido teve conhecimento de tal situação pela comunicação social - quer no que respeita à alegação de que a Recorrente não logrou em momento nenhum celebrar com o Recorrido qualquer acordo para cessação do contrato de trabalho e, consequentemente, no que respeita aos danos não patrimoniais alegadamente sofridos pelo Recorrido em virtude de tais ocorrências.

32. Desde logo, a Recorrente, na sua Contestação, impugnou por falso o alegado nos artigos 20.º, 23.º, 24.º, 28.º (iii) e 31.º da Petição Inicial.

33. Ora, relativamente aos factos 19. e 20. dados como provados, nos termos dos quais o Tribunal a quo entendeu que “(…) foi pela comunicação social que o Autor veio a tomar conhecimento de que não iria ser o treinador da equipa de futebol principal sénior masculina para aquela segunda época desportiva (.../...) (…)”, os mesmos são totalmente falsos e inverídicos.

34. A testemunha da Ré, BB, de uma forma clara, precisa e demonstrando ter conhecimento direto dos factos, relatou, sem deixar qualquer margem para dúvida, o modo e o momento em que o Recorrido tomou conhecimento de que não iria ser o treinador da equipa de futebol principal sénior masculina para aquela segunda época desportiva (.../...).

35. Acresce que, o depoimento desta testemunha foi ISENTO, SÉRIO e CREDÍVEL, e, portanto, deveria ter disso levado em consideração na Douta Sentença recorrida, QUE NEM SEQUER O APRECIOU!!!

36. Mais flagrante ainda, o próprio Autor e a testemunha do Autor CC, reconhecem expressamente, nos respetivos depoimentos, que foi diretamente pelo Legal Representante da Ré - o Presidente, Sr. DD - que o Autor tomou conhecimento de que não iria ser o treinador da equipa de futebol principal sénior masculina para a segunda época desportiva objeto do contrato (época .../...), conforme depoimentos que constam do ficheiro de áudio da audiência de discussão e julgamento e que se reproduzem infra.

37. Com a devida vénia, resulta sobejamente demonstrado pelos depoimentos acima transcritos, nomeadamente do depoimento de parte do Legal Representante da Ré, das declarações de parte do Autor e dos depoimentos das testemunhas do Autor, CC, e da Ré, BB, assim como dos documentos n.º 8 e n.º 9 juntos pelo Autor, QUE É MANIFESTAMENTE E INTEIRAMENTE FALSO QUE O AUTOR TENHA SABIDO PELA COMUNICAÇÃO SOCIAL, ATRAVÉS DE UMA CONFERÊNCIA DE IMPRENSA DADA PELO MISTER EE, EM 15 DE MAIO DE 2019, DE QUE NÃO IRIA SER O TREINADOR DA EQUIPA PRINCIPAL SÉNIOR MASCULINA DA RÉ PARA A ÉPOCA .../....

38. Conforme resulta provado dos sobreditos depoimentos em sede de audiência de discussão e julgamento, foi logo no início de maio - muito antes do dia 15 ou 19 de maio - que o Autor tomou conhecimento de que não iria ser o treinador da equipa principal da Ré para a época desportiva .../..., pelo próprio Presidente do Clube Réu, na pessoa do Sr. DD, que numa manhã, na sala do pequeno-almoço do Clube Ré, abordou pessoalmente o Autor, chamando-o à parte e lhe deu a conhecer esse intento, tendo o Presidente do Clube Réu, de imediato, proposto ao Autor que continuasse a exercer as suas funções de treinador no clube, potencialmente orientando a sua equipa de Sub-23 masculina, cujo projeto estava na iminência de acontecer.

39. Atente-se que este entendimento resulta das declarações de parte do Autor, do depoimento de parte da Ré e das testemunhas do Autor, CC, e da Ré, BB, tendo todos os seus depoimentos sido consonantes no sentido de o Autor ter sabido de tal intento pelo Presidente do Clube Ré- Sr. DD - quando faltavam algumas jornadas para terminar o campeonato. Ora, se a última jornada do campeonato da época .../... se disputou no dia 12 de maio de 2019, o Autor sempre teria que saber que não iria ser treinador do Clube Réu muito antes de 12 de maio de 2019, pois só aí tem assento a expressão “quando faltavam algumas jornadas para terminar o campeonato”.

40. Portanto, a DOUTA SENTENÇA A QUO tinha que ter dado como provado – O QUE DESDE JÁ SE REQUER – que foi pela Recorrente, através do seu legal representante, Sr. DD, e não pela comunicação social que o Recorrido teve conhecimento de que não iria ser o treinador da equipa de futebol principal sénior masculina para a segunda época desportiva objeto do contrato (época .../...)!!

41. Por outro lado, remetendo-nos agora ao facto 30. que a douta sentença recorrida deu como provado, a Recorrente entende que o mesmo se encontra incorretamente julgado, pelo que não se conforma com a douta sentença recorrida.

42. Com efeito, no supra mencionado facto 30., o Tribunal a quo deu como provado que “O Clube Réu não logrou em momento nenhum celebrar com o Autor qualquer acordo para cessação do contrato de trabalho”.

43. Sucede que, em sede de audiência de discussão e julgamento, a Ré fez prova de que, por diversas vezes, encetou negociações com o Autor para celebrar um acordo para cessação do contrato de trabalho celebrado, tendo manifestamente o Autor rejeitado todas as propostas do Clube Réu, revelando-se, consequentemente, infrutíferas todas as tentativas do Clube Réu para se celebrar o referido acordo para cessação do contrato de trabalho.

44. Aqui chegados, apraz ressaltar que na Assentada, relativamente ao artigo 30.º da petição inicial, o Mmo. Juiz a quo fez constar que PELO LEGAL REPRESENTANTE DA RÉ FOI ADMITIDO QUE NÃO FOI POSSÍVEL O CLUBE RÉU CELEBRAR COM O AUTOR QUALQUER ACORDO DE REVOGAÇÃO DE CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO (cfr. Ficheiro áudio 20210127142720_15575169_2871519, Minuto 01:40:05 a 01:41:47 minutos).

45. ORA, NÃO SER POSSÍVEL O CLUBE RÉU CELEBRAR COM O AUTOR QUALQUER ACORDO DE REVOGAÇÃO DE CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO É TOTALMENTE DISTINTO DE O CLUBE RÉU NÃO TER LOGRADO, EM MOMENTO NENHUM, CELEBRAR COM O AUTOR QUALQUER ACORDO PARA CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO.

46. In veritas veritatis, o Clube Réu logrou, por inúmeras vezes, celebrar com o Autor vários acordos para cessação do contrato de trabalho, almejando encontrar uma solução amigável entre as Partes que se pudesse afigurar como um ponto de encontro comum das vontades das Partes, levando-se, assim, o término da relação contratual com o Autor a bom porto.

47. A este respeito, cumpre, ainda, atentar nos depoimentos das testemunhas do Autor, FF e CC, e da Ré, BB, nos quais as referidas testemunhas reconhecem expressamente a existência de várias propostas do Clube Réu ao Autor para a cessação por mútuo acordo do contrato de trabalho celebrado.

48. Ademais, É TÃO VERDADE E EVIDENTE QUE TAIS PROPOSTAS EXISTIRAM E QUE FORAM FEITAS PELO CLUBE RÉU NÃO SÓ AO AUTOR, COMO AOS DEMAIS MEMBROS DA EQUIPA TÉCNICA, que conforme resulta dos depoimentos da testemunha do Autor, CC, e da Ré, BB, o treinador adjunto do Autor, a ora testemunha CC, ACEITOU UMA DESSAS PROPOSTAS DA RÉ PARA CESSAR DE MÚTUO ACORDO O CONTRATO DE TRABALHO CELEBRADO COM A RÉ.

49. PORTANTO, CONFORME PROVADO EM SEDE DE AUDIÊNCIA DE DISCUSSÃO E JULGAMENTO, DÚVIDAS NÃO RESTAM QUE NÃO PODE SER DADO COMO PROVADO QUE O CLUBE RÉU NÃO LOGROU EM MOMENTO NENHUM CELEBRAR COM O AUTOR QUALQUER ACORDO PARA CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO.

50. Efetivamente, as tentativas de conciliação encetadas entre Autor e Ré repercutiram-se em, pelo menos, duas propostas diferentes apresentadas pela Recorrente ao Recorrido, ambas demonstrativas do respeito e consideração que a Recorrente detinha pelo Recorrido.

51. A PRIMEIRA PROPOSTA APRESENTADA PELA RÉ AO AUTOR consubstanciou-se num convite ao Autor para abraçar um novo projeto que estava na iminência de acontecer, treinar a equipa sub-23 da Ré, conforme ficou provado pelo depoimento de parte do Legal Representante da Ré e pelas testemunhas da Autora, GG e FF, e da Ré, BB.

52. Ora, TENDO O AUTOR REJEITADO A PRIMEIRA PROPOSTA APRESENTADA PELA RÉ, ENTÃO, ESTA ÚLTIMA, VOLTOU A APRESENTAR UMA NOVA PROPOSTA que consistia em continuar a pagar ao Autor as remunerações mensais ilíquidas acordadas para a época desportiva .../... até o Autor arranjar um novo Clube, proposta que o Autor também rejeitou, conforme resultou provado em sede de audiência de discussão e julgamento pelo depoimento de parte do Legal Representante da Ré e pelas testemunhas da Autora, FF, e da Ré, BB.

53. IN CASU, RESULTA INEQUIVOCAMENTE PROVADO NÃO SÓ QUE O CLUBE RÉU LOGROU CELEBRAR COM O AUTOR VÁRIOS ACORDOS PARA CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO, COMO AINDA QUE AS TENTATIVAS DE CELEBRAÇÃO DE TAIS ACORDOS SE PROTELARAM NO TEMPO, NÃO SE TENDO ESGOTADO NUMA ÚNICA TENTATIVA DA RÉ NESSE SENTIDO.

54. Com efeito, a cessação do contrato de trabalho desportivo pela Recorrente foi o culminar de variadíssimas tentativas de conciliação frustradas e diferidas no tempo entre as Partes, não se tendo esgotado num único e inflexível ato da Recorrente.

55. A DOUTA SENTENÇA A QUO tinha que ter dado como provado – O QUE DESDE JÁ SE REQUER – que a Recorrente logrou, por diversas vezes, celebrar com o Recorrido acordos para cessação do contrato de trabalho, não tendo outrossim o Recorrido aceite qualquer um dos vários acordos propostos pela Recorrente para cessação do contrato de trabalho!!

56. À luz das considerações expendidas, sendo MANIFESTAMENTE INVERÍDICOS OS FACTOS 19., 20. E 30. DADOS COMO PROVADOS PELA DOUTA SENTENÇA RECORRIDA - não só que no que respeita a que “foi pela comunicação social que o Autor veio a tomar conhecimento de que não iria ser o treinador da equipa de futebol principal sénior masculina para aquela segunda época desportiva (.../...) objecto do contrato de trabalho que havia celebrado com o Clube Réu”, assim como que “O Clube Réu não logrou em momento nenhum celebrar com o Autor qualquer acordo para cessação do contrato de trabalho” - jamais poderá o Autor vir ancorar as suas alegadas angústias, revoltas, dores, desgostos, sofrimentos e preocupações com o futuro em comportamentos da Ré que NUNCA FORAM PERPETRADOS COM CULPA GRAVE, conforme supra explanado.

57. MANIFESTAMENTE, A RECORRENTE NÃO SE CONFORMA, E NÃO SE PODE CONFORMAR, COM A INDEMNIZAÇÃO NO MONTANTE DE € 10.000,00 (DEZ MIL EUROS), ATRIBUÍDA PELO TRIBUNAL A QUO AO RECORRIDO, A TÍTULO DE DANOS NÃO PATRIMONIAIS, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 3, da clausula 41.ª daquele C.T.T. e nos artigos 494.º e 496.º, n.ºs 1 e 4, do Código Civil.

58. A questão que está aqui em causa é saber se da matéria de facto provada resulta a existência de danos não patrimoniais que justifiquem a concessão de uma satisfação de natureza pecuniária ao Autor, para além dos danos não patrimoniais que se traduzem nos que comummente se verificam em idênticas situações de despedimento.

59. Ora, in casu, a matéria de facto provada não é suficiente para se poder concluir pela existência de danos não patrimoniais de gravidade bastante para merecer a tutela do direito.

60. Com efeito, não só O AUTOR NÃO PROVOU QUE HOUVE VIOLAÇÃO CULPOSA DOS SEUS DIREITOS PELA RÉ, CAUSADORA DE DANOS QUE, PELA SUA GRAVIDADE, MEREÇAM A TUTELA DO DIREITO, ASSIM COMO NÃO PROVOU QUE A CULPA DA RÉ FOI MANIFESTA E QUE OS DANOS SOFRIDOS FORAM OBJETIVAMENTE GRAVES, NÃO PROVANDO, CONSEQUENTEMENTE, O NEXO DE CAUSALIDADE QUE NÃO MEREÇA DISCUSSÃO RAZOÁVEL.

61. Conforme resulta da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, NUNCA A RÉ PERPETROU UMA VIOLAÇÃO CULPOSA DOS DIREITOS DO AUTOR E MUITO MENOS AGIU COM CULPA MANIFESTA. PELO CONTRÁRIO, A RÉ LOGROU, POR DIVERSAS VEZES, CHEGAR A ACORDO COM O AUTOR PARA A CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO CELEBRADO, TENTATIVAS ESSAS QUE SE TRADUZIRAM, NUMA FASE INICIAL, NUMA PROPOSTA PARA O AUTOR TREINAR A EQUIPA DE SUB-23 DA RÉ E, MALOGRADA ESTA TENTATIVA, ALMEJOU, AINDA, CELEBRAR UM NOVO ACORDO COM O AUTOR PARA A CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO POR MÚTUO ACORDO, TENDO PROPOSTO AO AUTOR CONTINUAR A PAGAR-LHE AS RETRIBUIÇÕES MENSAIS ILÍQUIDAS CONVENCIONADAS PARA A ÉPOCA DESPORTIVA .../..., ENQUANTO O AUTOR NÃO ARRANJASSE UM NOVO CLUBE.

62. Estas propostas ilustraram o respeito e consideração que a Ré nutria pelo Autor, aduzindo-se de tal conduta um cuidado e uma preocupação da Ré quanto ao futuro do Autor, não o tendo votado ao abandono quanto ao seu futuro, conforme o Autor erroneamente o pretende fazer crer.

63. Tanto mais que se o Autor alega ter sofrido preocupações quanto ao seu futuro, sempre se dirá que as mesmas apenas duraram pelo período de DOIS MESES, porquanto o Autor apenas esteve “desempregado” nos meses de agosto e setembro de 2021. Pelo que, não se concebe que por tal diminuto período de tempo, o Autor almeje reclamar da Ré uma considerável e avultada indemnização pelos danos não patrimoniais alegadamente sofridos nesse período. Sem prescindir, também sempre se dirá que se eventualmente o Autor sofreu preocupações com o seu futuro - o que por mera cautela de patrocínio se concebe - as mesmas não poderão deixar de ser também imputáveis ao Autor, uma vez que a Ré sempre se disponibilizou a pagar-lhe as retribuições mensais ilíquidas convencionadas para a época desportiva .../... enquanto o Autor não arranjasse um novo clube, obviando, assim, a que o Autor ficasse fragilizado financeiramente. Indubitavelmente, salvo o devido respeito, nunca se poderá considerar que alguém que age com o intento da Ré, age com culpa manifesta.

64. Acresce que, não se extrai da matéria fáctica apurada que aquelas emoções alegadamente sofridas pelo Autor [angústias, revoltas, dores, desgostos, sofrimentos e preocupações com o futuro pelo seu futuro], tenham atingido uma gravidade, profundidade, danosidade ou acentuação tais de modo a causar na sua personalidade moral um prejuízo assinalável, inexistindo, pois, fundamento para indemnizar o Autor por danos não patrimoniais.

65. Destarte, da matéria de facto provada não resultam que os danos não patrimoniais existentes, traduzindo-se nos que comummente se verificam em idênticas situações, sejam legitimadores da tutela do direito, de modo a justificarem uma condenação da Ré pelos mesmos e a atribuição de uma indemnização de natureza pecuniária excecional ao Autor.

66. Atento o exposto, é sem esforço e com naturalidade que podemos e devemos concluir que, in casu, inexistiram, pois, fundamentos que legitimassem a atribuição ao Recorrido de uma indemnização por danos não patrimoniais.

67. E aqui chegados, TENDO RESULTADO INEQUIVOCAMENTE PROVADO NÃO SÓ QUE O AUTOR TOMOU CONHECIMENTO DE QUE NÃO IRIA SER O TREINADOR DA EQUIPA PRINCIPAL DA RÉ PARA A ÉPOCA DESPORTIVA .../..., PELO PRÓPRIO PRESIDENTE DO CLUBE RÉU, NA PESSOA DO SR. DD, COMO AINDA QUE O CLUBE RÉU LOGROU CELEBRAR COM O AUTOR VÁRIOS ACORDOS PARA CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO, somos obrigados a reproduzir tudo o que acima foi explanado quanto à matéria dos danos não patrimoniais, sob pena de nos estarmos a repetir, mormente no que tange à INEXISTÊNCIA DE CULPA GRAVE DA RÉ E INEXISTÊNCIA DE INTENSIDADE DO DANO CAUSADO PELA RÉ, que possam fundamentar a atribuição ao Autor de uma indemnização por danos não patrimoniais, nos termos do artigo 41.º, n.º 3, do CCT.

68. POR FIM, POR TUDO O QUE FOI SUPRA EXPOSTO, COM O DEVIDO RESPEITO, TERÁ NECESSARIAMENTE DE SE CONCLUIR QUE A INDEMNIZAÇÃO ATRIBUÍDA AO RECORRIDO NOS TERMOS DO ARTIGO 41.º DO CCT JÁ COMPENSA DEVIDAMENTE O RECORRIDO PELOS DANOS EMERGENTES DA RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO SEM JUSTA CAUSA PELA OPERADA PELA RECORRENTE, PRETENDENDO O AUTOR OBTER, COM A PROPOSITURA DA AÇÃO, UM ENRIQUECIMENTO ILÍCITO À CUSTA DA RÉ, COMPORTAMENTO ESTE QUE CONSUBSTANCIA UM FLAGRANTE ABUSO DE DIREITO E UMA REPROVÁVEL TENTATIVA DO AUTOR DE LOCUPLETAMENTO ILÍCITO À CUSTA DA RÉ, QUE JAMAIS PODERÁ TER AQUI ARRIMO LEGAL.

Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. Doutamente suprirão, deve o recurso ser julgado totalmente procedente, revogando parcialmente a decisão recorrida e substituindo-a por outra que, na consequência destas alegações, julgue a Contestação da Ré parcialmente provada e procedente, com as devidas consequências legais.”

O A. interpôs recurso subordinado, tendo formulado as seguintes conclusões [já aperfeiçoadas na sequência de despacho da relatora]:
“1. Neste Recurso Subordinado, o Autor, aqui Recorrente, AA, recorre da Douta Sentença proferida no âmbito da presente acção judicial, que, sob a forma de processo comum, tramita como Processo N.º 3754/19.7T8MAI, no Juiz 1 do Juízo do Trabalho da Maia [Tribunal Judicial da Comarca do Porto], e em que é Ré, aqui recorrida, a A..., Futebol SDUQ, LDA., supra designado por clube Réu.
2. No presente recurso subordinado não é impugnada a decisão sobre a matéria de facto, circunstancialismo que em nada contende com as regras sobre os prazos de interposição dos recursos subordinados.
3. Contendo já os autos todos os elementos necessários para o clube Réu pagar ao Autor a indemnização ilíquida de 70.301,67€ (setenta mil, trezentos e um euros e sessenta e sete cêntimos) em que o primeiro foi condenado, deve o mesmo de pronto pagar ao segundo o montante de 36.000,00€ líquidos [em rigor serão 36.047,52€ (trinta e seis mil e quarenta e sete euros e cinquenta e dois cêntimos)], em que tal valor de consubstancia após feitas as deduções impostas por lei [valor líquido que é aceite pelo Clube Réu], acrescidos dos juros vencidos e vincendos contados sobre o montante total (o referido valor ilíquido de 70.301,67€) em apreço.
4. O Autor, aqui recorrente, não se conforma, de todo:
(i) nem com a qualificação de Danos NÃO Patrimoniais, feita pelo Tribunal, no que tange à indemnização de €91.494,00, pedida pelo Autor a título de Danos Patrimoniais e sob a designação de desvalorização profissional;
(ii) nem com o facto de não lhe ter sido atribuído qualquer montante a tal pedido [desvalorização profissional] respeitante.
5. Assim delimitando o objecto do seu recurso à discussão em torno das duas questões supra referidas nas conclusões 4. (i) e 4. (ii), as quais in casu constituem o fundamento específico da recorribilidade, como supra se alegou e infra sintetiza.
6. Na Douta Sentença aqui recorrida, foram dados como PROVADOS os factos nos quais o Autor fez assentar aquele pedido de €91.494,00, atinentes ao que apelidou de desvalorização profissional e deduziu a título de Danos Patrimoniais.
7. Nomeadamente, e entre toda a factualidade dada como provada e para a qual remetemos, foi dado como provado que o Clube Réu fez cessar o contrato unilateralmente e sem nada que o justificasse, não permitindo que o Autor exercesse a actividade profissional para a qual havia sido contratado, apenas pagando uma das doze mensalidades a que estava obrigado, passando para a opinião pública a ideia de falta de capacidade do Autor para treinar o clube na principal liga de futebol em Portugal e impedindo que o A. tivesse muito maior visibilidade e, consequentemente, valor de mercado.
8. Contudo, o Tribunal qualificou tal pedido como feito a título de Danos NÃO Patrimoniais, desconsiderando por completo o supra indicado pedido de €91.494,00 feito a título de Danos Patrimoniais.
9. Ora, na Sentença Recorrida não se diz, preto-no-branco, que não é devida uma indemnização que sirva para ressarcir o Autor da sua desvalorização profissional, apenas se intuindo que o valor da mesma se mostra elevado.
10. Por tudo quanto é referido na factualidade dada como provada, nomeadamente a referida nos respectivos pontos 12., 13., 16., 17., 18., 22., 23., 24., 27., 29., 35., 36., 37., 38. e 39. ressalta que o dano provocado pela conduta ilícita e culposa do clube Réu é inequivocamente de natureza PATRIMONIAL, ideia, aliás, reforçada para o que se diz na Motivação da Matéria de Facto no que tange ao facto provado 24.
11. É ainda verdade que tendo por base o estabelecido nos pontos 12., 24., 35., 36. e 39. da factualidade provada e na Motivação da Matéria de Facto no que tange ao facto provado 24., com uma bastante razoável margem de segurança se chega também à conclusão que ao assinar pelo clube Réu e assim ter deixado de assinar por um clube dos Emirados Árabes Unidos, o Autor deixou de ganhar 87.000,00€, mais 68.903,46€ (sessenta e oito mil, novecentos e três euros e quarenta e seis cêntimos) líquidos do que aquilo a que teve direito por ter ficado a primeira época no clube Réu - (cfr. facto provado 10. e página 2 do documento agora junto pelo Autor).
12. Dito de outro modo, o senhor Juiz a quo, equivocou-se ao empreender a qualificação jurídica do tipo de dano em causa naquele concreto pedido (desvalorização profissional), tendo ficado provada a factualidade que suportava a sua existência e o nexo de causalidade a quem culposamente e ilicitamente o causou (o clube Réu, por meio do concreto modo como contratou e despediu o Autor).
13. Por outras palavras: na Douta Sentença recorrida, de forma errónea classificou-se o concreto dano aqui em apreço como sendo Não Patrimonial e partiu-se desse equívoco para fundamentar a procedência total do pedido por danos não patrimoniais (10.000,00€) autonomamente formulado pelo Autor na P.I., a este título não se condenando em mais (em mais 91.494,003€, conforme o pedido pelo Autor, por exemplo) em razão da proibição legal do ultra petitum, expressamente prevista no artigo 609.º, n.º1 do Código de Processo Civil.
14. Se é verdade que na Douta Sentença recorrida foi exemplarmente julgada a adequada a condenação do clube Réu nos 10.000,00€ (dez mil euros) pedidos pelo Autor a título de danos não patrimoniais, isso em nada, em rigorosamente nada, bule com o direito deste a ver o clube Réu condenado, a título de indemnização por DANOS PATRIMONIAIS, que apelidámos de desvalorização profissional, seja por enquadramento nas classificações de lucro cessante ou de perda de chance, estando in casu verificados os requisitos que justificam qualquer delas.
15. Incumbe ao tribunal proceder a qualificação jurídica que julgue adequada, nos termos do artigo 5.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, contudo deve fazê-lo dentro da fronteira da factualidade alegada e provada e nos limites do efeito prático-jurídico pretendido, sendo-lhe vedado enveredar pela decretação de uma medida de tutela que extravase aquele limite, ainda que pudesse, porventura, ser congeminada por extrapolação da factualidade apurada.
16. Por cautela e dever de patrocínio, sempre nos cabe deixar consignado, atenta a teleologia do positivado no artigo 6.º do Código de Processo Civil e no âmbito do concreto dever de gestão processual ali previsto, que sempre cumpriria ao senhor Juiz a quo, nomeadamente nos termos da parte final do n.º1 de tal preceito – e em ordem a melhor garantir a justa composição do litígio em prazo razoável – ter ouvido, primeiro o Autor e depois o clube Réu, comunicando-lhes previamente a sua intenção de qualificar a indemnização por desvalorização profissional como de natureza não patrimonial, uma vez tendo presente aquela proibição legal do ultra petitum expressamente prevista no artigo 609.º, n.º1 do Código de Processo Civil.
17. Além disso, o senhor Juiz a quo terá achado excessivo o valor peticionado e não valendo de per se a base [o valor da cláusula de rescisão de 2.500.000,00€] a partir da qual o Autor, criteriosa e fundamentadamente chegou a um determinado valor (cfr. artigos 74.º a 97.º da P.I.), porém concluiu o mesmo senhor Juiz, quando se pronuncia sobre os Danos Não Patrimoniais, que no contrato de trabalho em causa estava blindada a saída unilateral do Autor do Clube Réu, precisamente em razão da existência de tal cláusula, logo aí convocando o Ilustre Decisor o necessário recurso à equidade e lembrando o intenso grau de gravidade da culpabilidade do Clube Réu
18. Ora, mutatis mutandis:
(i) Se a existência de tal cláusula rescisória serve para, a jusante, acentuar a gravidade da posterior actuação do clube Réu no cercear da carreira do Autor e da consequente e inevitável desvalorização profissional deste, então também poderá e deverá necessariamente constituir, a montante, um esteio norteador da sua valorização profissional;
(ii) Bem como se se pode e deve recorrer à equidade para cálculo da indemnização em sede de danos não patrimoniais, então, e com ancoramento no disposto nos artigos 4.º, al. a) e 566.º, n.º3, ambos do Código Civil, também poderia e deveria o Tribunal ter a ela recorrido para determinar o quantum da indemnização aqui em apreço, nitidamente de cariz patrimonial.
19. Ao ter sido despedido sem justa causa e sem ter falhado desportivamente na primeira época e sem sequer lhe ter sido permitido trabalhar na segunda, o Autor desvalorizou a quadruplicar:
(i) Passou de um clube da primeira divisão portuguesa – actualmente em quinto lugar naquele principal escalão do futebol português e cujo treinador, jovem e pouco conhecido, está agora, pelo trabalho que teve a oportunidade de fazer no clube Réu, a ser cobiçado por grandes clubes, como é público e notório – para um clube da quarta divisão espanhola, sem qualquer visibilidade;
(ii) Não está a treinar qualquer clube;
(iii) Passou de um ordenado/época (de .../...) de 49.500,00€ (quarenta e nove mil e quinhentos euros) líquidos – correspondente a 11 mensalidades de 4.500,00€ líquidos cada (eram doze, mas foi paga a de Julho de 2019 – para um ordenado/época (de .../...) de 13.500,00€ (treze mil e quinhentos euros) líquidos, numa perda correspondente a 36.000,00€ (trinta e seis mil euros) líquidos.
(iv) Viu o clube Réu assumir dever-lhe tal diferença (36.000,00€ líquidos), a ser condenado judicialmente a fazê-lo, ainda assim continuando sem lha pagar; sendo que, mesmo pagando, a desvalorização do Autor não se esvai, pois a verdade é que é visto como alguém que treinava um clube capaz de lhe pagar 4.500,00€ líquidos/mês, para um que, em Espanha, lhe pagava apenas 1.500,00€/mês e que não lhe deu qualquer visibilidade, apesar de ter realizado uma época com bons resultados desportivos.
20. Estamos perante a existência de uma conduta ilícita do clube Réu (resolução unilateral sem justa causa do contrato de trabalho = despedimento ilícito), com culpa especialmente grave deste, geradora de danos não patrimoniais e patrimoniais, entre estes últimos se devendo considerar, sem qualquer espécie de tibieza, o que apelidámos de desvalorização profissional, pois que contende com factos concretos que encerram em si um desvalor quantificável, uma perda de mercado, um degradar dum posicionamento num circuito fechado de grande competitividade – desvalor, perda e degradar esses que se consubstanciam em objectivas e concretas diminuições de natureza pecuniária, susceceptíveis de serem calculadas.
21. Pelo facto do pedido indemnizatório dos 91.494,00€ respeitantes à desvalorização profissional do Autor ter sido qualificado pelo Tribunal como formulado a título de Dano Não Patrimonial e de ter sido julgado totalmente improcedente, nessa parte a Douta Sentença requerida:
(i) Violou os artigos 5.º, n.º3 e 6.º, n.º1 do Código de Processo Civil.
(ii) Não fez a correcta interpretação do disposto na parte final do n.º1 do artigo 564.º do Código Civil, pois tal a desvalorização profissional em causa configura-se como um lucro cessante tal como está descrito em tal trecho do invocado preceito; isto sem prejuízo de também a podermos, em parte, configurá-la como uma situação de perda de chance.
(iii) Aplicou erroneamente a norma contida no artigo 496.º, n.º3 do Código Civil, quando em seu lugar deveria ter lançado mão daqueloutra norma contida no artigo 566.º, n.º3 do mesmo diploma legal.
22. Deve ser dado sem efeito o segmento da sentença recorrida onde se julgou improcedente o aludido pedido de condenação do clube Réu no montante de €91.494,00 por desvalorização profissional do Autor, e, em consequência substituí-lo por uma decisão que, nesse concreto ponto, condene o clube Réu a pagar tal quantia €91.494,00 ao Autor, a título de Danos Patrimoniais, por desvalorização profissional;
23. ou subsidiariamente por decisão que nesse concreto ponto, e por recurso à equidade, se norteie pelos valores alegados nos pontos XII e XIII das Alegações ou por outros que no V/ Douto Entendimento melhor se coadunem com a factualidade assente nos autos;
24. ou, em alternativa, e revogando-se parcialmente a sentença recorrida, formular às partes, antes de decidir, primeiro ao Autor e depois ao clube Réu, o convite para se pronunciarem sobre a intenção do senhor Juiz a quo considerar o pedido de 91.494,00€ se dever considerar feito a título de danos não patrimoniais.”

A Ré contra-alegou, tendo formulado as seguintes (desnecessária e manifestamente prolixas[1]) conclusões:
“1. Vem o recurso subordinado do Autor interposto da douta decisão proferida pelo Tribunal a quo, em 27/01/2022, que julgou improcedente o pedido de condenação do clube Réu no montante de € 91.494,00 por desvalorização profissional do Autor, e, consequentemente, absolveu a Ré, ora Recorrida, da instância.

2. Em suma, não conformado com tal decisão, interpôs o Autor recurso subordinado onde defende que a alegada desvalorização profissional se consubstancia como um dano de natureza patrimonial, alegando, no essencial, que a douta Sentença recorrida de forma errónea classificou aquele dano como sendo Não Patrimonial e partiu-se desse equívoco para fundamentar a procedência total do pedido por danos não patrimoniais (10.000,00€) feito pelo Autor, não se condenando em mais (em mais € 91.494,003, conforme o pedido pelo Autor, por exemplo) por proibição legal do ultra petitum expressamente prevista no artigo 609.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.

3. Primo, cumpre desde já aqui salientar que a argumentação expendida pelo Autor/Recorrente no seu Recurso Subordinado para além de infeliz, é impertinente e inadequada até para a questão sub judice, pela sua falta de juridicidade!

4. Secundo, as alegações do Autor/Recorrente, salvo o devido respeito, não têm qualquer suporte legal, doutrinal ou mesmo jurisprudencial.

5. Pelo que bem andou o Tribunal a quo ao decidir nos moldes em que o fez quanto à alegada desvalorização profissional do Autor, decisão esta inatacavelmente fundamentada.

6. O Tribunal a quo declarou ilícito por manifesta falta de justa causa e por inexistência de processo disciplinar, o despedimento do Autor operado pela Ré e, consequentemente, condenou a Ré ao pagamento ao Autor de uma indemnização pela justa causa de rescisão do contrato de trabalho pelo Autor, no montante de € 70.301,67 (setenta mil, trezentos e um euros e sessenta e sete cêntimos), nos termos do disposto no n.º 1 da cláusula 41.ª (aplicável por forca da respetiva cláusula 44.ª, nº 3) do CCT aplicável, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da citação do Clube Réu para a presente ação judicial e até efetivo e integral pagamento.

7. Ora, sob pena de repetição e por razões de economia processual, a Ré dá aqui por integralmente reproduzidos todos os argumentos expostos nas respetivas Alegações de Recurso a este respeito. Não obstante, é mister realçar que o artigo 41.º, n.º 1, do Contrato Coletivo de Trabalho entre a Liga Portuguesa de Futebol Profissional e a Associação Nacional de Treinadores de Futebol (doravante designado apenas por CCT), confere ao treinador o direito a uma indemnização correspondente ao valor das retribuições que lhe seriam devidas se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo, DEDUZIDAS das que eventualmente venha a auferir pela mesma atividade durante o período em causa”.

8. Sucede que, apesar de o Douto Tribunal a quo ter andado bem ao decidir que o Recorrido tem o direito a uma indemnização correspondente ao valor das retribuições que lhe seriam devidas se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo, DEDUZIDAS das que eventualmente viesse a auferir pela mesma atividade durante o período em causa, fez uma manifesta e incorreta subsunção do Direito aos factos no que tange à dedução das retribuições auferidas pelo Autor.

9. Com efeito, para aferir o quantum indemnizatório devido pela Ré ao Autor, em virtude da rescisão sem junta causa do contrato de trabalho desportivo celebrado, o Tribunal a quo, ao valor das retribuições ÍLIQUIDAS que seriam devidas pela Ré ao Autor se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo (€ 83.801,67) DEDUZIU o valor das retribuições mensais LÍQUIDAS que o Autor veio a auferir, pela mesma atividade, durante o período em causa, ao serviço do B... (€ 13.500,00), o que na prática se vem a traduzir num flagrante, injustificado e inadmissível locupletamento ilícito do Autor à custa da Ré!!

10. O âmago da questão em apreço é apenas e tão-só o seguinte: se a douta Sentença recorrida entendeu que para se aferir o quantum indemnizatório devido pela Ré ao Autor, em virtude do despedimento ilícito, deveriam ser consideradas as remunerações mensais ILÍQUIDAS auferidas pelo Autor ao serviço da Ré, sempre teriam necessariamente de se DEDUZIR a estas retribuições, as remunerações mensais ILÍQUIDAS auferidas pelo Autor ao serviço do B....

11. Ora, foi justamente no apuramento e fixação do sobredito quantum indemnizatório que o Mmo. Juiz a quo [ao decidir na douta Sentença recorrida que ao valor das retribuições ÍLIQUIDAS que seriam devidas pela Ré ao Autor se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo (€ 83.801,67) fosse DEDUZIDO o valor das retribuições mensais LÍQUIDAS que o Autor veio a auferir, pela mesma atividade, durante o período em causa, ao serviço do B... (€ 13.500,00)] INCORREU NUM MANIFESTO ERRO NO CÁLCULO DO CÔMPUTO INDEMNIZATÓRIO A FIXAR PELA RESOLUÇÃO DO CONTRATO SEM JUSTA CAUSA PELA RÉ, QUE SE TRADUZIU NUMA INJUSTIFICÁVEL ATRIBUIÇÃO AO AUTOR DE UMA VANTAGEM PATRIMONIAL À CUSTA DA RÉ E UM CONSEQUENTE ENRIQUECIMENTO DO AUTOR À CUSTA DA RÉ.

12. Não deixa de ser irrisória e até bizarra a argumentação esgrimida pelo Autor [em sede de Recurso Subordinado], acerca desta temática, na medida em o Autor aduz fervorosamente que é sobre o valor ILÍQUIDO de € 83.801,67 que deve ser calculado o valor das retribuições que seriam devidas pela Ré ao Autor se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo mas curiosamente, numa total contrariedade e desproporcionalidade, não aplica o mesmo critério às retribuições que o Autor auferiu ao serviço do B..., almejando o Autor DEDUZIR apenas e tão-só o valor das retribuições mensais LÍQUIDAS que o Autor veio a auferir, pela mesma atividade, durante o período em causa, ao serviço do B... (€ 13.500,00).

13. Indubitavelmente, a argumentação do Autor para além de inconcebível é escandalosamente tendenciosa: ora quando se trata de apurar o valor das retribuições que seriam devidas pela Ré ao Autor se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo, o Autor é perentório em sufragar que é pelo valor ÍLIQUIDO que tais retribuições terão de ser calculadas mas pasme-se que quando se trata de apurar o valor das retribuições mensais que o Autor veio a auferir, pela mesma atividade, durante o período em causa, ao serviço do B... [e que deverão ser DEDUZIDAS ao valor das retribuições que seriam devidas pela Ré ao Autor se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo] o Autor, numa gritante incoerência de critérios e numa insanável contradição com a argumentação que ele próprio sustenta, visa que tais retribuições sejam calculadas pelo seu valor LÍQUIDO.

14. É POR DEMAIS EVIDENTE QUE O AUTOR INCORRE NUM TOTAL E DESCARADO CONTRASSENSO JURÍDICO, almejando o melhor de dois mundos: ora quando se trata de calcular o valor das retribuições devidas pela Ré ao Autor se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo, deverão ser considerados os VALORES ÍLIQUIDOS de tais retribuições mas quando se trata de calcular o valor das retribuições a deduzir, auferidas pelo Autor, durante o período em causa, ao serviço do B..., então já deverão ser considerados os VALORES LÍQUIDOS de tais retribuições!!!

15. Do exposto, resulta sobejamente demonstrado que o Autor, ao litigar nos moldes supra descritos, incorre num manifesto abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium ao assumir comportamentos sobejamente contraditórios que violam as regras da e os ditames da boa-fé.

16. Inequivocamente, o Autor litiga em termos apoditicamente ofensivos da justiça, almejando ludibriar o douto Tribunal de modo a obter proveitos ilícitos e legalmente reprováveis à custa da Ré. Com efeito, a argumentação do Autor para além de destituída não só de qualquer motivação minimamente válida e coerente, é desprovida de qualquer credibilidade jurídica porquanto manifestamente contraditória e abusiva!!
17. No caso sub judice, impõe-se que o quantum indemnizatório seja fixado segundo os juízos de equidade, sob o princípio regulativo da proporcionalidade. Desta forma, a “ratio” do cálculo da indemnização em referência terá de ser imperativamente a equidade na aplicação dos critérios para apurar e fixar o quantum indemnizatório, o que in casu demanda que ao valor das remunerações mensais ILÍQUIDAS devidas pela Ré ao Autor seja deduzido o valor das remunerações mensais ILÍQUIDAS auferidas pelo Recorrido ao serviço do B..., no período compreendido entre 01 de outubro de 2019 e 30 de junho de 2020.

18. Neste sentido atente-se no douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 06/07/2004, processo n.º 03S2178, disponível em www.dgsi.pt ao decidir que "A dedução, no cálculo do montante das retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde a data do despedimento até à data da Sentença, do valor dos rendimentos do trabalho auferidos pelo trabalhador em atividades iniciadas posteriormente ao despedimento, ABARCA OS RENDIMENTOS ILÍQUIDOS, E NÃO OS RENDIMENTOS LIQUIDADOS APÓS A SUBTRAÇÃO DOS DESCONTOS LEGAIS".

19. Ora, subscrevendo o entendimento do douto Aresto supra referido, dúvidas não restam de que ao valor das retribuições ÍLIQUIDAS que seriam devidas pela Ré ao Autor se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo (€ 83.801,67) terá necessariamente de ser DEDUZIDO o valor das retribuições mensais ILÍQUIDAS que o Autor veio a auferir, pela mesma atividade, durante o período em causa, ao serviço do B....

20. Nesta senda, somos a reiterar que A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA PARA ALÉM DE PERPETRAR UM MANIFESTO ERRO NO CÁLCULO DO CÔMPUTO INDEMNIZATÓRIO A FIXAR PELA RESOLUÇÃO DO CONTRATO SEM JUSTA CAUSA PELA RÉ, INCORREU NUM EVIDENTE EXCESSO DE PRONÚNCIA na medida em que se o Tribunal a quo não dispunha dos elementos probatórios suficientes para proferir devidamente a decisão, sempre deveria ter diligenciado e requerido os documentos que se afiguravam necessários para proceder devidamente e em conformidade ao cálculo do quantum indemnizatório a atribuir ao Autor, nomeadamente, os recibos de vencimento do Autor ao serviço do B..., no período compreendido entre 01 de outubro de 2019 e 30 de junho de 2020, nos quais constam os valores das remunerações mensais ilíquidas auferidas pelo Autor no referido período!!

21. A este propósito, o artigo 651.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, consagra que as partes apenas podem juntar documentos em sede de recurso de apelação, a título excecional, numa de duas hipóteses: superveniência do documento ou necessidade do documento revelada em resultado do julgamento proferido na 1.ª instância.

22. À luz das considerações vertidas, a ora Recorrida, desde já requer, nos termos conjugados dos artigos 429.º e 651.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, que o Autor, ora Recorrente, seja notificado para juntar aos autos os recibos de vencimento do Autor ao serviço do B..., no período compreendido entre 01 de outubro de 2019 e 30 de junho de 2020 [nos quais constem expressamente o valor da remuneração mensal ÍLIQUIDA auferida pelo Autor em cada um dos referidos meses, de modo a apurar-se a componente ilíquida das retribuições mensais auferidas pelo Autor no período em que se encontrou ao serviço do B...], assim como as Declaração de IRS do Autor respeitantes aos anos de 2019 e 2020, de modo a que para se possa apurar devidamente o concreto valor das remunerações mensais ILÍQUIDAS que o Autor auferiu ao serviço do B... e que deverá ser DEDUZIDO ao valor das retribuições ÍLIQUIDAS que seriam devidas pela Ré ao Autor se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo.

23. Por fim, no que tange à pretensão do Autor de que a Ré seja notificada para juntar aos autos, em prazo razoável, o recibo do pagamento ao Autor do salário do mês de julho de 2019 - no valor ilíquido de € 7.618,33 - apraz referir que tal pretensão do Autor se configura totalmente despicienda uma vez que já resulta provado dos presentes autos, e mormente é aceite pela Ré na Contestação, que o valor da remuneração mensal ilíquida de € 7.618,33 do Autor, corresponde à remuneração mensal líquida de € 4.500,00.

24. Sucede que, o Autor, não se conforma com a qualificação de DANOS NÃO PATRIMONIAIS feita pelo Tribunal no que tange àquela indemnização de € 91.494,00 [apelidada pelo Autor de desvalorização profissional] e, muito especialmente, com o facto de não lhe ter sido atribuído qualquer montante a tal pedido respeitante.

25. Ora, partilhamos o entendimento de que bem andou a douta Sentença recorrida ao decidir nos moldes supraditos, não merecendo aqui a Douta decisão do Tribunal a quo qualquer censura.

26. O Autor peticionou uma indemnização no valor de € 91.494,00, que fez corresponder ao valor da desvalorização profissional por si sofrida em resultado da conduta do Clube Réu.

27. A este respeito, alega o Autor o seguinte: “Não teve o Autor qualquer dificuldade ou dúvida em classificar o que apelidou de “desvalorização profissional” como um dano de natureza patrimonial. Do que a propósito alegou nos artigos 74º a 97º da P.I. o autor, não deixou de invocar, com acerto, o estatuído nos artigos 562º a 564º do Código Civil, embora, como o frisou o senhor Juiz a quo, não tivesse caracterizado/qualificado como dano emergente ou lucro cessante”.

28. Ora, em sede de Recurso Subordinado, o Autor arroga-se à pretensa indemnização de € 91.494,00, a título de DANO PATRIMONIAL de desvalorização profissional sofrido, ancorando o referido pedido de indemnização nos artigos 562.º a 564.º do Código Civil.

29. É unânime tanto na Doutrina, como na Jurisprudência, que no contrato de trabalho do praticante desportivo - o qual é extensível aos treinadores - a responsabilidade em caso de despedimento ilícito, afere-se pelo critério legal consagrado no artigo 24.º da Lei n.º 54/2017, de 14 de julho [Regime Jurídico do Contrato de Trabalho do Praticante Desportivo, do Contrato de Formação Desportiva e do Contrato de Representação ou Intermediação], o qual sob a epígrafe preceitua que a “parte que der causa à cessação ou que a haja promovido indevidamente deve indemnizar a contraparte pelo valor das retribuições que ao praticante seriam devidas se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo”

30. Dúvidas não restam de que sempre se aplica ao caso sub judice o artigo 24.º do Lei n.º 54/2017, de 14 de julho e, consequentemente, todo o explanado no artigo 41.º do Contrato Colectivo de Trabalho celebrado entre a Associação dos Treinadores de Futebol e a Liga Portuguesa de Futebol Profissional.

31. A este respeito, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05/05/2010, processo n.º 270/07.3TTOAZ.S1, disponível em www.dgsi.pt [referindo-se ainda à redação anterior do art. 24.º, n.º 1, da atual Lei 54/2017, designadamente, ao art. 27.º, n.º 1, da Lei n.º 28/98], preceituou que “A ré tem razão quando afirma que o art.º 27.º da Lei n.º 28/98 consagra um regime jurídico diferente daquele que a lei prevê para os trabalhadores em geral, no que toca à indemnização por rescisão do contrato de trabalho desportivo com justa causa. E também tem razão quando diz que aquele normativo nos remete para as disposições civilísticas, designadamente para o art.º 562.º e seguintes do Código Civil, referentes à obrigação de indemnização. Na verdade, esse é o entendimento que claramente decorre do teor do n.º 1 do citado art.º 27.º, quando aí se preceitua que “a parte que der causa à cessação ou que a haja promovido indevidamente incorre em responsabilidade civil pelos danos causados em virtude do incumprimento do contrato” (nesse sentido, vide LEAL AMADO, Vinculação Versus Liberdade O Processo de Constituição e Extinção da Relação laboral do Praticante Desportivo”, p. 304 e 305, bem os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 7.3.2007, atrás referido, e de 20.5.2009, proferido no processo n.º 34345/08, da 4.ª Secção, ambos publicados na base de dados jurídico documentais do ITIJ)”.

32. Citando o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11/09/2019, processo n.º 914/14.0TTLSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt “Esta é a jurisprudência desta 4ª Secção e Supremo Tribunal de Justiça, ou seja, a de que a responsabilidade das partes pela cessação do contrato de trabalho desportivo afere-se pelo critério da responsabilidade civil pelos danos causados em virtude do incumprimento do contrato”.

33. É patente que a indemnização devida ao Autor tem de ser calculada nos termos do regime da responsabilidade civil previsto no Código Civil, para que, como já dissemos, o disposto no artigo 24.º, n.º 1, da Lei n.º 54/2017 nos remete.

34. Nos termos desse regime, e como dispõe o artigo 566.º, n.º 2, do Código Civil, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11/09/2019, processo n.º 914/14.0TTLSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt).

35. Nestes moldes, a obrigação de indemnizar, a cargo do causador do dano, a aqui Ré, deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação - art. 562.º do Código Civil.

36. Na definição do citado Civilista, o dano patrimonial é o reflexo do dano real sobre a situação patrimonial do lesado”. Este dano abrange não só o dano emergente ou perda patrimonial, como o lucro cessante ou lucro frustrado, correspondendo este aos “benefícios que o lesado deixou de obter por causa do facto ilícito, mas a que ainda não tinha direito à data da lesão” – cfr. ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, Vol. I, 7ª edição pág. 593.

37. Nesta senda, a indemnização devida ao Autor a título de DANOS PATRIMONIAIS tem de ser calculada nos termos do regime da responsabilidade civil previsto no Código Civil, para que, como já dissemos, o disposto no art. 24.º, n.º 1, da Lei n.º 54/2017, conjugado com o art. 41.º, n.º 1, do CCT, nos remete.

38. Ora, nos termos de tal regime, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data senão existissem danos (art. 566, n.º 2, do CC). Por outras palavras, a indemnização pecuniária a arbitrar ao lesado deve medir-se pela diferença entre a situação real em que o facto lesante deixou o lesado e a situação hipotética em que ele se encontraria sem o dano sofrido – cfr. ANTUNES VARELA, Das Obrigações Em Geral, Vol. I., 10.ª edição, página 907 [vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05/05/2010, processo n.º 270/07.3TTOAZ.S1, disponível em www.dgsi.pt].

39. Conforme resulta da factualidade assente, posteriormente à rescisão do contrato de trabalho desportivo com a Ré, ainda na época de .../... [mais propriamente no período compreendido entre 01 de outubro de 2019 e 30 de junho de 2020], o Autor exerceu a atividade de treinador de futebol profissional sob a autoridade e direção do Clube B..., mediante retribuição. Ora, a retribuição que o Autor auferiu naquele clube, nunca teria auferido se tivesse continuado vinculado à Ré, uma vez que não é legalmente possível a um treinador estar vinculado simultaneamente a dois clubes. Por isso, ao valor das remunerações que o Autor deixou de auferir da Ré haverá a deduzir o valor das retribuições que, naquela época de .../..., o Autor auferiu ao serviço do clube B..., POIS SÓ A DIFERENÇA CONSTITUI O LUCRO CESSANTE E CUMPRE O PLASMADO NOS ARTIGOS 562.º E SEGUINTES DO CÓDIGO CIVIL.

40. Estando provado in casu que o Autor deixou de auferir da Ré as retribuições que dela teria auferido se o contrato tivesse cessado no termo nele previsto [final da época desportiva de .../...] e estando provado que, posteriormente à rescisão do contrato de trabalho com a Ré, o Autor conseguiu entretanto a celebração de um novo contrato de trabalho, com o respetivo termo inicial reportado a 01 de Outubro de 2019 e término em Junho de 2020 [facto provado 35], tendo exercido na restante época desportiva de .../..., a atividade de treinador de futebol profissional, sob a autoridade e direção do clube B..., mediante retribuição, torna-se evidente que, nos termos da teoria da diferença consagrada no art. 566.º, n.º 2, do Código Civil, o Autor só tem direito, a título de indemnização pelos DANOS PATRIMONIAIS devidos pelo despedimento ilícito, à diferença entre a quantia correspondente às retribuições que, por causa da rescisão, deixou de auferir ao serviço da Ré, e o montante das retribuições que, até ao final da referida época desportiva, auferiu ao serviço do clube espanhol B....

41. Conforme preconiza o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 22/06/2017, processo n.º 824/06.5TVLSB.L2.S1, disponível em www.dgsi.pt “O espírito da lei, ao condenar a entidade patronal no pagamento de uma indemnização, pretende que o valor desta compense o trabalhador dos proventos que obteria se o contrato tivesse sido pontualmente cumprido, pretende colocar o trabalhador na situação em que este se encontraria se o contrato fosse integralmente cumprido, INDEMNIZANDO-O, NO MÁXIMO, PELO LUCRO CESSANTE, ou seja, pelos valores que deixou de auferir em consequência da cessação do contrato”.

42. A indemnização plasmada no artigo 41.º, n.º 1, do CCT, consagra o princípio nuclear de que o empregador deve colocar o trabalhador na situação em que este se encontraria se o contrato fosse exatamente cumprido, maxime INDEMNIZANDO-O PELO LUCRO CESSANTE, isto é, pelos benefícios que deixou de obter em consequência da cessação do contrato; ESTE LUCRO CESSANTE É, PRECISAMENTE, A PERDA DAS RETRIBUIÇÕES RELATIVAS AO PERÍODO QUE MEDEIA ENTRE A DATA DA CESSAÇÃO E A DATA PREVISTA PARA A CADUCIDADE DO CONTRATO [assim se pronunciou o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 20/05/2009, processo n.º 08S3445, disponível em www.dgsi.pt].

43. O douto Aresto do Supremo Tribunal de Justiça, de 20/05/2009, processo n.º 08S3445, disponível em www.dgsi.pt, aduz, ainda, que o artigo 41.º do CCT, ao prescrever que ao valor da indemnização deverão ser deduzidas as retribuições que o Autor venha a auferir no exercício da mesma atividade, consagra tão-somente, A REGRA CIVILÍSTICA DA “COMPENSATIO LUCRI CUM DAMNO”, nos termos da qual sempre que o facto constitutivo de responsabilidade tenha produzido ao lesado, não apenas danos, mas também lucros, estes devem compensar-se com aqueles”.

44. Porquanto aquele normativo [artigo 41.º do CCT] remete para as disposições civilísticas, designadamente para o artigo 562.º e seguintes do Código Civil, referentes à obrigação de indemnização, a indemnização devida ao Autor, nos moldes supra descritos, é calculada com base na teoria da diferença contida no art. 566.º, n.º 2, do Código Civil, pelo que o VALOR DO DANO SOFRIDO PELO AUTOR CORRESPONDE AO MONTANTE DAS RETRIBUIÇÕES QUE ELE TERIA AUFERIDO AO SERVIÇO DA RÉ ATÉ AO TERMO DO CONTRATO [LUCRO CESSANTE], DEDUZIDO DO VALOR DAS RETRIBUIÇÕES QUE, NESSA MESMA ÉPOCA DESPORTIVA, AUFERIU AO SERVIÇO DO CLUBE ESPANHOL B.... Consequentemente, é por demais evidente que artigo 41.º, n.º 1, do CCT estipulou um LIMITE MÁXIMO para a indemnização a arbitrar ao praticante desportivo/treinador A TÍTULO DE DANOS PATRIMONIAIS, no caso da resolução do contrato de trabalho sem justa causa pela entidade empregadora.

45. Ora, in casu, logra o Autor ser indemnizado pela alegada desvalorização profissional, que qualifica como um DANO DE NATUREZA PATRIMONIAL, nos termos do estatuído nos artigos 562º a 564º do Código Civil [embora, como o frisou o senhor Juiz a quo, não tivesse caracterizado/qualificado como dano emergente ou lucro cessante].

46. Sucede que, conforme supra se expendeu, a indemnização dos danos de natureza patrimonial, resultantes da resolução do contrato de trabalho desportivo sem justa causa pela Ré, encontra arrimo legal nas disposições conjugadas dos artigos 24.º, n.º 1, da Lei n.º 54/2017, e 41.º, n.º 1, do CCT. Ora, ambos os normativos legais remetem para as disposições civilísticas, designadamente para o art.º 562.º e seguintes do Código Civil, referentes à obrigação de indemnização.

47. Por conseguinte, A INDEMNIZAÇÃO POR DANOS PATRIMONIAIS, ATRIBUÍDA AO AUTOR NOS TERMOS DO ARTIGO 41.º, N.º 1, DO CCT, PARA ALÉM DE JÁ INDEMNIZAR O AUTOR NOS TERMOS DOS ARTIGOS 562.º E SEGUINTES DO CÓDIGO CIVIL, JÁ COMPREENDE A INDEMNIZAÇÃO DO AUTOR PELO LUCRO CESSANTE, consubstanciando-se este LUCRO CESSANTE na perda das retribuições relativas ao período que medeia entre a data da cessação e a data prevista para a caducidade do contrato de trabalho desportivo, ou seja, nos valores que deixou de auferir em consequência da cessação do contrato.

48. Consequentemente, uma vez que a indemnização atribuída ao Autor a título de DANOS PATRIMONIAIS, nos termos do artigo 41.º, n.º 1, do CCT, abarca já todos os DANOS DE NATUREZA PATRIMONIAL SOFRIDOS PELO AUTOR EM VIRTUDE DO DESPEDIMENTO ILÍCITO SENDO JÁ CALCULADA DE ACORDO COM O ESTATUÍDO NOS ARTIGOS 562.º E SEGUINTES DO CÓDIGO CIVIL E ENGLOBANDO IGUALMENTE OS LUCROS CESSANTES SOFRIDOS PELO AUTOR - não pode o Autor arrogar-se, conforme o pretende fazer, ao recebimento de uma outra [autónoma] indemnização pelo DANO PATRIMONIAL de desvalorização profissional, calculada igualmente nos precisos termos dos artigos 562.º e seguintes do Código Civil.

49. Destarte, com a indemnização atribuída nos termos do art. 41.º, n.º 1, do CCT, foi já o Autor devidamente ressarcido pelos danos patrimoniais sofridos em virtude do despedimento ilícito, nos termos dos artigos 562.º a 564.º do Código Civil.

50. Acresce que, a este respeito a douta Sentença recorrida determinou que Do alegado a propósito do invocado “valor da desvalorização profissional” nos artigos 74º a 97º da P.I. o autor, apesar de invocar o estatuído nos artigos 562º a 564º do CC, não enquadra dogmaticamente o invocado “valor da desvalorização profissional” em particular, não caracteriza/qualifica como dano emergente ou lucro cessante.

51. Acontece que, ainda que o Autor tivesse o alegado dano de desvalorização profissional como dano emergente ou lucro cessante - o que manifestamente não fez e o que por mera cautela de patrocínio se concede - sempre se diria, ao abrigo das considerações supra vertidas, que tais danos de natureza patrimonial são já abarcados pela indemnização atribuída ao Autor nos termos do artigo 41.º, n.º 1, do CCT, não tendo manifestamente o Autor direito a receber qualquer indemnização [para além da já atribuída nos termos do artigo 41.º, n.º 1, do CCT] a título de indemnização pelo dano patrimonial de desvalorização profissional.

52. Nesta esteira, conclui-se inequivocamente que a pretensa indemnização que o Autor logra a título de desvalorização profissional apenas poderia ser indemnizável em sede de danos não patrimoniais e nunca em sede de danos patrimoniais.

53. Ademais, cumpre aqui atentar no PEDIDO DO AUTOR na petição inicial, no qual o Autor peticiona “Uma indemnização no valor 91.494,00€ (noventa e um mil, quatrocentos e noventa e quatro euros), correspondente ao valor da desvalorização profissional sofrida pelo Autor em resultado da conduta do Clube Réu, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º3 da cláusula 41.ª daquele C.T.T. e nos artigos 562.ºa 564.º do Código Civil [cfr. supra artigo 96.º do presente articulado]; sem que lhe seja aplicada a dedução prevista na última parte do n.º 1 da cláusula 41.ª do CTT, uma vez que tal limitação apenas está prevista apenas por contrapartida aos montantes ganhos a título de retribuição (retribuição base, entendemos nós)”.

54. Ora, no ARTIGO 96.º DA PETIÇÃO INICIAL, QUE É REFERIDO PELO AUTOR NO PEDIDO PARA PETICIONAR E FUNDAMENTAR O MONTANTE DE € 91.494,00 A TÍTULO DE DESVALORIZAÇÃO PROFISSIONAL, fez constar o Autor o seguinte: “Para quantificar essa concreta perda de valor, devemos fazê-lo de forma criteriosa. Assim, e mantendo a linha objectiva de raciocínio que temos procurado seguir de modo fundamentado desde o início, percorramos o itinerário que agora propomos: sabendo que o valor de 230.000,00€ acima determinado corresponde ao dobro de um valor real contratualizado pelas partes – i.e., o do salário base global para a totalidade das duas épocas desportivas objecto do contrato de trabalho – então, partindo da ratio sintetizada supra no artigo 90.º do presente articulado, é sem esforço e com naturalidade que podemos e devemos objectivamente fixar como concreto quantum do DANO PATRIMONIAL SOFRIDO PELO AUTOR – NO QUE TANGE ESTRITAMENTE À SUA DESVALORIZAÇÃO PROFISSIONAL, TANGÍVEL EM PERDA DE VALOR DE MERCADO E ENCERRANDO EM SI AS VERTENTES DO DANO DE IMAGEM E DE PRESTÍGIO – a grandeza correspondente a metade do valor de 182.988,00€ ali estimado”.

55. Resulta claramente do PEDIDO DO AUTOR, no qual o Autor remete expressamente para o artigo 96.º da petição inicial, que o montante de 91.494,00, peticionado a título dano patrimonial de desvalorização profissional, “TANGE ESTRITAMENTE À SUA DESVALORIZAÇÃO PROFISSIONAL, TANGÍVEL EM PERDA DE VALOR DE MERCADO E ENCERRANDO EM SI AS VERTENTES DO DANO DE IMAGEM E DE PRESTÍGIO” [cfr. art. 96.º da petição inicial], DANOS ESSES QUE MANIFESTAMENTE SE CONSUBSTANCIAM COMO DANOS NÃO PATRIMONIAIS PELOS QUAIS O AUTOR FOI JÁ DEVIDAMENTE RESSARCIDO COM A ATRIBUIÇÃO DE UMA INDEMNIZAÇÃO NO MONTANTE DE € 10.000,00 A TÍTULO DE DANOS PATRIMONIAIS.

56. A douta Sentença recorrida julgou totalmente procedente o pedido de danos não patrimoniais (€ 10.000,00) feito pelo Autor, não podendo, como tal, o douto Tribunal condenar em mais (em mais € 91.494,00, conforme o pedido pelo Autor) POR PROIBIÇÃO LEGAL DO ULTRA PETITUM, expressamente previsto no artigo 609.º, n.º 1 do CPC.

57. Assim bem andou a douto Sentença recorrida ao decidir nos moldes supra descritos, pugnando-se pela manutenção do julgado.

58. Sem prejuízo de se entender que o dano de desvalorização profissional se afigura inequivocamente como um dano de natureza não patrimonial – e, como tal, apenas indemnizável em sede de danos não patrimoniais - debrucemo-nos no quantum em que o Autor computou a pretensa indemnização a título de dano patrimonial de desvalorização profissional, assim na forma de apuramento desse quantum indemnizatório.

59. Para tentar justificar o injustificável, o Autor, salvo o merecido respeito, mune-se ao longo da sua petição inicial, mormente ao longo dos artigos 75.º a 97.º, de um raciocínio absorto, que não tem aqui qualquer arrimo legal, desde logo porque a premissa de que parte o Autor para justificar que tenha tido uma desvalorização profissional de € 91.494,00, para além de totalmente disparatada, está absolutamente errada!

60. A natureza jurídica das cláusulas de rescisão insertas num contrato de trabalho desportivo não tem como escopo o “quantum indemnizatório” de um determinado jogador/treinador, até porque o valor de um treinador é ditado pelas leis do mercado e por um conjunto de variadíssimos fatores, muitos deles externos até ao próprio jogador/treinador.

61. Assim, não se pode a priori lançar mão de uma cláusula de rescisão inserida num determinado contrato de trabalho, para através desta, conjuntamente com o valor remuneratório (base) global contratualizado, apurar o cômputo da valorização de um treinador, sem mais.

62. Mas o Autor foi ainda mais longe, arrogou-se ao direito de poder reduzir o valor da cláusula de rescisão inserida no contrato de trabalho desportivo celebrado, e que se cifrou em € 2.500.000,00, para € 230.000,00, impondo que esse valor servisse de baliza nos dois sentidos.

63. Este comportamento por parte do Autor reflete-se num manifesto abuso de direito, almejando o Autor posicionar-se acima da lei, do legislador e até da vontade das próprias partes!

64. Relembre-se, aqui, que as cláusulas de rescisão inseridas nos contratos dos praticantes desportivos são uma vicissitude contratual, não revestindo a sua inclusão nos contratos carácter de obrigatoriedade.

65. In casu, foi vontade das Partes incluir no contrato de trabalho uma cláusula de rescisão pela cessação do contrato de trabalho antes do termo previsto no mesmo, a ser paga à Ré pelo Autor e não o contrário!

66. Não podemos deixar de dar o reparo de que se a cláusula de rescisão foi inserida no contrato é porque as partes assim o acordaram, e se acordaram é porque da negociação de todos os outros valores em causa (falamos de comissões para empresários e treinadores, salário do treinador, prémios para o treinador, etc.) acharam, as partes, por bem “blindar” aquele contrato com o valor aposto.

67. Assim, no caso concreto, o cômputo indemnizatório, a haver, sempre terá de ser fixado segundo as normas decorrentes do artigo 27.º, n.º 1 da Lei 28/98 [atual artigo 24.º, n.º 1, da Lei 54/2017], por não ter ficado estabelecido no contrato de trabalho qualquer cláusula de rescisão a favor do Autor, onde figurasse o cômputo indemnizatório, no caso do incumprimento do contrato pela Ré.

68. O que jamais poderá acontecer é que o Autor, unilateralmente, possa substituir-se à vontade das partes, logrando alcançar um cômputo indemnizatório, em benefício próprio, através de uma cláusula de rescisão que inexiste a favor do Autor!!

69. Ademais, como o próprio Autor assentiu nos artigos 76.º a 79.º da petição inicial, trazendo à colação os mais ilustres sabedores do Direito, uma cláusula de rescisão é antes de qualquer outra coisa “uma cláusula contratual através da qual se estabelece o montante a pagar à entidade empregadora pelo praticante desportivo que se de demita ante tumpus e sem justa causa(Neste sentido, vide LEAL AMADO, em Temas Laborais II).

70. Por outro lado, como no regime especial do contrato de trabalho desportivo inexiste a figura da denúncia do contrato de trabalho, tal como a conhecemos na lei geral, o trabalhador/treinador fica impossibilitado de, a qualquer momento e de forma livre, proceder à dissolução do seu contrato. Assim, através das cláusulas de rescisão, está na livre autonomia e vontade das partes a previsão numa cláusula do contrato de trabalho desportivo, a possibilidade de denúncia unilateral do contrato, por iniciativa do trabalhador/treinador, mediante determinada prestação pecuniária ao empregador, e vice-versa, sem necessidade de invocação de justa causa.

71. Por outro lado, conforme o entendimento partilhado por J. Z. MARTINS, in Revista do Direito e Justiça, Estudos Dedicados ao Prof. Dr. Da Gama Lobo Xavier, Os Futebolistas Profissionais e as Cláusulas de Rescisão, para a entidade empregadora, para o Clube, há uma maior segurança de poder projetar o seu futuro considerando a criação de um plano a longo prazo, sem temer o assédio dos clubes de maior envergadura financeira aos seus trabalhadores/treinadores e poder ficar, assim, desprotegido, o que não acontece, por via das cláusulas de rescisão.

72. Nisto consiste a natureza jurídica das cláusulas de rescisão, e não no apuramento sem mais, de um suposto valor de valorização ou desvalorização de um determinado trabalhador/treinador. Contudo, foi tão-só isto que o Autor realizou, ou seja, a partir do montante estipulado na cláusula de rescisão previsto no contrato de trabalho celebrado entre as partes que cifra em € 2.500,000,00 e através do valor remuneratório (base) global contratualizado entre o Clube Réu e o Autor, que se cifra em € 114.905,00 que o Autor logrou alcançar o cômputo da sua desvalorização profissional, no valor de € 91.494,00, argumentação que não tem qualquer acolhimento na Lei e com a qual a Ré jamais poderá concordar.

73. Ainda a este respeito, importa elucidar que a Doutrina e a Jurisprudência entendem como desvalorização profissional o que passamos a citar “determinam desvalorização profissional as atividades, acessoriamente exercidas, que se mostrem contrárias à promoção profissional, à melhoria da qualidade de emprego e ao desenvolvimento cultural, económico e social do trabalhador(cfr. art. 3, n.º 3, do Decreto-Lei 401/91, de 16/10) – perfilhando este entendimento vide JORGE LEITE, Flexibilidade Funcional – Questões Laborais, Ano IV, n.º 9-10 e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24/06/2003, processo n.º 0351707, relatado pelo Juiz Conselheiro Ferreira Neto.

74. Assim, o Autor fixa o valor da sua desvalorização profissional através do recurso à clausula de rescisão no valor de € 2.500.000,00 inserida no contrato de trabalho e ao montante correspondente ao salário contratualizado para as épocas desportivas em que vigorava o contrato. Apenas e somente com base nestes dois últimos critérios é que é o alcançado pelo Autor o valor absorto de € 91.494,00, através de um raciocínio improcedente, por frustrar todos os outros fatores que se devem ter em conta para apurar a desvalorização profissional de um trabalhador, como já foi supra referido, e por partir de uma premissa absolutamente errada e descabida, desfigurando a natureza jurídica das cláusulas de rescisão, pelo que aquele valor de € 91.494,00, não tem aqui qualquer assento legal, assim como o não tem a linha de raciocínio expendida pelo Autor para alcançar esse desiderato!!

75. Ainda que o Autor possa vir a fazer alusão a outros fatores determinantes para a perda de valor de mercado e para a sua desvalorização profissional, como os elencados nos artigos 92.º, 93.º e 95.º da petição inicial, a verdade é que na linha de raciocínio do Autor, partindo da ratio sintetizada no artigo 90.º da petição inicial em que este, alegadamente, fixa como concreto quantum do dano patrimonial sofrido pelo Autor o valor de € 91.494,00, esses outros fatores determinantes como o possam ser o “ficar sem trabalho”, o “desprestigio da sua imagem”, o “descrédito do Autor”, etc., em nada contribuíram para o cálculo daquele valor absorto de € 91.494,00. almejado pelo Autor a título de desvalorização profissional.

76. Mas ainda que o Autor tivesse contabilizado estes fatores para aferir dos danos patrimoniais, o que não o fez, sempre se dirá que a INDEMNIZAÇÃO PELO DESPEDIMENTO ILÍCITO DO PRATICANTE DESPORTIVO, IN CASU DO TREINADOR, SEMPRE TERÁ DE SER APURADA ATRAVÉS DAS NORMAS CIVILÍSTICAS, MORMENTE DO PLASMADO NO ARTIGO 562.º E SEGUINTES DO CÓDIGO CIVIL.

77. Apraz também aqui relembrar a este respeito [conforme já supra aludido] LEAL AMADO, em Vinculação vs Liberdade, que sustenta que a OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR nos termos dos artigos 562.º e seguintes do Código Civil estabelece que “quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação. VALE ISTO DIZER QUE O EMPREGADOR DEVE COLOCAR O PRATICANTE DESPORTIVO NA SITUAÇÃO QUE ESTE SE ENCONTRARIA SE O CONTRATO FOSSE EXATAMENTE CUMPRIDO, MAXIME INDEMNIZANDO-O PELO LUCRO CESSANTE, ISTO É, PELOS BENEFÍCIOS QUE O PRATICANTE DEIXOU DE OBTER EM CONSEQUÊNCIA DO DESPEDIMENTO ILÍCITO (vide o art. 564.º, n.º 1, do Código Civil). Consistindo este lucro cessante basicamente, na perda das retribuições relativas ao período que medeia entre a data do despedimento e a data prevista para a caducidade do contrato, a Lei entendeu fixar um teto para aquela indemnização: o valor das retribuições que ao praticante sejam devidas se o contrato tivesse cessado no seu termo”.

78. Mas, continuando a citar LEAL AMADO, em Vinculação vs Liberdade, “porém, assim, FIXADO O LIMITE MÁXIMO DO QUANTUM INDEMNIZATÓRIO, segue-se que a lei não lhe colocou qualquer limite mínimo, bem pelo contrário, àquele valor deverão ser deduzidas as retribuições que, durante o período correspondente à duração fixada para o contrato, o trabalhador venha a receber pela prestação da mesma atividade a outra entidade empregadora”.

79. Ora, desde logo, compreende-se a preocupação do legislador ao estabelecer aqui um LIMITE MÁXIMO DO QUANTUM INDEMNIZATÓRIO DO PRATICANTE DESPORTIVO/TREINADOR, ao contrário do previsto na lei geral do Trabalho que estabelece um limite mínimo, pois sempre se dirá que o contrato de trabalho do praticante desportivo/treinador constitui uma espécie de contrato de trabalho, com um regime legal consagrador da respetivas especificidades e que, por essa mesma razão, repousa, na perspetiva de que é essencial para a realização do projeto desportivos por parte dos empregadores de praticantes desportivos, a possibilidade de alterar periodicamente os planteis, adaptando-os aos objetivos desportivos, mutáveis, que vão sendo traçados, o que se verificou in casu [neste sentido vide o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24/01/2007, processo n.º 06S1821, tendo como relator o Juiz Conselheiro Mário Pereira].

80. Mas volvendo à fixação da indemnização pelo despedimento ilícito do treinador, sempre se dirá que os factos relativos à fixação da indemnização devem ser alegados e provados pelo Autor, nos termos do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil.

81. Ora, o Autor limitou-se a explanar ao longo dos artigos 92.º, 93.º e 95.º da petição inicial, que ficou sem trabalho, desempregado, quando tinha contrato para, pela primeira vez, treinar uma equipa do escalão máximo de futebol nacional, tendo sido tornada pública a mensagem sem qualquer fundamento plausível de que o Autor não reuniria os requisitos de competência necessária, nomeadamente os de experiência e pulso, para exercer de forma capaz o seu trabalho, imagem especialmente destruidora da sua reputação profissional, consubstanciando-se numa perda do seu valor de mercado. Todavia, não se vislumbra aqui, para aferir do valor dos danos patrimoniais sofridos pelo Autor, por isso do cômputo indemnizatório que o Autor cifra em € 91.494,00, de que forma é que os danos efetivamente suportados pelo Autor [os acima referidos] contribuíram para fixar esse valor indemnizatório uma vez que, o Autor apenas se refugia no valor de uma determinada cláusula de rescisão conjugada com o valor remuneratório (base) global contratualizado, para fixar um quantum indemnizatório devido pelos danos sofridos que nada tem que ver com uma cláusula de rescisão ou com um valor remuneratório (base) global contratualizado.

82. Assim sendo, o Autor apenas se limitou a trazer à colação um raciocínio totalmente absorto, desprovido de qualquer fundamento legal, não fazendo qualquer subsunção dos factos elencados nos artigos 92.º, 93.º e 95.º da petição inicial ao Direito, conforme legalmente exigível!

83. Sem prejuízo de todas as considerações supra expostas, sempre se dirá que a indemnização peticionada pelo Autor no valor de € 91.494,00 a título de desvalorização profissional, calculada nos moldes supra descritos, para além de não ter qualquer acolhimento legal, é gritantemente desmesurada, excessiva e, estupefactamente, acaba até por extravasar o valor da indemnização devida pela indemnização do contrato de trabalho desportivo sem justa causa pela entidade empregadora, que o legislador expressamente previu no artigo 41.º, n.º 1 do CCT [A resolução do contrato com fundamento nos factos previstos no n.º 1 da cláusula anterior confere ao treinador o direito a uma indemnização correspondente ao valor das retribuições que lhe seriam devidas se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo, deduzidas das que eventualmente venha a auferir pela mesma atividade durante o período em causa], a qual, in casu, a douta Sentença recorrida fixou em € 70.301,67.

84. Ora, para além de ter sido o escopo do legislador que a fixação deste quantum indemnizatório do artigo 41.º, n.º 1 do CCT já ressarcia devidamente o praticante desportivo/treinador pelo despedimento ilícito, entendeu até o legislador - ao contrário do que sucede na lei geral do Trabalho - fixar um teto para aquela indemnização: o valor das retribuições que ao praticante sejam devidas se o contrato tivesse cessado no seu termo.

85. A quantia de € 91.494,00 peticionada pelo Autor a título de desvalorização profissional para além de manifestamente infundada e sem qualquer assento legal, afigura-se sobejamente desproporcionada sendo inconcebível que um praticante desportivo/treinador venha a receber mais a título de uma alegada desvalorização profissional [in casu calculada com base em critérios galácticos, sem qualquer assento legal, provenientes tão-só de um raciocínio de ilusionismo jurídico do Autor e como tal totalmente desprovido de qualquer credibilidade jurídica e portanto, não merecedor de qualquer tutela do Direito] do que a título da indemnização que expressamente a lei [in casu, o art. 41.º, n.º 1, do CCT] expressamente previu para ressarcir devidamente o praticante desportivo/treinador dos danos patrimoniais advenientes do despedimento ilícito, pelo que sem prejuízo de tudo que supra se aduziu acerca deste tema, deverá manifestamente improceder a pretensão do Autor de ser indemnizado no montante de € 91.494,00 peticionado a título de desvalorização profissional.

86. Aqui chegados, cumpre, ainda, referir que, em sede de Recurso Subordinado, o Autor arroga-se, ainda, a que a indemnização pelo dano patrimonial de desvalorização profissional possa ser atribuída por enquadramento nas classificações de lucros cessantes ou de perda de chance “XVIII. A verdade é que por tudo quanto foi dado como provado e bem fundamentado na Douta Sentença recorrida, e por nós foi supra evidenciado, foi exemplarmente julgada a adequada a condenação do clube Réu nos 10.000,00€ pedidos pelo Autor e isso em nada, rigorosamente nada, bule com o direito deste a ver o clube Réu condenado, a título de indemnização por DANOS PATRIMONIAIS, que apelidamos de desvalorização profissional, seja por enquadramento nas classificações de lucro cessante ou de perda de chance, estando in casu verificados os requisitos que justificam qualquer delas”.

87. É MISTER RESSALTAR AQUI QUE EM MOMENTO ALGUM, EM SEDE DE 1.ª INSTÂNCIA, O AUTOR ALEGOU QUAISQUER FACTOS QUE ENQUADRASSEM A INDEMNIZAÇÃO PETICIONADA POR DANOS PATRIMONIAIS, QUE APELIDOU DE DESVALORIZAÇÃO PROFISSIONAL, NAS CLASSIFICAÇÕES DE LUCRO CESSANTE OU DE PERDA DE CHANCE. MAIS PROPRIAMENTE, NUNCA O AUTOR EM 1.ª INSTÂNCIA, ALEGOU QUAISQUER FACTOS QUE CONFIGURASSEM A ALEGADA DESVALORIZAÇÃO PROFISSIONAL COMO UM LUCRO CESSANTE OU COMO UMA SITUAÇÃO DE PERDA DE CHANCE PARA PETICIONAR A PRETENSA INDEMNIZAÇÃO POR DESVALORIZAÇÃO PROFISSIONAL.

88. Vem agora, em sede de recurso, o Autor alegar que “a desvalorização profissional em causa configura-se como um lucro cessante tal como está descrito em tal trecho do invocado preceito; isto sem prejuízo de também a podermos, em parte, configurá-la como uma situação de perda de chance”.

89. ORA NUNCA, REITERE-SE, NUNCA EM SEDE DE PRIMEIRA INSTÂNCIA O AUTOR PETICIONOU A QUANTIA DE € 91.494,00, A TÍTULO DE ALEGADA DESVALORIZAÇÃO PROFISSIONAL SOFRIDA PELO AUTOR, CONFIGURANDO A SOBREDITA DESVALORIZAÇÃO PROFISSIONAL COMO UM LUCRO CESSANTE OU UMA SITUAÇÃO DE PERDA DE CHANCE SOFRIDA PELO AUTOR.

90. COM EFEITO, EM PRIMEIRA INSTÂNCIA, NUNCA O AUTOR ALEGOU QUAISQUER FACTOS RELATIVOS A QUALQUER LUCRO CESSANTE E/OU PERDA DE CHANCE DO AUTOR QUE FUNDAMENTASSEM A ATRIBUIÇÃO DE UMA INDEMNIZAÇÃO NO VALOR DE € 91.494,00, CORRESPONDENTE AO VALOR DA DESVALORIZAÇÃO PROFISSIONAL SOFRIDA PELO AUTOR. CONFORME RESULTA DOS ARTIGOS 74.º a 97.º DA PETIÇÃO INICIAL, O AUTOR FUNDAMENTOU, UNICAMENTE, A ALEGADA DESVALORIZAÇÃO PROFISSIONAL NA PERDA DE VALOR DE MERCADO, ENCERRANDO EM SI AS VERTENTES DO DANO DE IMAGEM E DE PRESTÍGIO E FOI, ALIÁS, COM BASE NA REFERIDA PERDA DE VALOR DE MERCADO QUE O AUTOR QUALIFICOU O DANO DE DESVALORIZAÇÃO PROFISSIONAL COMO UM DANO DE NATUREZA PATRIMONIAL.

91. A este respeito pronunciou-se o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 31/05/2005, Recurso n.º 256/05 - 4.ª Secção, Relator Mário Pereira, in Assessoria Social do Supremo Tribunal de Justiça Caderno Temático, “OS DANOS NÃO PATRIMONIAIS NA JURISPRUDÊNCIA DA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA”, Sumários da Secção Social 2005 a julho/2021 “Sofrendo o autor danos não patrimoniais de relevo (humilhação no brio e imagem profissional e danos no equilíbrio emocional), por contenderem com a profissionalidade como valor inerente à realização da pessoa humana, deve atribuir-se-lhe uma indemnização por danos não patrimoniais”.

92. Ora, aliás é tão verdade que nunca em sede de 1.ª instância, mormente que nos artigos 74.º a 97.º da petição inicial, nos quais o Autor fundou e fundamentou o pedido de indemnização de € 91.494,00 a título de desvalorização profissional, nunca o Autor configurou ou enquadrou o dano patrimonial de desvalorização profissional como lucro cessante ou situação de perda de chance, que a Douta Sentença recorrida DECIDIU de forma clara que Do alegado a propósito do invocado “valor da desvalorização profissional” nos artigos 74º a 97º da P.I. o autor, apesar de invocar o estatuído nos artigos 562º a 564º do CC, não enquadra dogmaticamente o invocado “valor da desvalorização profissional” em particular, não caracteriza/qualifica como dano emergente ou lucro cessante”.

93. Aliás, NO PRÓPRIO RECURSO SUBORDINADO, O PRÓPRIO AUTOR RECONHECE E CONFESSA QUE NUNCA EM SEDE DE 1.ª INSTÂNCIA CONFIGUROU OU ENQUADROU O DANO PATRIMONIAL DE DESVALORIZAÇÃO PROFISSIONAL COMO LUCRO CESSANTE OU SITUAÇÃO DE PERDA DE CHANCE , afirmando que “Do que a propósito alegou nos artigos 74º a 97º da P.I. o autor, não deixou de invocar, com acerto, o estatuído nos artigos 562º a 564º do Código Civil, embora, como o frisou o senhor Juiz a quo, não tivesse caracterizado/qualificado como dano emergente ou lucro cessante”.

94. Ora, conforme decidiu o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 14/01/2014, processo n.º 154/12.3TBMGR.C1, disponível em www.dgsi.pt. AS QUESTÕES NOVAS SUSCITADAS PELA PARTE APENAS EM SEDE DE RECURSO, QUE NÃO FORAM ALEGADAS OPORTUNAMENTE, NEM CONSIDERADAS PELO TRIBUNAL, NOS TERMOS DO ART. 608 Nº 2, DO CPC, NÃO PODEM POR ISSO SER LEVADAS EM CONTA, ESTANDO VEDADA A SUA APRECIAÇÃO AO TRIBUNAL DE RECURSO.

95. E o Autor, no Recurso Subordinado, RECONHECE E ANUI NISSO MESMO ao declarar que “XIX. É verdade que incumbe ao tribunal proceder a qualificação jurídica que julgue adequada, nos termos do artigo 5.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, mas dentro da fronteira da factualidade alegada e provada e nos limites do efeito prático-jurídico pretendido, sendo-lhe vedado enveredar pela decretação de uma medida de tutela que extravase aquele limite, ainda que pudesse, porventura, ser congeminada por extrapolação da factualidade apurada”.

96. Ainda, no Recurso Subordinado, na Parte “C.2] - Da discordância do Autor quanto ao decidido na Douta Sentença: o fundamento específico da recorribilidade [2ª Parte]”, designadamente nos Pontos 11., 12., 13. e 14., o Autor pretende descaradamente ludibriar o douto Tribunal pois, de uma forma camuflada, tenta trazer à colação o instituto jurídico da perda de chance - relembre-se em momento algum alegado na sua petição inicial – almejando, voluntariamente e astutamente, confundi-lo com o instituto da desvalorização profissional alegado pelo Autor na sua petição, para, por vias travessas, lograr alcançar os proveitos de uma perda de chance através de uma desvalorização profissional, o que é legalmente inconcebível!!

97. A este propósito, em primeiro lugar, há que ter em conta que, no processo civil, vigorando o princípio do dispositivo, o juiz está impedido de levar em consideração factos que não foram alegados pelas partes, nos termos do estabelecido no art. 5.º do CPC.

98. Consagra o art. 5.º do CPC, que o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante ao direito, mas só pode servir-se dos factos articulados pelas partes. Esta norma, consagra o princípio do dispositivo, de acordo com o qual, conforme dispõe o seu n.º 1, às partes cabe alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções. O juiz só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes, ainda que, conforme acrescenta o n.º 2 deste artigo, sem prejuízo dos factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa.

99. Constata-se, assim, que o poder de cognição do juiz, no que se refere aos factos, está, no essencial, (excecionando os factos instrumentais, complementares, factos notórios ou aqueles de que o tribunal tenha conhecimento por virtude das suas funções) limitado aos factos concretos que são alegados pelo Autor e que integram a causa de pedir que serve de base à sua pretensão e que são alegados pelo Réu fundamentando as exceções que invoca.

100. Atente-se, ainda, no princípio da estabilidade da instância consagrado no artigo 260.º do CPC cuja sua razão de ser é clara: evitar que o tribunal seja surpreendido com novas questões para resolver ao longo do processo e que, por causa disso, se prejudique o normal andamento da causa. (DR. NUNO ANDRADE PISSARA NO TRABALHO O conhecimento de Factos Supervenientes Relativos ao Mérito da Causa pelo Tribunal de Recurso em Processo Civil, Revista da Ordem dos Advogados, vol. I, 2012, pp. 287 ss. e acessível no site http://www.fd.ulisboa.pt/professores/corpo-docente/nuno-andrade-pissarra/ que consultei no dia 28.04.2016).

101. Diz-nos o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 19/06/2001, in www.dgsi.pt que: SE DETERMINADA MEDIDA DE TUTELA JURÍDICA NÃO TIVER SIDO OPORTUNAMENTE PEDIDA OU DETERMINADOS FACTOS NÃO TIVEREM SIDO ALEGADOS, O PRINCÍPIO DO DISPOSITIVO OBSTA A QUE O TRIBUNAL DELES CONHEÇA, SOB PENA DE NULIDADE, POIS NESSE CASO HAVERÁ EXCESSO DE PRONÚNCIA, OU PRONÚNCIA INDEVIDA, NA MEDIDA EM QUE O JULGADO NÃO COINCIDE COM O PEDIDO OU COM A CAUSA DE PEDIR.

102. Em igual sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 14/01/2014, processo n.º 154/12.3TBMGR.C1, disponível em www.dgsi.pt., estatuiu que A RESPOSTA DADA PELO TRIBUNAL SOBRE FACTOS QUE NÃO FORAM ALEGADOS PELAS PARTES E QUE NÃO INTEGRAM A CAUSA DE PEDIR, É EXCESSIVA, PELO QUE TAIS FACTOS NÃO PODEM SER CONSIDERADOS NA DECISÃO”.

103. Dessarte, ao arrepio de todas as considerações supra entretecidas, e mormente ao abrigo dos artigos 5.º e 608.º, n.º 2, e 260.º do CPC, não pode manifestamente o Douto Tribunal de Recurso conhecer de factos que não foram alegados pelo Autor e que não integram a causa de pedir, pelo que, uma vez que no caso sub judice nunca o Autor, quer na causa de pedir, quer no pedido, alegou quaisquer factos que enquadrassem ou configurassem o dano patrimonial de desvalorização profissional nas classificações de lucro cessante ou de perda de chance, não podem agora ser considerados na decisão quaisquer pretensos lucros cessantes e/ou perda de chance, sob pena de excesso de pronúncia ou pronúncia indevida e sob pena de violação do princípio da estabilidade da instância.

104. Por fim, é mister relevar que o Autor, em sede de Recurso Subordinado, se limita praticamente a elencar e reproduzir os factos dados como provados na sentença recorrida sem, no entanto, fazer qualquer subsunção dos referidos factos ao Direito, que imponham uma decisão diversa da decisão proferida em 1.ª instância, no que tange ao alegado dano de desvalorização profissional sofrido pelo Autor.

105. Consequentemente, o Recurso Subordinado do Autor não vem aditar nada de novo em relação ao que já foi apreciado e decidido pelo Mmo. Juiz a quo na douta Sentença recorrida, não tendo qualquer suporte legal, doutrinal ou mesmo jurisprudencial, limitando-se o Recurso Subordinado do Autor, essencialmente, a reproduzir a matéria de facto dada como provada em 1.ª instância, não aduzindo quaisquer fundamentos de Direito que imponham uma decisão diversa no que concerne ao pedido de indemnização no valor de € 91.494,00, correspondente ao valor da desvalorização profissional sofrida pelo Autor em resultado da conduta do Clube Réu.

106. Em suma, com o devido respeito, a correta subsunção dos factos dados como provados ao Direito imporá, a nosso modesto ver, que sem mantenha a decisão da douta Sentença recorrida, improcedendo totalmente o pedido do Autor de indemnização no valor de € 91.494,00, correspondente ao valor da desvalorização profissional sofrida em resultado da conduta do Clube Réu.

TERMOS EM QUE,
Deve ser negado provimento ao recurso, com as devidas e legais consequências. (…)”

O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido da inadmissibilidade da junção, pelo A., do documento junto pelo mesmo com as alegações de recurso e bem assim referindo o seguinte:
“Consequentemente, foi fixada no ponto b1) do dispositivo: “uma indemnização no montante de 70.301,67€ (setenta mil, trezentos e um euros e sessenta e sete cêntimos), nos termos do disposto no n.º1 da cláusula 41.ª (aplicável por forca da respectiva clausula 44.ª, nº3) do C.C.T. aplicável, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da citação do Clube Réu para a presente acção judicial e até efectivo e integral pagamento;”.
Do exposto resulta claramente que para efeito de atribuição da indemnização foi atendida a remuneração auferida pelo recorrido ao serviço da recorrente pelo seu valor ilíquido, acrescida da por si ulteriormente percebida em Espanha, em montante líquido. A primeira é economicamente superior á segunda e o que constitui o fundamento para evitar a lesão do recorrido. No caso da recorrente, de acordo com o ordenamento jurídico português, esta teve de declarar aos Serviços de Finanças valores remuneratórios ilíquidos, com cálculo de retenção fiscal de imposto na fonte para efeito de IRS e das contribuições para a Segurança Social, em função de tabelas legalmente publicitadas, vindo a pagar ao recorrido os rendimentos líquidos apurados. De outro modo, em Espanha, é lícito contratar um trabalhador tendo como objectivo a obtenção de um rendimento líquido, como forma de garantir um proveito estável durante o período de execução do contrato. (cfr. Imposto de renda na Espanha – calculadora de imposto de renda espanhola - https://spanishsolicitors.com/pt/income-tax-in-spain).
Deste confronto resulta que se está perante regimes fiscais diferentes e que, necessariamente, têm de ser atendidos na apreciação da fixação da indemnização. No caso em apreço, só podem ser compatibilizadas remunerações da mesma natureza, por valores ilíquidos, por dela constarem os inerentes encargos fiscais e sociais, nos termos legalmente prescritos e de acordo com a legislação nacional.
Outrossim, coube ao recorrido declarar às autoridades fiscais competentes da sua residência estável por mais de 183 dias durante um ano civil, os rendimentos supra auferidos e em conformidade com a respectiva legislação local – cfr., entre nós, o artº. 16º. nº. 1 al. a) do CIRS. Mais haverá que ser tida em consideração, se for caso disso, a Convenção entre Portugal e a Espanha para Evitar a Dupla Tributação em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, aprovada para ratificação pelo Decreto-Lei n.º 49223, in Diário da República I, n.º 207, de 04/09/1969 e com início de vigência em 26/03/1970.
Esta questão tem de assumir importância no âmbito da natureza jurídica especial do contrato de trabalho dos treinadores profissionais de futebol no âmbito do CCT acima mencionado, considerando as particularidades dos regimes fiscais português e espanhol. Como tal, atenta a factualidade apurada e ao arrepio do afirmado na sentença sub iudice, não se pode concluir que “o autor tem direito à indemnização de €70.301,67 (= €83.801,67-13.500).”.
Na sentença o Mmo. Juiz “a quo”, face ao probatório apurado e em princípio, deveria ter comparado os rendimentos ilíquidos que foram auferidos pelo recorrido em Portugal e em Espanha, eventualmente. Naquela equação foram considerados valores remuneratórios com natureza diferenciada. O valor nacional para este efeito é elegível, por ser ilíquido, sendo os seus encargos determinados. O valor espanhol apesar de ser certo e líquido não pode ser atendível em tal operação, por serem desconhecidos os seus correlativos custos. Daí a incorreção do montante fixado na indemnização que, por incompatibilidade dos seus pressupostos, contaminou o raciocínio e resolução subjacente ao ponto b1) do decisório, por ser obscuro, tornando a decisão ininteligível e que é causa da invocada nulidade – cfr. Ac. do STJ. de 25 de Novembro 2020.
Em ordem a sua superação por este Tribunal “ad quem” dentro dos seus poderes de cognição, uma vez que não foi produzida prova que a tanto o habilite, afigura-se-nos que a matéria de facto terá de ser ampliada, máxime para se saber que valores fiscais foram declarados pelo recorrido no período em apreço e que montantes foram apurados pelas autoridades tributárias, para efeito de compatibilização de rendimentos ilíquidos a atender para efeito do referido cálculo de indemnização (se necessário, com pedido de intervenção dos serviços de finanças para concretizar e compatibilizar os valores apurados por via das declarações fiscais que apresentadas).
Do exposto decorre que a fundamentação e critério subjacente ao que foi decidido no ponto b1) da sentença que proferida no Tribunal “a quo” haja de ser anulado, com repetição do julgamento restrito a esta temática – cfr. artºs. 662º. nº.s 2 al. c) e 3 al. c) do CPC.
Tal segmento tem de ser expurgado da ordem jurídica.
Em suma, emite-se parecer pela anulação parcial do decidido restrito à fundamentação do segmento “2ª Questão: Indemnização devida ao autor.” e ao decidido no ponto b1) do dispositivo, com baixa dos autos à 1ª. instância para repetição do julgamento, nesta parte.”

As partes responderam ao parecer, a Ré com ele concordando e, o A., dele discordando.

Colheram-se os vistos legais.
***
II. Decisão da matéria de facto proferida pela 1ª instância

É a seguinte a decisão da matéria de facto proferida pela 1ª instância:
“Discutida a causa, resultou provada a seguinte factualidade (alinhada de forma lógica e cronológica):
“1. O Autor é treinador profissional de futebol.
2. O Clube Réu é uma sociedade desportiva unipessoal por quotas (SDUQ) cuja equipa principal de futebol sénior masculino se encontra a disputar, na presente época desportiva de .../..., a Primeira Liga, ou “Liga ...” por razões de patrocínio, que é o principal escalão do sistema de ligas de futebol de Portugal.
3. No dia 01 de Agosto de 2018, foi celebrado um contrato de trabalho desportivo entre o Autor e o Clube Réu, ao tempo a disputar o Campeonato de Portugal, serie A, intitulado de “Contrato de Trabalho”, junto a fls.19 e v.
4. Tal contrato de trabalho foi redigido em folhas com o logotipo e os sinais identificativos da Associação Nacional de Treinadores de Futebol [ANTF], e numerado como N.º ... (cfr. respectivo canto superior direito).
5. Nessa mesma data de 01 de Agosto de 2018, Autor e Clube Réu celebraram um aditamento ao contrato de trabalho acima referido, documento intitulado de “Aditamento ao Contrato de Trabalho N.º ...”, junto a fls.20 a 21.
6. No contrato referido em 3. foi acordado que o Autor exerceria, sob a autoridade e direcção do Clube Réu, as funções de treinador da equipa principal de futebol masculino sénior deste ultimo, durante o período compreendido entre 01.08.2018 e 30.06.2020, correspondente às épocas desportivas de .../... e .../....
7. No aditamento ao contrato referido em 5. mantiveram-se inalterados:
(i) quer o período de duração do vinculo contratual de natureza laboral que, momentos antes, havia sido celebrado entre as partes [cfr. clausula 5.ª, n.º1, na redacção inicial do contrato de trabalho referido em 3. e cláusulas Quinta e Sexta na redacção que lhe foi conferida no respectivo aditamento referido em 5.];
(ii) quer as funções a exercer pelo Autor [cfr. cláusulas 1.ª e 2.ª, na redacção inicial do contrato de trabalho referido em 3. e a cláusula Primeira na redacção que lhe foi conferida no respectivo aditamento referido em 5.].
8. Mas, e entre outras alterações, veio estabelecer:
(i) tanto um diferente regime remuneratório de base, (cfr. n.º. da cláusula 3ª na redacção inicial do contrato de trabalho referido em 3. e a cláusula Sexta na redacção que lhe foi conferida no respectivo aditamento referido em 5.;
(ii) como, ex novo, a previsão de um conjunto de prémios a pagar pelo Clube Réu ao Autor em razão da eventual obtenção de determinados objectivos desportivos, (cfr. os n.ºs 2. e 3. da cláusula 3ª na redacção inicial do contrato de trabalho referido em 3. e o que foi expressamente convencionado nas cláusulas Sétima, Oitava, Nona e Decima na redação que lhe foi conferida no respectivo aditamento referido em 5.)
9. Na Cláusula Décima Terceira da redacção inserta no “Aditamento ao Contrato de Trabalho N.º ...” referido em 5. ficou plasmado que:
A primeira e o segundo contraentes declaram que o presente aditamento ao contrato de trabalho se destina a regular as relações profissionais entre as partes e substitui, para todos os efeitos, o contrato de trabalho N.º ... celebrado em 01 de Agosto de 2018, que se encontra na ANTF e na FPF, nomeadamente em matéria de pagamentos”.
10. No que concerne à primeira metade do período de tempo objecto do contrato de trabalho, que decorreu de 01 de Agosto de 2018 a 30 de Junho de 2019, referente à primeira das duas épocas desportivas em causa, a de .../..., o contrato foi integralmente cumprido:
(i) Funções: o Autor exerceu a sua actividade profissional de acordo com o estabelecido contratualmente;
(ii) Remuneração: o Clube Réu pagou-lhe o salario anual na integra: a importância global ilíquida de 23.485,00€ (vinte e três mil, quatrocentos e oitenta e cinco mil euros), em onze (11) prestações mensais e iguais no valor ilíquido de 2.135,00€ (dois mil e trinta e cinco euros) cada, conforme previsto na cláusula Sexta, nº 1 e respectivo § único, do contrato de trabalho referido em 5.
11. No que tange à segunda metade do período de tempo objecto do contrato de trabalho, compreendido entre 01 de Julho de 2019 e 30 de Junho de 2020, referente à segunda das duas épocas desportivas em causa, a de .../..., as partes haviam acordado, como salário anual do Autor, a importância global ilíquida de 91.420,00€ (noventa e um mil, quatrocentos e vinte euros), a pagar em doze (12) prestações mensais iguais, no valor ilíquido de 7.618,33€ (sete mil, seiscentos e dezoito euros e trinta e três cêntimos) cada, de acordo com o convencionado na clausula Sexta, n.º 2 e respectivo § único, do contrato de trabalho referido em 5.
12. Contudo, o Clube Réu fez cessar o contrato referido em 5., unilateralmente e sem nada que o justificasse:
(i) não permitindo que o Autor exercesse a actividade profissional para a qual havia sido contratado;
(ii) tendo procedido apenas ao pagamento da primeira daquelas doze prestações (no valor ilíquido de 7.618,33€), assim ficando em falta o pagamento ao Autor da remanescente quantia de 83.801,67€ (oitenta e três mil, oitocentos e um euros e sessenta e sete cêntimos), no que se prende estritamente com a remuneração base não paga, em concreto as prestações salariais referentes ao período de Agosto de 2019 a Junho de 2020.
13. Ao tempo que foi celebrado o contrato de trabalho, 01.08.2018, já as partes sabiam, e tal facto era público e notório, que – apesar de militar no Campeonato de Portugal, o terceiro escalão na hierarquia dos campeonatos de futebol em Portugal – era praticamente certo que, na época seguinte (.../...) o Clube Réu ascenderia ao mais alto daqueles escalões, a Primeira Liga/LIGA ..., pois havia já uma sentença judicial transitada em julgado que determinava isso mesmo.
14. Por isso na cláusula Décima do contrato de trabalho referido em 5. as partes expressamente deixaram consignado que:
Caso o A..., Futebol SDUQ, LDA. garanta a manutenção na 1ª Liga Portuguesa de Futebol Profissional, na época de .../..., o segundo contraente receberá da primeira contraente a quantia líquida de €20.000,00 (vinte mil euros).
15. As partes previram um prémio de manutenção, para a época seguinte (.../...), num escalão (1ª Liga) dois degraus acima do escalão (Campeonato de Portugal) da época que em que se estava a iniciar (.../...), sem que de permeio se passasse pelo escalão intermedio (2ª Liga), porque de antemão já sabiam desse salto do Clube Réu na época .../... directamente para a 1ª Liga, não decorrente de uma causa desportiva– pois aí as promoções aos escalões superiores resultam de uma determinada classificação desportiva de topo e processam-se pela ascensão ao nível superior imediatamente a seguir – mas antes decorrente dos seguintes factores extraordinários previamente conhecidos do Autor e do Clube Réu:
(i) a decisão judicial do Tribunal Central Administrativo do Sul, tomada no dia 6 de Dezembro de 2017, no âmbito do processo n.o 2141/06.1BELSB – sobre o chamado “Caso HH” – confirmando a (re)integracão do Clube Reu na 1ª Liga na época de .../...;
e o imediatamente sequente (ainda no mês de Dezembro de 2017):
(ii) acordo/“memorando de entendimento”, patrocinado pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional e celebrado entre o Clube Réu e o os “C...- SAD”, que não recorreu daquela decisão judicial;
bem como a concomitante:
(iii) (reiteração de) uma recomendação da Federação Portuguesa de Futebol no sentido da reintegração do Clube Réu na 1ª Liga/Liga …, "no mais curto espaço de tempo".
16. Confirmando algumas notícias, não desmentidas pelo Clube Réu, no sentido de que não contava com o Autor para a época de .../..., em meados de Maio de 2019, o treinador da sua equipa principal de futebol sénior masculino em Outubro de 2019, o senhor EE, assumiu publicamente que na época desportiva seguinte, a de .../..., iria desempenhar tais funções.
17. Tal facto veio a confirmar-se.
18. O Autor sempre quis cumprir a segunda época abrangida pelo contrato de trabalho, sendo que a intenção, concretizada, do Clube Réu em não cumprir na íntegra o contrato de trabalho foi da exclusiva iniciativa deste ultimo.
19. Já depois de o Clube Réu, perto do final da primeira época desportiva contratualizada (.../...) ter tentado junto do Autor que este abdicasse voluntariamente de exercer, na época desportiva seguinte (.../...), as funções para as quais havia sido contratado, foi pela comunicação social que o Autor veio a tomar conhecimento de que não iria ser o treinador da equipa de futebol principal sénior masculina para aquela segunda época desportiva (.../...) objecto do contrato de trabalho que havia celebrado com o Clube Réu.
20. Tendo confrontado o Clube Réu com tal notícia, a qual veio a ser por este confirmada.
21. O Clube Réu propôs então ao Autor que fosse elaborada, em termos formais, uma auto-intitulada revogação por mútuo acordo do contrato de trabalho, assumindo pagar ao Autor o montante correspondente ao salário que haviam contratualmente convencionado para a época de .../..., mas apenas e tão só até ao montante correspondente ao período de tempo que ocorresse até ao preciso momento em que este viesse a celebrar contrato com outro clube.
22. Entre outras coisas, tal proposta implicava, directamente e de forma imediata - na perspectiva do Clube Réu e porque foi essa a vontade por este expressamente transmitida - que o Autor:
(i) Não pudesse exercer de forma efectiva a sua profissão ao serviço da entidade empregadora com a qual havia celebrado um vinculo laboral valido e vigente;
(ii) Não tivesse direito aos prémios monetários previstos nas clausulas Oitava, Nona e Decima do contrato de trabalho, que, respectivamente, se cifram nas quantias liquidas de:
a) 20.000,00€ (vinte mil euros, caso o Clube Reu logre vencer a Taca de Portugal, respeitante a epoca de .../...;
b) 10.000,00€ (dez mil euros, caso o Clube Reu logre vencer a Taca da Liga, respeitante a época de .../...;
c) 20.000,00€ (vinte mil euros, caso o Clube Réu logre garantir a manutenção na 1ª Liga, respeitante à época de .../....
23. O Autor não aceitou porque queria cumprir o contrato de trabalho até ao fim e porque a sua substituição por um outro treinador, na perspectiva do Clube Réu – que foi feita transparecer para a opinião pública – alegadamente mais capaz para o desempenho do cargo, agora que o Clube Réu tinha ascendido ao escalão máximo do futebol português, significava uma machadada na imagem e no prestigio profissionais do Autor.
24. O Autor jamais teria celebrado o contrato de trabalho com o Clube Réu caso o mesmo não contemplasse a época de .../... na Liga …, pois, como o Clube Réu ao tempo de tal facto estava a par, o primeiro encontrava-se na iminência de assinar um contrato de trabalho para exercer sua actividade fora de Portugal, num projecto cujas dimensão remuneratória e visibilidade desportiva largamente ultrapassavam as do Clube Réu a disputar o terceiro escalão do futebol português (Campeonato de Portugal).
25. E por isso fez saber ao Clube Réu que iria apresentar-se no início da temporada para cumprir o contrato de trabalho.
26. Persistindo em celebrar com o Autor a por si auto-intitulada revogação por mútuo acordo do contrato de trabalho em vigor entre as partes, o Clube Réu enviou-lhe, com data de 28 de Junho de 2019, uma comunicação escrita, intitulada “Declaração” com o seguinte teor:
A..., FUTEBOL SDUQ, LDA, pessoa colectiva nº..., com sede na Rua ..., em ..., aqui representada pelos Gestores DD e II, vem por este meio comunicar ao Treinador de Futebol Profissional AA, de nacionalidade Portuguesa, portador do cartão de cidadão nº ..., com validade até 30/05/2028, a ausentar-se temporariamente dos trabalhos da equipa pelo período compreendido entre 01/07/2019 a 31/07/2019, sem que exista qualquer perda remuneratória do contrato de trabalho em vigor, o que faz com os seguintes fundamentos :
1.
O A..., FUTEBOL SDUQ, LDA subiu à 1ª Liga na época desportiva de .../....
2.
Nas transatas cinco épocas desportivas, o A... competiu em escalões inferiores, designadamente na 2ª Liga e no Campeonato de Portugal.
3.
Em virtude da subida à 1ª Liga, o A... está a ser alvo de uma pertinente a massiva reestruturação empresarial a todos os níveis, interna e externamente.
4.
Esta profunda reorganização encetada pelo A... implica e repercute-se num vasto conjunto de operações que se refletem numa readaptação de meios e alterações na estratégia, nos activos ou na estrutura socieconómica do CLUBE.
A aludida reestruturação do A... visa readaptar o CLUBE à nova realidade competitiva, logrando-se impulsionar o respectivo desempenho, gerando mais valor.
6.
Para que o A... possa responder às actuais e fortes exigências do mercado, impõe-se, impreterivelmente, a aquisição, alienação, transferência e inutilização de elementos patrimoniais ou determinadas actividades.
7.
Face ao exposto, torna-se premente que o A... proceda a uma profunda reorganização do plantel do CLUBE, a qual implicará forçosamente a desocupação efetiva e temporária de alguns jogadores e equipa técnica.
8
Destarte, atenta a reestruturação em curso, nos termos supra referidos, o A... encontra-se temporariamente impedido de dar ocupação ao trabalhador AA, pelo período entre 01/07/2019 a 31./07/2019.
..., 28 de Junho de 2019” (sic), seguindo-se duas assinaturas manuscritas ilegíveis apostas por cima dum carimbo do Clube Réu.
27. Contra a sua expressa vontade, o Autor foi impedido de desempenhar no mês de Julho de 2019 as funções para as quais havia sido contratado, em razão da referida decisão unilateral do Clube Réu.
28. E em 31 de Julho de 2019, o Clube Réu remeteu ao Autor a carta registada com AR, junta a fls.22 v. e 23 com o seguinte teor :
“A...
...
Exmº Senhor
AA
..., nº ...
... Maia
..., 31 de Julho de 2019
Carta Registada com AR
Assunto: Cessação de Contrato de Trabalho
Exmº Senhor.
A A..., FUTEBOL SDUQ, LDA, sociedade desportiva por quotas, pessoa colectiva nº..., com sede na Rua ..., ... ..., neste ato representada pelo seu Presidente e Vice-Presidente, com poderes para o ato, vem expor o seguinte :
1. Como é do conhecimento de V.Exª, a Sociedade Desportiva logrou celebrar com V.Exª um Acordo para Cessação do Contrato de Trabalho celebrado entre ambos em 1 de Agosto de 2018, tendo-se comprometido, de boa fé, a responsabilizar-se pelo pagamento de todas as remunerações mensais previstas no contrato supra referido até à data em que V.Exª viesse a celebrar um novo contrato de trabalho de treinador de futebol com outro qualquer Clube.
2. Nos moldes supra descritos, a Sociedade Desportiva almejou vincar o respeito e consideração por V.Exª pelo período em que exerceu a sua atividade ao serviço da mesma, não o deixando desprotegido e fragilizado enquanto não beneficiasse de um novo vínculo laboral.
3. Na senda do exposto, não tendo V.Exª aceite a celebração de um Acordo de Cessação do Contrato de Trabalho nos termos supra aludidos, a Sociedade Desportiva vem, pela presente, comunicar a cessação do Contrato de Trabalho celebrado com V.Exa em 1 de agosto de 2018, cessando os seus efeitos a partir de 31 de Julho de 2019, data em que se considera para todos os efeitos legais terem cessado todos e quaisquer direitos, deveres e garantias das partes, emergentes do referido contrato, extinguindo-se, assim, e para futuro, a relação laboral.
4. Por conseguinte, deixou V.Exª de ser o Treinador Principal da Equipa de Futebol Masculino Senior da A..., FUTEBOL SDUQ, LDA.
Com os melhores cumprimentos,
Seguindo-se duas assinaturas manuscritas ilegíveis apostas por baixo do dizer “A Gerência” e por cima do carimbo da Ré.
29. O Clube Réu operou unilateralmente a cessação do contrato de trabalho em 31 de Julho de 2019.
30. O Clube Réu não logrou em momento nenhum celebrar com o Autor qualquer acordo para cessação do contrato de trabalho.
31. O Clube Réu não instaurou qualquer processo disciplinar ao Autor.
32. A Ré subiu à Primeira Liga /LIGA ... na época desportiva de .../..., encontrando-se anteriormente, durante 5 épocas seguidas, em escalões inferiores, nomeadamente no terceiro escalão na hierarquia dos campeonatos de futebol em Portugal.
33. Decorreram na íntegra os meses de Agosto e de Setembro de 2019 e o Clube Réu não pagou os respectivo salários ao Autor, sendo que este não treinou qualquer equipa no período em causa.
34. O Clube Réu apenas pagou ao Autor a primeira mensalidade de 7.618,33€ do total de doze devidas, nos termos e para os efeitos convencionados na clausula Sexta, n.º2, § unico do contrato de trabalho referido em 5.
35. O Autor conseguiu entretanto a celebração de um contrato de trabalho, com o respectivo termo inicial reportado a 01 de Outubro de 2019, – que o vincula a outro clube de futebol, passando a treinar uma equipa – o B..., do Grupo IX da “Tercera Divisíon” de Espanha, que, na realidade, corresponde a uma quarta divisão espanhola, pois acima dela existem o “Campeonato Nacional de Liga de Primera División”, o “Campeonato Nacional de Liga de Segunda División” e o “Campeonato Nacional de Liga de Segunda División B”, a competir num escalão com uma visibilidade inferior à da equipa de futebol profissional sénior masculino do Réu e auferindo uma remuneração base para a época de .../... de €13.500 líquidos, a pagar em 9 prestações mensais, iguais e consecutivas, com início em Outubro de 2019 e término em Junho de 2020, à razão de €1.500 líquidos por cada um desse meses.
36. O referido em 11), 12), 13), 14), 15), 16), 17), 18), 19), 20), 22), 23), 24), 25), 28), 31 e 32) fez e faz com que o Autor tivesse sofrido e continue a sofrer, tendo-lhe causado uma enorme angustia, que se prolonga, que o fez perder noites sem dormir ou a dormir pouco, a pensar no porquê do sucedido, e na injustiça em que tal se consubstanciou, provocando-lhe uma revolta imensa, mais a mais tendo por origem um clube ao qual já tanto havia dado, quer como treinador, quer como futebolista – clube esse, [o Clube Réu], que sempre soube que não fora o facto do objecto do contrato de trabalho prever, expressamente no seu objecto, a época desportiva de .../... no escalão máximo do futebol profissional em Portugal, o Autor não o teria celebrado, sequer, atenta a existência de uma outra proposta de trabalho que ao tempo estava prestes a aceitar.
37. O Autor sente-se, ainda, desacreditado profissionalmente e profundamente desrespeitado pelo Clube Réu,
38. que, com a sua conduta para com o A., lhe causou sofrimento pela situação desprestigiante e desonrosa em que foi colocado.
39. Com a sua conduta, o clube Réu impediu que o A. tivesse muito maior visibilidade e, consequentemente, valor de mercado, de que em concreto o Autor passaria a gozar por ir liderar um plantel de uma equipa da divisão máxima do futebol profissional em Portugal.
40. Tendo o Clube Réu causado, com a sua conduta para com o A. dor, desgosto, sofrimento e uma intensa preocupação pelo seu futuro, que o Autor já sofreu e continua a suportar em consequência da conduta do Clube Réu.
41. Na época de .../... o Clube Réu manteve-se na 1ª Liga Portuguesa de Futebol Profissional.
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Não se provaram quaisquer outros factos para além ou em contrário dos anteriormente referidos, designadamente que:
- perante tais irrazoabilidade, desfacatez e desonrosa falta de palavra ao compromisso contratual assumido, o Autor em resposta tenha lembrado ao Clube Réu que estava em vigor um contrato de trabalho celebrado entre as partes, e que entretanto o Clube Réu apresentara publicamente outro treinador para o mesmo cargo que o Autor havia sido contratado, o qual havia já começado a desempenhar tais funções, como era do conhecimento publico; e que tal circunstancialismo, de per si, constituía um despedimento sem justa causa (e sem processo disciplinar) do Autor, não colhendo qualquer plausibilidade a motivação invocada pelo Clube Reu naquela Declaração de 28 de Junho de 2019, a qual se desconstruía pela simples constatação dos factos; mais alertando o Autor o Clube Reu para que a situação por este causada representava, em concreto, uma séria lesão da sua imagem e prestigio profissionais, (cfr. artº31º da P.I.);
- o Clube Réu se tenha limitado a continuar a insistir para que o Autor aceitasse as absolutamente inalteráveis condições da proposta pelo primeiro intitulada de revogação por mútuo acordo do contrato de trabalho que havia apresentado ao Autor e referida nos artigos 25.o e 26.o da p.i., o que o Autor sempre recusou, (cfr. artº32º da P.I.);
- o aditamento ao contrato de trabalho nº ... não tenha substituído, para todos os efeitos, o contrato de trabalho nº ... celebrado em 01 de Agosto de 2018, que se encontra na ANTF e na FPF, nem que o aludido aditamento não se destinasse a passar a regular as relações profissionais entre o Autor e o Clube Réu, (cfr. artº4º da contestação);
- tenha ficado consagrado na cláusula décima terceira que o aditamento ao contrato de trabalho substitui os efeitos do contrato originário apenas no que toca a matéria de pagamentos, (cfr. artº7º da contestação);
- a razão subjacente à criação de tal cláusula não tenha sido a substituição total e sem mais do plasmado no contrato originário pelo plasmado no aditamento ao mesmo, (cfr. artº8º da contestação);
- a cláusula em apreço tenha visado, tão só, substituir os efeitos em matéria de pagamentos, (cfr. artº9º da contestação);
- o contrato de trabalho celebrado entre as partes seja aquele resultante do contrato originário em consonância com o plasmado no aditamento ao mesmo, (cfr. artº10º da contestação);
- a carta de 31 de Julho de 2019 tenha sido enviada no seguimento de vários acordos malogrados entre as partes para a cessação do contrato de trabalho celebrado entre ambas,, (cfr. artº12º da contestação;
- a cessação do contrato de trabalho tenha sido o culminar de variadíssimas tentativas de conciliação frustradas entre as partes e diferidas no tempo (cfr. artº13º da contestação);
- a cessação do contrato de trabalho não tenha sido desprovida de fundamento nem que não se tenha esgotado num único acto, sem mais, (cfr. artº14º da contestação);
- as variadas tentativas de conciliação entre as partes, ainda que frustradas, demonstrem o respeito e consideração que a Ré detinha pelo Autor, pelo período que este último exerceu a sua actividade ao serviço da Ré, não o deixando desprotegido e fragilizado enquanto não beneficiasse de um novo vínculo laboral, (cfr. artº16º da contestação);
- a Ré em momento algum não tenha desprestigiado a imagem e o profissionalismo do Autor, nem que jamais tenha ferido a sua reputação ou não lhe tenha causado dor ou sofrimento (cfr. artº17º da contestação);
- jamais a Ré não tenha desonrado a sua palavra, (cfr. artº18º da contestação);
- perto do final da primeira época desportiva (.../...) as partes já tivessem encetado negociações tendo em vista a imediata resolução consensual da questão e almejando o imenso respeito que ambos partilhavam, (cfr. artº19º da contestação);
- o autor sempre se tenha mostrado livre e disponível para encetar negociações com a Ré, (cfr. artº24º da contestação);
- as partes sempre tenham mantido contactos, tanto orais como escritos, com vista ao bom entendimento no que concerne à cessação do contrato de trabalho celebrado entre ambas, (cfr. artº25º da contestação);
- a Ré não tenha tido outra alternativa senão comunicar ao Autor, em 31 de Julho de 2019, a cessação do contrato de trabalho, (cfr. artºs 26º e 128º da contestação);
- a Ré estivesse numa posição fragilizada e que lutasse contra os prazos legais para, num curtíssimo espaço de tempo, conseguir proceder a uma profunda e imposta reeetruturação do seu plantel, o que o Autor sabia e não podia desconhecer, (cfr.artº27º da contestação);
- a Ré tenha sido alvo de uma massiva reestruturação empresarial a todos os níveis, interna e externamente, num espaço de tempo muito reduzido (cfr. artº29º da contestação);
- a Ré tenha tido necessariamente de abraçar uma profunda reorganização, que se tenha repercutido num vasto conjunto de operações que se reflectiram em alterações na estratégia, nos activos ou na estrutura socioeconómic da Ré (cfr. artº30º da contestação);
- o objectivo tenha passado passou única e exclusivamente por readaptar a Ré à nova realidade actual, tendo como fim o melhoramento do desempenho da mesma, criando mais valor, (cfr. artº31º da contestação);
- para que a Ré pudesse responder às actuais e fortes exigências do mercado, necessitasse forçosamente de adquirir, alienar, transferir, suprir, elementos patrimoniais ou determinadas actividades, (cfr. artº32º da contestação);
- se tenha afigurado urgente que a Ré procedesse a uma profunda reorganização do seu plantel, num espaço de tempo muito reduzido, (cfr. artº33º da contestação);
- a Ré se encontrasse numa posição débil, de que o Autor soubesse e não pudesse desconhecer, nem que o Autor tenha usado dessa fragilidade ou tenha tentado obter da Ré proveitos ilícitos, (cfr. artº34º da contestação);
- a Ré se encontrasse numa situação frágil, nem que o Autor tenha aproveitando a situação em que a Ré se encontrava, para a pressionar e forçar a exercer um comportamento que lhe traria (ao Autor) benefícios ilegítimos à custa do menos protegido (a Ré) , (cfr. artº37º da contestação);
- a Ré se tenha visto forçada a renovar todo o seu plantel sem excepções, (cfr. artº45º da contestação);
- não tendo sido possível lograr um Acordo entre as partes, a Ré não tenha tido outra alternativa senão comunicar ao Autor, em 31 de julho de 2019, a cessação do contrato de trabalho, (cfr. artº50º da contestação);
- só em 1 de agosto de 2019, a Ré contratado o Mister EE para exercer as funções de Treinador Principal da equipa de futebol masculino sénior da Ré para a época .../..., (cfr. artºs 52º e 107º da contestação);
- à data da cessação do contrato de trabalho entre as partes, em 31 de julho de 2019, o Mister EE não estivesse já contratado pela Ré, para exercer as funções de Treinador Principal da equipa de futebol masculino sénior da Ré para a época .../..., (cfr. artºs 53º e 108º da contestação);
- a Ré sempre tenha logrado celebrar um Acordo com o Autor, vendo-se forçada, por questões legais, a cessar o contrato de trabalho celebrado nos termos supra descritos, (cfr. artº54º da contestação).”
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III. Objeto do recurso

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo porém as matérias que sejam de conhecimento oficioso, (arts. 635, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável ex vi do art. 1º, nº 2, al. a), do CPT aprovado pelo DL 295/2009, de 13.10, alterado, designadamente, pela Lei 107/2019).
Assim, são as seguintes as questões suscitadas:
A. No recurso principal, interposto pela Ré:
a.1. Nulidade da sentença;
a.2. Impugnação da decisão da matéria de facto;
a.3. Das deduções, às retribuições devidas ao A. em consequência da ilicitude do despedimento, no montante global ilíquido de €83.802,67, das retribuições auferidas pelo mesmo após o despedimento, no período de outubro de 2019 a junho de 2020, ao serviço do Clube B..., estas no montante global líquido de €13.500
a.4. Da indemnização por danos não patrimoniais.
B. No recurso subordinado, interposto pelo A.:
b.1. Se deve a Ré ser condenada a pagar ao A. a quantia de €91.494,00 a título de indemnização por danos patrimoniais relativos à desvalorização profissional, não devendo esta ser qualificada como dano não patrimonial;
b.2. Se deve ser atribuído ao A. qualquer montante indemnizatório pela desvalorização profissional.
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IV. Questão prévia

1. O A./ Recorrente veio, no âmbito do recurso subordinado que interpôs, referir não pretender contra-alegar ao recurso principal interposto pela Ré, dizendo no corpo alegatório o seguinte:
“O Autor não apresentará peça processual autónoma de resposta ao recurso independente interposto pela Ré, não apenas porque, e com todo o respeito, que não é pouco, entende não encerrar aquele em si mesmo qualquer fundamentação que lhe permita – com uma base mínima de objectividade, razoabilidade e legalidade, inverter, com ancoramento no que foi a prova produzida e as regras que a regulam, assentes na correcta interpretação e aplicação da lei e na melhor práctica jurisprudencial – reverter o sentido decisório da sentença recorrida na direcção preconizada pela Ré;
Mas de igual sorte porque do próprio corpo alegatório e síntese conclusiva do RECURSO SUBORDINADO, que aqui é interposto, nos termos e para os efeitos dos artigos 81.º, n.º5 do Código de Processo do Trabalho, a ser apreciado em conjunto com o recurso independente interposto pela Ré, resultará tal resposta suficientemente apreensível.”.

Não obstante, o que se constata é que, sob a epígrafe “A) Do que fica excluído”, o A., da pág. 3 à pág. 11, desenvolve longa argumentação relativa à questão a.3. do recurso principal da Ré, acima elencada, no sentido da sua improcedência e da confirmação da sentença recorrida, nela incluindo, designadamente, requerimento para notificação da Ré para juntar aos autos o recibo de pagamento da retribuição de julho de 2019 e juntando ainda, com tais alegações, um documento (Declaração de IRS) e, a essa questão, se referindo a conclusão 3ª do recurso subordinado.
Por sua vez, a Ré, Recorrida no recurso subordinado veio, nas contra-alegações ao mesmo, referir que:
“Pese embora o Autor/Recorrente, não tenha apresentado peça processual autónoma de resposta ao Recurso de Apelação interposto pela Ré, a verdade é que o Autor se pronuncia, em sede de Recurso Subordinado, relativamente ao sobredito Recurso interposto pela Ré, designadamente no que respeita.
Destarte, antes de mais, apraz tecer algumas considerações relativamente à argumentação vertida pelo Autor, em sede de Recurso Subordinado, no que respeita ao Recurso Independente interposto pela Ré, designadamente quanto à matéria da indemnização devida ao Autor pela rescisão do contrato de trabalho sem justa causa, atribuída ao Autor nos termos do art. 41.º, n.º 1, do CCT.” [pág. 3],
E, de seguida e sob a epígrafe “I. DA INDEMNIZAÇÃO DEVIDA AO AUTOR PELA RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO SEM JUSTA CAUSA” desenvolve longa argumentação, o que faz de pág. 4 a 11, relativa à questão acima mencionada – a.3. do objeto do seu recurso acima indicado - respondendo ao que o A., a esse propósito, alegou na mencionada peça processual (recurso subordinado), e requerendo a notificação do A. para juntar aos autos os recibos de vencimento do Autor ao serviço do B..., no período compreendido entre 01 de outubro de 2019 e 30 de junho de 2020. E a esta temática reportam-se também as conclusões 7ª a 23ª da contra-alegação ao recurso subordinado.

Como aliás decorre do que o A./Recorrente do recurso subordinado refere e que o mesmo certamente não desconhecerá, uma coisa é o direito de resposta ao recurso e que se materializa na apresentação das contra-alegações e, outra diferente, é o direito de recorrer subordinadamente da parte da decisão que lhe foi desfavorável, que se materializa na interposição do respetivo recurso subordinado. Tratam-se, pois, de situações absolutamente independentes, ainda que do ponto de vista formal possam ser reunidas numa única peça processual mas, neste caso, não perdendo a sua autonomia e devendo estar (como no caso aliás estão), devidamente individualizadas. Ou seja, o que não pode a parte fazer é aproveitar o recurso subordinado, para, de forma camuflada (ou, até, no caso explicitamente), vir responder ao recurso principal, dispensando-se de o fazer como processualmente lhe é imposto, isto é, através da apresentação de contra-alegações (e arcando com as consequência decorrentes, designadamente no que toca em matéria de custas).
Ora, tendo o A. sido perfeitamente claro no sentido de que não pretende contra-alegar no recurso interposto pela Ré, não o poderá, afinal, vir a fazê-lo tal como o fez.
E, assim sendo, temos como não escrito tudo quanto o A. alegou e requereu a págs. 3 [a partir da epígrafe “A] do que fica excluído”, mas com exceção desta e da referência que nela faz a que fica de fora do objeto do recurso subordinado a questão que o Réu suscita no recurso principal] a pág. 12, último §, inclusive da sua peça processual apresentada aos 30.04.2022 (recurso subordinado), bem como a conclusão 3ª do recurso subordinado, ou seja no que toca à matéria em que responde ao recurso principal, incluindo o requerimento para notificação da Ré para juntar o recibo relativo à retribuição de julho de 2019 e a junção, pelo A., do documento junto com essa alegação (declaração de IRS de 2019).

Por sua vez, no que toca à “resposta” da Ré, nas contra-alegações ao recurso subordinado, na parte relativa à “resposta” do A. acima não admitida, ou seja, desde pág. 4, onde se diz ““I. DA INDEMNIZAÇÃO DEVIDA AO AUTOR PELA RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO SEM JUSTA CAUSA”, até pág. 11, 2º § inclusive , bem como nas conclusões 7ª a 23ª, desenvolve longa argumentação relativa à questão acima mencionada – al. c) do objeto do seu recurso acima indicado – deverá igualmente ser tida como não escrita, incluindo a requerida notificação do A. para juntar aos autos os recibos de retribuições auferidas no Clube B... de onde conste a indicação das quantias ilíquidas auferidas [sem prejuízo da manutenção dessa pretensão formulada nas suas alegações de recurso principal].
Com efeito, e desde logo, não sendo admissível o alegado pelo A. a esse propósito, como já acima referido, não é igualmente admissível a “resposta” da Ré apresentada nas contra-alegações ao recurso subordinado.
Mas, sobretudo, porque, mesmo que o A. tivesse contra-alegado no recurso principal, a tramitação processual aplicável (CPT e CPC) não preveem, nem admitem, o direito de “resposta”/contra-alegação à contra-alegação apresentada pela parte contrária.
O Recorrido, parte contra quem é apresentado o recurso, tem o direito de responder/contra-alegar no recurso apresentado pelo Recorrente (art. 81º, nº 3, do CPT), mas este já não tem o direito de responder/contra-alegar às contra-alegações apresentadas pelo Recorrido.
É certo que, interposto recurso subordinado, a Ré tem o direito de a ele responder (art. 81º, nº 5, do CPT), direito este que, contudo, se reporta à matéria que é objeto do recurso subordinado, não já à matéria invocada nas contra-alegações ao recurso principal. Ou seja, mesmo que, porventura, o A. tivesse contra–alegado no recurso principal, interposto pela Ré, ainda que inserindo-a no recurso subordinado, não tinha a Ré o direito de responder a essas contra-alegações a pretexto da admissibilidade de contra-alegar no recurso subordinado.

Assim e concluindo tem-se como não escritas as já mencionadas passagens constantes do recurso subordinado, interposto pelo A., incluindo o requerimento para notificação da Ré para juntar o recibo relativo à retribuição de julho de 2019 e a junção, pelo A., do documento junto com essa alegação (declaração de IRS de 2019), cuja junção, em consequência, não se admite e que, oportunamente, deverá ser desentranhado e devolvido à parte, e das contra-alegações ao recurso subordinado, apresentadas pela Ré.
***
V. Fundamentação

1. Da nulidade de sentença – recurso principal interposto pela Ré

Invoca a Ré/Recorrente a nulidade da sentença referindo, na conclusão 27ª, que “27. No que respeita ao modo como foi fixada a sobredita indemnização ao Recorrido, cumpre referir que, nos termos conjugados dos artigos 635.º, nº, 4 e 639.º., nº 1, do CPC, estamos perante circunstância de conhecimento oficioso, padecendo a sentença recorrida de vício de nulidade parcial, quanto à fundamentação que suporta o decidido no ponto b1), por ambiguidade ou obscuridade que a torna ininteligível, conforme o artigo 615.º, nº. 1, al. c) do CPC, que expressamente se invoca para os devidos e legais efeitos.”.
Tal arguição prende-se com a questão objeto do recurso da Ré/Recorrente, mencionada no ponto III.A.a.3, qual seja a relativa às deduções, às retribuições devidas ao A. em consequência da ilicitude do despedimento, no montante global ilíquido de €83.802,67, das retribuições auferidas por aquele após o despedimento, no período de outubro de 2019 a junho de 2020, ao serviço do Clube B..., estas no montante global líquido de €13.500 [questão que se prende com o segmento condenatório constante da al. B1) da decisão: “b1) uma indemnização no montante de 70.301,67€ (setenta mil, trezentos e um euros e sessenta e sete cêntimos), nos termos do disposto no n.º1 da cláusula 41.ª (aplicável por forca da respectiva clausula 44.ª, nº3) do C.C.T. aplicável, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da citação do Clube Réu para a presente acção judicial e até efectivo e integral pagamento”]

1.1. Dispõe art. 615º, nº 1 al. c), do CPC/2013 que é nula a sentença quando: “c) (…) ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que a torne ininteligível”.
As nulidades podem ser processuais, se derivam de actos ou omissões que foram praticados antes da prolação da sentença; podem também ser da sentença, se derivam de actos ou omissões praticados pelo Juiz na sentença.
A obscuridade ocorre quando “a sentença, ou parte dela, é ininteligível” e, na ambiguidade, quando a sentença se apresenta “também total ou parcialmente, com um sentido duplo” – cfr. José Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil Anotado, Volume 2º, Coimbra Editora, pág. 672.
De referir que tais nulidades não se confundem com eventual erro de julgamento.
Na sentença recorrida foi referido o seguinte:
“Assim, tendo o autor sido despedido ilicitamente no dia 31 de Julho de 2019, em face do nº2 da Cláusula Sexta do “aditamento ao contrato de trabalho nº ...”, junto a fls.20 a 21, e tendo em conta ter resultado provado (facto provado 34) que o Clube Réu apenas pagou ao Autor a primeira mensalidade de 7.618,33€ do total de doze devidas, nos termos e para os efeitos convencionados na clausula Sexta, n.º2, § único do contrato de trabalho referido no facto provado 5., temos que o valor das retribuições que seriam devidas ao Autor se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo é de €83.801,67 (= €91.420,00 - €7.618,33).
Porém, resultou igualmente provado que decorreram na íntegra os meses de Agosto e de Setembro de 2019 e o Clube Réu não pagou os respectivo salários ao Autor, sendo que este não treinou qualquer equipa no periodo em causa, (facto provado 33) e que o Autor conseguiu entretanto a celebração de um contrato de trabalho, com o respectivo termo inicial reportado a 01 de Outubro de 2019, – que o vincula a outro clube de futebol, passando a treinar uma equipa – o B..., do Grupo IX da “Tercera Divisíon” de Espanha, que, na realidade, corresponde a uma quarta divisao espanhola, pois acima dela existem o “Campeonato Nacional de Liga de Primera División”, o “Campeonato Nacional de Liga de Segunda División” e o “Campeonato Nacional de Liga de Segunda División B”, a competir num escalão com uma visibilidade inferior à da equipa de futebol profissional senior masculino do Réu e auferindo uma remuneração base para a época de .../... de €13.500 líquidos, a pagar em 9 prestações mensais, iguais e consecutivas, com início em Outubro de 2019 e término em Junho de 2020, à razão de €1.500 líquidos por cada um desse meses, (facto provado 35.).
E assim, importa deduzir as retribuições que o autor auferiu pela mesma actividade durante o período em causa e que totalizaram €13.500 líquidos.
O que significa que, à luz do aludido nº1 da cláusula 41ª do CCT o autor tem direito a uma indemnização correspondente ao valor das retribuições que lhe seriam devidas se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo (€83.801,67), deduzidas das que veio a auferir pela mesma actividade durante o período em causa, (€13.500).
Ou seja, o autor tem direito à indemnização de €70.301,67 (= €83.801,67-13.500), nos termos do nº1 da cláusula 41ª ex vi do nº3 da cláusula 44ª, ambas do CCT aplicável, acrescida dos peticionados juros de mora, procedendo, desde logo, nesta parte e nesta medida a presente acção.”
Do referido pelo Mmº Juiz decorre, de forma clara, que o mesmo entendeu ser de descontar à quantia de €83.801,67 (correspondente às retribuições que o A. auferiria na Ré até ao termo do contrato – de agosto de 2019 a junho de 2020 ), quantia essa que é ilíquida como decorre dos nºs 11 e 12 dos factos provados, a quantia líquida de €13.500,00, correspondendo a diferença (70.301,67€ ) ao montante em que a Ré foi condenada no segmento condenatório constante do ponto V. b.1.) da sentença, montante este que, na economia da sentença e ainda que não o diga expressamente, é ilíquido.
Entende-se perfeitamente, e a Ré também bem o entendeu (como decorre das suas profusas alegações), que o Mmº Juiz, à quantia, que é ilíquida, de €83.801,67, descontou a quantia, que é líquida, de €13.500,00, do que a Ré/Recorrente discorda.
O que poderá ocorrer é eventual erro de julgamento, não nulidade de sentença por obscuridade ou ambiguidade, erro esse que foi invocado pela Ré/Recorrente e que constitui objeto do recurso, que adiante será apreciado.
Improcede o recurso nesta parte.

2. Da impugnação da decisão da matéria de facto – recurso principal, da Ré

A Ré impugna os nºs 19, 20, 30, 36, 38 e 40 dos factos provados (cfr. conclusão 31ª).

2.1. Quantos aos nºs 19 e 20, deles consta que:
- “19. Já depois de o Clube Réu, perto do final da primeira época desportiva contratualizada (.../...) ter tentado junto do Autor que este abdicasse voluntariamente de exercer, na época desportiva seguinte (.../...), as funções para as quais havia sido contratado, foi pela comunicação social que o Autor veio a tomar conhecimento de que não iria ser o treinador da equipa de futebol principal sénior masculina para aquela segunda época desportiva (.../...) objecto do contrato de trabalho que havia celebrado com o Clube Réu.”
-“20. Tendo confrontado o Clube Réu com tal notícia, a qual veio a ser por este confirmada.”
Pretende a Ré/Recorrente que seja dado como provado que “foi pela Recorrente, através do seu legal representante, Sr. DD, e não pela comunicação social que o Recorrido teve conhecimento de que não iria ser o treinador da equipa de futebol principal sénior masculina para a segunda época desportiva objeto do contrato (época .../...)” (cfr. conclusão 40ª), o que sustenta no depoimento das testemunhas BB e CC, nas declarações de parte do A., no depoimento de parte do legal representante da Ré e nos documentos 8 e 9 juntos pelo A (não diz a que folhas do processo, ou quando foram juntos ou com que articulado ou requerimento em que o foram).

2.1.1. Na fundamentação da decisão da matéria de facto consta o seguinte:
“O ponto 19. dos factos provados resultou dos documentos juntos a fls.132 e 133, conjugados com a assentada de fls.119 e v. do depoimento de parte do legal representante do Réu, DD, com as declarações de parte credíveis e convincentes do Autor, AA e e com a parte que mereceu credibilidade ao Tribunal do depoimento da testemunha BB.
A factualidade do facto provado 20., foi confirmada pela testemunha GG, amigo do Autor e que tinha integrado como treinador adjunto uma equipa técnica anterior liderada pelo Autor e que depôs de uma forma natural, serena e objectiva, depoimento esse conjugado com a assentada de fls.119 e v. do depoimento de parte do legal representante do Réu, DD, com os documentos juntos a fls.132 e 133, com o depoimento claro e consistente da testemunha CC, que tendo integrado a equipa técnica do autor, viveu de perto todas as incidências e que necessariamente se encontrava em posição de assistir e ter conhecimento directo de tal matéria e com as declarações de parte credíveis e convincentes do Autor, AA.”
Da conjugação das declarações prestadas e invocadas pela Ré/Recorrente, a cuja audição se procedeu, decorre que, cerca de duas semanas antes do fim da época de .../... existiam rumores de que o A. não iria ficar como treinador da equipa principal e, bem assim, que, nessa altura, quando se encontraram no pequeno almoço, aquele e o Presidente do Clube Réu falaram, tendo o A. referido, nas suas declarações, que aquele lhe disse que não estava em causa a sua competência, mas que estava a ser pressionado para terem um treinador da equipa principal mais experiente, tendo ainda havido troca de argumentos, designadamente por parte do A., e que “as coisas ficaram assim” tendo-lhe aquele referido “deixa ver, ainda não está nada decidido”, depoimento este que, em bom rigor, até acaba por ser confirmado pelo legal representante da Ré, o qual referiu não poder precisar a data da contratação de EE, mas que “foi em cima da hora”, que “foi em muito curto espaço de tempo”, que em junho ele ainda estava no D... e que este ainda contava com ele, que havia “notícias que iam saindo na comunicação social, que o A. começou a achar que não ia ser o treinador principal, o que não era verdade”.
Decorre também do nº 16 dos factos provados, que não foi impugnado, que, em meados de maio de 2019, EE assumiu publicamente que na época desportiva .../... iria ser o treinador da equipa principal do Réu.
Ou seja, aquando da conversa/reunião acima mencionada, embora transmitido ao A. que havia a possibilidade de este não vir a ser o treinador da equipa principal e/ou que a Ré ponderava essa hipótese, a questão ficou todavia e ainda “em aberto”, não decorrendo dos depoimentos invocados, designadamente das declarações do A. e do legal representante da Ré, que este tivesse, nessa altura ou até à ao referido em 16) dos factos provados, informado o A., em termos definitivos, de que o mesmo não iria ser o treinador principal e que este iria ser o mencionado EE, nem tendo o legal representante da Ré referido que, até ao mencionado anúncio público feito por EE, tivesse informado o A. de que iria ser aquele o treinador principal.
De referir que os depoimentos das testemunhas BB e CC corroborando embora a referida reunião com o A. (aquando do mencionado pequeno almoço), não põem contudo em causa os termos em que ela foi relatada pelo A., sendo que a conversa entre este e o legal representante da Ré ocorreu em local mais afastado.
Acresce que, essa conversa, a tão curto espaço de tempo do anúncio público feito por EE (em meados de maio de 2019 – cfr. nº 16), não é de crer que este e o Réu já não houvessem falado e/ou mesmo acordado em que passaria ele a ser o treinador principal (não se vê que o referido EE anunciasse publicamente que iria ser o treinador do Clube Réu sem que tal acordo estivesse já firmado), facto que não só contraria o depoimento do legal representante da Ré quando afirma que, a essa data, o EE ainda não teria sido contratado, como dele se conclui que o legal representante da Ré não deu conhecimento do facto ao A. seja na mencionada reunião, seja até à publicitação do facto por EE.
Diga-se que de fls. 132 e 133 constam os documentos 8 e 9 que consistem em duas noticias, de 15.05.2019 e de 19.05.2019, relativas ao anúncio público, por EE, de que iria ser o novo treinador do clube Réu.
Não se vê, pois, razão, para dar como não provado o nº 19 dos factos provados ou para alterar a redação do mesmo nos termos pretendidos pela Ré/Recorrente.

Quanto ao nº 20 dos factos provados, a Ré/Recorrente não indica a resposta que a ele deveria ter sido dada, com o que não cumpriu o requisito previsto no art. 640º, nº 1, al. c), do CPC/2013, pelo que é de rejeitar a impugnação. De todo o modo, sempre se dirá que improcedendo a impugnação quanto ao nº 19, não se vê que deva ser alterado o nº 20, tanto mais que da prova invocada pela Recorrente não decore que o A., depois da notícia de que não iria ser o treinador principal, mormente da notícia referida no nº 16, não haja confrontado o legal representante da Ré e que este a haja confirmado.

2.2. Quanto ao nº 30 dos factos provados, pretende a Ré Recorrente que seja dado como provado o que refere na conclusão 55ª: “55. A DOUTA SENTENÇA A QUO tinha que ter dado como provado – O QUE DESDE JÁ SE REQUER – que a Recorrente logrou, por diversas vezes, celebrar com o Recorrido acordos para cessação do contrato de trabalho, não tendo outrossim o Recorrido aceite qualquer um dos vários acordos propostos pela Recorrente para cessação do contrato de trabalho!!”
Invoca a assentada do depoimento do legal representante da Ré e os depoimentos das testemunhas FF, CC (arroladas pelo A.) e BB (arrolado pela Ré), aludindo às propostas apresentadas pela Ré ao A. referidas nas conclusões 51 e 52, referindo na conclusão 54ª que “54. Com efeito, a cessação do contrato de trabalho desportivo pela Recorrente foi o culminar de variadíssimas tentativas de conciliação frustradas e diferidas no tempo entre as Partes, não se tendo esgotado num único e inflexível ato da Recorrente” e rematando com o referido na conclusão 55ª acima transcrita.
A Ré/Recorrente, intencionalmente ou não, mas certamente de forma incompreensível, confunde ou mistura “propostas” para acordo com o “acordo” em si, aludindo à “celebração de acordos para cessação do contrato de trabalho” mas dizendo também que o A./Recorrido não aceitou qualquer dos acordos propostos!
“Proposta” e “acordo” são realidades completamente distintas, dispensando grandes considerações tal a evidência da distinção: “proposta” é proposta e, para que haja acordo, é necessário que haja aceitação da proposta por parte da parte contrária. Um acordo resulta da convergência da vontade manifestada pelas partes, dispondo o art. 232º do Cód. Civil que o contrato não pode considerar-se celebrado enquanto não existir acordo das partes em relação a todas as cláusulas sobre as quais qualquer delas tiver entendido ser necessário o acordo.
A Ré fez propostas ao A. para cessação do contrato de trabalho, que este não aceitou, como por aquela admitido. É pois óbvio que a Ré, ao contrário do que diz, não “logrou, por diversas vezes, celebrar com o Recorrido acordos para cessação do contrato de trabalho”.
Por outro lado, as propostas a que a Ré/Recorrente alude já foram dadas como provadas nos nºs 21, 22, 26 e que o A. não aceitou e se, porventura, a outras se refere, não as concretizou na conclusão 55ª da qual consta o que pretende que seja dado como provado (art. 640º, nº 1, al. c), do CPC).
E que o A. não aceitou as aludidas propostas é já o que consta do nº 30 dos factos provados e foi isso que foi admitido pelo legal representante da Ré em audiência de julgamento, conforme assentada na respetiva ata de julgamento (de 27.01.2021) e da qual consta que: “Relativamente ao art.º 34.º da petição inicial, pelo depoente foi admitido que não foi possível o clube réu celebrar com o autor qualquer acordo de cessação de contrato de trabalho”. E, ao contrário do que alega a Ré/Recorrente, dizer-se o que ficou consignado na mencionada assentada e o que ficou a constar do nº 30 dos factos provados é exatamente a mesma coisa, tem exatamente o mesmo significado.
Improcede, assim e nesta parte, e sem necessidade de considerações adicionais, a impugnação aduzida.

2.3. Quanto aos nºs 36, 37, 38 e 40, deles consta que:
- “36. O referido em 11), 12), 13), 14), 15), 16), 17), 18), 19), 20), 22), 23), 24), 25), 28), 31 e 32) fez e faz com que o Autor tivesse sofrido e continue a sofrer, tendo-lhe causado uma enorme angustia, que se prolonga, que o fez perder noites sem dormir ou a dormir pouco, a pensar no porquê do sucedido, e na injustiça em que tal se consubstanciou, provocando-lhe uma revolta imensa, mais a mais tendo por origem um clube ao qual já tanto havia dado, quer como treinador, quer como futebolista – clube esse, [o Clube Réu], que sempre soube que não fora o facto do objecto do contrato de trabalho prever, expressamente no seu objecto, a época desportiva de .../... no escalão máximo do futebol profissional em Portugal, o Autor não o teria celebrado, sequer, atenta a existência de uma outra proposta de trabalho que ao tempo estava prestes a aceitar.
- 37. O Autor sente-se, ainda, desacreditado profissionalmente e profundamente desrespeitado pelo Clube Réu,
- 38. que, com a sua conduta para com o A., lhe causou sofrimento pela situação desprestigiante e desonrosa em que foi colocado.
- 40. Tendo o Clube Réu causado, com a sua conduta para com o A. dor, desgosto, sofrimento e uma intensa preocupação pelo seu futuro, que o Autor já sofreu e continua a suportar em consequência da conduta do Clube Réu.”
A Ré/Recorrente, embora dizendo que impugna os mencionados pontos da matéria de facto provada, não deu, todavia, o mínimo cumprimento aos requisitos previstos nas als. b) e c) do nº 1 do art. 640º do CPC/2013. Com feito, seja nas alegações, seja nas conclusões, não indica o sentido das respostas que, em seu entender, pretende que sejam dadas quanto a tais pontos, assim como não indica qualquer meio de prova a sustentar a impugnação, o que, nos termos do nº 1, do citado preceito, determina a imediata rejeição do recurso quanto a essa impugnação, que aliás não se encontra minimamente fundamentada.
Assim sendo, rejeita-se a impugnação quanto aos mencionados pontos da decisão da matéria de facto.

3. Das deduções às retribuições devidas ao A. em consequência da ilicitude do despedimentoRecurso principal, interposto pela Ré Recorrente

Na sentença recorrida considerou-se serem devidas ao A., em consequência da ilicitude do despedimento, as retribuições que se venceriam até final do contrato, no montante ilíquido de €83.802,67 (de agosto de 2019 a junho de 2020), às quais é de descontar o montante líquido de €13.500 auferido pelo A. de outubro de 2019 a junho de 2020 ao serviço do Clube B..., em Espanha.
Não pondo a Ré/Recorrente em causa o valor das retribuições por si devidas (montante ilíquido de €83.802,67) e o montante líquido auferido pelo A. no mencionado período (€13.500 líquidos), a questão, pese embora a longuíssima (mas repetitiva) alegação que aduz, é tão só a de saber se o Mmº Juiz poderia, ao mencionado montante ilíquido, descontar o mencionado montante líquido, concluindo a Recorrente que: i) ao montante ilíquido a que o A. teria direito deverá ser descontado o montante ilíquido que corresponda ao líquido de €13.500 auferido pelo A. (o que deveria ter sido apurado pela 1ª instância); ii) ou descontar-se o montante líquido de €13.500,00 ao montante líquido que corresponda ao ilíquido de €83.802,67.
É de referir que, na contestação, a Ré advogou a solução mencionada em ii), tendo deduzido à quantia de €4.500,00 líquida (correspondente, segundo ela, à ilíquida de €7.618,33) que o A. auferiria ao seu serviço não fosse o despedimento, a quantia líquida de €1.500,00 auferida pelo A. no B... de outubro de 2019 a junho de 2020 (acrescida da retribuição correspondente aos meses de agosto e setembro de 2019, pela totalidade, nos quais não exerceu atividade profissional remunerada).

3.1. Na sentença recorrida considerou-se que o A. foi ilicitamente despedido pela Ré, o que não é posto em causa no recurso, sendo ao caso aplicável o CCT celebrado entre a Liga Portuguesa de Futebol Profissional e a Associação Nacional de Treinadores de Futebol publicado no BTE nº 20, de 29.05.2012, tal como também ali decidido e no que estão as partes de acordo.
Na sentença referiu-se o seguinte:
“2ª Questão: Indemnização devida ao autor
Divergência entre as partes tanto mais surpreendente, quanto cristalina e inequívoca a resposta a tal questão se apresenta perante o estatuído no nº3 da cláusula 44ª do CCT:
“3 — A entidade patronal que promova ilicitamente o despedimento do treinador fica obrigada a indemnizá-lo nos termos da anterior cláusula 41.ª”
Por sua vez, a aludida cláusula 41ª dispõe sobre a “responsabilidade da entidade empregadora pela resolução do contrato do treinador” nos seguintes termos:
“1 — A resolução do contrato com fundamento nos factos previstos no n.º 1 da cláusula anterior confere ao treinador o direito a uma indemnização correspondente ao valor das retribuições que lhe seriam devidas se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo, deduzidas das que eventualmente venha a auferir pela mesma actividade durante o período em causa.
2 — As retribuições vincendas referidas no número anterior abrangem, para além da remuneração base, apenas os prémios devidos em função dos resultados obtidos até ao final da época em que foi promovida a resolução do contrato com justa causa pelo treinador.
3 — Se pela cessação do contrato resultarem para o treinador prejuízos superiores ao montante indemnizatório fixado nos n.os 1 e 2, poderá aquele reclamar a respectiva indemnização para ressarcimento desses danos.”
Aí se prevê, de forma clara e escorreita, o acervo indemnizatório dos direitos que para o autor decorrem do despedimento ilícito de que foi alvo no dia 31 de Julho de 2019 por parte do Clube Réu.
*
Assim, o autor tem o direito a uma indemnização correspondente ao valor das retribuições que lhe seriam devidas se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo, deduzidas das que eventualmente venha a auferir pela mesma actividade durante o período em causa.
Assim, tendo o autor sido despedido ilicitamente no dia 31 de Julho de 2019, em face do nº2 da Cláusula Sexta do “aditamento ao contrato de trabalho nº ...”, junto a fls.20 a 21, e tendo em conta ter resultado provado (facto provado 34) que o Clube Réu apenas pagou ao Autor a primeira mensalidade de 7.618,33€ do total de doze devidas, nos termos e para os efeitos convencionados na clausula Sexta, n.º2, § unico do contrato de trabalho referido no facto provado 5., temos que o valor das retribuições que seriam devidas ao Autor se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo é de €83.801,67 (= €91.420,00 - €7.618,33).
Porém, resultou igualmente provado que decorreram na íntegra os meses de Agosto e de Setembro de 2019 e o Clube Réu não pagou os respectivo salários ao Autor, sendo que este não treinou qualquer equipa no periodo em causa, (facto provado 33) e que o Autor conseguiu entretanto a celebração de um contrato de trabalho, com o respectivo termo inicial reportado a 01 de Outubro de 2019, – que o vincula a outro clube de futebol, passando a treinar uma equipa – o B..., do Grupo IX da “Tercera Divisíon” de Espanha, que, na realidade, corresponde a uma quarta divisao espanhola, pois acima dela existem o “Campeonato Nacional de Liga de Primera División”, o “Campeonato Nacional de Liga de Segunda División” e o “Campeonato Nacional de Liga de Segunda División B”, a competir num escalão com uma visibilidade inferior à da equipa de futebol profissional senior masculino do Réu e auferindo uma remuneração base para a época de .../... de €13.500 líquidos, a pagar em 9 prestações mensais, iguais e consecutivas, com início em Outubro de 2019 e término em Junho de 2020, à razão de €1.500 líquidos por cada um desse meses, (facto provado 35.).
E assim, importa deduzir as retribuições que o autor auferiu pela mesma actividade durante o período em causa e que totalizaram €13.500 líquidos.
O que significa que, à luz do aludido nº1 da cláusula 41ª do CCT o autor tem direito a uma indemnização correspondente ao valor das retribuições que lhe seriam devidas se o contrato de trabalho tivesse cessado no seu termo (€83.801,67), deduzidas das que veio a auferir pela mesma actividade durante o período em causa, (€13.500).
Ou seja, o autor tem direito à indemnização de €70.301,67 (= €83.801,67-13.500), nos termos do nº1 da cláusula 41ª ex vi do nº3 da cláusula 44ª, ambas do CCT aplicável, acrescida dos peticionados juros de mora, procedendo, desde logo, nesta parte e nesta medida a presente acção.”
Como é sabido a retribuição, no sistema fiscal português, está sujeita a descontos legais (IRS) e para a Segurança Social (contribuições, designadamente por parte do trabalhador)[4], competindo ao empregador proceder à retenção na fonte das quantias provenientes de tais descontos, fazendo a sua entrega às entidades competentes, e, por consequência, pagando ao trabalhador um montante líquido, isto é, deduzido de tais encargos.
O mesmo sucede no pagamento ao trabalhador das retribuições intercalares decorrentes da ilicitude do despedimento - cfr. Acórdão do STJ de 16.06.2010, Processo 2282/18.2T8STR, in www.dgsi.pt, de cujo sumário consta que: “V - Embora o referido n.º 1 do art. 437.º , ao estatuir que o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal, não refira se o valor da retribuição a considerar é a retribuição ilíquida ou líquida, resulta da letra da lei que a retribuição em causa corresponde à quantia que o trabalhador deixou de auferir, isto é, a quantia ilíquida que deve entender-se como retribuição do trabalho e sobre a qual incidem os descontos legais”.
E, pelo menos por regra ou na normalidade das situações, o mesmo regime deverá ser aplicável aos descontos, que deverão ser feitos às retribuições intercalares, das importâncias que o trabalhador aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento (previstos no art. 390º, nº 2, al. a), do CT/2009 e, bem assim, na clª 41ª, nº 1, do CCT aplicável), mormente quando estas estejam também sujeitas ao mesmo regime fiscal, mormente o português. Assim se um trabalhador, por atividade profissional remunerada após o despedimento auferida em Portugal, sujeita ao regime fiscal português, auferir uma retribuição ilíquida será esta a que deverá ser descontada às retribuições intercalares (ilíquidas) devidas pelo despedimento ilícito.
Importa, no entanto, dizer que não compete ao Tribunal do Trabalho aferir da legalidade ou correção, ou não, dos encargos legais que sejam, ou não, devidos e que hajam, ou não, sido feitos e ou descontados, nem à sua determinação, seja no que se reporta às retribuições intercalares, seja no que se reporta às retribuições que hajam sido auferidas pelo trabalhador por atividade profissional posterior ao despedimento, sendo que tal é da competência das autoridades competentes no âmbito da relação tributária que mantêm com os contribuintes (Autoridade Tributária e Segurança Social) e de jurisdição própria (administrativa e fiscal). E, tal, tanto mais quando se esteja perante regimes nacionais tributários diferentes.
Ou seja, serve isto para dizer, e tendo presente o caso concreto, que não cabe ao Tribunal do Trabalho aferir e decidir quer do montante líquido das retribuições intercalares que sejam devidas pela Ré, quer do montante ilíquido que corresponderia ao líquido que o A. auferiu, em Espanha, ao serviço do Clube B... e /ou se foi, ou não, corretamente acordada e paga uma quantia líquida (sem sujeição a descontos legais).
É igualmente de referir que, no que se reporta a deduções relativas a eventuais importâncias auferidas pelo A. após a cessação do contrato e que não auferiria se não fosse o despedimento [citado art. 390º, nº 2, al. a) e, de forma idêntica, clª 41º, nº 1, do CCT], atento o principio do dispositivo, por se tratar de matéria na disponibilidade da parte/empregador, e porque constitui facto extintivo do direito do trabalhador às retribuições intercalares a que tem direito, entendemos que cabe ao empregador a alegação e prova, em sede de 1ª instância, dos factos necessários a tal dedução – cfr. neste sentido Acórdãos da RP de 16.12.2015, Proc. 191/09.05TTMTS.P4, de 14.07.2021, Proc. 88/20.8T8MTS-A.P1 e do STJ Acórdãos do STJ de 24.01.07, CJ, T1, p. 252, de 12.07.07, 29.04.09, 17.06.10 e 20.09.2006, Processos 06S4104, 06S4280, 08S3081, 615-B/2001.E1.S1 e 06S899, todos in www.dgsi.pt.
Revertendo ao caso em apreço, concordamos com a Ré/Recorrente no sentido de que o valor líquido das retribuições auferidas pelo A. após o despedimento ao serviço do Clube B... em Espanha (de outubro de 2019 a junho de 2020, no valor mensal de líquido de €1.500,00 e global de €13.500,00) não deve ser descontado ao valor ilíquido das retribuições intercalares devidas pela Ré. Discorda-se, todavia, do entendimento, apenas agora sufragado no recurso, de que a estas deverá ser descontado o montante ilíquido correspondente ao líquido mensal auferido em tal Clube, antes se entendendo, como também defende a Recorrente no recurso (cfr. conclusão 19ª) e defendeu na contestação, que este valor líquido, de €1.500,00/mensal e de €13.500 global, deve ser descontado ao montante líquido das retribuições intercalares devidas pela Ré em tal período (de outubro de 2019 a junho de 2020), isto é, competindo à Ré, depois de efetuar os descontos legais que haja de efetuar ao montante global ilíquido de €68.564,97 (€7.618,33 x 9 meses), descontar então os montantes líquidos auferidos pelo A. [acrescendo a retribuição global ilíquida de €7.618,33 x 2, correspondente aos meses de agosto e setembro de 2019 em que o A. não exerceu atividade profissional remunerada] e, assim, se encontrando o montante global ilíquido devido ao A.
Com efeito, o que decorre da matéria de facto provada é que, após o despedimento, o A., ao serviço de clube espanhol, auferiu a retribuição líquida global de €13.500 (no período de outubro de 2019 a junho de 2020), desconhecendo-se e não tendo sido alegado pela Ré o montante ilíquido correspondente a tal quantia líquida, nem tão pouco que sobre tal retribuição devessem incidir descontos de acordo com o regime fiscal espanhol (e/ou, ainda que auferida em Espanha, de acordo com o regime fiscal português), sendo que, como se disse, à Ré incumbia o ónus de alegação e prova das quantias auferidas pelo A. após o despedimento. Aliás, a dedução da quantia ilíquida que corresponderia à líquida de €13.500,00 consubstancia até questão nova, que apenas agora foi suscitada no recurso, sendo que, na contestação, o que a Ré alegou e pretendia é que essa quantia líquida de €13.500 fosse descontada à quantia líquida devida a título de retribuições intercalares. E, como também acima se disse, não cabe ao Tribunal do Trabalho apurar da legalidade ou não do acordo e pagamento pelo Clube espanhol de quantias líquidas (e não já de ilíquidas) e/ou do pagamento, ou não, pelo A. de encargos fiscais que porventura fossem devidos, seja ao fisco espanhol, seja ao português.
Salienta-se que o que está em causa não é saber se as retribuições intercalares devem ser pagas pelo seu valor ilíquido ou líquido (devendo, como se disse, serem pagas pelo seu valor ilíquido). O que está em causa é o desconto, a efetuar nos termos da clª 41º, nº 1, do CCT (dispondo o art. 390º, nº 2, al. a), do CT de forma similar), das importâncias que o trabalhador aufira com a cessação do contrato de trabalho e que não receberia se não fosse o despedimento, relevando, quanto a estas o valor do auferido mesmo que não tenham estado sujeitas aos descontos decorrentes de encargos fiscais.
Só que, neste caso, então os montantes auferidos deverão ser abatidos ao montante líquido das retribuições intercalares por serem estas as retribuições “comparáveis”.
Ora, assim sendo, não procede a pretensão da Recorrente, no que é secundada pelo parecer do Ministério Público, de anulação da sentença para apuramento da quantia ilíquida correspondente à líquida de €13.500,00 (valor global), assim como a pretensão daquela para notificar o A. no sentido de informar o valor do montante ilíquido que corresponderia ao líquido de €13.500,00, relevando, sim, que foi este o que foi pago e que o A. recebeu e que deve ser descontado ao montante que lhe é devido a título de retribuições intercalares, mas depois de efetuados, a esse montante ilíquido, os descontos legais que sejam devidos (IRS e contribuições para a Segurança Social), descontos legais estes que compete à Ré fazer, e não ao tribunal, tal como lhe competia fazê-lo quando lhe pagava a retribuição mensal.
Ou seja, a Ré deverá efetuar, à quantia global ilíquida de €68.564,97 a retenção na fonte/ descontos legais que sejam devidos (retenção na fonte que a ela compete efetuar) e, ao valor líquido assim apurado, deduzir o valor líquido de €13.500,00. Ao A. será, pois, devida, quanto ao período de outubro de 2019 a junho de 2020, a retribuição ilíquida correspondente ao valor apurado depois da referida dedução nos termos apontados, a que acrescerá a quantia ilíquida global de €15.236,66 [€7.618,33 x 2] correspondente aos meses de agosto e setembro de 2019 em que o A. não exerceu atividade profissional remunerada.

Assim, e nesta parte, procede parcialmente o recurso, devendo ser revogada a sentença recorrida na parte em que condenou a Ré a pagar ao A. a quantia de “70.301,67€ nos termos do disposto no n.º1 da cláusula 41.ª (aplicável por forca da respectiva clausula 44.ª, nº3) do C.C.T. aplicável”, devendo, em substituição, a Ré ser condenada a pagar ao A., a título de retribuições intercalares decorrentes do despedimento ilícito nos termos do disposto no n.º1 da cláusula 41.ª [aplicável por força da respetiva clausula 44.ª, nº3) do C.C.T. aplicável]: correspondente aos meses de agosto e setembro de 2019, a quantia global ilíquida de €15.236,66, bem como, correspondente aos meses de outubro de 2019 a junho de 2020, depois de calculados pela Ré os descontos legais (fiscais e para a Segurança Social) à quantia global ilíquida de €68.564,97 e efetuada, sobre o montante encontrado, a dedução da quantia líquida de €13.500,00, deverá pagar a quantia global ilíquida correspondente à líquida dai resultante.
Sobre a quantia ilíquida encontrada nos termos do acima referido, são devidos juros de mora conforme decidido pela 1ª instância (que não foram postos em causa).

4. Do recurso subordinado, interposto pelo A.:

Tem o recurso subordinado, interposto pelo A., por objeto: a absolvição da Ré do pedido de condenação no pagamento da quantia de €91.494,00 a título de danos patrimoniais relativos à desvalorização profissional; se esta não deve ser qualificada como dano não patrimonial; ou, subsidiariamente, se devia ter sido atribuído ao A. qualquer montante indemnizatório pela desvalorização profissional; e, ainda, em alternativa, se deve ser “revogada” a sentença recorrida com vista à formulação de convite às partes para se pronunciarem sobre a intenção do Juiz a quo de considerar o pedido de 91.494,00€ como sendo feito a título de danos não patrimoniais.

4.1. O A., na petição inicial, a par de uma indemnização de €10.000,00 por danos não patrimoniais, havia autonomizado e enquadrado a desvalorização profissional como um dano patrimonial e reclamado, pelo mesmo, a indemnização de €91.494,00.
Porém, na sentença recorrida entendeu-se que a desvalorização profissional invocada pelo A. se enquadra, não na figura dos danos patrimoniais, mas sim dos danos não patrimoniais, neste âmbito, e na fixação da indeminização correspondente (de €10.000,00), a tendo sopesado e valorizado, decisão de que o A. discorda no recurso subordinado que interpôs. Por sua vez a Ré, no recurso (principal) que interpôs, discorda do montante da indemnização de €10.000,00 pelos danos não patrimoniais fixada na sentença.
Uma vez que a questão objeto do recurso subordinado se pode repercutir ou ter influência no objeto do recurso principal, será aquele apreciado em primeiro lugar.

4.2. Na sentença recorrida referiu-se o seguinte:
“(…)
The Last but not the least, prevê-se no nº 3 da aludida cláusula 41ª que “se pela cessação do contrato resultarem para o treinador prejuízos superiores ao montante indemnizatório fixado nos n.ºs 1 e 2, poderá aquele reclamar a respectiva indemnização para ressarcimento desses danos.”
A esse propósito, o autor vem peticionar uma indemnização no valor de € 91.494,00, correspondente ao valor da desvalorização profissional sofrida pelo Autor em resultado da conduta do Clube Réu, sem que lhe seja aplicada a dedução prevista na última parte do nº1 da cláusula 41ª do CCT, uma vez que tal limitação apenas está prevista por contrapartida aos montantes ganhos a título de retribuição base.
Mais peticiona o autor a título de danos não patrimoniais, uma indemnização no montante de €10.000, nos termos e para os efeitos do disposto no nº3 da cláusula 41ª daquele CCT e dos artigos 494º e 496º, nºs 1 e 4 do CC, sem que lhe seja aplicada a dedução prevista na última parte do nº1 da cláusula 41ª do CCT, uma vez que tal limitação apenas está prevista por contrapartida aos montantes ganhos a título de retribuição base.
Em tal parte do seu pedido, o autor parece considerar o por si invocado, e peticionado, “valor da desvalorização profissional” como um dano patrimonial, ao peticionar separadamente e acrescidamente os danos não patrimoniais.
Do alegado a propósito do invocado “valor da desvalorização profissional” nos artigos 74º a 97º da P.I. o autor, apesar de invocar o estatuído nos artigos 562º a 564º do CC, não enquadra dogmaticamente o invocado “valor da desvalorização profissional” em particular, não caracteriza/qualifica como dano emergente ou lucro cessante.
O que até se compreende, face à nem sempre clara distinção entre dano emergente e lucro cessante, mormente quando estão em causa meras expetativas jurídicas, importando notar que a nossa lei (art. 564.º/1 do C. Civil) menciona tal binómio para querer dizer que ambos os danos são ressarcíveis,
O que é imprescindível (como resulta dos arts. 483.º/1, 798.º, 227.º/1 e 562.º, todos do C. Civil) - é que haja dano, condição essencial, limite e escopo da obrigação de indemnizar. Dano que, não contendo a nossa lei uma noção ou definição legal, pode ser definido como toda a ofensa de bens ou de interesses alheios protegidos pela ordem jurídica, como "a lesão ou prejuízo real, sob a forma de destruição, subtração ou deterioração de um certo bem, como a lesão de bens juridicamente protegidos do lesado, patrimoniais ou não, ou simplesmente como uma desvantagem de uma pessoa que é juridicamente relevante por ser tutelada pelo Direito" (Ac STJ de 09/07/2015, in CJ/STJ, 2015, Tomo II, pág. 164).
Questão diferente e a jusante da prova da existência de dano é a questão da avaliação e fixação do quantum indemnizatório devido.
Sendo certo que para que o Réu possa ser responsabilizado pelo invocado dano terá de se tratar de um dano causado por um ato/facto ilícito praticado pelo Réu, neste caso que tenha sido causado pelo despedimento ilícito efectuado pelo Réu.
Ora, em face da factualidade provada podemos considerar que do despedimento ilícito do A., que constitui a causa de pedir da presente acção, resultou a desvalorização profissional do autor, como treinador profissional de futebol?
A esse propósito, resultou provado que:
- contra a sua expressa vontade, o Autor foi impedido de desempenhar no mês de Julho de 2019 as funções para as quais havia sido contratado, em razão da referida decisão unilateral do Clube Réu, (facto provado 27.);
- o Autor conseguiu entretanto a celebração de um contrato de trabalho, com o respectivo termo inicial reportado a 01 de Outubro de 2019, – que o vincula a outro clube de futebol, passando a treinar uma equipa – o B..., do Grupo IX da “Tercera Divisíon” de Espanha, que, na realidade, corresponde a uma quarta divisão espanhola, pois acima dela existem o “Campeonato Nacional de Liga de Primera División”, o “Campeonato Nacional de Liga de Segunda División” e o “Campeonato Nacional de Liga de Segunda División B”, a competir num escalão com uma visibilidade inferior à da equipa de futebol profissional senior masculino do Réu e auferindo uma remuneração base para a época de .../... de €13.500 líquidos, a pagar em 9 prestações mensais, iguais e consecutivas, com início em Outubro de 2019 e término em Junho de 2020, à razão de €1.500 líquidos por cada um desse meses, (facto provado 35.);
- O Autor sente-se, ainda, desacreditado profissionalmente e profundamente desrespeitado pelo Clube Réu, (facto provado 37.);
- Com a sua conduta, o clube Réu impediu que o A. tivesse muito maior visibilidade e, consequentemente, valor de mercado, de que em concreto o Autor passaria a gozar por ir liderar um plantel de uma equipa da divisão máxima do futebol profissional em Portugal, (facto provado 39).
Ou seja, resulta da factualidade provada que ao ter despedido ilicitamente o autor o clube Réu impediu que o A. tivesse muito maior visibilidade e, consequentemente, valor de mercado, de que em concreto o Autor passaria a gozar por ir liderar um plantel de uma equipa da divisão máxima do futebol profissional em Portugal.
Que tal consequência danosa para o autor possa ser indemnizável em sede de danos não patrimoniais não se nos suscitam grandes dúvidas, mas poderá considerar-se estar-se perante um dano patrimonial com um valor de €91.494 como pretende o autor e como tal ser ressarcível nesse valor?
Regressemos à profusa alegação do autor a este propósito, começando o mesmo por invocar a cláusula décima primeira do “aditamento ao contrato de trabalho nº ...” onde as partes acordaram “como cláusula de revogação do presente contrato, pela cessação do contrato de trabalho antes do termo previsto no mesmo, a ser pago à primeira contraente pelo segundo contraente ou por qualquer Clube ou Sociedade Anónima Desportiva, nacional ou estrangeira, ou ainda por qualquer entidade terceira, no valor de 2.500.000,00 € (dois milhões e quinhentos mil euros)”.
É o que se designa por uma cláusula de rescisão.
Aos contributos doutrinários já trazidos aos autos pelo Autor nos seus artigos 77º a 79º da P.I., sintetizando-os na expressiva passagem de JOÃO LEAL AMADO (Vinculação versus liberdade, Coimbra, Coimbra Editora, págs.342-343) de que “a «cláusula de rescisão» distancia-se, pois, dos contornos típicos de uma cláusula penal, antes se analisando numa autêntica multa ou arra penitencial, isto é, numa cláusula que concede ao praticante o direito a uma desvinculação ad nutum, mediante o pagamento à entidade empregadora desportiva de uma certa contrapartida pecuniária, o chamado «direito de arrependimento»”, acrescentam-se ainda, em igual sentido, LÚCIO CORREIA o qual afirma que “a cláusula penal (…) visa liquidar de modo ne varietur o dano futuro, pretendendo-se desta forma evitar uma avaliação judicial da indemnização devida”, enquanto que “a cláusula de rescisão, não tem como pressuposto, o incumprimento contratual, não visa ressarcir danos futuros, mas sim, a recuperação da liberdade de trabalho do praticante desportivo, mediante um preço” (“Contributo para o Estudo da Cláusula Penal/Cláusula de Rescisão no Contrato de Trabalho Desportivo”, Minerva – Revista de Estudos Laborais, V (8), pág. 121).“Ao contrário do que sucede na cláusula penal, em que esta só é devida, se houver culpa do devedor, na cláusula de rescisão, esta pode verificar-se, sem que haja qualquer culpa do praticante desportivo no cumprimento da sua obrigação principal” (Loc. e Ob. Cits.., pág. 123).
Conclui, assim, LÚCIO CORREIA, que as cláusulas de rescisão são, afinal, típicas multas penitenciais. Também na doutrina espanhola, alguns autores negam a natureza das cláusulas de rescisão como cláusulas penais, Cfr.., por todos, UNAI ESQUIBEL MUÑIZ (Las denominadas cláusulas de rescisión del contrato del deportista profesional, Madrid, Dykinson, págs. 303-304).
Ou seja, a invocada cláusula décima primeira mais não estabelece que as consequências para o terminus antecipado do contrato por parte do aqui Autor, ou seja, fixa um montante do qual depende a possibilidade de fazer cessar antecipadamente um contrato.
Porém, que do valor impressivo da mesma (€2.500.000,00), mormente perante os valores acordados entre o autor e o réu quanto à sua retribuição, constantes da cláusula sexta de tal contrato, apenas se permite extrair a conclusão de que o valor significativo de tal cláusula (mais de dois milhões de euros) é um valor próprio de uma 1ª Liga de Futebol Profissional, prendendo-se com a circunstância de, mediante tal contrato o autor ter sido contratado para na época .../... ser treinador profissional do clube réu ter sido acordado o autor ir ser o treinador do clube réu na 1ª Liga Portuguesa de Futebol Profissional (conforme claramente também resulta da cláusula décima que imediatamente antecede a aludida cláusula décima primeira).
Porém, não se afigura permitir concluir, por si só, ser esse “o valor de valorização profissional” do autor pela sua contratação como treinador profissional na 1ª Liga Portuguesa de Futebol Profissional.
Por um lado, o valor acordado para a retribuição do autor para a aludida época .../... de 1ª Liga Portuguesa de Futebol Profissional foi um valor inferior a €100.000, (cfr. cláusula sexta, nº2, § único do aditamento ao contrato) muito inferior portanto a um valor de 2 milhões e 500 mil euros por época, e por outro lado, não é despiciendo sublinhar que tal cláusula de rescisão também visava garantir a manutenção do autor como treinador na época de .../... no campeonato de Portugal (vulgo, “terceira divisão”), que o clube Réu disputou em condições especialíssimas publicitadas nos jornais e rádios da época (os jogos em que o clube Réu participava não tinham sequer pontos em disputa por o clube Réu não poder ser despromovido nem ser promovido para a Liga de Honra – cfr. f.s.145 v.), pois, para o clube Réu tratou-se de uma mera época de transição, sabendo-se já que o clube Réu iria disputar directamente na época seguinte (.../...) a 1ª Liga Portuguesa de Futebol Profissional, como aliás decorre claramente das cláusulas décima e décima primeira do aditamento ao contrato de trabalho nº ..., sendo cláusulas que aponta, inequivocamente em Agosto de 2018 para a época de .../... do Clube Réu na 1ª Liga Portuguesa de Futebol Profissional, como veio a suceder.
Para o que mais nos aqui interessa na economia expositiva da apreciação do pedido de condenação formulado a título de “valor de desvalorização profissional”, não se pode, pois, estar de acordo com o autor quando refere que o valor de tal cláusula de rescisão de 2.500.000,00 permitira aferir da valorização do autor, mormente que “passaria a ter um valor de mercado 21,75 vezes superior ao valor remuneratório global” (cfr. artº88º da P.I.), pois tal cláusula de rescisão visou, como qualquer cláusula de rescisão, garantir que uma desvinculação ad nutum do autor implicaria o pagamento ao clube réu do aludido montante de 2.500.000€, logo desde a época de .../... no campeonato de Portugal (que aliás, foi a única época em que tal cláusula vigorou) e a inerente segurança jurídica, custando o «direito de arrependimento»” do Autor na celebração de tal contrato o aludido custo significativo de €2.500.000,00.
Nem se afigura rigoroso pretender aplicar o aludido índice de 21,75 vezes para o invocado cálculo de valorização do autor em €1.988.385,00 (cfr. artº89º da P.I.), ou a forma como se propõe no artº86º da P.I. o valor de €230.000,00, de onde o autor procura depois extrair nos artigos 90º e 96º da P.I. o peticionado montante de €91.494,00 de “desvalorização profissional.”
Se é certo que é sabido que o mercado dos treinadores profissionais de futebol é um mercado cada vez mais competitivo e mediático, também não é menos certo que o despedimento dos treinadores de futebol são um fenómeno relativamente comum e frequente por, conforme se refere no futebol “os treinadores estarem dependentes dos resultados”, de “a bola entrar”, pelo que a citada passagem do Professor Leal Amado no artigo 95º da P.I., da necessidade de o treinador e praticante desportivo profissional estar “perto da vista” tem necessariamente que ser temperado com muitos outros factores que tornam o mercado do futebol extremamente complexo e de difícil avaliação da cotação económica dos seus intervenientes.
Com efeito, no caso dos treinadores profissionais não só os resultados influem directamente no prestígio e cotação, mas também toda a entourage de empresários e agentes que consigam “colocar” o treinador em determinados mercados, a chamada “escola de treinadores” onde determinado treinador se insere (e a esse respeito a escola portuguesa está muito bem cotada- veja-se o que actualmente se passa no Brasil onde a procura de treinadores portugueses nunca foi tão intensa), mas ainda alguns factores dificilmente explicáveis que conduzem a que treinadores, com poucos resultados desportivos, ou sem resultados relevantes, mereçam um prestígio elevado e uma consequente cotação elevada de mercado (é conhecido o exemplo de Sven Goran Eriksson que em várias épocas no campeonato italiano apenas venceu uma liga de futebol profissional ao serviço da Lazio, mas que manteve sempre uma elevadíssima cotação e prestígio, tendo passado mesmo a ser carinhosamente conhecido em Itália como “il perdente sucesso” –“o perdedor com sucesso” - ou o caso mais recente de Bielsa, treinador argentino sem resultados relevantes na Argentina e na Europa, mas que com um enorme prestígio internacional, mormente na Inglaterra, por ser considerado um treinador capaz de criar um “futebol autoral”).
Tudo no sentido conclusivo de não se poder considerar que nos presentes autos se tenha provado que o autor sofreu uma desvalorização profissional quantificável em €91.494,00, sem prejuízo de se entender que a inequívoca perda da chance de treinar, pela primeira vez na sua carreira, uma equipa da 1ª Liga Portuguesa de Futebol Profissional, depois de ter um contrato celebrado com o clube réu dando-lhe essa oportunidade profissional para a época de .../..., que o seu despedimento ilícito pelo clube réu impossibilitou concretizar, trata-se de um dano indemnizável mas já no âmbito dos chamados danos não patrimoniais e não como dano patrimonial.
Improcede, assim, a presente acção quanto ao aludido pedido de condenação do clube réu no montante de €91.494,00, impondo-se que se passe a apreciar o pedido de indemnização por danos não patrimoniais também formulado pelo autor na presente causa.”
E ainda e tendo em conta, designadamente, o alegado pelo Recorrente, transcreve-se o que, na sentença, e após o que acima consignámos, foi referido a propósito dos danos não patrimoniais:
“Com efeito, peticiona ainda o autor a condenação do clube réu a pagar-lhe o montante de €10.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais.
Recorde-se que o nº3 da Claúsula 41ª do CCT aplicável estatui que “se pela cessação do contrato resultarem para o treinador prejuízos superiores ao montante indemnizatório fixado nos n.ºs 1 e 2, poderá aquele reclamar a respectiva indemnização para ressarcimento desses danos”, aí se incluindo inquestionavelmente os danos não patrimoniais.
Por outro lado, nos termos do disposto no artigo 389º, nº1, al.a) do CPT “sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado” “a indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais.”
Apreciemos pois se os factos provados fundamentam a peticionada fixação de uma indemnização por danos de natureza não patrimonial.
Para tanto, como é consabido, importa ter presente que, tendo a obrigação de indemnizar como resulta do disposto no artigo 483.º do Código Civil como pressupostos fundamentais a verificação de um facto ilícito e culposo do qual em termos de nexo de causalidade decorreram danos, estabelece por sua vez o artigo 496.º, do mesmo Código, que na fixação da indemnização se deve atender aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Estabelece ainda o artigo 563.º do Código Civil que “a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”, normativo este que vem sendo visto como expressão do acolhimento, no nosso sistema jurídico, da teoria da causalidade adequada, mas na sua formulação negativa, como resulta dos ensinamentos de Almeida Costa, (Direito das Obrigações, 3.ª edição, pág. 518), de tal modo que “o facto que actua como condição só deixará de ser causa do dano desde que se mostre por sua natureza de todo inadequado e o haja produzido apenas em circunstâncias anómalas ou excepcionais”.
Importa ainda acrescentar, agora citando-se a lição sempre actual de Antunes Varela (Das Obrigações em Geral, Volume I, pág. 748) que “o facto que actuou como condição do dano só deixará de ser considerado como causa adequada se, dada a sua natureza geral, se mostrar de todo em todo indiferente (…) para a verificação do dano, tendo-o provocado só por virtude das circunstâncias excepcionais, anormais, extraordinárias ou anómalas, que intercedam no caso concreto”, esclarecendo ainda que no juízo de prognose, em “condições regulares, desprendendo-nos da natureza do evento constitutivo de responsabilidade, dir-se-ia que um facto só deve considerar-se causa (adequada) daqueles danos (sofridos por outrem) que constituem uma consequência normal, típica, provável dele”.
Por sua vez, Galvão Telles, (Direito das Obrigações, 7.ª Edição, Coimbra Editora, 1997, pág. 404), nas suas irrepetíveis palavras, afirma que «a orientação hoje dominante (…), consiste em só considerar como causa jurídica do prejuízo a condição que, pela sua natureza e em face das circunstâncias do caso, se mostre apropriada para o gerar. A ideia de causalidade fica assim restringida às condições que (…) apresentam aptidão ou idoneidade para a produção do dano. Causa será só a condição adequada a essa produção».
Sendo certo que a lei não enumera os danos não patrimoniais que merecem a tutela do direito, antes confia ao tribunal o encargo de apreciar, em cada caso concreto se o dano não patrimonial é merecedor de uma indemnização.
Recorde-se que nos termos do artigo 496.º, do Código Civil, apenas se deve atender aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Tem sido afirmado na jurisprudência que a gravidade do dano é um conceito relativamente indeterminado, carecido de preenchimento valorativo a fazer caso a caso, de acordo com a realidade fáctica apurada e que a gravidade deve medir-se por um padrão objectivo, e não de acordo com factores subjectivos, ligados a uma sensibilidade particularmente aguçada ou especialmente fria e embotada do lesado.
Por outro lado, deve a gravidade ser apreciada em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado.
Parece-nos importante aqui notar que a lesão essencial que surge como consequência do comportamento ilícito do empregador que procede a um despedimento ilícito se traduz na lesão do direito ao trabalho do trabalhador que lhe é suprimido, ainda que temporariamente, por um acto unilateral e contratualmente ilícito do empregador, retirando-o do meio laboral onde o trabalhador estava inserido.
E é importante, também, relembrar a questão da diversidade das consequências a nível económico e de subsistência do trabalhador, pela consequente perda da retribuição, e das consequências em termos de carreira profissional, bem como a necessidade de se exigir um plus nos casos de despedimento ilícito, pela frequência com que tais actos se verificam, pelo que as consequências normais de perda do trabalho e da retribuição não costumam ser consideradas com gravidade suficiente para conferir ao trabalhador ilicitamente despedido o direito a uma indemnização por tal despedimento ilícito, sob pena de se banalizarem tais indemnizações.
O critério decisivo terá, pois, de ser o previsto no artigo 496º do CC e a gravidade suficiente aí prevista para que tais danos não patrimoniais possam merecer a tutela do direito.
Ora, a este propósito, resultou provado que:
- O referido nos factos provados 11), 12), 13), 14), 15), 16), 17), 18), 19), 20), 22), 23), 24), 25), 28), 31 e 32) fez e faz com que o Autor tivesse sofrido e continue a sofrer, tendo-lhe causado uma enorme angustia, que se prolonga, que o fez perder noites sem dormir ou a dormir pouco, a pensar no porque do sucedido, e na injustica em que tal se consubstanciou, provocando-lhe uma revolta imensa, mais a mais tendo por origem um clube ao qual ja tanto havia dado, quer como treinador, quer como futebolista – clube esse, [o Clube Réu], que sempre soube que não fora o facto do objecto do contrato de trabalho prever, expressamente no seu objecto, a epoca desportiva de .../... no escalão máximo do futebol profissional em Portugal, o Autor não o teria celebrado, sequer, atenta a existencia de uma outra proposta de trabalho que ao tempo estava prestes a aceitar.
- O Autor sente-se, ainda, desacreditado profissionalmente e profundamente desrespeitado pelo Clube Réu, que, com a sua conduta para com o A., lhe causou sofrimento pela situação desprestigiante e desonrosa em que foi colocado.
- Com a sua conduta, o clube Réu impediu que o A. tivesse muito maior visibilidade e, consequentemente, valor de mercado, de que em concreto o Autor passaria a gozar por ir liderar um plantel de uma equipa da divisao maxima do futebol profissional em Portugal. - Tendo o Clube Réu causado, com a sua conduta para com o A. dor, desgosto, sofrimento e uma intensa preocupação pelo seu futuro, que o Autor ja sofreu e continua a suportar em consequência da conduta do Clube Réu.
A tal factualidade acresce ainda, ter resultado provado que:
O Clube Réu impediu o Autor de trabalhar entre 01/07/2019 a 31./07/2019, (cfr. facto provado 26) tendo assim o Réu violado o direito de ocupação efectiva do Autor, que ficou um mês sem ocupação, tendo consequentemente o Réu violado dessa forma a própria dignidade do autor como trabalhador, despedindo-o de seguida no dia 31/7/2019, tendo resultado provado que contra a sua expressa vontade, o Autor foi impedido de desempenhar no mês de Julho de 2019 as funções para as quais havia sido contratado, em razão da referida decisão unilateral do Clube Réu, (facto provado 27.), não sendo despiciendo ainda referir decorrer da factualidade provada que foi pela comunicação social que, ainda em meados de Maio de 2019, o Autor veio a tomar conhecimento de que não iria ser o treinador da equipa de futebol principal senior masculina para a época desportiva de .../... e que o treinador da equipa principal de futebol senior masculino do réu para essa época iria ser o Mister EE, como se veio a verificar e o Clube réu confirmou, (cfr. factos provados 16, 17, 19 e 20), tendo sido foi feito transparecer para opinião pública a substituição do autor por um outro treinador alegadamente mais capaz para o desempenho do cargo, o que significava uma machadada na imagem e no prestigio profissionais do Autor., (cfr. facto provado 23.) o que não pode deixar de se considerar uma situação profissionalmente humilhante e melindrosa para o autor, mormente perante os jogadores que orientava e treinava e todo o pessoal administrativo e de apoio do clube, que já sabiam que o autor não iria continuar na época seguinte.
Ao que acresce que o Autor jamais teria celebrado o contrato de trabalho com o Clube Réu caso o mesmo não contemplasse a epoca de .../... na Liga …, pois, como o Clube Réu ao tempo de tal facto estava a par, o primeiro encontrava-se na iminencia de assinar um contrato de trabalho para exercer sua actividade fora de Portugal, num projecto cujas dimensão remuneratória e visibilidade desportiva largamente ultrapassavam as do Clube Reu a disputar o terceiro escalão do futebol português (Campeonato de Portugal), (facto provado 24.), o que não pode deixar de se reflectir numa frustração profissional o autor ter estado um ano (.../...) a “marcar passo” no campeonato de Portugal com o clube ré na expectativa de na época seguinte (.../...) ter a sua grande oportunidade profissional de pisar o palco da 1ª Liga Profissional Portuguesa e aí ter a oportunidade de consolidar ou lançar a sua carreira, o que lhe foi retirado de repente e por vontade unilateral do clube réu, esfumando-se assim uma oportunidade que o autor não sabe quando possa voltar a surgir : ser um dos 18 treinadores do escalão principal do futebol profissional português.
Num tal cenário, cremos não haver dúvidas que existe uma lesão objectiva da dignidade, um dano não patrimonial objectivo que se reveste de gravidade evidente e deve ser compensado.
Tanto mais que, aqui sim, surge a tal questão da desvalorização profissional do autor, ou melhor da sua não valorização em termos que estavam contratualmente previstos, uma vez que treinar um clube de futebol profissional na 1ª Liga Profissional de Clubes é, para a maioria dos treinadores, o auge da sua carreira ou uma etapa decisiva para os poucos treinadores portugueses que posteriormente são convidados para treinar um grande clube português ou um clube estrangeiro relevante (ou seja, um clube da primeira liga inglesa, espanhola, italiana, francesa ou alemã ou mesmo, como tem sucedido mais recente, um grande clube brasileiro).
Tal perspectiva de carreira do autor foi efectivamente cerceada com o seu despedimento ilícito pelo Réu não podendo tal frustração de expectativas fundadas num contrato em que até se encontrava “blindada” a sua saída unilateral do clube por uma cláusula rescisória de mais de dois milhões de euros, não podendo deixar de ser valorado esse frustrar de expectativas em sede de danos não patrimoniais.
A forma como é sentida essa lesão e os sentimentos que suscita em cada um podem divergir em termos subjectivos, o que deve ser ponderado na fixação equitativa do valor da indemnização, mas não apaga a existência daquele dano objectivo que surge como consequência primeira do comportamento ilícito do empregador.
Ora, voltando ao caso, afirmada a ilicitude dos factos e a culpa, como ainda também o necessário nexo, não se nos afigura merecer controvérsia a conclusão de que os danos que se provaram, como o exige o artigo 496.º, são indemnizáveis, pela gravidade do dano, pressuposta pela citada norma, não se estando perante meros vulgares incómodos, contrariedades, transtornos ou indisposições.
Com efeito, “o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado” (cfr. Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, volume I, 4.ª edição, Almedina, pág. 532).
Quanto à questão de saber qual será a medida adequada da indemnização (a justa indemnização) para compensar os danos que se provaram, entende-se como ajustado fixar nos peticionados €10.000,00 o montante da indemnização, ponderando a gravidade bastante acentuada dos danos sofridos pelo A., o assinalável grau de ilicitude e culpa no comportamento da R.; o facto da situação se arrastar desde há quase 2 anos e a capacidade económica do clude R., que como é do conhecimento público tem um orçamento superior a 5 milhões de euros e é um dos mais históricos clubes do futebol português.
Com efeito, e conforme já se deixou escrito, temos como de gravidade bastante/acentuada os danos sofridos pelo Autor, que inclusivamente foi colocado pelo Réu numa situação de inatividade profissional – em clara violação do direito que a esta assiste de efetivo desempenho dessa atividade –, ficando pois sem funções atribuídas, no contexto a que já aludimos anteriormente e que resulta da factualidade provada.
Consideramos, pois, que nesta concreta situação, não podendo deixar de se considerar relevantes para os efeitos previstos no artigo 496.º do Código Civil os descritos danos, por contenderem com a profissionalidade como valor inerente à realização da pessoa humana e à sua intrínseca dignidade, pois que causam evidente abalo a quem deles sofre, é devida, porque fundada, a atribuição ao Autor de indemnização que, na medida do possível, compense esses danos.
Por necessário recurso à equidade, aqui chamada à aplicação, haverá que ponderar-se, para o efeito, do que resulta dos autos, por um lado, o grau de culpabilidade do Réu, que é sem dúvidas intenso, desde logo atenta a natureza da violação do dever de ocupação efetiva – com a retirada total de funções – e o tempo por que perdurou (durante um mês), o grau de ilicitude do facto, que no caso temos também como elevado, a situação económica do Réu, clube da 1ª Liga Profissional, com um orçamento de alguns milhões de euros, um dos clubes históricos do nosso País de dimensão nacional, as consequências/danos que resultaram do comportamento ilícito do Ré, já antes enunciados, de gravidade manifesta.
Tudo ponderado, num juízo de equidade e em face dos critérios estabelecidos no n.º 3 do art.º 496 do Código Civil, não encontramos razões efetivas para não ter por justo e adequado o valor peticionado pelo autor de €10.000, face às razões e a própria função que a fixação da indemnização nesta sede se visam alcançar para ressarcir os danos não patrimoniais sofridos pelo Autor, em consequência da descrita atuação ilícita do Réu.
Procede assim também a presente acção nessa parte.”

4.3. Do assim decidido discorda o Recorrente alegando que:
- Dos nºs 12., 13., 16., 17., 18., 22., 23., 24., 27., 29., 35., 36., 37., 38. e 39 da factualidade provada, ressalta que o dano provocado pela conduta ilícita e culposa do clube Réu é inequivocamente de natureza patrimonial, ideia, aliás, reforçada para o que se diz na Motivação da Matéria de Facto no que tange ao facto provado 24.[5];
- Tendo por base os nºs 12., 24., 35., 36. e 39. da factualidade provada e na Motivação da Matéria de Facto no que tange ao facto provado 24., com uma bastante razoável margem de segurança se chega também à conclusão que ao assinar pelo clube Réu e assim ter deixado de assinar por um clube dos Emirados Árabes Unidos, o Autor deixou de ganhar 87.000,00€, mais 68.903,46€ líquidos do que aquilo a que teve direito por ter ficado a primeira época no clube Réu - (“cfr. facto provado 10. e página 2 do documento agora junto pelo Autor”).
- A sentença recorrida errou ao qualificar o concreto dano da desvalorização profissional como dano não patrimonial, não tendo condenado na quantia de €91.494,003 peticionada em razão da proibição legal do art. 609º, nº 1,do CPC, nada impedindo, contudo, que o Réu fosse condenado em tal quantia a título de indemnização por danos patrimoniais, que foi apelidada de desvalorização profissional, enquadrando-a nas classificações de lucro cessante ou de perda de chance, estando no caso verificados qualquer deles, qualificação jurídica que lhe era permitida nos termos do art. 5º, nº 3, do CPC, uma vez que dentro dos limites da factualidade provada;
- Atento o disposto no art. 6.º, nº 1, do CPC sempre cumpriria ao Mmº Juiz ter ouvido as partes, comunicando-lhes previamente a sua intenção de qualificar a indemnização por desvalorização profissional como de natureza não patrimonial, tendo presente a proibição legal do ultra petitum expressamente prevista no artigo 609.º, n.º1 do CPC.
- A sentença terá achado excessivo o valor peticionado e não valendo de per se a base [o valor da cláusula de rescisão de 2.500.000,00€ a partir da qual o A. chegou a um determinado valor -cfr. artigos 74.º a 97.º da P.I], porém concluiu, quando se pronuncia sobre os danos não patrimoniais, que no contrato de trabalho em causa estava blindada a saída unilateral do Autor do Clube Réu, precisamente em razão da existência de tal cláusula, logo aí convocando o necessário recurso à equidade e lembrando o intenso grau de gravidade da culpabilidade do Clube Réu
- “Ora, mutatis mutandis:
(i) Se a existência de tal cláusula rescisória serve para, a jusante, acentuar a gravidade da posterior actuação do clube Réu no cercear da carreira do Autor e da consequente e inevitável desvalorização profissional deste, então também poderá e deverá necessariamente constituir, a montante, um esteio norteador da sua valorização profissional;
(ii) Bem como se se pode e deve recorrer à equidade para cálculo da indemnização em sede de danos não patrimoniais, então, e com ancoramento no disposto nos artigos 4.º, al. a) e 566.º, n.º3, ambos do Código Civil, também poderia e deveria o Tribunal ter a ela recorrido para determinar o quantum da indemnização aqui em apreço, nitidamente de cariz patrimonial”, contendendo a desvalorização profissional com factos concretos que encerram em si um desvalor quantificável, uma perda de mercado, um degradar dum posicionamento num circuito fechado de grande competitividade – desvalor, perda e degradar esses que se consubstanciam em objectivas e concretas diminuições de natureza pecuniária, susceceptíveis de serem calculadas, pois tal é a desvalorização profissional que deve ser configurada como um lucro cessante (art. 564º, nº 1, Cód. Civil), isto sem prejuízo de também poder ser, em parte, configurada como uma situação de perda de chance;
- Aplicou erroneamente o art. 496.º, n.º3 do Código Civil, quando em seu lugar deveria ter aplicado o art. 566.º, n.º3 do mesmo;
-Deve assim a Ré ser condenada a pagar ao A. a quantia €91.494,00 a título de indemnização por danos patrimoniais, por desvalorização profissional;
- ou subsidiariamente por decisão que nesse concreto ponto, e por recurso à equidade, se norteie pelos valores alegados nos pontos XII e XIII das Alegações ou por outros que melhor se coadunem com a factualidade assente nos autos;
- ou, em alternativa, e revogando-se parcialmente a sentença recorrida, formular às partes, antes de decidir, primeiro ao Autor e depois ao clube Réu, o convite para se pronunciarem sobre a intenção do senhor Juiz a quo considerar o pedido de 91.494,00€ se dever considerar feito a título de danos não patrimoniais.

4.4. Dispõe o código Civil que:
- no art. 483º, nº 1, do Cód. Civil: “1. Aquele que, com dolo ou culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.
- no art. 494º: “1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. 2. (…). 3. O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494º; (…)
- no art. 562º: “Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação”;
- no art. 563º: “A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”;
- no art. 564º: “1. O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão. (…)”.
- no art. 566º: “1. A indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor. 2. Sem prejuízo do preceituado noutras disposições, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos. 3. Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados”.
Para além de um facto ilícito, da sua imputação ao agente e da existência de dolo ou culpa, constituem também requisitos do direito à indemnização a existência de um dano e o nexo de causalidade entre este e o facto ilícito.
O dano pode ser patrimonial ou não patrimonial. O primeiro incide sobre interesses de natureza material ou económica, refletem-se no património do lesado, ao contrário do segundo, que se reporta a valores de ordem espiritual, ideal ou moral. E, no dano patrimonial, cabem não só os danos emergentes, como os lucros cessantes. Como diz Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, Coimbra Editora, 3ª Edição, pág. 448, o primeiro (dano emergente) “compreende o prejuízo causado nos bens ou nos direitos já existentes na titularidade do lesado à data da lesão. O segundo abrange os benefícios que o lesado deixou de obter por causa do facto ilícito, mas a que ainda não tinha direito à data da lesão”, medindo-se o dano patrimonial “em princípio, por uma diferença: a diferença entre a situação real actual do lesado e a situação (hipotética) em que ele se encontraria, se não fosse a lesão”.
Quanto ao nexo de causalidade é necessário que entre o facto praticado pelo agente e o dano (patrimonial ou não patrimonial) sofrido haja um nexo de causalidade (na sua formulação negativa) de modo a poder afirmar-se que o dano é resultante do facto.
A par da clássica distinção entre dano emergente e lucro cessante, a perda de chance, embora variando o seu enquadramento dogmático e como forma de colmatar ou resolver algumas questões que decorrem da verificação, como requisitos indemnizatórios, da existência de dano e do nexo de causalidade entre este e o evento, tem vindo a ser admitida pela doutrina e jurisprudência como dano patrimonial ressarcível, dizendo-se no Acórdão do STJ de 01.07.2014, Proc. 824/06.5TVLSB.L2.S1, in www.dgsi.pt:
(…)
Não devem assimilar-se os planos do dano e da causalidade com implicação na perspectiva de excluir como dano autónomo a perda de chance nem esta figura deve ser aplicada, subsidiariamente, quando se não provou a existência de nexo de causalidade adequada entre a conduta lesiva por acção ou omissão, e o dano sofrido, já que existe sempre uma álea, seja quando se divisa uma vantagem que se quer alcançar, ou um risco de não conseguir o resultado desejado.
Para que se considere autónoma a figura de “perda de chance”, como um valor que não pode ser negado ao titular e que está contido no seu património, importa apreciar a conduta do lesante, não a ligando ferreamente ao nexo de causalidade – sem que tal afirmação valha como desconsideração absoluta desse requisito da responsabilidade civil, mas, antes, introduzir como requisito caracterizador dessa autonomia que se possa afirmar que o lesado tinha uma chance, uma probabilidade, séria, real, de, não fora a actuação que frustrou essa chance, obter uma vantagem que probabilisticamente era razoável supor que almejasse e/ou que a actuação omitida se o não tivesse sido, poderia ter minorado a chance de ter tido um resultado não tão danoso como o que ocorreu. Há perda de chance quando se perde um proveito futuro, ou se não se evita uma desvantagem por actuação imputável a terceiro.”
Embora sobre a perda de chance processual, o Acórdão do STJ nº 2/2022, de 05.07.2021 (Proc. 34545/15.3T8LSB.L1.S2-A), publicado no DR 1ª Série, de 26.01.2022, teceu considerações e fixou jurisprudência que releva no âmbito de tal figura ainda que no domínio de outras situações de responsabilidade civil, jurisprudência essa que se fixou nos seguintes termos: “O dano da perda de chance processual, fundamento da obrigação de indemnizar, tem de ser consistente e sério, cabendo ao lesado o ónus da prova de tal consistência e seriedade.” [sublinhado nosso]
E, na sua fundamentação, refere-se, para além do mais, o seguinte:
“(…)
A certeza do dano e a imputação objetiva deste ao ato lesivo (nexo causal), requisitos exigíveis segundo os princípios e regras do nosso direito de responsabilidade civil[21], não dispensam que se apure, caso a caso, a suficiente probabilidade da consistência e seriedade da concreta “chance” processual comprometida.
A verificação dos pressupostos gerais da responsabilidade civil, incluindo a existência do dano e de um nexo causal entre o facto lesivo e o dano, impõem, em linha com o que se referiu, que a “chance”, para poder ser indemnizável, seja “consistente e séria” e que a sua concretização se apresente com um grau de probabilidade suficiente e não com carácter meramente hipotético.
Só assim a “chance” preencherá, num limiar mínimo, a certeza que é condição da indemnizabilidade do dano, só assim este pode ser considerado como objetivamente imputável ao ato lesivo e só assim se respeitará a regra (e a ideia de justiça) de que ao lesante apenas poderá ser imposto que responda pelos danos que causou.
Significa isto que a toda a chance ou oportunidade perdida (a todo o ato lesivo e a todo processo perdido) não se segue, como que automaticamente e sem mais, uma indemnização por dano da perda de chance: a verificação do ilícito não contém já em si o dano a indemnizar.
(…)
(…): à luz das regras e princípios vigentes de responsabilidade civil, só uma “chance” com um mínimo de consistência pode aspirar a exprimir a certeza (“relativa”) do resultado comprometido (pelo ato lesivo) ser considerado provável.
Não há indemnização civil sem dano e este tem que ser certo, sendo que a certeza do dano de chance (que, por isso, merece a tutela do direito e ser indemnizado) está exatamente na probabilidade suficiente, em função da consistência da chance, do resultado favorável da ação comprometida.
(…)
Concretizando um pouco mais, para estarmos perante uma chance com probabilidade de sucesso suficiente terá, em princípio e no mínimo, o sucesso da chance (o sucesso da provável ação comprometida) que ser considerado como superior ao seu insucesso, uma vez que só a partir de tal limiar mínimo se poderá dizer que a não ocorrência do dano, sem o ato lesivo, seria mais provável que a sua ocorrência[22].
(…)
Apreciação/decisão hipotética que acabará também por relevar para o quantum indemnizatório, uma vez que a indemnização deve corresponder ao valor da chance perdida e este valor será o reflexo do grau de probabilidade da perda de chance em relação à vantagem que se procurava e se perdeu em definitivo.
Assim, visando-se com tal apuramento estabelecer o preenchimento de requisitos da responsabilidade civil (dano e nexo causal), estão em causa (no subsequente processo, em que se pede a indemnização pelo dano da perda de chance) elementos/factos constitutivos do direito indemnizatório invocado pelo lesado/mandante, sendo este – face ao encargo que o ónus da prova, quando aos requisitos da responsabilidade civil, lhe coloca (cfr. 342.º/1 do C. Civil) – que terá que fornecer os elementos que irão permitir apurar qual seria a decisão hipotética do processo em que foi cometida a falta do advogado (ou seja, os factos que irão permitir apurar que o processo comprometido tinha uma suficiente, no referido limiar mínimo, probabilidade de sucesso ou, dito por outras palavras, que a chance perdida era consistente e séria).
Tanto mais que, repete-se, no incidental “julgamento dentro do julgamento”, como juízo de prognose póstuma que é, o que se pretende alcançar é a prova da decisão hipotética que o processo teria tido sem a falta do mandatário (tendo em vista reconstruir a situação hipotética que, sem tal falta, existiria), ou seja, o tribunal da ação de indemnização deve adotar a perspetiva do tribunal que teria que decidir o processo e não exatamente o seu prisma de decisão[25], uma vez que, insiste-se, o que está verdadeiramente em causa, em termos de configuração jurídica, é a reconstituição do curso hipotético dos acontecimentos sem o evento/facto lesivo (reconstituição de que a decisão hipotética do processo, na perspetiva do tribunal que teria decidido o processo, é instrumental)[26].
Não sendo isto iludível (a dificuldade em averiguar, em certos casos, a decisão hipotética), o certo é que o respeito pelas regras e princípios que regem a responsabilidade civil – a certeza do dano, a doutrina da causalidade adequada, a função essencialmente reparatória/ressarcitória da responsabilidade civil e a proibição do enriquecimento sem causa do lesado – não podem ser afastados, ainda que tal obste a uma responsabilidade generalizada das perdas de chance processual.
A violação de deveres específicos – voluntária e contratualmente assumidos – dos mandatários forenses, com o argumento da intrínseca incerteza relativa do desfecho dum processo judicial, não pode passar sempre incólume, mas a sua responsabilização tem que respeitar, sem voluntarismos, a segurança jurídica e ser rodeada dos necessários cuidados, não podendo prescindir, como se referiu, da imposição ao lesado do ónus de provar – seja fácil ou difícil – a verificação do dano (a consistência e seriedade da concreta chance processual comprometida), a suficiente probabilidade (no referido limiar mínimo) de obtenção de ganho de causa no processo em que foi cometida a falta pelo mandatário forense.
Questão diferente e a jusante da prova da existência de dano (da prova da consistência e seriedade da concreta chance processual comprometida), é a já referida questão da avaliação e fixação do quantum indemnizatório devido em caso de perda de chance consistente e séria.
(…)
O que sucede é que a teoria da diferença, enquanto método de quantificação do dano patrimonial (e não tanto para apurar da sua existência), não serve para quantificar um dano com as características do dano da perda de chance, razão pela qual há quem entenda[27] que talvez seja preferível, em certas situações de perda de chance processual, sustentar que o cliente/mandante sofreu “uma incompreensível indignação pela ligeireza e leviandade com que o seu caso foi tratado” e, por isso, um dano não patrimonial a indemnizar equitativamente.
São coisas diferentes – ao lado dum dano patrimonial da perda de chance processual, pode existir uma dano não patrimonial decorrente da ansiedade que o incumprimento dos deveres pelo mandatário possa ter causado – devendo, todavia, reconhecer-se a dificuldade da prova do montante do dano da perda de chance, a dificuldade em quantificar a exata probabilidade de sucesso da chance/oportunidade de ganho do processo, o que por certo levará a que, em muitos casos, haja lugar à fixação equitativa, nos termos do art. 566.º/3 do C. Civil, dum montante indemnizatório pelo dano da perda de chance; reparação por recurso à equidade que, no seguimento de tudo o que se referiu, só poderá acontecer – enfatiza-se especialmente, uma vez que é exatamente neste ponto que está o fulcro da divergência e contradição jurisprudenciais – após, no seguimento/termo do incidental “julgamento dentro do julgamento”, se ter concluído pela consistência e seriedade da perda de chance, ou seja, após ter-se considerado provada a probabilidade suficiente (no referido limiar mínimo) de existência dum dano de chance indemnizável (sabido que a indemnização equitativa dum dano pressupõe que o dano está provado, ou seja, no caso, que a consistência e seriedade do dano da perda de chance está previamente provada, apenas se desconhecendo o valor exato do mesmo).
Probabilidade suficiente de verificação do resultado favorável que se perdeu (a tal chance consistente e séria), que há de extrair-se da factualidade alegada e provada pelo lesado, pelo que, sem tal factualidade, fica o tribunal (que julga o pedido de indemnização com base na perda de chance) sem elementos para poder concluir pela existência do dano da perda de chance, não podendo/devendo sequer passar ao momento seguinte respeitante à quantificação da indemnização.
Como refere Patrícia Cordeiro da Costa[28], “a chance indemnizável não é (…) uma chance abstrata e filosófica, no campo das possibilidades gerais, mas uma chance séria, concreta e consistente, apoiada numa probabilidade igualmente séria e consistente de ocorrência da vantagem perdida não fora o facto ilícito. Sob pena de se transformar a perda de chance num mecanismo de atribuição irrestrita de indemnizações, bastando a presença de uma mera suspeita de probabilidade, a ação de indemnização deve ser preparada, em termos de alegação de facto e de produção de prova, de forma a que o tribunal, na decisão a tomar, tenha dados de facto suficientes para, desde logo, concluir pela existência duma chance séria. (…) A indemnização pela chance perdida depende da prova efetiva da existência de uma chance séria (…)”
“A intervenção do art. 566.º/3 do C. C. só pode operar num momento em que o tribunal já estabeleceu a existência de uma chance séria e consistente, ainda que num intervalo de probabilidade mínima e máxima, mas permitindo o limite mínimo desse intervalo afirmar a existência de uma chance séria, faltando apenas quantificar a indemnização. Se persiste a dúvida quanto à existência de uma chance e à seriedade da mesma, o art. 566.º/3 não pode ser convocado para, com recurso à equidade, resolver um problema de falta de prova, nomeadamente em termos salomónicos. Esta norma destina-se a estabelecer um critério de quantificação da indemnização, não da prova dos factos.”
(…)
É quanto basta para, concluindo, afirmar:
Que – respondendo à proposta de uniformização constante do Parecer do M. P – não é ao lesante que cabe provar que a chance não era consistente e séria[30], uma vez que, repete-se, a consistência e seriedade da oportunidade perdida é que permite dizer que há dano da perda de chance suscetível de indemnização, ou seja, a consistência e seriedade preenche um dos requisitos exigidos pelo instituto jurídico (responsabilidade civil) em que o lesado alicerça o seu direito, sendo constitutivo (não é impeditivo) do direito invocado.
Que – respondendo ao recorrente – para haver dano da perda de chance suscetível de indemnização, não basta a prova da conduta ilícita do advogado, não basta a prova do ato/facto lesivo (a verificação do ilícito não contém já em si o dano a indemnizar), uma vez que, repete-se, segundo o instituto jurídico invocado não há reparação sem estar também provada a existência dum dano e causado por tal ato/facto ilícito.” [sublinhados nossos].

4.5. Revertendo ao caso em apreço, o A./Recorrente vem invocar a atendibilidade da indemnização de 91.420,00€ (conforme cálculo que adiante se referirá) a titulo de dano patrimonial decorrente da sua desvalorização profissional, para tanto aludindo, agora no recurso, ao seu enquadramento como lucro cessante ou perda de chance, contrapondo a Ré que tal enquadramento não foi, pelo A., invocando na petição inicial, consubstanciando questão nova, de que a Relação não pode agora apreciar, para além de que, nos termos dos arts. 5º, 608º, nº 2, e 260º do CPC, não pode a Relação conhecer de factos que não foram alegados pelo A. na petição inicial e que não integram a causa de pedir, nem o pedido, não tendo sido alegados “quaisquer factos que enquadrassem ou configurassem o dano patrimonial de desvalorização profissional nas classificações de lucro cessante ou de perda de chance, não podem agora ser considerados na decisão quaisquer pretensos lucros cessantes e/ou perda de chance, sob pena de excesso de pronúncia ou pronúncia indevida e sob pena de violação do princípio da estabilidade da instância” [conclusão 103º das contra-alegações ao recurso subordinado].
É certo que o A., na petição inicial, a fundamentar o alegado dano patrimonial decorrente da sua desvalorização profissional, não aludiu ao lucro cessante, nem à perda de chance. Invocou, todavia, a desvalorização profissional e a factualidade de que, segundo ele, aquela decorrerá, bem como que, dessa desvalorização, decorreu o dano patrimonial cujo ressarcimento peticiona, sendo que o seu enquadramento como dano emergente, lucro cessante ou perda de chance consubstancia questão meramente jurídica a apreciar dentro dos limites da factualidade alegada e do normativo jurídico relativo aos danos patrimoniais (art. 5º, nº 3, do CPC), não consubstanciando questão de que, face ao principio do dispositivo e da estabilidade da instância, não possa a Relação, nos termos do art. 608º, nº 2, 5º e 260º do CPC, apreciar e/ou questão nova de que também não possa conhecer. Questão diferente é se a factualidade invocada e dada como provada sustenta o dano patrimonial invocado, o que se prende, não com os limites dos poderes de conhecimento por esta Relação, mas sim com o mérito do pedido.
Assim e prosseguindo:
O A., na p.i., a par do pedido de condenação da Ré nas retribuições intercalares e de uma indemnização de €10.000,00 por danos não patrimoniais, havia autonomizado e enquadrado a desvalorização profissional como um dano patrimonial e reclamado, pelo mesmo, a indemnização de €91.494,00.
Para tanto ali alegou que:
- o valor remuneratório (base) global contratualizado entre Ré e Autor para as duas épocas desportivas objeto do contrato de trabalho foi de 114.905,00€ [= 23.485,00€, para a época .../... + 91.420,00€, para a época .../...], correspondendo o valor de 2.500.000,00€ previsto na clª 11ª do contrato de trabalho (independentemente da sua qualificação como cláusula penal ou cláusula de rescisão), a 21,75 vezes mais do que o mencionado remuneratório (base) global 114.905,00€- art. 82º;
- Tal quantia de 2.500.000,00€ mostra-se excessiva, pelo que, será, nos termos do art. 812º do CC, de a reduzir para um valor correspondente ao dobro da remuneração global acordada para toda a duração do período contratual – ou seja, para o valor de 230.000,00€ [= 114.905,00€ x 2]- art. 85º;
- se o Clube Reu entendeu que se o Autor se quisesse libertar do contrato ante tempus teria de pagar-lhe um determinado valor, e porque presumiu que o Autor, ao trabalhar ao seu serviço ficaria valorizado, a concreta medida dessa valorização deverá ser contabilizada nos termos indicados no art. 82: o Autor passaria a ter um valor de mercado 21,75 vezes superior ao valor remuneratório global contratualizado entre Clube Reu e Autor para as duas épocas desportivas objeto do contrato de trabalho -art. 88º;
- Aplicando esse fator de valorização (x 21,75) ao montante correspondente ao salário contratualizado apenas para a última das duas épocas desportivas (91.420,00€), o Autor, com o despedimento ilícito de que foi alvo terá perdido a oportunidade de se valorizar no montante de 1.988.385,00€; -art. 89º
- Tendo em conta a redução do valor de 2.500.000,00€ para 230.000,00€, bem como que o valor salarial respeitante à segunda época (91.420,00€) corresponde a 79,56% do valor salarial global contratualizado para o conjunto das duas épocas (total de 114.905,00€- de .../... e .../...), sempre seria de aplicar aquele mesmo percentual (79,56%) ao valor de 230.000,00€, do que resulta que o valor assim obtido, de 182.988,00€, seria aquele que o Reu deveria pagar ao Autor pelo despedimento ilícito (art. 90º);
- Porém, e porque o contrato de trabalho foi, indevidamente, omisso quanto a reciprocidade de uma cláusula como a sua clª 11ª “não podemos deixar de cautelarmente, procurar medir o efectivo dano sofrido pelo Autor em resultado do despedimento ilicito de que foi objecto” (art. 90º);
- o R. agiu de forma voluntária e culposa, bem como danosa para o A., que ficou sem trabalho, desempregado, quando tinha contrato para, pela primeira vez, treinar uma equipa do escalão máximo do futebol nacional, tendo sido tornada pública a mensagem, sem qualquer fundamento plausível, de que o Autor não reuniria os requisitos de competência necessária, nomeadamente os de experiência e pulso, para exercer de forma capaz o seu trabalho, imagem especialmente destruidora da reputação profissional, sobretudo quando era e é do conhecimento publico, que o Autor tinha treinado a mesma equipa do Clube Réu na época desportiva anterior (.../...) – art. 92º;
- Numa atividade como o futebol profissional, onde os treinadores vivem do prestigio e da imagem que os resultados e a comunicação social lhe conferem, um despedimento antes do início da época, não por maus resultados, mas sim pela publicitação na opinião pública, apreendida nos jornais, na internet, na televisão, na rádio, de uma imagem de incapacidade de bom desempenho, de menoridade profissional, que, para lá de totalmente desprovida de factualidade que lhe pudesse servir de âncora, em concreto e apta, como o foi, a desacreditar o Autor, a desvalorizá-lo profissionalmente – art. 93º
- Tendo o A., assim, perdido valor de mercado e uma inequívoca desvalorização profissional- art. 94º.
- Para quantificar essa concreta perda de valor e seguindo o critério anterior, correspondendo a quantia de 230.000,00€ acima referida ao dobro do valor real contratualizado pelas partes (salário base global para a totalidade das duas épocas desportivas), deve fixar-secomo concreto quantum do dano patrimonial sofrido pelo Autor – no que tange estritamente à sua desvalorização profissional , tangível em perda de valor de mercado e encerrando em si as vertentes do dano de imagem e de prestigio – a grandeza correspondente a metade do valor de 182.988,00€ ali estimado” – art. 96º;
- E, assim, ascendendo ao valor de 91.494,00€ a medida do dano sofrido pelo Autor no que concerne a desvalorização profissional resultante em exclusivo do concreto despedimento ilícito promovido pelo Clube Réu – art. 97º.
Ou seja, e em síntese, alegou o A. que do despedimento ilícito resultou a sua desvalorização profissional, o que consubstancia, segundo diz, dano patrimonial que quantifica, nos termos acima referidos, em 91.494,00€.
De referir que o A., na p.i., não qualificou o mencionado dano como dano emergente, lucro cessante ou perda de chance.
Tal pedido foi julgado improcedente, tendo-se referido na sentença recorrida que:
“Tudo no sentido conclusivo de não se poder considerar que nos presentes autos se tenha provado que o autor sofreu uma desvalorização profissional quantificável em €91.494,00, sem prejuízo de se entender que a inequívoca perda da chance de treinar, pela primeira vez na sua carreira, uma equipa da 1ª Liga Portuguesa de Futebol Profissional, depois de ter um contrato celebrado com o clube réu dando-lhe essa oportunidade profissional para a época de .../..., que o seu despedimento ilícito pelo clube réu impossibilitou concretizar, trata-se de um dano indemnizável mas já no âmbito dos chamados danos não patrimoniais e não como dano patrimonial”. E, no âmbito da indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos atendeu, a par de outra factualidade, designadamente dos danos não patrimoniais sofridos nela descritos, à desvalorização profissional do A., condenado a Ré a pagar-lhe a indemnização de €10.000,00, este o valor peticionado pelo A. a tal título.”

4.6. No que toca aos alegados danos patrimoniais

A desvalorização profissional do trabalhador determinada por comportamento ilícito do empregador (no caso, o despedimento ilícito) só por si e ainda que represente uma situação desfavorável ou contrária ao direito do trabalhador de não ser desvalorizado profissionalmente, não se nos afigura que consubstancie um dano patrimonial indemnizável.
Ela, desvalorização profissional ilícita, poderá, sim, ser causa de um dano patrimonial se dela resultar um prejuízo patrimonial que poderá configurar-se como um dano emergente (se afetar o património já existente na titularidade do trabalhador à data da lesão), como um lucro cessante (reportado este aos benefícios patrimoniais que o lesado deixou de obter por causa do facto ilícito, mas a que ainda não tinha direito à data da lesão) ou na previsão da perda de chance, isto é e tendo em conta o caso concreto, na perda da possibilidade de o A. vir a obter outras/melhores condições remuneratórias de contratação (por esta razão se enquadrando no dano patrimonial) do que as que se verificariam não fosse a ilícita desvalorização profissional de que foi alvo (decorrente do despedimento ilícito).
E podendo o dano não patrimonial coexistir com o dano patrimonial, pode a ilícita desvalorização profissional determinar, também e simultaneamente, a ressarcibilidade dos danos de natureza não patrimonial se se verificarem os respetivos pressupostos: danos dessa natureza, nexo de causalidade entre o ato lesivo (desvalorização profissional) e os danos existentes e gravidade destes a reclamarem a tutela do direito.
No caso, e no que se reporta aos eventuais danos enquadráveis na categoria de danos patrimoniais, releva a seguinte factualidade provada:
- O Autor é treinador profissional de futebol;
- O Clube Réu é uma sociedade desportiva unipessoal por quotas (SDUQ) cuja equipa principal de futebol senior masculino se encontrou a disputar na época desportiva de .../..., a Primeira Liga, que é o principal escalão do sistema de ligas de futebol de Portugal;
- No dia 01 de Agosto de 2018, foi celebrado um contrato de trabalho desportivo entre o Autor e o Clube Réu, ao tempo a disputar o Campeonato de Portugal, serie A, intitulado de “Contrato de Trabalho”, o qual foi objeto, nessa mesma data, de aditamento;
- Nesse contrato e seu aditamento, foi acordado que o Autor exerceria as funções de treinador da equipa principal de futebol masculino senior deste ultimo, durante o período compreendido entre 01.08.2018 e 30.06.2020, correspondente às épocas desportivas de .../... e .../..., mediante a remuneração anual global ilíquida de 23.485,00€ quanto à 1ª época e de 91.420,00€ ilíquidos quanto à 2ª época, de 01.07.2019 a 30.06.2020;
- o A., aos 31.07.2019, foi despedido, sem justa causa e sem procedimento disciplinar, nos termos e circunstancialismo descrito na matéria de facto provado, donde decorre que o A. foi ilicitamente despedido;
- Ao tempo que foi celebrado o contrato de trabalho, 01.08.2018, já as partes sabiam, e tal facto era público e notório, que – apesar de militar no Campeonato de Portugal, o terceiro escalão na hierarquia dos campeonatos de futebol em Portugal – era praticamente certo que, na época seguinte (.../...) o Clube Réu ascenderia ao mais alto daqueles escalões, a Primeira Liga/LIGA ..., pois havia já uma sentença judicial transitada em julgado que determinava isso mesmo;
- O A. não aceitou a proposta da Ré referida nos nºs 21 e 22 dos factos provados, porque queria cumprir o contrato de trabalho até ao fim e porque a sua substituição por um outro treinador, na perspetiva do Clube Réu – que foi feita transparecer para a opinião pública – alegadamente mais capaz para o desempenho do cargo, agora que o Clube Réu tinha ascendido ao escalão máximo do futebol português, significava uma machadada na imagem e no prestigio profissionais do Autor;
- O Autor jamais teria celebrado o contrato de trabalho com o Clube Réu caso o mesmo não contemplasse a época de .../... na Liga ..., pois, como o Clube Réu ao tempo de tal facto estava a par, o primeiro encontrava-se na iminência de assinar um contrato de trabalho para exercer sua atividade fora de Portugal, num projeto cujas dimensão remuneratória e visibilidade desportiva largamente ultrapassavam as do Clube Réu a disputar o terceiro escalão do futebol português (Campeonato de Portugal);
- A Ré subiu à Primeira Liga /LIGA ... na época desportiva de .../..., encontrando-se anteriormente, durante 5 épocas seguidas, em escalões inferiores, nomeadamente no terceiro escalão na hierarquia dos campeonatos de futebol em Portugal.
- O Autor, aos 01.10.2019, conseguiu celebrar contrato de trabalho com outro clube de futebol, passando a treinar uma equipa – o B..., do Grupo IX da “Tercera Divisíon” de Espanha, que, na realidade, corresponde a uma quarta divisão espanhola, pois acima dela existem o “Campeonato Nacional de Liga de Primera División”, o “Campeonato Nacional de Liga de Segunda División” e o “Campeonato Nacional de Liga de Segunda División B”, a competir num escalão com uma visibilidade inferior à da equipa de futebol profissional sénior masculino do Réu e auferindo uma remuneração base global de €13.500 líquidos, com início em Outubro de 2019 e término em Junho de 2020, à razão de €1.500 líquidos por cada um desse meses.
- O referido em 11), 12), 13), 14), 15), 16), 17), 18), 19), 20), 22), 23), 24), 25), 28), 31 e 32) fez e faz com que o Autor tivesse sofrido e continue a sofrer, tendo-lhe causado uma enorme angustia, que se prolonga, que o fez perder noites sem dormir ou a dormir pouco, a pensar no porquê do sucedido, e na injustiça em que tal se consubstanciou, provocando-lhe uma revolta imensa, mais a mais tendo por origem um clube ao qual já tanto havia dado, quer como treinador, quer como futebolista – clube esse, [o Clube Réu], que sempre soube que não fora o facto do objecto do contrato de trabalho prever, expressamente no seu objecto, a época desportiva de .../... no escalão máximo do futebol profissional em Portugal, o Autor não o teria celebrado, sequer, atenta a existência de uma outra proposta de trabalho que ao tempo estava prestes a aceitar – nº 36;
- O Autor sente-se, ainda, desacreditado profissionalmente e profundamente desrespeitado pelo Clube Réu – nº 37;
- A conduta do Réu para com o A. causou-lhe sofrimento pela situação desprestigiante e desonrosa em que foi colocado – nº 38.
- Com a sua conduta, o clube Réu impediu que o A. tivesse muito maior visibilidade e, consequentemente, valor de mercado, de que em concreto o Autor passaria a gozar por ir liderar um plantel de uma equipa da divisão máxima do futebol profissional em Portugal – nº 39;
- Tendo o Clube Réu causado, com a sua conduta para com o A. dor, desgosto, sofrimento e uma intensa preocupação pelo seu futuro, que o Autor já sofreu e continua a suportar em consequência da conduta do Clube Réu. -nº 40
- Na época de .../... o Clube Réu manteve-se na 1ª Liga Portuguesa de Futebol Profissional – nº 41.
Da ilicitude do despedimento decorreu, na verdade, uma desvalorização profissional do A., na medida em que tal o impediu de disputar, na época de .../..., o campeonato da 1ª Liga de Futebol, assim o impedindo de ter “muito maior visibilidade e, consequentemente, valor de mercado, de que em concreto o Autor passaria a gozar por ir liderar um plantel de uma equipa da divisão máxima do futebol profissional em Portugal” conforme decorre do nº 39 dos factos provados.
Essa é a única consequência provada que mais se poderia aproximar de um dano patrimonial, sendo que os restantes factos não se enquadram, manifestamente, num dano de natureza patrimonial (mas sim não patrimonial).
Acontece que não se nos afigura que esse único facto provado (nº 39) consubstancie ou dele resulte a verificação de um dano patrimonial, seja como dano emergente, seja como lucro cessante, passível de ser indemnizado a esse título. Da perda de visibilidade e de valor de mercado não decorre, só por si, que tal haja determinado um concreto prejuízo já existente na esfera patrimonial do A. ou um benefício patrimonial que este auferiria se não fosse a desvalorização profissional decorrente do despedimento ilícito (sendo de realçar que a Ré já foi condenada, na sentença recorrida, no pagamento das retribuições intercalares e prémios de jogo que o A. auferiria na época de .../... se não fosse o despedimento ilícito).
E também não se nos afigura que a pretensão do A. possa proceder com fundamento na perda de chance, isto é, com fundamento na perda da possibilidade de o A. vir a obter outras/melhores condições remuneratórias de contratação (por esta razão se enquadrando no dano patrimonial) do que as que se verificariam não fosse a ilícita desvalorização profissional de que foi alvo (decorrente do despedimento ilícito).
Como decorre das considerações jurídicas tecidas pelo Acórdão do STJ nº 2/2022 (de uniformização de jurisprudência) e aí citando Patrícia Cordeiro da Costa, a propósito desta figura, “a chance indemnizável não é (…) uma chance abstrata e filosófica, no campo das possibilidades gerais, mas uma chance séria, concreta e consistente, apoiada numa probabilidade igualmente séria e consistente de ocorrência da vantagem perdida não fora o facto ilícito.”, sendo necessário uma “[p]robabilidade suficiente de verificação do resultado favorável que se perdeu (a tal chance consistente e séria), que há de extrair-se da factualidade alegada e provada pelo lesado, pelo que, sem tal factualidade, fica o tribunal (que julga o pedido de indemnização com base na perda de chance) sem elementos para poder concluir pela existência do dano da perda de chance, não podendo/devendo sequer passar ao momento seguinte respeitante à quantificação da indemnização”.
Ora, do nº 39 dos factos provados [39. Com a sua conduta, o clube Réu impediu que o A. tivesse muito maior visibilidade e, consequentemente, valor de mercado, de que em concreto o Autor passaria a gozar por ir liderar um plantel de uma equipa da divisão máxima do futebol profissional em Portugal] apenas resulta uma chance abstrata, no campo das possibilidade gerais, mas não uma chance suficientemente séria, concreta e consistente de que, não fora o despedimento ilícito e a desvalorização profissional, teria o A. um outro benefício patrimonial, mormente a sua posterior contratação em termos remuneratórios mais favoráveis do que os que se verificam por virtude dessa desvalorização profissional.
Com efeito, o valor de mercado do treinador de futebol e, bem assim, a possibilidade de contratação por clubes de maior projeção, designadamente que disputem a 1ª Liga Portuguesa de Futebol Profissional, é extremamente volátil e incerta, dependendo de inúmeros fatores condicionantes e não controláveis, nomeadamente dos resultados desportivos que a equipe conseguiria, da empatia com a massa adepta, da maior ou menor concorrência de treinadores existentes e disponíveis com visibilidade e maior ou menor possibilidade de colocação, com a vontade dos dirigentes desportivos.
Não se encontra, pois, demonstrada a existência de um suporte mínimo factual que nos permita concluir no sentido de que, ainda que por recurso à figura da perda de chance, a desvalorização profissional do A. lhe haja determinado um dano patrimonial suscetível de indemnização.
É de dizer, ainda, que os cálculos feitos pelo A. para determinar o alegado prejuízo patrimonial de €91.494,00 é questão que se prende com a determinação do valor do dano indemnizável e da indemnização, não com a sua existência dos pressupostos da ressarcibilidade do dano patrimonial, mormente com a existência do mesmo e do nexo causal entre este e o facto ilícito. Ora, concluindo-se, como se concluiu – no sentido da inexistência de dano patrimonial suscetível de ressarcimento -, não há que apreciar do valor da indemnização, seja em face do critério adotado pelo A., seja, em face do disposto no art. 566º, nº 3, do Cód. Civil [com recurso à equidade], questão que, assim, fica prejudicada.

4.7. Diz ainda o A./Recorrente que “11. É ainda verdade que tendo por base o estabelecido nos pontos 12., 24., 35., 36. e 39. da factualidade provada e na Motivação da Matéria de Facto no que tange ao facto provado 24., com uma bastante razoável margem de segurança se chega também à conclusão que ao assinar pelo clube Réu e assim ter deixado de assinar por um clube dos Emirados Árabes Unidos, o Autor deixou de ganhar 87.000,00€, mais 68.903,46€ (…) líquidos do que aquilo a que teve direito por ter ficado a primeira época no clube Réu - (cfr. facto provado 10. e página 2 do documento agora junto pelo Autor).”
Desde já é de referir que não foi admitida a junção do documento invocado em tal conclusão conforme referido no ponto IV. do presente acórdão.
O A., na petição inicial, invocou como causa de pedir do pedido de indemnização por danos patrimoniais, a desvalorização profissional decorrente do despedimento ilícito, não o facto, que agora alega, de que, por virtude de ter celebrado o contrato de trabalho com o Réu, ter deixado de contratar com um clube dos Emirados Árabes Unidos e deixado de auferir a quantia de €87.000,00, ou seja, ter deixado de auferir mais 68.903,46€. Aliás, e diga-se, o A., na petição inicial, não alegou sequer o montante da quantia que iria auferir no mencionado clube.
O agora alegado radica em facto anterior ao despedimento, e aliás anterior à contratação, enquanto que a causa de pedir invocada na ação para fundamentar o pedido de indemnização por danos patrimoniais radica no despedimento ilícito e desvalorização profissional dele decorrente, posteriores pois àquele. O agora invocado consubstanciaria aditamento da causa de pedir e/ou alteração/desenvolvimento do pedido primitivo que seriam extemporâneos, pois que, como decorre do disposto no art. 265º , nº 3, do CPC, tal só poderia ter tido lugar até ao encerramento da discussão em 1ª instância e não já em fase de recurso, como acontece.
Assim, e nesta parte, improcede o alegado na conclusão 11ª.

4.8. Mas, diz ainda o Recorrente que, improcedendo o pedido de condenação da Ré no pagamento do alegado prejuízo patrimonial de €91.494,00, sempre deverá ser fixado ao A. uma indemnização pela desvalorização profissional sofrida em consequência do despedimento ilícito.
Das razões acima aduzidas decorre a improcedência da pretensão de indemnizabilidade da desvalorização profissional (traduzida esta no facto contido no nº 39 dos factos provados), por si só, como dano patrimonial. A alegada desvalorização profissional, só por si, não consubstancia um dano patrimonial passível de indemnização, sendo necessário a existência de um dano/prejuízo patrimonial que dela decorra, seja como dano emergente ou lucro cessante, ou com base na perda de chance, o que, no caso e como referido, se julgou improcedente.

4.9. Diz ainda o A./Recorrente que “13. Por outras palavras: na Douta Sentença recorrida, de forma errónea classificou-se o concreto dano aqui em apreço como sendo Não Patrimonial e partiu-se desse equívoco para fundamentar a procedência total do pedido por danos não patrimoniais (10.000,00€) autonomamente formulado pelo Autor na P.I., a este título não se condenando em mais (em mais 91.494,003€, conforme o pedido pelo Autor, por exemplo) em razão da proibição legal do ultra petitum, expressamente prevista no artigo 609.º, n.º1 do Código de Processo Civil.”, acrescentando que o juiz não está sujeito à qualificação jurídica dos factos (art. 5º, nº 3, do CPC) e que, no âmbito do dever de gestão processual previsto no art. 6º, nº 1, do mesmo, deveria o Mmº Juiz “ter ouvido, primeiro o Autor e depois o clube Réu, comunicando-lhes previamente a sua intenção de qualificar a indemnização por desvalorização profissional como de natureza não patrimonial, uma vez tendo presente aquela proibição legal do ultra petitum expressamente prevista no artigo 609.º, n.º1 do Código de Processo Civil.” [cfr. conclusões 13ª e 15ª].
O Mmº Juiz, no âmbito da livre qualificação jurídica dos factos (art. 5º, nº 3, do CPC) qualificou juridicamente a desvalorização profissional e perda de chance que daí considerou decorrer como dano não patrimonial, sendo que, na sessão da audiência de discussão e julgamento de 28.06.2021 proferiu o seguinte despacho: “Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 3º nº3 do CPC determino que as partes se pronunciem, querendo, quanto ao eventual conhecimento pelo Tribunal aquando da apreciação das matérias em causa, mormente do pedido indemnizatório por danos não patrimoniais, acerca da eventual perda de chance e violação dos princípios de boa fé durante a fase negocial entre as partes”. Ou seja, ainda que não se referindo expressamente à desvalorização profissional, está subjacente ou decorre do referido despacho que tal questão – perda de chance cujo fundamento assenta na alegada desvalorização profissional – poderia vir a ser tratada em sede de pedido indemnizatório por danos não patrimoniais, com o que foi dado cumprimento ao princípio do contraditório e o que permitiria às partes, A. e Ré, pronunciarem-se sobre a mesma e sobre a eventual atendibilidade, ou não, do pedido de condenação no pagamento da indemnização de 91.494,003€ com fundamento em danos não patrimoniais e não já nos danos patrimoniais.
E da referida ata consta também, após o referido despacho, que “Deste despacho notifiquei os presentes e de seguida foi dada novamente a palavra ao ilustre mandatário do autor e de seguida à ilustre mandatária do réu que dela usaram”. Ou seja, daí resulta que as partes tiveram oportunidade de se pronunciarem e que usaram da palavra do modo que entenderam [ouvida a gravação do referido pelas partes resulta que elas usaram da palavra, mas não já que se tenham pronunciado sobre a questão objeto do despacho, o que, todavia, a elas é imputável uma vez que lhes foi dada tal oportunidade].
Ou seja, o princípio do contraditório, que aliás foi, como referido, assegurado, não impede que se conheça da alegada desvalorização profissional como fundamento, também, do pedido de indemnização por danos não patrimoniais com o limite de 91.494,003€.
E, por outro lado, o art. 609º, nº 1, do CPC, não impede esse conhecimento, ao contrário do que diz, designadamente, o Réu/Recorrido nas contra-alegações ao recurso subordinado.
Com efeito:
Dispõe o art. 609º, nº 1, do CPC/2013 que “1. A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir”, o que se prende, é certo, com o princípio do dispositivo, nos termos do qual compete ao A. delimitar o objeto da ação através da formulação do pedido e da respetiva causa de pedir.
São, todavia, aplicáveis as considerações tecidas no Acórdão da Relação de Évora de 12.06.2019, Proc. 2129/15.1T8STR.E1, no qual se refere que:
“Escreveu-se no Acórdão do STJ de 25.03.2010[2]:
«Encontra-se, há muito, firmado na jurisprudência o entendimento segundo o qual os limites da condenação contidos no artigo 661.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, têm de ser entendidos como referidos ao valor do pedido global e não às parcelas em que aquele valor se desdobra.
Esta orientação tem sido assumida como válida na solução de casos em que o efeito jurídico pretendido se apresenta como indemnização decorrente de um único facto ilícito, traduzindo-se o total do pedido na soma dos valores de várias parcelas, que correspondem, cada uma delas, a certa espécie ou classe de danos (v.g. danos patrimoniais e danos não patrimoniais, danos emergentes e lucros cessantes, danos presentes e danos futuros), componentes ou integrantes do direito cuja tutela é jurisdicionalmente solicitada.
Compreende-se que assim seja nos casos em que, com base na descrição de uma situação de facto, se afirma a titularidade de um direito que se pretende ver tutelado mediante a declaração da sua existência e a concretização em valor único da sua dimensão global, porque, então, se trata de pedido unitário, decomposto ou desdobrado em parcelas que integram um só efeito jurídico, com a mesma e única causa de pedir.
Com efeito, na definição legal (artigo 498.º, n.º 3, do Código de Processo Civil), pedido é o efeito jurídico que se pretende obter com a acção, traduzindo uma pretensão decorrente de uma causa, a causa de pedir, consubstanciada em factos concretos [artigos 467.º, alínea d), e 498.º, n.º 4, 1.ª parte, do Código de Processo Civil], sendo, pois, os dois elementos (pedido e causa de pedir) indissociáveis, como elementos identificadores da acção e delimitadores do seu objecto, do que resulta que o pedido se individualiza como a providência concretamente solicitada ao tribunal em função de uma causa de pedir».
No caso concreto, o pedido de indemnização formulado pela autora diz respeito a um único facto ilícito, traduzindo-se o total do pedido na soma dos valores de várias parcelas, que correspondem, cada uma delas, a certa espécie ou classe de danos.
Ora, não será pelo facto de os pedidos de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais terem sido deduzidos parcelarmente, que não se atenderá ao entendimento vertido no excerto do Acórdão do STJ de 25.03.2010 acabado de transcrever.
(…)
É certo que a autora não pediu expressamente indemnização a título de dano biológico, mas como bem se diz na sentença recorrida, alegou os factos que integram a correspondente incapacidade, sendo que o princípio do dispositivo se basta com a alegação e prova desses factos para que a respetiva indemnização deva ser arbitrada[3].
Por outro lado, o facto de se arbitrar uma quantia a título de dano biológico não autonomizada pela autora, não viola o princípio do nº 1 do art.º 609º do CPC que, quantitativamente, apenas se refere ao pedido considerado como um todo, impondo apenas ao tribunal que se mantenha dentro do valor peticionado, como se viu supra.
A este propósito, com inteira aplicação ao caso dos autos, escreveu-se no Acórdão da Relação de Coimbra de 21.03.2013:
«(…), ainda que os danos revistam uma natureza diferenciada – como por exemplo, a decorrente da fundamental dicotomia entre dano patrimonial e não patrimonial – e, por isso, o cálculo da respectiva indemnização obedeça a parâmetros distintos, os recorrentes não ficam investidos em vários direitos de crédito – tantos quantas as parcelas em que, para a determinação do quantum indemnizatório, há que desdobrar o cálculo do dano – mas num único direito de crédito. É justamente isto que explica, v.g., que os limites da condenação, ditados pelo princípio da disponibilidade objectiva, se entendem referidos ao pedido global e não às parcelas em que, para a determinação do quantum indemnizatório, há que desdobrar o cálculo do dano (artº 661 nº 1 do CPC), e que a proibição da reformatio in mellius – que é um simples consequência da vinculação do tribunal ad quem à impugnação do recorrente, que vincula a que esse tribunal não pode conceder a essa parte mais do que ela pede no recurso interposto – não seja violada pela circunstância de o tribunal de recurso confirmar a procedência do quantitativo total do pedido do autor, ainda que com diferentes montantes de cada uma das parcelas. Se, por exemplo, o autor pede uma determinada indemnização para pagamento dos vários prejuízos decorrentes de um acidente de viação, o tribunal de recurso pode considerar a acção totalmente procedente, ainda que faça uma diferente avaliação de cada um desses prejuízos. Identicamente, o tribunal ad quem pode julgar o recurso procedente, quantificando diferentemente os diversos danos que devem ser reparados ou compensados».
[2] Proc. 1052/05.2TTMTS.S1.
[3] Cfr. o Acórdão do STJ de 25.11.2009, proc. 397/03.0GEBNV.S1 - também citado na sentença – e a vasta jurisprudência aí referida.”
E, assim também, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2º, 4ª Edição, Almedina, pág. 715, em que referem que “Não releva que o pedido se apresente por parcelas ou resulte da soma de parcelas separadas, como acontece quando o autor quantifica vários danos sofridos e pede a sua reparação (acs. do TRP de 26.04.01, Soleiro de Abreu, www.dgsi.pt, proc. 0130451, e de 3.10.01, Pinto Monteiro, www.dgsi.pt, proc. 0140558).”

4.9.1. No caso, o A., invocando a desvalorização profissional decorrente da ilicitude do despedimento, enquadrou os danos que considerou daí decorrerem como um dano patrimonial e reclamou o pagamento de indemnização no montante de 91.494,00€.
Por sua vez, a sentença recorrida entendeu configurar o mencionado dano como dano não patrimonial, no âmbito do qual, em conjunto com os demais factos provados, o avaliou considerando ser ao A. devida a indemnização, a título de danos não patrimoniais, no montante de €10.000,00, este o valor que havia sido peticionado no que toca aos danos não patrimoniais.
Nos termos do art. 5º, nº 3, do CPC, o tribunal não está vinculado às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação do direito e, por outro lado e como decorre do acima referido, não está espartilhado aos montantes dos pedidos parcelares formulados, estando antes sujeito ao montante global resultante desses valores parcelaras (€91.494,00 + €10.000) posto que, ambos, se reportam ao pedido indemnizatório global decorrente do mesmo comportamento da Ré, consubstanciado no despedimento ilícito do A. e, assim, respeitando a mesma causa de pedir.
Ou seja, e em conclusão, impõe-se apreciar, no recurso subordinado, interposto pelo A., do valor da indemnização devida por danos não patrimoniais, mas com a limitação decorrente do valor global do pedido de €101.494,00 (€91.494,00+ €10.000), e não já com a limitação do valor de €10.000,00.
Tendo em conta que a Ré, no recurso principal, impugnou a sentença recorrida no que toca ao valor, de €10.000,00, em que foi condenada a título de indemnização por danos não patrimoniais, será a fixação de tal indeminização, suscitada em ambos os recursos, apreciada em conjunto, o que se passará a fazer.

5. Da indemnização por danos não patrimoniais objeto dos recursos, principal, interposto pela Ré, e do recurso subordinado, interposto pelo A.

Na sentença recorrida considerou-se ser justo e adequado o valor indemnizatório, de €10.000,00, pelos danos não patrimoniais, do que a Ré Recorrente discorda, alegando em síntese que: não só o autor não provou que houve violação culposa dos seus direitos pela Ré, causadora de danos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, assim como não provou que a culpa da Ré foi manifesta e que os danos sofridos foram objetivamente graves, não provando, consequentemente, o nexo de causalidade que não mereça discussão razoável; tentou a Ré, várias vezes, chegar a acordo com o A., propondo-lhe treinar a equipa Sub-23 e, falhada esta, propondo-lhe continuar a pagar ao A. as retribuições mensais convencionada para a época desportiva .../... enquanto aquele não arranjasse um clube; o A. apenas esteve desempregado em dois meses; as preocupações do A. com o seu futuro são-lhe imputáveis uma vez que recusou a proposta de pagamento das retribuições mensais até que arranjasse novo clube; não se extrai da matéria fáctica apurada que as emoções alegadamente sofridas pelo Autor [angústias, revoltas, dores, desgostos, sofrimentos e preocupações com o futuro], tenham atingido uma gravidade, profundidade, danosidade ou acentuação tais de modo a causar na sua personalidade moral um prejuízo assinalável; o A. teve conhecimento de que não iria ser o treinador pelo próprio presidente da Ré; a indemnização já atribuída ao A. já o compensa devidamente pelos danos emergentes da rescisão do contrato de trabalho sem justa causa operada pela recorrente, pretendendo o A. obter, com a propositura da ação, um enriquecimento ilícito à custa da ré, comportamento este que consubstancia um flagrante abuso de direito e uma reprovável tentativa do autor de locupletamento ilícito à custa da ré, que “jamais poderá ter aqui arrimo legal”.
No que toca à posição do A. já acima a deixámos consignada, incluindo o modo como chegou ao valor de €91.494,00 decorrente do dano consequente à sua alegada desvalorização profissional.

5.1. Para que o dano não patrimonial seja ressarcível, é necessário que: tenha ocorrido um facto ilícito; que o mesmo seja culposo, que ocorra um dano que, pela sua gravidade, mereça a tutela do direito (art. 496º nº 1, do Cód. Civil); o nexo de causalidade adequada (na sua formulação negativa) entre o facto e o dano, de modo a que se possa dizer que este é consequência daquele.
No que toca ao enquadramento jurídico, na sentença recorrida referiu-se o seguinte, com o que se está de acordo e passa a transcrever:
“Recorde-se que o nº3 da Cláusula 41ª do CCT aplicável estatui que “se pela cessação do contrato resultarem para o treinador prejuízos superiores ao montante indemnizatório fixado nos n.ºs 1 e 2, poderá aquele reclamar a respectiva indemnização para ressarcimento desses danos”, aí se incluindo inquestionavelmente os danos não patrimoniais.
Por outro lado, nos termos do disposto no artigo 389º, nº1, al. a) do CPT “sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado” “a indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais.”
Apreciemos pois se os factos provados fundamentam a peticionada fixação de uma indemnização por danos de natureza não patrimonial.
Para tanto, como é consabido, importa ter presente que, tendo a obrigação de indemnizar como resulta do disposto no artigo 483.º do Código Civil como pressupostos fundamentais a verificação de um facto ilícito e culposo do qual em termos de nexo de causalidade decorreram danos, estabelece por sua vez o artigo 496.º, do mesmo Código, que na fixação da indemnização se deve atender aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Estabelece ainda o artigo 563.º do Código Civil que “a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”, normativo este que vem sendo visto como expressão do acolhimento, no nosso sistema jurídico, da teoria da causalidade adequada, mas na sua formulação negativa, como resulta dos ensinamentos de Almeida Costa, (Direito das Obrigações, 3.ª edição, pág. 518), de tal modo que “o facto que actua como condição só deixará de ser causa do dano desde que se mostre por sua natureza de todo inadequado e o haja produzido apenas em circunstâncias anómalas ou excepcionais”.
Importa ainda acrescentar, agora citando-se a lição sempre actual de Antunes Varela (Das Obrigações em Geral, Volume I, pág. 748) que “o facto que actuou como condição do dano só deixará de ser considerado como causa adequada se, dada a sua natureza geral, se mostrar de todo em todo indiferente (…) para a verificação do dano, tendo-o provocado só por virtude das circunstâncias excepcionais, anormais, extraordinárias ou anómalas, que intercedam no caso concreto”, esclarecendo ainda que no juízo de prognose, em “condições regulares, desprendendo-nos da natureza do evento constitutivo de responsabilidade, dir-se-ia que um facto só deve considerar-se causa (adequada) daqueles danos (sofridos por outrem) que constituem uma consequência normal, típica, provável dele”.
Por sua vez, Galvão Telles, (Direito das Obrigações, 7.ª Edição, Coimbra Editora, 1997, pág. 404), nas suas irrepetíveis palavras, afirma que «a orientação hoje dominante (…), consiste em só considerar como causa jurídica do prejuízo a condição que, pela sua natureza e em face das circunstâncias do caso, se mostre apropriada para o gerar. A ideia de causalidade fica assim restringida às condições que (…) apresentam aptidão ou idoneidade para a produção do dano. Causa será só a condição adequada a essa produção».
Sendo certo que a lei não enumera os danos não patrimoniais que merecem a tutela do direito, antes confia ao tribunal o encargo de apreciar, em cada caso concreto se o dano não patrimonial é merecedor de uma indemnização.
Recorde-se que nos termos do artigo 496.º, do Código Civil, apenas se deve atender aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Tem sido afirmado na jurisprudência que a gravidade do dano é um conceito relativamente indeterminado, carecido de preenchimento valorativo a fazer caso a caso, de acordo com a realidade fáctica apurada e que a gravidade deve medir-se por um padrão objectivo, e não de acordo com factores subjectivos, ligados a uma sensibilidade particularmente aguçada ou especialmente fria e embotada do lesado.
Por outro lado, deve a gravidade ser apreciada em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado.
Parece-nos importante aqui notar que a lesão essencial que surge como consequência do comportamento ilícito do empregador que procede a um despedimento ilícito se traduz na lesão do direito ao trabalho do trabalhador que lhe é suprimido, ainda que temporariamente, por um acto unilateral e contratualmente ilícito do empregador, retirando-o do meio laboral onde o trabalhador estava inserido.
E é importante, também, relembrar a questão da diversidade das consequências a nível económico e de subsistência do trabalhador, pela consequente perda da retribuição, e das consequências em termos de carreira profissional, bem como a necessidade de se exigir um plus nos casos de despedimento ilícito, pela frequência com que tais actos se verificam, pelo que as consequências normais de perda do trabalho e da retribuição não costumam ser consideradas com gravidade suficiente para conferir ao trabalhador ilicitamente despedido o direito a uma indemnização por tal despedimento ilícito, sob pena de se banalizarem tais indemnizações.
O critério decisivo terá, pois, de ser o previsto no artigo 496º do CC e a gravidade suficiente aí prevista para que tais danos não patrimoniais possam merecer a tutela do direito.”
E, quanto à apreciação do caso concreto e fixação da indemnização em €10.000,00, referiu a sentença o seguinte:
“Ora, a este propósito, resultou provado que:
- O referido nos factos provados 11), 12), 13), 14), 15), 16), 17), 18), 19), 20), 22), 23), 24), 25), 28), 31 e 32) fez e faz com que o Autor tivesse sofrido e continue a sofrer, tendo-lhe causado uma enorme angustia, que se prolonga, que o fez perder noites sem dormir ou a dormir pouco, a pensar no porque do sucedido, e na injustica em que tal se consubstanciou, provocando-lhe uma revolta imensa, mais a mais tendo por origem um clube ao qual ja tanto havia dado, quer como treinador, quer como futebolista – clube esse, [o Clube Réu], que sempre soube que não fora o facto do objecto do contrato de trabalho prever, expressamente no seu objecto, a época desportiva de .../... no escalão máximo do futebol profissional em Portugal, o Autor não o teria celebrado, sequer, atenta a existencia de uma outra proposta de trabalho que ao tempo estava prestes a aceitar.
- O Autor sente-se, ainda, desacreditado profissionalmente e profundamente desrespeitado pelo Clube Réu, que, com a sua conduta para com o A., lhe causou sofrimento pela situação desprestigiante e desonrosa em que foi colocado.
- Com a sua conduta, o clube Réu impediu que o A. tivesse muito maior visibilidade e, consequentemente, valor de mercado, de que em concreto o Autor passaria a gozar por ir liderar um plantel de uma equipa da divisão máxima do futebol profissional em Portugal. - Tendo o Clube Réu causado, com a sua conduta para com o A. dor, desgosto, sofrimento e uma intensa preocupação pelo seu futuro, que o Autor ja sofreu e continua a suportar em consequência da conduta do Clube Réu.
A tal factualidade acresce ainda, ter resultado provado que:
O Clube Réu impediu o Autor de trabalhar entre 01/07/2019 a 31./07/2019, (cfr. facto provado 26) tendo assim o Réu violado o direito de ocupação efectiva do Autor, que ficou um mês sem ocupação, tendo consequentemente o Réu violado dessa forma a própria dignidade do autor como trabalhador, despedindo-o de seguida no dia 31/7/2019, tendo resultado provado que contra a sua expressa vontade, o Autor foi impedido de desempenhar no mês de Julho de 2019 as funções para as quais havia sido contratado, em razão da referida decisão unilateral do Clube Réu, (facto provado 27.), não sendo despiciendo ainda referir decorrer da factualidade provada que foi pela comunicação social que, ainda em meados de Maio de 2019, o Autor veio a tomar conhecimento de que não iria ser o treinador da equipa de futebol principal sénior masculina para a época desportiva de .../... e que o treinador da equipa principal de futebol sénior masculino do réu para essa época iria ser o Mister EE, como se veio a verificar e o Clube réu confirmou, (cfr. factos provados 16, 17, 19 e 20), tendo sido foi feito transparecer para opinião pública a substituição do autor por um outro treinador alegadamente mais capaz para o desempenho do cargo, o que significava uma machadada na imagem e no prestigio profissionais do Autor., (cfr. facto provado 23.) o que não pode deixar de se considerar uma situação profissionalmente humilhante e melindrosa para o autor, mormente perante os jogadores que orientava e treinava e todo o pessoal administrativo e de apoio do clube, que já sabiam que o autor não iria continuar na época seguinte.
Ao que acresce que o Autor jamais teria celebrado o contrato de trabalho com o Clube Réu caso o mesmo não contemplasse a época de .../... na Liga ..., pois, como o Clube Réu ao tempo de tal facto estava a par, o primeiro encontrava-se na iminência de assinar um contrato de trabalho para exercer sua actividade fora de Portugal, num projecto cujas dimensão remuneratória e visibilidade desportiva largamente ultrapassavam as do Clube Reu a disputar o terceiro escalão do futebol português (Campeonato de Portugal), (facto provado 24.), o que não pode deixar de se reflectir numa frustração profissional o autor ter estado um ano (.../...) a “marcar passo” no campeonato de Portugal com o clube ré na expectativa de na época seguinte (.../...) ter a sua grande oportunidade profissional de pisar o palco da 1ª Liga Profissional Portuguesa e aí ter a oportunidade de consolidar ou lançar a sua carreira, o que lhe foi retirado de repente e por vontade unilateral do clube réu, esfumando-se assim uma oportunidade que o autor não sabe quando possa voltar a surgir : ser um dos 18 treinadores do escalão principal do futebol profissional português.
Num tal cenário, cremos não haver dúvidas que existe uma lesão objectiva da dignidade, um dano não patrimonial objectivo que se reveste de gravidade evidente e deve ser compensado.
Tanto mais que, aqui sim, surge a tal questão da desvalorização profissional do autor, ou melhor da sua não valorização em termos que estavam contratualmente previstos, uma vez que treinar um clube de futebol profissional na 1ª Liga Profissional de Clubes é, para a maioria dos treinadores, o auge da sua carreira ou uma etapa decisiva para os poucos treinadores portugueses que posteriormente são convidados para treinar um grande clube português ou um clube estrangeiro relevante (ou seja, um clube da primeira liga inglesa, espanhola, italiana, francesa ou alemã ou mesmo, como tem sucedido mais recente, um grande clube brasileiro).
Tal perspectiva de carreira do autor foi efectivamente cerceada com o seu despedimento ilícito pelo Réu não podendo tal frustração de expectativas fundadas num contrato em que até se encontrava “blindada” a sua saída unilateral do clube por uma cláusula rescisória de mais de dois milhões de euros, não podendo deixar de ser valorado esse frustrar de expectativas em sede de danos não patrimoniais.
A forma como é sentida essa lesão e os sentimentos que suscita em cada um podem divergir em termos subjectivos, o que deve ser ponderado na fixação equitativa do valor da indemnização, mas não apaga a existência daquele dano objectivo que surge como consequência primeira do comportamento ilícito do empregador.
Ora, voltando ao caso, afirmada a ilicitude dos factos e a culpa, como ainda também o necessário nexo, não se nos afigura merecer controvérsia a conclusão de que os danos que se provaram, como o exige o artigo 496.º, são indemnizáveis, pela gravidade do dano, pressuposta pela citada norma, não se estando perante meros vulgares incómodos, contrariedades, transtornos ou indisposições.
Com efeito, “o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado” (cfr. Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, volume I, 4.ª edição, Almedina, pág. 532).
Quanto à questão de saber qual será a medida adequada da indemnização (a justa indemnização) para compensar os danos que se provaram, entende-se como ajustado fixar nos peticionados €10.000,00 o montante da indemnização, ponderando a gravidade bastante acentuada dos danos sofridos pelo A., o assinalável grau de ilicitude e culpa no comportamento da R.; o facto da situação se arrastar desde há quase 2 anos e a capacidade económica do clude R., que como é do conhecimento público tem um orçamento superior a 5 milhões de euros e é um dos mais históricos clubes do futebol português.
Com efeito, e conforme já se deixou escrito, temos como de gravidade bastante/acentuada os danos sofridos pelo Autor, que inclusivamente foi colocado pelo Réu numa situação de inatividade profissional – em clara violação do direito que a esta assiste de efetivo desempenho dessa atividade –, ficando pois sem funções atribuídas, no contexto a que já aludimos anteriormente e que resulta da factualidade provada.
Consideramos, pois, que nesta concreta situação, não podendo deixar de se considerar relevantes para os efeitos previstos no artigo 496.º do Código Civil os descritos danos, por contenderem com a profissionalidade como valor inerente à realização da pessoa humana e à sua intrínseca dignidade, pois que causam evidente abalo a quem deles sofre, é devida, porque fundada, a atribuição ao Autor de indemnização que, na medida do possível, compense esses danos.
Por necessário recurso à equidade, aqui chamada à aplicação, haverá que ponderar-se, para o efeito, do que resulta dos autos, por um lado, o grau de culpabilidade do Réu, que é sem dúvidas intenso, desde logo atenta a natureza da violação do dever de ocupação efetiva – com a retirada total de funções – e o tempo por que perdurou (durante um mês), o grau de ilicitude do facto, que no caso temos também como elevado, a situação económica do Réu, clube da 1ª Liga Profissional, com um orçamento de alguns milhões de euros, um dos clubes históricos do nosso País de dimensão nacional, as consequências/danos que resultaram do comportamento ilícito do Ré, já antes enunciados, de gravidade manifesta.
Tudo ponderado, num juízo de equidade e em face dos critérios estabelecidos no n.º 3 do art.º 496 do Código Civil, não encontramos razões efetivas para não ter por justo e adequado o valor peticionado pelo autor de €10.000, face às razões e a própria função que a fixação da indemnização nesta sede se visam alcançar para ressarcir os danos não patrimoniais sofridos pelo Autor, em consequência da descrita atuação ilícita do Réu.”

5.2. À apreciação dos danos não patrimoniais releva a seguinte factualidade:
- O Autor é treinador profissional de futebol (nº 1).
- O Clube Réu é uma sociedade desportiva unipessoal por quotas (SDUQ) cuja equipa principal de futebol senior masculino se encontrou a disputar, na época desportiva de .../..., a Primeira Liga, ou “Liga …”, que é o principal escalão do sistema de ligas de futebol de Portugal. (nº 2)
- No dia 01 de Agosto de 2018, A. e Réu celebraram contrato d etrabalho, e aditamento ao mesmo, encontrando-se o Réu, a essa data, a disputar o Campeonato de Portugal, serie A; (nº 3)
- Em tal contrato foi acordado que o A. exerceria, sob a autoridade e direcção do Clube Réu, as funções de treinador da equipa principal de futebol masculino senior deste ultimo, durante o período compreendido entre 01.08.2018 e 30.06.2020, correspondente às épocas desportivas de .../... e .../..., mediante a remuneração de anual global de: 23.485,00€ ilíquidos, a pagar em onze (11) prestações mensais e iguais no valor ilíquido de 2.135,00€ cada; e, na 2ª época desportiva (.../...) entre 01 de Julho de 2019 e 30 de Junho de 2020, a remuneração mensal global ilíquida de 91.420,00€, a pagar em doze (12) prestações mensais iguais, no valor ilíquido de 7.618,33€cada; (nºs 10 e 11);
- O Clube Réu fez cessar o mencionado contrato, unilateralmente e sem nada que o justificasse: (i) não permitindo que o Autor exercesse a actividade profissional para a qual havia sido contratado; (ii) tendo procedido apenas ao pagamento da primeira daquelas doze prestações (no valor ilíquido de 7.618,33€); (nº 12)
- Ao tempo que foi celebrado o contrato de trabalho, 01.08.2018, já as partes sabiam, e tal facto era público e notório, que – apesar de militar no Campeonato de Portugal, o terceiro escalão na hierarquia dos campeonatos de futebol em Portugal – era praticamente certo que, na época seguinte (.../...) o Clube Réu ascenderia ao mais alto daqueles escalões, a Primeira Liga/LIGA ..., pois havia já uma sentença judicial transitada em julgado que determinava isso mesmo. (nº 13)
- Por isso na cláusula Décima do contrato de trabalho as partes expressamente deixaram consignado que:
Caso o A..., Futebol SDUQ, LDA. garanta a manutenção na 1ª Liga Portuguesa de Futebol Profissional, na época de .../..., o segundo contraente receberá da primeira contraente a quantia líquida de €20.000,00 (vinte mil euros).” (nº 14)
- As partes previram um prémio de manutenção, para a época seguinte (.../...), num escalão (1ª Liga) dois degraus acima do escalão (Campeonato de Portugal) da época que em que se estava a iniciar (.../...), sem que de permeio se passasse pelo escalão intermedio (2ª Liga), porque de antemão já sabiam desse salto do Clube Réu na época .../... directamente para a 1ª Liga, não decorrente de uma causa desportiva– pois aí as promoções aos escalões superiores resultam de uma determinada classificação desportiva de topo e processam-se pela ascensão ao nível superior imediatamente a seguir – mas antes decorrente dos seguintes factores extraordinários previamente conhecidos do Autor e do Clube Réu:
(i) a decisão judicial do Tribunal Central Administrativo do Sul, tomada no dia 6 de Dezembro de 2017, no âmbito do processo nº 2141/06.1BELSB – sobre o chamado “Caso HH” – confirmando a (re)integracão do Clube Reu na 1ª Liga na época de .../...;
e o imediatamente sequente (ainda no mês de Dezembro de 2017):
(ii) acordo/“memorando de entendimento”, patrocinado pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional e celebrado entre o Clube Réu e o os “C...- SAD”, que não recorreu daquela decisão judicial;
bem como a concomitante:
(iii) (reiteração de) uma recomendação da Federação Portuguesa de Futebol no sentido da reintegração do Clube Réu na 1ª Liga/Liga …, "no mais curto espaço de tempo". (nº 15)
- Confirmando algumas notícias, não desmentidas pelo Clube Réu, no sentido de que não contava com o Autor para a época de .../..., em meados de Maio de 2019, o treinador da sua equipa principal de futebol sénior masculino em Outubro de 2019, o senhor EE, assumiu publicamente que na época desportiva seguinte, a de .../..., iria desempenhar tais funções. (nº 16)
- Tal facto veio a confirmar-se. (nº 17)
- O Autor sempre quis cumprir a segunda época abrangida pelo contrato de trabalho, sendo que a intenção, concretizada, do Clube Réu em não cumprir na íntegra o contrato de trabalho foi da exclusiva iniciativa deste ultimo.(nº 18)
- Já depois de o Clube Réu, perto do final da primeira época desportiva contratualizada (.../...) ter tentado junto do Autor que este abdicasse voluntariamente de exercer, na época desportiva seguinte (.../...), as funções para as quais havia sido contratado, foi pela comunicação social que o Autor veio a tomar conhecimento de que não iria ser o treinador da equipa de futebol principal sénior masculina para aquela segunda época desportiva (.../...) objecto do contrato de trabalho que havia celebrado com o Clube Réu. (nº 19)
- Tendo confrontado o Clube Réu com tal notícia, a qual veio a ser por este confirmada. (nº 20)
- O Clube Réu propôs então ao Autor que fosse elaborada, em termos formais, uma auto-intitulada revogação por mútuo acordo do contrato de trabalho, assumindo pagar ao Autor o montante correspondente ao salário que haviam contratualmente convencionado para a época de .../..., mas apenas e tão só até ao montante correspondente ao período de tempo que ocorresse até ao preciso momento em que este viesse a celebrar contrato com outro clube. (nº 21)
- Entre outras coisas, tal proposta implicava, directamente e de forma imediata - na perspectiva do Clube Réu e porque foi essa a vontade por este expressamente transmitida - que o Autor:
(i) Não pudesse exercer de forma efectiva a sua profissão ao serviço da entidade empregadora com a qual havia celebrado um vinculo laboral valido e vigente;
(ii) Não tivesse direito aos prémios monetários previstos nas clausulas Oitava, Nona e Decima do contrato de trabalho, que, respectivamente, se cifram nas quantias liquidas de:
a) 20.000,00€, caso o Clube Reu logre vencer a Taca de Portugal, respeitante a época de .../...;
b) 10.000,00€, caso o Clube Reu logre vencer a Taca da Liga, respeitante a época de .../...;
c) 20.000,00€, caso o Clube Réu logre garantir a manutenção na 1ª Liga, respeitante à época de .../.... (nº 22)
- O Autor não aceitou porque queria cumprir o contrato de trabalho até ao fim e porque a sua substituição por um outro treinador, na perspectiva do Clube Réu – que foi feita transparecer para a opinião pública – alegadamente mais capaz para o desempenho do cargo, agora que o Clube Réu tinha ascendido ao escalão máximo do futebol português, significava uma machadada na imagem e no prestigio profissionais do Autor. (nº 23)
- O Autor jamais teria celebrado o contrato de trabalho com o Clube Réu caso o mesmo não contemplasse a época de .../... na Liga ..., pois, como o Clube Réu ao tempo de tal facto estava a par, o primeiro encontrava-se na iminência de assinar um contrato de trabalho para exercer sua actividade fora de Portugal, num projecto cujas dimensão remuneratória e visibilidade desportiva largamente ultrapassavam as do Clube Réu a disputar o terceiro escalão do futebol português (Campeonato de Portugal). (nº 24)
- E por isso fez saber ao Clube Réu que iria apresentar-se no início da temporada para cumprir o contrato de trabalho. (nº 25)
- Persistindo em celebrar com o Autor a por si auto-intitulada revogação por mútuo acordo do contrato de trabalho em vigor entre as partes, o Clube Réu enviou-lhe, com data de 28 de Junho de 2019, uma comunicação escrita, intitulada “Declaração” com o seguinte teor:
A..., FUTEBOL SDUQ, LDA, (…), vem por este meio comunicar ao Treinador de Futebol Profissional AA, (…), a ausentar-se temporariamente dos trabalhos da equipa pelo período compreendido entre 01/07/2019 a 31/07/2019, sem que exista qualquer perda remuneratória do contrato de trabalho em vigor, o que faz com os seguintes fundamentos :
1. O A..., FUTEBOL SDUQ, LDA subiu à 1ª Liga na época desportiva de .../....
2. Nas transatas cinco épocas desportivas, o A... competiu em escalões inferiores, designadamente na 2ª Liga e no Campeonato de Portugal.
3. Em virtude da subida à 1ª Liga, o A... está a ser alvo de uma pertinente a massiva reestruturação empresarial a todos os níveis, interna e externamente.
4. Esta profunda reorganização encetada pelo A... implica e repercute-se num vasto conjunto de operações que se refletem numa readaptação de meios e alterações na estratégia, nos activos ou na estrutura socieconómica do CLUBE.
5. A aludida reestruturação do A... visa readaptar o CLUBE à nova realidade competitiva, logrando-se impulsionar o respectivo desempenho, gerando mais valor.
6. Para que o A... possa responder às actuais e fortes exigências do mercado, impõe-se, impreterivelmente, a aquisição, alienação, transferência e inutilização de elementos patrimoniais ou determinadas actividades.
7. Face ao exposto, torna-se premente que o A... proceda a uma profunda reorganização do plantel do CLUBE, a qual implicará forçosamente a desocupação efetiva e temporária de alguns jogadores e equipa técnica.
8. Destarte, atenta a reestruturação em curso, nos termos supra referidos, o A... encontra-se temporariamente impedido de dar ocupação ao trabalhador AA, pelo período entre 01/07/2019 a 31./07/2019. (nº 26)
- Contra a sua expressa vontade, o Autor foi impedido de desempenhar no mês de Julho de 2019 as funções para as quais havia sido contratado, em razão da referida decisão unilateral do Clube Réu. (nº 27)
28. E em 31 de Julho de 2019, o Clube Réu remeteu ao Autor a carta registada com AR, junta a fls.22 v. e 23 com o seguinte teor:
“(…)
Assunto: Cessação de Contrato de Trabalho
Exmº Senhor.
A A..., FUTEBOL SDUQ, LDA, (…), neste ato representada pelo seu Presidente e Vice-Presidente, com poderes para o ato, vem expor o seguinte:
1. Como é do conhecimento de V.Exª, a Sociedade Desportiva logrou celebrar com V.Exª um Acordo para Cessação do Contrato de Trabalho celebrado entre ambos em 1 de Agosto de 2018, tendo-se comprometido, de boa fé, a responsabilizar-se pelo pagamento de todas as remunerações mensais previstas no contrato supra referido até à data em que V.Exª viesse a celebrar um novo contrato de trabalho de treinador de futebol com outro qualquer Clube.
2. Nos moldes supra descritos, a Sociedade Desportiva almejou vincar o respeito e consideração por V.Exª pelo período em que exerceu a sua atividade ao serviço da mesma, não o deixando desprotegido e fragilizado enquanto não beneficiasse de um novo vínculo laboral.
3. Na senda do exposto, não tendo V.Exª aceite a celebração de um Acordo de Cessação do Contrato de Trabalho nos termos supra aludidos, a Sociedade Desportiva vem, pela presente, comunicar a cessação do Contrato de Trabalho celebrado com V.Exa em 1 de agosto de 2018, cessando os seus efeitos a partir de 31 de Julho de 2019, data em que se considera para todos os efeitos legais terem cessado todos e quaisquer direitos, deveres e garantias das partes, emergentes do referido contrato, extinguindo-se, assim, e para futuro, a relação laboral.
4. Por conseguinte, deixou V.Exª de ser o Treinador Principal da Equipa de Futebol Masculino Senior da A..., FUTEBOL SDUQ, LDA.
Com os melhores cumprimentos,” (nº 28)
- O Clube Réu operou unilateralmente a cessação do contrato de trabalho em 31 de Julho de 2019. (nº 29)
- O Clube Réu não logrou em momento nenhum celebrar com o Autor qualquer acordo para cessação do contrato de trabalho. (nº 30)
- O Clube Réu não instaurou qualquer processo disciplinar ao Autor. (nº 31)
- A Ré subiu à Primeira Liga /LIGA ... na época desportiva de .../..., encontrando-se anteriormente, durante 5 épocas seguidas, em escalões inferiores, nomeadamente no terceiro escalão na hierarquia dos campeonatos de futebol em Portugal. (nº 32)
- Decorreram na íntegra os meses de Agosto e de Setembro de 2019 e o Clube Réu não pagou os respectivo salários ao Autor, sendo que este não treinou qualquer equipa no período em causa. (nº 33)
- O Autor conseguiu entretanto a celebração de um contrato de trabalho, com o respectivo termo inicial reportado a 01 de Outubro de 2019, – que o vincula a outro clube de futebol, passando a treinar uma equipa – o B..., do Grupo IX da “Tercera Divisíon” de Espanha, que, na realidade, corresponde a uma quarta divisão espanhola, pois acima dela existem o “Campeonato Nacional de Liga de Primera División”, o “Campeonato Nacional de Liga de Segunda División” e o “Campeonato Nacional de Liga de Segunda División B”, a competir num escalão com uma visibilidade inferior à da equipa de futebol profissional sénior masculino do Réu e auferindo uma remuneração base para a época de .../... de €13.500 líquidos, a pagar em 9 prestações mensais, iguais e consecutivas, com início em Outubro de 2019 e término em Junho de 2020, à razão de €1.500 líquidos por cada um desse meses. (nº 35)
- O referido em 11), 12), 13), 14), 15), 16), 17), 18), 19), 20), 22), 23), 24), 25), 28), 31 e 32) fez e faz com que o Autor tivesse sofrido e continue a sofrer, tendo-lhe causado uma enorme angustia, que se prolonga, que o fez perder noites sem dormir ou a dormir pouco, a pensar no porquê do sucedido, e na injustiça em que tal se consubstanciou, provocando-lhe uma revolta imensa, mais a mais tendo por origem um clube ao qual já tanto havia dado, quer como treinador, quer como futebolista – clube esse, [o Clube Réu], que sempre soube que não fora o facto do objecto do contrato de trabalho prever, expressamente no seu objecto, a época desportiva de .../... no escalão máximo do futebol profissional em Portugal, o Autor não o teria celebrado, sequer, atenta a existência de uma outra proposta de trabalho que ao tempo estava prestes a aceitar. (nº 36)
- O Autor sente-se, ainda, desacreditado profissionalmente e profundamente desrespeitado pelo Clube Réu, (nº 37)
- que, com a sua conduta para com o A., lhe causou sofrimento pela situação desprestigiante e desonrosa em que foi colocado. (nº 38)
- Com a sua conduta, o clube Réu impediu que o A. tivesse muito maior visibilidade e, consequentemente, valor de mercado, de que em concreto o Autor passaria a gozar por ir liderar um plantel de uma equipa da divisão máxima do futebol profissional em Portugal. (nº 39)
- Tendo o Clube Réu causado, com a sua conduta para com o A. dor, desgosto, sofrimento e uma intensa preocupação pelo seu futuro, que o Autor já sofreu e continua a suportar em consequência da conduta do Clube Réu. (nº 40)
- Na época de .../... o Clube Réu manteve-se na 1ª Liga Portuguesa de Futebol Profissional.” (nº 41)”

5.3. Tendo em conta a matéria de facto e as considerações tecidas na sentença recorrida relativas, designadamente, à gravidade do comportamento da Clube Réu e dos danos não patrimoniais sofridos pelo A., com as quais concordamos e que, no essencial, dão resposta à argumentação da Ré/Recorrente, os danos são ressarcíveis, não assistindo razão ao Recorrido, quer quanto à exclusão de tal direito, quer quanto à eventual fixação de montante inferior ao fixado na sentença (de €10.000) [aliás, e como adiante diremos, entendemos até que é devido montante superior ao fixado pela 1ª instância].
Tendo ainda presente o que a Ré alega no recurso, a circunstância desta ter feito ao A. a proposta que consta do nº 21 dos factos provados com vista à resolução consensual da questão não obsta à gravidade da infração e à gravidade dos danos sofridos pelo A.
Com efeito, essa proposta (pagamento ao A. da retribuição acordada até que o A. viesse a celebrar contrato de trabalho com outro clube) implicava que o A. não pudesse exercer a atividade que havia sido contratada (treinador da equipa sénior a disputar a 1ª Liga na época de .../...) e que não pudesse ter direito aos prémios que haviam sido acordados (nº 22), proposta essa que o A. não aceitou porque pretendia cumprir o contrato de trabalho até ao fim e porque a sua substituição por outro treinador que, na perspetiva do Clube Réu e que foi feita transparecer na opinião pública, seria mais capaz para o desempenho das funções de treinador agora que aquele tinha ascendido à 1ª Liga, significava uma machadada na imagem e no prestígio profissional do A. (nº 23), razões essas mais que válidas para a não aceitação da proposta, sendo de salientar que, não só o A. ficava ou poderia ficar prejudicado financeiramente (no que toca aos prémios de jogos), como, sobretudo, veria a sua imagem e prestígio profissionais afetados, não sendo de esquecer que tal tem um peso significativo no seio da atividade profissional do A. (treinador de futebol), que é um mercado volátil, incerto e competitivo, e sendo que nem tudo se “resolve” ou se resume a questões de ordem patrimonial, para além de que, mais do que uma expetativa, existia a “certeza”, pelo A., conferida pelo contrato celebrado com a Ré, de que iria treinar, na época de .../..., uma equipa que iria disputar o campeonato da 1ª Liga, e que o A. deixou, por essa razão, de aceitar uma proposta de um outro clube, o que era do conhecimento do Réu (nº 24).
Quanto a uma alegada proposta de o A. treinar a equipa de sub-23, é de referir que a mesma não consta da matéria de facto provada, nem os contornos e condições dessa alegada proposta, nem dos factos provados resulta, sequer, que a Ré tivesse, à data (época de .../...), uma equipa de Sub-23. De todo o modo, ainda que a tivesse, são aplicáveis as considerações acima referidas, não desvalorizando isso a gravidade da conduta da Ré e dos danos sofridos pelo A.: não havia sido isso o acordado no contrato de trabalho celebrado, sendo que, para o A., foi decisivo da sua celebração, o vir a disputar a 1ª Liga na época de .../... e a visibilidade e prestígio de treinar e disputar um campeonato da 1ª Liga na equipa sénior é completamente diferente da que se verifica em relação a uma equipa de Sub-23.
E mais: já sabendo a Ré, aquando da celebração do contrato de trabalho com o A., que, na época de .../..., iria disputar a 1ª Liga (nº 13 dos factos provados) mal se compreende que, sem qualquer razão válida posterior, haja pretendido mudar de treinador ainda antes do início dessa época. Diga-se que o alegado pela Ré para justificar o despedimento ilícito foi dado como não provado – cfr. respostas de não provado à matéria dos arts. 16, 27, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 37, 45, 50, 128 da contestação.
Ainda no campo da ilicitude e gravidade do comportamento da Ré, esta, para além da ilicitude do despedimento, violou também o dever de ocupação efetiva do A. ao não lhe permitir exercer as suas funções no mês de julho de 2019.
Por outro lado, são manifestamente graves os danos não patrimoniais decorrentes da ilicitude do despedimento, como decorre dos nºs 36, 37, 38, 39 e 40 dos factos provados, incluindo, pois, no que toca à desvalorização profissional do A. na medida em que, com o despedimento ilícito, a Ré o impediu de ter muito maior visibilidade e, consequentemente, valor de mercado de que iria gozar por ir liderar uma equipa da divisão máxima do futebol profissional em Portugal, o que é relevante para qualquer treinador e foi, em concreto, relevante para o A. que apenas aceitou ir prestar a sua atividade de treinador para a Ré porque lhe estava garantido, pelo contrato celebrado, que iria disputar a 1ª Liga do campeonato na época de .../..., o que era do conhecimento da Ré.
É, pois, totalmente destituída de fundamento ao alegação da Ré/Recorrente de que “não só o autor não provou que houve violação culposa dos seus direitos pela ré, causadora de danos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, assim como não provou que a culpa do Réu foi manifesta e que os danos sofridos foram objetivamente graves, não provando, consequentemente, o nexo de causalidade que não mereça discussão razoável”.
Assim como é destituído de fundamento o invocado abuso de direito e/ou “LOCUPLETAMENTO ILÍCITO À CUSTA DA RÉ”
Conforme dispõe o art. 334º do Cód. Civil “É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.
O comportamento ilícito e culposo da Ré foi causa dos danos não patrimoniais já mencionados, tendo o A. exercido o seu legítimo direito de peticionar o ressarcimento dos mesmos, não se descortinando o menor facto de onde se pudesse concluir no sentido da violação da boa-fé, dos seus limites, dos bons costumes ou do fim social ou económico do direito, assim improcedendo a argumentação do Réu/Recorrente e não existindo qualquer “locupletamento ilícito à custa da Ré”.
Improcedem, assim e nesta parte, as conclusões do recurso da Ré/Recorrente.

5.4. E o que, agora, se impõe apreciar, no âmbito do recurso subordinado, interposto pelo A., é se a este deve ser fixada indemnização, por danos não patrimoniais, superior à fixada, tendo em conta, designadamente, o referido no nº 39 dos factos provados decorrente do despedimento, sendo que este a contabilizou em €91.494,00 nos termos que já deixamos referidos.
A indemnização por danos não patrimoniais deverá ser fixada, conforme art. 496º, nº 3, do Cód. Civil, com recurso à equidade, tendo em atenção as circunstâncias referidas no art. 494º do mesmo, ou seja, ao grau de culpabilidade do agente, à situação económica deste e do lesado e demais circunstâncias do caso, não se nos afigurando ser de acolher o critério ou fórmula de cálculo utilizada pelo A., a qual não está em consonância, nem atende, ao disposto no citado art. 494º, fórmula de cálculo essa que, aliás, tinha como pressuposto a desvalorização profissional no contexto, invocado pelo A., da ressarcibilidade de um dano de natureza patrimonial, para além de que assenta ou tem como ponto de partida o valor da clª de rescisão do A., de €2.500.000,00 que, independentemente da sua natureza ou enquadramento dogmático, não é, nem deve ser, base ou pressuposto para o cálculo da indemnização por danos não patrimoniais ainda que relativos à sua desvalorização profissional (foi tendo como ponto de partida tal valor e os demais processos “lógico-dedutivos” que efetua, que o A. chegou ao valor pecuniário correspondente à sua alegada desvalorização profissional), não havendo, ainda que por recurso à equidade, qualquer correspondência entre os danos não patrimoniais e o raciocínio lógico pressuposto nos cálculos que o A. fez. Para além de que se concorda com o referido na sentença recorrida a propósito da mencionada clª de rescisão e, bem assim, que se nos afigura manifestamente exagerado o montante peticionado.
Mas avançando.
O despedimento ilícito e substituição do A. por um outro treinador afeta efetivamente a imagem e prestígio profissional do A. (nºs 23 e 38), tendo impedido que este tivesse muito maior visibilidade e consequente valor de mercado que passaria a gozar se, não fosse o despedimento ilícito, tivesse exercido as funções de treinador de uma equipa da divisão máxima de futebol (nº 39), assim determinando uma desvalorização profissional que consubstancia dano de natureza não patrimonial, tanto mais tendo em conta as repercussões, dessa natureza, referidas nos nºs 36, 37, 38 e 40 dos factos provados.
Tendo em conta os mencionados danos, são os mesmos de gravidade elevada, assim como é intensa, pelo que já se deixou dito e demais aduzido na sentença recorrida, a gravidade do comportamento da Ré e da sua culpabilidade, não sendo a situação financeira desta comparável, sequer, à do A. que, após o despedimento, até mais não conseguiu do que exercer a sua atividade num modesto clube espanhol auferindo uma modesta retribuição mensal de €1.500 (líquidos). E, como também já se deixou dito e para onde se remete, não minimiza, ou não minimiza de forma relevante, a proposta do Réu referida nos nºs 21 e 22 dos factos provados.
Ora, tendo em conta todo o referido circunstancialismo, e num juízo de equidade, afigura-se-nos que a quantia de €10.000,00 de indemnização fica aquém da ressarcibilidade que se nos afigura impor-se, qual seja a de €20.000,00,e que se tem como adequada, proporcional e equitativa, acrescida de juros de mora nos termos referidos na sentença.
Assim, e nesta medida, procede o recurso subordinado.
***
VI. Decisão

Em face do exposto, acorda-se em:

A. Ter como não escritas as passagens constantes quer do recurso subordinado, interposto pelo A., incluindo o requerimento para notificação da Ré para juntar o recibo relativo à retribuição de julho de 2019 e a junção, pelo A., do documento junto com essa alegação (declaração de IRS de 2019), cuja junção, em consequência, não se admite e que, oportunamente, deverá ser desentranhado e devolvido à parte, quer das contra-alegações ao recurso subordinado, apresentadas pela Ré, tudo conforme mencionado no ponto IV. do presente Acórdão.

B. Quanto ao recurso principal, interposto pela Ré, julgá-lo parcialmente procedente, em consequência do que se decide:

B.1. Revogar a sentença recorrida quanto ao segmento condenatório constante do ponto V.b.1.), que é substituída pelo presente acórdão em que se decide condenar a Ré, A..., Futebol SDUQ, Ldª, a pagar ao A., AA, a título de retribuições intercalares decorrentes do despedimento ilícito nos termos do disposto no n.º1 da cláusula 41.ª (ex vi da respetiva clausula 44.ª, nº3, do C.C.T. aplicável): i) correspondente aos meses de agosto e setembro de 2019, a quantia global ilíquida de €15.236,66 (quinze mil duzentos e trinta e seis euros e sessenta e seis cêntimos), ii), bem como, correspondente aos meses de outubro de 2019 a junho de 2020, e depois de calculados pela Ré os descontos legais (fiscais e para a Segurança Social) sobre a quantia global ilíquida de €68.564,97 e efetuada, sobre o montante líquido encontrado, a dedução da quantia líquida de €13.500,00, pagar a quantia global ilíquida correspondente à líquida daí resultante.
B.2. Sobre as quantias mencionadas em B.1., são devidos juros de mora nos termos decididos na sentença recorrida, incidindo os mesmos sobre a quantia ilíquida global devida nos termos do referindo no ponto B.1.
B.3. No mais impugnado no recurso principal, julgá-lo improcedente, confirmando-se a sentença recorrida, mas sem prejuízo do decidido no ponto C.1. do presente acórdão.

C. Quanto ao recurso subordinado, interposto pelo Autor, julgá-lo parcialmente procedente, em consequência do que se decide:

C.1. Revogar a sentença recorrida quanto ao segmento condenatório constante do ponto V.b.3.) da sentença recorrida, que é substituída pelo presente acórdão em que se decide condenar a Ré, A..., Futebol SDUQ, Ldª, a pagar ao A., AA, a quantia de 20.000,00€ (vinte mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º3 da clausula 41.ª daquele C.T.T. e nos artigos 494.º e 496.º, n.ºs 1 e 4, do Código Civil, acrescida dos juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos desde a data sentença até efetivo e integral pagamento.
C.2. No mais impugnado no recurso subordinado, julgá-lo improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas do recurso principal pela Ré/Recorrente e pelo A/Recorrido na proporção do decaimento e custas do recurso subordinado pelo A./Recorrente e pela Ré/Recorrida na proporção do decaimento.

Porto, 20.03.2023
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha
Jerónimo Freitas
______________
[1] Que não mandámos aperfeiçoar por se entender que tal está reservado às conclusões do recurso e não às contra-alegações.
[2] De onde consta “Evidenciada com total clarividência esta não questão, não podemos senão reiterar, com o ímpeto que só a razão da justiça consegue conferir e legitimar, que os autos contêm já todos os elementos necessários para o clube Réu pagar ao Autor a indemnização ilíquida de 70.301,67€, devendo aquele pagar de imediato a este os 36.000,00€ líquidos (em rigor seriam 36.047,52€), acrescidos dos juros contados sobre o montante total (ilíquido = 70.301,67€).”
[3] Onde se diz “Resta-nos concluir, com toda a clarividência, quanto a este ponto, o Autor, em sede de Recurso Subordinado, apenas se limita a reproduzir ipsis verbis a douta Sentença recorrida, não acarretando para o processo quaisquer novos argumentos que permitam sustentar a pretensão de que às retribuições ILÍQUIDAS a serem pagas pelo Clube Réu, deverão ser descontadas apenas as retribuições LÍQUIDAS que o Autor auferiu, no mesmo período ao serviço do B....”
[4] Descontos esses (IRS e contribuições obrigatórias para a Segurança Social) que, por facilidade e economia, designaremos apenas de encargos legais ou descontos legais.
[5] Na fundamentação da decisão da matéria de facto, a propósito do nº 24 dos factos provados, consta o seguinte:
“Relativamente à matéria constante do facto provado 24. resultou da conjugação das declarações de parte credíveis e convincentes do Autor, AA e dos depoimentos credíveis e convincentes das testemunhas GG, amigo do Autor e que tinha integrado como treinador adjunto uma equipa técnica anterior liderada pelo Autor, JJ, treinador de futebol, que convidou o autor para fazer parte de um projecto nos Emirados Árabes Unidos para o qual a testemunha tinha sido contactada pelo sheik, dono do clube em causa, indo o autor receber €15.000 do prémio de assinatura e a retribuição mensal de €6.000 líquidos, não tendo o autor aceite esse convite dizendo que já estava comprometido com o A... para ser o treinador do A... na 1ª divisão, CC, que tendo integrado a equipa técnica do autor, viveu de perto todas as incidências e que necessariamente se encontrava em posição de assistir e ter conhecimento directo de tal matéria, e FF, com conhecimento directo dos factos por a testemunha estar presente em muitos contactos estabelecidos por empresários de futebol e dirigentes do Clube do Réu com o seu marido, aqui Autor, e que estiveram entre si em sintonia quanto a essa matéria.”.