Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
390/13.5GBOAZ-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA ERMELINDA CARNEIRO
Descritores: CONVERSÃO DA MULTA EM PRISÃO SUBSIDIÁRIA
DESPACHO
NOTIFICAÇÃO POR VIA POSTAL
TIR
Nº do Documento: RP20180912390/13.5GBOAZ-A.P1
Data do Acordão: 09/12/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO (LIVRO DE REGISTOS Nº 37/2018, FLS 221-227)
Área Temática: .
Sumário: É admissível a notificação ao arguido do despacho que converte a multa em prisão subsidiária, por via postal para a morada constante do TIR.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo número 390/13.5GBOAZ-A.P1
Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – juízo Local Criminal de Oliveira de Azeméis

Acordam em conferência na Primeira Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:

I - Relatório
No âmbito dos presentes autos de Processo Abreviado supra identificado em que é arguido, B..., por despacho proferido em 4 de outubro de 2017, foi indeferida a promoção do Ministério Público no sentido de o despacho de conversão da pena de multa em prisão subsidiária ser notificado ao arguido por via postal simples com prova de depósito, para a morada indicada no termo de identidade e residência.
Inconformado com tal decisão, dela interpôs recurso o Digno Ministério Público, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões (transcrição):
«Conclusões:
1. No âmbito dos presentes autos foi o arguido B... condenado, pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de €5,00 (cinco euros), perfazendo o total de €350,00 (trezentos e cinquenta euros).
2. Verificados os pressupostos do n.º 1 do artigo 49.º do Código de Processo Penal e sem prejuízo da faculdade conferida no n.º 2 do mesmo normativo, foi determinada a conversão daquela pena de multa em 46 dias de prisão subsidiária;
3. tendo sido o competente despacho de conversão, datado de 23.06.2017, notificado ao respectivo defensor do arguido.
4. Por despacho datado de 04.10.2017 foi indeferida a promovida notificação do arguido do referido despacho por via postal simples, mediante prova de depósito na morada pelo mesmo indicada no respectivo termo de identidade e residência, e determinada a necessidade da respectiva notificação do mesmo por contacto pessoal, formalidade que mais se reputou essencial sob pena de violação das garantias de defesa do arguido e do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 61.º do Código de Processo Penal, geradora da nulidade prevista na alínea c) do artigo 119.º do mesmo diploma.
5. O arguido prestou termo de identidade e residência no âmbito dos presentes autos no dia 29.06.2013 e ao abrigo da nova redacção legal conferida aos artigos 196.º, n.º2 e n.º 3 e 214.º, n.º 1 – alínea e) do Código de Processo Penal, introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de Fevereiro;
6. Motivo pelo qual, não tendo comunicado morada distinta, o mesmo ainda se encontra plenamente válido, mantendo-se todas as respectivas obrigações e consequências do mesmo decorrentes até à execução da pena na qual foi condenado, de entre as quais as circunstâncias de todas as notificações futuras passarem a ser legitimamente feitas por mera via postal simples (nos termos da alínea c) do n.º 3 do artigo 196.º e do n.º 3 do artigo 113.º, ambos do Código de Processo Penal) e do incumprimento da comunicação de alteração de residência legitimar a representação do arguido por defensor (nos termos da alínea d) do n.º 3 do artigo 196.º);
7. para as quais, de resto, foi o arguido foi devidamente advertido no termo de identidade prestado, ali mais expressamente constando que, em caso de condenação, aquele só se extinguirá com a extinção da pena.
8. Desta feita, na sequência do intencional alargamento dos efeitos do termo de identidade e residência para além do trânsito em julgado da sentença condenatória e até à cessação da execução da pena (operado por via da apontada alteração legislativa de 2013) e à míngua de norma que determine outra forma expressa de como efectuar a notificação ao arguido do despacho de conversão proferido ao abrigo do artigo 49.º n.º 1 do Código Penal, não se vê como, existindo termo de identidade e residência validamente prestado nos autos ao abrigo deste novo regime legal, a notificação ao arguido deva processar-se por outra forma que não por aquela para a qual o mesmo foi expressamente advertido: por via postal simples para a morada por si indicada para o efeito;
9. não sendo exigível in casu a respectiva notificação do arguido por contacto pessoal.
10. Pelo exposto e porque em violação do disposto no artigo 49.º do Código Penal e nos artigos 113.º, n.º 1 – alínea c), n.º 3 e n.º 10, 196.º, n.º 2 e n.º 3 – alíneas c), d) e e) e 214.º, n.º 1 – alínea e), todos do Código de Processo Penal, a decisão de fls. 212, que indefere a promovida notificação do aludido despacho de conversão por via postal simples mediante prova de depósito na morada para o efeito indicada pelo arguido, deve por isso ser revogada e substituída por outra que determine tal forma de notificação.
Termos em que, e nos quais V.as Ex.as superiormente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, revogado o despacho recorrido e substituído por outro que determine a notificação do arguido do despacho de conversão da pena de multa em prisão subsidiária mediante via postal simples para a morada do respectivo termo de identidade e residência, assim se fazendo Justiça.».
*
O recurso foi admitido por despacho de 15 de novembro de 2017.
Sem sustentação do despacho, a Exmª Srª Juíz ordenou a subida dos autos a esta Relação.
Neste Tribunal da Relação o Digno Procurador-Geral Adjunto elaborou douto parecer no qual, contrariando a argumentação aduzida no despacho recorrido e convocando, ainda, o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 6/2010, conclui pela procedência do recurso.
Cumprido o preceituado no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal nada foi acrescentado.
Colhidos os vistos legais foram os autos submetidos a conferência.
***
II – Fundamentação
Constitui jurisprudência pacífica dos tribunais superiores que o âmbito do recurso se afere e se delimita pelas conclusões formuladas na motivação apresentada (artigo 412º nº 1, in fine, do Código de Processo Penal), sem prejuízo das que importe conhecer, oficiosamente por obstativas da apreciação do seu mérito.
No caso vertente, vistas as conclusões do recurso, a questão suscitada cinge-se a saber se a notificação ao arguido do despacho que converte a pena de multa em prisão subsidiária deve ser pessoal, ou pode ser efetuada por via postal simples com prova de depósito para a morada constante do termo de identidade e residência prestado nos autos.
Cumpre apreciar e decidir
Com relevância para a análise do recurso há que atender às seguintes ocorrências processuais:
O arguido prestou termo de identidade e residência nos autos em 29 de junho de 2013, tendo-lhe sido dado conhecimento, naquele ato, do conteúdo do disposto nas alíneas a), b), c), d) e e) do artigo 196º nº 3 Código Processo Penal.
Por sentença proferida em 20 de novembro de 2013 foi o arguido condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3º, nº. 2, do Decreto-Lei nº. 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 70 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, no montante global de € 350 (trezentos e cinquenta euros).
A sentença foi pessoalmente notificada ao arguido em 29 de outubro de 2015.
O Ministério Público, em 16 de fevereiro de 2016, promoveu o cumprimento da pena de prisão subsidiária por o arguido não ter efetuado voluntariamente o pagamento da multa e se mostrar inviável a sua execução.
Determinada a notificação do arguido do teor da aludida promoção através da GNR, foi remetida por esta entidade certidão negativa, com a informação que o arguido não residia na morada indicada no termo de identidade e residência há mais de dois anos.
Por despacho de 23 de junho de 2017, foi a pena de multa convertida, nos termos do disposto no artigo 49º, nº 1 do Código Penal, em 46 (quarenta e seis) dias de prisão subsidiária.
Desse despacho foi notificada, em 10 de julho de 2017, a Ilustre Defensora oficiosa do arguido e determinada a notificação pessoal deste para a residência constante do termo de identidade e residência novamente através da GNR.
Gorada a notificação pessoal do arguido nos termos determinados, como se constata da certidão negativa de 23 de julho de 2017 junta aos autos, o Digno Ministério Público promoveu, em 25 de setembro de 2017 a notificação do arguido do despacho de conversão proferido em 23 de junho de 2017, nos termos e para os efeitos ali determinados, ao abrigo do disposto nos artigos 196º., nº 2 e 113º., nº 1 alínea c), do Código Processo Penal.
Em 4 de outubro de 2017 foi proferido o despacho recorrido (transcrição):
«A fls.211 veio a Digna Magistrada do Ministério Público requerer fosse o arguido B... notificado do despacho de conversão da pena de multa em pena de prisão subsidiária para a morada indicada no TIR, por via simples com prova de depósito, prestado pelo arguido
A questão a decidir e colocada pela Digna Magistrada do Ministério Público é a modalidade da notificação ao arguido do despacho que converte a multa em prisão subsidiária e designadamente se deve ser pessoal ou pode ser efetuada por via postal simples para a morada constante do termo de identidade e residência prestado nos autos.
Cumpre decidir.
Antes de mais importa referir não ser pacífica a jurisprudência nesta matéria, porém das pesquizas efetuadas no estudo aprofundado da questão suscitada (que ó veio reforçar a posição que temos vindo a assumir), concluímos ser maioritariamente no sentido de uma exigência processual e constitucional a notificação pessoal do despacho ao abrigo do disposto no n.º1 do artigo 49.º do Código Penal.
Perfilhamos o entendimento de que o despacho proferido, ao abrigo do art. 49º do Código Penal, que converteu a pena de multa não paga em prisão subsidiária configura uma alteração superveniente do conteúdo decisório da sentença de condenação, que tem como efeito a privação da liberdade do arguido condenado.
Na verdade, o despacho que converte a pena de multa em prisão subsidiária ao operar uma verdadeira modificação na natureza da pena aplicada (passa a ser uma pena detentiva), o que impõe que a notificação deva ser efetuada através de uma via que garanta a certeza de que o condenado teve conhecimento da decisão que afeta os seus direitos, liberdades e garantias e que ordena a emissão de mandados de detenção para o cumprimento da prisão subsidiária.
Pelo que aquela notificação, em nosso entendimento, tem que ser pessoal e configura uma formalidade essencial, cuja violação gera nulidade, do art. 119º, al. c), do C.P.P., por violação do art. 61º, nº 1, al. b).
Tal garantia apenas pode ser dada através de notificação por contacto pessoal (até pelo paralelismo com o caso do artº 333º, nº 5).
Em conformidade com o supra exposto, indefere-se, assim, o doutamente promovido.
Notifique.»

Relativamente à questão suscitada nestes autos a jurisprudência tem-se dividido, designadamente, em duas correntes antagónicas.
Uma delas, seguida no despacho recorrido, considera que a notificação do despacho de conversão da pena de multa em prisão subsidiária terá de ser pessoalmente efetuada ao arguido. (vide, acórdãos desta Relação do Porto de 19 de janeiro de 2011, processo nº 662/05.2GNPRT-A.P123; de 23 de fevereiro de 2011, processo n.º18/08.5PHMTS-B.P1; de 9 de março de 2011, processo nº 630/06.7PCMTS-A.P1; de 18 de maio de 2011, processo nº 241/10.2PHMTS-A.P1 e de 14 de dezembro de 2011, processos nºs 344/09.6PBMTS-B.P1 e 80/10.0PTPRT-A.P1, todos disponíveis in www.dgsi.pt.
A outra corrente, defendida pelo Ministério Público, entende que tal notificação poderá ser efetuada por via postal com prova de depósito, para a residência constante do termo de identidade e residência (nesta esteira se perfilam, também desta Relação do Porto, os acórdãos de 6 de abril de 2011, processo nº 53/10.3PBMTS-A.P1; de 2 de maio de 2012, processo nº 4261/07.6TAMTS-A.P1; de 4 de junho de 2014, processo nº 618/08.3GCSTS-A.P1; de 27 de setembro de 2017, processo nº 9126/00.0TDPRT-A.P1; de 8 de novembro de 2017, processo nº 664/14.8GAPFR-A.P1 e de 13 de junho de 2018, processo nº 92.8GBOAZ.P1. disponíveis, igualmente in www.dgsi.pt.
Os argumentos esgrimidos por uma e por outra corrente jurisprudencial encontram-se sintetizados no acórdão deste Tribunal da Relação do Porto de 28 de setembro de 2016 (processo nº. 1239/06.0PTPRT-A.P1) cuja enunciação, por a subscrevermos, aqui reproduzimos:
«No sentido da necessidade da notificação pessoal:
- É distinta a natureza da prisão subsidiária e da multa. Uma implica a privação da liberdade e a outra apenas sacrifício patrimonial. Logo, a conversão da multa em prisão subsidiária constitui uma modificação essencial da decisão condenatória em momento posterior à sentença.
- A efectividade do direito ao recurso, que faz parte das garantias de defesa, é melhor defendida com a notificação pessoal do arguido, única que assegura o efectivo conhecimento da decisão. Só a notificação pessoal satisfaz as exigências do processo equitativo, previstas no artigo 20º nº 4 da Constituição da República Portuguesa e no artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos.
- A jurisprudência do Acórdão uniformizador nº 6/10 não é aplicável ao caso porque tratou da notificação ao arguido de decisão diferente e porque a cisão, ali defendida, entre uma parte da sentença transitada e outra não transitada, no caso da revogação da suspensão da execução da pena de prisão, não é transponível para a situação da conversão da multa em prisão subsidiária. Acresce que na situação tratada no Acórdão uniformizador o arguido tem garantido, em momento prévio ao despacho que se considerou poder ser notificado por via postal, o exercício do contraditório, com a audição do artigo 495º do CPP, o que não sucede previamente ao despacho de conversão da multa em prisão.
- As obrigações do TIR extinguem-se com o trânsito em julgado da sentença. Não pode ficcionar-se que a notificação postal feita para a morada do TIR produziu um efectivo conhecimento da decisão pelo arguido, quando deixaram de subsistir as obrigações de manter a residência e de comunicar as alterações subsequentes.
- As consequências do despacho que converte a multa em prisão subsidiária são bem mais graves do que várias situações previstas o artigo 113º nº 10 do CPP em que se exige a notificação pessoal do arguido. Por isso não tem sentido, na harmonia do sistema, entender que neste caso basta uma notificação postal.
No sentido de ser bastante a notificação postal, os argumentos são de outra ordem:
- A partir da revisão do CPP de 2000 a notificação postal é a regra prevista para a comunicação dos actos processuais, inclusivamente ao arguido. Essa regra vale tanto durante a pendência do TIR como em momento posterior, porque a lei não distingue e o arguido mantém sempre essa qualidade no processo.
- A pena de multa convertida em prisão não altera a sua natureza de pena principal. O que se executa é ainda a pena principal fixada na sentença, através de uma “sanção de constrangimento”, visto que a todo o momento o arguido pode fazer cessar a prisão, por acto da sua exclusiva vontade, pagando a multa ou demonstrando impossibilidade de a pagar e pedindo a suspensão da prisão.
- O arguido condenado em pena de multa teve dela conhecimento pessoal e sabe que consequências terá a falta de pagamento. O despacho que determina a aplicação dessas consequências não constitui assim uma modificação superveniente do conteúdo da sentença que tenha de ser levada ao conhecimento pessoal do arguido.
- Apesar da extinção dos efeitos do TIR com o trânsito da sentença, as prescrições do artigo 196º do CPP que não têm efeitos restritivos nos direitos fundamentais, não constituem medidas de coacção e por isso podem manter-se para além desse momento.
- A partir da revisão de 2000, o arguido é também co-responsável pelo valor da celeridade processual. A notificação postal pressupõe sempre um contacto pessoal prévio, com a constituição de arguido e a prestação do TIR. A escolha do receptáculo postal pelo arguido e os mecanismos de certificação pelo agente dos serviços postais dão suficientes garantias de que a comunicação chega ao seu conhecimento.»
Com o maior respeito e sem olvidarmos a consistência e pertinência dos argumentos aduzidos no sentido da notificação pessoal do arguido, não sufragamos da mesma posição.
Desde logo porquanto se é manifesto revestir-se de particular importância a notificação da decisão de conversão da pena de multa em pena de prisão por afetar a liberdade do condenado, igual importância patenteia a decisão de revogação da suspensão de uma pena de prisão. E, relativamente a esta foi uniformizada jurisprudência por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 6/2010, in DR 1ª S. de 21 de Maio de 2010, no sentido de admissibilidade de a notificação ser efetuada por via postal na morada indicada no termo de identidade e residência. Como já salienta o supra mencionado acórdão da Relação do Porto de 4 de junho de 2014 «Por uma questão de coerência e unidade do sistema jurídico, deve considerar-se aplicável à situação vertente o princípio subjacente a essa jurisprudência. As duas situações são (independentemente da diferente natureza das penas em causa) substancialmente equiparáveis: da mesma forma que numa condenação em pena de prisão suspensa pode distinguir-se entre a condenação na pena suspensa substituta, que transita em julgado de imediato, e a condenação em pena de prisão efetiva, que é eventual e não transita em julgado antes do despacho de revogação dessa suspensão, também numa condenação em pena de multa pode distinguir-se entre essa condenação em si mesma, que transita em julgado de imediato, e a condenação na pena de prisão subsidiária, que é inerente a tal condenação em multa, mas também é virtual e não se torna efetiva antes da conversão dessa multa (e, portanto, não transita em julgado antes dessa conversão).
Assim sendo, deve considerar-se, mesmo à luz do regime anterior à Lei nº 20/2013, que o termo de identidade e residência se mantém válido até à eventual conversão da pena de multa em pena de prisão subsidiária e é admissível a notificação do condenado por via postal na morada indicada nesse termo.».
Ademais, é nosso entendimento que a querela jurisprudencial existente se terá esbatido com as alterações introduzidas aos artigos 196º e 214º do Código Processo Penal pela Lei n.º20/2013, de 21/02, como são exemplo os mais recentes acórdãos em que se debate a questão.
Com efeito, esta Lei nº 20/2013 veio dar nova redação, designadamente, ao artigo 214º, nº 1, alínea e), do Código Processo Penal, nos termos do qual as medidas de coação se extinguem de imediato com o trânsito em julgado da sentença condenatória, à exceção do termo de identidade e residência que só se extinguirá com a extinção da pena.
Assim, nos termos deste normativo legal, as prescrições decorrentes do termo de identidade e residência mantêm-se até à extinção da pena, sendo as notificações ao arguido, após o trânsito em julgado da sentença (sem prejuízo de admissibilidade de outras modalidades de notificação previstas no artigo 113º alíneas a) a c) do Código Processo Penal), efetuadas por via postal simples para a morada indicada aquando a prestação do termo de identidade e residência – cfr. artigo 196.º, n.º3, alínea c) do Código Processo Penal.
Desta forma, ou seja, através da notificação por via postal simples dos despachos proferidos após a prestação do termo de identidade e residência com todas as informações ao arguido contidas no artigo 196º, nº 3 do Código Processo Penal, permite-se a satisfação das exigências de eficácia e celeridade da administração da justiça penal, sem postergar a garantia de defesa dos arguidos. Na verdade, impõe-se ao arguido oportunamente advertido de que as suas notificações passarão a ser efetuadas por via postal para a morada indicada no termo de identidade e residência, que não altere a sua residência sem comunicar essa alteração ao Tribunal. Se não cumpre tal obrigação, impende sobre si a responsabilidade pelo prejuízo que daí lhe advenha.
Destarte, para concluir que, no caso dos autos, tendo o arguido prestado termo de identidade e residência nos termos da atual redação do artigo 193º do Código Processo Penal com as advertências constantes no mesmo, a notificação a efetuar do despacho que converteu a pena de multa em prisão subsidiária deverá, como pretende o Digno Recorrente, ser levada a efeito através de aviso postal com prova de depósito para a morada constante do termo de identidade e residência.
No sentido que vimos defendendo se pronunciou o já supra mencionado recente acórdão desta Relação de 13 de junho de 2018, processo nº 92.8GBOAZ.P1. Ainda, perfilando o mesmo entendimento, o acórdão da Relação de Coimbra de 13 de julho de 2016, processo nº 120/14.4PTCBR.C1.
Cumpre, aliás, sublinhar que o acórdão da Relação do Porto de 28 de setembro de 2016, processo nº 1239/06.0PTPRT-A.P1, e a que já fizemos referência acima, não obstante sufragar o entendimento da necessidade da notificação pessoal (antes da entrada em vigor da Lei nº. 20/2013, de 21/02) por razão de proteção das garantias de defesa, acaba por ressalvar a suficiência da notificação do despacho que converte em prisão subsidiária a pena de multa por via postal simples na hipótese de o arguido ter prestado termo de identidade e residência em momento posterior à vigência da redação dos artigos 196º nº 3 e) e 214º nº 1 e) do Código Processo Penal, ou seja, se tiver sido advertido de que as obrigações e consequências inerentes se mantêm até cessar a execução da pena.
Em síntese, procede, pois, o recurso.
***
III – Decisão
Acordam em conferência na Primeira Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto em julgar procedente o recurso interposto pelo Digno Ministério Público revogando-se, em consequência, o despacho recorrido, o qual deverá ser substituído por outro que ordene a notificação do condenado, B..., do despacho de 23 de junho de 2017 que converteu a pena de multa em prisão subsidiária, por via postal simples com prova de depósito para a morada indicada no termo de identidade e residência.

Sem tributação.

Porto, 12 de setembro de 2018
(elaborado pela relatora e revisto por ambos os subscritores – artigo 94 nº2 do Código Processo Penal)
Maria Ermelinda Carneiro
Raúl Esteves