Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
109/13.0EAPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ELSA PAIXÃO
Descritores: CRIME DE EXPLORAÇÃO ILÍCITA DE JOGO
JOGO DE FORTUNA E AZAR
Nº do Documento: RP20150429109/13.0EAPRT.P1
Data do Acordão: 04/29/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – Jogos de fortuna ou azar são todos aqueles cujo resultado assenta exclusiva ou fundamentalmente na sorte - artº 1º DL 422/89.
II – Dos artº 159º e 161º DL 422/89 resulta que as modalidades afins dos jogos de fortuna ou azar não podem desenvolver temas próprios dos jogos de fortuna e azar, alguns dos quais ali exemplifica, nem pode substituir por dinheiro ou fichas os prémios atribuídos.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. nº 109/13.0EAPRT.P1
Instância Local de Felgueiras – Secção Criminal – J1 – Comarca do Porto Este

Acordam, em Conferência, os Juízes desta 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:

I – RELATÓRIO
Na Instância Local de Felgueiras – Secção Criminal – J1 – Comarca do Porto Este, no processo comum singular nº 109/13.0EAPRT, foram submetidos a julgamento os arguidos B… e C…, tendo sido proferida decisão com o seguinte dispositivo:
Pelo exposto, tendo em atenção as considerações produzidas e as normas legais citadas, julga-se a acusação pública procedente, por provada e, em consequência, decide-se:
1) Condenar o arguido B…, como co-autor material e na forma consumada, de um crime de exploração ilícita de jogo, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 26.º, do Código Penal e 108.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 422/89, de 02 de Dezembro, nas penas compósitas de 3 (três) meses de prisão e 60 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos);
2) Substituir a pena de prisão fixada em 1) supra por 90 (noventa) dias de multa, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), nos termos do disposto nos artigos 43.º e 47.º, ambos do Código Penal;
3) Condenar o arguido B… na pena materialmente cumulada de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, do Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, à taxa diária € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz a quantia global de € 825,00 (oitocentos e vinte e cinco euros);
4) Condenar a arguida C…, como co-autora material e na forma consumada, de um crime de exploração ilícita de jogo, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 26.º, do Código Penal e 108.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 422/89, de 02 de Dezembro, nas penas compósitas de 3 (três) meses de prisão e 60 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros);
5) Substituir a pena de prisão fixada em 4) supra por 90 (noventa) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), nos termos do disposto nos artigos 43.º e 47.º, ambos do Código Penal;
6) Condenar a arguida C… na pena materialmente cumulada de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, do Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, que, após aplicação do disposto no artigo 80.º, n.º 2, do Código Penal, se fixa em 149 (cento e quarenta e nove) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), perfazendo o montante global de € 745,00 (setecentos e quarenta e cinco euros);
7) Declarar perdida a favor do Estado a máquina de jogo descrita em 8.º supra e apreendida nos autos, nos termos do disposto no artigo 109.º, n.ºs 1 a 3, do Código Penal e 116.º, do Decreto-Lei n.º 422/89, de 02 de Dezembro e, após trânsito, ordenar que tal máquina seja destruída;
8) Declarar perdida a favor do Fundo de Turismo a quantia de € 4,50 (quatro euros e cinquenta cêntimos) apreendida nos autos, nos termos do disposto no artigo 109.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal e 117.º, do Decreto-Lei n.º 422/89, de 02 de Dezembro;
9) Condenar os arguidos B… e C… no pagamento das custas processuais, que englobam a taxa de justiça e demais encargos, fixando-se aquela para cada um dos arguidos, individualmente, em 2 (duas) UC´s (cfr. artigos 513.º, n.º 1, 514.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Penal e 8.º, n.º 9 e tabela III, do Regulamento das Custas Processuais).
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Após trânsito:
a) Remeta boletim à Direcção dos Serviços de Identificação Civil, de acordo com o disposto no artigo 5.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 57/98, de 18 de Agosto;
b) Abra vista ao Ministério Público para se pronunciar quanto ao destino da máquina melhor descrita no ponto 7.º supra e do demais dinheiro apreendido nos autos;
c) Comunique à A.S.A.E. para proceder à destruição da indicada máquina Colorama, identificado no ponto 8.º dos factos provados supra, remetendo, oportunamente, o respectivo auto de destruição.
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Notifique, registe e deposite, nos termos do disposto no artigo 372.º, n.º 5, do Código do Processo Penal.
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Inconformados com a decisão condenatória, os arguidos C… e B…, conjuntamente, vieram interpor recurso, terminando a motivação com as seguintes conclusões (transcrição):
1º - A decisão sob recurso faz incorreta apreciação e valoração dos factos e subsequente subsunção, interpretação e aplicação “in casu” dos normativos legais aplicáveis.
2º - A máquina em causa nos autos não poderá ser enquadrada como máquina de jogo de fortuna e azar,
3º - Na verdade, da conjugação do disposto no artº 4º do n.° 1 do D.L. 10/95, de 19/1, com os fundamentos emanados do Acórdão uniformizador de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), com o número 4/2010 (publicado no DR 1a série — N.° 46 — 8 de Marco de 2010), só serão de considerar como jogos de fortuna ou azar as máquinas de jogos que paguem directamente prémios em fichas ou moedas; ou não pagando directamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvam temas próprios dos jogos de fortuna ou azar identificados no art.° 4 n.° 1 do D.L. 10/95, de 19/1, por a sua exploração caber exclusivamente aos casinos.
4º - E, nem mesmo a circunstância de os jogos proporcionarem prémios em coisas com valor económico e em dinheiro, ou só em dinheiro, não é suficiente, por si só, para integrar a " especifica configuração em que está definido o pagamento de prémios (pagamento directo em fichas ou moedas) nos jogos de fortuna ou azar, não retirando aquela circunstância aos jogos em causa a natureza de modalidade afim.
5º - Sendo que, “todas as modalidades de jogos que não correspondam às características descritas e especificadas nos referidos artigos 1.° e 4.° do Decreto -Lei n.° 422/89, na redacção do Decreto -Lei n.°10/95, embora os seus resultados dependam exclusiva ou fundamentalmente da sorte, revertem para as modalidades afins, como se defende no referido acórdão.”
6º - No caso ora em recurso, a máquina em causa: não desenvolve tema próprio de jogo de fortuna e azar, como o póker, frutas, campainhas, blackjack, ou mesmo a roleta, (porquanto este jogo conjuga probabilidades muito mais complexas, que variam com o número apostado, sua cor, ser par ou ímpar, etc., e permite apostas elevadas, e não jogadas fixas, como neste caso).
7º - Sendo que, se a máquina automática em causa, não desenvolvia tema próprio dos jogos de fortuna ou azar nem pagava diretamente prémios em fichas ou moedas.
8º - Violou por isso a decisão ora em crise, o disposto nos artºs 1º, 3º, 4º, nº 1, al. g) e 108º, nºs 1 e 2 conjugados com os artigos 159º, 160° a 162° do Decreto Lei no 422/89 de 2/12, com as alterações do Decreto Lei nº 10/95 de 19/01, em conjugação ainda com os fundamentos do Acórdão uniformizador de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), com o número 4/2010 (publicado no DR 1a série — N.° 46 — 8 de Marco de 2010).
9º – Por outro lado, não será de considerar como provado que o arguido explorava de facto e efetivamente o estabelecimento em causa.
10º – Sendo que, por maioria de razão muito menos será de considerar provado que o mesmo explorava os equipamentos em causa nos autos.
11º – Na sequência, operado o princípio “in dubio pro reo” deveria ser o arguido absolvido, e revogada parcialmente a douta sentença.
12º - A Sentença ora em crise fez ainda uma desadequada aplicação da medida da pena.
13º - Na verdade, atendendo às condições económicas do arguido/recorrente, sociais e familiares.
14º - Mostra-se desadequado o montante da pena de multa aplicada ao recorrente.
15º - Na sequência, entender-se-ia, caso fosse de aplicar qualquer pena, o que não se concebe, que uma pena de menor montante teria servido de igual modo os fins de prevenção geral e especial que os dispositivos legais visam prosseguir, reduzindo-a bem como reduzindo ao mínimo legal a taxa diária da multa
16º - Por todo o exposto e sem mais delongas, deverá ser parcialmente revogada a decisão de condenação proferida pela meritíssima juiz a quo.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO QUE VªS. EXªS. TÃO DOUTAMENTE SUPRIRÃO DEVE A PRESENTE DECISÃO SER PARCIALMENTE REVOGADA, E EM CONSEQUÊNCIA SER O ARGUIDO B… ABSOLVIDO DO CRIME DE QUE VEM ACUSADO, TAL COMO É DE INTEIRA JUSTIÇA.
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O recurso foi admitido (cfr. despacho de fls. 226).
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Em resposta ao recurso, o Ministério Público defendeu que “a douta sentença recorrida não enferma de qualquer erro, vício ou contradição, pelo que, deve a mesma ser confirmada e mantida nos seus precisos termos, negando-se provimento ao recurso interposto pelos arguidos. Formulou as seguintes conclusões:
1. Ao contrário do que alegam os arguidos/recorrentes, tal como se defende na douta sentença proferida nos autos, com a qual se concorda na íntegra - e para cujo teor se remete por brevidade de argumentação e atenta a sua clareza de exposição e douta fundamentação - bem como se defende nos doutos acórdãos ali melhor referenciados e ainda douto acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, n.º 4/2010, de 08/03, (sic) "Constitui modalidade afim, e não jogo de fortuna ou azar, nos termos dos artigos 159°, n.º 1, 161°, 162° e 163°, da Lei n.º 422/89, de 02/12, na redacção introduzida pelo Dec-Lei n.º 10/95, de 19/01, o jogo desenvolvido em máquina automática na qual o jogador introduz uma moeda e, rodando um manipulo, faz sair de forma aleatória uma cápsula contendo uma senha que dá direito a um premio pecuniário, no caso de o número nela inscrito coincidir com algum dos números constantes do cartaz exposto ao público".
2. Ora, como facilmente se constata através de uma leitura, mesmo que perfunctória, do texto da douta sentença recorrida e do teor de tal douto acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, que o caso dos autos não se enquadra nos parâmetros legais ali melhor descritos.
3. Ou seja, a máquina em causa nos autos desenvolve um jogo denominado "Halloween", o qual, depois de o jogador introduzir uma moeda, depende em exclusivo da sorte. Isto é, o resultado que o jogador vai ter não depende da sua perícia, mas apenas das várias combinações obtidas no jogo (que vão permitir obter ou não créditos e consequentemente obter prémios pecuniários ou outros, conforme o estabelecido pelo explorador do jogo), as quais ele não pode influenciar de nenhuma forma, conforme se constata pelo teor do exame pericial constante dos autos.
4. Deste modo, não podendo o jogador influenciar de nenhuma forma o resultado do jogo, mas podendo (conforme a sorte que tiver) obter prémios, não se percebe como se pode alegar que tal máquina não pode ser enquadrada como máquina de jogo de fortuna e azar e que ainda se enquadra e é abrangida pelos fundamentos do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do S.T.J., com o n.º 4/2010, publicado no DR – 1ª Série, n.º 46, de 08/03/2010, ainda que conjugado com as alterações introduzidas pelo Dec-Lei n.º 10/95, de 19/01.
5. Pelo que, e assim sendo, sem mais delongas, carece de qualquer fundamento as razões de recurso melhor descritas nas doutas alegações apresentadas pelos arguidos, nesta parte.
6. Pelo exposto, e por maioria de razão, inexiste no caso em análise, por parte da douta sentença proferida nos autos, a invocada violação dos artigos 1°, 3°, 4°, n.º 1, al. g), e 108°, n.º 1 e n.º 2, conjugados com os artigos 159°, 160° a 162°, todos do Dec-Lei n.º 422/89, de 02/12, na redacção introduzida pelo Dec-Lei n.º 10/95, de 19/01, em conjugação com o citado acórdão de uniformização de jurisprudência, motivo pelo qual a mesma não merce qualquer censura devendo se manter nos seus precisos termos.
7. Alega ainda o arguido/recorrente B… que nunca geriu de facto o estabelecimento comercial melhor referido nos autos, pelo que deve ser absolvido da prática do crime em causa.
8. Mais uma vez, e ao contrario do que lega o arguido/recorrente B…, tal como se defende na douta sentença proferida nos autos, dúvidas não restam de que o arguido/recorrente era sócio do estabelecimento comercial em causa, assinava toda a documentação para as finanças, segurança social, contabilidade, bancária, entre outras, pelo que, apesar de o arguido não estar de forma diária em tal estabelecimento, pois trabalha como operário numa fábrica - sendo a gestão diária do café da responsabilidade da arguida C…, situação muito comum em Portugal (o marido trabalha fora enquanto a esposa explora uma loja comercial que é de ambos) ­ambos têm conhecimento das questões diárias e correntes referentes à exploração de tal estabelecimento comercial e em regra decidem em conjunto sobre tais questões.
9. Nesta conformidade, o M.º Juiz do Tribunal a quo ao decidir como decidiu teve em conta as regras da experiência comum e da normalidade das coisas, ou seja, o arguido recorrente ajudava a mulher aos fins-de-semana e à noite no citado estabelecimento comercial e estava a par de toda a gestão diária e cotidiana de tal café, motivo pelo qual não teve a menor dúvida sobre tal prática e situação o que o levou a condená-lo, como foi, não existindo no caso em análise nenhuma dúvida "existencial" que o obrigasse a aplicar o invocado princípio fundamental de direito "in dubio pro reo" e muito menos a reduzir a pena de multa em que o condenou, a qual já está muito próxima do mínimo legal previsto na lei.
10. Pelo exposto, inexiste no caso em análise, qualquer violação do princípio "in dubio pro reo", ou de qualquer outro, por parte da douta sentença proferida nos autos, motivo pelo qual a mesma não merece qualquer censura devendo se manter nos seus precisos termos.
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Nesta Relação, o Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto, acompanhando no essencial a resposta apresentada pelo Ministério Público na 1ª instância, emitiu parecer no sentido da manutenção da decisão recorrida.
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Cumpriu-se o disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, não tendo sido apresentada resposta.
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Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência.
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II – FUNDAMENTAÇÃO
Passemos agora ao conhecimento das questões alegadas no recurso interposto da decisão final proferida pelo tribunal singular.
Para tanto, vejamos, antes de mais, o conteúdo da decisão recorrida.
Segue-se a enumeração dos factos provados e não provados e respectiva motivação, constantes da sentença recorrida (transcrição):
II – Fundamentação de facto:
A – Factos provados:
Discutida a causa, resultaram provados, com interesse para a decisão a proferir, os seguintes factos:
1.º Os arguidos B… e C…, marido e mulher respectivamente, exploram, gerem e dirigem o estabelecimento comercial denominado “D…”, sito na Rua …, n.º .., em …, Felgueiras, onde se situa também a sua residência, o que fazem com vista ao lucro, sendo esta actividade fonte dos seus rendimentos;
2.º No dia 06 de Março de 2013, pelas 15horas e 30minutos, nesse estabelecimento de café, os arguidos tinham à vista, acessível e disponível a qualquer cliente do mesmo, estando por isso devidamente ligada à energia eléctrica e em condições de ser utilizada, a máquina de jogo com as características e contendo o jogo referido no relatório de exame pericial de folhas 64 e 65, frente e verso, que aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos;
3.º Nesta máquina era possível praticar o jogo descrito no mencionado relatório de exame, em que a perícia do jogador não tem qualquer interferência no resultado, cabendo tão só ao acaso ou à sorte a obtenção de prémios ou de dinheiro, razão pela qual a sua exploração só é permitida nos casinos e em zonas autorizadas de jogo;
4.º Também nas circunstâncias de tempo, modo e lugar descritas em 2.º supra, nesse estabelecimento de café, os arguidos tinham à vista de qualquer cliente do mesmo, mas desligada da corrente eléctrica, não estando, por isso, em funcionamento, uma máquina sem qualquer referência exterior quanto à origem, fabricante, número de fabrico ou série móvel de cor preta, com estrutura em madeira, composto apor um monitor e teclado, para interface com o utilizador, denominada quiosque de internet, apresentando, ainda, na parte inferior frontal o mecanismo de introdução de moedas;
5.º Com efeito, em data não concretamente apurada, mas anterior a 06 de Março de 2013, os arguidos adquiriram as aludidas máquinas descritas a indivíduo cuja identidade não foi possível apurar e, desde então e sem prejuízo do descrito em 4.º supra, colocaram-nas em funcionamento no estabelecimento comercial indicado, com vista à obtenção de lucro, proporcionando aos eventuais interessados a respectiva utilização, como sucedeu anteriormente à data dos factos;
6.º Na verdade, em 06 de Março de 2013, a máquina referida em 4.º supra continha, no seu interior, a quantia de € 16,50 (dezasseis euros e cinquenta cêntimos) e a máquina aludida em 2.º supra continha a quantia de € 4,50 (quatro euros e cinquenta euros), num total de € 21,00 (vinte e um euros) em moedas e notas do B.C.E., provenientes da sua utilização, por parte dos clientes;
7.º Na máquina identificada no relatório de folhas 57 a 63, para além de ser possível, através dela, aceder à internet, desde que, para tanto fosse introduzido dinheiro no respectivo moedeiro, permitia, ainda, a mesma, através de um série de toques e códigos, o desenvolvimento de dois jogos em que a perícia do jogador não tem qualquer interferência no resultado, cabendo tão só ao acaso ou à sorte a obtenção de prémios ou de dinheiro, razão pela qual, quanto a esses dois jogos, a sua exploração só é permitida nos casinos e em zonas autorizadas de jogo, a saber:
i. Halloween, no qual, após a introdução de moedas e escolhido o jogo, surgindo no topo do écran as palavras: crédito, que apresenta à sua frente os pontos provenientes das moedas ou notas introduzidas; prémio, que assinala os créditos/pontos provenientes de eventuais jogadas premiadas; e aposta, que regista o número de apostas (créditos/pontos) que o jogador decide arriscar em cada jogada;
1. o menu de jogo é composto por cinco rolos de símbolos (colunas) e três linhas, perfazendo quinze quadrados com imagens;
2. a ladear estes quadros encontram-se dispostos em coluna e na linha inferior, números compreendidos entre 1 e 25, no caso da máquina1, e entre 1 e 20, no caso da máquina 2, sendo que estes representam as várias linhas de apostas que o jogador poderá efectuar em cada jogada; os rolos são todos iguais, possuindo cada um 10 símbolos (imagens) os quais se encontram identificados na “Tabela de Prémios”;
3. no cenário de jogo estão apenas visíveis 3 símbolos de cada rolo (perfazendo um total de 15), os quais, no desenvolvimento do jogo, produzirão combinações aleatórias que poderão, ou não, coincidir com as combinações existentes na “Tabela de Prémios”;
4. as “linhas” de aposta são linhas virtuais que atravessam a janela de jogo lado a lado: estas podem ser simples rectas, ou quebradas em várias configurações; só os símbolos que ficarem sob a mesma linha é que configuram uma combinação de jogo, sendo que todos os outros são ignorados;
5. após decisão do número de créditos que se pretendem apostar numa jogada, o jogador pode accionar a tecla que inicia a jogada, dando origem a que as 5 colunas que se encontram ao centro do écran comecem a deslizar do sentido superior para o inferior, simulando o funcionamento de uma máquina de rolos dos casinos, até ao ponto em que automaticamente se imobilizam, ficando em cada um dos quadrados um símbolo;
6. normalmente e relativamente às apostas, o jogador poderá apostar, em cada “linha”, um mínimo de um crédito e um máximo de dez créditos;
7. se apostar o máximo em todas as linhas, a aposta máxima é de duzentos e cinquenta créditos; se a combinação aleatória desses símbolos constar da relação das combinações consideradas premiadas, o jogador ganha, perdendo em caso contrário;
8. no caso de o jogador ter uma combinação premiada, os pontos/créditos ganhos, são de imediato incrementados na janela com a inscrição “Prémio”; o jogador pode optar por receber os pontos/créditos, dado por finalizada a sua intenção de continuar a jogar, para tal, basta chamar o responsável;
ii. Joly Card, o qual se inicia com o jogador a decidir o número de apostas com que pretende efectuar cada jogada (Bet), surgindo, então, de imediato, em simultâneo, de forma aleatória e dispostas em linha, na base do écran, cinco cartas;
1. cada uma destas cartas, pertence a um baralho, podendo portanto, aparecer qualquer uma das 52 cartas e ainda a figura de um Joker que substitui qualquer carta numa sequência premiada;
2. o jogador poderá optar por “fixar” as cartas que entender, na expectativa de que, as que não fixou, sejam substituídas por outras que, conjuntamente com as já fixadas, venham a constituir uma das sequências premiadas admitidas pela máquina e visualizadas no próprio écran no decorrer de todo o jogo;
3. a fixação das cartas é feita tocando a carta escolhida, aparecendo de imediato a informação de que a carta está fixa (através do aparecimento das palavras (Halt);
4. se o jogador mudar de ideias e não quiser fixar a carta, toca-a novamente, sendo de evidenciar que, quando surge, logo à partida, uma combinação susceptível de dar prémio, é a própria máquina que fixa tais combinações;
5. então, duas situações podem acontecer: a combinação que saiu não é premiada, e neste caso o jogo termina; a combinação que saiu é premiada, e o jogador poderá optar por somar (“creditar”) os créditos ganhos na jogada, aos que já tem, ou por tentar dobrar esses mesmos créditos, para tal, este terá de escolher entre uma carta alta (HOCH), ou, uma carta baixa (TIEF);
6. caso decida recolher os pontos obtidos, a jogada acaba, podendo iniciar outra imediatamente;
7. caso decida arriscar a dobra e sair uma carta do valor em que apostou, o jogador duplica os créditos apostados, caso contrário, perderá tudo e a jogada termina; o objectivo dos jogos, tal como no VIDEO-POKER, é o de conseguir combinações premiadas tais como: SEQUÊNCIA REAL (ás, rei, dama, valete e 10 do mesmo naipe), SEQUÊNCIA NUMÉRICA, SEQUÊNCIA DE COR, FULLEN, TRIOS, PARES, entre outras;
8. o lançamento das cartas, tal como a substituição das não “fixadas”, como ainda o sorteio da carta para a dobra, são processos totalmente aleatórios executados pela aplicação de jogo;
9. o sistema de funcionamento é igual ao das vulgares “SLOT MACHINES” dos casinos e consiste em tentar-se, mediante o arriscar de dinheiro, convertido em créditos, obter aleatoriamente combinações com direito a prémio, resultado esse que depende em tudo da sorte, independentemente da perícia do jogador, uma vez que o jogador não tem qualquer tipo de influência no resultado final do jogo analisado;
8.º A máquina identificada no relatório de folhas 64 e 65 tinha as seguintes características e modo de funcionamento:
i. trata-se de uma máquina com a designação “COLORAMA”, sem qualquer referência exterior quanto à origem, fabricante, número de fabrico ou série, inserida um móvel tipo portátil, de cor azul e outras e estrutura em madeira, tendo na parte frontal um painel em vidro acrílico;
ii. na parte superior do vidro acrílico é possível visualizar a designação da máquina e na parte lateral direita existe um mecanismo de introdução de moedas;
iii. ao centro do aludido painel situa-se um mostrador circular dividido em oito pontos, os quais são identificados pelos seguintes números: 1, 50, 2, 100, 5, 20, 200 e 100;
iv. o mostrador circular, é constituído por vários led´s (pequenas lâmpadas) equidistantes, que após a introdução de 50 cêntimos (mínimo para se poder dar inicio à jogada), se iluminam sequencialmente, executando, no mesmo sentido, um movimento giratório;
v. tal como descrição feita anteriormente, o mostrador circular apresenta oito led´s identificados, e os restantes não têm qualquer identificação;
vi. ao centro do mostrador circular existe uma janela digital através da qual são visualizados os pontos provenientes de eventuais jogadas premiadas e, no lado direito, encontra-se uma nova janela digital, que nos informa dos créditos existentes, provenientes de introdução de moedas;
vii. cada € 0,50 (cinquenta cêntimos) proporcionam 50 créditos;
viii. quando, no final do movimento giratório, um dos led´s identificados ficar iluminado, todo o mostrador se ilumina, dando indicação ao jogador que tem uma jogada premiada;
ix. na parte lateral esquerda da máquina, encontram-se dois pontos metálicos que permitem fazer o reset aos pontos provenientes de eventuais jogadas premiadas;
x. na parte frontal da máquina, encontra-se um botão encarnado, que permite ao jogador utilizar os pontos acumulados;
xi. por um ponto ganho, o jogador terá direito a mais duas jogadas, ou seja em cada jogada aposta-se € 0,50 (cinquenta cêntimos);
xii. após a introdução de uma moeda, automaticamente os led´s de que é constituído o mostrador, se iluminam sequencialmente, executando, no mesmo sentido, um movimento giratório;
xiii. esse movimento termina, no momento em que apenas um dos led´s fica iluminado;
xiv. nesta altura duas situações podem acontecer: o led iluminado corresponde a um dos oito identificados pelos números já referidos e, neste caso, o jogador terá direito aos pontos correspondentes, que oscilam entre 1 e 200, estes são creditados e visualizados através de uma das janelas; o led iluminado, não se encontra identificado por qualquer número, pelo que o jogador não terá direito a qualquer prémio, restando-lhe a hipótese de tentar novamente a sua sorte, introduzindo nova moeda;
xv. em regra, os pontos são posteriormente convertidos em dinheiro, à razão de € 1,00 (um euro) por cada ponto;
xvi. trata-se de um jogo em que o objectivo é o de conseguir que no final de cada jogada, o led iluminado, corresponda a um dos que se encontram identificados, dando por isso direito a prémio, sendo que o resultado depende em tudo da sorte, independentemente da perícia e destreza do jogador, dado que a única intervenção deste se resume à introdução de uma moeda no respectivo mecanismo da máquina;
9.º Os arguidos sabiam qual era o modo de funcionamento e características dessas máquinas e seus jogos;
10.º Sabiam os arguidos que não podiam colocar a máquina referida em 2.º, 3.º e 8.º supra, bem como os jogos descritos em 7.º, i. e ii., em funcionamento naquele estabelecimento comercial, para serem utilizados pelos frequentadores do mesmo, beneficiando dos proveitos da sua utilização;
11.º Mais sabiam os arguidos que a exploração daquele tipo de máquina aludida em 2.º, 3.º e 8.º supra e, bem assim, a prática dos jogos de fortuna ou azar nela existente e dos jogos referidos em 7.º, i. e ii., só era permitida nos casinos e em zonas autorizadas de jogo, tendo perfeito conhecimento que as máquinas em causa desenvolviam os referidos jogos;
12.º Os arguidos, contudo, levaram a cabo as suas condutas carecendo de autorização para o efeito;
13.º Agiram de comum acordo e em conjugação de esforços, de forma livre, voluntária e consciente, sabendo ainda que tais condutas eram proibidas e punidas por lei.

Apurou-se também que:
14.º Os arguidos têm dois filhos, com 20 e 26 anos de idade;
15.º O arguido é empregado fabril, auferindo a quantia de € 960,00 (novecentos e sessenta euros);
16.º A arguida encontra-se desempregada, auferindo o subsídio de desemprego no valor de € 345,00 (trezentos e quarenta e cinco euros);
17.º Vivem em casa própria;
18.º Têm um veículo automóvel, da marca Mercedes, modelo …, do ano de 2004;
19.º Trespassaram o café indicado em 1.º supra;
20.º Estudaram ambos até ao 4.º ano de escolaridade;
21.º A arguida despende mensalmente em medicação a quantia de € 85,00 (oitenta e cinco euros) e em fisioterapia o valor mensal de cerca de € 100,00 (cem euros);
22.º Na sequência do supra descrito, a arguida foi detida no dia 06 de Março de 2013, pelas 15horas e 30minutos e libertada nesse mesmo dia, por volta das 17horas;
23.º Os arguidos não têm antecedentes criminais.
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B – Factos não provados:
Com relevo para a decisão justa da causa resultaram como não provados:
a) Que nas circunstâncias descritas em 2.º, 4.º e 6.º supra a máquina aí referida estivesse acessível, disponível a qualquer cliente e em condições de desenvolver os jogos referidos em 7.º supra;
b) Que nas circunstâncias descritas em 2.º, 4.º e 6.º supra fosse possível praticar os jogos aludidos em 7.º supra;
c) Que os arguidos tivessem colocado em funcionamento a máquina aludida em 4.º supra no dito estabelecimento, quer em data anterior, quer nas circunstâncias referidas em 2.º, 4.º e 6.º supra, para que a mesma desenvolvesse os jogos de fortuna ou azar referidos em 7.º supra;
d) Que os arguidos, quanto à máquina referida em 4.º supra e no que concerne à utilização da mesma para aceder à internet, soubessem que não podiam colocá-la em funcionamento naquele estabelecimento comercial;
e) Que os arguidos, quanto à máquina aludida em 4.º supra e no que concerne à utilização da mesma para aceder à internet, soubessem que a sua exploração só era permitida nos casinos e em zonas autorizadas de jogo.
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C – Convicção do tribunal:
Como é sabido, vigora entre nós o princípio da livre apreciação da prova, conforme decorre do disposto no artigo 127.º, do Código de Processo Penal.
Tal consagração legal não significa que o julgador possa proceder arbitrária e caprichosamente à avaliação da prova, ou que a lei lhe ofereça a faculdade de julgar como lhe aprouver, sem provas ou mesmo contra as provas produzidas, antes pelo contrário, este princípio significa que o tribunal deve julgar segundo a consciência que formou.
E essa convicção é formada, não em obediência a regras preestabelecidas, a quadros, critérios ou ditames impostos por lei, mas sim através da influência que as provas produzidas exerceram no espírito do julgador, após as ter apreciado e avaliado, segundo critérios de valoração racional e lógica, e com apelo à sua experiência, sendo que, neste particular aspecto, não pode deixar de dar-se a devida relevância à percepção directa que a imediação e a oralidade conferem ao julgador[1].
Na verdade, o juízo acerca da verificação ou não de um determinado facto não assenta, como é lógico, num acto de fé, mas sim num procedimento baseado em juízos racionais, onde se procura reconstituir o facto histórico, usando a razão como instrumento.
Assim, a formação da convicção do tribunal depende essencialmente de duas operações: de um lado, a actividade cognitiva de filtragem de informações dadas e sua relevância ético-jurídica e, de outro lado, a ponderação de elementos racionalmente explicáveis – ou pelo menos de explicação menos linear – como a credibilidade que se concede a um certo meio de prova em detrimento de outro, já que não é a quantidade de prova produzida que releva, mas antes da qualidade de tal prova.
Isto posto, no caso dos autos, importa desde logo sublinhar que os arguidos optaram por não prestar declarações, aliás, no exercício de um direito legítimo ao silêncio, reconhecido pelo artigo 61.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Penal.
Daí que, para efeitos de formação da convicção do tribunal, mostraram-se essenciais os depoimentos das testemunhas E… e F… que, na qualidade de inspectores da A.S.A.E., levaram a cabo a inspecção de que foi objecto o estabelecimento comercial identificado nos autos e no decurso da qual foram apreendidas as duas máquinas em apreço.
Nessa medida, a testemunha E…, agente autuante, confrontado com o teor do auto de notícia que deu origem aos presentes autos, de forma isenta, espontânea, sincera, vivencial e completamente desinteressada, confirmou o teor do mesmo. Concretizou que se tratou de uma inspecção de rotina ao café ali identificado, no decurso da qual detectaram a existência de duas máquinas que foram apreendidas: a primeira, em cima do balcão, ligada à corrente eléctrica, de fácil acesso e pronta a ser utilizada e a segunda, numa outra divisão do café, à qual também tinham acesso os seus clientes, mas que se encontrava desligada da corrente eléctrica. Esta última tratava-se de um quiosque de internet, mas depois de a terem ligado, verificaram que a mesma, para além de permitir o acesso à internet, também possibilitava o acesso a jogos de fortuna e azar. Mais disse que no dito estabelecimento encontrava-se apenas a arguida que logo lhe transmitiu que era a responsável pela exploração do café, embora quem figurasse como proprietário do mesmo, para efeitos de alvará, era o arguido, marido daquela, conforme confirmou nos documentos que lhe foram exibidos e cuja cópia juntou ao expediente que deu origem aos presentes autos. Disse igualmente que as duas máquinas continham moedeiro, que foram abertos e nos quais existia dinheiro que também foi apreendido. Referiu ainda que ligou à corrente eléctrica o tal quiosque de internet, verificando então que o mesmo permitia o acesso à internet, mas também, através de uma combinação de toques e códigos, dava ainda acesso a um painel de jogos de fortuna ou azar, designadamente o Halloween e o Joly Card. Esclareceu que acedeu a esse painel por indicação da arguida que acompanhou a inspecção, sendo certo que, segundo se recorda, a arguida sabia de memória as palavras passe, pois caso contrário, se a mesma se tivesse socorrido de algum manuscrito, tê-lo-ia junto aos autos, o que não foi o caso.
Por seu turno, a testemunha F…, também de forma séria, espontânea e desinteressada, corroborou as declarações da testemunha anterior, dizendo assim que no estabelecimento que inspeccionaram, detectaram a existência de duas máquinas: uma sobre o balcão, a denominada roleta “Colorama”, pronta a ser utilizada e uma outra, numa sala contígua, um quiosque de internet que estava desligada da corrente eléctrica, mas com a colaboração da arguida e depois de a ligarem, testaram essa máquina e verificaram que a mesma permitia o acesso à internet, mas também, através de uma série de toques, a jogos de fortuna ou azar, mais concretamente ao Halloween e ao Joly Card. Disse também que, aquando da inspecção, apenas se encontrava presente a arguida e a sua filha, tendo sido aquela que se identificou como responsável pelo estabelecimento e inclusivamente facultado os códigos de acesso ao tal quiosque de internet, sendo certo que sem a sua colaboração não tinham logrado aceder àqueles dois jogos. Verificaram, no entanto, que o alvará do estabelecimento estava em nome do arguido. Segundo se recorda, o arguido teria uma outra actividade profissional, motivo pelo qual, aquando da inspecção, o mesmo não se encontrava presente, nem sequer foi chamado pela arguida.
A par desta prova testemunhal, foi ainda valorada a prova documental e pericial constante dos autos, mais concretamente o auto de notícia, de folhas 3 a 5, o auto de apreensão de folhas 6 e 7, a factura de folhas 11 (destaca-se que da mesma consta a identificação do aqui arguido), as fotografias de folhas 12 a 21, a cópia do alvará de autorização de utilização para serviços de restauração ou de bebidas, encontrando-se a mesma, no que concerne à entidade exploradora, em nome do aqui arguido, de folhas 22, a cópia da declaração de instalação, modificação e de encerramento dos estabelecimentos de restauração ou de bebidas, de folhas 23, estando igualmente identificada como titular da exploração o aqui arguido, o termo de entrega de folhas 26, e, sobretudo, o exame pericial às máquinas apreendidas nos autos, a folhas 57 a 65, do qual consta a descrição de cada uma delas, bem como do respectivo modo de funcionamento e desenvolvimento dos jogos aos quais as mesmas davam acesso.
De salientar, ainda, que, para além da autenticidade deste relatório pericial, da própria natureza do mesmo, não foram questionados os factos/circunstâncias que objectivamente estão nele vertidos/descritos, não foi invocada a sua falsidade e sequer reflexa ou indirectamente resultou que os arguidos ou qualquer outro sujeito/interveniente processual questionasse o valor probatório e teor das informações contidas no mesmo.
Tendo então por base este acervo probatório, e não obstante os arguidos não terem prestado declarações, concatenando os depoimentos sérios, isentos, credíveis e espontâneos das duas testemunhas supra identificadas com o teor da prova documental e pericial também supra elencada, recorrendo ainda às regras da experiência comum, do normal acontecer e da lógica, ficou o tribunal plenamente convencido que nas circunstâncias de tempo, modo e lugar descritas na acusação, ou seja, aquando da fiscalização levada a cabo pelos Sr.ºs Inspectores da A.S.A.E. no estabelecimento comercial identificado no respectivo auto de notícia que elaboraram, foi detectada a presença de duas máquinas, com as características e funcionamento que foram descritos pelos aludidos Sr.ºs Inspectores e posteriormente relatadas no exame pericial que lhes foi respectivamente realizado.
Tal realidade foi, como vimos, confirmada de forma inequívoca pelos Sr.ºs Inspectores da A.S.A.E., que procederam à sua apreensão, bem como do dinheiro que se encontrava no respectivo moedeiro, tendo aqueles ainda confirmado o concreto local onde as mesmas se encontravam e se estavam ou não em funcionamento. Aliás, os Sr.ºs Inspectores foram peremptórios em afirmar que apenas a máquina Colorama estava ligada à corrente eléctrica e, como tal, pronta a funcionar, ao passo que a outra máquina, vulgarmente denominada de quiosque de internet, estava desligada da corrente eléctrica, encontrando-se numa outra divisão do estabelecimento, ainda que à vista dos clientes que o frequentassem. Confirmaram, pois, que para aceder ao conteúdo da dita máquina tiveram que a ligar, asseverando que, além da mesma permitir a ligação à internet, permitia ainda, através de uma série de toques e palavra-passe, aceder a dois jogos denominados Halloween e Joly Card.
Por outro lado, estas duas testemunhas também confirmaram que, no momento da fiscalização, apenas se encontrava presente a aqui arguida (acompanhada da sua filha), embora toda a papelada atinente à sua exploração estivesse em nome do arguido.
Donde, apesar do silêncio dos arguidos quanto aos factos que lhe eram imputados, tendo sido os próprios a admitir, quando esclarecerem o tribunal acerca das respectivas condições económicas, familiares e profissionais, que são casados um com o outro, então, por recurso às regras da experiência comum, do normal acontecer e da lógica, não obstante o arguido até desempenhar uma outra profissão, de empregado fabril, situando-se o dito estabelecimento comercial precisamente na morada que aqueles igualmente utilizam como sua habitação (veja-se a morada constante do respectivo termo de identidade e residência e confirmada, em audiência aquando da respectiva identificação, por ambos os arguidos), sendo marido e mulher, estando toda a papelada relativa à sua exploração em nome do arguido, logicamente que é de concluir que a arguida geria o café durante o período de tempo em que o arguido estivesse a exercer aquele outro trabalho, mas quando regressava a casa, fosse o arguido ou ambos, em conjunto, a explorá-lo, designadamente atendendo os seus clientes, fazendo encomendas, etc.
Ademais, ditam também as regras da lógica e do normal acontecer que em casos como estes, de marido e mulher, apesar de até um deles ter uma outra profissão e normalmente o outro permanecer no café a atender os clientes, sendo que fora daquele horário, e uma vez que o café está aberto desde manhã até ao fim da noite e aos fins de semana, serem os dois a fazê-lo, sempre os lucros advenientes desse negócio são tidos como proventos comuns do casal, procedendo assim os dois à sua exploração conjunta.
Sublinhe-se ainda que, no caso presente, essa situação ainda é mais evidente, porquanto, apesar do arguido também ser empregado fabril, trabalhando numa fábrica, o alvará do café, quando à identificação da entidade exploradora, está em seu nome, pelo que é por demais manifesto que, como a arguida não tinha qualquer outra profissão, fosse esta a ficar encarregue de, pelo menos, durante o período em que o arguido estivesse a trabalhar, atender os clientes, etc., sendo que aquele também o fazia quando regressava desse outro emprego, sendo os proventos advenientes dessa exploração integrados no património comum do casal.
E sendo assim, como é, ficou então o tribunal totalmente convencido de que ambos os arguidos procediam à gestão e exploração do dito café.
Esclarecido, então, esse ponto e conjugando o teor dos indicados documentos e do relatório pericial com os depoimentos das aludidas testemunhas (por terem sido ambas as responsáveis pela operação de fiscalização, tendo, de modo coerente e sincero, relatado a forma como a mesma decorreu (circunstanciando-a no tempo e no espaço), o tribunal também não teve dúvida em dar como provado que apenas a máquina Colorama, nas circunstâncias de tempo retratadas no auto de notícia, é que se encontra pronta a funcionar, devidamente ligada à corrente eléctrica, sendo certo que tal já não se verificava quanto ao denominado quiosque de internet que, conforme foi asseverado por aquelas duas não estava ligado à energia eléctrica, encontrando-se inclusivamente numa outra divisão do café, ainda que visível para qualquer cliente. Ademais, tais testemunhas também confirmaram que tal quiosque permite o acesso à internet, mediante a introdução de dinheiro no moedeiro, sem prejuízo de também permitir o acesso aos dois aludidos jogos Halloween e Joly Card, acesso esse apenas possível através de uma série de toques/combinações e palavra-passe. De qualquer modo, foram peremptórios em afirmar que, quando fizeram a fiscalização, a dita máquina não se encontrava em pleno funcionamento, revelando ainda desconhecer se o dinheiro que a mesma tinha no seu moedeiro se ficou a dever à utilização da mesma apenas para aceder à internet e/ou aos ditos jogos. Ou seja, permitindo aquela máquina aceder quer à internet, quer aos jogos de Halloween e Joly Card e estando a mesma, naquele momento, desligada e por isso sem estar a funcionar, e na falta de qualquer outro meio probatório, não há como afirmar que o dinheiro encontrado no moedeiro – que embora comprove a sua prévia utilização – fosse apenas proveniente da utilização dos aludidos jogos ou, ao invés, do acesso à internet ou de ambas.
Daí que se tenha apenas como provada a factualidade constante dos pontos 1.º a 8.º supra com as correcções atinentes ao conteúdo do tal quiosque de internet e ao facto de o mesmo, naquelas circunstâncias, não se encontrar em funcionamento, considerando-se em contrapartida e porque não confirmada por qualquer meio probatório e, em última instância, por força do princípio do in dubio pro reo, como não provada a facticidade descrita em a) e e) supra.
Isto porque, “(…) a situação de incerteza quanto à materialidade dos factos, resolve-se, não mediante o apelo a uma presunção de culpa, ainda que tão só natural ou simples, mas ao princípio “in dubio pro reo”, articulado com o princípio da presunção de inocência, do arguido acolhido no texto constitucional, o que conduz, necessariamente, à absolvição do réu”[2].
De facto, o princípio in dubio pro reo é unanimemente reconhecido entre nós como princípio fundamental do direito processual penal, muito embora não se encontre expressamente contemplado em qualquer preceito da Constituição ou da legislação ordinária[3], decorrendo, portanto, implicitamente do preceituado no artigo 32.º, da Constituição da República Portuguesa, enquanto expressão do princípio político-jurídico da presunção de inocência.
Respeita à decisão da matéria de facto, constituindo uma regra legal de decisão em matéria de facto, segundo a qual o tribunal deve decidir a favor do arguido se não se encontrar convencido da verdade ou falsidade de um facto, ou seja, se permanecer em estado de dúvida sobre a sua realidade (non liquet).
Este princípio não constitui uma regra probatória em sentido próprio, uma regra relativa à produção ou valoração da prova, nomeadamente à dúvida sobre a credibilidade de um dado meio de prova individualmente considerado, antes se reporta às consequências da não realização de prova suficiente sobre a verdade ou falsidade de um facto, depois de concluído o processo de valoração da prova produzida.
O que significa que este princípio só deve ser aplicado quando os elementos probatórios, no seu conjunto, não foram suficientes para o julgador formar a sua convicção num sentido ou noutro, como refere o Acórdão da Relação de Coimbra de 24 de Março de 2004[4].
A propósito da relação do princípio da livre apreciação da prova com o princípio in dubio pro reo, escreve JORGE FIGUEIREDO DIAS que “a liberdade de apreciação da prova é, no fundo, uma liberdade de acordo com um dever – o dever de perseguir a chamada “verdade material” – de tal sorte que a apreciação há-de ser, em concreto, recondutível a critérios objectivos e, portanto, em geral susceptível de motivação e controlo”, acrescentando que “as dúvidas relevantes para a operância do princípio in dubio pro reo são só as dúvidas razoáveis, aquelas que por uma via racionalizável o tribunal não logre afastar e para as quais subsistam razões”[5].
“[E]xistindo um laivo de dúvida, por mínimo que seja, sobre a veracidade de um facto em que se alicerça uma imputação, ninguém pode ser condenado com base nesse facto. Logo, a punição só pode ter lugar quando o julgador, face às provas produzidas, adquire a convicção da certeza da imputação feita ao acusado”[6].
Por outro lado, já quanto ao elemento subjectivo, vertido nos factos retratados nos pontos 9.º a 13.º supra, foram os mesmos dados como provados por reporte ao elenco da factualidade descrita em 1.º a 8.º e da prova produzida a esse propósito, devidamente conjugada com as regras da experiência, do normal acontecer e da lógica, visto que é manifesto que, actuando da forma descrita, os arguidos fizeram-no de comum acordo, em conjugação de esforços e de forma livre, voluntária e conscientemente, com perfeito conhecimento do carácter proibido da conduta por cada um deles praticada.
Aliás, como doutamente se escreveu no Acórdão da Relação de Lisboa de 02 de Dezembro de 2004 “[c]abe aqui dizer que, como se afigura evidente, não é correcto pensar que o julgador está amarrado e tem de aceitar todas as versões de um dado acontecimento que lhe são apresentadas, nomeadamente a versão do recorrente quando alega que agiu na convicção de que era lícita a exploração da máquina em apreço porquanto ignorava que a mesma pudesse ser legalmente qualificada como desenvolvendo um jogo de fortuna ou azar, ou seja, que agiu sem dolo, visto ser tal versão absolutamente improvável à luz da lógica e da razoabilidade. (…) dizer em Tribunal que se desconhece o funcionamento de máquinas e jogos que se exploram em estabelecimentos comerciais, não é de aceitar, sendo certo que quem explora um negócio e tem uma porta aberta se inteira de tudo o que vende e explora no estabelecimento, pelo que também aqui é a experiência comum que opera, não se podendo falar sequer em negligência e em matéria tão sensível»”(Disponível em www.dgsi.pt.).
Ainda a este propósito, importa também não esquecer a lição de CAVALEIRO FERREIRA quando ensinava que “(…) existem elementos do crime que, no caso da falta de confissão, só são susceptíveis de prova indirecta como são todos os elementos de estrutura psicológica”(In Curso de Processo Penal, Volume II, 1981, página 292) o que é corroborado por MALATESTA que refere que “(…) exceptuando o caso da confissão, não é possível chegar-se à verificação do elemento intencional, senão por meio de provas indirectas: percebem-se coisas diversas da intenção propriamente dita, e dessas coisas se a concluir pela sua existência (...) afirma-se muitas vezes sem mais nada o elemento intencional mediante a simples prova do elemento material (...) o homem, ser racional, não obra sem dirigir as suas acções a um fim. Ora quando um meio só corresponde a um dado fim criminoso, o agente não pode tê-lo empregado senão para alcançar aquele fim” (In A Lógica das provas em matéria Criminal, páginas 172 e seguintes e, ainda, o Acórdão da Relação do Porto de 23 de Fevereiro de 2993, in B.M.J., n.º 324, página 620).
Já relativamente aos factos descritos nos pontos 14.º a 21.º supra, o tribunal socorreu-se das declarações dos arguidos que esclarecerem a respectiva situação económica, profissional e familiar, não tendo sido as mesmas infirmadas por qualquer outro meio de prova produzida em sede de audiência de julgamento, mostrando-se assim as mesmas suficientes para, nesta parte, convencerem o tribunal da sua veracidade, dando-as como provadas.
Quanto aos factos descritos em 22.º supra, o tribunal teve apenas em consideração o teor do auto de notícia de folhas 3 a 5 e do auto de notificação de folhas 10 que espelham as circunstâncias temporais em que a arguida foi detida e posteriormente restituída à liberdade.
No que concerne aos factos descritos no ponto 23.º supra, o tribunal estribou a sua convicção no teor dos certificados do registo criminal dos arguidos constantes de folhas 123 e 124.
Esta é, pois, a convicção do tribunal perante o manancial probatório apresentado em sede de audiência de julgamento.
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Enunciação das questões a decidir no recurso em apreciação.
O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelos recorrentes da respectiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente os vícios indicados no art. 410º nº 2 do Código de Processo Penal [Cfr. Prof. Germano Marques da Silva, “Curso de Processo Penal” III, 3ª ed., pág. 347 e jurisprudência uniforme do STJ [cfr. Ac. STJ de 28.04.99, CJ/STJ, ano de 1999, p. 196 e jurisprudência ali citada e Ac. STJ para fixação de jurisprudência nº 7/95, de 19/10/95, publicado no DR, série I-A de 28/12/95].
Assim, face às conclusões apresentadas pelos recorrentes, importa decidir as seguintes questões:
- Impugnação da decisão proferida sobre matéria de facto provada;
- Violação do princípio in dubio pro reo;
- Subsunção jurídica dos factos ao tipo de crime de exploração ilícita de jogo, previsto e punível pelo artigo 108º do Decreto Lei nº 422/89, de 2/12, na perspetiva de saber se é de fortuna e azar a máquina que desenvolve os jogos em causa;
- Dosimetria das penas (número de dias de multa aplicados e quantitativo diário da pena de multa).
Passemos à análise da questão atinente à impugnação da decisão proferida sobre matéria de facto provada.
É sabido que a matéria de facto pode ser sindicada por duas vias: no âmbito, mais restrito, dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º2, do Código de Processo Penal, no que se convencionou chamar de “revista alargada”; ou através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412.º, n.º3, 4 e 6, do mesmo diploma.
No primeiro caso, estamos perante a arguição dos vícios decisórios previstos nas diversas alíneas do n.º 2 do referido artigo 410.º, de conhecimento oficioso, cuja indagação, como resulta do preceito, tem que resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos, para a fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento (Cfr. Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 10. ª ed., 729, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, Verbo, 2ª ed., 339 e Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6.ª ed., 77 e ss.).
No segundo caso, da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412.º, n.º3, 4 e 6, do Código de Processo Penal, a apreciação não se restringe ao texto da decisão, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada) produzida em audiência, mas sempre dentro dos limites fornecidos pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus de especificação imposto pelos n.º 3 e 4 do art. 412.º do Código de Processo Penal, como sejam o de especificar os pontos de facto que considera incorrectamente julgados e o de especificar as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida, além da indicação das provas a renovar, se for caso disso.
Nos casos de impugnação ampla, o recurso da matéria de facto não visa a realização de um segundo julgamento sobre aquela matéria, agora com base na audição de gravações, antes constituindo um mero remédio para obviar a eventuais erros ou incorrecções da decisão recorrida na forma como apreciou a prova, na perspectiva dos concretos pontos de facto identificados pelo recorrente. O recurso que impugne (amplamente) a decisão sobre a matéria de facto não pressupõe, por conseguinte, a reapreciação total do acervo dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida, mas antes uma reapreciação autónoma sobre a razoabilidade da decisão do tribunal a quo quanto aos «concretos pontos de facto» que o recorrente especifique como incorrectamente julgados. Para esse efeito, deve o tribunal de recurso verificar se os pontos de facto questionados têm suporte na fundamentação da decisão recorrida, avaliando e comparando especificadamente os meios de prova indicados nessa decisão e os meios de prova indicados pelo recorrente e que este considera imporem decisão diversa (Sobre estas questões, v. os Acórdãos do S.T.J., de 14 de Março de 2007, Processo 07P21, e de 23 de Maio de 2007, Processo 07P1498, disponíveis em www.dgsi.pt.).
Temos, pois, que o recurso em matéria de facto não implica uma reapreciação, pelo tribunal de recurso, da globalidade dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida.
Duplo grau de jurisdição em matéria de facto não significa direito a novo (a segundo) julgamento no tribunal de recurso.
Mas se o recurso que incide sobre matéria de facto implica a reponderação, pelo Tribunal da Relação, de factos pontuais incorrectamente julgados, essa reponderação não é realizada se este tribunal se limitar a ratificar ou “homologar” o julgado (por exemplo, com a simples constatação, a partir do acolhimento da fundamentação, da correcção do factualmente decidido), em vez de fazer um verdadeiro exercício de julgamento, embora de amplitude menor.
Como faz notar o Supremo Tribunal de Justiça no seu acórdão de 30.11.2006 (www.dgsi.pt/jstj), “em sede de conhecimento do recurso da matéria de facto, impõe-se que a Relação se posicione como tribunal efectivamente interveniente no processo de formação da convicção, assumindo um reclamado «exercício crítico substitutivo», que implica a sobreposição, ou mesmo, se for caso disso, a substituição, com assento nas provas indicadas pelos recorrentes, da convicção adquirida em 1.ª instância pela do tribunal de recurso, sobre todos e cada um daqueles factos impugnados, individualmente considerados, em vez de se ficar por uma mera atitude de observação aparentemente externa ao julgamento” [No mesmo sentido, o acórdão do STJ de 15.10.2008 (www.dgsi.pt/jstj; Relator: Cons. Henriques Gaspar) em que se escreveu que “a reapreciação da matéria de facto, se não impõe uma avaliação global e muito menos um novo julgamento da causa, também se não poderá bastar com declarações e afirmações gerais quanto à razoabilidade do julgamento da decisão recorrida, requerendo sempre, nos limites traçados pelo objecto do recurso, a reponderação especificada (ou, melhor, uma nova ponderação), em juízo autónomo, da força e da compatibilidade probatória das provas que serviram de suporte à convicção em relação aos factos impugnados, para, por esse modo, confirmar ou divergir da decisão recorrida (cf. Ac. n.º 116/07 do TC, de 16-02-2007, DR, II série, de 23-04-2007, que julgou inconstitucional a norma do art. 428.º, n.º, 1 do CPP «quando interpretada no sentido de que, tendo o tribunal de 1.ª instância apreciado livremente a prova perante ele produzida, basta para julgar o recurso interposto da decisão de facto que o tribunal de 2.ª instância se limite a afirmar que os dados objectivos indicados na fundamentação da sentença objecto de recurso foram colhidos da prova produzida.]
É esse exercício que procuraremos fazer de seguida, mas não pode olvidar-se que uma das grandes limitações do tribunal de recurso quando é chamado a pronunciar-se sobre uma impugnação de decisão relativa a matéria de facto, sobretudo quando tem que se debruçar sobre a valoração, efectuada na primeira instância, da prova testemunhal, decorre da falta do contacto directo com essa prova, da ausência de oralidade e, particularmente, de imediação.
No nosso sistema processual, como acontece aliás com a grande maioria dos países europeus, vigora o princípio da livre apreciação da prova, por contraposição ao sistema da prova legal. Em conformidade com o referido princípio, o juiz tem total liberdade, de acordo com a sua íntima convicção, de proceder à valoração dos meios de prova obtidos.
Assim, regra geral (e ressalvadas as excepções previstas na lei), na apreciação da prova e partindo das regras de experiência, o tribunal é livre de formar a sua convicção. Normalmente o que sucede é que face à globalidade da prova produzida, o tribunal se apoie num certo conjunto de provas, em detrimento de outras, nada obstando a que esse convencimento parta de um registo mínimo, mas credível, de prova, em detrimento de vastas referências probatórias, que, contudo, não têm qualquer suporte de credibilidade.
Também não se pode esquecer que o julgador pode recorrer a presunções naturais ou hominis no processo de formação da sua convicção, uma vez que se trata de um meio de prova admitido na lei (cf. art. 125º do Código de Processo Penal), sendo que de acordo com o disposto no art. 349º Código Civil, presunções são as ilações que a lei ou julgador extrai de um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido. Consistem, pois, em raciocínios lógico-dedutivos, ou demonstrativos, que o julgador elabora, a partir da prova indiciária, para alcançar a verificação dos “factos juridicamente relevantes”.
As presunções naturais são, afinal, o produto das regras de experiência; o juiz, valendo-se de um certo facto e das regras da experiência, conclui que esse facto denuncia a existência de outro facto. «Ao procurar formar a sua convicção acerca dos factos relevantes para a decisão, pode o juiz utilizar a experiência da vida, da qual resulta que um facto é a consequência típica de outro; procede então mediante uma presunção ou regra da experiência [ou de uma prova de primeira aparência». (cfr. v. g., Vaz Serra, "Direito Probatório Material", BMJ, n° 112 pág, 190).” cfr. Ac. STJ 07-01-2004, proc. 03P3213.
Para avaliar da racionalidade e da não arbitrariedade da convicção sobre os factos, há que apreciar, de um lado, a fundamentação da decisão quanto à matéria de facto (os fundamentos da convicção), e de outro, a natureza das provas produzidas e dos meios, modos ou processos intelectuais, utilizados e inferidos das regras da experiência comum para a obtenção de determinada conclusão.
O duplo grau de jurisdição na apreciação da decisão da matéria de facto não tem, portanto, a virtualidade de abalar o princípio da livre apreciação da prova que está conferido ao julgador de primeira instância.
É que se afigura indubitável que há casos em que, face à prova produzida, as regras da experiência permitem ou não colidem com mais do que uma solução. Se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis segundo as regras da experiência, ela será inatacável, já que foi proferida em obediência à lei que impõe que ele julgue de acordo com a sua livre convicção.
Note-se, aliás, que o legislador, consciente das limitações que o recurso da matéria de facto necessariamente tem envolver, teve o cuidado de dizer que as provas a atender pelo Tribunal ad quem são aquelas que “impõem”e não as que “permitiriam” decisão diversa (cfr. artigo 412º, nº 3, al. b) do Código de Processo Penal).
O nosso poder de cognição está confinado aos pontos de facto que o recorrente considere incorrectamente julgados, com as especificações estatuídas no art. 412º n.º 3 e 4 do Código Processo Penal.
E diga-se que os recorrentes cumpriram minimamente o ónus de especificação imposto pelos n.º 3 e 4 do art. 412.º do Código de Processo Penal.
Atentemos no que se fez constar na Motivação da Matéria de Facto da sentença recorrida. E atentemos também nos argumentos invocados pelos recorrentes, que consideram que foi incorrectamente julgado o facto constante do ponto 1 dos “Factos Provados”, entendendo que deve ser dado como não provado que “o arguido explorava de facto e efetivamente o estabelecimento em causa e que o mesmo explorava os equipamentos em causa nos autos”.
Argumentam os recorrentes que “resulta claro que, o arguido tem outra profissão, não se encontrava no local da apreensão, apenas a arguida C… se intitulou como exploradora do estabelecimento e responsável pelo mesmo.
Nesse mesmo sentido foram os depoimentos dos inspectores da ASAE, de forma clara quando referem que: “D. C… identificou-se como responsável e esposa do Sr. B… que é o titular da exploração, disse que era ela que estava ali diariamente a gerir aquilo” – Inspetor E…
Já o Inspetor F… refere no seu depoimento que: “ela era a responsável, porque o Sr. B… tinha outra atividade ele não se encontrava lá, penso que ele tinha outra atividade.”
Por outro lado, é também relevante o facto de a arguida C… não ter chamado o marido pois seria lógico sendo o mesmo o explorador que esta o chamasse, perante a inspecção?!..
Na verdade, o mesmo não foi chamado porque os documentos do estabelecimento estão em seu nome apenas formalmente. Ficou patente que o arguido era explorador apenas a título formal e não de facto”.
O Tribunal da Relação procedeu à análise da totalidade da prova produzida, nomeadamente da prova testemunhal, documental e pericial, sendo que os segmentos dos depoimentos transcritos na motivação do recurso traduzem apenas parte do que foi dito pelas testemunhas E… e F…, ouvidas na audiência de julgamento.
E diga-se, desde já, que tais transcrições não são susceptíveis de alterar a matéria de facto provada, conforme pretendem os recorrentes.
Sucede que a argumentação avançada pelos recorrentes mais não traduz do que a sua discordância relativamente à avaliação que o tribunal a quo fez da prova produzida, valoração esta porém devidamente fundamentada, e olvidando que a convicção do tribunal é a do julgador e não a das partes.
Sabemos que as provas não podem ser apreciadas uma a uma, isoladamente, de forma segmentada, devendo ser analisadas e valoradas concatenadamente, conjugando-as e estabelecendo correlações internas entre elas, confrontando-as de forma a que, ainda que de sinal contrário, daí resulte uma decisão linear, fazendo inferências ou deduções de factos conhecidos desde que tal se justifique e tendo sempre presentes as regras da lógica e as máximas da experiência.
Efectivamente, impõe-se que o tribunal proceda a uma análise conjugada dos meios de prova, tendo presentes as regras da experiência comum e da normalidade. Além disso, ao tribunal é permitido socorrer-se de presunções naturais para a formação da convicção sobre a factualidade provada.
Assim, o julgador pode justificar a verificação de um facto, mesmo que não directa e imediatamente percepcionado pela prova testemunhal ou directamente evidenciado por outros meios de prova, desde que a convicção se apoie em raciocínio lógico, objectivo e motivado, sem atropelo daquelas normas da vivência comum e resulte perfeitamente explicado na decisão.
No caso sub judice a motivação de facto revela uma avaliação objectiva, racional e ajuizada do conjunto da prova produzida. Mostra-se estruturada a partir da análise dos depoimentos das testemunhas ouvidas, conjugados entre si e valorados concatenadamente com a restante prova produzida (documental e pericial).
Por conseguinte, o tribunal ponderou todas as provas, segundo critérios de objectividade e à luz das regras da experiência comum e da normalidade, no pleno uso do princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artigo 127.º do Código Processo Penal.
Ora, tendo em conta o alegado pelos recorrentes na motivação e conclusões do recurso, no que respeita à impugnação da decisão proferida sobre matéria de facto provada, constata-se, desde logo, que os mesmos ignoram, em absoluto, a explicitação do raciocínio lógico do tribunal a quo contida na motivação da sentença recorrida, sendo que a alegação dos recorrentes traduz a sua pessoal e subjectiva valoração da prova produzida.
Na verdade, os recorrentes desconsideraram que na sentença recorrida se refere que:
“Daí que, para efeitos de formação da convicção do tribunal, mostraram-se essenciais os depoimentos das testemunhas E… e F… que, na qualidade de inspectores da A.S.A.E., levaram a cabo a inspecção de que foi objecto o estabelecimento comercial identificado nos autos e no decurso da qual foram apreendidas as duas máquinas em apreço.
Nessa medida, a testemunha E…, agente autuante, confrontado com o teor do auto de notícia que deu origem aos presentes autos, de forma isenta, espontânea, sincera, vivencial e completamente desinteressada, confirmou o teor do mesmo. Concretizou que se tratou de uma inspecção de rotina ao café ali identificado, no decurso da qual detectaram a existência de duas máquinas que foram apreendidas: a primeira, em cima do balcão, ligada à corrente eléctrica, de fácil acesso e pronta a ser utilizada e a segunda, numa outra divisão do café, à qual também tinham acesso os seus clientes, mas que se encontrava desligada da corrente eléctrica. Esta última tratava-se de um quiosque de internet, mas depois de a terem ligado, verificaram que a mesma, para além de permitir o acesso à internet, também possibilitava o acesso a jogos de fortuna e azar. Mais disse que no dito estabelecimento encontrava-se apenas a arguida que logo lhe transmitiu que era a responsável pela exploração do café, embora quem figurasse como proprietário do mesmo, para efeitos de alvará, era o arguido, marido daquela, conforme confirmou nos documentos que lhe foram exibidos e cuja cópia juntou ao expediente que deu origem aos presentes autos. Disse igualmente que as duas máquinas continham moedeiro, que foram abertos e nos quais existia dinheiro que também foi apreendido. Referiu ainda que ligou à corrente eléctrica o tal quiosque de Internet, verificando então que o mesmo permitia o acesso à internet, mas também, através de uma combinação de toques e códigos, dava ainda acesso a um painel de jogos de fortuna ou azar, designadamente o Halloween e o Joly Cardo Esclareceu que acedeu a esse painel por indicação da arguida que acompanhou a inspecção, sendo certo que, segundo se recorda, a arguida sabia de memória as palavras passe, pois caso contrário, se a mesma se tivesse socorrido de algum manuscrito, tê-lo­-ia junto aos autos, o que não foi o caso.
Por seu turno, a testemunha F…, também de forma séria, espontânea e desinteressada, corroborou as declarações da testemunha anterior, dizendo assim que no estabelecimento que inspeccionaram, detectaram a existência de duas máquinas: uma sobre o balcão, a denominada roleta "Colorama", pronta a ser utilizada e uma outra, numa sala contígua, um quiosque de internet que estava desligada da corrente eléctrica, mas com a colaboração da arguida e depois de a ligarem, testaram essa máquina e verificaram que a mesma permitia o acesso à internet, mas também, através de uma série de toques, a jogos de fortuna ou azar, mais concretamente ao Halloween e ao Joly Cardo Disse também que, aquando da inspecção, apenas se encontrava presente a arguida e a sua filha, tendo sido aquela que se identificou como responsável pelo estabelecimento e inclusivamente facultado os códigos de acesso ao tal quiosque de internet, sendo certo que sem a sua colaboração não tinham logrado aceder àqueles dois jogos. Verificaram, no entanto, que o alvará do estabelecimento estava em nome do arguido. Segundo se recorda, o arguido teria uma outra actividade profissional, motivo pelo qual, aquando da inspecção, o mesmo não se encontrava presente, nem sequer foi chamado pela arguida.
A par desta prova testemunhal, foi ainda valorada a prova documental e pericial constante dos autos, mais concretamente o auto de notícia, de folhas 3 a 5, o auto de apreensão de folhas 6 e 7, a factura de folhas 11 (destaca-se que da mesma consta a identificação do aqui arguido), as fotografias de folhas 12 a 21, a cópia do alvará de autorização de utilização para serviços de restauração ou de bebidas, encontrando-se a mesma, no que concerne à entidade exploradora, em nome do aqui arguido, de folhas 22, a cópia da declaração de instalação, modificação e de encerramento dos estabelecimentos de restauração ou de bebidas, de folhas 23, estando igualmente identificada como titular da exploração o aqui arguido, o termo de entrega de folhas 26, e, sobretudo, o exame pericial às máquinas apreendidas nos autos, a folhas 57 a 65, do qual consta a descrição de cada uma delas, bem como do respectivo modo de funcionamento e desenvolvimento dos jogos aos quais as mesmas davam acesso.
(…)
Por outro lado, estas duas testemunhas também confirmaram que, no momento da fiscalização, apenas se encontrava presente a aqui arguida (acompanhada da sua filha), embora toda a papelada atinente à sua exploração estivesse em nome do arguido.
Donde, apesar do silêncio dos arguidos quanto aos factos que lhe eram imputados, tendo sido os próprios a admitir, quando esclarecerem o tribunal acerca das respectivas condições económicas, familiares e profissionais, que são casados um com o outro, então, por recurso às regras da experiência comum, do normal acontecer e da lógica, não obstante o arguido até desempenhar uma outra profissão, de empregado fabril, situando-se o dito estabelecimento comercial precisamente na morada que aqueles igualmente utilizam como sua habitação (veja-se a morada constante do respectivo termo de identidade e residência e confirmada, em audiência aquando da respectiva identificação, por ambos os arguidos), sendo marido e mulher, estando toda a papelada relativa à sua exploração em nome do arguido, logicamente que é de concluir que a arguida geria o café durante o período de tempo em que o arguido estivesse a exercer aquele outro trabalho, mas quando regressava a casa, fosse o arguido ou ambos, em conjunto, a explorá-lo, designadamente atendendo os seus clientes, fazendo encomendas, etc.
Ademais, ditam também as regras da lógica e do normal acontecer que em casos como estes, de marido e mulher, apesar de até um deles ter uma outra profissão e normalmente o outro permanecer no café a atender os clientes, sendo que fora daquele horário, e uma vez que o café está aberto desde manhã até ao fim da noite e aos fins de semana, serem os dois a fazê-lo, sempre os lucros advenientes desse negócio são tidos como proventos comuns do casal, procedendo assim os dois à sua exploração conjunta.
Sublinhe-se ainda que, no caso presente, essa situação ainda é mais evidente, porquanto, apesar do arguido também ser empregado fabril, trabalhando numa fábrica, o alvará do café, quando à identificação da entidade exploradora, está em seu nome, pelo que é por demais manifesto que, como a arguida não tinha qualquer outra profissão, fosse esta a ficar encarregue de, pelo menos, durante o período em que o arguido estivesse a trabalhar, atender os clientes, etc., sendo que aquele também o fazia quando regressava desse outro emprego, sendo os proventos advenientes dessa exploração integrados no património comum do casal.
E sendo assim, como é, ficou então o tribunal totalmente convencido de que ambos os arguidos procediam à gestão e exploração do dito café”.

Quer dizer, a argumentação avançada pelos recorrentes foi já escalpelizada e considerada pelo tribunal a quo na sentença recorrida. E bem, dizemos nós.
Com efeito, dizem-nos as regras da experiência, da normalidade das coisas e da lógica que, sendo os arguidos casados entre si, funcionando o estabelecimento comercial (café) em causa, local onde as máquinas foram encontradas, na mesma morada da utilizada como habitação dos arguidos, conjugando com o facto de toda a documentação relativa à exploração de tal estabelecimento estar em nome do arguido, é de concluir que, como concluiu o tribunal a quo “a arguida geria o café durante o período de tempo em que o arguido estivesse a exercer aquele outro trabalho, mas quando regressava a casa, fosse o arguido ou ambos, em conjunto, a explorá-lo, designadamente atendendo os seus clientes, fazendo encomendas, etc.”; “…que em casos como estes, de marido e mulher, apesar de até um deles ter uma outra profissão e normalmente o outro permanecer no café a atender os clientes, sendo que fora daquele horário, e uma vez que o café está aberto desde manhã até ao fim da noite e aos fins de semana, serem os dois a fazê-lo, sempre os lucros advenientes desse negócio são tidos como proventos comuns do casal, procedendo assim os dois à sua exploração conjunta”.
E apesar de o arguido ser empregado fabril, trabalhando numa fábrica, o certo é que o alvará do café, quando à identificação da entidade exploradora, está em seu nome, pelo que, neste contexto, é normal que fosse a arguida, que não tinha qualquer outra profissão, a ficar no café, pelo menos, durante o período em que o arguido estivesse a trabalhar, sendo que este também o fazia quando regressava desse outro emprego, sendo os proventos advenientes dessa exploração integrados no património comum do casal.
Assim, ficou também este tribunal convencido de que ambos os arguidos procediam à gestão e exploração do dito café.
Ademais, não podemos olvidar a matéria de facto constante do ponto 5º dos “Factos Provados”, nomeadamente que, “em data não concretamente apurada, mas anterior a 06 de Março de 2013, os arguidos adquiriram as aludidas máquinas descritas a indivíduo cuja identidade não foi possível apurar e, desde então e sem prejuízo do descrito em 4.º supra, colocaram-nas em funcionamento no estabelecimento comercial indicado, com vista à obtenção de lucro, proporcionando aos eventuais interessados a respectiva utilização, como sucedeu anteriormente à data dos factos”.
Ora, conjugando os meios de prova referidos na sentença recorrida com as regras da experiência comum, tendo em conta o que já se disse sobre os depoimentos das testemunhas ouvidas em tribunal e respectiva credibilidade, entendeu, e bem, o tribunal a quo dar como provada a factualidade referida, actuando de acordo com a sua livre convicção, nos termos do artigo 127º do Código de Processo Penal e em absoluto respeito dos dispositivos legais aplicáveis.
No caso em análise, o Tribunal a quo cindiu os depoimentos, valorando-os positivamente, no âmbito da imediação e da oralidade e, conjugando-os com os documentos e exame pericial constantes dos autos, nos termos que constam da fundamentação da matéria de facto. A convicção do Tribunal recorrido expressa na sentença, adquirida na base da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, não é irracional, nem viola as regras da experiência comum, como atrás se deixou já consignado, escapando a qualquer censura.
Pelo que, decorre de todo o exposto, que não demonstram os recorrentes que a decisão tenha incorrido em ilógico ou arbitrário juízo na valoração da prova, ou se tenha afastado das regras da normalidade do acontecer ou da experiência comum, não existindo razões para afastar o raciocínio lógico do tribunal a quo, tampouco os recorrentes indicaram prova que imponha decisão diversa da tomada na sentença recorrida.
Assim, analisada e avaliada em conjunto toda a prova produzida, na ponderação lógica e racional de todos os elementos probatórios, face às regras da experiência comum, não pode senão concluir-se que a argumentação e prova indicadas pelos recorrentes não impõem decisão diversa, nos termos da al. b) do nº 3 do artigo 412º do Código de Processo Penal, apenas sendo exemplificativas de outra interpretação da prova, não havendo, pois, qualquer razão para alterar a matéria de facto provada decidida pelo Tribunal a quo.
Aqui chegados, e definitivamente fixada a matéria de facto provada nos termos decididos, é por demais evidente a falta de razão dos recorrentes, no que se refere à invocação do princípio in dubio pro reo, ínsito no artigo 32º da Constituição da República Portuguesa.
Vejamos porquê.
O princípio da presunção de inocência é um princípio fundamental num Estado de Direito democrático, cuja função é, sobretudo (mas não só), a de reger a valoração da prova pela autoridade judiciária, ou seja, o processo de formação da convicção com base nos meios de prova. Nas palavras de Gomes Canotilho e Vital Moreira (“Constituição da República Portuguesa Anotada”, 4.ª edição revista, 519), “o princípio da presunção de inocência surge articulado com o tradicional princípio in dubio pro reo. Além de ser uma garantia subjectiva, o princípio é também uma imposição dirigida ao juiz no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao réu, quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa”.
Ensina o Prof. Figueiredo Dias, sobre o princípio in dubio pro reo: «À luz do princípio da investigação bem se compreende, efectivamente, que todos os factos relevantes para a decisão (quer respeitem ao facto criminoso, quer à pena) que, apesar de toda a prova recolhida, não possam ser subtraídos à “dúvida razoável” do tribunal, também não possam considerar-se como provados. E se, por outro lado, aquele mesmo princípio obriga em último termo o tribunal a reunir as provas necessárias à decisão, logo se compreende que a falta delas não possa, de modo algum, desfavorecer a posição do arguido: um non liquet na questão da prova — não permitindo nunca ao juiz, como se sabe, que omita a decisão (...) — tem de ser sempre valorado a favor do arguido. É com este sentido e conteúdo que se afirma o princípio in dúbio pro reo» (Direito Processual Penal, reimpressão, 1984 p. 213).
Como se tem dito repetidas vezes, a violação do princípio in dubio pro reo ocorre quando, após a produção e a apreciação dos meios de prova relevantes, o julgador se defronte com a existência de uma dúvida razoável sobre a verificação dos factos e, perante ela, decide “contra” o arguido. Não se trata, pois, de uma dúvida hipotética, abstracta ou de uma mera hipótese sugerida pela apreciação da prova feita pelo recorrente, mas de uma dúvida assumida pelo próprio julgador.
Temos, pois, que a dúvida que fundamenta o apelo ao princípio in dubio pro reo não é qualquer dúvida, devendo ser insanável, razoável e objectivável.
Em primeiro lugar, deverá ser insanável, pressupondo, por conseguinte, que houve todo o empenho no esclarecimento dos factos, sem que tenha sido possível ultrapassar o estado de incerteza.
Deverá ser razoável, ou seja, impõe-se que se trate de uma dúvida racional e argumentada.
Finalmente, deverá ser objectivável, ou seja, é necessário que possa ser justificada perante terceiros, o que exclui dúvidas arbitrárias ou fundadas em meras conjecturas e suposições.
Não se trata aqui de “dúvidas” que o recorrente entende que o tribunal recorrido não teve e devia ter tido, pois o “in dubio” não se aplica quando o tribunal não tem dúvidas. Ou seja, o princípio “in dubio pro reo” não serve para controlar as dúvidas do recorrente sobre a matéria de facto, mas antes o procedimento do tribunal quando teve dúvidas sobre a matéria de facto.
Haverá violação do princípio in dubio pro reo se for manifesto que o julgador, perante essa dúvida relevante, decidiu contra o arguido, acolhendo a versão que o desfavorece [Ac. STJ de 27.5.2010 e de 15-07-2008; e Ac. RP de 22.6.2011, 17.11.2010, 2.12.2009, 9.9.2009 e de 11.1.2006, todos disponíveis em www.dgsi.pt].
Inexistindo dúvida razoável na formulação do juízo factual que conduziu à decisão condenatória, e resultando esse juízo do exame e discussão livre das provas produzidas e examinadas em audiência, como impõe o artigo 355.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, subordinadas ao princípio do contraditório (art.º 32.º, n.º 1, da Constituição da República), fica afastado o princípio do in dubio pro reo e da presunção de inocência (acórdão do STJ de 27.05.2010, in www.dgsi.pt/jstj).
Por último, tal como acontece com os vícios da sentença a que alude o n.º 2 do art.º 410.º do Código de Processo Penal, a eventual violação do princípio em causa deve resultar, claramente, do texto da decisão recorrida, ou seja, quando se puder constatar que o tribunal decidiu contra o arguido apesar de tal decisão não ter suporte probatório bastante, o que há-de decorrer, inequivocamente, da motivação da convicção do tribunal explanada naquele texto (Neste sentido, o acórdão do STJ de 29.05.2008 (Relator: Cons. Rodrigues da Costa), www.dgsi.pt/jstj).
E, como já anteriormente tivemos oportunidade de esclarecer, a prova foi apreciada segundo as regras do artigo 127º do Código de Processo Penal, com respeito pelos limites ali impostos à livre convicção, não só de motivação objectiva segundo as regras da vida e da experiência, e sem que se vislumbre que na apreciação da prova o tribunal tenha incorrido em qualquer erro lógico, grosseiro ou ostensivo.
Atentas as considerações expostas, cumpre reverter para o caso sub judice.
Parece-nos claro, em face do que o tribunal deixou extravasado na sentença, que logrou convencer-se e convencer-nos da verdade dos factos, que deu como provados “para além de toda a dúvida razoável”.
A decisão em apreço baseia-se num juízo de certeza (independentemente do sentido da mesma), não em qualquer juízo dubitativo. É o que dela resulta com clareza.
Ou seja, em momento algum a decisão impugnada revela que o tribunal recorrido tenha experimentado uma hesitação ou indecisão em relação a qualquer facto e respectiva autoria. Ao invés, o tribunal recorrido afirma convictamente a matéria dada como provada. E do conhecimento que sobre tal decisão tomámos, igualmente concluímos que a mesma é linear e objectiva, cumpre os pressupostos decorrentes do princípio da livre apreciação da prova [artigo 127.º, do Código de Processo Penal] e não acolhe espaço para dúvidas ou incertezas relevantes.
Resta apenas dizer que o tribunal recorrido apenas apelou ao princípio do in dubio pro reo quando abordou a factualidade considerada como não provada, supra descrita em a) e e). E fê-lo nos seguintes termos:
“Daí que se tenha apenas como provada a factualidade constante dos pontos 1.º a 8.º supra com as correcções atinentes ao conteúdo do tal quiosque de internet e ao facto de o mesmo, naquelas circunstâncias, não se encontrar em funcionamento, considerando-se em contrapartida e porque não confirmada por qualquer meio probatório e, em última instância, por força do princípio do in dubio pro reo, como não provada a facticidade descrita em a) e e) supra”.
Pelo que, face a todo o exposto, nada há, pois, a censurar no processo lógico e racional que subjaz à formação da convicção do tribunal, sendo patente a inexistência de quaisquer motivos para se falar em violação do princípio in dubio pro reo.
Improcede, pois, também, este fundamento do recurso.
Aqui chegados, e considerando definitivamente assente a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo, cumpre proceder, agora, ao seu enquadramento jurídico-penal.
Sustentam os recorrentes que a máquina em causa não desenvolve tema próprio de jogo de fortuna e azar, como o póker, frutas, campainhas, blackjack, ou mesmo a roleta, nem pagava diretamente prémios em fichas ou moedas, enquadráveis no artigo 4º do Decreto-Lei nº 422/89, de 2/12.
Vejamos.
Os arguidos foram condenados como co-autores materiais e na forma consumada, de um crime de exploração ilícita de jogo, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 26.º, do Código Penal e 108.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 422/89, de 02 de Dezembro.
Atentemos nas normas relevantes para a decisão da questão em análise.
Dispõem os seguintes artigos do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro:
Artigo 1º: “Jogos de fortuna ou azar são aqueles cujo resultado é contingente por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte.”
Artigo 3.º: «1 – A exploração e a prática dos jogos de fortuna ou azar só são permitidas nos casinos existentes em zonas de jogo permanente ou temporário criadas por decreto-lei ou, fora daqueles, nos casos excepcionados nos artigos 6° a 8°.».
Artigo 4º, n.º 1, al. g): “Nos casinos é autorizada a exploração, nomeadamente, dos seguintes tipos de jogos de fortuna ou azar: Jogos em máquinas que, não pagando directamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvam temas próprios dos jogos de fortuna ou azar ou apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte.”
Artigo 108º, n.º 1: “Quem, por qualquer forma, fizer a exploração de jogos de fortuna ou azar fora dos locais legalmente autorizados será punido com prisão até dois anos e multa até 200 dias.”
Constituem, assim, elementos típicos deste crime:
- objetivos –
a) a exploração de jogos de fortuna ou azar;
b) que essa exploração se processe por qualquer forma;
c) a exploração de tais jogos e por tais formas fora dos locais legalmente autorizados;
- subjetivo-
d) a existência de dolo em qualquer das suas modalidades, direto, necessário ou eventual (cfr. artigo 14º do Código Penal).
A discordância dos recorrentes relativamente à subsunção jurídica da sua conduta, nos termos efetuados pela sentença recorrida, assenta na divergência que manifestam quanto à classificação da máquina em causa nos autos como jogo de fortuna e azar, o que é, efetivamente, ponto de fulcral importância na delimitação da conduta proibida pelo tipo.
Assim, importa desde logo considerar o referido artigo 1º do mesmo diploma, que define os jogos de fortuna ou de azar como todos aqueles cujo resultado se caraterize pela contingência, ou seja, pela particularidade de assentarem, exclusiva ou fundamentalmente, na sorte. Ficando, assim, definitivamente afastados da previsão legal, aqueles jogos cujo resultado dependa da destreza ou perícia do jogador, seja esta de natureza física, intelectual ou sensorial.
Aqui chegados, e relembrando as caraterísticas dos jogos desenvolvidos na máquina em causa nos autos, tal como consta da factualidade tida como apurada e que não foi impugnada, é forçosa a conclusão de que nenhum deles se enquadra nesta última situação, já que é indubitável que o resultado dos jogos tipo roleta nela desenvolvidos dependem única e exclusivamente da sorte.
De facto está assente que a máquina em causa estava acessível e disponível a qualquer cliente do café, estando por isso devidamente ligada à energia eléctrica e em condições de ser utilizada, tinha as características e continha o jogo referidos no relatório de exame pericial de folhas 64 e 65, frente e verso. Está igualmente assente que nesta máquina era possível praticar o jogo descrito no mencionado relatório de exame, em que a perícia do jogador não tem qualquer interferência no resultado, cabendo tão só ao acaso ou à sorte a obtenção de prémios ou de dinheiro, razão pela qual a sua exploração só é permitida nos casinos e em zonas autorizadas de jogo.
No entanto a questão põe-se, antes, porque nem todas as máquinas que desenvolvem um jogo que dependa única e exclusivamente, ou fundamentalmente, da sorte, integram o conceito típico de jogos de fortuna ou azar considerados ilícito criminal (cfr. artigos 108º a 115º do Decreto-Lei n.º 422/89), já que desse conceito há, desde logo, que considerar excluídas as denominadas modalidades afins dos jogos de fortuna e azar, abrangidas apenas pelo direito de mera ordenação social (artigos 159º a 163º do mesmo diploma).
Importa pois estabelecer, de forma clara, a definição de jogos de fortuna e azar, que passa, necessariamente, pelo estabelecimento da fronteira entre esse jogos e aquelas outras modalidades afins.
Para tal, somos logo reconduzidos para o disposto no já transcrito artigo 4º, que define e enumera os tipos de jogos de fortuna e azar, autorizados apenas nos casinos. Desse elenco, fazem parte os “jogos em máquinas pagando diretamente prémios em fichas ou moedas” (alínea f) do nº 1) e os “jogos em máquinas que, não pagando diretamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvem temas próprios dos jogos de fortuna ou azar ou apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte” (alínea g) do nº 1).
Por sua vez, o artigo 159º, nº 1, do mesmo diploma, estatui que “modalidades afins dos jogos de fortuna ou azar são as operações oferecidas ao público em que a esperança de ganho reside conjuntamente na sorte e perícia do jogador, ou somente na sorte, e que atribuem como prémios coisas com valor económico”. Nelas se incluem, nomeadamente, rifas, tômbolas, sorteios, concursos publicitários, concursos de conhecimentos e passatempos (nº 2 do mesmo artigo).
Estabelecendo-se em seguida, no artigo 161º nº 3, em enumeração não exaustiva, os temas que as modalidades afins dos jogos de fortuna e azar não podem desenvolver, como sejam, o póquer, frutos, campainhas, roleta, dados, bingo, lotaria de números ou instantânea, totobola e totoloto, nem substituir por dinheiro ou fichas os prémios atribuídos.
O Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2010, publicado no DR n.º 46, Série I, de 08-03-2010, que procedeu a uma análise pormenorizada sobre a classificação de várias máquinas de jogo como sendo de fortuna ou azar ou apenas modalidades afins, muito contribuindo para a definição da fronteira entre elas, fixou a seguinte jurisprudência: “Constitui modalidade afim e não jogo de fortuna ou azar, nos termos dos artigos 159.º, n.º 1, 161.º, 162.º e 163.º do Decreto-Lei nº 422/89, de 2 de Dezembro, na redacção do Decreto-Lei nº 10/95, de 19 de Janeiro, o jogo desenvolvido em máquina automática na qual o jogador introduz uma moeda e, rodando um manípulo, faz sair de forma aleatória uma cápsula contendo uma senha que dá direito a um prémio pecuniário, no caso de o número nela inscrito coincidir com algum dos números constantes de um cartaz exposto ao público”.
Sendo esta jurisprudência vinculativa, desde já adiantamos que ela não é aplicável aos presentes autos, pois a máquina aqui em causa tem características diversas daquela outra modalidade específica de máquina que foi objecto do acórdão uniformizador: a máquina denominada Colorama nada tem que ver com o tipo de máquina que foi objecto de apreciação no referido Acórdão de fixação de jurisprudência n.º 4/2010.
É que a questão dirimida pelo STJ, que até então dividia a jurisprudência, respeita a máquinas que funcionam como espécies de rifas ou tômbolas mecânicas e atribuem prémios com valor económico de acordo com resultados que dependem exclusiva ou fundamentalmente da sorte, que são vulgarmente designadas por máquinas de “bolas” e abundam em estabelecimentos de cafetaria, restauração e espaços de lazer. Máquinas essas que, face à definição ampla do artigo 1º, já supra citado, havia quem enquadrasse no jogo de fortuna ou azar, pelo facto de os seus resultados dependerem da sorte. Entendimento que o acórdão do STJ veio afastar, com os argumentos que se passam a transcrever:
“Todas as modalidades de jogos que não correspondam às caraterísticas descritas e especificadas nos referidos artigos 1º e 4º do Decreto -Lei nº 422/89, na redação do Decreto -Lei nº 10/95, embora os seus resultados dependam exclusiva ou fundamentalmente da sorte, revertem para as modalidades afins, como se defende no acórdão fundamento.
No caso das máquinas de jogos, só são de considerar como jogos de fortuna ou azar: Os jogos em máquinas pagando diretamente prémios em fichas ou moedas; Os jogos em máquinas que, não pagando diretamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvam temas próprios dos jogos de fortuna ou azar ou apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte.
O facto de os jogos em máquinas terem desaparecido do elenco exemplificativo do artigo 159º, nº 2 (modalidades afins), após as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 22/85, de 17 de Janeiro, não significa que todos os jogos em máquinas se dividam, pura e simplesmente, em jogos de fortuna ou azar e jogos de diversão, estes de resultados dependentes exclusiva ou fundamentalmente da perícia do utilizador e não pagando prémios em dinheiro, fichas ou coisas com valor económico, nos termos do artigo 1º do Decreto-Lei nº 21/85, também de 17 de Janeiro.
Ora, os jogos nas máquinas automáticas em causa nos acórdãos em conflito (cf. supra n.ºs 6.1 e 6.2), se apresentavam resultados que dependiam exclusiva ou fundamentalmente da sorte, não desenvolviam temas próprios dos jogos de fortuna ou azar nem pagavam diretamente prémios em fichas ou moedas. Por conseguinte, não podiam ser enquadradas em qualquer dos tipos de jogos de fortuna ou azar praticados em máquinas automáticas, tal como descritos nas referidas alíneas f) e g) do nº 1 do artigo 4º do Decreto-Lei nº 422/89, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 10/95, revertendo, antes, para as modalidades afins referidas no artigo 159º, pois constituem uma espécie de sorteio por meio de rifas ou tômbolas mecânicas.
É certo que os referidos jogos proporcionavam também prémios em coisas com valor económico e em dinheiro, ou só em dinheiro, mas tal circunstância, se não é permitida pelo artigo 161º, n.º 3, do referido diploma legal, também não é suficiente, por si só, para integrar a «específica configuração em que está definido o pagamento de prémios (pagamento directo em fichas ou moedas) nos jogos de fortuna ou azar”, como se diz no acórdão fundamento.”
Adiantando, em seguida, o mesmo aresto, duas ordens de razões justificativas do entendimento que perfilhou, que também se transcrevem, pelo seu manifesto interesse no estabelecimento da fronteira entre as máquinas de jogo de fortuna ou azar e de modalidades afins. Atentemos pois:
“Como vimos atrás, o tipo legal de crime é dotado de uma certa rigidez, que o constitui como tipo de garantia, sendo essa precisamente uma das manifestações do princípio da legalidade. Assim, aquela circunstância não retira aos jogos em causa a natureza de modalidade afim. Acresce que a tutela penal adscrita à proibição dos jogos de fortuna ou azar fora dos locais autorizados encontra fundamento, como se viu (cf. supra n.º 7.1.1), em valores de relevante ressonância ético-social, nomeadamente pelos efeitos devastadores a nível social, familiar, económico e laboral, com incremento de criminalidade grave, não só de carácter patrimonial mas também de caráter pessoal (vida, integridade física, ameaça, coação) que a dependência de jogos de grande poder aditivo e potenciação de descontrolo pode acarretar. Tal não sucede relativamente aos jogos em máquinas automáticas que funcionam como espécies de rifas ou tômbolas mecânicas, em que o que se arrisca assume dimensão pouco significativa, pois a expetativa é limitada ou predefinida e o impulso para o jogo tem de ser renovado em cada operação, ao contrário do que sucede com os jogos de casino, mesmo em máquinas, possibilitando uma série praticamente ilimitada de jogadas, numa espécie de encadeamento mecânico e compulsivo, em que o jogador corre o risco de se envolver emocionalmente.”
Do exposto, pode, pois, concluir-se que, a nosso ver, não encontram suporte na letra da lei, por isso, extravasando-a e permitindo uma solução não abrangida, logo, não autorizada por aquela, que no caso das máquinas de jogos, só são de considerar como jogos de fortuna ou azar: a) os jogos em máquinas pagando directamente prémios em fichas ou moedas; b) os jogos em máquinas que, não pagando directamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvam temas próprios dos jogos de fortuna ou azar ou apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte.
Note-se, porém, que o facto de os jogos em máquinas terem desaparecido do elenco exemplificativo do artigo 159.º, n.º 2 (modalidades afins), após as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 22/85, de 17 de Janeiro, não significa que todos os jogos em máquinas se dividam, pura e simplesmente, em jogos de fortuna ou azar e jogos de diversão, estes de resultados dependentes exclusiva ou fundamentalmente da perícia do utilizador e não pagando prémios em dinheiro, fichas ou coisas com valor económico, nos termos do artigo 1.º do Decreto -Lei n.º 21/85, também de 17 de Janeiro.
Aqui chegados, retomemos novamente o caso sub judice, relembrando as caraterísticas da máquina em causa nos autos:
i. trata-se de uma máquina com a designação “COLORAMA”, sem qualquer referência exterior quanto à origem, fabricante, número de fabrico ou série, inserida um móvel tipo portátil, de cor azul e outras e estrutura em madeira, tendo na parte frontal um painel em vidro acrílico;
ii. na parte superior do vidro acrílico é possível visualizar a designação da máquina e na parte lateral direita existe um mecanismo de introdução de moedas;
iii. ao centro do aludido painel situa-se um mostrador circular dividido em oito pontos, os quais são identificados pelos seguintes números: 1, 50, 2, 100, 5, 20, 200 e 100;
iv. o mostrador circular, é constituído por vários led´s (pequenas lâmpadas) equidistantes, que após a introdução de 50 cêntimos (mínimo para se poder dar inicio à jogada), se iluminam sequencialmente, executando, no mesmo sentido, um movimento giratório;
v. tal como descrição feita anteriormente, o mostrador circular apresenta oito led´s identificados, e os restantes não têm qualquer identificação;
vi. ao centro do mostrador circular existe uma janela digital através da qual são visualizados os pontos provenientes de eventuais jogadas premiadas e, no lado direito, encontra-se uma nova janela digital, que nos informa dos créditos existentes, provenientes de introdução de moedas;
vii. cada € 0,50 (cinquenta cêntimos) proporcionam 50 créditos;
viii. quando, no final do movimento giratório, um dos led´s identificados ficar iluminado, todo o mostrador se ilumina, dando indicação ao jogador que tem uma jogada premiada;
ix. na parte lateral esquerda da máquina, encontram-se dois pontos metálicos que permitem fazer o reset aos pontos provenientes de eventuais jogadas premiadas;
x. na parte frontal da máquina, encontra-se um botão encarnado, que permite ao jogador utilizar os pontos acumulados;
xi. por um ponto ganho, o jogador terá direito a mais duas jogadas, ou seja em cada jogada aposta-se € 0,50 (cinquenta cêntimos);
xii. após a introdução de uma moeda, automaticamente os led´s de que é constituído o mostrador, se iluminam sequencialmente, executando, no mesmo sentido, um movimento giratório;
xiii. esse movimento termina, no momento em que apenas um dos led´s fica iluminado;
xiv. nesta altura duas situações podem acontecer: o led iluminado corresponde a um dos oito identificados pelos números já referidos e, neste caso, o jogador terá direito aos pontos correspondentes, que oscilam entre 1 e 200, estes são creditados e visualizados através de uma das janelas; o led iluminado, não se encontra identificado por qualquer número, pelo que o jogador não terá direito a qualquer prémio, restando-lhe a hipótese de tentar novamente a sua sorte, introduzindo nova moeda;
xv. em regra, os pontos são posteriormente convertidos em dinheiro, à razão de € 1,00 (um euro) por cada ponto;
xvi. trata-se de um jogo em que o objectivo é o de conseguir que no final de cada jogada, o led iluminado, corresponda a um dos que se encontram identificados, dando por isso direito a prémio, sendo que o resultado depende em tudo da sorte, independentemente da perícia e destreza do jogador, dado que a única intervenção deste se resume à introdução de uma moeda no respectivo mecanismo da máquina.
Ora, debruçando-se sobre um caso em que estava em causa uma máquina com as características e modo de funcionamento exactamente iguais à máquina em causa denominada Colorama, o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão publicado em 27 de Outubro de 2010, disponível em www.dgsi.pt, negou igualmente a aplicação da mencionada jurisprudência uniformizada, considerando que um jogo como o da máquina referida em 8.º não tinha as características da máquina a que se reportou o supra referido Acórdão de fixação de jurisprudência, precisamente porque a primeira, ao contrário desta última, desenvolvia um jogo em tudo semelhante ao modo de operação típico do jogo de roleta, de fortuna e azar, cuja exploração só pode ser realizada em casinos.
Na verdade, nesse tipo de máquinas, como sucedeu no caso dos autos quanto à denominada máquina Colorama, o jogador só tem intervenção activa no início do jogo quando coloca a moeda na máquina, não podendo através da sua perícia influenciar o resultado que fica exclusivamente dependente da sorte ou do acaso, podendo auferir uma vantagem patrimonial de valor variável (dependendo do valor do prémio obtido e das vezes que joga) ou nem sequer auferir qualquer prémio.
Donde, essa máquina não desenvolve tema de espécie de rifa ou tômbola, independentemente de ser mecânica ou eléctrica, ao contrário do que sucedia com a máquina que foi objecto do aludido Acórdão Uniformizador de Jurisprudência.
É que aquelas – tal como a dos presentes autos, melhor descrita em 8.º supra, desenvolvem um jogo que apresenta como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte, que se premiadas traduzem-se as mesmas em dinheiro, diferenciando-se assim, inequivocamente, da máquina objecto da referida jurisprudência uniformizada.
No mesmo sentido, foi decidido pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Novembro de 2010, disponível em www.dgsi.pt, no qual se exarou que: “(…) no acórdão uniformizador em análise entendeu-se não serem jogos de fortuna ou azar todos aqueles que não tenham “as características descritas e especificadas” no artº 4º do DL nº 422/89 e que era esse o caso dos jogos que ali estavam em causa, não se preenchendo tanto a previsão da alínea f) («Jogos em máquinas pagando directamente prémios em fichas ou moedas») como a da alínea g) («Jogos em máquinas que, não pagando directamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvam temas próprios dos jogos de fortuna ou azar ou apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte») do nº 1 desse preceito, na medida em que as máquinas respectivas (nas quais o jogador introduzia uma moeda de 100 escudos ou de 50 cêntimos, fazendo sair, “seleccionada de forma totalmente aleatória, uma cápsula de plástico, ficando o jogador na expectativa de receber um prémio em dinheiro, caso as três senhas contidas no interior da cápsula, uma ou mais, tivesse escrito um número que fosse coincidente com outro inscrito no cartaz”, sendo que, “nas situações em que a numeração constante da senha não coincidia com as existentes no cartaz, o jogador não tinha direito a qualquer prémio”) não desenvolviam temas próprios dos jogos de fortuna ou azar e, se proporcionavam também prémios em dinheiro, o seu pagamento não assumia a configuração típica: “pagamento directo em fichas ou moedas”. Ora, a situação de facto deste processo é outra, por ser diferente o jogo desenvolvido pela máquina. Esta, se não pagava prémios directamente em fichas ou moedas, apresentava, desde logo, como resultado pontuações dependentes exclusivamente da sorte, facto que, relevando no âmbito da parte final daquela alínea g), não se verificava nas situações apreciadas no acórdão de fixação de jurisprudência. No presente processo, o tribunal recorrido considerou ainda que a máquina aqui em causa desenvolvia temas próprios dos jogos de fortuna ou azar, sendo que o acórdão uniformizador, não tendo em vista uma máquina com este funcionamento, não decidiu o contrário.”.
Também no Acórdão da Relação de Lisboa de 08 de Janeiro de 2013, também disponível em www.dgsi.pt, se escreveu que: “(…) A discussão sobre o critério de distinção entre jogos de fortuna ou azar e modalidades afins tem suscitado grande polémica, podendo assentar-se em que deixou de haver qualquer distinção material entre os dois conceitos, pelo que o critério a adoptar tem de ser formal: jogos de fortuna ou azar serão, apenas, aqueles cuja exploração, nos termos dos nºs 1 e 3 do artº 4º do DL nº 422/89 é autorizado nos casinos. Todas as modalidades de jogos que não correspondam às características descritas e especificadas nos artigos 1º e 4º daquele diploma legal, embora os seus resultados dependam, exclusiva ou fundamentalmente da sorte, revertem para as modalidades afins, havendo que salientar o facto de, nos termos do artº 161º, nº 3, do mesmo diploma legal, as modalidades afins não poderem “desenvolver temas característicos dos jogos de fortuna ou azar, nomeadamente o póquer, frutos, campainhas, roleta (...) nem poder substituir por dinheiro ou fichas os prémios atribuídos”. III-No caso em apreciação, o jogo que as máquinas desenvolvem é, em tudo, semelhante ao típico jogo de roleta, pelo que é de rejeitar a sua integração nas modalidades afins de jogos de fortuna ou azar, não só porque a tanto se opõe o disposto no artº 161º, nº 3, do DL nº 422/89, mas também, e sobretudo, porque se trata de jogo cuja exploração é autorizada em casinos e tem as características de um dos jogos descritos no nº 1 do artigo 4º daquele diploma legal.”.
Ora, considerando o teor destes referidos acórdãos, é de afirmar que o jogo da máquina denominada Colorama é um jogo de fortuna ou azar, estando, aliás, em conformidade com a interpretação legal veiculada no referido Acórdão de fixação de jurisprudência sobre a definição de jogo de fortuna ou azar.
Não há pois dúvida de que a máquina em causa, desenvolve jogos que apresentam como resultado pontuações e não os prémios isolados próprios dos sorteios, rifas e tômbolas, como acontecia nas situações apreciadas no acórdão de fixação de jurisprudência, sendo o modo de obtenção dessa pontuação em tudo semelhante aos típicos jogos da roleta tradicional: o jogo desenvolvido pela referida máquina não é uma tômbola de números ou rifas, desenvolvendo, assim, tema próprio dos jogos de fortuna ou azar e apresentam como resultado pontuações dependentes exclusivamente da sorte, sendo o jogador premiado em função da pontuação obtida.
Concretizando, o jogo que a dita máquina desenvolve é em tudo semelhante ao típico jogo de roleta, tratando-se, pois, de uma versão eléctrica e computorizada do jogo mecânico da roleta e do poker, respectivamente, sendo, pois, de rejeitar a sua integração nas modalidades afins de jogos de fortuna ou azar, não só porque a tanto se opõe o disposto no artigo 161.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 422/89, mas também, e sobretudo, porque se tratam de jogos cuja exploração é apenas autorizada em casinos e tem as características de um dos jogos descritos no n.º 1, do artigo 4.º, daquele diploma legal (In Acórdão da Relação de Évora de 07 de Janeiro de 2014, disponível em www.dgsi.pt.).
Ora, jogos com estas caraterísticas, são de fortuna e azar, tal como definido no artigo 4º, nº 1, alínea g), da Lei do Jogo: “jogos em máquinas que, não pagando diretamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvam temas próprios dos jogos de fortuna ou azar ou apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte”, cuja exploração só pode ser realizada em casinos.
Aliás, o artigo 161º nº 3, do mesmo diploma, a que supra já se aludiu, na sua parte final, prescreve que as modalidades afins de jogos de fortuna ou azar não podem desenvolver temas próprios dos jogos de fortuna ou azar (e exemplifica), nem substituir por dinheiro ou fichas os prémios atribuídos, assim excluindo expressamente dessas modalidades, jogos do tipo dos desenvolvidos nas máquinas em causa nos autos.
O jogo de fortuna e azar trás consigo consequências perniciosas a nível social e familiar, sendo fonte de criminalidade e de perturbação social, e por isso nada impede o legislador de, através do direito penal, proteger os bens jurídico-constitucionais que aquela exploração põe em causa.
Como referem Altina Rento e Abel Laureano, in Direito de Jogo – Legislação Anotada, Quid Juris? – Sociedade Editora, Lda. Lisboa, 1991, pág. 23, “O jogo só é permitido em zonas circunscritas, definidas imperativamente pela lei. Porquê? […] O jogo é visto, simultaneamente, como benéfico e maléfico. Este posicionamento híbrido reflecte-se, depois, em medidas correspondentes. Assim, entende-se que o jogo é uma actividade boa. E, em conformidade, deixa de se proibir a sua prática; diz-se que ele favorece o turismo; quer-se garantir a rentabilidade aos que o exploram; protege-se o jogador, cuja comodidade e privacidade se assegura. No entanto, não está igualmente arredia a ideia de que o jogo é coisa má. Por isso se proíbe a sua prática fora dos locais rigidamente determinados; pensando-se que provoca viciação fácil e indesejável, reprimem-se severamente os empréstimos de dinheiro para o jogo; monta-se uma apertadíssima vigilância, por banda do Estado, através da Inspecção-Geral de Jogos (além da repressão ao jogo clandestino, a cargo, também, das autoridades policiais); é notória a preocupação de velar pela transparência dos actos de jogo (como se, por natureza, fossem tendencial ou inevitavelmente obscuros ou enganosos)...”
Não se pode também olvidar, como se escreveu no acórdão desta Relação, de 19.10.2011, proferido no processo nº 324/10.9GEGDM.P1 (disponível em www.dgsi.pt), que se debruçou sobre situação semelhante, estando em causa, como nos presentes autos, uma máquina com a designação “colorama”, com desenvolvimento de jogo semelhante aos dos presentes autos, que “no que se refere à ratio da criminalização da exploração do jogo, não pode dizer-se em relação ao jogo em apreço nestes autos, como pode dizer-se da máquinas que funcionam como uma espécie de rifas ou tômbolas mecânicas a que ser reporta o acórdão nº 4/2010, que «a expectativa é limitada ou predefinida», ou «o impulso para o jogo tem de ser renovado em cada operação». Pelo contrário, dela pode dizer-se, como pode dizer-se dos jogos de casino, que possibilitam «uma série praticamente ilimitada de jogadas, numa espécie de encadeamento mecânico e compulsivo, em que o jogador corre os risco de se envolver emocionalmente». Os pontos adquiridos podem ser usados em jogos sucessivos e o próprio funcionamento do jogo induz à cumulação de pontos e a essa utilização em jogos sucessivos. Neste aspecto, os efeitos do uso da máquina em apreço nestes autos podem ser substancialmente equiparados aos do jogo da roleta dos casinos, independentemente das diferenças de características entre ambos. A indução de comportamentos compulsivos com reflexos sociais danosos representa um malefício que a criminalização da exploração ilícita do jogo pretende combater e, porque tal risco se verifica no uso da máquina em questão, justifica-se a criminalização da sua exploração ilícita.”
É de realçar que no referido acórdão se explanam as diferenças de funcionamento das máquinas como a que está em causa nesse processo e aquelas a que se reporta o acórdão de uniformização de jurisprudência, concluindo-se que o entendimento aplicado no referido acórdão de uniformização de jurisprudência não é aplicável nem directamente nem por analogia às máquinas como as que estão em causa nestes autos, cuja exploração configura a prática de um crime de exploração ilícita de jogo.
Ainda no citado Ac. TRP de 19-10-2011, após análise do modo do funcionamento do jogo desenvolvido pela máquina, semelhante à em causa nestes autos, concluiu-se que “... as características da máquina a que é relativo o presente processo são distintas das da máquina a que se reporta o acórdão de uniformização de jurisprudência em questão”.
E, após análise do mencionado acórdão de fixação de jurisprudência n° 4/2010, concluiu-se no mencionado acórdão da RP de 19-10-2011, que vimos seguindo e citando: “Vejamos se ... a máquina a que é relativo o presente desenvolve um jogo que deve ser considerado de fortuna ou azar, ou não. Quanto à subsunção no citado artigo 4o do Decreto-Lei n° 422/89, poderíamos considerar que se trata do jogo da roleta habitualmente jogado nos casinos e referido na alínea a) do n°1 desse artigo. No entanto, e como refere a recorrente, não estarão preenchidas todas as características deste jogo, tal como vêem definidas exaustivamente na Portaria n° 217/2007, de 26 de Fevereiro.
Mas na alínea g) desse n°1 estão previstos as máquinas que, não pagando directamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvam temas próprios dos jogos de fortuna e azar ou apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte. Parece claro que a máquina em apreço apresenta como resultado pontuações (não os prémios isolados proporcionados pelos sorteios, rifas e tômbolas) que dependem exclusivamente da sorte. Está assim preenchida a previsão da última parte da alínea g) do n°1 do citado artigo 4o, que define os tipos de jogos de fortuna ou azar”.
Aqui chegados, face a todo o exposto, retomando, novamente, o caso sub judice e, relembrando as características da máquina em causa nos autos, não há, pois, dúvida de que o jogo desenvolvido pela mesma, pelas suas características, deve classificar-se como jogo de fortuna e azar (cfr. artigo 4º, nº 1, alínea g), da Lei do Jogo), como tal preenchendo, para efeitos criminais, o respectivo conceito típico do artigo 108, nº 1 da Lei do Jogo.
No mesmo sentido vejam-se, entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 27.10.2010, deste Tribunal da Relação do Porto de 25/5/2011, 19/10/11, 28/3/12, 8/2/12, 27/6/12 e de 5/5/14, do Tribunal da Relação de Lisboa de 5/04/2011 e de 8/1/13, do Tribunal da Relação de Coimbra de 21/03/2012 e de 15/02/2012 e do Tribunal da Relação de Évora de 2/7/13, todos acessíveis no mesmo sítio da internet.
Do que resulta que, não integrando a noção de modalidade afim de jogo de fortuna e azar, não poderá ser qualificada como mera contra-ordenação a exploração dessas mesmas máquinas: vide artigo 163.º, da Lei do Jogo, mas sim como um verdadeiro jogo de fortuna e azar.
Assim, considerando que, à data da prática dos factos supra descritos, o estabelecimento em referência não era um casino, nem se encontrava abrangido pelas excepções previstas nos artigos 6.º a 8.º, da Lei do Jogo, nem tão pouco possuía qualquer tipo de licença para exploração e prática de jogos de fortuna ou azar, ocorreu a sua exploração com intuitos lucrativos fora dos locais legalmente autorizados.
Estão, pois, preenchidos os elementos objectivos do ilícito em apreço quanto à exploração da máquina denominada Colorama.
De igual modo, está assente que os arguidos tinham conhecimento da forma como o referido jogo desta máquina, bem sabendo que lhes estava vedada a sua exploração sem a mencionada autorização e licença e que tal tipo de jogo só podia ser explorado nos casinos existentes em zonas de jogo autorizadas, conhecendo ainda a ilicitude da sua conduta, pelo que actuaram com dolo directo, nos termos do citado artigo 14.º, n.º 1, do Código Penal.
Em suma, a conduta dos arguidos, quanto à exploração da referida máquina denominada Colorama, preencheu todos os elementos objectivos do tipo de ilícito em referência e, na medida em que se provou que os arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, ciente do tipo de jogo que tal máquina desenvolvia que sabia ser de fortuna e azar, bem sabendo que não estavam autorizados à exploração de tal máquina no local em que a mesma se encontrava, sabendo ainda a exploração ilícita de jogo era contrária à lei e criminalmente punível, então, também preencheram o respectivo elemento subjectivo.
Acresce que, face à factualidade assente, também decorre que os arguidos actuaram de comum acordo e em conjugação de esforços e vontades, importando, pois, saber se tal actuação deve ser ou não enquadrada na figura jurídica da co-autoria.
Face ao exposto, atenta a matéria de facto provada definitivamente assente, não existindo, no caso concreto, quaisquer causas de exclusão da ilicitude ou da culpa, resultam preenchidos todos os elementos típicos (objectivos e subjectivo) do crime de exploração ilícita de jogo imputado aos arguidos, pelo que se constituíram os mesmos como co-autores materiais (artigo 26º do Código Penal) e na forma consumada de um crime de exploração ilícita de jogo, previsto e punível pelo artigo 108.º, n.º 1, com referência aos artigos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, todos do Decreto-Lei n.º 422/89, de 02 de Dezembro.
Assim, a condenação dos arguidos e recorrentes pela prática de um crime de exploração ilícita de jogo, previsto e punido pelo artigo 108.º, n.º 1, com referência aos artigos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, todos do Decreto-Lei n.º 422/89, de 02 de Dezembro, não é merecedora de reparo.
Os recorrentes alegam, ainda, que “discordam da medida da pena aplicável, porquanto na verdade, atendendo às condições económicas dos mesmos, sociais e familiares, atendendo à conjuntura económico-financeira e os momentos de grave crise por que passam os cidadãos não só em Portugal, como no resto da Europa e diríamos até do mundo, mostra-se desadequada a medida da pena de multa aplicada à recorrente”. Entendem, pois, que “uma medida de pena de multa de menor montante teria servido de igual modo os fins de prevenção geral e especial que os dispositivos legais visam prosseguir, reduzindo a mesma, bem como a sua taxa diária da multa”.
Vejamos.
Dispõe o artigo 40º, nº 1, do Código Penal que “a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”.
E segundo o disposto no artigo 70º, do mesmo diploma “se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”
Quer dizer, a escolha da pena depende de critérios de prevenção geral e especial, pelo que o julgador, perante um caso concreto, tem que os valorar para depois optar por aplicar uma pena detentiva ou não detentiva.
A medida da pena há-de ser dada pela medida da necessidade de tutela de bens jurídicos face ao caso concreto, assumindo a protecção de bens jurídicos um significado prospectivo que se traduz na tutela das expectativas da comunidade, na manutenção (ou mesmo no reforço) da validade das normas infringidas (prevenção geral positiva ou de integração que decorre do princípio político criminal básico da necessidade da pena – art. 18.°, n.° 2 da Constituição da Republica Portuguesa).
É a prevenção geral positiva ou de integração que fornece um “espaço de liberdade ou de indeterminação”, mais precisamente “uma moldura de prevenção”, (Prof. Figueiredo Dias, in “Consequências Jurídicas do crime”, Direito Penal 2, Parte Geral, pág. 283).
Na referida “moldura de prevenção” a função da culpa é a de estabelecer o limite máximo da pena concreto e como tal a pena nunca a pode ultrapassar, uma vez que a culpa constitui o pressuposto e limite da pena. O limite mínimo resulta do quantum de pena imprescindível, no caso concreto, e ainda comunitariamente suportável de medida da tutela de bens jurídicos e de estabilização das expectativas comunitárias da validade das normas violadas.
Na determinação da pena deve ter-se em conta, nos termos do art. 71º do Código Penal, todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o arguido, fixando-se o limite máximo daquela de acordo com a culpa do mesmo; o limite mínimo, de acordo com as exigências de prevenção geral; e a pena a aplicar, dentro da moldura penal assim conseguida, de acordo com as exigências de prevenção especial que ao caso convenham.
Assim, a determinação da pena concreta far-se-á em função da culpa do agente, atendendo às necessidades de prevenção de futuros crimes e a todos os elementos exteriores ao tipo legal que deponham a favor ou contra a arguida, nos termos do disposto art.º. 71º do Código Penal.
Desta norma se retira o critério norteador da tarefa de que nos ocupamos, e que se pode sintetizar da seguinte forma: a medida concreta da pena deverá ser encontrada, entre o ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos da comunidade e o limiar mínimo em que essa tutela ainda é eficaz (“moldura de prevenção”), através do recurso a considerações de prevenção especial de socialização, não podendo a pena, em caso algum, ultrapassar a medida da culpa do arguido. Aquela “moldura de prevenção” é fornecida pela prevenção geral positiva ou de integração, que, tal como já foi aflorado, se traduz na tutela das expectativas da comunidade na manutenção (ou mesmo no reforço) da validade e vigência da norma infringida.
Os fins das penas encontram-se estabelecidos no já citado artigo 40.º do Código Penal.
O requisito da culpa traduz a vertente pessoal do crime entendido como um juízo de censura pela personalidade manifestada no facto, fixando-se através dela o limite máximo da pena, sendo pressuposto da mesma, limitando de forma inultrapassável as exigências da prevenção (Neste sentido, Figueiredo Dias, “Direito Penal, Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 255 e ss).
Como já se disse, complementarmente à medida da culpa - dentro da margem de variação por esta consentida - intervêm as necessidades de prevenção.
Assim mesmo se têm pronunciado a doutrina, maxime: Figueiredo Dias in “Direito Penal Português”, pag. 227/228; Robalo Cordeiro In “Jornadas de Direito Criminal”, CEJ, vol. I, pag. 265/270; Maia Gonçalves in “Código Penal Português” em anotação ao art.º. 71º e Leal Henriques e Simas Santos in “Código Penal”, vol. I, pag. 550/558) e a jurisprudência do STJ (maxime Ac. de 21/9/94, proc. 46290/3ªsec e de 20/5/95, proc. 47386/3ªsec).
A individualização da pena concreta aplicada pelo tribunal em cada caso não depende de uma qualquer opção discricionária por um qualquer número. Tem, pois, o tribunal de fixar o quantum da pena dentro das regras postuladas pelo legislador, impondo-se-lhe que objective os critérios que utilizou e que fundamente a quantificação que decidiu -vd. artigo 71º n.º 3 do Código Penal.
Certamente que não se pode pensar em critérios de quantificação matemática. O direito não é uma ciência exacta. No entanto, os critérios legais, funcionando comparativamente, podem permitir estabelecer relações quantitativas de grandeza (maior/menor).
Assim, na graduação da pena atender-se-á aos critérios fornecidos pelos artigos 40° e 71° do Código Penal.
O crime em apreço é punível com pena de prisão até dois anos e com pena de multa até duzentos dias.
Analisemos o caso concreto, tendo em conta as considerações expostas.
Assim, há que valorar o grau de ilicitude e de gravidade dos factos praticados, bem como a intensidade do dolo – direto - e da culpa.
No entanto, há a considerar a circunstância de nada se ter apurado relativamente ao tempo de utilização da máquina, do número de pessoas que as possam ter utilizado ou dos ganhos que ela proporcionou aos arguidos, sendo que a sua utilização estava dependente da introdução de quantias extremamente reduzidas, seja, moedas de €:0,50, desconhecimento este que não pode deixar de beneficiar o agente.
As exigências de prevenção geral revelam-se acentuadas, considerando a crescente prática de crimes de idêntica natureza.
As exigências de prevenção especial mostram diminutas em face da ausência de antecedentes criminais e da circunstância de, actualmente, os arguidos já não se dedicarem à exploração de qualquer estabelecimento comercial.
Ademais, e ainda como factores de valoração que militam a favor dos arguidos apurou-se que os mesmos se encontram social, profissional e familiarmente inseridos.
A determinação das penas de prisão (em 90 dias) situa-se próximo do mínimo legal. A multa que substitui tal pena (de noventa dias) também não se revela desproporcionada, considerando a respectiva moldura e as circunstâncias referidas.
O mesmo acontecendo com a determinação das penas de multa (em sessenta dias), que se situa no patamar inferior ao meio da respectiva moldura abstracta.
Assim, as penas encontrados pelo tribunal a quo e em que os arguidos foram condenados, revelam-se adequadas e proporcionadas, considerando a factualidade apurada na sentença recorrida, atendendo a todas as circunstâncias a que alude o artigo 71º do Código Penal, ponderando-se a culpa global do agente, as circunstâncias supra enunciadas e as necessidades de prevenção geral e especial, que o caso concreto exige.
Com efeito, a fixação de tais penas não é merecedora de reparo.
E que dizer quanto ao “quantitativo diário da multa”?
Conforme é sabido o Código Penal (artigo 47º) utiliza o modelo escandinavo dos dias de multa segundo o qual a fixação desta pena pecuniária se faz através de duas operações sucessivas: na primeira determina-se o número de dias de multa através dos critérios gerais de fixação das penas (cfr. artigos 40º 71º, ambos do Código penal) e na segunda fixa-se o quantitativo de cada dia de multa em função da capacidade económica e financeira do agente. Fixada a pena, em caso de a precária situação económica e financeira do condenado o justificar, o tribunal decide se o pagamento da multa pode ser autorizado em alguma das modalidades que o n.º 3 facilita (cfr. Figueiredo Dias, Direito Penal Português- As Consequências Jurídicas do Crime, Lisboa, 1993, págs. 126-127 §143, Simas Santos e Leal Henriques, Noções Elementares de Direito Penal, 2ª ed, Lisboa 2003, pág. 187, Maia Gonçalves, Código Penal Português, 17ª ed., Coimbra, 2005, pág. 194, e Ac. do S.T.J. de 3 de Novembro de 2003, proc.º n.º 3366/03-5ª).
De harmonia com o disposto no art. 47º nº 2 do Código Penal, cada dia de multa corresponde a uma quantia entre € 5 e € 500, e é fixada em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais.
Quanto à taxa diária da multa, ainda como refere Figueiredo Dias (in ob. cit., pág. 127), todas as considerações atinentes quer à culpa, quer à prevenção geral, quer à especial, devem exercer influência sobre a determinação da pena e, portanto sobre os dias de multa, e não sobre o quantitativo diário. Em contrapartida, tudo quanto respeite à situação económico-financeira do condenado deve ser considerado nesta fase de fixação do quantitativo diário de multa.
Como é entendimento corrente, a taxa diária da multa deve ser fixada de forma a que mesma represente um sacrifício real para o condenado, para que mantenha a sua característica de verdadeira pena, pois de outro modo não será possível, através da sua aplicação, realizar as finalidades da punição.
Na ponderação do quantitativo ajustado ao caso concreto não entram unicamente em linha de conta os rendimentos mensais, apurados ou declarados, mas também todos os outros rendimentos, bens e encargos que definem uma situação económica e que permitem avaliar a repercussão que nela vai ter a pena encontrada, de forma a poder concluir-se se a mesma é, efectivamente, e como deve ser, adequada para sancionar a concreta gravidade do facto.
Logo, “o juiz graduará o quantitativo diário da multa em atenção às determinações legais, atendendo a que a finalidade da lei é eliminar ou pelo menos esbater as diferenças de sacrifício que o seu pagamento implica entre os réus possuidores de diferentes meios de a solver” – cfr. Maia Gonçalves, in Código Penal Português, 10ª ed., pág. 226.
Como se pode ler no Acórdão do STJ, proferido em 3-6-2004, no processo 04P1266, em www.dgsi.pt “A pena de multa, se não quer ser um andrajoso simulacro de punição, tem de ter como efeito o causar ao arguido, pelo menos, algum desconforto se não, mesmo, um sacrifício económico palpável”.
Ou conforme se salientou no douto Ac. do STJ de 2-10-1997 (Col. de Jur., Ano V, tomo 3, págs. 183-184) “como a multa é uma pena, o montante diário da mesma deve ser fixado em termos de tal sanção representar um sacrifício real para o condenado, sob pena de se estar a desacreditar esta pena, os tribunais e a própria justiça, gerando um sentimento de insegurança, de inutilidade de impunidade”.
Também o Prof. Taipa de Carvalho assinala em termos incisivos que “a multa enquanto sanção penal, não pode deixar de ter um efeito preventivo e, portanto, não pode deixar de ter uma natureza de pena ou sofrimento, isto é e por outras palavras, não pode o condenado a multa deixar de a ‘sentir na pele’ (As Penas no Direito Português após a Revisão de 1995, in Jornadas de Direito Criminal-Revisão do Código Penal, ed. do Centro de Estudos Judiciários, Lisboa, 1998, vol II, pág. 24) e já antes o Prof. Figueiredo Dias, salientara que “é indispensável (…), que a aplicação concreta da pena de multa não represente uma forma disfarçada de absolvição ou o Ersatz de uma dispensa ou isenção de pena que não se tem coragem de proferir” (Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, Lisboa, 1993, pág. 119, §123).
Mas neste domínio – como, de resto, em tudo na vida - há que ter o sentido das proporções, impondo-se critérios de razoabilidade e de exigibilidade.
Resulta da factualidade apurada que os arguidos têm dois filhos, com 20 e 26 anos de idade; o arguido é empregado fabril, auferindo a quantia de € 960,00 (novecentos e sessenta euros); a arguida encontra-se desempregada, auferindo o subsídio de desemprego no valor de € 345,00 (trezentos e quarenta e cinco euros); vivem em casa própria; têm um veículo automóvel, da marca Mercedes, modelo 220, do ano de 2004; a arguida despende mensalmente em medicação a quantia de € 85,00 (oitenta e cinco euros) e em fisioterapia o valor mensal de cerca de € 100,00 (cem euros).
Pelo que, tendo em conta que o mínimo por cada dia de multa corresponde a 5€, quantia que deve ser aplicada em situações limite, de praticamente nenhuns ou parcos rendimentos, designadamente àqueles que nem sequer ganham o suficiente para fazer face às necessidades mais elementares, sob pena de se desvirtuar a essência da pena de multa e se criarem injustiças relativas entre os condenados, considerando que aos arguidos foi fixada a quantia de 5,50€ (quase a quantia mínima) por cada dia de multa, tudo ponderado, afigura-se-nos que tal quantia se mostra perfeitamente adequada, atenta a referida situação económica e financeira dos arguidos recorrentes, que, por isso, se mantém.
Assim, improcede, na totalidade o recurso.
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III – DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes da 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento ao recurso interposto pelos arguidos B… e C…, mantendo integralmente a decisão recorrida.
Custas pelos recorrentes, fixando-se em 4 UC’s a taxa de justiça a suportar por cada um deles.
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Porto, 29 de Abril de 2015
Elsa Paixão
Maria dos Prazeres Silva
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[1] Vide, por todos, JORGE FIGUEIREDO DIAS, in Direito Processual Penal, Volume I, página 205 e os Acórdãos do Tribunal Constitucional de 19 de Novembro de 1996, publicado no Diário da República, II Série, n.º 5, página 1571 e do Supremo Tribunal de Justiça de 06 de Abril de 2000, in Boletim do Ministério da Justiça, 496.º, página 169.
[2] Vide o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Novembro de 1986, disponível em www.dgsi.pt.
[3] Constitui um princípio natural de prova imposto pela lógica e pelo senso moral, pela probidade processual (cfr. CAVALEIRO FERREIRA, in Curso do Processo Penal, Volume II, página 310), ou um princípio fundamental do processo penal em qualquer Estado de Direito (cfr. JORGE FIGUEIREDO DIAS, in Direito Processual, Edição de 1974, página 214). Tratando-se de um princípio indiscutível no que concerne à apreciação da prova na decisão da “questão de facto”, tanto no que diz respeito à prova dos elementos constitutivos do crime, como à prova dos factos extintivos ou causas de exclusão da responsabilidade criminal – cfr. CAVALEIRO FERREIRA, in ob., cit., página 312 e JORGE FIGUEIREDO DIAS, in ob. cit., página 215.
[4] Disponível em www.dgsi.pt.
[5] In Lições Coligidas de Direito Processual Penal, Edição de 1988/1989, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, página 141.
[6] Veja-se ainda, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Outubro de 2000, disponível em www.dgsi.pt.