Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
604/13.1JAPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ERNESTO NASCIMENTO
Descritores: CRIME
HOMICÍDIO
DETENÇÃO
ARMA
USO DE ARMA DE FOGO
AGRAVAÇÃO
Nº do Documento: RP20171108604/13.1JAPRT.P1
Data do Acordão: 11/08/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 735, FLS.204-220)
Área Temática: .
Sumário: Ocorre a agravação do artº 86º 3 Lei 5/2006, se o crime de homicídio tentado foi cometido com arma de fogo, não ocorrendo a circunstancia qualificativa do artº 132º 1 e 2 al. h), ou esse uso não for elemento do tipo legal autónomo.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo Comum Colectivo 604/13.1JAPRT da Comarca do Porto, Porto, Instância Central, Secção Criminal, J10

Relator - Ernesto Nascimento
Adjunto – José Piedade

Acordam, em conferência, na 2ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório

I. 1. Efectuado o julgamento – no que ao caso aqui releva - foram condenados os arguidos,

A – B…, como autor material, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.º/1 C Penal, na pena de 3 meses de prisão;
- como co-autor, de um crime de homicídio, na forma tentada, com dolo eventual, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 14.º/3, 22.º, 23.º, 73.º e 131.º C Penal, na pena de 3 anos de prisão – ofendido C….
- como co-autor, de um crime de homicídio, na forma tentada, com dolo eventual, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 14.º/3, 22.º, 23.º, 73.º e 131.º C Penal, na pena de 3 anos de prisão – ofendido D….
- como co-autor, de um crime de homicídio, na forma tentada, com dolo eventual, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 14.º/3, 22.º, 23.º, 73.º e 131.º C Penal, na pena de 2 anos e 8 meses de prisão – ofendido E….
- na pena unitária de 5 anos de prisão, cuja execução se suspendeu, por igual período de tempo, acompanhada de regime de prova, mediante plano de reinserção social a elaborar pelos competentes serviços da DGRSP e sujeição ao cumprimento das seguintes regras de conduta, com apoio e fiscalização da aludida entidade:
- não contactar, por qualquer meio, com os ofendidos nos crimes aqui ajuizados;
- não ter em seu poder qualquer tipo de armas;
B – F…,
- como co-autor, de um crime de homicídio, na forma tentada, com dolo eventual, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 14.º/3, 22.º, 23.º, 73.º e 131.º C Penal, na pena de 3 anos e 2 meses de prisão – ofendido C…;
- como co-autor, de um crime de homicídio, na forma tentada, com dolo eventual, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 14.º/3, 22.º, 23.º, 73.º e 131.º C Penal, na pena de 3 anos e 2 meses de prisão – ofendido D…;
- como co-autor, de um crime de homicídio, na forma tentada, com dolo eventual, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 14.º/3, 22.º, 23.º, 73.º e 131.º C Penal, na pena de 2 anos e 10 meses de prisão – ofendido E…;
- na pena unitária de 5 anos de prisão, cuja execução se suspendeu por igual período, acompanhada de regime de prova, mediante plano de reinserção social a elaborar pelos competentes serviços da DGRSP e sujeição ao cumprimento das seguintes regras de conduta, com apoio e fiscalização da aludida entidade:
- não contactar, por qualquer meio, com os ofendidos nos crimes aqui ajuizados;
- não ter em seu poder qualquer tipo de armas.

2. Inconformada com o assim decidido, recorre a Magistrada do MP pugnando pela aplicação aos arguidos B… e F…, pela prática dos crimes de homicídio sob a forma tentada, a agravação decorrente do artigo 86.º/3 da Lei 5/2006, e, consequentemente, de penas parcelares e de penas únicas, em quantum superior ao decidido, não suspensas na sua execução, rematando a motivação com as conclusões que se passam a transcrever:
1. o arguido B… foi condenado na douta decisão recorrida, como autor material, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143º, nº1 do CP, na pena de 3 meses de prisão; como co-autor, de um crime de homicídio, na forma tentada, com dolo eventual, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 14º, nº3, 22º, 23º, 73º e 131º, todos do C.P., na pena de 3 (três) anos de prisão (quanto ao ofendido C…), de um crime de homicídio, na forma tentada, com dolo eventual, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 14º, nº3, 22º, 23º, 73º e 131º, todos do C.P., na pena de 3 (três) anos de prisão (quanto ao ofendido D…) e de um crime de homicídio, na forma tentada, com dolo eventual, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 14º, nº3, 22º, 23º, 73º e 131º, todos do C.P., na pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão (quanto ao ofendido E…) e, nos termos dos arts. 77º e 78º do CP, em cúmulo jurídico das preditas penas parcelares, na pena unitária de 5 anos de prisão;
2. foi também decidido, nos termos conjugados dos arts. 50º, nºs 1, 2, 3 e 5, 52º, nº1 e nº2, al. f), 53º e 54º, todos do C.P., suspender a execução da pena única de prisão aplicada ao arguido B… por cinco anos, acompanhada de regime de prova, mediante plano de reinserção social e sujeição ao cumprimento das seguintes regras de conduta, com apoio e fiscalização da aludida entidade:
- não contactar, por qualquer meio, com os ofendidos nos crimes aqui ajuizados;
- não ter em seu poder qualquer tipo de armas;
3. o arguido F… foi condenado na douta decisão recorrida, pela prática, como co-autor, de um crime de homicídio, na forma tentada, com dolo eventual, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 14º, nº3, 22º, 23º, 73º e 131º, todos do C.P., na pena de 3 (três) anos e 2 (dois) meses de prisão (quanto ao ofendido C…), de um crime de homicídio, na forma tentada, com dolo eventual, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 14º, nº3, 22º, 23º, 73º e 131º, todos do C.P., na pena de 3 (três) anos e 2 (dois) meses de prisão (quanto ao ofendido D…) e de um crime de homicídio, na forma tentada, com dolo eventual, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 14º, nº3, 22º, 23º, 73º e 131º, todos do C.P., na pena de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão (quanto ao ofendido E…) e, nos termos dos arts. 77º e 78º do CP, em cúmulo jurídico das preditas penas parcelares, na pena unitária de 5 anos de prisão;
4. foi também decidido, nos termos conjugados dos arts. 50º, nºs 1, 2, 3 e 5, 52º, nº1 e nº2, al. f), 53º e 54º, todos do C.P., suspender a execução da pena única de prisão aplicada ao arguido F… por cinco anos, acompanhada de regime de prova, mediante plano de reinserção social e sujeição ao cumprimento das seguintes regras de conduta, com apoio e fiscalização da aludida entidade:
- não contactar, por qualquer meio, com os ofendidos nos crimes aqui ajuizados;
- não ter em seu poder qualquer tipo de armas;
5. ora, não obstante nada se apontar quanto à demais qualificação jurídico-penal dos factos provados levada a cabo na douta decisão recorrida, não se pode, salvo o devido e elevadíssimo respeito, acolher a apreciação que levou a que, excluindo-se a qualificação dos crimes de homicídio sob a forma tentada provados, não fossem estes objeto, em vez daquela qualificação, da agravação resultante do artº86º, nº3, da Lei das Armas – Lei nº5/2006;
6. com efeito, é de entender, que os crimes em causa, não sendo qualificados nos termos da circunstância qualificativa resultante da previsão legal da alínea h) do nº2 do artº 132º do Código Penal (excluída, de igual modo, a circunstância qualificativa relativa à prática juntamente, com pelo menos, mais duas pessoas, que “cai” com a exclusão da comparticipação do co-arguido G… nos crimes de homicídio tentado), certo é que não se acompanha o juízo efetuado quando não se considera a utilização de arma de fogo, nos termos gerais previstos no artº86º da Lei nº5/2006 de 23.02 (Regime Jurídico das Armas e suas munições);
7. de acordo com o disposto no artº86º, nº3, da Lei nº5/2006: «As penas aplicáveis a crimes cometidos com arma são agravadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo, excepto se o porte ou uso de arma for elemento do respectivo tipo de crime ou a lei já previr agravação mais elevada para o crime, em função do uso ou porte de arma»;
8. sendo que, no respectivo nº 4 se prevê o seguinte: «Para os efeitos previstos no número anterior, considera-se que o crime é cometido com arma quando qualquer comparticipante traga, no momento do crime, arma aparente ou oculta prevista nas alíneas a) a d) do nº 1, mesmo que se encontre autorizado ou dentro das condições legais ou prescrições da autoridade competente»;
9. assim sendo, é de entender que resulta deste regime que a agravação prevista só não terá lugar quando «o porte ou uso de arma for elemento do respectivo tipo de crime ou a lei já previr agravação mais elevada para o crime, em função do uso ou porte de arma»;
10. a Jurisprudência vem definindo como deve operar tal agravação genérica em situações concretas, invocando-se, entre outros o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22.05.2013 (Proc. nº455/12.0PCLSB.L1-3) segundo o qual: “O uso ou porte de arma não é elemento do crime de homicídio, cujo tipo legal fundamental é o previsto no artº 131º do CP. Pode ser um factor de agravação, mas só o será se, para além de preencher um dos exemplos-padrão «meio particularmente perigoso» ou «prática de um crime de perigo comum» da alínea h) do nº 2 do artº 132º, revelar «especial censurabilidade ou perversidade». Enquanto a agravação do nº 3 do artº 86º, encontrando fundamento num maior grau de ilicitude, tem sempre lugar se o crime for cometido com arma, a do artº 132º só operará se o uso de arma ocorrer em circunstâncias reveladoras de uma especial maior culpa. Além, para haver agravação, basta o uso de arma no cometimento do crime; aqui não.
O nº 3 do artº 86º só afasta a agravação nele prevista nos casos em que o uso ou porte de arma seja elemento do respectivo tipo de crime ou dê lugar, por outra via, a uma agravação mais elevada. A agravação do artº 86º, nº 3, não é arredada ante a mera possibilidade de haver outra agravação, mas apenas se for de accionar efectivamente essa outra agravação”;
11. entendeu ainda o S.T.J. no Acórdão de 31-03-2011 (Proc. 361/10.3GBLLE) o seguinte:
“I - O uso ou porte de arma não é elemento do crime de homicídio, cujo tipo legal fundamental é o previsto no art. 131.º do CP; pode ser um factor de agravação, mas só o será se, para além de preencher um dos exemplos-padrão «meio particularmente perigoso» ou «prática de um crime de perigo comum» da al. h) do n.º 2 do art. 132.º, revelar «especial censurabilidade ou perversidade». Enquanto que a agravação do n.º 3 do art. 86.º, encontrando fundamento num maior grau de ilicitude, tem sempre lugar se o crime for cometido com arma, a do art. 132.º só operará se o uso de arma ocorrer em circunstâncias reveladoras de uma especial maior culpa. Além, para haver agravação, basta o uso de arma no cometimento do crime, aqui não.
II - O n.º 3 do art. 86.º só afasta a agravação nele prevista nos casos em que o uso ou porte de arma seja elemento do respectivo tipo de crime ou dê lugar, por outra via, a uma agravação mais elevada. A agravação do art. 86.º, n.º 3, não é arredada ante a mera possibilidade de haver outra agravação, mas apenas se for de accionar efectivamente essa outra agravação. Ora, o uso de arma não é elemento do crime de homicídio, e, no caso, não levou ao preenchimento do tipo qualificado do art.132.º, pelo que não há fundamento para afastar a agravação do art. 86.º, n.º 3”;
12. no caso concreto, e não sendo, evidentemente, o uso de arma um dos elementos típicos do crime de homicídio, o tribunal a quo deliberou no sentido do afastamento, no caso, da circunstância qualificativa prevista no nº2, al.h), do artº 132º do Código Penal, invocada na acusação pública, designadamente por se entender que o uso de arma de fogo não integra um meio particularmente perigoso no cometimento do crime-base, logo, não revelando especial censurabilidade ou perversidade;
13. mas tal afastamento da circunstância qualificativa em causa em nada obsta a que fosse accionada, antes, a referida agravação genérica, em termos de maior ilicitude do facto, em função do comprovado cometimento pelos arguidos dos crimes com recurso a armas de fogo;
14. com efeito provou-se que “os arguidos B… e G… surgiram às janelas da residência, sita no …, em …, nº .., casa …, … andar, no Porto, que se encontravam abertas, e o arguido F… assomou à entrada da porta dessa casa, e empunhando cada um dos arguidos B… e F… uma arma de fogo, de características e de dimensões não concretamente apuradas, e o arguido G… um objeto não concretamente identificado que aparentava ser uma arma de fogo, apontaram-nas na direção dos ofendidos C…, D… e E…, a uma distância situada entre os cinco e os quinze metros, e efetuaram, pelo menos os arguidos B… e F…, com aquelas armas de fogo entre 10 e 20 disparos de projéteis na direção dos mesmos;
15. e ainda que “Um dos disparos que foram efetuados pelo arguido F… atingiram o C… no antebraço e um disparo efetuado pelo arguido B… ou pelo arguido F… atingiu o D… na região lombar, de raspão.” e que “O E… não foi atingido por nenhum dos disparos em qualquer órgão, por motivos estranhos à vontade dos arguidos B… e F…”;
16. concluindo-se, a final dos factos provados que “Os arguidos B… e F… atuaram conjugadamente, de acordo com um plano gizado entre eles no sentido de ambos dispararem projéteis de arma de fogo sobre os ofendidos E…, C… e D…, de modo a que fosse possível atingi-los nos respetivos corpos e, caso tal sucedesse e fossem atingidos órgãos vitais destes, assim lhes causar a morte, não se abstendo de agirem do modo descrito ainda que soubessem que tal ocorrência podia provir das suas atuações”;
17. deveria, pois, ter sido considerado que, não obstante não ter sido possível apreender e examinar as armas de fogo efetivamente utilizadas pelos dois referidos arguidos, certo é que se provou terem sido usadas para atingir os ofendidos tal tipo de armas, o que de per se basta para a aplicação da agravação resultante do artigo 86.º/3 da Lei das Armas;
18. pelo que se pugna agora pela aplicação, tendo em conta a moldura penal abstratamente aplicável ao crime de homicídio simples, p. e p. pelo artº131º, nº1, do Código Penal, da agravação de um terço nos limites mínimos e máximos respectivos, ao abrigo do disposto no artigo 86.º/3 da Lei 5/2006 (após aplicação da atenuação resultante dos artigos 23.º, n.º 2, e 73º do Código Penal);
19. tendo em conta o supra alegado, ainda que sem aplicação da agravação referida, não se pode acompanhar a douta decisão recorrida, em matéria de direito, quando vem a aplicar aos arguidos as penas parcelares de:
- quanto aos três crimes de homicídio tentados (ofendidos C…, D… e E…):
» Tentativas (duas) reportadas aos ofendidos C… e D…:
- Arguido B…: pena de 3 anos de prisão por cada um deles.
- Arguido F…: pena de 3 anos e 2 meses de prisão por cada um deles.
» Tentativa (uma) reportada ao ofendido E…:
- Arguido B…: pena de 2 anos e 8 meses de prisão.
- Arguido F…: pena de 2 anos e 10 meses de prisão;
20. no que se afigura tratarem-se de penas de prisão inferiores ao que seria um “quantum” adequado, dentro dos limites obtidos pela moldura penal abstratamente aplicável o que, por maioria de razão, seria sempre de apontar à medida concreta das mencionadas penas parcelares, caso se entenda ser de aplicar, em concreto, a agravação resultante do disposto no artigo 86.º/3 da Lei das Armas, tal como propugnado supra;
21. significa isto, na prática, que a pena concreta a aplicar a cada um dos apontados crimes de homicídio tentado há-de encontrar-se entre um limite mínimo da moldura penal aplicável de 2 (dois) anos, 2 (dois) meses e 23 (vinte e três) dias e um limite máximo de 14 (catorze) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias;
22. de facto, não se pode obviar, como o fez o tribunal a quo neste segmento da decisão recorrida, à gravidade objectiva e ilicitude muito elevada dos factos, nem se pode desvalorizar a culpa dos arguidos, nem ignorar as características de personalidade por estes evidenciadas, nem os antecedentes criminais respectivos e a ausência de uma situação de inserção socio-laboral estável de ambos, tudo conjugado a impor penas de prisão e, sobremaneira, uma pena única de prisão em quantum superiores e mais expressivos, de modo a garantir as elevadíssimas exigências de prevenção geral, mas também de prevenção especial em concreto evidenciadas;
23. de facto, não será de mais sublinhar que não deve ser de algum modo desvalorizada a gravidade e a ilicitude dos actos praticados por ambos os arguidos – que dispararam, em pleno dia, do interior de uma residência para a via pública, munidos com armas de fogo, na direcção das vítimas, estando estas em situação de desprotecção e desarmados (nada se provando em contrário), ao que tudo indica, colocando em perigo quer as vítimas atingidas, quer os terceiros que ali fortuitamente se encontrassem;
24. quanto às penas parcelares aplicadas aos dois crimes de homicídio tentado perpetrado contra os ofendidos C… e D…, não se pode deixar de ressaltar que a medida da pena deveria ter reflectido em maior medida as assinaladas gravidade e ilicitude elevadas daquelas condutas e o modo da prática da tentativa, ou seja, com o uso de armas de fogo, as quais, aliás, tudo indica que os arguidos dissimularam e ocultaram logo de seguida aos factos, não tendo sido possível às autoridades policiais apreende-las e assim por termo ao risco potencial de serem de novo utilizadas em circunstâncias semelhantes, pelos arguidos ou outrem a quem as tenham entregado;
25. bastam as referidas circunstâncias para avaliar as exigências de prevenção especial e geral como elevadíssimas, face à facilidade com que actualmente, na nossa sociedade, se cometem crimes contra bens jurídico-penais eminentemente pessoais (por vingança, disputas familiares ou entre conhecidos e vizinhos) com o uso de armas brancas ou de fogo;
26. tal tendência social, que aqui se evidencia na reacção desproporcionada, injustificada e potencialmente letal dos arguidos face à abordagem dos ofendidos e irmão H…, tem que merecer do sistema judicial uma mensagem de censura clara e inequívoca, a dirigir em concreto aos agentes de crimes com tais contornos de gravidade e perigosidade, que podem resvalar para condutas de “justiça pelas próprias mãos” e fomentar a vindicta privada, em termos interpessoais e grupais;
27. porém, em termos da medida das penas parcelares aplicadas quanto aos dois referidos crimes de homicídio tentado, em concreto, pouco se marca esta acrescida censurabilidade das condutas (designadamente, também por referência ao outro crime de homicídio tentado visando o E…), quando dos factos perpassa a evidência de uma vontade, ainda que a título de dolo eventual, dos dois arguidos de, com as suas condutas, tirarem a vida aos ofendidos, atingindo efetivamente os dois referidos irmãos C… e D…, de entre o grupo que se aproximou do local onde se aboletavam, sendo certo que qualquer um dos seus integrantes poderia ter sido atingido mortalmente com disparos efetuados pelos arguidos na direcção da via pública;
28. impõe-se ter em conta que, de acordo com o estipulado no artigo 40.º/1 C Penal, as finalidades da pena são a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade;
29. impunha-se igualmente ter em devida conta o estipulado no artigos 70.º e 71.º do Código Penal, quanto aos critérios legais para escolha e determinação da medida da pena, designadamente os factores previstos nas alíneas a), c) e e), do n.º 2 do referido artigo 71.º, por não se atender de modo claro e bastante na fundamentação ao grau de ilicitude e modo de execução dos factos, aos motivos que os determinaram e às condutas dos arguidos anteriores e posteriores aos factos;
30. de realçar que as exigências de prevenção geral, afiguram-se, na verdade, como sendo muito elevadas e acima do normal, por todas as circunstâncias concretas das condutas dos arguidos, mas sobremaneira porque está em causa o bem jurídico-penal cimeiro no nosso sistema jurídico-constitucional – o direito à vida – sendo este tipo de ofensa contra a vida do outro aquela que mais justos sentimentos de insegurança inculca na generalidade dos cidadãos, bem como de indução de limitação de liberdade de movimentos no espaço público;
31. ora, ambos os arguidos têm antecedentes criminais, ambos fizeram desaparecer as armas de fogo que utilizaram, omitindo a sua entrega, como deviam, às autoridades, não prestaram declarações perante o tribunal colectivo de modo a tornar compreensíveis os motivos eventualmente atendíveis das suas condutas, e nenhum deles tomou qualquer iniciativa para compensar os ofendidos dos danos sofridos;
32. as exigências de prevenção geral impunham, pois, uma reacção penal expressiva também face à comunidade em geral, como já defendido supra, atenta a aludida percepção geral de insegurança causada por crimes desta natureza, tendo ainda em conta que se trataram de crimes cometidos em espaço público, com disparos na direcção da via pública, em pleno dia e em zona habitacional da cidade;
33. não foi de igual modo devidamente valorado, além das já mencionadas elevadas exigências de prevenção geral, o nível das exigências de prevenção especial, que se reputa de muito elevado, face ao percurso de vida e características de personalidade desconforme à norma evidenciados pelos arguidos;
34. salvo melhor opinião, não foram, nessa perspectiva, devidamente levados em conta os antecedentes criminais dos arguidos, atendendo às condenações penais anteriores, afigurando-se ter sido acolhida, sem mais, uma visão acrítica da sua inserção social veiculada nos relatórios sociais;
35. com efeito, o tribunal a quo não atendeu adequadamente, neste segmento da decisão, quanto ao arguido B…, que por decisão transitada em 10.09.2013, este foi condenado pela prática, em 15.07.2009, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º do DL 15/93, de 22.01, na pena de 4 anos e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo com sujeição a regime de prova;
36. por outro lado, quanto ao arguido F…, é de sublinhar que este apresenta os seguintes antecedentes criminais:
- No processo n° 1128/05.6PAVNG da 1ª Vara de Competência Mista de V. N. de Gaia, foi condenado, por decisão de 11.06.2007, transitada em julgado a 26.06.2007, pela prática em 08.09.2005, de um crime de furto, p. e p. pelo art. 203º, nº 1 do CP, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de €4. Por decisão de 02.02.2010 tal pena foi declarada extinta pelo pagamento.
- No processo n° 589/06.0GCVNG da 2ª Vara de Competência Mista de V. N. de Gaia, foi condenado, por decisão de 05.12.2007, transitada em julgado a 17.01.2008, pela prática em 26.10.2006, de três crimes de roubo, p. e p. pelo art. 210º, nº 1 do CP, dois crimes de roubo, p. p. e p. pelo art. 210º, nº l1, com referência ao art. 204º, nº1, al. f), do CP, na pena única de 1 ano de prisão substituída por 365 dias de multa, à taxa diária de €5. Por decisão de 19.01.2011 tal pena foi declarada extinta pelo pagamento da multa.
- No processo n° 728/09.0PHVNG do 1º Juízo Criminal de V.N. de Gaia, foi condenado, por decisão de 29.10.2009, transitada em julgado a 18.11.2009, pela prática em 20.10.2009, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º, nº1 do DL 2/98, de 03.01, na pena de três meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano, com sujeição a deveres. Por decisão de 10.10.2013, tal pena foi declarada extinta pelo cumprimento.
- No processo n° 1946/11.6PJPRT do 3º Juízo (1ª Secção) Criminal do Porto, foi condenado, por sentença de 14.05.2013, transitada em julgado a 14.06.2013, pela prática em 07.11.2011, de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo art. 25º do DL 15/93, de 22.01, na pena de 16 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo.
- No processo n° 580/14.3PTPRT da Secção Criminal da Inst. Local do Tribunal de Matosinhos (Comarca do Porto) – J3, foi condenado, por decisão de 09.09.2014, transitada em julgado a 09.10.2014, pela prática em 08.09.2014, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art. 292º, nº1 do CP, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 5 e na pena acessória de proibição de condução de veículos motorizados pelo período de 3 meses. Por decisões de 07.12.2015 e 14.12.2015, respetivamente, tais penas (principal e acessória) foram declaradas extintas pelo cumprimento;
37. perante estas condenações anteriores, embora relativas a crimes de diversa natureza e punidos sempre com penas não privativas da liberdade, certo é que, numa perspectiva de prevenção especial, não se tratam de percursos com indicadores positivos que permitam formular um juízo de menor necessidade da pena de prisão;
38. há que ponderar também, com outro peso e outra medida, as condições de inserção sócio-económica que ambos os arguidos apresentam, não se tendo atendido a que não revelam percursos laborais minimamente consistentes, nem evidenciam um quotidiano estruturado à volta de uma actividade lícita conhecida, dependendo de trabalhos esporádicos não concretizados, da ajuda de familiares ou de subsídios sociais – o que tudo aconselha uma reacção do sistema penal expressiva no sentido de garantir efetivamente a sua ressocialização de modo sério, fundado e estruturado;
39. assim, deveria optar-se por penas parcelares mais elevadas – menos próximas do limite mínimo da pena aplicável em abstracto ao crime de homicídio tentado em causa – ao menos naqueles visando os ofendidos C… e D…, efetivamente atingidos por projécteis disparados de armas de fogo;
40. por conseguinte, afigura-se que o tribunal a quo não ponderou devidamente os pressupostos legais previstos nos artigos 40.º/1 e 71.º/1 e 2 alíneas a), b), e) e f) C Penal, sendo de sublinhar a gravidade das condutas adoptadas pelos arguidos;
41. é de entender, pois, que deveria ter sido aplicada aos arguidos, pela prática de dois dos crimes de homicídio tentado em causa (C… e D…):
- ao arguido B…: uma pena de prisão não inferior a 4 anos de prisão;
- ao arguido F…: uma pena de prisão não inferior a 4 anos de prisão;
42. quanto às penas únicas aplicadas, há que ter em conta que, na determinação da pena conjunta é fundamental a visão de conjunto dos factos, a conexão dos factos entre si e a relação «desse bocado de vida criminosa» com a personalidade do arguido, mediante uma valoração completa da pessoa do arguido e das diversas penas parcelares em causa, devidamente fundamentada;
43. a medida concreta da pena do concurso é determinada, tal como a medida das penas parcelares, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, mas ainda levando em linha de conta um critério específico: a consideração em conjunto dos factos e da personalidade do agente;
44. assim, a nosso ver, a pena única aplicada aos arguidos não foi encontrada mediante essa apreciação verdadeiramente “panóptica” do tribunal a quo sobre o significado dos factos e a sua integração no percurso criminal de cada um dos arguidos, pois não retribui adequadamente a sua culpa, de forma ajustada sobretudo às exigências de prevenção geral, mediante uma verdadeira visão global do significado dos factos e da personalidade do arguido, omitindo uma aplicação razoável e suficientemente fundada do regime previsto nos artigos 40.º, 71.º e 77.º/1 e 2 C Penal;
45. de facto, dando-se nesta parte por reproduzida toda a argumentação exposta supra quanto à medida das penas parcelares, também nesta fase decisória se deveria ponderar com maior peso que no conjunto dos factos em causa se percepciona uma tendência criminosa dos arguidos, ambos capazes de utilizar armas de fogo contra as pessoas, o que impõe um efeito agravante dentro da moldura penal abstractamente aplicável ao concurso, sendo de concluir que a pena única fixada para cada um dos arguidos está aquém das exigências de prevenção geral e especial evidenciadas;
46. por conseguinte, de acordo com uma aplicação ponderada dos critérios legais do cúmulo jurídico de penas, nos termos do disposto no artigo 77.º/1 C Penal, seria de aplicar: ao arguido B…, tendo em conta as penas parcelares que seriam de atingir, deveria ser aplicada uma pena única não inferior a 6 anos de prisão;
47. quanto ao arguido F…, tendo em conta as penas parcelares que seriam de atingir, deveria ser aplicada uma pena única não inferior a 6 anos de prisão;
48. assim sendo, ao decidir como referido quanto à determinação concreta das penas parcelares em causa e da pena única de prisão aplicadas, o tribunal a quo violou o disposto nos artigos 40.º/1, 70.º e 71.º/1 e 2 alíneas a), c) e e) C Penal, bem como o artigo 77.º/1 do mesmo diploma legal;
49. quanto à suspensão da execução das penas de prisão aplicadas aos arguidos B… e F…, sempre se diga que, face ao pretendido supra quanto à medida da pena única de aplicar aos arguidos, decorre que se torna legalmente inadmissível a aplicação do instituto da suspensão da execução da pena, atento o disposto no artigo 50.º/1 C Penal;
50. aliás, mesmo concedendo na pena única atingida no douto acórdão recorrido, não se afigura fundado nem adequado às circunstâncias dos factos conceder aos arguidos o voto de confiança traduzido na convicção de que a mera ameaça da pena, enquanto medida penal com reflexos sobre o seu comportamento futuro, evitará a repetição de comportamentos delituosos da mesma natureza;
51. não deveria, por conseguinte, em nenhuma das hipóteses, optar-se pela suspensão da execução da pena de prisão, nos termos do artigo 50.º C Penal, sobretudo tendo em conta razões de prevenção geral de integração, o tipo de crime em causa e a gravidade do mesmo em concreto, tudo a reclamar uma pena de prisão efectiva, sem o que a tutela dos bens jurídicos violados e as expectativas comunitárias em ver punidos tais crimes de forma firme ficam irremediavelmente fragilizadas;
52. pelo exposto, ao decidir como referido quanto à determinação concreta das referidas penas parcelares e da pena única de prisão, bem como quanto à suspensão da execução das penas únicas aplicadas, o tribunal a quo violou o disposto nos artigos 40.º/1, 50.º/1, 70.º, 71.º e 77.º/1 C Penal.

I. 3. Responderam os arguidos pugnando pelo não provimento do recurso.

II. Subidos os autos a este Tribunal o Sr. Procurador da República, aderindo à motivação do recurso, entende, da mesma forma, que o recurso merece provimento.

No exame preliminar o relator deixou exarado o entendimento de que o recurso foi admitido com o efeito adequado e que nada obstava ao seu conhecimento e, na mesma ocasião em cumprimento do estatuído no artigo 425.º/4 C P Penal ordenou-se a notificação dos arguidos, através do ilustre defensor, nos termos e para os efeitos do artigo 358.º/1 e 3 C P Penal, para querendo se pronunciarem em 10 dias sobre a possibilidade de alteração da qualificação jurídica dos factos constantes da acusação e, agora, da decisão recorrida, nos termos pugnados no recurso do MP, para um crime de homicídio tentado, simples, agravado, nos termos do artigo 86.º/3 da Lei das Armas.

Seguiram-se os vistos legais.

Foram os autos submetidos à conferência e dos correspondentes trabalhos resultou o presente acórdão.
III. Fundamentação.
III. 1. Tendo presente que o objecto dos recursos é balizado pelas conclusões da motivação apresentada pelo recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas - a não ser que sejam de conhecimento oficioso - e, que nos recursos se apreciam questões e não razões, bem como, não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, então, as questões suscitadas no presente são, tão só, a de saber se, é caso de agravação dos crimes de homicídio sob a forma tentada em que foram condenados os arguidos; de qualquer forma, é caso de agravar as penas parcelares e as penas únicas impostas aos arguidos e, de não decretar a suspensão da execução destas últimas.

III. 2. Vejamos, então, para começar, os fundamentos da decisão recorrida.

III. 2. 1. Primeiramente, a matéria de facto definida pelo Tribunal recorrido.
Factos provados
1 – Na madrugada do dia 20 de Março de 2013, H… deslocou-se ao Café I…, sito no Largo …, em …, no Porto, onde também se encontravam os arguidos B… e G….
2 – O H…, encontrando-se embriagado, questionou aqueles arguidos, em tom provocatório, porque é que estavam a olhar para ele; então, o arguido B… desferiu um soco na cabeça do H…, após o que o arguido G… também desferiu a este socos na cabeça, nomeadamente na face, o que tudo provocou a queda ao chão do H….
3 – Cada um dos arguidos, sabendo que tal não podia nem devia fazer, decidiu maltratar o ofendido, H…, no seu corpo e na sua saúde.
4 - O ofendido H… foi assistido no Hospital J….
5 - Com a atuação acima descrita os arguidos B… e G… provocaram no ofendido H… as dores e lesões descritas nos registos clínicos de fls. 50 a 53 e no relatório de exame médico de fls. 283 a 285 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, nomeadamente:
- Traumatismo da cabeça com atingimento no olho;
- Traumatismo (edema) da face, com limitação na abertura total da boca, que se prolongava até à região perioricular, com hemorragia conjuntival do olho direito, associado a visão turva.
- Hematoma marcado na face à direita;
- Hemorragia Conjuntival do olho direito.
6 - Tendo tais dores e lesões provocado no H… período de doença nunca superior a 5 dias, sem afetação da capacidade do trabalho geral e profissional.
7 – Cada um dos arguidos atuou de forma deliberada, livre e consciente, pretendendo e conseguindo atingir, lesar e causar mal-estar no corpo e na saúde do ofendido.
8 - Sabiam que o seu respetivo comportamento era proibido e punido por lei penal.
9 - O ofendido H…, que ficou com ferimentos visíveis na cara, dirigiu-se para casa e contou aos seus irmãos, os ofendidos, C…, D… e E… o que havia sucedido.
10 - Indignados com o sucedido, C…, o D… e o E… decidiram deslocar-se para o Largo …, no Porto, por saberem que ali residia o arguido G…, com a alcunha “G1…”, com o propósito de se vingar deste pelas agressões perpetradas ao seu irmão H…, agredindo-o também fisicamente.
11 - Em execução de tal desígnio os ofendidos, no início da tarde, do dia 21 de Março de 2013, dirigiram-se ao Largo …, em …, no Porto. Aí chegados, os ofendidos C… e D… gritavam em voz alta: “Oh G1… anda cá baixo”.
12 - De imediato os arguidos B… e G… surgiram às janelas da residência, sita no Largo …, em …, nº .., casa …, … andar, no Porto, que se encontravam abertas, e o arguido F… assomou à entrada da porta dessa casa, e empunhando cada um dos arguidos B… e F… uma arma de fogo, de características e de dimensões não concretamente apuradas, e o arguido G… um objeto não concretamente identificado que aparentava ser uma arma de fogo, apontaram-nas na direção dos ofendidos C…, D… e E…, a uma distância situada entre os cinco e os quinze metros, e efetuaram, pelo menos os arguidos B… e F…, com aquelas armas de fogo entre 10 e 20 disparos de projéteis na direção dos mesmos.
13 – Um dos disparos que foram efetuados pelo arguido F… atingiram o C… no antebraço e um disparo efetuado pelo arguido B… ou pelo arguido F… atingiu o D… na região lombar, de raspão.
14 – O E… não foi atingido por nenhum dos disparos em qualquer órgão, por motivos estranhos à vontade dos arguidos B… e F….
15 - De imediato o C… e o D… foram conduzidos, ao Serviço de Urgência do Hospital J…, onde deram entrada às 16.36 horas e pelas 16h44m, respetivamente, do dia 21 de Março de 2013.
16 - Em consequência direta e necessária do disparo efetuado pelo arguido F… com que foi atingido C… resultaram para este as dores e lesões descritas no relatório de exame médico de fls. 319 a 321 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, designadamente:
- Duas cicatrizes, elíticas, hiperpigmentadas, castanhas, de maior eixo horizontal situada no membro superior direito: uma, com área central deprimida, na parte medial da região anterior do terço médio do antebraço, com 1,1x0,70cm de maiores dimensões-orifício de entrada de projétil; outra de 0,5cm para cima e 3,6cm para trás da anterior, no bordo medial do terço médio do antebraço, com 0,5x0,7cm de maiores dimensões – orifício de saída de projétil.
17 - Tendo tais dores e lesões provocado 20 dias de doença, com afetação da capacidade de trabalho geral e sem afetação da capacidade do trabalho profissional.
18 - Em consequência direta e necessária do disparo efetuado pelo arguido B… ou F… com que foi atingido o D…, este sofreu as lesões descritas no relatório de exame médico de fls. 315 a 317, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, nomeadamente:
- Cicatriz roxa e nacarada, na região lombar à esquerda, ligeiramente obliqua para baixo e para dentro, iniciando-se medialmente a 4 cm da linha média, mais profunda nos dois terços laterais com 6x0,5cm de maiores dimensões, situada no abdómen.
19 - Tendo tais dores e lesões provocado 18 dias de doença, sem afetação da capacidade de trabalho geral e sem afetação do trabalho profissional.
20 - Os arguidos B… e F… agiram de forma deliberada, livre e consciente, tendo representado a possibilidade de com as suas condutas virem a tirar a vida a C…, D… e E…, e conformaram-se com esse possível resultado, não se abstendo de atuar da forma descrita, sendo que a morte só não adveio para os ofendidos porque aqueles arguidos não lograram atingir qualquer órgão vital dos mesmos; e só não conseguiram atingir o E… com nenhum dos disparos que efetuaram, em nenhum órgão, por motivos estranhos à sua vontade, tendo os arguidos, contudo, previsto tal possibilidade e de que daí pudesse sobrevir a morte deste ofendido, conformando-se igualmente com tal facto e, em conformidade, não se abstendo de atuar da forma referida.
21 – Os arguidos B… e F… atuaram conjugadamente, de acordo com um plano gizado entre eles no sentido de ambos dispararem projéteis de arma de fogo sobre os ofendidos E…, C… e D…, de modo a que fosse possível atingi-los nos respetivos corpos e, caso tal sucedesse e fossem atingidos órgãos vitais destes, assim lhes causar a morte, não se abstendo de agirem do modo descrito ainda que soubessem que tal ocorrência podia provir das suas atuações.
22 – Mais sabiam os arguidos B… e F… que as suas descritas condutas eram proibidas e punidas por lei e os faziam incorrer em responsabilidade criminal.
23 – O Demandante D…, antes das agressões, era uma pessoa saudável, alegre, dinâmica, extrovertida, bem-disposta.
24 – Tais agressões causaram ao demandante tristeza e abalo psico-emocional.
25 – O demandante sofreu dores decorrentes da agressão de que foi alvo, especialmente durante os tratamentos a que foi sujeito.
26 – As lesões sofridas pelo Demandante C… causaram-lhe fortes dores e abalo psíquico, que se prolongaram por muito mais tempo que os 20 dias de imobilização por doença a que esteve sujeito, e que ainda hoje se fazem sentir no braço atingido, que se agravam com os esforços musculares mais violentos.
27 – Tais dores foram muito violentas e obrigaram o ofendido a permanecer, pelo menos até à data da consolidação médico-legal das lesões, em 10-04-2013, sob o efeito de analgésicos e medicação.
28 – Nesse mesmo período, tais dores geravam impossibilidade de o demandante C… proceder à sua higiene pessoal, de se alimentar sem dificuldade, e sobretudo na dificuldade em dormir e conseguir uma posição cómoda de descanso, provocando-lhe cansaço físico.
29 – O demandante C…, à data dos factos, tinha dois filhos, hoje com 13 e 12 anos de idade, que assistiram e comprovaram o estado em que o pai lhe apareceu após a saída do hospital no dia 21.03.2013.
30 - O demandante C…, durante pelo menos os dois primeiros meses subsequentes aos factos ajuizados e por causa destes, sentiu medo de sair sozinho à rua, seja para levar os filhos à escola, seja para assegurar a mais elementar necessidade da vida de casa.
31 – Nesse mesmo período, ficou privado do convívio social com as suas relações de amizade, deixando de frequentar cafés, tomar refeições fora de casa, frequentar estabelecimentos comerciais e de fazer passeios com amigos.
32 – O demandante E…, no momento dos factos, temeu pela sua vida, tendo ficado aterrorizado porque representou a sua morte iminente, face à quantidade de tiros contra si dirigidos.
33 – Ficando desde então traumatizado e com receio de voltar a ser alvo de novos disparos de armas de fogo.
34 – Tendo deixado, pelo menos nos dois primeiros meses após os factos, temendo novas ações contra si dos demandados, de sair à rua como sempre fazia, deixando de frequentar cafés, evitando sair sozinho.
35 - A infância do arguido B… decorreu no agregado familiar da avó materna, que residia no Porto, na zona de …, na sequência da separação conjugal dos progenitores quando o arguido tinha cerca de um ano de idade.
36 - A situação sócio económica do micro sistema familiar era modesta e os pais do arguido nunca contribuíram economicamente para o seu sustento apesar de manterem alguma proximidade relacional. No entanto, B… com 12 anos de idade optou por ir viver com a progenitora, com quem se manteve cerca de 3 anos, sendo estes atribulados pela ténue vinculação à referida figura parental, indo posteriormente para junto do irmão mais velho, inicialmente para o Bairro …, no Porto e posteriormente para Vila Nova de Gaia.
37 - Ao nível escolar, B… após conclusão do 2ºciclo do ensino básico, abandonou os estudos, altura que coincidiu com a mudança para junto do agregado materno.
38 - Sem ocupação estruturada do tempo e em contexto de acompanhamento de grupo de pares com condutas desviantes, B… iniciou consumos de haxixe, com treze anos de idade, adotando igualmente outras condutas disruptivas.
39 - Apesar de ter experienciado algumas realidades laborais, nomeadamente de vigilante, as mesmas não apresentavam vínculo legal.
40 - Ainda menor, estabeleceu uma união de facto, no âmbito da qual aos 18 anos foi pai, integrando o contexto residencial dos pais da companheira, no Bairro …, no Porto.
41 - À data dos factos do presente processo o arguido residia com a companheira e a filha do casal em …, junto do agregado familiar da avó paterna, registando um quotidiano sem estruturação laboral ou ocupacional, pelo que vivenciava dificuldades económicas, sendo o seu núcleo familiar sustentado pela referida avó.
42 - Posteriormente e até ao momento, a vida do arguido tem sido caracterizada pela instabilidade residencial e económica, pelo que o seu agregado familiar tem vindo a beneficiar de apoio da Ação Social Local, nomeadamente através da atribuição de subsídios. Desta forma o arguido aufere cerca de €361 de Rendimento Social de Inserção e €110 de abono familiar, verbas com as quais necessita fazer uma gestão económica extremamente regrada, sendo priorizada a subsistência em detrimento dos encargos com a habitação cuja renda já não paga há vários meses. Nesta conjuntura teme uma ação de despejo, pelo que foi orientado para solicitar à Domus Social, Empresa Municipal de Habitação do Porto, apoio no sentido de lhe consiga assegurar um espaço residencial a curto prazo.
43 - No domínio relacional o arguido vivencia estabilidade, sendo a família constituída uma fonte motivacional em prol da procura atual de ajustamento da sua conduta.
44 – B… encontra-se em acompanhamento pela DGRSP no âmbito de uma medida de suspensão da pena de prisão com regime de prova, aplicada no processo nº10833/09.7TDPRT, das Varas Criminais do Porto, por cometimento de crime de tráfico de estupefacientes. Neste contexto tem vindo a denotar adesão e respeito pela justiça cumprindo as orientações que lhe vão sendo dirigidas.
45 - Está ainda em acompanhamento na mesma equipa à ordem do proc.º 16064/15.0T9PRT da 7ª Secção do DIAP – Porto numa suspensão provisória de processo.
46 - O percurso de desenvolvimento do arguido F… decorreu integrado no seu núcleo familiar, de nível sociocultural e económico modesto, constituído pelos progenitores e o seu único irmão, três anos mais novo.
47 - Sempre desfrutou de condições de vida suficientes, assentando a economia doméstica nos salários do pai e do avô, operários da construção civil; a progenitora era doméstica e, segundo o arguido, imperava um relacionamento familiar cordato, com transmissão de regras e valores socialmente disciplinados.
48 – F… iniciou a frequência do sistema de ensino em idade regular, tendo apresentado parco investimento nos estudos, com sucessivas retenções, e abandono escolar perto dos dezasseis anos, apenas com o 6º ano de escolaridade concluído.
49 - Pouco tempo depois iniciou o seu percurso laboral, que tem decorrido maioritariamente como servente da construção civil, tendo também trabalhado como vigilante (de obras imobiliárias e de um Stand de automóveis) e como distribuidor de publicidade, registando ainda alguns períodos de inatividade.
50 - Entre os quinze e os dezasseis anos envolveu-se no consumo de substâncias (cocaína), tendo atravessado uma fase conturbada, com prática de comportamentos ilícitos e envolvimentos com o Sistema de Administração da Justiça (refere ter sido condenado em pena de prisão cuja execução foi suspensa). Segundo afirmou, abandonou esse consumo com a sua força de vontade e a ajuda de amigos.
51 - No período a que se reportam os factos descritos na acusação, F… vivia na morada dos autos, com a progenitora (doméstica), o progenitor (operário da construção civil) e o irmão (25 anos). Moravam numa casa térrea arrendada, com condições de habitabilidade.
52 - A situação económica familiar era precária, assentando em trabalhos irregulares exercidos pelos três elementos masculinos do agregado, cada um deles contribuindo para o pagamento das despesas fixas. A dinâmica relacional caracterizava-se por certas limitações culturais e algum individualismo dos elementos do agregado.
53 - O arguido namorava há vários anos, tendo dessa relação nascido uma descendente, atualmente com 4 anos, que viveu com a mãe até à união do casal, o qual há cerca de um ano arrendou uma habitação para morar, situada perto da casa dos pais do arguido, na Rua …, nº …, …, V. N. Gaia. Trata-se de um apartamento de tipologia 2, com boas condições.
54 - O arguido avalia a sua situação económica como razoável, assente nos ganhos que vai auferindo pela realização de trabalhos de construção civil junto de diversos empregadores, o que lhe rende entre 400,00 e 500,00€ mensais; a companheira (25 anos, desempregada) é beneficiária do Rendimento Social de Inserção – 250,00€ - e aufere uma pequena quantia pela realização de algumas limpezas; o casal é pontualmente auxiliado pelos respetivos pais. As despesas fixas são as relativas a renda de casa, água e eletricidade, que ascendem a 300,00€.
55 – F… ficou desempregado há seis meses, tendo o seu último emprego sido como vigilante de um Stand de automóveis, onde trabalhou perto de dois anos, até ao seu encerramento. Atualmente exerce trabalhos ocasionais de construção civil, sem vínculo contratual, sendo um dos seus objetivos conseguir maior estabilidade profissional, de modo a proporcionar boas condições de vida à descendente.
56 - Não tem, nos seus tempos livres, atividades estruturadas, ocupando-se em jogos digitais e demais atividades lúdicas comuns, e no convívio com a família nuclear e alargada, onde se inclui a família de origem da companheira. De vez em quando encontra-se com os amigos, maioritariamente oriundos de …, onde F… morava anteriormente, os quais são referenciados como normativos.
57 - O arguido é pouco referenciado no meio social de residência, apenas sendo conhecido dos vizinhos mais próximos, não existindo referências negativas sobre si ou sobre a sua família.
58 - O presente processo é do conhecimento dos elementos da família de origem e da família constituída, a qual mantêm apoio incondicional ao arguido, fundamentado nas caraterísticas de responsabilidade que aquele tem evidenciado, sobretudo desde o nascimento da descendente. Na zona de residência, os factos de que F… está acusado não parecem ser do conhecimento da comunidade, pelo que este processo não acarretou repercussões ao nível da sua imagem social e profissional.
59 - O arguido B… sofreu anteriormente a seguinte condenação judicial, transitada em julgado:
- No processo n° 10833/09.7TDPRT da 3ª Vara Criminal do Porto, foi condenado, por acórdão de 25.06.2013, transitado em julgado a 10.09.2013, pela prática em 15.07.2009, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º do DL 15/93, de 22.01, na pena de 4 anos e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo com sujeição a regime de prova.
60 - O arguido G… não tem antecedentes criminais.
61 - O arguido F… sofreu anteriormente as seguintes condenações judiciais, transitadas em julgado:
- No processo n° 1128/05.6PAVNG da 1ª Vara de Competência Mista de V. N. de Gaia, foi condenado, por decisão de 11.06.2007, transitada em julgado a 26.06.2007, pela prática em 08.09.2005, de um crime de furto, p. e p. pelo art. 203º, nº 1 do CP, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de €4. Por decisão de 02.02.2010 tal pena foi declarada extinta pelo pagamento.
- No processo n° 589/06.0GCVNG da 2ª Vara de Competência Mista de V. N. de Gaia, foi condenado, por decisão de 05.12.2007, transitada em julgado a 17.01.2008, pela prática em 26.10.2006, de três crimes de roubo, p. e p. pelo art. 210º, nº 1 do CP, dois crimes de roubo, p. p. e p. pelo art. 210º, nº l1, com referência ao art. 204º, nº1, al. f), do CP, na pena única de 1 ano de prisão substituída por 365 dias de multa, à taxa diária de €5. Por decisão de 19.01.2011 tal pena foi declarada extinta pelo pagamento da multa.
- No processo n° 728/09.0PHVNG do 1º Juízo Criminal de V.N. de Gaia, foi condenado, por decisão de 29.10.2009, transitada em julgado a 18.11.2009, pela prática em 20.10.2009, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º, nº1 do DL 2/98, de 03.01, na pena de três meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano, com sujeição a deveres. Por decisão de 10.10.2013, tal pena foi declarada extinta pelo cumprimento.
- No processo n° 1946/11.6PJPRT do 3º Juízo (1ª Secção) Criminal do Porto, foi condenado, por sentença de 14.05.2013, transitada em julgado a 14.06.2013, pela prática em 07.11.2011, de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo art. 25º do DL 15/93, de 22.01, na pena de 16 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo.
- No processo n° 580/14.3PTPRT da Secção Criminal da Inst. Local do Tribunal de Matosinhos (Comarca do Porto) – J3, foi condenado, por decisão de 09.09.2014, transitada em julgado a 09.10.2014, pela prática em 08.09.2014, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art. 292º, nº1 do CP, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 5 e na pena acessória de proibição de condução de veículos motorizados pelo período de 3 meses. Por decisões de 07.12.2015 e 14.12.2015, respetivamente, tais penas (principal e acessória) foram declaradas extintas pelo cumprimento.

III. 2. 2. A propósito da operação de subsunção dos factos ao direito – no que ao caso aqui releva.

Os arguidos vinham acusados, no que ao caso releva, pela prática em co-autoria material, de três crimes de homicídio qualificado, na forma tentada, pp. e pp. pelos artigos 22.º, 23.º, 131.º e 132.º/1 e 2 alíneas h) e j) C Penal.
Na decisão recorrida, considerou-se – com a concordância expressa do MP – no entanto, que s enão verificava, in casu, nenhuma das apontadas circunstâncias qualificativas das alínea h) e j) do n,º 2 do artigo 132.º, isto é que, a morte seja cometida em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade do agente, sendo susceptível de a revelar, entre outras, a de o agente praticar o facto juntamente com, pelo menos, mais duas pessoas ou utilizar meio particularmente perigoso (al. h)) ou agir com frieza de ânimo, com reflexão sobre os meios empregados ou ter persistido na intenção de matar por mais de vinte e quatro horas (al. j). E, então, foram os arguidos condenados pela prática do crime de homicídio, na sua forma tentada e básica, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 22.º, 23.º, 73.º e 131.º C Penal.
Para assim se decidir entendeu-se que, no circunstancialismo de tempo, modo e lugar ali apurados, os arguidos dispararam, em conjunto, na direcção dos ofendidos C…, D… e E… pelo menos dez disparos de projécteis de armas de fogo; um deles, disparado pelo arguido F… com a arma de fogo que empunhava, atingiu o ofendido C… no antebraço (membro superior direito), enquanto outro dos ditos projécteis, disparado por aquele mesmo arguido ou pelo arguido B…, das respectivas armas de fogo por eles usadas, atingiu o ofendido D… na região lombar (à esquerda), de raspão; ademais, o E… só não foi atingido por nenhum dos disparos efectuados por aqueles dois arguidos, por motivo estranho à vontade destes; destas condutas dos arguidos só não sobreveio a morte para os ofendidos C… e D… em virtude de, por mero acaso, não ter sido afectado de modo letal nenhum órgão vital dos que se alojavam nos seus corpos (no caso do D…, até nas proximidades da zona do corpo atingida, como, por exemplo, o fígado); por outro lado, aqueles arguidos só não lograram atingir o corpo do E… e, eventualmente, de modo letal, algum órgão vital deste, com nenhum dos disparos que efectuaram, também direcção de onde se encontrava, por motivos exógenos, estranhos à sua vontade e, assim - no que à primeira das circunstâncias vertidas na alínea h) do n.º 2 do artigo 132.º C Penal – o exemplo-padrão só se preenche quando no facto comparticipem pelo menos 3 agentes em co-autoria e, no caso, um outro arguido, G…, não comparticipou nos factos, ou seja, não agiu em co-autoria com estes dois arguidos nas tentativas de homicídio em questão, pelo que não se verifica, destarte, a apontada circunstância qualificativa; quanto ao mais: uma arma de fogo, de per si, não revela uma perigosidade muito superior à normal nos meios habitualmente utilizados para atentar contra a vida; no caso vertente, urge considerar que cada um dos arguidos utilizaram como meio de agressão uma arma de fogo, de características não apuradas, ou seja, um vulgar instrumento de desferimento de projécteis, que não excede, por si só, a normal adequação e capacidade necessária para matar e, como tal, não é, prima facie, “meio particularmente perigoso”; por outro lado, desconhece-se ainda quantos disparos efectuou cada um dos arguidos e, assim, considerando o concreto circunstancialismo conhecido em que actuaram os arguidos - que não denota particular censurabilidade ou perversidade – entendeu-se que a utilização pelos mesmos de armas de fogo, não é susceptível de integrar, sem mais, o conceito de “meio particularmente perigoso” para efeitos de fazer operar a circunstância qualificativa constante da al. h), segunda parte, do n.º 2 do artigo 132.º C Penal; finalmente em relação à alínea j), considerou-se, desde logo que, a acusação descarnada de factualidade que sustente a imputação da mesma; e, de todo o modo, não se provou que os arguidos tivessem antecipadamente planeado atentar contra as vidas dos ofendidos, congeminando o respectivo tempo, modo e local, agindo de forma calma, ponderada, calculada, premeditada, denotando insensibilidade e particular desrespeito pela pessoa e vida humana, nada permitindo, sequer, afirmar que os arguidos já esperassem a “visita” dos ofendidos e que se tivessem previamente munido de armamento com vista a recebê-los a tiro, pelo modo como o fizeram, sendo que, do modo de execução dos factos parece ressaltar antes que os actos cometidos pelos arguidos resultaram de uma reacção de momento, quiçá fundada em medo - mas sempre injustificada, desproporcional -, à deslocação dos ofendidos à residência onde se encontravam numa presumível tentativa de ajuste de contas com os irmãos B… e G… por terem agredido no dia anterior o irmão daqueles, H….
III. 3. Apreciando.
III. 3. 1. A subsunção dos factos ao direito.
Discorda o MP do facto de se ter excluído – mais apropriado seria, no entanto, afirmar que se não inclui - na operação de qualificação dos crimes de homicídio, sob a forma tentada, a agravação resultante do artigo 86.º/3 da Lei das Armas, Lei 5/2006.
Com efeito, entende o MP que, muito embora, os crimes em causa, não sejam qualificados nos termos constantes da acusação – onde se omitiu, de todo qualquer referência à agravação resultante da Lei das Armas - pela circunstância da alínea h) do n.º 2 do artigo 132.º C Penal (excluída, de igual modo, a circunstância qualificativa relativa à prática juntamente, com pelo menos, mais duas pessoas, que “cai” com a exclusão da comparticipação do arguido G…), não pode, no entanto, deixar de se considerar a utilização de arma de fogo, nos termos gerais previstos no artigo 86.º da Lei 5/2006 de 23.02.
Atentemos.

Como refere o Sr. PGA neste tribunal, não sofre dúvida, da leitura da decisão da matéria de facto, a qual não foi impugnada, que as três tentativas de homicídio cometidas em co-autoria pelos arguidos, ora recorridos, foram praticadas com o uso de arma de fogo, circunstância que não foi tida em consideração enquadramento jurídico-penal desses mesmos factos; tal circunstância agrava, em abstracto, a moldura penal correspondente ao crime tentado de homicídio em um terço, nos seus limites mínimo e máximo, pois que o uso das armas não foi considerado elemento do tipo de ilícito praticado pelos recorridos;
Com efeito.
Dispõe aquele artigo 86.º/3 que, “as penas aplicáveis a crimes cometidos com arma são agravadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo, excepto se o porte ou uso de arma for elemento do respectivo tipo de crime ou a lei já previr agravação mais elevada para o crime, em função do uso ou porte de arma”.
E, no n.º 4 da mesma norma que, “para os efeitos previstos no número anterior, considera-se que o crime é cometido com arma quando qualquer comparticipante traga, no momento do crime, arma aparente ou oculta prevista nas alíneas a) a d) do nº 1, mesmo que se encontre autorizado ou dentro das condições legais ou prescrições da autoridade competente”.
Estamos perante uma circunstância qualificativa genérica, com aplicação, indistintamente, a qualquer crime, mas de carácter subsidiário, ié., com a ressalva de aplicação aos regimes legais estabelecidos para determinados tipos penais que integrem já, o uso e porte de arma na descrição típica do crime matriz, do crime base, ou de tipos qualificados.
Deste regime resulta cremos que evidente, que, ao contrário, do preenchimento da previsão contida no artigo 132.º C Penal - que só opera se o uso da arma ocorrer em circunstâncias reveladoras de especial maior grau de culpa - não se pode fugir à agravação resultante da aplicação do nº 3 do artigo 86.º - que, por encontrar o seu fundamento num maior grau de ilicitude - se basta com o simples uso da arma na prática do crime - que assim, terá sempre lugar se o crime for cometido com arma (no que não se pode deixar de entender como uma reacção do legislador à proliferação de condutas criminosas praticadas com armas, que vêm causando forte alarme social).
Agravação – que no limite, para o crime consumado, traduz uma moldura penal de prisão de 16 a 25 anos - que, como vimos, só será afastada, se verificada uma das seguintes condições:
- se o uso ou porte de arma for elemento constitutivo do tipo legal de crime que é objecto da cognição do tribunal, ou,
- se os mesmos uso ou porte de arma derem lugar a uma agravação mais elevada.
Ora no caso concreto, manifestamente, que o uso das armas não é elemento do tipo de crime de homicídio, desde logo, do artigo 131.º, pelo qual vêm condenados - só constituiria factor de qualificação, caso, além de preencher um dos exemplos-padrão ”meio particularmente perigoso” ou “prática de um crime de perigo comum” da alínea h) do n.º 2 do artigo 132.º, revelar “especial censurabilidade ou perversidade” - nem a lei prevê já, agravação mais elevada em função do tal uso, pois que ficou arredada tal possibilidade teórica, porque, na prática, se entendeu não estar preenchido o tipo qualificado do artigo 132.º C Penal.
Revertendo ao caso concreto.
Mas tal afastamento da circunstância qualificativa em causa em nada obstava a que fosse aplicada a referida agravação genérica, em função da maior ilicitude dos factos, dado o comprovado cometimento pelos arguidos dos crimes com recurso a armas de fogo.
Isto, perante os factos provados na decisão recorrida – de resto, como, perante os factos descritos na acusação, empunhando cada um deles, uma arma de fogo, de características e de dimensões não concretamente apuradas, apontaram-nas na direcção dos ofendidos C…, D… e E…, a uma distância situada entre os cinco e os quinze metros, e efectuaram entre 10 e 20 disparos de projécteis na direcção dos mesmos; um dos disparos que foi efectuado pelo arguido F… atingiu o C… no antebraço; um disparo efectuado pelo arguido B… ou pelo arguido F… atingiu o D… na região lombar, de raspão; o E… não foi atingido por nenhum dos disparos em qualquer órgão, por motivos estranhos à vontade dos arguidos; os arguidos actuaram conjugadamente, de acordo com um plano gizado entre eles no sentido de ambos dispararem projécteis de arma de fogo sobre os 3 ofendidos, de modo a que fosse possível atingi-los nos respectivos corpos e, caso tal sucedesse e fossem atingidos órgãos vitais destes, assim lhes causar a morte, não se abstendo de agirem do modo descrito ainda que soubessem que tal ocorrência podia provir das suas actuações.
E, assim, deveria, ter sido considerado - não obstante não ter sido possível apreender e examinar as armas, efectivamente, utilizadas pelos arguidos - que dado o facto de terem sido usadas, no caso, de fogo, para atingir os ofendidos, que tal circunstância, “de per se” basta para a aplicação da agravação resultante do artigo 86.º/3 da Lei das Armas.
E esta qualificação jurídica deveria ter sido efectuada, desde logo, na acusação pública deduzida pelo MP.
Se o tivesse sido, porventura não estaríamos aqui e agora a abordar a questão suscitada – curiosamente, ou talvez, não - pelo MP.
Obviamente que não é o facto de o MP não proceder à correcta qualificação jurídica dos factos que descreve na acusação, que impede que o tribunal de julgamento, não tivesse, ele próprio, procedido à devida correcção no momento, processualmente adequado e oportuno, de harmonia com o regime legal previsto no artigo 358.º/1 e 3 C P penal.
Como, de resto, agora, em sede de recurso, pode este tribunal, fazer, por via do estatuído no artigo 425.º/4 C P Penal.
Ou que o recurso a tal expediente se revele como necessário e pertinente em face do facto de o meio utilizado se não traduzir na prática de crime de perigo comum” ou de ter caído da acusação para a sentença, a circunstância da ”utilização de meio particularmente perigoso”.
Assim, é incontornável, a aplicação da pugnada agravação.
III. 3. 2. Consequências desta alteração.
Desta alteração da qualificação jurídica resulta uma moldura penal abstracta agravada de um terço nos limites mínimos e máximos respectivos – naturalmente, após a aplicação da atenuação resultante dos artigos 23.º/ 2 e 73.º/1 alíneas a) e b) C Penal, de que resulta, num primeiro passo, uma sub-moldura correspondente ao crime consumado, especialmente atenuada, no caso, com o limite mínimo reduzido a um quinto e o limite máximo reduzido de um terço.

Entende o MP que, ainda, que sem aplicação da agravação referida - numa moldura abstracta de prisão de 1 ano, 7 meses e 10 dias a 10 anos e 8 meses de prisão - as penas aplicadas de 3 anos de prisão, de 3 anos e 2 meses de prisão, de 2 anos e 8 meses de prisão e de 2 anos e 10 meses de prisão - são manifestamente inferiores ao que seria o quantum adequado e, assim, o continuará a ser, por maioria de razão, em face da nova moldura penal abstracta, resultante do disposto no artigo 86.º/3 da Lei das Armas - 2 anos, 1 mês e 20 dias a 14 anos, 2 meses e 20 dias.
Estrutura o MP a sua discordância nesta sede, com base no seguinte raciocínio: a gravidade objectiva e ilicitude muito elevada dos factos, bem como a culpa dos arguidos (pese embora a forma do dolo, eventual) que se não podem desvalorizar - ao dispararam, em pleno dia, do interior de uma residência para a via pública, numa zona habitacional, munidos com armas de fogo, na direcção das vítimas, estando estas em situação de desprotecção e desarmados (nada se provando em contrário), ao que tudo indica, colocando em perigo quer as vítimas atingidas, quer os terceiros que ali fortuitamente se encontrassem a que acresce que bem sabiam que visavam os ofendidos que se encontravam na via pública, a uma distância de entre 5 a 15 metros da residência onde se acobertavam os arguidos, e que o faziam em virtude do conflito latente entre aqueles e os arguidos B… e G…, também ali presente - como provado - desencadeado pelas agressões físicas por dois arguidos praticadas no dia anterior contra o ofendido D…, irmãos dos ofendidos, também ali presente na via pública; bem, como, de resto, as características de personalidade evidenciadas, os antecedentes criminais de cada um e a ausência de uma situação de inserção socio-laboral estável de ambos, tudo conjugado a impor penas de prisão e, sobremaneira, uma pena única de prisão em quantum superiores e mais expressivos, de modo a garantir as elevadíssimas exigências de prevenção geral, mas também de prevenção especial em concreto evidenciadas.
E, assim, as penas parcelares referentes aos crimes de homicídio tentado em que são ofendidos C… e D… – que, na medida imposta, pouco se demarcam e distinguem em relação à pena reportada ao crime em que é ofendido o E… - devem reflectir em maior medida as assinaladas gravidade e ilicitude elevadas daquelas condutas e o modo da prática da tentativa (com o uso de armas de fogo, que, tudo indica, os arguidos dissimularam e ocultaram logo de seguida aos factos, não tendo sido possível às autoridades policiais apreendê-las e assim colocar termo ao risco potencial de serem de novo utilizadas em circunstâncias semelhantes, pelos arguidos ou outrem a quem as tenham entregado), o que basta para ter como elevadíssimas, as exigências de prevenção geral e especial, face à facilidade com que actualmente, na nossa sociedade, se cometem crimes contra bens jurídico-penais eminentemente pessoais (por vingança, disputas familiares ou entre conhecidos e vizinhos) com o uso de armas, brancas ou de fogo - tendência social, que aqui se evidencia na reacção desproporcionada, injustificada e potencialmente letal dos arguidos face à abordagem dos ofendidos e irmão H…, que tem que ser controlada, sem ambiguidades nem ligeirezas, pelo sistema de justiça, sob pena de poder resvalar para condutas de “justiça pelas próprias mãos” e fomentar a vindicta privada, em termos interpessoais e grupais.
Sendo, ainda, de realçar, as exigências de prevenção geral - embora não seja ressaltado na fundamentação citada – que se afiguram, na verdade, como sendo muito elevadas e acima do normal, por todas as circunstâncias concretas das condutas dos arguidos, mas sobremaneira porque está em causa o bem jurídico-penal cimeiro no nosso sistema jurídico-constitucional – o direito à vida – sendo este tipo de ofensa contra a vida do outro aquela que mais justos sentimentos de insegurança inculca na generalidade dos cidadãos, bem como de indução de limitação de liberdade de movimentos no espaço público.
Por outro lado, ambos os arguidos têm antecedentes criminais, ambos fizeram desaparecer as armas de fogo que utilizaram, omitindo a sua entrega, como deviam, às autoridades, não prestaram declarações perante o tribunal colectivo de modo a tornar compreensíveis os motivos eventualmente atendíveis das suas condutas, nem, demonstrando, assim, qualquer empatia com os ofendidos, sendo certo, por ouro lado, que nenhum deles tomou qualquer iniciativa para compensar os ofendidos dos danos sofridos ou de com estes se reconciliar, a evidenciar serem elevadas, também, as exigências de prevenção especial, face ao percurso de vida e características de personalidade desconforme à norma.
Sendo que neste particular, mais se afigura ter sido acolhida, sem mais, uma visão acrítica da sua inserção social tal como veiculada nos relatórios sociais.
Com efeito, o arguido B… foi já julgado e condenado, em 25JUN2013, com trânsito a 10SET2013, pela prática, em 2009, de um crime de tráfico de estupefacientes, na pena de 4 anos e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo com sujeição a regime de prova - sendo estes factos de 20MAR2013 – donde, desde logo, se patenteia uma situação de concurso superveniente a demandar a condenação numa pena única; o arguido F…, foi já julgado e condenado, em 11JUN2007, com trânsito a 26JUN2007, pela prática em 2005, de um crime de furto, em pena de multa - extinta pelo pagamento; em 5DEZ2007, com trânsito a 17JAN2008, pela prática em 2006, de 5 crimes de roubo, na pena única de 1 ano de prisão substituída por multa – também, já julgada extinta pelo pagamento; em 29OUT2009, com trânsito a 18NOV2009, pela prática em 2009, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 3 meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano, com sujeição a deveres – da mesma forma, extinta pelo cumprimento; em 14MAI2013, com trânsito a 14JUN2013, pela prática em 2011, de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, na pena de 16 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo – a evidenciar que, também, estes factos estão numa relação de concurso, superveniente com os dos presentes autos, ocorridos a 20MAR2013; em 9SET2014, com trânsito 9OUT2014, pela prática em 2014, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, em pena de multa e de proibição de condução - ambas extintas pelo cumprimento.
E, muito embora, defende o MP, estas condenações se reportem a crimes de diversa natureza e, punidos sempre com penas não privativas da liberdade, certo é que, numa perspectiva de prevenção especial, não se tratam de percursos com indicadores positivos que permitam formular um juízo de menor necessidade da pena de prisão. O que, somado às condições de inserção sócio-económica que ambos os arguidos apresentam, que não revelam percursos laborais minimamente consistentes, nem evidenciam um quotidiano estruturado à volta de uma actividade lícita conhecida, dependendo de familiares ou de subsídios sociais – tudo aconselha uma reacção do sistema penal expressiva no sentido de garantir efectivamente a sua ressocialização de modo sério, fundado e estruturado.
Para assim, concluir por que, deveria ter sido aplicada aos arguidos, ao menos pela prática dos 2 crimes de homicídio tentado nas pessoas dos ofendidos C… e D…, penas parcelares mais elevados - menos próximas do limite mínimo - e, no caso, prisão não inferior a 4 anos.
Já quanto às penas únicas, entende que o conjunto dos factos em causa não é reconduzível a uma pluriocasionalidade de situações criminosas, antes se percepciona uma tendência criminosa dos arguidos, ambos capazes de utilizar armas de fogo contra as pessoas, o que impõe um efeito agravante dentro da moldura penal abstractamente aplicável ao concurso, sendo de concluir que a pena única fixada está aquém das exigências de prevenção geral e especial evidenciadas e, por conseguinte, seria de aplicar, em ambos os casos, uma pena única não inferior a 6 anos de prisão.
Já o Sr. PGA neste tribunal entende que, de acordo com a nova qualificação jurídico-penal dos factos, segundo os critérios adoptados pelo próprio tribunal recorrido, as penas parcelares aplicadas ao arguido B… deveriam ser fixadas em 4 anos; 4 anos; 4 anos 6 meses e 20 dias de prisão, sendo que a pena unitária deverá ser fixada em 6 anos e 8 meses de prisão efectiva e, por seu turno, as penas parcelares aplicadas ao arguido F…, deveriam ser fixadas 4 anos, 2 meses e 20 dias; 4 anos 2 meses e 20 dias e 3 anos, 9 meses e 10 dias de prisão, sendo que a pena unitária deverá ser fixada, igualmente, em 6 anos e 8 meses de prisão.

III. 3. 2. 1. A este propósito expendeu-se da seguinte forma na decisão recorrida.
(…)
Cada uma das três tentativas de crime de homicídio cometidas, em coautoria, pelos arguidos B… e F… é abstratamente punível com pena de prisão de 1 ano, 7 meses e 10 dias a 10 anos e 8 meses - cf. arts. 73º, nº1, als. a) e b) e 131º, ambos do CP.
Ponderam contra os arguidos como agravantes gerais as seguintes circunstâncias:
(…)
Como consequência direta e necessária das condutas danosas dos arguidos B… e F… decorrentes dos atentados à vida dos ofendidos C… e D…, estes ficaram com sequelas permanentes no seu corpo, nomeadamente o primeiro com duas cicatrizes no antebraço e o segundo com uma cicatriz na região lombar à esquerda, sendo que o C… sofreu ainda um período de 20 dias de afetação da capacidade de trabalho geral (al. a) do nº2 do art. 71º do CP, quanto às consequências do facto);
Os arguidos B… e F… têm antecedentes criminais, com particular relevo no caso do segundo que conta com cinco condenações anteriores, incluindo por crimes também dirigidos contra as pessoas, como é o caso de roubos (al. e) do nº2 do art. 71º do CP, quanto à conduta anterior ao facto).
Funcionarão como circunstâncias atenuantes gerais:
(…)
No que tange ao cometimento dos crimes de homicídio tentados, os arguidos B… e F… agiram com a forma menos intensa de dolo, isto é, com dolo eventual (al. b) do nº2 do art. 71º do CP);
(…)
Ao nível da prevenção geral, no que concerne às tentativas de homicídio, urge ter presente que o bem jurídico visado atingir pelas condutas criminosas dos arguidos, a vida humana, representa o maior valor pessoal do indivíduo, sendo que o direito à vida se encontra constitucionalmente consagrado (art. 24º da Constituição da República Portuguesa).
(…)
Quanto às exigências de prevenção especial:
(…)
No que respeita aos arguidos B… e F… as ditas exigências mostram-se medianas.
Por um lado, ambos têm antecedentes criminais; contudo, no que concerne ao arguido B… este só sofreu uma condenação, por factos cometidos em 2009 e por crime de natureza assaz diversa daqueles que foram ajuizados aqui.
Nenhum deles cumpriu até ao momento pena efetiva de prisão e, decorridos quase quatro anos desde a prática dos factos, não há notícia de novos incidentes ou conflitos entre arguidos e ofendidos.
Ao nível da reinserção social cumpre ter presente que: o arguido B… apresenta estabilidade familiar, habitando conjuntamente com a sua companheira e uma filha comum do casal. Não apresenta ocupação laboral e o agregado sobrevive à custa de apoios sociais.
O arguido F… encontra-se inserido familiarmente, vivendo em união de facto com a companheira e uma filha do casal, e realiza trabalhos ocasionais remunerados de construção civil junto de vários empregadores.
Destarte, sopesando todos estes fatores, temos por adequadas e suficientes a promover os fins punitivos vertidos no art. 40º do C.P., as seguintes penas:
Quanto ao crime de ofensa à integridade física simples (ofendido H…):
Arguido B…: pena de 3 meses de prisão.
(…)
- Quanto aos três crimes de homicídio tentados (ofendidos C…, D… e E…):
» Tentativas (duas) reportadas aos ofendidos C… e D…:
- Arguido B…: pena de 3 anos de prisão por cada um deles.
- Arguido F…: pena de 3 anos e 2 meses de prisão por cada um deles.
» Tentativa (uma) reportada ao ofendido E…:
- Arguido B…: pena de 2 anos e 8 meses de prisão.
- Arguido F…: pena de 2 anos e 10 meses de prisão.
(…)
Quanto aos arguidos B… e F…:
Estamos perante situações de concurso de crimes (art. 30º, nº1 do C.P.), pelo que cumpre aplicar a cada um dos arguidos, em cúmulo jurídico, uma pena única, na qual se considerem, em conjunto, os factos e a personalidade daqueles (art. 77º, nº1 do mesmo diploma legal).
A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes e como limite mínimo a mais elevada daquelas penas (nº2 do aludido art. 77º).
Assim, teremos:
Para o arguido B…: uma moldura abstrata para o cúmulo de 3 anos a 8 anos e 11 meses de prisão.
Para o arguido F…: uma moldura abstrata para o cúmulo de 3 anos e 2 meses a 9 anos e 2 meses de prisão.
Em conformidade, ponderando em concatenação:
- A gravidade objetiva dos factos (mormente, no caso do arguido B…, quanto às tentativas de homicídio), com atentado plúrimo ao bem jurídico supremo, qual seja a vida humana;
- A ocorrência num único momento das três tentativas de homicídio, enquadradas pois no mesmo contexto fático e motivacional;
- Os crimes de homicídio tentado estão conexionados com uma anterior (temporalmente próxima) agressão cometida pelos irmãos B… e G… sobre um dos irmãos C1… D1… e subsequente tentativa dos ofendidos de se vingarem dos autores daquela agressão, tudo no âmbito de exaltação de ânimos;
- As respetivas personalidades dos arguidos manifestadas nos seus comportamentos ilícitos não revela vontade férrea de matar outrem, como demonstra o facto de terem atuado (o arguido B… apenas nesta parte) com a forma menos intensa de dolo, antes se inserindo num quadro de “guerrilha” não calculado, não premeditado, entendemos por adequadas e proporcionais as seguintes penas únicas:
para o arguido B…: 5 anos de prisão.
para o arguido F…: 5 anos de prisão.
III. 3. 2. 2. A medida da pena.
Determinar se a medida da pena é, por um lado, suficiente para promover a recuperação social do delinquente e dar satisfação às exigências de reprovação e de prevenção e, por outro, ajustada à medida da culpa, não constitui uma operação abstracta ou uma atitude puramente intelectual, mas deve ser fruto de uma avaliação das circunstâncias de cada situação concreta.
Como é sabido a questão da medida da pena não é do conhecimento oficioso por parte do tribunal de recurso.
Para o efeito de determinação da medida concreta ou fixação do quantum da pena, o juiz serve-se do critério global contido no artigo 71º C Penal, estando vinculado aos módulos – critérios de escolha da pena constantes do preceito. Observados estes critérios de dosimetria concreta da pena, há uma margem de actuação do julgador dificilmente sindicável, se não mesmo impossível de sindicar.
O dever jurídico, substantivo e processual de fundamentação visa justamente tornar possível o controlo da decisão sobre a determinação da pena.
Acerca da questão da cognoscibilidade, controlabilidade da determinação da pena, no âmbito do recurso, há que dizer que a intervenção do tribunal nesta sede, de concretização da medida da pena e do controle da proporcionalidade no respeitante à sua fixação concreta, tem de ser necessariamente parcimoniosa, porque não ilimitada.
Vem-se entendendo que se pode sindicar a decisão de determinação da medida da pena, quer quanto à correcção das operações de determinação ou do procedimento, à indicação dos factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, à falta de indicação dos factores relevantes, ao desconhecimento pelo tribunal ou à errada aplicação dos princípios gerais de determinação, quer quanto à questão do limite da moldura da culpa, bem como a forma de actuação dos fins das penas no quadro de prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto da pena, salvo perante a violação das regras da experiência, ou a desproporção da quantificação efectuada.

III. 3. 2. 3. O Código Penal atribui à pena um conteúdo de reprovação ética, dando tradução à exigência de que a vertente pessoal do crime, ligada ao princípio da eminente dignidade da pessoa humana, limita de forma inultrapassável a medida da pena, sem deixar de atender aos fins da prevenção geral e especial.
“A culpa jurídico-penal traduz-se num juízo de censura, que funciona ao mesmo tempo, como um fundamento e limite inultrapassável da medida da pena”, cfr. Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As consequências jurídicas do crime, 215.
Com a determinação de que sejam tomadas em consideração as exigências de prevenção geral, procura dar-se satisfação à necessidade da comunidade, de punição do caso concreto, tendo-se em conta, de igual modo, a premência da tutela dos respectivos bens jurídicos e com o recurso à vertente da prevenção especial, procura satisfazer-se as exigências de socialização do agente com vista à sua integração na comunidade.
Dispõe o artigo 40° C Penal que “a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”, nº. 1 e, que “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”, nº. 2.
O modelo de determinação da medida da pena que melhor combina os critérios da culpa e da prevenção é, como ensina o Prof. Figueiredo Dias, “aquele que comete à culpa a função, única, mas nem por isso menos decisiva, de determinar o limite máximo e inultrapassável da pena; à prevenção geral, de integração, a função de fornecer uma “moldura de prevenção”, cujo limite máximo é dado pela medida óptima de tutela dos bens jurídicos, dentro do que é consentido pela culpa e, cujo limite mínimo é fornecido pelas exigências irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico; e à prevenção especial a função de encontrar o quantum exacto de pena, dento da referida “moldura de prevenção”, que sirva melhor as exigências de socialização ou, em casos particulares, de advertência ou segurança do delinquente” in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 3, Abril - Dezembro 1993, 186-187.
Não tendo o propósito de solucionar por via legislativa a questão dogmática dos fins das penas, a disposição contém, no entanto, imposições normativas específicas que devem ser respeitadas: a formulação da norma reveste a “forma plástica” de um programa de política criminal cujo conteúdo e principais proposições, cabe ao legislador definir e que, em consequência, devem ser respeitadas pelo juiz.
A norma do artigo 40.° condensa, assim, em três proposições fundamentais o programa político criminal sobre a função e os fins das penas: protecção de bens jurídicos e socialização do agente do crime, sendo a culpa o limite da pena mas não o seu fundamento.
Nos termos do artigo 71.°/1 C Penal, a determinação da medida concreta da pena é feita dentro dos limites definidos na lei, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo-se a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando, nomeadamente, as circunstâncias enumeradas exemplificativamente, nas alíneas a) a f), do nº. 2 do citado artigo 71.° C Penal.
A este processo deve presidir uma preocupação de tratamento justo do caso concreto, adequado à vontade e intenções da lei, que haverá que passar pela escolha de reacção sancionatória com aptidão e eficácia bastantes à ideal/tendencial protecção do bem jurídico violado e à dissuasão da prática de novos crimes, constituindo a retribuição justa do mal praticado, dando satisfação ao sentimento de justiça e segurança da comunidade e contribuindo, na medida do possível, para a reinserção social do delinquente.
A culpa constitui, assim, o limite inultrapassável do quantum da pena, dentro é certo da sub-moldura da prevenção geral e ponderadas as necessidades que o agente apresente em sede de prevenção especial.
Esta medida concreta da pena a aplicar ao arguido, tendo em atenção que a mesma assenta na “moldura de prevenção”, cujo máximo é constituído pelo ponto mais alto consentido pela culpa do caso e cujo mínimo resulta do quantum da pena imprescindível, no caso concreto, à tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias, deve ser encontrada dentro dos limites definidos na lei, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, artigo 71°/1 C Penal, sendo que em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa, artigos 40º/2 e 71°/1 C Penal.
Devendo proporcionar ao condenado a possibilidade de optar por comportamentos alternativos ao criminal, a pena tem de responder, sempre positivamente, às exigências de prevenção geral de integração, sendo certo que se a culpa constitui o fundamento e o limite da pena, as suas finalidades são a prevenção geral e especial.

III. 3. 2. 4. Descendo ao caso concreto.
III. 3. 2. 4. 1. As penas parcelares.
Como resulta óbvio, na decisão recorrida, operou-se a avaliação dos factos que determinaram fixação da medida das penas em função da materialidade apurada, que, neste momento é intangível.
A propósito da fixação e determinação da medida concreta da pena, no caso em apreço, há que convocar os seguintes argumentos: o facto de os arguidos terem actuado na forma menos grave de dolo, o eventual; a mediana ilicitude dos factos e diminuta, apesar de tudo, gravidade das consequências, pois que, os ofendidos como sequelas permanentes no corpo, por virtude dos disparos, apresentam, o C…, 2 cicatrizes no antebraço e o D…, 1 cicatriz na região lombar, tendo aquele sofrido ainda um período de 20 dias de afectação da capacidade de trabalho geral; ambos estão, como estavam, inseridos em termos familiares - o que não serviu de suficiente elemento dissuasor em relação à prática dos factos - mas evidenciam, ambos, falta de inserção sócio-económica, pois que não apresentam percursos laborais minimamente consistentes, nem evidenciam um quotidiano estruturado à volta de uma actividade profissional estável e permanente, dependendo de familiares, de subsídios sociais ou de biscates; as muito elevadas exigências de prevenção geral, face à facilidade – banalização do mal, num certo sentido - com que actualmente, na nossa actual sociedade, se cometem crimes, desta natureza, contra a vida e com recurso a armas de fogo, pelas mais variadas razões, por vingança, disputas, patrimoniais, familiares ou entre vizinhos, que urge combater, por forma a ser estancada e contida dentro de parâmetros mais razoáveis e aceitáveis, ainda assim, por forma a assegurar a validade do valor e do sentimento de segurança da sociedade; as ainda assim, prementes necessidades de prevenção especial, dado o facto de ambos os arguidos ostentarem uma personalidade avessa ao direito, consubstanciada no facto de ambos terem antecedentes criminais:
o arguido B… foi já julgado e condenado, no ano de 2013, pela prática, em 2009, de um crime de tráfico de estupefacientes, na pena de 4 anos e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo com sujeição a regime de prova; o arguido F…, foi já julgado e condenado, no ano de 2007, pela prática em 2005, de um crime de furto, em pena de multa - extinta pelo pagamento; pela prática em 2006, de 5 crimes de roubo, na pena única de 1 ano de prisão substituída por multa – também, já julgada extinta pelo pagamento; no ano de 2009, pela prática em 2009, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 3 meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano, com sujeição a deveres – da mesma forma, extinta pelo cumprimento; no ano de 2013, pela prática em 2011, de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, na pena de 16 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo; no ano de 2014, pela prática nesse ano, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, em pena de multa e de proibição de condução - ambas extintas pelo cumprimento.
Se como vimos a culpa constitui o limite inultrapassável do quantum da pena, dentro é certo da sub-moldura da prevenção geral e ponderadas as necessidades que o agente apresente em sede de prevenção especial, perante estes factores, tidos em consideração na decisão recorrida, com determinado peso, no confronto com aquele que o MP defende lhe deveria ter sido concedido, cremos evidenciar-se a necessidade de um ajustamento – desde logo, mas não só, derivado da ponderação de uma moldura penal abstracta, agora mais gravosa.
Assim perante a nova moldura penal abstracta, de prisão de 2 anos, 1 mês e 20 dias a 14 anos, 2 meses e 20 dias, entendemos mais ajustadas e adequadas a acautelar os apontados fins das penas e, ainda assim, sem exceder a medida da culpa, mais equilibradas e calibradas, as penas parcelares, relativamente aos homicídios na pessoa dos ofendidos C… e D…, sem distinção, por injustificada, de facto e de direito, em relação a qualquer deles, bem como a qualquer dos arguidos – apenas se justificando realçar a distinção em relação ao outro homicídio, aqui não colocado em causa, na pessoa do ofendido E… – a pena parcelar de 4 anos de prisão.
I. 3. 2. 4. 2. As penas únicas.
Em sede de determinação da pena única, dir-se-á, que nos termos do artigo 77°/1 C Penal, são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, na busca da imagem global dos factos.
A individualização da pena única conjunta move-se numa moldura penal abstracta balizada pela pena parcelar mais grave – patamar mínimo - e pela soma material de todas elas – patamar máximo, n.º 2 do artigo 77º C Penal.
O que deixa transparecer, um sistema de pena unitária em que o limite mínimo da moldura atendível é constituído pela mais grave das penas parcelares (numa concessão minimalista ao princípio da exasperação ou agravação – a punição do concurso correrá em função da moldura penal prevista para o crime mais grave, mas devendo a pena concreta ser agravada por força da pluralidade de crimes), sem que possa ultrapassar a soma das penas concretamente que seriam de aplicar aos crimes singulares.
A moldura penal do concurso, dentro da qual é encontrada a pena unitária – artigo 77º/2 C Penal - tendo em atenção os factos e a personalidade dos agentes, no caso concreto, é, então, de 4 a 10 anos e 11 meses, no caso do arguido B… e, de 4 anos a 10 anos e 10 meses no caso do arguido F….
Fundamental na formação da pena única é a visão de conjunto, a eventual conexão dos factos entre si e a relação “desse bocado de vida criminosa com a personalidade”.
A pena única deve formar-se mediante uma valoração completa da pessoa do agente e das diversas penas parcelares.
Para a determinação da dimensão da pena única, decisivo é que, antes do mais, se obtenha uma visão conjunta dos factos - “a relação dos diversos factos entre si em especial o seu contexto; a maior ou menor autonomia; a frequência da comissão dos delitos; a diversidade ou igualdade dos bens jurídicos protegidos violados e a forma de comissão bem como o peso conjunto das circunstâncias de facto sujeitas a julgamento mas também a receptividade à pena pelo agente deve ser objecto de nova discussão perante o concurso ou seja a sua culpa com referência ao acontecer conjunto da mesma forma que circunstâncias pessoais, como por exemplo uma eventual possível tendência criminosa”.
Será, assim, o conjunto dos factos que fornece a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique.
Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma “carreira”) criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).
Um dos critérios fundamentais em sede deste sentido de ilicitude reportada à globalidade dos factos é o da determinação da intensidade da ofensa e dimensão do bem jurídico ofendido - sendo certo que assume significado profundamente diferente a violação repetida de bens jurídicos ligados à dimensão pessoal, e ao núcleo de bens essenciais, em relação à ofensa de bens patrimoniais, como sucedeu no caso vertente.
Por outro lado, importa determinar os motivos e objectivos do agente no denominador comum dos actos ilícitos praticados e, eventualmente, dos estados de dependência.
Igualmente deve ser expressa a determinação da tendência para a actividade criminosa revelada pelo número de infracções, pela sua perduração no tempo, pela dependência de vida em relação àquela actividade.
Na avaliação da personalidade expressa nos factos é todo um processo de socialização e de inserção, ou de repúdio, pelas normas de identificação social e de vivência em comunidade que deve ser ponderado.
Recorrendo à prevenção, importa verificar relativamente à prevenção geral o significado do conjunto de actos praticados em termos de perturbação da paz e segurança dos cidadãos e, num outro plano, o significado da pena conjunta em termos de ressocialização do delinquente, para o que será preponderante e decisivo, o resultado da ponderação dos seus antecedentes criminais e da sua personalidade expressa no conjunto dos factos.
Serão esses factores que necessariamente deverão ser tomados em consideração na determinação da medida da pena única, sendo então o pressuposto de uma adição ao limite mínimo do quantum necessário para se atingir as finalidades da mesma pena mas tendo, também, presente o sentido da proporcionalidade que deve presidir à fixação da pena única.
Atentando à matéria de facto provada, não se pode deixar de reconhecer que o ilícito global é de acentuada gravidade, quer pelo número de infracções em que se corporiza, quer por se tratar, maioritariamente, da prática de crimes da mesma natureza, que são factor de grande insegurança social e comunitária, e um estilo de conduta associado a comportamentos próprios de grupos de criminosos, ou, pelo menos, associados, ocasionalmente, para o efeito.
Julgamos assim adequada, em relação a cada um dos arguidos, a mesma pena única, de prisão de 6 anos.
Valor este que, impede, qualquer possibilidade de suspensão da sua execução, por ultrapassar o limite mínimo, de 5 anos, previsto no artigo 50.º/1 C Penal.

Assim e, em resumo, há que afirmar que a decisão recorrida é merecedora da censura que o MP lhe dirige, donde, está o recurso votado ao sucesso.
IV. Dispositivo
Nestes termos e com os fundamentos mencionados, acordam os Juízes que compõem este Tribunal em conceder provimento ao recurso apresentado pelo MP, em função do que,
- se determina a agravação dos 2 crimes de homicídios tentados, nas pessoas dos ofendidos C… e D…, por força do artigo 86.º/3 da Lei das Armas, aprovada ple Lei 5/2206, cometidos pelos arguidos B… e F…,
- em consequência, se eleva,
- para 4 anos de prisão, as respectivas penas parcelares e,
- para 6 anos as penas únicas.
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Taxa de justiça, devida por cada um dos arguidos, por terem decaído em recurso a que apresentaram resposta, fixando-se a taxa de justiça no equivalente a 4 UC,s.
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Elaborado em computador. Revisto pelo Relator, o 1º signatário.
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Porto 2017.Novembro.8
Ernesto Nascimento
José Piedade