Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
177/09.0TTBRR.L1-4
Relator: LEOPOLDO SOARES
Descritores: CEDÊNCIA OCASIONAL DE TRABALHADORES
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/25/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: Para se verificar uma cedência ocasional de trabalhador cumpre provar a existência de acordo de cedência entre cedente e cessionário, bem como a declaração de concordância do trabalhador que deve constar do documento que titula o acordo ( vide artigo 325º, nº 2º do CT/03).
(Elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:AA, (…), intentou,[1] acção com processo comum , contra :
- BB Empreendimentos Turísticos e Imobiliários, S.A., (…);
- CC II Actividades Hoteleiras, S.A., (…).
Requereu a declaração da ilicitude do despedimento e a condenação das RR. a pagarem-lhe:
a) Indemnização por caducidade do contrato, no montante de € 3.633,12;
b) A quantia de € 908,28, por falta de aviso prévio;
c) A quantia de € 2.270,70, de férias e subsídios de férias de 2008 e 2009 e subsídio de Natal de 2008;
d) A quantia de € 376,92 de diuturnidades;
e) Subsídio de turno em montante a apurar;
f) Quantias estas acrescidas de juros de mora , à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Alega, em síntese, que trabalhava para a CC II , no Hotel A..., que passou a ser explorado pela BB.
Foi despedida sem processo disciplinar nem justa causa.
Na data do despedimento, ficaram por pagar créditos laborais
relativos a férias e subsídios de férias de 2008 e 2009 e subsídio de Natal de 2008, bem como diuturnidades e subsídios de turno.
Realizou-se audiência de Partes.
A R. BB contestou.
Invocou a excepção de prescrição do direito da A.
Também impugnou a matéria alegada e invocou , em resumo, que nunca recebeu o Hotel A... de trespasse.
Mais alegou que a A. nunca trabalhou para si e que não trabalhou sempre no referido hotel, tendo transitado para o restaurante A... Grill.
Requereu a sua absolvição.
A R. CC II também contestou.
Invocou a sua ilegitimidade.
Alegou , em síntese, que foi entidade patronal da A., tendo , porém, desde Janeiro de 2001, transferido todo o seu pessoal para a sociedade DD – Actividades Hoteleiras, Lda, a qual efectivamente trespassou o Hotel A... para a BB, em 29 de Junho de 2007.
Também solicitou a sua absolvição.
A A. respondeu.
Uma vez mais manteve a posição já expressa nos autos.
Mais requereu a intervenção principal provocada da sociedade DD – Actividades Hoteleiras, Lda, (…), como associada das RR.
Dispensou-se  a organização de base instrutória e foi admitida a requerida intervenção provocada.
A Chamada DD– Actividades Hoteleiras contestou.
Invocou a ineptidão da petição inicial e alegou  , em resumo,  que foi entidade patronal da A., desde Janeiro de 2001, altura da transferência de todo o pessoal da sociedade CC II e que efectivamente trespassou o Hotel A... para a BB, em 29 de Junho de 2007.
Todavia a A. não foi integrada no quadro de pessoal da BB, tendo-lhe sido comunicado que deveria apresentar-se no seu restaurante, para aí passar a exercer funções, o que se recusou a fazer.
Assim,  requereu a sua absolvição.
A A. respondeu.
Manteve a posição já expressa nos autos
Foi proferido despacho que julgou improcedente a invocada excepção de ineptidão da petição inicial.
Realizou-se julgamento, que foi gravado, no decurso da qual a A. desistiu do pedido formulado contra a R. CC II.
Por outro lado, constata-se que na audiência de 28 de Fevereiro de 2001 ( vide fls. 245 a 247), o Exmº mandatário da Autora reiterou o requerimento que anteriormente havia apresentado, via Citius ( vide fls. 241 a 243) , solicitando a rectificação de lapsos de escrita de que a petição inicial,   a seu ver, enfermava.
O Exmº mandatário da aqui recorrente deduziu  oposição.
Todavia por despacho proferido naquela data (28.2.2011)  tal pretensão foi deferida e notificada aos presentes.
A aqui recorrente “reclamou” dessa decisão ( vide fls. 250 a 260), sustentando que a mesma carecia de apoio legal, sendo que tal pretensão foi indeferida por decisão proferida em 24 de Março de 2001 ( fls. 267).
Em 30 de Maio de 2001, foi fixada a matéria de facto por decisão que não foi alvo de reclamação.
Em 8 de Agosto de 2011, foi proferida sentença que em sede decisória teve o seguinte teor:
“Nestes termos, julgo a presente acção parcialmente procedente e, em consequência:
A. Julgo improcedente a invocada excepção de prescrição do direito que a A. pretende fazer valer com a presente acção;
B. Declaro a ilicitude do despedimento da A. AA e, em consequência, condeno a R. BB Empreendimentos Turísticos e Imobiliários, S.A. no pagamento à A. de:
a) Indemnização em substituição da reintegração, no montante de € 3.633,12 (três mil seiscentos e trinta e três euros e doze cêntimos)
b) Da quantia de € 2.270,70 (dois mil duzentos e setenta euros e setenta cêntimos),
de férias e subsídios de férias de 2008 e 2009 e subsídio de Natal de 2008, e da quantia de € 376,92 (trezentos e setenta e seis euros e noventa e dois cêntimos) de diuturnidades;
c) De subsídio de turno, em montante a liquidar em execução de sentença;
d) Quantias estas referidas em a) e b) acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos, contados à taxa anual legal, deste a citação até integral pagamento.
C. Absolvo a R. do demais peticionado;
D. Absolvo a Chamada DD – Actividades Hoteleiras, L.da de todo o peticionado.
Valor da acção: € 7.189,20 (sete mil cento e oitenta e nove euros e vinte cêntimos).
Custas a cargo de A. e R. BB, respectivamente na proporção de 12,5% e 87,5%.
Registe e notifique” – fim de transcrição.
Em 21 de Setembro de 2011, a Ré BB Empreendimentos Turísticos e Imobiliários, S.A., apelou.
Concluiu que:
(…)
A Autora contra alegou.
Concluiu que:
(…)
O recurso foi admitido.
Foram colhidos os vistos dos Exmºs Adjuntos.
Observou-se o disposto no artigo 87º, nº 3º do CPT, sendo certo que o MºPº emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
A recorrente respondeu.
Continuou a sustentar a bondade do recurso.

                                                     ****

Em 1ª instância foi dada como assente a seguinte matéria de facto:                                             
1 - A A. foi admitida para trabalhar por conta, ordem e direcção da CC II, em 1 de Fevereiro de 2000, (art.ºs 1.º petição inicial e 12.º contestação Chamada) mediante a celebração de um contrato de trabalho. (art.º 2.º petição inicial)
2 - Para desempenhar as funções de recepcionista estagiária. (art.º 3.º petição inicial)
3 - O local de trabalho da A. sempre foi o Hotel A..., em .... (art.º 4.º petição inicial)
4 - Em meados de Junho de 2007, a A. teve conhecimento que o estabelecimento onde trabalhava (Hotel A...) foi objecto de trespasse. (art.º 5.º petição inicial)
5 - Em finais de Julho de 2007, a A. foi informada, pelos proprietários da Chamada DD - Sociedade Turística, e pelo Director do Hotel, que passaria a trabalhar para a Ré BB Empreendimentos Turísticos e Imobiliários, S.A., e a partir dessa data, embora mantendo-se o mesmo Director do Hotel, passava a reportar-se à Gerência da Ré BB, que dava ordens. (art.º 6.º petição inicial)
6- Tendo a A. continuado a desempenhar as suas funções de recepcionista como sempre fez. (art.º 7.º petição inicial)
7 - A A. foi recebendo pontualmente a sua retribuição, a qual, pelo menos em Outubro e Novembro de 2007, lhe foi paga pela R. BB. (art.º 8.º petição inicial)
8 - Sucede que a A. engravidou e, no início de Dezembro, comunicou o seu estado ao seu superior hierárquico. (art.º 9.º petição inicial)
9 - Porém, foi-lhe diagnosticada uma gravidez de risco e esta passou a ser seguida no Instituto Português de Oncologia. (art.º 10.º petição inicial)
10 - Em 20 de Dezembro de 2007, a A. ficou doente e não pode continuar a trabalhar, uma vez que o seu estado de saúde não lho permitia, já que necessitava de repouso absoluto. (art.º 11.º petição inicial)
11 - A A. esteve de baixa médica desde 20 de Dezembro de 2007 até ao dia 13 de Julho de 2008, data do nascimento do seu filho. (art.º 12.º petição inicial)
12 - E entre 14 de Julho e 10 de Dezembro de 2008, a A. gozou de licença de maternidade. (art.º 13.º petição inicial)
13 - No entanto, a A. entregou pessoal e pontualmente o seu comprovativo de baixa médica no seu local de trabalho. (art.º 14.º petição inicial)
14 - A A. dirigiu-se à ACT para apresentar uma queixa. (art.º 17.º petição inicial)
15 - No dia 11 de Dezembro de 2008, a A., acompanhada de duas testemunhas, dirigiu-se ao Hotel A..., seu local de trabalho, disposta a recomeçar a trabalhar. (art.º 18.º petição inicial)
16 - Porém, assim que se apresentou ao trabalho, o responsável do hotel disse-lhe que seu posto de trabalho estava ocupado e que esta já não era trabalhadora do Hotel A..., que não a reconheciam como trabalhadora do mesmo. (art.º 19.º petição inicial)
17 - Foi-lhe novamente concedida baixa médica. (art.º 22.º petição inicial)
18 - A A. sempre enviou para a BB no dia imediatamente a seguir à concessão da baixa, o documento comprovativo da mesma, através de carta registada com aviso de recepção. (art.º 23.º petição inicial)
19 - Aconteceu que a BB recebeu a carta e, após a ter recepcionado, ao verificar o seu conteúdo, colocou o documento comprovativo da baixa médica enviada pela A. dentro de um envelope e remeteu-lho. (art.º 24.º petição inicial)
20 - A A. continuou a enviar a baixa médica através de carta registada dirigida à BB, que nunca as quis receber. (art.º 25.º petição inicial)
21 - Pelo que as cartas foram devolvidas à A.. (art.º 26.º petição inicial)
22 - A A. nunca justificou quaisquer faltas junto da Chamada. (art.º 25.º contestação Chamada)
23 - Desconhece a A. os termos em que foi efectuado o trespasse do Hotel A.... (art.º 28.º petição inicial)
24 - Apenas sabe que trabalhou por conta e direcção da BB desde Julho a Dezembro de 2007. (art.º 29.º petição inicial)
25 - A R. BB manteve a A., durante o tempo em que esta trabalhou, no seu posto de trabalho, tendo-lhe sido pagas as retribuições, nos termos supra referidos. (art.º 30.º petição inicial)
26 - À data do despedimento, a A. auferia a retribuição mensal de € 454,14, acrescida de subsídio de refeição no montante de € 6,05 por cada dia de trabalho. (art.º 37.º petição inicial)
27 - Em 31 de Março de 2001, a A. já tinha a categoria de recepcionista de segunda e à data do despedimento ainda continuava a receber o vencimento de recepcionista de segunda. (art.º 41.º petição inicial)
28 - A A. tinha o horário de trabalho das 7h às 16h ou das 8h às 13h e das 18h às 21h. (art.º 44.º petição inicial)
29 - A A. nunca recebeu subsídio de turno ou qualquer subsídio. (art.º 45.º petição inicial)

                                                    *

É sabido que o objecto do recurso apresenta-se delimitado pelas conclusões da respectiva alegação (artigos 684º nº 3º e 690º nº 1º ambos do CPC ex vi do artigo 87º do CPT).[i]
Porém, analisado o presente recurso constata-se que em termos alegatórios a recorrente suscita questão atinente à impugnação da matéria de facto.
Todavia tal impugnação apenas foi formulada em sede de alegações de recurso, sendo certo que se afigura ter sido abandonada nas respectivas conclusões.
Fica, pois, por tal motivo prejudicada a apreciação do recurso na  vertente da impugnação da matéria de facto, propriamente dita.

                                                          ***

Todavia em sede de conclusões a recorrente suscita três questões.
A primeira diz respeito à rectificação de lapso de escrito de que enfermaria a petição,  sendo que esta apresenta uma sub questão.
A recorrente entende que o tal título requerido pela Autora não devia ter sido deferido, o que implica a revogação dessa decisão,
Por outro lado, a recorrente também invoca neste particular que foram violados os artigos 393, nº 2º do CC.                                         
Ora tendo em conta o que se deixou explanado a tal respeito no relatório, constata-se que ,oportunamente, não foi interposto recurso do despacho que deferiu a pretensão rectificativa apresentada pela Autora , pelo que a decisão então proferida a tal título transitou em julgado.
E nem se esgrima com a decisão que indeferiu reclamação posteriormente apresentada, nos termos do disposto no nº 5º do artigo 650º do CPC, visto que esta apenas respeitava à ampliação da base instrutória e foi indeferida em 24 de Março de 2010.
Assim, constata-se que entre o indeferimento da “reclamação” e a sentença ocorreram mais duas sessões de julgamento ( em 11 de Abril de 2011 e 30 de Maio do mesmo ano), sendo que nenhuma nulidade processual (agora implicitamente arguida em sede de recurso) foi suscitada.
Por outro lado, a decisão que admitiu a requerida rectificação foi despachada no sentido do respectivo deferimento e logo notificada em 28 de Fevereiro de 2010, sendo que o recurso só veio a ser interposto em 21 de Setembro de 2010.
Como tal também nada cumpre aqui dirimir a tal título, improcedendo, deste modo o recurso neste particular.
Mas e quanto à violação do preceituado nos artigos 375, 376º e  393, nº 2º do CC ?
Com respeito por entendimento distinto, não se vislumbra em que é que os recibos juntos  com a petição inicial são impeditivos da matéria provada em :
4 - Em meados de Junho de 2007, a A. teve conhecimento que o estabelecimento onde trabalhava (Hotel A...) foi objecto de trespasse. (art.º 5.º petição inicial)
5 - Em finais de Julho de 2007, a A. foi informada, pelos proprietários da Chamada DD - Sociedade Turística, e pelo Director do Hotel, que passaria a trabalhar para a Ré BB Empreendimentos Turísticos e Imobiliários, S.A., e a partir dessa data, embora mantendo-se o mesmo Director do Hotel, passava a reportar-se à Gerência da Ré BB, que dava ordens. (art.º 6.º petição inicial)
6- Tendo a A. continuado a desempenhar as suas funções de recepcionista como sempre fez. (art.º 7.º petição inicial).
Alias, os mesmos até contendem com os cheques constantes de fls 33 e 34, emitidos pela aqui recorrente; sendo certo, por outro lado, que são documentos particulares e não autênticos.
E cabe recordar que a eficácia probatória de um documento particular apenas diz  respeito à materialidade das declarações que nele constam e não também à exactidão das mesmas.
Como tal não se afigura que ,só por si, os recibos em apreço sejam impeditivos de que se considere que entre recorrida e recorrente tenha existido – como se considerou que existiu – uma relação laboral desde o trespasse.
                                      
                                                      ****

Uma segunda questão consiste em saber se os créditos reclamados pelo Autor se encontram prescritos, sendo certo que a tal título invoca o preceituado no artigo 337º do CT/2009 [2], quando à situação em apreço logra aplicação o CT/2003,[3] atenta a data da cessação da relação laboral ( 11 de Dezembro de 2008 – vide factos nºs 15º e 16º    ), tal como bem decorre do disposto no artigo 7º , nºs 1º e  5, alínea b) da Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro.
Porém, este último diploma estatuía , igualmente , a tal título um prazo de prescrição de créditos laborais no seu artigo 381º nos termos do qual (prescrição e regime de provas de créditos resultantes de contrato de trabalho) :
“1 – Todos os créditos resultantes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação pertencentes ao empregador ou ao trabalhador , extinguem-se por prescrição decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho”.
Todavia, no caso em apreço, atenta a data da cessação da relação laboral (11 de Dezembro de 2008) e aquela em que foi intentada a presente acção ( 19 de Abril de 2009 – vide fls. 2) afigura-se evidente que não se verifica qualquer prescrição dos créditos laborais da Autora.
Improcede, assim, o recurso, igualmente ,neste ponto.

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A derradeira questão a apreciar tem a ver com a invocação por parte da recorrente do regime de cedência ocasional estabelecido nos artigos 289º e 292º do CT/2009, sendo que essas normas correspondem com alterações ao disposto nos artigos 323º, 324º ,329º e 676º, nº 1 do CT/2003.
Seja como for , em face da matéria assente nos autos , salvo o devido respeito por entendimento distinto, não se vislumbra que na situação sub júdice se verifique qualquer situação susceptível de ser enquadrada como cedência ocasional de trabalhador.
Desde logo, não se provou a existência de acordo de cedência entre cedente e cessionário, bem como a declaração de concordância do trabalhador que deve constar do documento que titula o acordo ( vide artigo 325º, nº 2º do CT/03).
Na realidade o que se afigura que se verificou foi uma situação de  transmissão de estabelecimento por via de trespasse.
Cabe a tal título recordar que o art. 318.° do CT/2003 regula:
“ 1 – Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade da empresa, do estabelecimento ou de parte da empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmite-se para o adquirente a posição jurídica de empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, bem como a responsabilidade pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laboral.
2 – Durante o período de um ano subsequente à transmissão, o transmitente responde solidariamente pelas obrigações vencidas até à data da transmissão.
3 – O disposto nos números anteriores é igualmente aplicável à transmissão, cessão ou reversão da exploração da empresa, do estabelecimento ou da unidade económica, sendo solidariamente responsável, em caso de cessão ou reversão, quem imediatamente antes exerceu a exploração da empresa, estabelecimento ou unidade económica.
4 – Considera-se unidade económica o conjunto de meios organizados com o objectivo de exercer uma actividade económica, principal ou acessória”.
E a tal título citando acórdão desta Relação , de 07-12-2010 ( proferido no processo nº 2187/08.5TTLSB.L1-4,[4]) recordar-se-á  que :
“ Este art. 318.º - que corresponde, com alterações, ao art. 37.º do Regime do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei nº 49.408, de 24 de Novembro de 1969 (RJCIT) – transpôs para o nosso ordenamento jurídico a Directiva nº 2001/23/CE, do Conselho, de 12.03.2001, relativa à aproximação das legislações dos Estados Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos. Esta directiva substituiu a Directiva nº 77/187/CEE do Conselho de 14.02.77, com a redacção que lhe foi dada pela Directiva nº98/50/CE do Conselho de 29.06.98.
O referido preceito consagra, por imposição da directiva que transpôs, o princípio da transmissão para o adquirente da empresa ou de estabelecimento de todas as obrigações relativas aos contratos de trabalho abrangidos pela respectiva transmissão. Significa isto que a transmissão da posição jurídica de empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores a que se refere o nº 1 não se esgota na subrogação legal no contrato (a que se referia Mota Pinto, a propósito do art. 37.º do RJCIT), antes inclui, conforme estabelece o art. 3.º, nº 1 da directiva, quaisquer direitos e obrigações do cedente emergentes de um contrato de trabalho ou de uma relação de trabalho existentes antes da data da transferência.
A noção de “unidade económica” constante do nº 4 reproduz o art. 1.º, nº 1, alínea b) da directiva atrás referida, com origem na Directiva nº 98/50/CE, do Conselho de 29.06.98 que, quanto a este ponto, recolheu o ensinamento da jurisprudência do Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia, segundo a qual é considerada transmissão a transferência de uma unidade económica que mantém a sua identidade, entendida (esta) como um conjunto de meios organizado, com objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória.
Devido ao elevado grau de indeterminação deste conceito, para averiguar a subsistência de uma unidade económica são frequentemente enunciados por aquele Tribunal os critérios considerados relevantes a atender: o tipo de estabelecimento, a transferência de bens corpóreos, a continuidade da clientela, o grau de semelhança da actividade exercida, antes e depois da transmissão, a assunção de efectivos, a estabilidade da estrutura organizativa, etc.. Mas a ponderação dos critérios varia de acordo com o caso concreto. Nas empresas cuja actividade assenta na mão de obra, o factor determinante para se considerar a existência da mesma unidade económica, pode ser o da manutenção dos efectivos. Para o referido Tribunal, um conjunto de trabalhadores que executa de forma durável uma actividade comum pode corresponder a uma unidade económica (Ac. de 2.12.999, Proc. C-234/98 – Caso Allen - http://curia.eu.int/pt), um conjunto organizado de trabalhadores que são especial e duradouramente afectos a uma tarefa comum pode, na ausência de outros factores de produção, corresponder a uma entidade económica (Ac. de 13.01.99, Proc. C-127/1996 – Caso Vidal - http://curia.eu.int/pt).
Deve salientar-se que os critérios enunciados pelo Tribunal de Justiça mostram uma crescente independência face a critérios próprios do direito comercial, bem como a superação de uma perspectiva predominantemente material do estabelecimento (que atribui grande importância, por ex., à transmissão de elementos do activo, designadamente bens patrimoniais que constituem o suporte do exercício de uma actividade) e que corresponde a uma visão clássica da empresa.
O regime jurídico enunciado apresenta uma dúplice justificação: por um lado, pretendem-se acautelar os interesses do cessionário em receber uma empresa funcionalmente operativa; mas, por outro lado, como foi enfatizado no âmbito do direito comunitário pelas mencionadas directivas, a manutenção dos contratos de trabalho existentes à data da transmissão para a nova entidade patronal pretende proteger os
 trabalhadores, garantindo a subsistência dos seus contratos e a manutenção dos seus direitos quando exista uma transferência de estabelecimento” – fim de transcrição.
Ora tendo em conta tais elementos e a matéria apurada em 4 e 5 [5]afigura-se que se pode e deve considerar que , no caso concreto, se verificou por via de um trespasse do Hotel onde a Autora sempre laborou ( vide ponto nº 3º da matéria apurada) uma transferência ou transmissão de uma verdadeira unidade económica entre a chamada e a ora recorrente e não uma cedência ocasional de trabalhadora.
Não tem , pois, cabimento, no caso em apreço, o regime invocado pela recorrente.
Improcede, assim, o recurso neste ponto e como tal na íntegra.

                                                      ****

Nestes termos, acorda-se em julgar improcedente o presente recurso, confirmando-se a decisão recorrida,
Custas pela recorrente.
DN (processado e revisto pelo relator -  nº 5º do artigo 138º do CPC).
   
Lisboa, 25 de Janeiro de 2012

Leopoldo Soares
José Eduardo Sapateiro
Maria José Costa Pinto.
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[1] Em 19 de Abril de 2009 – vide fls 2.
[2] Aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro – Lei que aprovou a revisão do Código do Trabalho -  que entrou em vigor em 17 de Fevereiro de 2009.
[3] Aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto.
[4] Relatora  ISABEL TAPADINHAS.
[5] Isto é que:
4 - Em meados de Junho de 2007, a A. teve conhecimento que o estabelecimento onde trabalhava (Hotel A...) foi objecto de trespasse. (art.º 5.º petição inicial)
5 - Em finais de Julho de 2007, a A. foi informada, pelos proprietários da Chamada A... - Sociedade Turística, e pelo Director do Hotel, que passaria a trabalhar para a Ré ... Empreendimentos Turísticos e Imobiliários, S.A., e a partir dessa data, embora mantendo-se o mesmo Director do Hotel, passava a reportar-se à Gerência da Ré ..., que dava ordens. (art.º 6.º petição inicial)
Decisão Texto Integral: