Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
270/03.2TTVFX.L1-4
Relator: JOSÉ EDUARDO SAPATEIRO
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
INCAPACIDADE PERMANENTE ABSOLUTA PARA O TRABALHO HABITUAL
FIXAÇÃO DA INCAPACIDADE
SUBSÍDIO DE ELEVADA INCAPACIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/08/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A DECISÃO
Sumário: I – Apesar do incidente de revisão ser dependente da acção onde foi fixada originalmente a incapacidade do sinistrado, o mesmo caracteriza-se por possuir uma plena autonomia formal relativamente aquela, com um conteúdo, alcance e sentido diferentes dos aí prosseguidos e uma tramitação adjectiva própria, que justifica, em termos processuais, que se aplique o regime em vigor à data da sua instauração.
II – A prova pericial em que se traduzem os exames médicos, quer de natureza singular como colectiva, efectuados no quadro nas acções emergentes de acidente de trabalho, está sujeita à livre apreciação do julgador.
III – O juiz de trabalho não está vinculado, em termos de estrutura e sequência processuais obrigatórias, a finalizar a fase instrutória da acção ou incidente relativo a acidente de trabalho com o exame por junta médica, quando a ele haja lugar, podendo ordenar, após a concretização do exame por junta médica e antes de proferir decisão, outros exames, relatórios, pareceres, etc.
IV – O sinistrado está afectado por uma IPATH, em razão do tipo de tarefas, posturas físicas repetidas e condutas de cariz profissional que reiteradamente tem de realizar como armador de ferro, do tipo de lesões permanentes que o afectam (lombalgia de esforço, com dores e limitações ao nível da destreza e resistência corporais), idade que possui e impossibilidade relativa e absoluta da sua conversão profissional.
V – Existe uma diferença de grau (quantitativo e qualitativo) entre a situação prevista na alínea a) da 5.ª Instrução Geral (Factor de Bonificação de 1,5) e a IPATH, não se podendo cumular uma e outra relativamente à mesma lesão do sinistrado.
VI – A data a considerar para efeitos da fixação da incapacidade e do pagamento da pensão é o da formulação do pedido de revisão. VII – Tendo, anteriormente, sido atribuída ao sinistrado uma pensão obrigatoriamente remível, impõe-se deduzi-la à pensão de valor superior determinada no quadro do incidente de revisão.
VIII – Numa situação de IPATH e com referência ao subsídio de elevada incapacidade permanente (artigo 23.º da LAT), não há qualquer ponderação a fazer em função da IPP residual atribuída, pois trata-se, como a IPA, de uma incapacidade absoluta, não mensurada nesses termos.
IX – Tal prestação deverá ser paga pela Ré Seguradora, dado que não é atribuída nem aferida em função do salário auferido pelo sinistrado nem na razão da responsabilidade transferida para a entidade seguradora pela entidade empregadora.
(Elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:ACORDAM NESTE TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:

I – RELATÓRIO

Os presentes autos de acção emergente de acidente de trabalho tiveram a sua origem no acidente ocorrido em 21/03/2002 e que afectou o sinistrado AA, nascido em 09/05/1955 e natural da Geórgia, quando o mesmo se achava a trabalhar, como armador de ferro, por conta e sob as ordens, direcção e fiscalização da entidade patronal BB -, LDA., tendo a sua responsabilidade infortunística laboral parcialmente transferida para a COMPANHIA DE SEGUROS CC, SA.
Procedeu-se à realização do competente exame médico, a fls. 57 e 58 no qual foi considerado o sinistrado afectado por uma IPP de 10%, desde 12/03/2003, tendo os Serviços Clínicos da Seguradora lhe atribuído também uma IPP de 10% (fls. 3).
Realizada, no dia 4/02/2004, a tentativa de conciliação sob a presidência do MP, a fls. 72 a 75, sinistrado, entidade empregadora e seguradora assentaram nos seguintes pontos:
- Que no dia 21/03/02, em Lisboa, quando o sinistrado desempenhava as funções de armador de ferro por conta e sob as ordens, direcção e fiscalização da entidade patronal BB –, LDA., (…), sofreu um acidente de trabalho que consistiu em ter sentido uma dor na região zona lombar quando levantava um ferro, o que lhe provocou as lesões constantes dos autos;
- Que o sinistrado auferia o vencimento anual de Euros 6.103,78 (Euros 348,00 x 14 meses, a título de remuneração base + Euros 111,98 x 11 meses, a título de subsídio de alimentação);
- Que o sinistrado tinha transferida para a Seguradora COMPANHIA DE SEGUROS CC, SA a sua responsabilidade infortunística laboral apenas pelo valor da remuneração-base x 14 meses.
- Que a Seguradora, com base na IPP de 10% desde 12/03/2003, pagará ao sinistrado o capital de remição da pensão anual de € 341,04, devida desde 13/03/2003;
- Que a Entidade Empregadora, com base na IPP de 10% desde 12/03/2003, pagará ao sinistrado o capital de remição da pensão anual de € 86,22, devida desde 13/03/2003.
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Foi proferido, a fls. 79 e com data de 9/02/2003, sentença homologatória do acordo a que sinistrado, empregadora e seguradora fizerem no âmbito da Tentativa de Conciliação.
O capital de remição devido ao sinistrado pela entidade patronal e Companhia de Seguros foi-lhe entregue, em 24/03/2004, conforme Termos de fls. 105 e 106.
Os autos foram à conta e, depois de liquidadas as custas em dívida, arquivados nos termos legais, em 19/02/2005 (fls. 138).
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Veio o sinistrado AA, em 9/08/2006 e a fls. 139 e 140, requerer o presente incidente de revisão da pensão a ele atribuída, nos termos dos artigos 145.º do C.P.T. e 25.º da lei n.º 100/97 de 13/09, por se terem agravado as lesões de que foi vítima por acidente de trabalho ocorrido em 21/03/2002 (o Requerente refere a data de 21/03/2006, quando, em nosso entender, era aquela data a que pretendia aludir), formulando ainda um pedido de reembolso de despesas que fez com consultas e exames médicos.
O mesmo alega, a esse propósito e para o efeito, o seguinte:
Salvo melhor opinião, o sinistrado entende padecer de uma incapacidade permanente para a actividade habitual, pois o médico do Hospital ... disse ao sinistrado que não podia levantar pesos de mais de 3 kg.
O Sinistrado tem lesões muito graves na coluna.
De facto, o Sinistrado tem grandes dores na coluna e na perna direita.
Não há dúvidas quanto ao acidente e à caracterização do mesmo que foi assumida.
O sinistrado pretende assim reabrir processo de acidentes de trabalho de forma a assegurar os seus direitos e a ter uma incapacidade para a Profissão Habitual.
Juntou Documentação clínica (fls. 145 a 150 - TAC Coluna Lombo - Sagrada).
Tendo sido designada data para a realização do exame médico (fls. 153), a Seguradora (fls. 157) e entidade empregadora (fls. 158 a 171) vieram opor-se ao pedido de reembolso formulado pelo Sinistrado, tendo o mesmo sido indeferido nos termos constantes do despacho de fls. 172, que, nessa medida, acompanhou o parecer do Ministério Público de fls. 171.
A responsável BB–LDA., apesar de tal decisão, apresentou ainda o requerimento de fls. 204, onde afirma querer discutir a responsabilidade total ou parcial do agravamento das lesões do sinistrado.
Procedeu-se à realização do pretendido exame de revisão, conforme fls. 191 a 194 e 372 a 375, tendo o Sr. perito médico atribuído uma IPP de 22,5%, desde 30/01/2008, ao sinistrado, com base no Boletim de Alta da Seguradora de fls. 285, onde lhe foi mantida a IPP de 10%, desde 30/01/2008, nos exames complementares de fls. 331 a 334 e 341 a 343 e no parecer de neurocirurgia que solicitou previamente e que foi nesse mesmo sentido (IPP de 15% x Factor de Bonificação 1,5), conforme fls. 323 e 362, dessa forma alterando a desvalorização que lhe havia sido determinada pelo exame singular de fls. 574 (IPP de 10%, desde 12/3/03).
O Sinistrado foi juntando aos autos diversa documentação clínica, certificados de baixa por doença (Segurança Social) e requerimentos (nomeadamente, em que era pedida a intervenção dos serviços clínicos da Seguradora, com vista os seu tratamento, bem como o pagamento de diversas despesas efectuadas) – cf. fls. 186 a 189, 196 a 202, 214 e 215, 231 e 232, 250 e 251, 255 a 259, 263 a 265, 280 a 283, 292 e 293, 295 a 299, 303 a 309, 320 e 321, 354 a 362, 399 a 401.
A Seguradora, desde, 6 ou 16 de Fevereiro de 2007, aceitou proceder à reavaliação da situação clínica do Sinistrado, tendo sido o mesmo sujeito a sucessivos tratamentos nos seus serviços clínicos até ao dia 30/01/2008 em que os mesmos lhe deram alta, ficando entre uma e outra data em situação de ITA, com direito a indemnização, tendo ainda assumido o pagamento de despesas reclamadas por aquele – cf. fls. 205, 206, 216 a 222, 227, 234 e 235, 240 e 241, 245 a 249, 260, 272 e 273, 276 e 277, 284 e 285 – alta clínica - e 290 e 291.
Notificadas as partes do resultado de tal exame, vieram a Seguradora (fls. 380 e 381) e o Sinistrado, patrocinado para o efeito pelo Ministério Público (fls. 383) deduzir oposição a tal parecer, requerendo a realização da competente junta médica, nos termos do artigo 145º n.º 4 do C.P.T. – tendo o sinistrado manifestado a fls. 398, a sua oposição aos quesitos formulados pela Companhia de Seguros –, que, sendo da especialidade de neurocirurgia (conforme ressalta de fls. 394 a 396), veio a reunir-se a fls. 423 e 426 e a atribuir, por unanimidade, uma IPP de 10%, desde 30/01/2008 (presume-se) ao sinistrado.
O sinistrado juntou aos autos, a fls. 411 a 422, procuração passada a advogado, bem como comprovativo da concessão de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo.
O Sinistrado, notificado do parecer da Junta Médica, veio, em 12/10/2009, a fls. 439 a 467, reclamar da referida perícia, requerendo, designadamente, que fosse feita um exame de avaliação da incapacidade (artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30/04), por entender estar afectado de uma IPATH.
Juntou dois Arestos do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal da Relação de Lisboa.
Foi proferido, a fls. 481 e com data de 07/12/2009, despacho em que se solicitava ao Centro de Formação Profissional de Lisboa a elaboração de parecer mos termos do artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30/04, devendo o mesmo pronunciar-se expressamente se o sinistrado se encontra ou não afectado de IPATH.
Foi junto, a fls. 485 a 489, pelo IEFP, o Parecer n.º 49/DEM/EM-10/2010, sobre a análise das funções do sinistrado.
Posteriormente, foi junto a fls. 498 a 503, Parecer do IEFP, em que se concluía nos mesmos termos da Junta Médica de Neurocirurgia (IPP de 10%, sem IPATH).
Tal especialista, após reclamação do sinistrado de fls. 507 a 515 e despacho judicial de fls. 516, em que lhe era solicitada a prestação dos esclarecimentos pedidos pelo trabalhador, veio, a fls. 526 a 530 novo relatório (depois reiterado a fls. 552 e 558) onde era atribuída ao sinistrado uma IPP de 15% (IPP de 10% x factor de bonificação de 1,5), com IPATH.
O Sinistrado, notificado de tal parecer, veio apresentar o requerimento de fls. 544 a 550 (cf. também 566 a 573), onde discrimina as quantias vencidas e vincendas, a título de pensão e juros de mora calculados sobre as já devidas, para além de subsídio de elevada incapacidade.
Foi então proferido Parecer pelo Ministério Público no sentido de atribuir ao Sinistrado a desvalorização determinada pelo último Parecer (fls. 536), vindo a ser elaborada, a fls. 574 a 576 e com data de 03/05/2011, sentença que, em síntese, decidiu o litígio nos termos seguintes:
Em 09 de Agosto de 2006, requereu o sinistrado AA a revisão da sua incapacidade por entender que se verificou o agravamento das lesões sofridas em consequência do acidente em causa nestes autos.
Procedeu-se a exame médico de revisão em que, finalmente, lhe foi reconhecida uma IPP de 15% (0,10 x 1,5) com IPATH, com competência para um trabalho compatível com a capacidade residual graduável em 75%, desde a data do pedido de exame de revisão.
Este resultado não foi questionado por qualquer das Rés, pese embora a entidade empregadora tenha, em 16 de Outubro de 2006 formulado o requerimento junto a fls. 158 e segs., ao qual não foi dado qualquer sequência.
Em face do parecer maioritário dos peritos que compuseram a junta médica e dos exames complementares de diagnóstico a que o sinistrado foi sujeito, não há necessidade de realização de outras diligências.
Cumpre decidir:
Considero assente o grau de desvalorização fixado pela Junta Médica, o qual é, neste momento, de 15% (0,10 x 1,5) com IPATH, com competência para um trabalho compatível com a capacidade residual graduável em 75%, desde a data do pedido de exame de revisão.
Constata-se, pois, que o sinistrado sofreu alteração da afectação da capacidade de ganho desde a prolação da decisão de fls. 79.
Importa, pois, determinar o novo quantitativo do capital de remição da pensão devida ao sinistrado.
Assim, atendendo ao resultado da junta médica, que se mostra conforme as disposições da Tabela Nacional de Incapacidades, e a que a pensão arbitrada ao sinistrado, no montante anual de € 427,26 desde 13 de Março de 2003, provinha de uma IPP de 10%, determino o aumento da pensão para o montante anual de € 640,90, desde 09 de Agosto de 2006, sendo € 511,76 da responsabilidade da seguradora e € 139,34, da responsabilidade da entidade empregadora.
Esta pensão é obrigatoriamente remível desde aquela data, nos termos do disposto nos art.ºs 17.º, n.º 1, alínea d), 33.º, no 1 e 41.º, n.º 2, todos da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro e 56.º, n.º 1, alínea b) e 74.º, ambos do D.L. 143/99, de 30 de Abril, devendo ser abatido o capital já remido aquando da fixação da anterior pensão.
Por via da IPATH, receberá ainda o sinistrado a pensão anual e vitalícia de € 4.176,35 euros, desde 09 de Agosto de 2006, sendo € 3.333,35 da responsabilidade da seguradora e € 842,77 da responsabilidade da entidade empregadora - artigo 17.º, n.º 1, al. b) da Lei 100/97, de 13 de Setembro.
Decisão
Em face do exposto, julgo procedente o presente incidente de revisão e, em consequência, condeno as entidades responsáveis, nos termos e proporções anteriormente explicitados, a pagar ao sinistrado o capital de remição de uma pensão anual de € 640,90, com efeitos a partir de 14 de Outubro de 2008 (tendo-se em atenção o capital já anteriormente recebido) e a pensão anual e vitalícia de € 4.176,35 euros, desde a mesma altura.
Custas pela seguradora e entidade empregadora, no montante de 5/6 para a primeira e 116 para a segunda.
Notifique e registe.
Após trânsito, proceda-se ao cálculo do capital de remição.
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A Magistrada do Ministério Publico do Tribunal do Trabalho de Lisboa veio, a fls. 586 e 587 dos autos e na sequência da notificação da sentença de fls. 574 e seguintes requerer a sua rectificação nos termos do art. 667° do CPC, com os fundamentos seguintes:
(…)
*
Foi proferido despacho a fls. 607, onde se entendeu que a requerida rectificação da sentença não era possível, pela ausência dos pressupostos que a possibilitariam e atento o recurso já apresentado.
*
A Ré COMPANHIA DE SEGUROS CC, SA, inconformada com tal sentença, veio, a fls. 592 e seguintes, interpor recurso da mesma, que foi admitido a fls. 674 dos autos, como de Apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
*
A Apelante apresentou, a fls. 592 e seguintes, alegações de recurso e formulou as seguintes conclusões:
(…)
*
O sinistrado apresentou contra-alegações dentro do prazo legal, na sequência da respectiva notificação, tendo formulado as seguintes conclusões (fls. 612 e seguintes):
(…)
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O sinistrado interpôs ainda recurso subordinado da sentença, conforme fls. 635 e seguintes, tendo formulado as seguintes conclusões:
( )
*
A Ré seguradora não apresentou, relativamente a tal recurso subordinado, contra-alegações dentro do prazo legal, apesar de notificada para o efeito.
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O ilustre magistrado do Ministério Público, a fls. 686 e 687, deu parecer no sentido da improcedência do recurso de Apelação da Ré Seguradora (e ao que julgamos, também no sentido da improcedência do Recurso de Apelação Subordinado do Sinistrado), não tendo as partes se pronunciado acerca do mesmo dentro do prazo legal, apesar de notificadas para o efeito.
*
Tendo os autos ido aos vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – OS FACTOS

Os factos a considerar encontram-se descritos no Relatório do presente Aresto, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, na parte que releva.
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III – OS FACTOS E O DIREITO

É pelas conclusões do recurso que se delimita o seu âmbito de cognição, nos termos do disposto nos artigos 690.º e 684.º n.º 3, ambos do Código de Processo Civil, salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 660.º n.º 2 do Código de Processo Civil).
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A – REGIME ADJECTIVO E SUBSTANTIVO APLICÁVEIS

Importa, antes de mais, definir o regime processual aplicável aos presentes autos, atendendo à circunstância deste pedido de revisão da incapacidade sido apresentado em 9/08/2006, ou seja, antes da entrada em vigor das alterações introduzidas no Código do Processo do Trabalho pelo Decreto-Lei n.º 295/2009, de 13/10, que segundo o seu artigo 6.º, só se aplicam às acções que se iniciem após a sua entrada em vigor, tendo tal acontecido, de acordo com o artigo 9.º do mesmo diploma legal, somente em 1/01/2010.
Este incidente de revisão, para efeitos de aplicação supletiva do regime adjectivo comum, foi instaurada depois da entrada em vigor (que ocorreu no dia 15/9/2003) das alterações introduzidas no Código de Processo Civil pelo Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8/03 mas antes da reforma ensaiada pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24/08, que só se aplicou aos processos instaurados a partir de 01/1/2008, data da sua entrada em vigor (artigos 12.º e 11.º do aludido diploma legal).
Importa realçar que tal incidente foi também e naturalmente instaurado antes da produção de efeitos das mais recentes alterações trazidas a público pelo Decreto-Lei n.º 226/2008, de 20/11 e parcialmente em vigor desde 31/03/2009, com algumas excepções que não tem relevância na economia dos presentes autos (artigos 22.º e 23.º desse texto legal) – cf., quanto ao complexo regime decorrente das normas de direito transitório constantes do último diploma legal indicado, Eduardo Paiva e Helena Cabrita, “O processo executivo e o agente de execução”, 2.ª Edição, Abril de 2010, Edição conjunta de Wolsters Kluwer Portugal e Coimbra Editora, páginas 19 e seguintes -, mas esse regime, centrado, essencialmente, na acção executiva, pouca ou nenhuma relevância teria, de qualquer forma, para a economia deste processo judicial.
Não se ignora que a acção de que o incidente de revisão depende (na sua fase conciliatória - cf. artigo 26.º, números 2 e 3 e 99.º do Código do Processo do Trabalho de 1999) deu entrada em tribunal em 19/03/2003, ou seja, antes da aludida reforma de 2003, mas temos para nós que o incidente de revisão da incapacidade se caracteriza por possuir uma plena autonomia formal relativamente à acção original, com um conteúdo, alcance e sentido diferentes dos aí prosseguidos e uma tramitação adjectiva própria, que justifica, em termos processuais, que se aplique o regime em vigor à data da sua instauração.
Será, portanto, de acordo com o regime legal decorrente do anterior Código do Processo do Trabalho e da reforma do processo civil de 2003 e dos diplomas entretanto publicados e com produção de efeitos até ao dia da instauração dos presentes autos, que iremos apreciar as diversas questões suscitadas neste recurso de apelação.
Também se irá considerar, em termos de custas devidas no processo, o anterior Código das Custas Judiciais, dado que o Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26/02, rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 22/2008, de 24 de Abril e alterado pelas Lei n.º 43/2008, de 27-08, Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28-08, Lei n.º 64-A/2008, de 31-12 e Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, só ter entrado em vigor no dia 20 de Abril de 2009 e se aplicar a processos instaurados após essa data.
Importa, finalmente, atentar na circunstância dos factos que se discutem no quadro destes autos terem todos ocorrido na vigência da LAT (ou seja, da Lei dos Acidentes do Trabalho aprovada pela Lei n.º 100/97, de 13/09 e da respectiva regulamentação inserida no Decreto-Lei n.º 143/99, de 30/04), dado as normas constantes do Código do Trabalho de 2009 – que entrou em vigor em 17/02/2009 –, relativas aos acidentes de trabalho (artigos 281.º e seguintes) estarem dependentes de legislação especial que só veio a encontrar a luz do direito com a Lei n.º 98/2009, de 4/09 e que, segundo os seus artigos 185.º, 186.º e 187.º, revogou o regime anterior (aquele aqui aplicável) e está em vigor desde 1/01/2010 e para eventos infortunísticos de carácter laboral ocorridos após essa data.

I – RECURSO DE APELAÇÃO DA SEGURADORA

B – NULIDADE DA SENTENÇA

A COMPANHIA DE SEGUROS CC, SA vem, nas suas alegações, arguir a nulidade da sentença impugnada, nos termos e para os efeitos do artigo 668.º, número 1, alínea b) do Código de Processo Civil (“É nula a sentença: b) Quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;), estipulando ainda os artigos 158.º, número 1 e 659.º, número 2, desse mesmo diploma legal, a propósito, respectivamente, do dever de fundamentação da decisão e da estrutura da sentença, que “as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas” e “…seguem-se os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes concluindo pela decisão final”.
O mesmo Apelante suscita ainda uma outra nulidade da sentença recorrida, que se mostra vertida no número 1, alínea d) do Código de Processo Civil (“É nula a sentença: d) Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”), convindo ainda visitar os artigos 264.º, número 2 e 660.º, número 2, do mesmo texto legal, quando, respectivamente, estatuem que “O juiz só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes, sem prejuízo do disposto nos artigos 514.º e 665.º e da consideração, mesmo oficiosa, dos factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa” e “O juiz deve resolver todas as questões que nas partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se ali lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”.
A recorrente, para fundar tais nulidades, alega o seguinte:
A sentença é nula, quando, designadamente, não especifica as fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, e quando deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar (art.º 668.º do CPC).
Ao decidir que o sinistrado está afectado de uma IPP de 15% com IPATH, sem que tenha antes fundamentado a razão de ser da sua opção pela incapacidade atribuída no parecer do IEFP em detrimento do parecer por unanimidade dos Senhores Peritos da junta médica, o Mmo. Juiz a quo proferiu decisão não especificando os seus fundamentos de facto e de direito. Simples e implicitamente mostra ter aderido a uma das posições periciais, nada mais acrescentando que permita aos destinatários da douta sentença descortinar as razoes da sua real motivação.
Nestas condições, afigura-se que a douta sentença padece de nulidade.
Dado que, nos termos do art.º 77.º, no 1 do CPT, a arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso, a arguente não pode deixar de, por mera cautela e sempre sem prescindir, deixar de aqui arguir, com os fundamentos que antecedem, a nulidade da douta sentença.
Impõe-se, desde logo e antes de mais, atentar na regra especial, de índole formal, que, no quadro do direito processual laboralista, vigora nesta matéria e que se acha contida no número 1 do artigo 77.º do Código de Processo de Trabalho:

Artigo 77.º
Arguição de nulidades da sentença
1 – A arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso.
2 – (…)

Ora, compulsando a peça processual que suporta as alegações de recurso, verifica-se que a Ré, apesar de invocar, primeiramente, uma nulidade processual secundária (artigo 201.º do Código de Processo Civil), vem suscitar, com autonomia formal e substantiva, as nulidades de sentença em análise, o que legitima processualmente a sua apreciação pior este tribunal de recurso.
Acerca do primeiro vício de natureza formal que deixámos enunciado, convirá ouvir Fernando Amâncio Ferreira, em “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 6.ª Edição, Almedina, páginas 52 e seguintes, quando afirma o seguinte: “A falta de motivação susceptível de integrar a nulidade de sentença é apenas a que se reporta à falta absoluta de fundamentos quer estes respeitem aos factos quer ao direito (…)”, bem como Jaime Octávio Cardona Ferreira, “Guia de Recursos em Processo Civil – o novo regime recursório civil”, Coimbra Editora, Novembro de 2007, página 54, ao defender o seguinte: “Omissão dos fundamentos de facto e de Direito que justificam a decisão (cfr. art. 158.º); não é o mesmo que fundamentação insuficiente, inadequada ou, até, errada (…)”.
A decisão impugnada diz, a certa altura, o seguinte:
“Procedeu-se a exame médico de revisão em que, finalmente, lhe foi reconhecida uma IPP de 15% (0,10 x 1,5) com IPATH, com competência para um trabalho compatível com a capacidade residual graduável em 75%, desde a data do pedido de exame de revisão.
Este resultado não foi questionado por qualquer das Rés, pese embora a entidade empregadora tenha, em 16 de Outubro de 2006 formulado o requerimento junto a fls. 158 e segs., ao qual não foi dado qualquer sequência.
Em face do parecer maioritário dos peritos que compuseram a junta médica e dos exames complementares de diagnóstico a que o sinistrado foi sujeito, não há necessidade de realização de outras diligências.”
Ora, da leitura atenta da sentença recorrida não ressalta, salvo a devida opinião, uma absoluta carência de fundamentação, quer em termos fácticos, como meramente jurídicos, que possa, de alguma forma, ser reconduzida à nulidade aqui em apreço e prevista na alínea b) do número 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil.
Entrando agora na análise da segunda nulidade invocada (na sua vertente de omissão de pronúncia), convirá ouvir, por todos e mais uma vez, Fernando Amâncio Ferreira, obra citada, páginas 54 e 55, quando afirma o seguinte:
À omissão de pronúncia alude a 1.ª parte da alínea d) do número 1 do artigo 668.º e traduz-se na circunstância de o juiz se não pronunciar sobre questões que devesse apreciar, ante o estatuído na 1.ª parte do número 2 do artigo 660.º.
Trata-se da nulidade mais invocada nos tribunais, originada na confusão que se estabelece com frequência entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos no decurso da demanda. (…)”.
Será conveniente chamar aqui à colação o disposto no artigo 664.º do Código de Processo Civil, quando determina que “o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito; mas só pode servir-se dos factos articulados pelas partes, sem prejuízo do disposto no artigo 264.º.”
O Prof. Alberto dos Reis, na obra citada, página 453 refere que “(…) O Juiz pode ir buscar regras diferentes daquelas que as partes invocaram; pode atribuir às regras invocadas pelas partes sentido diferente do que estas lhe deram; pode fazer derivar das regras de que as partes se serviram efeitos e consequências diversas das que estas tiraram …”, defendendo, por seu turno, João de Castro Mendes, em “Direito Processual Civil”, Volume I, Edição da AAFDL, 1980, págs. 218 e seguintes que «Estabelece-se que o Juiz não está sujeito à vontade das partes quanto às soluções de direito (art. 664.º). Isto porque, em princípio, se pretende que a solução dada à hipótese presente ao Tribunal seja a realmente verdadeira (princípio da verdade material) e não apenas aquela que se justifica em face da maneira como decorreu o processo (princípio da verdade formal). Neste campo o Juiz só é limitado pela lei, não pela vontade das partes».
Importa por, outro lado, lembrar que as questões a que alude a transcrita alínea d) do número 1 do art. 668.º do Código de Processo Civil são as concernentes ao pedido e à causa de pedir que suportam a demanda judicial e não a todas e cada uma das razões, fundamentos, motivações ou meios de prova apresentados pelas partes ao longo da tramitação dos autos, defendendo, a este propósito, o Professor Lebre de Freitas, “Código de Processo Civil Anotado”, Volume 2.º, Coimbra Editora, página 670 que o juiz deve “(…) conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e de todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer, …, não podendo o juiz conhecer de causas de pedir não invocadas, nem de excepções na exclusiva disponibilidade das partes…”, ao passo que o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11.01.2000, publicado no BMJ n.º 493.º, páginas 385 e seguintes, “… Questões para este efeito são, desde logo, as que se prendem com o pedido e a causa de pedir. São, em primeiro lugar, todas as pretensões formuladas pelas partes, que requerem decisão do juiz, qualquer que seja a forma como são deduzidas (pedidos, excepções, reconvenção) …”.
Afigura-se-nos não nos encontrarmos face a uma genuína omissão de pronúncia, dado a sentença impugnada não ter escamoteado o julgamento das matérias colocadas no presente incidente de revisão, sem prejuízo de poder ser censurada pela maneira como ponderou os diversos elementos de prova constantes dos autos - clínicos e funcionais - e interpretou e aplicou o regime legal pertinente, situações reconduzíveis a eventuais erros de julgamento, a apreciar de seguida, mas nunca a uma nulidade de sentença.
Logo, por as questões suscitadas não configurarem, verdadeiramente, as nulidades de sentença arguidas pela Ré nas suas alegações e previstas no artigo 668.º, número 1, alíneas c) e d) do Código de Processo Civil, vão as mesmas indeferidas.

C – NULIDADE SECUNDÁRIA DO PROCESSO – OPORTUNIDADE E MEIO ADJECTIVO PRÓPRIO PARA A SUA INVOCAÇÃO

A recorrente vem também qualificar a conduta do tribunal recorrido, traduzida na não convocação de uma nova Junta Médica de Neurologia, como uma nulidade processual de índole secundária, nos termos e para os efeitos dos artigos 201.º e 205.º do Código de Processo Civil, dado entender que a realização desse segundo exame era obrigatório, por os pareceres emanados de tal corpo clínico colectivo constituírem a mãe das provas neste tipo de processos, em que se visa determinar a desvalorização de que padecem os sinistrados.
Ora, impõe-se averiguar da oportunidade e legitimidade da arguição desta irregularidade processual no quadro das alegações da presente Apelação de Apelação, atento o regime legal das nulidades processuais e objecto e finalidade dos recursos.
O Professor José Alberto dos Reis, no seu “Comentário ao Código de Processo Civil”, Volume II, página 507 a 510, a este respeito, afirma o seguinte: “a arguição da nulidade só é admissível quando a infracção processual não está ao abrigo de qualquer despacho judicial; se há um despacho a ordenar ou autorizar a prática ou a omissão do acto ou da formalidade, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade que se tenha cometido, não é a arguição ou a reclamação por nulidade, é a impugnação do respectivo despacho pela interposição do recurso competente.
Eis o que a jurisprudência consagrou nos postulados: dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se. (…)”.).
Aprofundando a questão, dir-se-ia que nada impedia a Ré de arguir tal (eventual) nulidade dentro do prazo de 10 dias (artigos 201.º e 205.º do Código de Processo Civil) e, caso a mesma viesse a ser indeferida, interpor recurso de agravo (e não de apelação) do correspondente despacho, em paralelo com o recurso de apelação da sentença final, conforme se mostra expressamente previsto nos artigo 735.º e 736.º do Código de Processo Civil (na sua redacção anterior à reforma dos recursos) e que, por força, da manutenção dessas duas espécies de recursos no quadro do Código do Processo do Trabalho, têm de ser aqui aplicadas.
Logo, o meio de impugnação adequado ao objectivo perseguido pela demandada não seria o levantamento dessa questão nova em sede de recurso (quer fosse de apelação, como é a situação dos autos, quer de agravo) mas antes a formulação, dentro do prazo de 10 dias a contar da notificação da sentença, do competente requerimento de arguição da nulidade processual, podendo depois interpor recurso de agravo do despacho que indeferisse tal nulidade.
A questão suscitada, atento o cenário adjectivo dos autos, não é, todavia, de resposta tão simples e esquemática como, à primeira vista, parece.
É que a Ré Seguradora – ainda que se tenha remetido ao silêncio, na sequência da comunicação do segundo Parecer do IEFP e dos dois esclarecimentos posteriores, que de pouco adiantaram ao conteúdo daquele –, só com a notificação da sentença de revisão é que se apercebe da não determinação pelo tribunal da 1.ª instância de quaisquer outras diligências – verdadeira grandeza, de um segundo Exame por Junta Médica de Neurocirurgia –, que, no entender do julgador, são desnecessárias, conforme expressamente declarado no final do seu relatório (“Em face do parecer maioritário dos peritos que compuseram a junta médica e dos exames complementares de diagnóstico a que o sinistrado foi sujeito, não há necessidade de realização de outras diligências.”), o que nos faz cair na segunda hipótese referida por Alberto dos Reis, a saber, a irregularidade processual cometida mostra-se justificada e coberta por um despacho judicial (neste caso, a decisão judicial impugnada), sendo, nessa medida, o recurso o meio de reacção próprio para atacar tal situação.
Chegados aqui e atendendo ao disposto no artigo 691.º do Código de Processo Civil, que reserva e resguarda o recurso de Apelação para a “decisão do mérito da causa” (a este último se equiparando o julgamento de excepções peremptórias), resta-nos perguntar se o meio de impugnação próprio para discutir e julgar uma questão como essa – nulidade processual secundária ou mesmo principal – não seria o Agravo – que não foi interposto pela Ré Seguradora – e não a presente Apelação.
A dúvida, ainda que meramente formal, coloca-se no quadro do anterior Código de Processo de Trabalho, aqui aplicável, como já vimos, dado se manter a dicotomia entre o recurso de Apelação e o recurso de Agravo e o seu diverso âmbito de aplicação, mas, ainda que sem certezas, afigura-se-nos como excessivamente formalista a posição que reclame a interposição autónoma de um recurso de Agravo para apreciação da referida nulidade, quando parece manifesto que é a própria sentença que assume a mencionada inutilidade de se realizarem mais exames e que, com fundamento em tal premissa, parte daí para a fixação imediata da nova incapacidade, bem como da atribuição da pensão a que o sinistrado terá direito em função da alteração negativa da sua situação clínica.
Logo, pelos motivos expostos, importa apreciar, no âmbito desta Apelação, da bondade ou não da dita irregularidade processual.

D – OBRIGATORIEDADE DO EXAME POR JUNTA MÉDICA

No que concerne a tal nulidade secundária, sempre se dirá que a Ré Apelante não tem qualquer razão no que sustenta, pois inexiste no regime legal aplicável – quer adjectivo como substantivo – qualquer regra que imponha como acto pericial final e definitivo o Exame por Junta Médica.
Impõe-se, a este respeito, chamar à boca de cena os artigos 41.º do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30/04 e 145.º, número 5, do Código do Processo do Trabalho de 1999, com a seguinte redacção:

Artigo 41.º
Avaliação da incapacidade
1 — O grau de incapacidade resultante do acidente é expresso em coeficientes determinados em função do disposto na tabela nacional de incapacidades em vigor à data do acidente.
2 — Sempre que haja lugar à aplicação do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 17.º e no n.º 1 do artigo 19.º da lei, o juiz pode requisitar o parecer prévio de peritos especializados, designadamente do Ministério do Trabalho e da Solidariedade.
Artigo 145.º
Revisão da incapacidade em juízo
1 – Quando for requerida a revisão da incapacidade, o juiz manda submeter o sinistrado a exame médico.
2 – O pedido de revisão é deduzido em simples requerimento e deve ser fundamentado ou vir acompanhado de quesitos.
3 – Findo o exame, o seu resultado é notificado ao sinistrado e à entidade responsável pela reparação dos danos resultantes do acidente.
4 – Se alguma das partes não se conformar com o resultado do exame, pode requerer, no prazo de 10 dias, exame por junta médica nos termos previstos no nº 2; se nenhuma das partes o requerer, pode o exame ser ordenado pelo juiz, se o considerar indispensável para a boa decisão do incidente.
5 – Se não for realizado exame por junta médica, ou feito este, e efectuadas quaisquer diligências que se mostrem necessárias, o juiz decide por despacho, mantendo, aumentando ou reduzindo a pensão ou declarando extinta a obrigação de a pagar.
6 – (…)

Importa referir que o artigo 17.º, número 1, alínea b) da Lei n.º 100/97, de 13/09 possui a seguinte redacção: “1 - Se do acidente resultar redução na capacidade de trabalho ou ganho do sinistrado, este terá direito às seguintes prestações: (…) b) Na incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual: pensão anual e vitalícia compreendida entre 50%e 70%da retribuição, conforme a maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível e subsídio por situações de elevada incapacidade permanente”.
Julgamos essencial realçar ainda o estatuído no artigo 139.º do Código do Processo do Trabalho, que, embora referente ao exame por junta médica a realizar na fase inicial ou primária do processo, se aplica, com as necessárias adaptações, a todas as demais situações em que haja lugar à realização de exame pericial de cariz plural, determinando o seu número 7 o seguinte: “O juiz, se o considerar necessário, pode determinar a realização de exames e pareceres complementares ou requisitar pareceres técnicos”.
O artigo 389.º do Código Civil, acerca da prova pericial e da sua força probatória, estatui o seguinte: “A força probatória das respostas dos peritos é fixada livremente pelo tribunal” (sublinhados nossos).
Conjugando as diversas disposições transcritas ou citadas, facilmente se podem extrair as seguintes conclusões:
a) A prova pericial, em que traduzem os exames médicos, quer de natureza singular como colectiva, efectuados no quadro nas acções emergentes de acidente de trabalho, está sujeita à livre apreciação do julgador, pois como defendem Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, I Volume, 3.ª Edição, 1982, Coimbra Editora, págs. 338 e 339, em anotação ao artigo 389.º, “1. O princípio da prova livre (por contraposição à prova legal: prova por documentos, por confissão e por presunções legais) vigora no domínio da prova pericial (ou por arbitramento), da prova por inspecção (artigo 391.º) e da prova por testemunhas (artigo 396.º).
Prova livre não quer dizer prova arbitrária, «mas prova apreciada pelo juiz segundo a sua experiência, a sua prudência, o seu bom sendo, com inteira liberdade, sem estar vinculado ou adstrito a quaisquer regras, medidas ou critérios legais» (Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 30/12/1997, no BMJ n.º 271, página 185)”.
b) O juiz de trabalho não está vinculado, em termos de estrutura e sequência processuais obrigatórias, a finalizar (ainda que essa seja a normalidade dos casos que lhe passam pelas mãos) a fase instrutória da acção ou incidente relativo a acidente de trabalho com o exame por junta médica, quando a ele haja lugar, pois como ressalta com clareza do número 5 do artigo 145.º, que, para o efeito, deve ser conjugado com o número 7 do artigo 139.º, ambos do Código do Processo do Trabalho, o julgador pode ordenar, após a concretização do exame por junta médica e antes de proferir o despacho, quaisquer diligências que se mostrem necessárias (leia-se, exames, relatórios, pareceres, etc.).
c) O magistrado judicial tem, nomeadamente, nos termos do artigo 41.º da Regulamentação da LAT, a faculdade de solicitar parecer prévio de peritos especializados – prévio à decisão, obviamente –, quando estiver em causa uma situação de eventual IPATH, tendo sido esse, aliás, o caso dos autos (cf., a este respeito, ainda que no quadro da acção de acidente de trabalho e não de um incidente de revisão, Carlos Alegre em “Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais - Regime Jurídico Anotado”, 2.ª Edição, Almedina, Fevereiro de 2000, página 96 e o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 21/09/2004, em que foi relator André Proença, publicado na CJ, Tomo IV, página 267 e também em “Acidentes de Trabalho - Jurisprudência 2000-2007”, numa coordenação de Luís Azevedo Mendes e Jorge Manuel Loureiro, Colectânea de Jurisprudência, Edições, a página 338).
d) Finalmente e salvo o devido respeito pela posição sustentada pela Ré, não vemos que relevância teria a realização de uma segunda junta de neurocirurgia, quando o seu parecer, como todos os demais, aliás, estaria sujeito à livre apreciação do julgador, não impondo ao tribunal, nessa medida e apesar de plural e final, a desvalorização por si atribuída, dado a mesma não se sobrepor às demais fixadas nos autos (cf., neste sentido e por todos, os Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 2/05/2006, em que foi relatora Maria Fernanda Soares, publicado na CJ, Tomo III, página 229 e do Tribunal da Relação de Évora, de 22/06/2004, em que foi relator Alexandre Baptista Coelho e também em “Acidentes de Trabalho - Jurisprudência 2000-2007”, numa coordenação de Luís Azevedo Mendes e Jorge Manuel Loureiro, Colectânea de Jurisprudência, Edições, a, respectivamente, páginas 348 e 336).
Logo, sem prejuízo da necessidade de fundamentação da sua discordância – como, aliás, relativamente a qualquer decisão judicial (artigo 158.º do Código de Processo Civil) –, quando o juiz não acompanha o parecer unânime (ou maioritário, quando os há…!), a lei não coloca qualquer entrave a tal distanciamento ou divergência, ainda que total.
Sendo assim e em conclusão, o tribunal recorrido actuou conforme o regime processual e substantivo aplicável, muito embora a justificação para o não acompanhamento da Junta Médica de Neurocirurgia tenha sido escassa e insuficiente.

E – INCAPACIDADE DO SINISTRADO

A COMPANHIA DE SEGUROS CC, SA contesta igualmente a incapacidade atribuída ao sinistrado, pugnando pela manutenção da IPP de 10% anteriormente fixada.
Julgamos curial fazer uma pequena viagem pelos autos, de maneira a trazermos à sua superfície os factos e elementos clínicos que relevam para esta questão:
- O sinistrado nasceu em 09/05/1955;
- O sinistrado exercia a actividade de armador de ferro;
- O acidente ocorreu em 21/03/2002;
- O acidente traduziu-se numa dor na região lombar quando o trabalhador levantava um ferro;
- Inquérito profissional, com base em declarações do sinistrado, datado de 21/01/2004 e junto a fls. 56;
- O sinistrado teve alta em 12/03/2003;
- Foi-lhe atribuída uma IPP de 10%, desde a referida alta;
- O sinistrado, em 9/08/2006, veio deduzir incidente de revisão da incapacidade;
- Os autos apresentam os seguintes exames complementares e outros documentos clínicos:
- Um TAC da coluna Lombo – Sagrada, realizado em 26/01/2006, onde se evidenciam sinais de intervenção cirúrgica (fls. 145);
- Uma prescrição médica, de 8/05/2006 (fls. 149);
- Ficha hospitalar (fls. 181 e 182);
- Uma ressonância magnética de 23/11/2006 (fls. 198);
- Um TC da Coluna Cervical de 4/3/2008 (fls. 305);
- Relatório de uma Ecografia Articular de 25/03/2008 (fls. 306);
- Relatório para Médico de Família de 14/04/2008 (fls. 307);
- RM Coluna Cervical de 28/10/2008 (fls. 332 e 333);
- RX de 28/10/2008 (fls. 334);
- EMG de 20/11/2008 (fls. 341 a 343);
- Acompanhamento e tratamento do sinistrado pela Seguradora – fls. 227, 231 e 232, 235, 241, 246, 248 e 249, fls. 257 a 259, 264, 273, 277, 282 e 283, 285 (alta), 291 e 293;
- O sinistrado ficou em situação de ITA e ITP entre 06 ou 16/02/2007 até 30/01/2008 (data da alta pela seguradora), muito embora se tenha mantido de baixa pela Segurança Social (fls. 296, 298, 299, 308, 309, 321, 355 a 361, 399 a 401,
- Exame na especialidade de neurocirurgia de 29/01/2009 (fls. 329 e 362) – IPP de 15% x factor de bonificação (1,5);
- Exame Singular de Revisão (fls.191 a 194 e 372 a 375) – IPP de 22,5%, desde 30/01/2008;
- Junta Médica de 02/06/2009 (fls. 423 a 427) – IPP de 10%;
- Parecer de 12/10/2010 – Análise de funções do sinistrado (fls. 486 a 489);
- Parecer sobre a existência de IPATH de 31/05/2010 (fls. 498 a 503) – IPP de 10% (ou de 10% x factor de bonificação de 1,5, caso não seja possível a reconversão do trabalhador);
- Parecer alterado sobre a existência de IPATH de 17/09/2010 (fls. 527 a 529, 552 e 558 - 3/12/2010) – IPP de 10% x factor de bonificação de 1,5 (15%), com IPATH.
É este o quadro fáctico e clínico que importa considerar neste incidente de revisão que se prolongou durante 5 anos, tempo invulgar para um processo desta natureza – ainda que não se ignore o interregno que mediou entre Dezembro de 2006 e 30 de Janeiro de 2008, em que a Seguradora tentou contactar o Sinistrado e depois o acompanhou e submeteu a tratamento –, parecendo-nos que não só em função da lesão apresentada pelo trabalhador – dor lombar ou lombalgia, de diagnóstico difícil, pelos seus contornos fluidos, incertos e variegados –, do seu perfil pessoal – idade de 46 anos à data do acidente, de 52 anos à data da segunda Alta Clínica e de 56 anos, actualmente - como das características da actividade, descritas a fls. 56 e 486 a 489, que exercia (armador de ferro) para a Ré BB, LDA., para a qual já deixou de trabalhar (segundo ele, em virtude do acidente sofrido ao seu serviço e das sequelas permanentes com que ficou), como finalmente das abordagens clínicas, tão diferenciadas, que ressaltam dos autos - IPP de 10%, 15%, 22,5%, com e sem IPATH, já para não falar da curiosa alteração de agulha do Parecer referente à IPATH -, nos encontramos face a uma situação problemática, de fronteira, que divide os peritos e gera discordâncias várias das partes envolvidas.
Olhando desapaixonadamente para todos os dados acima referenciados, afigura-se-nos que o sinistrado AA padece efectivamente de uma IPP de 10%, desde 30/01/2008 (dado ter sido alvo de uma nova e prolongada intervenção médica por parte da Apelante Seguradora), estando ainda afectado por uma IPATH, em razão do tipo de tarefas, posturas físicas repetidas e condutas de cariz profissional que reiteradamente tem de realizar como armador de ferro (nomeadamente, carregar com pesos superiores a 10 kg, que podem com regularidade atingir 40 kg e, por vezes, 90 kg, ainda que em conjunto com outros trabalhadores, fazer esforços com o tronco, com flexões frontais do mesmo e torções laterais dorso lombares, estar em diversas posições corporais, ou seja, de pé, curvado, de joelhos, tendo de agachar-se e levantar-se para esse efeito), do tipo de lesões permanentes que o afectam (lombalgia de esforço, com dores e limitações ao nível da destreza e resistência corporais), idade que possui e impossibilidade da sua conversão profissional, apesar das afirmações vagas, abstractas e pela negativa feitas em várias opiniões médicas (não só em termos relativos, pois deixou de laborar para a 2.ª Ré, como não parece estar a prestar trabalho assalariado para uma outra entidade patronal, como igualmente em termos absolutos, pois não vislumbramos por que maneira se pode converter ou adaptar um tal “posto de trabalho”, de forma a obstar a que um armador de ferro desenvolva aquele conjunto de movimentos, atitudes físicas, esforços e acções que são, inevitável e necessariamente, reclamados pelo quotidiano da sua profissão, de maneira a não prejudicar a sua zona lombar).
Logo, pelos motivos expostos, que se radicam na documentação clínica, funcional e pessoal do sinistrado, entendemos que este último se acha, pelo menos, diminuído por uma IPP de 10%, desde 30/01/2008, com IPATH.

F – APLICAÇÃO DO FACTOR DE BONIFICAÇÃO

Muito embora a Seguradora não aborde expressamente tal questão, afigura-se-nos que a mesma ainda cabe dentro da sua tese de que o sinistrado só se acha afectado por uma IPP de 10%, parecendo também ser essa a interpretação que o sinistrado faz de tais alegações e conclusões, pois vem sustentar a possibilidade de acumulação entre uma IPATH e o factor de bonificação de 1,5, designadamente, com base nos dois Arestos que juntou oportunamente (Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19/03/2009, processo n.º 08S3920, relator: Pinto Hespanhol e do Tribunal da Relação de Lisboa de 9/03/2006, processo n.º 7119/2005-4, relator: Duro Mateus Cardoso, ambos publicados em www.dgsi.pt).
Olhando para a alínea a) do número 5 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades aprovada pela Lei n.º 341/93, de 30/09, a mesma diz o seguinte:
5 - Na determinação do valor final da incapacidade devem ser observadas as seguintes normas, para além e sem prejuízo das que são específicas de cada capítulo ou número:
a) Sempre que se verifique perda ou diminuição de função inerente ou imprescindível ao desempenho do posto de trabalho que ocupa­va com carácter permanente, os coeficientes de incapacidade previstos são bonificados com uma multiplicação pelo factor 1,5, se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de tra­balho ou tiver 50 anos ou mais;
A IPATH – Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual – é definida, com fundamento no artigo 17.º, número 1, alínea b) da LAT, da seguinte forma, por Carlos Alegre, obra e local citados: “trata-se de uma incapacidade de 100% para a execução do trabalho habitual do sinistrado, no desempenho de uma específica função, actividade ou profissão, mas que deixa uma capacidade residual para o exercício de outra actividade laboral compatível, permitindo-lhe alguma capacidade de ganho, todavia, uma capacidade de ganho, em princípio diminuta”.
Afigura-se-nos que existe uma diferença de grau (quantitativo e qualitativo) entre uma e outra situação, achando-se a situação prevista na alínea a) da 5.ª Instrução Geral consumida ou absorvida por aquela, mais gravosa e global da IPATH, ao privar, em termos imediatos e definitivos, o trabalhador da possibilidade de desenvolver a profissão que até aí desempenhava, ao passo que as hipóteses contempladas pela dita Instrução Geral estão aquém de tal impossibilidade, ainda que os sinistrados afectados e pela mesma abrangidos, tenham perdido ou visto diminuída uma função inerente ou imprescindível ao desempenho do seu posto de trabalho, que lhes dificulta seriamente o seu exercício mas não impede a continuação no e do mesmo, ainda que noutras condições (reconversão daquele).
Logo, tendo sido reconhecida ao sinistrado uma IPATH, não se justifica cumular com tal incapacidade absoluta a aplicação do factor de bonificação de 1,5 à IPP de 10%, já acima determinada.

G – DATA A PARTIR DA QUAL SE DEVE CONSIDERAR O AGRAVAMENTO DO ESTADO DO SINISTRADO

Uma questão intercalar suscita-se agora nos autos, dado nos defrontarmos nos autos com três momentos distintos que podem servir de referência temporal à consideração do novo estado clínico do sinistrado.
Temos, em primeiro lugar, a data do pedido de revisão formulado por AA (9/08/2006), em segundo lugar a data da alta atribuída ao mesmo no fim do acompanhamento e tratamentos a que foi sujeito por parte dos serviços clínicos da Ré Seguradora (30/01/2008) e, finalmente, a data de 14/01/2008 que surge na parte decisória do despacho de fls. 574 a 576, em contradição aparente com a fundamentação constante deste último.
Podemos, desde logo, eliminar esta última data que, no confronto com o corpo da decisão e sem que nele se encontre qualquer justificação para a sua menção (aí faz-se sempre alusão à data do pedido de revisão da incapacidade - 9/98/2006), resulta, certamente, de erro informático, provocado pela redacção do despacho dos autos sobre outro já anteriormente redigido e com a referida data, como sendo aquela a partir da qual era ali devida a respectiva pensão.
Resta-nos as outras duas datas, afigurando-se-nos que a data da alta, fixada pelos serviços clínicos da Companhia de Seguros, não se traduz numa nova cura clínica, com as repercussões de índole jurídica atribuídas à alta clínica inicial (cf., por exemplo, artigos 16.º e 17.º, número 4, da LAT e 32.º da Regulamentação) mas antes num procedimento interno, operacional, destinado a pôr termo à situação de Incapacidade temporária total ou parcial em que o sinistrado esteve durante os tratamentos de que foi alvo e que visaram a sua hipotética e lograda recuperação ou melhoria.
Sendo assim, como é jurisprudência uniforme – cf., por todos, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 12/12/2005, em que foi relator Domingos Morais, publicado em CJ, Tomo V, página 245 e também em “Acidentes de Trabalho – Jurisprudência 2000-2007”, numa coordenação de Luís Azevedo Mendes e Jorge Manuel Loureiro, Colectânea de Jurisprudência, Edições, a, respectivamente, página 294 –, a data a considerar para efeitos do pagamento da pensão é o da formulação do pedido de revisão (9/08/2006).
Não ignoramos que a Companhia de Seguros pagou ao sinistrado durante, pelo menos, 06 ou 16/02/2007 até 30/01/2008, quantias não apuradas a título de indemnização pelas incapacidades temporárias fixadas pelos seus serviços clínicos, mas tais valores terão de ser deduzidos aqueles devidos ao sinistrado a título de pensão desde a referida data de 9/08/2006.

H – PENSÃO DO SINISTRADO

Chegados aqui, resta-nos abordar o último aspecto suscitado na Apelação da Ré Seguradora e que tem a ver com a forma como a pensão devida ao sinistrado foi calculada na decisão impugnada, dado ter-se procedido na mesma a um desdobramento ou diferenciação entre a IPP de 15% (agora, 10%) e a IPATH, calculando-se valores de pensão distintos para cada uma dessas realidades, o que, desde já e face ao disposto na LAT e respectivo Regulamento, não conhece o mínimo suporte legal nem é sufragado por qualquer uma das partes (cf. fls. 566 e seguintes, quanto ao sinistrado e alegações de recurso, quanto à Seguradora) nem pelo magistrado do Ministério Público (cf. fls. 586 e 587).
A pensão em causa é una e única e tem de ser determinada de acordo com a IPP de 10%, com IPATH, o salário auferido pelo sinistrado à data do acidente [Euros 6.103,78 (Euros 348,00 x 14 meses, a título de remuneração base + Euros 111,98 x 11 meses, a título de subsídio de alimentação)] e as regras aplicáveis e que são os artigos 17.º, número 1, alínea b) e 26.º da Lei n.º 100/97 de 13/09.
Determinam tais normas o seguinte:

Artigo 17.º
Prestações por incapacidade
1- Se do acidente resultar redução na capacidade de trabalho ou ganho do sinistrado, este terá direito às seguintes prestações:
a) (…)
b) Na incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual: pensão anual e vitalícia compreendida entre 50% e 70% da retribuição, conforme a maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível e subsídio por situações de elevada incapacidade permanente;
Artigo 26.º
Retribuição
1 – (…)
2 - As pensões por morte e por incapacidade permanente, absoluta ou parcial, serão calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente recebida pelo sinistrado.
3 - Entende-se por retribuição mensal tudo o que a lei considera como seu elemento integrante e todas as prestações recebidas mensalmente que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios.
4 - Entende-se por retribuição anual o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de Natal e de férias e outras remunerações anuais a que o sinistrado tenha direito com carácter de regularidade.
(…)
8 - Em nenhum caso a retribuição pode ser inferior à que resulte da lei ou de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.
(…)

Logo, tendo em atenção a norma contida na alínea b) do número 1 do artigo 17.º, obtemos os seguintes cálculos, com referência à pensão anual e vitalícia devida à sinistrada (nesta matéria, socorremo-nos da fórmula habitualmente utilizada nos nossos tribunais do trabalho - cf. posição do Ministério Público a fls. 586 e 587 -, apesar da oposição que conhece, por exemplo, da parte do Dr. Carlos Alegre, obra citada, páginas 97 e 98 e de Vítor Ribeiro, “Acidentes de Trabalho, Reflexões e Notas Práticas, página 318), por nos parecer a via mais segura e objectiva de garantir um tratamento igualitário das situações de IPTAH que se apresentem ao julgador:

a) Retribuição anual: Euros 6.103,78 (Euros 348,00 x 14 meses, a título de remuneração base + Euros 111,98 x 11 meses, a título de subsídio de alimentação)
b) Euros 6.103,78 x 70% = Euros 4.272,646
c) Euros 6.103,78 x 50% = Euros 3.051,89
d) Euros 4.272,646 – Euros 3.051,89 = Euros 1.220,756 x 10% = Euros 122,0756
e) Euros 3.051,89 + Euros 122,0756 = Euros 3.173,9656.
Tal pensão não é obrigatoriamente remível, face ao disposto nos artigos 33.º da LAT e 56.º da sua Regulamentação.

Sendo tal montante o valor total da pensão bruta devida ao sinistrado, importa relembrar que, anteriormente, já havia sido fixada uma pensão com base numa IPP de 10%, devida desde 13/03/2003 e na importância global de € 427,26, impondo-se deduzir esta à quantia acima encontrada a esse mesmo título, conforme sustentado, entre outros, pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 9/05/2007, processo n.º 2229/2007-4, disponível em www.dgsi.pt e indicado pelo magistrado do Ministério Público, a fls. 586.
Obtemos, portanto, o valor final anual de € 2.746,7056 (€3.173,9656 - € 427,26).
Interessa recordar que a responsabilidade infortunística da entidade empregadora não se encontrava totalmente transferida para a Ré Seguradora, só podendo ser a esta assacada, portanto, a parte da pensão correspondente ao capital transferido (Euros 348,00 x 14 meses, a título de remuneração base), ao passo que a BB –, LDA tem de suportar a restante pensão em função da parte da remuneração não transferida (Euros 111,98 x 11 meses, a título de subsídio de alimentação).
Face a tal cenário de desdobramento de responsabilidade, impõe-se fazer reflectir o mesmo em termos de pensões parciais devidas:

I – SEGURADORA

a) Retribuição anual: Euros 4.872,00 (Euros 348,00 x 14 meses, a título de remuneração base)
b) Euros 4.872,00 x 70% = Euros 3.410,40
c) Euros 4.872,00 x 50% = Euros 2.436,00
d) Euros 3.410,40 – Euros 2.436,00 = Euros 974,40 x 10% = Euros 97,44
e) Euros 2.436,00 + Euros 97,44 = Euros 2.533,44.

II – ENTIDADE PATRONAL

a) Retribuição anual: Euros 1.231,78 (Euros 111,98 x 11 meses, a título de subsídio de alimentação)
b) Euros 1.231,78 x 70% = Euros 862,246
c) Euros 1.231,78 x 50% = Euros 615,89
d) Euros 862,246 – Euros 615,89 = Euros 246,356 x 10% = Euros 24,6356
e) Euros 615,89 + Euros 24,6356 = Euros 640,5256
Total: Euros 3.173,9656 (Euros 2.533,44 + 640,5256).

Sabendo nós que a seguradora, inicialmente, foi condenada a pagar ao sinistrado uma pensão anual remível de € 341,04, ao passo que a empregadora o foi em € 86,22, há que deduzir tais montantes aos valores parciais acima encontrados, assim se alcançando as pensões finais de € 2.192,40 (€ 2.533,44 - € 341,04) e € 554,3056 (€ 640,5256 - € 86,22).
Tais montantes, conforme referido pelo Ministério Público a fls. 587 e pelo sinistrado a fls. 567, têm de ser actualizados a partir de 1/12/2006, inclusive, data da primeira actualização posterior à fixação desta nova pensão (não faz sentido actualizar o seu montante logo desde o início da sua vigência, quando a pensão anterior foi remida, nada estando a ser liquidado ao sinistrado até essa fixação de uma nova pensão).
Logo, alcançamos tais valores finais e anuais:

- 2006/2007 - Portaria n.º 1357-A/2006, de 30/11 (produção de efeitos desde 1/12/2006 – artigo 25.º, alínea a)]

- Seguradora – € 2.192,40 x 3,10% = € 2.259,952
- Empregadora – € 554,3056 x 3,10% = € 571,489073

- 2008 - Portaria n.º 74/2008, de 24/01 (produção de efeitos desde 1/1/2008)

- Seguradora – € 2259,952 x 2,40% = € 2.314,190848
- Empregadora – € 571,489073 x 2,40% = € 585,204811

- 2009 - Portaria n.º 166/2009, de 16/02 (produção de efeitos desde 1/1/2009

- Seguradora – € 2.314,190848 x 2,90% = € 2.381,302382
- Empregadora – € 585,204811 x 2,90% = € 602,175750

- 2010 - Decreto-Lei n.º 47/2010, de 10/05 (produção de efeitos desde 1/1/2010

- Seguradora – € 2381,302382 x 1,25% = € 2.411,088662
- Empregadora – € 602,175750 x 1,25% = € 611,208387.

- 2011 - Portaria n.º 115/2011, de 24/03 (produção de efeitos desde 1/1/2011)

- Seguradora – € 2.411,088662 x 1,2% = € 2.440,021725
- Empregadora – € 611,208387 x 1,2% = € 618,542887.

Logo, tem o presente recurso de Apelação, pelos motivos expostos, de ser julgado parcialmente procedente, revogando-se a decisão judicial impugnada nos moldes acima indicados.

II – RECURSO SUBORDINADO

Abordemos agora a única questão pendente e suscitada no recurso subordinado do sinistrado, que se prende com a atribuição ao mesmo do subsídio de elevada incapacidade permanente.
Bastará cruzar a IPATH do aqui recorrente com o disposto na alínea b) do número 1 do artigo 17.º da LAT para se concluir, sem margem para quaisquer dúvidas, de que é efectivamente devida ao mesmo também essa prestação.

I – SUBSÍDIO DE ELEVADA INCAPACIDADE

Tendo o sinistrado tal direito inscrito na sua esfera jurídica, importa agora ponderar relativamente ao montante a que a esse título lhe é devido, sendo conhecidas as divergências que, a este respeito, tem havido na nossa doutrina e jurisprudência.
O artigo 23.º da LAT, acerca de tal prestação, estatui o seguinte:

Artigo 23.º
Subsídio por situações de elevada incapacidade permanente
A incapacidade permanente absoluta ou a incapacidade permanente parcial igual ou superior a 70% confere direito a um subsídio igual a 12 vezes a remuneração mínima mensal garantida à data do acidente, ponderado pelo grau de incapacidade fixado, sendo pago de uma só vez aos sinistrados nessas situações.

Relembremos que a RMMG à data do acidente era a de € 348,01, conforme o Decreto-Lei n.º 325 /2001, de 17/12.
Ora, considerando o disposto na citada alínea b) do número 1 do artigo 17.º, em conjugação com o artigo 23.º, ambos da Lei n.º 100/97, de 13/09, obtemos o seguinte montante único, relativo a um subsídio por situações de elevada incapacidade permanente, com base no seguinte cálculo (tratando-se de uma situação de IPATH, não há qualquer ponderação a fazer em função da incapacidade restante atribuída (IPP), pois trata-se, como a IPA, de uma incapacidade absoluta, não mensurada nesses termos):

RMGG à data do acidente (21/03/2002): Euros 348,01 x 12 meses = Euros 4.176,12.

Tal prestação deverá ser paga pela Ré Seguradora, dado que não é atribuída nem aferida em função do salário auferido pelo sinistrado nem na razão da responsabilidade transferida para a entidade seguradora pela entidade empregadora (cf., neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 19/10/2011, processo n.º 218/10.8TTALM, em que foi relator o Juiz - Desembargador Leopoldo Mansinho Soares, tendo o relator deste Aresto subscrito o mesmo como adjunto).
Conforme se pode ler no Sumário de tal Acórdão:
1. O subsídio por situação de elevada incapacidade permanente, quer se trate de uma situação de incapacidade permanente para todo e qualquer trabalho, quer se trate de incapacidade permanente para o trabalho habitual, é igual a 12 vezes a remuneração mínima mensal garantida à data do acidente, sem qualquer ponderação de grau de incapacidade, que apenas deve ser considerado nos casos de incapacidade permanente parcial igual ou superior a 70%.
Como tal o montante do subsídio de elevada incapacidade permanente resulta da lei.
2 - Assim, a fixação devida a título dessa prestação ao contrário de outras prestações decorrentes da incapacidade atribuída ao sinistrado não depende da respectiva retribuição, mas sim do grau de incapacidade atribuído do sinistrado.
3 - Não se vislumbra, pois, motivo para uma repartição de responsabilidades entre a seguradora e a sua segurada neste particular, visto que esta última transferiu para a primeira a sua responsabilidade infortunística laboral em sentido lato”.
Também sustentando a inexistência de qualquer ponderação no quadro da atribuição do subsídio por situações de elevada incapacidade permanente para sinistrados com IPATH, confrontar a anotação ao Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 23/02/2005, igualmente publicado na mesma revista, da autoria de Viriato Reis, em Revista do Ministério Público, n.º 103, Ano 26, Julho/Setembro de 2005, páginas 157 e seguintes e ainda os seguintes e recentes Arestos do nosso mais alto tribunal:
- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04/05/2011, processo n.º 199/07.5TTVCT.P1.S1, em que foi relator o Juiz-Conselheiro Pereira Rodrigues, publicado em www.dgsi.pt (Sumário):
III - O subsídio de elevada incapacidade, sem situações de incapacidade permanente para todo e qualquer trabalho e de incapacidade permanente para o trabalho habitual, corresponde a 12 vezes a remuneração mínima mensal garantida à data do acidente, sem qualquer ponderação de grau de incapacidade, pelo que a incapacidade permanente parcial atribuída ao sinistrado não deve ser considerada.
- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14/11/2007, processo n.º 07S2716, em que foi relator o Juiz-Conselheiro Sousa Peixoto, publicado em www.dgsi.pt (Sumário):
3. Nas situações de incapacidade permanente absoluta (seja para todo e qualquer trabalho, seja apenas para o trabalho habitual), o subsídio por elevada incapacidade deve ser fixado no seu limite máximo.
- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 02/02/2006, processo n.º 05S3820, em que foi relator o Juiz-Conselheiro Fernandes Cadilha, publicado em www.dgsi.pt (Sumário):
O subsídio por situações de elevada incapacidade permanente a que se refere o artigo 23º da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, em situações de incapacidade permanente para todo e qualquer trabalho e de incapacidade permanente para o trabalho habitual corresponde a 12 vezes a remuneração mínima mensal garantida à data do acidente, sem qualquer ponderação de grau de incapacidade, que apenas se aplica aos casos de incapacidade permanente parcial igual ou superior a 70%.
Logo, tem o presente recurso de Apelação, pelos motivos expostos, de ser julgado procedente nesta parte, revogando-se igualmente e nessa medida a decisão judicial impugnada.


IV – DECISÃO

Por todo o exposto, nos termos dos artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e 713.º do Código de Processo Civil, acorda-se neste Tribunal da Relação de Lisboa em julgar, pelos fundamentos acima expostos:
a) Parcialmente procedente o recurso de apelação interposto por COMPANHIA DE SEGUROS CC, SA;
b) Parcialmente procedente o recurso subordinado de apelação interposto por AA;
c) Revogar nessa medida a decisão recorrida;
d) Substituir a decisão recorrida pelo aqui e agora determinado:
Logo e em conclusão, nos termos dos artigos 145.º do CPT e 25.º, 17.º, número 1, alínea b) e 23.º do Código do Processo do Trabalho, decide-se o seguinte:
1) Considerar o sinistrado AA afectado por uma IPP de 10%, com IPATH, desde 09/08/2006, a que corresponde uma pensão anual, vitalícia e actualizável de Euros 3.173,97, desde aquela mesma data, a que haverá que deduzir a pensão obrigatoriamente remível anteriormente fixada de Euros 427,26, ficando-se então com uma pensão residual e final de € 2.746,71;
2) Condenar a Seguradora COMPANHIA DE SEGUROS CC, SA a pagar ao sinistrado AA uma pensão anual, vitalícia e actualizável, de Euros 2.192,40, desde 09/08/2006 até 31/12/2006, e, por virtude das actualizações a operar nos anos de 2007, 2008, 2009, 2010 e 2011, sucessiva e anualmente nos valores de:
- 1/12/2006 a 31/12/2007 - € 2.259,95;
- 2008 - € 2.314,19;
- 2009 - € 2.381,30;
- 2010 - € 2.411,09;
- 2011 - € 2.440,02.
3) Condenar a entidade empregadora BB -, LDA a pagar ao sinistrado AA uma pensão anual, vitalícia e actualizável, de € 554,31, desde 09/08/2006 até 31/12/2006, e, por virtude das actualizações a operar nos anos de 2007, 2008, 2009, 2010 e 2011, sucessiva e anualmente nos valores de:
- 1/12/2006 a 31/1272007 - € 571,49;
- 2008 - € 585,20;
- 2009 - € 602,18;
- 2010 - € 611,21;
- 2011 - € 618,54.
4) Condenar a Seguradora COMPANHIA DE SEGUROS CC, SA a pagar ao sinistrado AA o subsídio por elevada incapacidade permanente, no valor de Euros 4.176,12, devido desde 9/08/2006;
5) Condenar a Seguradora e a entidade empregadora a pagarem ao sinistrado os juros de mora, calculados sobre cada uma das pensões agora determinadas e o subsídio de elevada incapacidade permanente, à taxa legal de 4%, desde o dia imediato à data do pedido de revisão (10/08/2006) até ao seu integral pagamento;
6) Custas a cargo da Seguradora e da entidade empregadora na proporção das prestações em que foram condenadas;
7) Valor do incidente de revisão, para efeitos processuais, nos termos do artigo 120.º do C.P.T. – Euros 36.849,86 (€ 2.746,71 x 13,416/51 anos);
8) Valor do incidente para efeitos tributários, nos termos do artigo 8.º, alínea d) do Código das Custas Judiciais (redacção anterior) – Euros 13.733,55 [Euros 3.173,9656 - Euros 427,26 x 5);
9) Registe e notifique, inclusive a Seguradora nos termos e para os efeitos dos artigos 76.º e 89.º do Código do Processo do Trabalho de 199;
10) Cumpra-se, oportunamente, o disposto no artigo 137.º n.º 1 do CPT.”
*
Custas a cargo da Apelante Seguradora e do Apelante Sinistrado na proporção do decaimento no que toca ao recurso principal (4/5 e 1/5, respectivamente) e a cargo da Companhia de Seguros no que respeita ao recurso subordinado, dado o sinistrado não estar isento de custas, por não se lhe aplicar o artigo 2.º, número 1, alínea e) do Código das Custas Judiciais, visto não ser patrocinado pelo Ministério Público, tudo sem prejuízo do benefício do apoio judiciário de que beneficia.

Registe e notifique.

Lisboa, 8 de Fevereiro de 2012

José Eduardo Sapateiro
Maria José Costa Pinto
Seara Paixão
Decisão Texto Integral: