Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | RAMALHO PINTO | ||
Descritores: | EXTINÇÃO DE SOCIEDADE SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA HABILITAÇÃO | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 02/29/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Parcial: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA A DECISÃO | ||
Sumário: | Verificando-se a extinção da sociedade, por ter sido dissolvida, estando já os factos respectivos levados ao registo comercial, e estando pendente acção contra essa sociedade, tal extinção não determina a suspensão da instância nem é necessária qualquer habilitação, prosseguindo a acção com a substituição da sociedade pela generalidade dos seus sócios, representados pelos liquidatários. (Elaborado pelo Relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: AA instaurou, em 4 de Outubro de 2010 e no 1º Juízo do Tribunal do Trabalho de Sintra, a presente acção emergente de contrato de trabalho, com processo comum, contralimpezas BB, ldª, pedindo que seja declarada a ilicitude do seu despedimento e que a Ré seja condenada a pagar-lhe os créditos salariais a que tem direito em virtude dessa declaração, e que discrimina. A Ré contestou a acção. A fls. 81 e ss foi junta certidão comprovativa de que foi objecto de registo, em 30/09/2010, a dissolução e encerramento da liquidação da sociedade- Ré. Posteriormente, foi proferido saneador- sentença, do seguinte teor: “O tribunal é competente em razão da nacionalidade, da hierarquia e da matéria. Inexistem nulidades que enfermem todo o processo. A A. tem personalidade e capacidade judiciárias. Suscita-se a questão da falta de personalidade judiciária da R., deconhecimento oficioso pelo tribunal. Com efeito, nos termos do artº 160º, nº 2, do Código das SociedadesComerciais, a sociedade considera-se extinta pelo registo do encerramento da liquidação. Acrescenta o artº 163º do mesmo Código que, encerrada a liquidação e extinta a sociedade de responsabilidade limitada, os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, até ao montante que receberam na partilha (nº 1); as acções necessárias para os fins referidos no número anterior podem ser propostas contra a generalidade dos sócios, na pessoa dos liquidatários, que são considerados representantes legais daqueles para este efeito. Verifica-se, pois, que a lei determina que, em caso de extinção de uma sociedade comercial, as acções destinadas a efectivar o passivo social não satisfeito ou acautelado são instauradas contra a generalidade dos sócios, por si mesmos ou através dos liquidatários intervindo como representantes legais daqueles. O que não pode é haver acções instauradas contra a própria sociedade, atendendo a que a mesma, por se ter extinto, não mais tem personalidade jurídica ou judiciária. Ora, da certidão do registo comercial que antecede resulta que a dissolução e encerramento da liquidação da sociedade demandada como R. foi registada em 30/09/2010. Assim, conclui-se que a sociedade R. se extinguiu, por força do aludido artº 160º, nº 2, do Cód. das Soc. Comerciais, ainda antes da propositura da presente acção. Pelo exposto, verificando-se a excepção dilatória de falta de personalidade judiciária da R., absolvo esta da instância (artºs 5º, 288º, nº 1, al. c), 493º, 494º, al. c) e 495ºCPC). Custas pela A.. Registe e notifique”. x Inconformada com o decidido, veio a Autora interpor recurso, formulando as seguintes conclusões: (…) Foram apresentadas contra-alegações e colhidos os vistos legais. x Cumpre apreciar e decidir. Sabendo-se que é pelas conclusões das alegações que se delimita o objecto do recurso temos, como única questão a apreciar, a de saber se a extinção da sociedade- Ré, por ter sido objecto de dissolução e já estar registada a mesma bem como o encerramento da liquidação, conduz à absolvição da instância da Ré: x Como circunstancialismo relevante temos o descrito no relatório deste acórdão. x Entendeu a sentença recorrida que, resultando da certidão do registo comercial junta aos autos que a dissolução e encerramento da liquidação da sociedade demandada como Ré foi registada antes da propositura da presente acção, se deve concluir que a sociedade Ré se extinguiu, por força do disposto no artº 16º, nº 2, do Cód. das Soc. Comerciais (CSC), verificando-se a excepção dilatória de falta de personalidade judiciária da Ré. Em consequência absolveu esta da instância. Vejamos se é assim, designadamente se há lugar atal absolvição da instância. Efectivamente, consta da certidão de fls. 81 e ss que foram objecto de registo, em 30/09/2010, a dissolução e o encerramento da liquidação da sociedade- Ré, sendo que a presente acção foi proposta em 4/10/2010. A dissolução de uma sociedade é a modificação (e não a extinção) da relação jurídica constituída pelo contrato de sociedade. Com efeito, a sociedade dissolvida entra imediatamente em liquidação, mas mantém a personalidade jurídica durante esta – artº 146º, nºs 1 e 2, do CSC. Este ultimo número é bem claro ao estabelecer que a “sociedade em liquidação mantém a personalidade jurídica e, salvo quando outra coisa resulte das disposições subsequentes ou da modalidade da liquidação, continuam a ser-lhe aplicáveis, com as necessárias adaptações, as disposições que regem as sociedades não dissolvidas”. As finalidades visadas com a liquidação são: quanto ao sócios, evitar que as relações sociais quer activas, quer passivas, passem a constituir relações pessoais dos sócios, ou em contitularidade ou individualmente; no que respeita aos credores, obter a satisfação dos seus créditos enquanto permanece o ente juridicamente devedor – cfr. Raul Ventura, Dissolução e Liquidação de Sociedades, 1987,pág. 216. E dispõe o artº 162º do CSC que: “1. As acções em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, nos termos dos artigos 163.º, n.ºs 2, 4 e 5, e 164.º, n.ºs 2 e 5. 2. A instância não se suspende nem é necessária habilitação”. Mas e se já estiver encerrada a liquidação, e a acção seja intentada posteriormente ao registo desta, como acontece na presente hipótese? A dissolução e liquidação da sociedade e a sua extinção são realidades distintas, sujeitas a regimes igualmente distintos. Na verdade, uma sociedade dissolvida e em liquidação não está extinta: a extinção só se verifica com a inscrição, no registo, do encerramento da liquidação (artº 160º, nº 2, do CSC) Com a extinção, deixa de existir a pessoa colectiva, que perde a sua personalidade jurídica e judiciária, mas as relações jurídicas de que a sociedade era titular não se extinguem, como flui do disposto nos artºs 162º, 163º e 164º do CSC. Assim, no tocante às acções pendentes em que a sociedade seja parte, elas continuam após a extinção desta, que se considera substituída – sem que haja lugar a suspensão da instância, uma vez que não é necessária habilitação – pela generalidade dos sócios, representada pelos liquidatários, não havendo lugar à absolvição da instância. O nº 1 do artº 163º do CSCpressupõe que a liquidação esteja encerrada e extinta a sociedade – só neste caso é que se verifica a substituição da sociedade pela generalidade dos sócios. A sociedade considera-se substituída pela generalidade dos sócios: são estes que passam a ser parte na lide, representados pelos liquidatários. Os liquidatários, que já funcionavam no processo como representantes da própria sociedade, passam a ser considerados como representantes legais da generalidade (ou seja, da totalidade) dos sócios. A lei comete-lhes o encargo de defender interesses alheios, em continuação de uma função que, relativamente à sociedade, já vinham exercendo- cfr. Ac. desta Relação de Lisboa de 17/2/2011, in www.dgsi.pt. E isto vale ainda que, como é o caso, o registo de encerramento da liquidação seja anterior à propositura da acção em que sejam reclamados créditos sobre a sociedade extinta. Foi o que se decidiu no Ac. da Relação do Porto de 6/7/2009, disponível em www.dgsi.pt e citado pela recorrente, com o qual concordamos inteiramente, e onde se afirma nomeadamente o seguinte: “De facto, estando probatoriamente demonstrado nos autos que a sociedade ré foi dissolvida e liquidada, tendo tal facto sido registado definitivamente, em data anterior à data da interposição da presente acção, por força do artigo 160.º, n.º 2 do CSC, a sociedade considera-se extinta nessa data, no caso, em 02.05.2006, o que, em princípio, teria como consequência a absolvição da instância nos termos ajuizados. Porém, o n.º 2 do artigo 160.º estipula literalmente o seguinte: “A sociedade considera-se extinta, mesmo entre os sócios e sem prejuízo do disposto nos artigos 162.º a 164.º, pelo registo do encerramento da liquidação” (sublinhado nosso). Ou seja, não obstante a extinção, ressalva o preceito três situações distintas, desde que preenchidos os seus pressupostos, determinando que, apesar da extinção da sociedade, os sócios ou sócios liquidatários da sociedade substituem a sociedade extinta, com eles prosseguindo a causa, operando-se uma modificação subjectiva da instância. (…) Neste caso, após a extinção da sociedade, verifica-se existir um passivo superveniente, entenda-se no sentido referido de não satisfeito ou acautelado à data do encerramento da liquidação e extinção da sociedade. Ocorrendo tal situação, o n.º 2 deste preceito estipula que as acções necessárias para os fins referidos podem ser propostas contra a generalidade dos sócios, na pessoa dos liquidatários, que são considerados representantes legais daqueles para este efeito. Embora o preceito aluda explicitamente a acções a propor, o mesmo também se aplica quando a acção já se encontra proposta contra a sociedade, apurando-se durante a pendência da mesma que, à data da interposição, já tinha sido levado ao registo o facto extintivo. Neste caso, até por razões de economia processual, a acção prossegue contra os sócios, na pessoa dos liquidatários, entendendo-se, embora com alguma divergência jurisprudencial, que a acção prossegue sem que seja necessário a suspensão da instância e a dedução de incidente de habilitação”. Assim, e à laia de conclusão, podemos afirmar que se é certo que a sociedade Ré se mostra extinta, por ter sido dissolvida, estando já os factos respectivos levados ao registo comercial, também o não é menos que, estando pendente acção contra a sociedade, a extinção da mesma não determina a suspensão da instância nem é necessária qualquer habilitação, prosseguindo a mesma com a substituição da sociedade pela generalidade dos seus sócios, representados pelos liquidatários. Procedem, assim, as conclusões do recurso. x Decisão: Nos termos expostos, acorda-se em conceder provimento à apelação, revogando-se a sentença recorrida e determinando-se que a acção prossiga, sem necessidade de habilitação, com a substituição da sociedade – Ré pela generalidade dos seus sócios, representados pelos liquidatários. Custas pela apelada. Lisboa, 29 de Fevereiro de 2012 Ramalho Pinto Isabel Tapadinhas Albertina Pereira | ||
Decisão Texto Integral: |