Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2005/10.4TVLSB.L1-8
Relator: CATARINA ARÊLO MANSO
Descritores: DELIBERAÇÃO SOCIAL
REMUNERAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/03/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I - Matérias como a das remunerações: em regra, a fixação destas é feita por deliberação dos sócios (art. 192/5,255/1e 399/1).
II - A fixação de remuneração compete à assembleia-geral ou a uma comissão por ela nomeada, tendo em conta as funções desempenhadas e a situação económica da sociedade (art. 399/1).
III – A sanção de nulidade apenas se aplica quando houver uma omissão total de fundamentação de facto ou de direito, e não se preenche com uma fundamentação meramente deficiente ou incompleta. Neste último caso, haverá apenas uma decisão menos feliz, que afecta o seu valor doutrinal, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas tal deficiência não produz a nulidade da mesma
IV - A sustentação de posições jurídicas, porventura desconformes com a correcta interpretação da lei, não implica, em regra, por si só, a litigância de má fé na espécie de lide dolosa ou de lide temerária.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

I – A…, intentou acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra B…, S.A. pedindo a condenação da ré na quantia de €60.095,65, de créditos remuneratórios acrescida de juros legais vencidos e vincendos.
Fundamentou tal pretensão, no facto de ter exercido, ao abrigo de um "Contrato de Administração", funções de presidente do conselho de administração da ré, ininterruptamente, até ao dia 29 de Março de 2010. O contrato foi «celebrado em 1 de Março de 2007. Em 16 de Abril de 2009 - com efeitos retroactivos a 1 de Abril desse ano a A. aceitou, naquela data, o pagamento dos retroactivos devidos, por três meses, uma vez que estava já no exercício efectivo de funções executivas de Presidente do Conselho de Administração da R., não auferiu qualquer remuneração pecuniária, entre 5 de Janeiro de 2009 e 31 de Março de 2009. Foi acordada, entre a R. e a A., uma "Adenda ao contrato de administração", que ficou, a fazer parte integrante do Contrato de Administração outorgado pelas partes.
Em 1 de Março de 2010, a A., por carta endereçada ao fiscal único da R., apresentou a renúncia ao exercício de tal cargo invocando razões de ordem pessoal.
A ré na contestação impugnou a versão dos factos, concluiu pedindo a improcedência da acção e a condenação da autora como litigante de má fé.
Proferido o despacho saneador foi elaborada a BI com a selecção dos factos assentes e os controvertidos.
Procedeu-se a julgamento, foi proferida decisão que julgou parcialmente procedente a acção e condenou a ré a pagar a importância de €3.465,00, após trânsito da decisão.
Não se conformando interpôs recurso a autora e nas suas alegações concluiu:
- a ora recorrente, manteve desde 2004 um vínculo contratual, com a ré “3C” que se manteve até 2010, data em que o vínculo contratual cessa por sua iniciativa com renúncia ao cargo de Presidente do Conselho de Administração da ré, que vinha exercendo desde Janeiro de 2009 "Fundamentação de Facto", da Sentença ora Recorrida, mormente, com base no "teor dos documentos de fls. 15 a 22 (certidão de matrícula e das inscrições referentes à ré)";
- tratou-se, de uma vinculação prolongada, iniciada em 29 de Outubro de 2004, em que foi convidada para exercer Funções não Executivas, como Administradora, na R.,;
- funções que só interrompeu, para exercer (a pedido e por conveniência da R.), funções, REMUNERADAS, de Assessoria, como Quadro da R., entre 17 de Julho de 2006 e 7 de Fevereiro de 2007, mantendo assim a sua vinculação, ininterrupta e continuadamente, à R.;
- voltando, após esse período, a ser eleita em A.G., para exercer Funções de Presidente Não Executiva, mas mantendo (desde 2004 até ao termo da sua ligação à R., em 29 de Março de 2010), o uso de viatura de serviço e de cartão de crédito da R;
- funções que exerceu, sob a égide de um "Contrato de Administração" (outorgado em 1 de Março de 2007), como Presidente do Conselho de Administração, da R., B…, S.A. – em finais de 2008, por convite do accionista maioritário da S.. Sr. M… e por ter cessado as suas Funções como Presidente do C.A. da P.F, passou a ter a disponibilidade pretendida pela S…, para o exercício de Funções, agora EXECUTIVAS, como Presidente da B…SA (ibidem)
- o que, de facto, aconteceu, coincidindo com a saída, por termo de mandato, do anterior Administrador Executivo, Dr. AV (ibidem);
- iniciando tais funções, EXECUTIVAS, diariamente, na Sede Social da R., "…, assegurando, desde 5 de Janeiro de 2009, uma 2.2 Feira, todos os dias, desde as 8,30h., muitas vezes até noite adentro, a condução, efectiva, dos negócios da "B…SA": participando e conduzindo as Reuniões semanais de Direcção da "B…SA'; coordenando o Fecho de contas de 2008, elaborando o Relatório e Contas da Sociedade para esse exercício, de 2008, assegurando a Gestão Corrente e as relações quotidianas com as entidades financeiras, e assumindo, logo em Janeiro de 2009, particular responsabilidade na efectivação das medidas de racionalização e de redução de custos, de negociação com a banca de novas e mais favoráveis Linhas de Crédito, acompanhando a negociação dos Contratos com novos e grandes clientes, etc...;
- que consubstanciam, de facto e iniludivelmente, o exercício EXECUTIVO de Funções de Administração, desde 5 de Janeiro de 2009, até 29 de Março de 2010;
- como se comprova, quer pelos depoimentos de várias testemunhas em julgamento, mas, fundamentalmente, pela simples constatação que, a partir de Janeiro de 2009, eram três, apenas três, os membros do CA da R., "B…SA", tal como se extrai singela e directamente da Certidão de Registo Comercial da R., logo a fls. 15., dos autos;
- a primeira questão primordial que se discute no presente pleito é a de se julgar se a A. tem ou não o direito vinculístico de remuneração sobre o identificado lapso temporal situado entre 5 de Janeiro de 2009 e 29 de Março de 2009, enquanto Presidente, Executiva, de facto, do Conselho de Administração da R., (1. e 2.º) sendo que todas as demais questões de Direito, que tangem os factos dados como "provados" ou "não provados" (nos 4. a 14. e 15. a 21), àquela e central questão, se subordinam, atenta a continuidade, ininterrupta, do vínculo contratual da A. à R., desde 2004;
- prende-se, com a aplicação do disposto no art. 1158., n. 1 e 2, ex vi art. 164., cjg. com os art. 987, 1155, 1157 e 1167, al. b), todos do Código Civil e, entre outros, prescritos no Código das Sociedades Comerciais, do art. 232.2, §1, do Código Comercial;
- os poderes/deveres e direitos dos titulares de órgãos de pessoa colectiva, aplicam-se, em observância do disposto no art. 987. ex vi art. 164, do CC, as normas do mandato, contrato pelo qual uma das partes (in casu, a A.), se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta de outrem (in casu a R.);
- a A., entre 5 de Janeiro de 2009 e 29 de Março de 2009, exerceu, de facto, como Presidente do Conselho de Administração da R., funções executivas, neste Conselho, por força de ter terminado, em 31 de Dezembro de 2008, o mandato do Administrador;
- ensina o Professor Doutor António Menezes Cordeiro ao explicitar que o "Administrador de facto traduz a situação na qual uma pessoa (mesmo) sem decorrência de uma qualquer designação legítima, exerce as funções de administração - Prof. Menezes Cordeiro, Código das Sociedades Comerciais Anotado, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2011, pag. 276;
- mais diz este autor, que o "Administrador de facto, strícto sensu, corresponde à pessoa que, por razões objectivas e/ou subjectivas, exerça o poder na sociedade, dando ordens aos administradores de direito (…) pag 276 - o que, também de facto acontece, in casu, porquanto a A., ao desempenhar, de facto, todas as funções cometidas ao anterior administrador (cujo mandato cessara), em concomitância com as competências próprias da A., enquanto Presidente, Executiva, de facto, do Conselho de Administração da R., desempenhava ;
- tais funções executivas se concretizaram, entre as referidas, nesse mesmo 1º trimestre de 2009, enquanto no exercício, Executivo, de facto, pela A., do cargo de Administração da R. (como Presidente e Administradora com o "pelouro" financeiro, no Conselho de Administração da R.), seja na "mera" assinatura dos cheques da R., seja dando ordens de pagamento, seja participando e conduzindo as Reuniões semanais de Direcção da R., seja, mesmo, coordenando o Fecho de Contas de 2008, elaborando o Relatório e Contas da Sociedade para esse exercício (sublinhe-se: de 2008), assegurando, no fundo e ao fim e ao cabo, a Gestão Corrente da R. como a um Presidente com Funções Executivas compete e como a A. assegurou, quotidianamente, entre 5 de Janeiro de 2009 e 29 de Março de 2009 – tal como doravante e até à apresentação da sua renúncia, a este cargo, em Março de 2010 –, em que a A. representou a R., agindo por ela e assumindo, de facto, em toda a sua plenitude, a sua Gestão;
- o que nos ensina a sempre acutilante lição de Pires de Lima e Antunes Varela, que se transcreve, também, a este propósito e em anotação ao disposto no art. 1158, do CC (e pelo qual "o mandato se presume oneroso (...) se tiver por objecto actos que o mandatário pratique por profissão"): "a gratuitidade (cujo conceito é desenvolvido por Antunes Varela no ensaio sobre o conceito do modo, 1955, págs. 152 e segs.) está estabelecida na lei como mera presunção, e é ainda como presunção que se considera oneroso o mandato, quando ele tem por objecto actos que o mandatário pratica por profissão" e, mais adiante, alertando, que "nada contende com a gratuitidade ou onerosidade o direito que o mandatário tenha ao reembolso das despesas feitas e à indemnização do prejuízo que tenha sofrido com o exercício do mandato. Esse direito existe sempre, ainda que o mandato seja gratuito" pag. 789/790;
- no mesmo sentido, sustenta o Professor Manuel Januário da Costa Gomes: "o mandato presume-se gratuito, excepto se tiver por objecto actos que o mandatário pratique por profissão; para estes casos o código estabelece uma presunção de onerosidade" e que esta, para este Emérito Professor, é uma "presunção juris tantum"; Contrato de Mandato, reimpressão da ed. de 1990, Ed. AAFDL, Lisboa, 2007, pg. 22;
- mais nos esclarecem estes Doutos Professores de Direito, ao deixarem inequívoco o seu entendimento sobre o n.º2 do art. 1158. do CC (que determina que, sendo o mandato "oneroso, a medida da retribuição, não havendo ajuste entre as partes, é determinada pelas tarifas profissionais; na falta destas, pelos usos; e, na falta de umas e outros, por juízos de equidade"): os Eméritos Pires de Lima e Antunes Varela fixando que a medida da retribuição, não havendo acordo das partes, é fixada "pelas tarifas profissionais"; e, "não havendo tarifas, pelos usos (cf. art. 3); não havendo usos, por juízos de equidade; o Professor Januário, explicitando, no mesmo sentido e dando a mesma solução para o Douto Tribunal a quo, que, inexistindo acordo das partes, lhe caberia "o recurso às tarifas profissionais" (que existem e constam dos autos, no elenco de remunerações praticados pela R., por reporte às remunerações que passou a pagar à A. a partir de Abril de 2009), ou, "como último recurso, pela equidade"-pag.22;
- a questão de fundo sub judicio releva, apenas e só, do Direito à Remuneração de um Administrador — a A., Presidente do Conselho de Administração da R. - que, entre 5 de Janeiro de 2009 e 29 de Março de 2009, exerceu, de facto, funções executivas, na e para a R., praticando, a A., por profissão, actos de gestão, em nome da R., por conta da R. e, nomine alieno ou por contemplatio domini, com poderes para o fazer;
- como taxativamente expressa o Professor Menezes Cordeiro: "O primeiro direito do administrador será o direito à retribuição. (...). A retribuição faz parte do seu conteúdo natural" Direito das Sociedades, Vol. 1, Parte geral, 3. ed., rev. e actual., Almedina, Coimbra, 2011, pg. 930;
- convencionaram que a "tarifa profissional" — a Remuneração Mensal da A. — se cifrava em € 9.500, pelo que a R. reteve, indevidamente, à face da Lei aplicável, um valor total € 28.500, relativamente a Retribuições devidas pelo exercício, de facto, de funções Executivas, pela A., ora Recorrente, como Presidente do Conselho de Administração da R., nos meses de Janeiro a Março de 2009;
- as partes convencionaram tal "tarifa profissional", nos termos referido no ponto anterior (o que de per se já era insuficiente para afastar a tutela vinculística) como, inclusive, a R., só após a A. ter apresentado a sua renúncia aos cargos que desempenhava na R. (Administradora, Presidente, Executiva, do Conselho de Administração da R. e, também, como Administradora, não Executiva, da S…(SGPS), SA), é que decidiu, unilateralmente e sem qualquer fundamento legal, deduzir aos valores devidos à A. (num intempestivo "fecho de contas", que nunca teria acontecido, naqueles moldes e com os montantes oferecidos como "provados", se a A. não tivesse apresentado a sua renúncia ao desempenho do cargo de Presidente EXECUTIVA do Conselho de Administração da R;
- tal "fecho de contas em 31.03.2010" ocorre, aliás, nesta data. Porém, posteriormente, no mês seguinte — mais concretamente, no dia 19 de Abril de 2010 — ao da renúncia da A. e não, como é de Lei, no mês em que a A. apresenta a sua carta a renunciar aos cargos que exercia (1 de Março de 2010) evidenciando um claro abuso de direito, um locupletamento indevido e um concomitante enriquecimento sem causa da R., ilícito;
- processamento que, ao arrepio da Lei Fiscal, chega ao extremo de conter duplo desconto à A. em sede de IRS e de TSU, retendo quantias sobre valores ilíquidos que já haviam sido objecto de retenção na fonte no processamento regular, normal, do mês de Março, com dupla tributação e uma retenção na fonte, neste "novo", alegado e intempestivo, "fecho de contas de 19 de Abril de 2010", por reporte à soma algébrica dos valores ilíquidos que havia processado no regular "fecho de contas em 31.03.2010" — consubstanciando uma directa violação do disposto nos art., 98. n.º 1 e 3, 99, n. 1 e 119, n.º 1, als. a), b) e c), do CIRS;
- relembrar que (em corroboração da factualidade assente, relevante para a apreciação do direito ao despacho deste tribunal, sobre a continuidade, ininterrupta, da vinculação contratual da A. à R. e dos direitos que, por força de tal vinculação assistem à A., que a A., Dr.ª A…, integrou o Conselho de Administração da R., "3', pela primeira vez e como Administradora, em 29 de Outubro de 2004. Funções que exerceu, como não executiva — mas remuneradas em pecúnia e, mais tarde, também, em espécie (VUP, gasolina e cartão de crédito — este nunca utilizado até passar a exercer funções executivas), até 12 de Julho de 2006.
- entre 13 de Julho de 2006 e 25 de Fevereiro de 2007, a A., desempenhou funções, como Quadro, na R., mantendo, por tais funções, as suas remunerações em pecúnia e em espécie;
- de 26 de Fevereiro de 2006, até 5 Janeiro de 2009, a A. desempenhou as Funções de Presidente, não executiva, da R., tendo, desde o dia 5 de Janeiro de 2009, até 29 de Março de 2010, exercido, de facto e de direito, as funções de Presidente Executiva, do Conselho de Administração da R., período em que se regista uma alteração na composição do Conselho de Administração da R., com o termo de mandato de um administrador e a nomeação de uma Administradora, a Dr.ª SL…, com o pelouro dos Recursos Humanos;
- não era, da competência da A., mas sim da Administradora de tal pelouro (Recursos Humanos), dar ou alterar instruções para proceder a rectificações dos processamentos de remunerações (uma questão, colateral, suscitada pelos assinalados 12, 13, 13-A e 14, à face dos quais, factos, a Lei aplicável é, igualmente, clara e inequívoca, competindo a esta Administradora o cumprimento do disposto no art. 64, n.º 1, do CSC — o que esta não terá entendido necessário, por ter tomado conhecimento dos mesmos e ter ratificado a autorização para pagamento das quantias em apreço;
- contínua a ser importante relembrar, uma vez mais, o direito aplicável aos factos dados como "provados" ou "não provados", esclarecendo que tais "acertos" ao processamento de remunerações da A. ocorrem em 2010 (mais concretamente no tal "fecho de contas de 19 de Abril de 2010"), sobre remunerações pagas, pela R. à (e auferidas pela) A., em 2009;
- terá que forçosamente reconduzir à reiterada necessidade de apreciação conclusiva do direito aplicável aos factos sub judicio ao que determina a Lei Comercial na matéria: já no vetusto mas ainda bem actual Código Comercial se comanda, no seu art. 232, a propósito da "Remuneração do mandatário" que: "O mandato comercial não se presume gratuito, tendo todo o mandatário direito a uma remuneração pelo seu trabalho", esclarecendo, no seu § 1 que: "A remuneração será regulada por acordo das partes, e, não o havendo, pelos usos da praça onde for executado o mandato";
- estando em causa remunerações, devidas e pagas, à A., relativas ao ano contabilístico e fiscal de 2009, poderia a R., se entendesse ter legitimidade para tanto, proceder às alegadas "correcções" e "acertos", em 2009, atento que é sua obrigação fiduciária relevar todos os factos contabilísticos relativos ao ano contabilístico e fiscal que, in casu, para a R., termina em 31 de Dezembro de 2009... em 2009 e não em Abril de 2010 — com, repete-se, concluindo, ter ocorrido nova e manifesta violação do disposto nos art. 98n.º 1 e 3, 99, n.º 1 e 119, n.º 1, al a), b) e c), do CIRS;
-a R., poderia proceder, no "fecho de contas em 31.03.2010", às "correcções" e "acertos" que houvesse (mas não houve!) que operar relativamente às remunerações auferidas pela A. em 2010, mas não, nunca, relativamente a remunerações devidas e pagas, pela R., à A., em 2009, relativas ao ano de 2009 (Exercício que, ademais, sublinhando, de novo, foi aprovado em Assembleia Geral da R. e — tal como em relação às remunerações da A. — com Parecer sem reservas do próprio Revisor Oficial de Contas da R;
- a conclusão do direito aplicável à matéria constante dos 4. a 14 e 15 a 21, e à "Fundamentação de Facto" e correlativa fundamentação de direito, da lavra do Douto Tribunal a quo, terá que se subordinar, para além da sua conjugação com o do que a Lei prevê em matéria de mandato : com o disposto nos art., 98, n. 1 e 3, 99., n. 1 e 119, n 1, als. a), b) e c), do CIRS; com o que comanda os art.264, n.º 1 e 238, n.º 3, al. a), ex vi art. 262., n. 2, al. a), todos do Código do Trabalho, ex vi art. 59, n.º 1, al. d), da CRP; e, bem assim, com o que se determina, no Código das Sociedades Comerciais, no que concerne às obrigações da R., para cumprimento no disposto nos art. 65. e segs., deste Código, em matéria de relato e apresentação das contas e respectivos anexos, relativos ao ano contabilístico e fiscal de 2009, na sua omissão em relevar os tais ditos "acertos" e "correcções" nas remunerações da A., reportados a 2009, no seu Relatório e Contas de 2009;.
- a última, questão suscitada no "quesito" 3 sobre o qual, aliás e uma vez mais, o tribunal, nem se pronuncia, nem fundamenta as razões pelas quais optou por não decidir –, isto, sem embargo, tal como já antecipado a A. (como sempre, ademais, reitera-se, reconheceu), "gozou férias no verão de 2009", durante "10 dias" corridos, de calendário;
- a Constituição e a Lei determinam que o direito a férias (e a respectiva retribuição) é um inalienável direito (cf. art. 59, n.º1, al. d), da CRP), com aplicação, in casu, por remissão para o Direito contido nos art. 264, n.º 1 e 238. n.º3, al. a), ex vi art.2 262, n.º 2, al. a), todos do Código do Trabalho, por força do disposto no Contrato de Administração (e respectiva Adenda), outorgado entre a R. e a A., acima já identificados nos autos;
- com o outorgado contratualmente entre as partes, a A. é credora – em observância do princípio da não penalização retributiva e do contrato bilateral, marcado pelo sinalagma entre trabalho e retribuição – das demais quantias demandadas, não só pelo período de duração de férias e respectiva majoração, mas, também e objectivamente, pelas férias não gozadas e pela remição em dinheiro do respectivo valor e subsídio (de férias), pelos remanescentes dias de férias (os quinze, majorados, não gozados), num total que ascende a € 5.400, devidos e ainda não pagos ou ressarcidos pela R., como manda o Direito;
- resultando da aplicação do direito acima invocado, que a R. deverá repor e processar à A., os montantes constantes do petitório, tal como se encontra detalhado e demonstrado de € 60.095,65;
- tal como se vem sustentando e fundamentando, o regime jurídico dos contratos, de mandato, de administração, sejam ou não escritos, será sempre aquele que decorre da aplicação das regras do Mandato (e, in casu, do Mandato Comercial), aquele que, em cada caso, segundo a natureza de cada um, lhe venha caber, estando o tribunal vinculado à interpretação e aplicação das normas jurídicas aqui invocadas, para sobre os mesmos incidir o regime jurídico condicente e de acordo com a ratio legis;
- perante a factualidade acima exposta e a que se demonstrou "provada" e "não provada" nos presentes autos, impera reconhecer a aplicação do regime regra do Mandato à relação jurídica sub judicie;
- também e até data posterior à renúncia, pela A., dos cargos que vinha exercendo na R., nunca a R. se opôs ou manifestou qualquer reserva aos pagamentos que efectuou, por serem devidos, à A., pelo que não tendo havido (sublinha-se: até à data em que a A. apresenta a sua renúncia aos cargos que exercia na R.), qualquer alteração do status existente ou oposição da R., quanto aos inalienáveis direitos da A., ademais, impostos pelos normativos das Leis aplicáveis e invocados nas presentes alegações;
- não considerou e, em consequência, olvidou ou se exonerou, na decisão sobre o aspecto jurídico da causa, visando a adequada interpretação e aplicação da lei aos factos que tidos como assentes, de aplicar as normas legais que, no caso sub judicio, se exigiriam, por regularem a relação jurídica controvertida, optando por fundamentar a sua Decisão por reporte a um entendimento que improcede, por ser merecedora de juízo de censura, ao, na douta sentença a quo, não ter levado em consideração, como devia, o que, na Lei, se dispõe em matéria de "Mandato" (Direito que, como se demonstrou, é imparavelmente determinado pelo Art.2 1158, n.º 1 e 2, ex vi art. 164 cjg. com os art. 987, 1155, 1157 e, entre outros, 1167, al. a), todos do Código Civil).
- padecendo a douta sentença, em crise, do Tribunal a quo, da censurabilidade e dos vícios previstos e para os efeitos determinados no art. 668, n.º 1, al. b), c) e d), do CPC, o que aqui se requer, tal como da decisão sobre custas.
Factos
1 — No dia 1 de Março de 2007, entre a autora (como segunda outorgante) e a ré (como terceira outorgante) foi realizado o acordo cuja cópia se encontra a fls. 64/6, denominado "Contrato de Administração", do qual consta, além do mais, o seguinte:
«Considerando que:
1. Em 26 de Fevereiro de 2007, reuniu a assembleia-geral da primeira outorgante, tendo sido ratificada a cooptação da segunda outorgante, como Presidente do Conselho de administração.
2. A segunda outorgante foi cooptada para terminar o triénio em curso, o qual termina em 2008.
É, livre e esclarecidamente, celebrado o presente contrato de administração, o qual se rege pelas cláusulas seguintes, dele fazendo parte integrante os considerandos supra:
CLÁUSULA PRIMEIRA
1. Pelo exercício do cargo de Presidente do Conselho de Administração, a Segunda Outorgante não auferirá qualquer remuneração mensal.
CLÁUSULA SEGUNDA
1. Na qualidade de Presidente do Conselho de Administração da Primeira Outorgante, a Segunda Outorgante tem direito a uma viatura automóvel, escolhida por si, cujos custos, na modalidade de "renting", serão suportados pela Primeira Outorgante, até aos seguintes montantes:
a) As mensalidades da viatura automóvel serão suportadas pela Primeira Outorgante, até ao montante de €1.300,00 por mês, doze vezes ao ano, excluindo IVA e seguro;
b) O seguro automóvel da viatura em causa será também integralmente suportado pela Primeira Outorgante.
2. No final do período de "renting", a Primeira Outorgante suportará todos os custos da transmissão da viatura, para a Segunda Outorgante, caso esta assim o solicite.
CLÁUSULA TERCEIRA
1. A Primeira Outorgante atribui à Segunda Outorgante um cartão de crédito com um "plafond" anual de €6.000,00 euros.
O "plafond" atribuído destinar-se-á ao pagamento, por parte da Segunda Outorgante, de despesas de representação no quadro do exercício das suas funções de Presidente do Conselho de Administração, bem como de outras despesas, fiscalmente aceites (por exemplo, deslocações e estadas)» — (A);
2 — Pela Ap. …, foi inscrito na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa o seguinte registo relativo à ré:
«Conselho de administração :
A…, designada por cooptaçào em 20041029 e ratificada em 20041030
Prazo de duração do(s) mandato(s): até ao final do mandato em curso 2003/2005» —(B);
3 — Pela Ap. …. foi inscrito na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa o seguinte registo relativo à ré:
««Conselho de administração :
A…, designada por cooptaçào em 2007. 02.07 e ratificada em 2007.02.26
Cargo: Presidente
Prazo de duração do mandato: até ao final elo mandato em curso 2006/2008» — (C);
4 - Pela Ap. … foi inscrito na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa o seguinte registo relativo à ré:
«Conselho de administração:
A…
Cargo: Presidente
Prazo de duração mandato»: triénio de 2009/2011
Data da deliberação : 2009.01.17» — (D) e documento de fls. 15 a 22);
5 — Em 16 de Abril de 2009, entre a ré (como primeira outorgante) e a autora (como segunda outorgante) foi celebrada uma adenda ao contrato referido em 1. da qual consta, além do mais, o seguinte:
«Considerando que:
B) As Partes acordaram entre si que a situação remuneratória e os "fringe benefits" inerentes ao exercício do cargo de Presidente do Conselho de Administração da 3C pela Segunda Outorgante seriam revistos em Janeiro de 2009, na medida em que o exercício do cargo de Presidente elo Conselho de Administração, passasse a exigir funções executivas.
É acordado e reciprocamente aceite a presente adenda ao contrato de administração nos termos e condições constantes das cláusulas infra, a qual fica, para todos os efeitos a fazer parte integrante do contrato de administração
CLÁUSULA PRIMEIRA
(CLÁUSULAS ALTERADAS)
São alteradas as Cláusulas 1ªe 3ª do Contrato de Administração celebrado em 01/03/2007 entre a 3C e a Segunda Outorgante, as quais passam a ter a redacção constantes das cláusulas seguintes:
Cláusula Segunda
(Nova redacção da clausula 1ª)
1. Pelo exercício do cargo de Presidente do Conselho de Administração, a Segunda Outorgante passará a auferir uma remuneração mensal bruta de € 9.000 (nove mil euros) catorze vezes por ano, aí se incluindo, por isso, a remuneração por férias, subsídio de férias e subsídio de natal.
2. A Segunda Outorgante terá, ainda, direito a ajudas de custo pelo montante máximo de € 6.000, pagas em doze prestações mensais de 500 (quinhentos ouros) cada.
CLÁUSULA SEXTA
Os efeitos dos termos e condições constantes na presente Adenda ao Contrato de Administração celebrado cm 01/03/2007 e que dele faz, para todos os efeitos, parte integrante, retroagem à data de 1 de Abril de 2009 e serão objecto de revisão em ... Setembro de 2009» — (E);
6 — Em 1 de Março de 2010 a autora enviou à ré, que a recebeu no dia seguinte, a carta cuja cópia se encontra a fls. 29, da qual consta, além do mais, o seguinte:
«Venho pela presente, e por razões de ordem pessoal, apresentar a minha renúncia ao cargo de Presidente do Conselho de Administração da B…, SA.
Nos termos do estipulado no art. 404, nº 2, do Código das Sociedades Comerciais a minha renúncia produzirá efeitos no último dia do mos seguinte ao da sua apresentação, ou seja, no dia 30 de Abril de 2010. (...)» — (F);
7 — A autora exerceu o cargo de Presidente do Conselho de Administração da ré entre 7 de Fevereiro de 2007 e 29 de Março de 2010 — (1°);
8 — Em finais de 2009, a autora, enquanto Presidente do Conselho de Administração da ré, insurgiu-se contra a Directora de Recursos Humanos ré, quando esta lhe processou férias, subsídio de férias e subsídio de natal, com referência à data de 1 de Abril de 2009 — (4);
9 — No final do Verão de 2009 os recursos humanos da ré pretenderam processar as férias e o subsídio de férias da autora relativos ao ano de 2009, com referência a 1 de Abril de 2009 — (5);
10 — A autora, invocando a sua qualidade de Presidente do Conselho de Administração da ré, ordenou aos seus serviços de recursos humanos que lhe fossem pagos 12 dias de férias e 22 dias de subsídio de férias referentes ao ano de 2008 — (6°);
11 — (...) e que se procedesse da mesma maneira quanto ao subsídio de natal referente ao ano de 2009 — (7°);
12 — A Directora de Recursos humanos da ré explicou então à autora que o sistema de processamento de salários assumiu os dados constantes da adenda referida em 5. — (8°);
13 — (...) e que dessa adenda constava que a autora só tinha passado a auferir remuneração como Presidente do Conselho de Administração da ré a partir de 1 de Abril de 2009 — (9°);
14 — (...) e que, por isso, durante o ano civil de 2009, a autora não tinha vencido o direito a receber férias e subsídio de férias relativos ao ano de 2008, mas apenas e só respectivos os proporcionais com referência à data de 1 de Abril de 2009 — (10°);
15 — (...) e que o mesmo acontecia com o subsídio de natal referente ao ano de 2009, relativamente ao qual apenas tinha direito a 9/12 do seu total — (11°);
16 — Apesar das explicações que lhe foram dadas pela Directora de Recursos Humanos da ré e descritas em 12. a 15., a autora ordenou que lhe fosse pago o correspondente a 22 dias de férias, subsídio de férias e subsídio de natal — (12°);
17 — (...) o que sucedeu — (13°);
18 — (...) e ordenou ainda que lhe fossem pagos 12 dias de férias relativos ao ano de 2008 — (13°-A);
19 — (...) o que igualmente sucedeu — (14°);
20 — À data do fecho de contas entre a autora e a ré. ocorrido em 31.03.2010, esta processou àquela:
a) € 9.000.00. correspondente ao vencimento de Março de 2010;
b) € 154,79, a título de subsídio de alimentação referente ao mês de Março de 2010;
c) € 500,00. a título de ajudas de custo não sujeitas a tributação, referentes ao mês de Março de 2010;
d) € 2.250.00. correspondente ao proporcional de 3/l2. relativo a férias reportadas ao ano de 2010;
e) € 6.750,00. correspondente ao proporcional de 9/12. relativo a férias não gozadas reportadas ao ano de 2009;
t) € 2.250,00, correspondente ao proporcional de 3/l2, relativo a subsídio de férias reportado ao ano de 2010;
g) € 2.250,00, correspondente ao proporcional de 3/12. relativo a subsídio de Natal reportado ao ano de 2010;
h) € 6.750.00, correspondente ao proporcional de 9/12. relativo a subsídio de férias reportado ao ano de 2009, no montante global de € 29.904,79 — (18") ;
21 — Na mesma data, à referida quantia global de € 29.904.79, a ré deduziu a quantia de:
a) € 2.250,00, correspondente ao proporcional de 3/l2, relativo a subsídio de Natal referente ao ano de 2009;
b) € 9.000.00, correspondente ao montante do subsídio de férias referente ao ano de 2008;
c) € 3.600,00, correspondente a 12 dias de retribuição de férias referentes ao ano de 2008.no montante global de € 14.850,00 — (15 a 17);
22 — Sobre a quantia de € 15.054,79, correspondente à diferença entre os montantes globais referidos em 20. e 21.. a ré efectuou descontos:
a) para a Segurança Social, no valor de € 503.06;
b) para efeitos de IRS, no valor de € 4.682,00, no montante global de € 5.185,06 — (191;
23 — Para pagamento da quantia de € 9.869,73, correspondente à diferença entre os montantes globais de € 15.054,79 e € 5.185,06, referidos em 22.:
a) no dia 30 de Março de 2010, a ré transferiu para uma conta bancária da autora a quantia de € 6.404,73:
b) em 31 de Março de 2010, a ré emitiu à ordem da autora o cheque nº ….. datado de 15.04.2010, no valor de € 3.465.00, sacado sobre a conta bancária nº …, de que aquela é titular no Millenium BCP — (20° e 21°);
24 — A autora recusou receber o cheque referido em 23. b) — (22°).
Houve contra alegações defendendo a manutenção da decisão. A ré, ao apelada, pediu a condenação da apelante como litigante de má fé.
Corridos os vistos legais, nada obsta ao conhecimento
II - Apreciando
A apelante não aceita a decisão e, continua a pedir a condenação da ré no pedido. Invocou variadas nulidades, que afectam a decisão. A ré, por outro lado, nas contra - alegações, pediu a condenação da autora como litigante de má fé.
Vejamos, então
1.1 A autora, ora apelante fundamenta a sua pretensão, no facto de ter mantido com a ré “3C”, desde 2004, um vínculo contratual ininterrupto até 29 de Março de 2010, que cessou com a renúncia ao cargo de Presidente executiva do conselho de administração. Assim sendo, tem direito às remunerações entre 5 de Janeiro de 2009 e 29 de Março de 2009, acordadas na adenda de 16 de Abril de 2009, vencimentos e respectivos acréscimos remuneratórios.
Na decisão impugnada entendeu-se que não era devido tal pagamento.

Como nota inicial, a apelante faz afirmações nas alegações que reproduzem factos que não foram alegados e consequentemente não constam da matéria de facto, com por exemplo a que consta na al.C) das alegações, reportando-se a um período de funções remuneradas (17/7/2006 a 7/2/2007) e a cessação de funções como presidente do CA da PF. Ou seja, nada podem relevar.
Alegou que, acordaram verbalmente, no contrato celebrado em 16 de Abril de 2009, ser remunerada desde Janeiro a Março de 2009, nas mesmas condições, das alterações efectuadas ao contrato, na denominada adenda.
O acordo entre a pessoa convidada para ingressar no conselho de administração da sociedade anónima e um membro desse conselho, não obriga a pagar suplementos se não forem acordados por órgão para tal exclusivamente competente. Assim, a pretensão da apelante tem de encontrar resposta no acordado pelas partes em duas situações distintas. A adenda celebrada entre as partes em 16 de Abril de 2009, que acordaram ter efeitos a partir de 1 de Abril desse mesmo ano e, no contrato de administração celebrado em 1 de Março de 2007.
Com relevância para a decisão vem provado que:
- no dia 7 de Fevereiro de 2007, a autora foi designada, por cooptação, para exercer funções de presidente do conselho de administração da ré até ao final do triénio 2006-2008; essa designação por cooptação foi ratificada no dia 26 de Fevereiro de 2007.Tal ratificação, conforme decorre do citado preceito legal, só pode ter sido efectuada em reunião da assembleia-geral da ré (aliás, é exactamente isso que resulta do documento de fls. 64/65).
- no dia 7 de Janeiro de 2009 a autora foi eleita (necessariamente pelos accionistas da ré em reunião da assembleia-geral, como impõe o citado preceito legal), para o exercício de funções de presidente do conselho de administração da ré para o triénio 2009-2011.
Vem provado que “Os efeitos dos termos e condições constantes na presente Adenda ao Contrato de Administração celebrado cm 01/03/2007 e que dele faz, para todos os efeitos, parte integrante, retroagem à data de 1 de Abril de 2009 e serão objecto de revisão em Setembro de 2009» — (E);
1. Na qualidade de Presidente do Conselho de Administração da Primeira Outorgante, a Segunda Outorgante tem direito a uma viatura automóvel, escolhida por si, cujos custos, na modalidade de "renting", serão suportados pela Primeira Outorgante, até aos seguintes montantes:
a) As mensalidades da viatura automóvel serão suportadas pela Primeira Outorgante, até ao montante de €1.300,00 por mês, doze vezes ao ano, excluindo IVA e seguro;
b) O seguro automóvel da viatura em causa será também integralmente suportado pela Primeira Outorgante.
2. No final do período de "renting", a Primeira Outorgante suportará todos os custos da transmissão da viatura, para a Segunda Outorgante, caso esta assim o solicite.
CLÁUSULA TERCEIRA
1. A Primeira Outorgante atribui à Segunda Outorgante um cartão de crédito com um "plafond" anual de €6.000,00 euros.
O "plafond" atribuído destinar-se-á ao pagamento, por parte da Segunda Outorgante, de despesas de representação no quadro do exercício das suas funções de Presidente do Conselho de Administração, bem como de outras despesas, fiscalmente aceites (por exemplo, deslocações e estadas)» — (A);
B) As Partes acordaram entre si que a situação remuneratória e os "fringe benefits" inerentes ao exercício do cargo de Presidente do Conselho de Administração da 3C pela Segunda Outorgante seriam revistos em Janeiro de 2009, na medida em que o exercício do cargo de Presidente elo Conselho de Administração, passasse a exigir funções executivas.
É acordado e reciprocamente aceite a presente adenda ao contrato de administração nos termos e condições constantes das clausulas infra, a qual fica, para todos os efeitos a fazer parte integrante do contrato de administração -(CLÁUSULAS ALTERADAS) São alteradas as Cláusulas 1ª e 3ª do Contrato de Administração celebrado em 01/03/2007 entre a B..SA e a Segunda Outorgante, as quais passam a ter a redacção constantes das cláusulas seguintes:
Clausula Segunda (Nova redacção da clausula 1ª)
1. Pelo exercício do cargo de Presidente do Conselho de Administração, a Segunda Outorgante passará a auferir uma remuneração mensal bruta de € 9.000 (nove mil euros) catorze vezes por ano, aí se incluindo, por isso, a remuneração por férias, subsídio de férias e subsídio de natal.
2. A Segunda Outorgante terá, ainda, direito a ajudas de custo pelo montante máximo de € 6.000, pagas em doze prestações mensais de 500 (quinhentos ouros) cada.
CLÁUSULA SEXTA Os efeitos dos termos e condições constantes na presente Adenda ao Contrato de Administração celebrado cm 01/03/2007 e que dele faz, para todos os efeitos, parte integrante, retroagem à data de 1 de Abril de 2009 e serão objecto de revisão em ... Setembro de 2009» — (E);
No art. 2º perguntava-se: «À data da realização da adenda referida em E) – 16 de Abril de 2009 –, autora e ré acordaram que a primeira receberia, em momento posterior àquela data, o montante da remuneração mensal e das ajudas de custo referidas em 1. e 2. da cláusula segunda da dita adenda, com referência aos meses de Janeiro, Fevereiro e Março de 2009?». Este art. obteve a resposta de não provado.
O acordo verbal que alegou não se provou, mais difícil fica acolher a sua tese. Mas, se por hipótese conseguisse provar tal acordo tinha de resultar também da decisão do órgão competente para fixar as remunerações, o que não alegou e consequentemente não podia provar. Assim sendo, há que considerar apenas os documentos certidão de matrícula e inscrições referentes à ré, fls.15 a 22, adenda ao contrato de administração de fls. 25 a 28 e contrato de administração de fls.64 e 65. O sistema informático da empresa não assumiu tal alteração de vencimentos a processar desde Janeiro e foi a autora que deu as ordens de pagamento. Na referida Adenda ao contrato de administração, assinada entre as partes a 16 de Abril de 2009, foram fixados efeitos retroactivos, na verdade, combinaram o seu início a 1 desse mesmo mês, apesar de ter sido assinada a 16. Ou seja, se as partes quisessem fazer retroagir tal acordo, não se entende a razão pela qual se referiu o seu início a 1 de Abril e não ficou a constar 1 de Janeiro. A simples interpretação literal não aponta no sentido defendido pela apelante bem pelo contrário, nem o tempo verbal usado na alteração “passará a auferir…”, no futuro, não se prevê o tempo passado. Sendo a apelante uma gestora experiente seguramente que estaria atenta a tal falha, se tivesse sido o que queriam estipular. Nem colhe o argumento de que trabalhou sem qualquer recompensa, uma vez que, lhe foram processadas as regalias que tinham acordado.
No entanto, vem provado que, a autora desde 1 de Março de 2007, como Presidente do Conselho de Administração da ré não auferiria qualquer retribuição mensal, e na cláusula 2ª constavam as regalias que passaria a auferir. A alteração por adenda daquele acordo, nomeadamente a cláusula 2ª , na qual no seu nº 1 passou a estipular expressamente que a partir de 16.4.2009 a autora passaria a auferir, pelo exercício do cargo de presidente do Conselho de Administração da ré, a quantia de €9.000,00, 14 vezes ao ano e nº 2 daquela cláusula segunda, o montante das ajudas de custo, com início em 1 desse mês. Podemos com segurança afirmar que, não estipularam o início dessas alterações para Janeiro e podiam fazê-lo seguramente se essa fosse a decisão da entidade competente para o fazer. Aí se previam, por exemplo, alterações a introduzir em Setembro desse mesmo ano. A sua remuneração não podia resultar nestes casos de acordo das partes, como é normal nos contratos onerosos, mas tem de ser tomada por deliberação da assembleia-geral ou de órgão estatutário ou facultativo. Se por hipótese, viesse provado que o fizeram, não teria validade, nem vincularia a sociedade se não houvesse decisão da entidade competente para a sua fixação. Como se decidiu no Ac. do TRP de 15.11.1993 acessível in wwdgsi.pt:
I- A remuneração do administrador de sociedade anónima pode não ser nenhuma, negociada por um grupo de accionistas e pela Assembleia-geral.
II - No caso de fixação pela Assembleia-geral, se a mesma não lhe convier só lhe resta renunciar ao cargo.
III - A reeleição da Assembleia-geral para outro período de funções nada tem a ver com o exercício em período anterior.
IV - Podendo a Assembleia Geral reapreciar e deliberar em sentido oposto o decidido pela criada Comissão de Vencimentos de fixação de um ordenado mensal a um administrador que o aceitou, tal deliberação não tem efeitos retroactivos, devendo ser pagas ao administrador as remunerações vencidas pois só a partir da mesma ele podia renunciar. (…)
Estipula o art. 391º nº 1 do Código das Sociedades Comerciais que os administradores das sociedades anónimas podem ser designados no contrato de sociedade ou eleitos pela assembleia-geral ou constitutiva.
Entre uma pessoa designada como administrador — que aceita a designação — e a sociedade respectiva estabelece-se uma relação jurídica complexa (com direitos e deveres recíprocos, respeitantes, por exemplo, à gestão e representação, às remunerações, aos períodos de trabalho).
O contrato de administração é uma figura “sui generis”, pelo qual uma pessoa se obriga a prestar a sua actividade de gestão e representação de uma sociedade anónima com ou sem remuneração. De cada vez que o administrador é eleito e aceita o cargo, formaliza-se um contrato de administração ex novo. A reeleição e aceitação não correspondem aos mesmos pressupostos do anteriormente existente, nem a prorrogação do prazo anterior. Atendendo principalmente à génese desta relação, têm sido avançadas numerosas teses acerca da natureza jurídica dela: teses contratualistas (mandato, prestação de serviço, contrato de trabalho, contrato de administração), teses unilateralistas, teses dualistas ou da divisão.
Ora, tendo em vista o panorama dos modos de designação, a relação administrativa muitas vezes não será contratual. Dir-se-á que é contratual quando fundada no contrato de sociedade e o administrador seja sócio — parte do mesmo contrato. Mas com a nota de que tal relação é conformada basicamente, não pela disciplina dos contratos, mas pela lei, que fixa os poderes e deveres dos administradores e os mecanismos, muitas vezes não contratuais. Em matérias como a das remunerações: em regra, a fixação destas é feita por deliberação dos sócios (art. 192/5,255/1e 399/1).
Tem-se discutido especialmente a natureza da designação dos administradores por deliberação dos sócios, em assembleia-geral. Entendem alguns que a eleição forma com a aceitação do cargo um contrato de administração –art. 391/5, entre eles o Prof. Oliveira Ascensão, Direito comercial, Vol. IV; Pinto Furtado, curso de Direito das Sociedades pag.340-341. Coutinho de Abreu Curso de Direito Comercial pag. 536, defende que parece preferível ver na deliberação de eleição um negócio unilateral da sociedade, relativamente à qual a aceitação constitui condição de eficácia. A deliberação designa, o designado aceita a nomeação. A deliberação de eleição é registável e impugnável judicialmente-art 3/1, al. m) do C.R.Com.
Por vezes, a relação de administração assenta não só num acto de designação de natureza unilateral, não contratual – mas ainda em contrato. Assim a nomeação de um ROC para a sociedade exige não só o acto de aceitação, mas também, um contrato de prestação de serviço – art. 53 do DL 487/99 de 16 de Nov. A relação de administração não tem de ser contratual, e normalmente não é contratual.
Defende a apelante que deve ser remunerada por ter exercido no período em discussão (Janeiro a Abril) um mandato de facto mas, podemos adiantar que tal entendimento não colhe em face das razões expostas anteriormente, que afastam a possibilidade de remunerar pelas regras do mandato, o administrador.
É característica tanto do contrato de mandato como de prestação de serviços a possibilidade de ser gratuito ou oneroso. Segundo o CC o mandato presume-se gratuito, excepto se tiver por objecto actos que o mandatário pratique por profissão, caso em que se presume oneroso ( 1158) E o mesmo se aplica ao contrato de prestação de serviço nos termos do art. 1156 do CC. O mandato comercial não se presume gratuito. No art. 232 §1 do C.Com. -“ O mandato não se presume gratuito, tendo o mandatário direito a uma remuneração pelo seu trabalho”. A remuneração no contrato de mandato será regulada por acordo das partes, e, não havendo, pelos usos e da praça onde for executado o mandato.
O contrato de trabalho subordinado é, por natureza, oneroso, sendo essencial a existência de retribuição art. 1152 do CC e art. 1º e 90 da LCT. Distingue-se deste por poder ser gratuito e não poder ser juridicamente subordinado.
Como escreveu Brito Correia, in Os Administradores de Sociedades Anónimas - fls. 800, (… )distingue-se do mandato e da prestação de serviços, porque tem por objecto uma actividade e não um resultado; uma actividade que pode ser jurídica ou também material; uma actividade de gestão e de representação orgânica, e não de representação por substituição de vontades; e em posição de grande autonomia, uma vez que tem poderes exclusivos de representação e que a colectividade dos accionistas só pode deliberar sobre assuntos de gestão nos casos previstos nos estatutos ou a pedido do órgão de administração, não estando, portanto em regra, obrigado a cumprir as instruções da colectividade dos accionistas, embora deva respeitar as suas orientações, sob pena de ser destituído.
Quanto aos administradores em sociedades anónimas, C.Com estabelece que “ as funções dos membros da direcção, são remuneradas, salvo disposição dos estatutos em contrário” art.177§unico. Decorre deste art. que as funções de administrador podem ser remuneradas ou gratuitas. E o art. 399 do CSC contém algumas normas sobre a competência para a fixação da remuneração valor mas não diz se é obrigatória.
Também o CSC introduziu um preceito importante sobre o direito subsidiário (o art. 2°), que altera, em alguns aspectos, as conclusões que podem retirar-se da lei anterior. Diz o art. 2° que "os casos que a presente lei não preveja são regulados segundo a norma desta lei aplicável aos casos análogos e, na sua falta, segundo as normas do Código Civil sobre o contrato de sociedade, no que não seja contrário nem aos princípios gerais da presente lei nem aos princípios informadores do tipo adoptado".
Da primeira parte deste preceito decorre a aplicabilidade analógica aos administradores de sociedades anónimas — quando seja caso disso, é claro— das disposições relativas aos gerentes de sociedades por quotas ou de sociedades em nome colectivo ou de sociedades em comandita.
A este respeito, o CSC não remete em nenhuma das suas disposições para as regras do mandato. No entanto, a segunda parte do art. 2° do CSC manda aplicar "as normas do Código Civil sobre o contrato de sociedade" (v. g., os art. 985 a 987, 996 a 998 e, por força do art. 157, os art. 162 a 165 e 170). E nelas (v. g., nos art. 164, nº 1, 986, n.º 3, e 987, nº 1) voltam a encontrar-se remissões para as regras do mandato. O CSC estabeleceu dois limites importantes à aplicação subsidiária das regras do C.C.
Em primeiro lugar, as normas do C.C sobre o contrato de sociedade não são aplicáveis quando forem contrárias aos princípios gerais do próprio CSC. Em segundo lugar, tais normas não são aplicáveis quando sejam contrárias aos princípios informadores do tipo adoptado. Quais são esses princípios é questão que o próprio CSC não resolve claramente e irá, por certo, resultar da elaboração doutrinária e jurisprudencial. E quando é que se verifica tal contrariedade é questão a analisar caso a caso.
É de observar também que o CSC não prevê a hipótese de recurso analógico ou subsidiário a normas do C.Com, nem a outros capítulos do C.C. E esta omissão tem particular interesse neste campo, pois pode pôr-se a questão de saber se, para resolver questões sobre os administradores de sociedade anónimas. Assim, primeiro há que recorrer às regras do C.Com como dispõe o art. 3 do C.Com., para integrar lacunas só se deve recorrer ao CC se aquele for omisso.
No caso dos autos a recorrente exerceu funções de presidente do conselho de administração da ré entre 7 de Fevereiro de 2007 e 29 de Março de e 2010, no entanto, a remuneração fixa, foi fixada a partir de 1 de Abril de 2009. E, assim sendo, não houve omissão nem precisa de se fazer analogia. Ou seja, a apelante não foi mandatária da apelada, em face da matéria de facto que vem dada como provada. Consta da acta nº 28 junta a fls.165, que foi nomeado um procurador para a sociedade em 28 de Setembro de 2009 Dr. P....
Não fazendo prova desse facto, também a lei não permite que se aplique a regra do mandato como se viu, por a tal obstar as funções de administrador, deve ser remunerada de Janeiro a Abril, nos mesmos termos que foram feitos pela adenda de 16 de Abril com início em 1 de desse mesmo mês. A entidade competente não lhe fixou remuneração, é impossível fazer retroagir como pretende. A lei não permite. Nem pode de modo algum aplicar as regras do mandato, em face do que ficou exposto. Aliás, anteriormente a apelante estava noutra sociedade que faliu e seguramente tinha outras regalias que acumulou com as enumeradas nestes autos e ai gozou as férias remuneradas. Mas, o mas importante, é que, a fixação de remuneração compete à assembleia-geral ou a uma comissão por ela nomeada, tendo em conta as funções desempenhadas e a situação económica da sociedade. (art. 399/1). Não sabemos, nem foi alegado se a empresa comportava tal encargo, com se exige na sua fixação, atendendo à situação económica que o permita. A apelante manteve as regalias que já tinha anteriormente e mais o vencimento que lhe foi fixado, nos termos e condições em que o foram. Não podia dar ordens de pagamento como administradora, pois, não foi acordado nem estava previsto no contrato. Não existe obrigação de pagamento, por remissão a outras figuras jurídicas que lhe são próximas e a apelante invocou nas suas alegações. Podia sempre ter renunciado ao cargo. O que não se entende, foi como ordenou o processamento de subsídios e vencimentos como se existisse um contrato de trabalho subordinado. Se tinha dúvidas devia ter pedido informação à sociedade para dirimir este diferendo de interpretação. E, não concordando só lhe restava uma solução, sair.
Dispõe o art. 64/2 introduzido pelo DL76-A/2006 “ Os titulares de órgãos sociais com funções de fiscalização devem observar deveres de cuidado, empregando para o efeito elevados padrões de diligência profissional e deveres de lealdade, no interesse da sociedade”. Como escreveu o Prof. Calvão in RLJ, 136/51 (… de acordo com o direito geral, cada um deve cumprir os seus deveres de boa fé (vide, por exemplo, art. 762/2 ou o art.227 do CC), vale dizer, com correcção, a honestidade, a lisura e a lealdade próprias de pessoas de bem, e com o cuidado e diligência do “ bónus pater famílias”(....) E continuando (…) “ O dever de lealdade implica não fazer negócios com a sociedade (art.397) …ou para fins pessoais; fixar remunerações exorbitantes, etc”
Nem afasta, de modo algum, este entendimento, o facto de ter sido pago alojamento em férias, sendo certo que se provou que foi processado por ordem sua e sem que o sistema informático da empresa tivesse assumido tal pagamento, cf. art. 12 a 15 e 16 a 20, nem os documentos de fls. 175/176, o que comprovam, é que, a autora esteve hospedada num hotel durante 10 dias, a expensas da S… SGPA…SA, da ré, não alteram a versão dos factos. Ou seja, gozou férias e recebeu a remuneração proporcional pagas pela recorrida. O que estava em causa eram os acertos de contas com a sua renúncia ao cargo. È seguramente um direito constitucional o gozo de direito a férias, que não se discute nos autos, na adenda não estava acordado esse pagamento, para as férias do ano anterior, uma vez que não auferia uma remuneração fixa. E, afastada a invocação do art. 59/1,al.d) da CRP - Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito: d) Ao repouso e aos lazeres, a um limite máximo da jornada de trabalho, ao descanso semanal e a férias periódicas pagas. A questão a decidir não coloca em causa tal direito, se não houver remuneração fixada, e é esse o cerne da questão, ou seja, fica decidido antes da aplicação deste comando constitucional.
Aliás, antes desta alteração com a adenda de 16 de Abril a apelante não tinha direito a férias pagas. E em 2008 seguramente que a ré não tinha de pagar tais encargos, como se decidiu. E se estava noutra empresa seguramente tinha aí as regalias que lhe foram fixadas. Não tendo remuneração mensal, mas variadas regalias que manteve, só após a adenda de 1 de Abril obteve tal direito a férias pagas. O que não podia era ordenar o pagamento como fez, como se sempre tivesse auferido aquele vencimento. Discute-se a diferença entre os montantes referidos em 21ª al. a),b),e c), num total de €14.850,00 com o que se apurou ter direito €29.904,79, art. 20. Daí o acerto de contas após as deduções para a SS e do IRS num total de €5.185,06. Vem provado que renunciou em 1.3.2010, fls.29, e como dispõe o art. 404/2 do C.S.C. com efeito no mês seguinte, ou seja 30.4.2010. No entanto, cessou funções 29.3.210. Assim sendo, bem se andou em não considerar em dívida o mês de Abril.
O argumento da apelante de que a ré, não podia fazer acertos nas contas com a autora, uma vez que se reportavam a pagamentos feitos em 2009, estavam fechadas as contas. Este facto novo, não foi apreciado na primeira instância e como tal não há elementos para se poder conhecer. Tem-se entendido que os recursos são meios para obter o reexame de questões já submetidas à apreciação dos tribunais inferiores e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida a exame do tribunal de que se recorre, mas o tribunal de recurso pode conhecer de questões novas desde que de conhecimento oficioso e ainda não decididas com trânsito em julgado, como é o caso do abuso do direito (cf. Fernando Amâncio Ferreira (in Manual dos Recursos em Processo Civil, 8ª edição, pág. 146 a 149).
Mas, tal argumento não colhe, se assim fosse, não era possível pagar salários atrasados por estarem fechadas as contas o que no mínimo era insustentável. Mas, acresce, no caso vertente, que os pagamentos foram feitos por ordem expressa dada como presidente do conselho de administração e seguramente não estava nas suas competências, em face do que ficou exposto - art. 9 a 19. No art. 20 estão os montantes pagos e a indicação a que título foram pagos. E, assim sendo, nada há para alterar na dedução dos montantes indicados em 21, al. a) a c), em face do seu contrato de administração. O momento para acertar contas é o fim do contrato, que no caso vertente acabou com renúncia da apelante.
Sendo o mandato um contrato (não um acto unilateral), que impõe a obrigação de celebrar actos jurídicos por conta de outrem; o que há de típico, no mandato é a cooperação dos dois sujeitos sob a forma de actos jurídicos que um deles, o mandatário, realiza por conta do outro, mandante (Pires de Lima e Antunes Varela, "CC Anotado", vol. II, 4ª ed., 1997, p. 788; Galvão Teles, "Contratos Civis", BMJ, nº 83-174).
Em suma, a remuneração do mandatário e do prestador de serviços é fixada, na falta de acordo, por recurso a critérios objectivos estranhos às partes, ou por decisão de terceiro, a remuneração do administrador é, em regra, fixada por um órgão da entidade devedora. Esta é uma situação diferenciadora na relação de administração e mandato - Brito Correia, Os Administradores de Sociedades Anónimas pag .570.
O n. 1 do artigo 236 do Código Civil representa a consagração da chamada da "teoria da impressão do declaratário", teoria que entende que a declaração negocial deve ser interpretada como um declaratário medianamente sagaz, diligente e prudente, a interpretaria, colocado na posição concreta do declaratário. O código não se prenuncia sobre o problema de saber quais as circunstâncias atendíveis para a interpretação, ensinava o Prof. Mota Pinto que - "se deverá operar com a hipótese dum declaratário normal: serão atendíveis todos os coeficientes ou elementos que um declaratário medianamente instruído, diligente e sagaz, na posição do declaratário efectivo, teria tomado em conta" - Teoria Geral do Direito Civil, 1980, pag.421.Entre os elementos a tomar em conta destacam-se os posteriores ao negócio, elementos estes que são "os modos de conduta porque posteriormente se prestou ao negócio concluído" – Prof. Rui Alarcão, in Boletim do Ministério da Justiça n. 84, página 334. A título exemplificativo, o Prof. Manuel de Andrade refere: "os termos do negócio", "os usos de outra natureza que possa interessar", "a finalidade prosseguida pelo declarante", "os interesses em jogo no negócio" -Teoria Geral da Relação Jurídica, volume II, 1960, página 313, nota 1).
Ora, no âmbito interpretativo, há que ter em conta os seguintes princípios:
a declaração negocial valerá de acordo com a vontade real do declarante, se ela for conhecida do declaratário (art. 236º, n.º 2, do Cód. Civil);
não o sendo, valerá com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do declaratário real, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele (art. 236º, citado, n.º 1); nos negócios formais, a declaração não pode valer com um sentido que não tenha no texto do respectivo documento um mínimo de correspondência, ainda que imperfeitamente expresso (art. 238º, n.º 1, também do Cód. Civil).
Não pode, por outro lado, esquecer-se que a interpretação das declarações ou cláusulas negociais constitui matéria de facto, e a apelante não provou que tivessem acordado tal retroactividade do acordo e, por outro lado, a leitura literal do acordado não aponta de modo algum nessa direcção.
Findo o contrato há que fazer o acerto de contas, momento certo para encerrar as mesmas. E, não obsta a regra da contabilidade ou mesmo do CIRS para serem feitas. Se houve discrepâncias há que proceder ao seu acerto se houver créditos ou débitos. O argumento de que só foram feitas por ter renunciado, não colhe. Se a apelante pode pedir o que lhe era devido também a entidade devedora deve neste momento apresentar os créditos que tenha para compensar. O que podemos concluir, no caso vertente, é que a fiscalização e aprovação de contas na assembleia-geral e do seu revisor oficial de contas, aprovaram as contas como ordenado pela apelante.
Nas alegações refere que já pagou a taxa a da SS e IRS e foi novamente descontada no mês de Março, mas tal reporta-se eventualmente ao que não devia ter recebido pois não vem provado no acerto de constas tal desconto em duplicado.
Improcedem as suas conclusões, nesta parte.
1.2 A apelante aponta várias nulidades à decisão impugnada não concretizando, em que consistem as invocando nulidades, remetendo apenas para as várias al. do art. 688 do CPC
a) Nesta primeira questão, defende a recorrente a nulidade com base na al. b) do nº 1 do art. 668.
A al. b) referida prevê uma causa de nulidade da sentença que ocorre quando aquela não especifique os fundamentos de facto ou de direito que justifiquem a decisão. Trata-se aqui de sancionar o incumprimento do dever processual de fundamentação das decisões judiciais, dever esse que consta genericamente do disposto no art. 158° e está previsto especificamente para a sentença no art. 659°.Desta forma, terá a sentença que fundamentar a sua parte decisória sob pena de ser julgada nula. Porém, tal como é pacificamente aceite – cf. J. R. Bastos, in Notas ao C. de Proc. Civil, pág. 194 do III vol. – a pesada sanção de nulidade apenas se aplica quando houver uma omissão total de fundamentação de facto ou de direito, e não se preenche com uma fundamentação meramente deficiente ou incompleta. Neste último caso, haverá apenas uma decisão menos feliz, que afecta o seu valor doutrinal, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas tal deficiência não produz a nulidade da mesma.
Ora analisando a decisão recorrida, não vemos em que consiste a invocada nulidade da decisão impugnada.
Ocorre a nulidade da sentença, prevista na al. c), nº1, do CPC, quando os fundamentos invocados pelo juiz, deveriam logicamente conduzir ao resultado oposto ao que vem expresso na sentença, existindo um vício real no raciocínio do julgador.
O art. 668º, nº al. c) comina com a nulidade a sentença que contenha contradição entre os fundamentos e a decisão.
Trata-se da deficiência da sentença existente no silogismo em que aquela se analisa, e consistente em os fundamentos invocados conduzirem logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto.
Analisando o acórdão não descortinamos qualquer vício lógico de raciocínio, e nem os recorrentes são muito explícitos na indicação do referido vício.
Com efeito, a nulidade da dita al. c) consiste em oposição entre os fundamentos e a decisão, só existindo quando o processo lógico baseado nos fundamentos invocados devesse conduzir a uma decisão diferente ou contrária da que foi efectivamente tomada.
Ora, não se detecta que a fundamentação invocada no acórdão recorrido fosse susceptível de conduzir a um resultado lógico distinto do da decisão nele tomada, independentemente da eventual existência de algum erro de julgamento.
No entanto, da matéria de facto dada como provada não resulta, que tivesse havido qualquer erro.
Invocou, ainda, a nulidade do art. 668, al. d) do CPC
Não ocorre a nulidade prevista, na al. d), quando o não conhecimento da mera questão se deva a ter ficado prejudicado pela solução dada a outras. (Ac. RL, de 23.3.1995;CJ,1995,2°-95).
A nulidade de omissão de pronúncia prevista na alínea d) do art. 668 do C.P.C. traduz-se no incumprimento por parte do julgador, do dever prescrito no nº2 do art. 660º do citado Código, e que é o de resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão estiver prejudicada pela solução dada a outras. A omissão de pronúncia incide sobre questões postas ao tribunal e não sobre os fundamentos produzidos pelas partes. Não há omissão de pronúncia quanto a fundamentos.
Ora, como se sabe, as nulidades do processo «são quaisquer desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei e a que este faça corresponder – embora não de modo expresso uma invalidade mais ou menos extensa dos actos processuais (Manuel de Andrade, Noções Elementares do Processo Civil, 1956,pag.156).
Estes desvios de carácter formal podem assumir, tendo em atenção o preceituado no art. 193 e seg. três tipos: prática de um acto proibido, omissão de um acto prescrito na lei, e, por último, realização de um acto imposto ou permitido por lei, mas sem o formalismo requerido (Antunes Varela, Manual, CPC, 1984, pag. 373).
Não concretizando, em que consistiu tal nulidade, não é possível proceder a tal apreciação.
Improcedem todas as nulidades arguidas pela apelante.
1.3 Nas contra-alegações foi pedida a condenação da apelante como litigante de má fé. A apelante nada disse, quando notificada.
A alegação que considera denegrir a sua imagem ao apontar como causa da sua renúncia à prática de lícitos na 3C, nada em concreto foi alegado e a apelada pretende pedir certidão para os fins tidos por convenientes. Aponta, por outro lado, para a sua pretensão as variadas posições assumidas nas alegações contrárias ao que consta nos autos, nomeadamente na prova dos factos, o gozo de férias em 2009.
A reforma do processo civil veio dar mais realce ao princípio geral da boa fé, autonomizando-o numa norma adjectiva, ao mesmo tempo que introduziu modificações no instituto da litigância da má fé, de modo a ampliar as situações censuráveis.
Assim, se antes da reforma era corrente o entendimento segundo o qual apenas eram passíveis de sancionamento comportamentos ou omissões imputáveis a título de dolo ao menos eventual, aquela passou a prever expressamente a aplicação das sanções da litigância de má fé a actuações caracterizadas pela negligência grave ou grosseira (cf. Abrantes Geraldes, in Temas de Reforma do Processo Civil, II, pags.340 a 342).
Entre outras situações, a lei qualificou como litigante de má fé todo aquele que deduza pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não podia ignorar; tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa ou que fizer do processo ou dos meios processuais uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão, desde que esses comportamentos sejam imputáveis a título de dolo ou de negligência grave.
Para que se consubstancie litigância de má fé, a conduta processual da parte terá de ser qualificável como grave em termos de censurabilidade, o que reclamará sempre uma objectivação ou tradução em factos que não uma simples convicção íntima do julgador.
No caso dos autos, tendo em conta toda a factualidade apurada e tentando surpreender na actuação da apelante um comportamento susceptível de integrar uma das situações supra referidas, não a encontramos.
A falta de razão não é sinónimo de má fé, a não ser quando se demonstra a consciência dessa falta, como também não o é a adopção de condutas parciais em relação à substância do litígio, se estas não se traduzirem em atitudes parciais incorrectas, nos termos do art. 456° do CPC.
Importa ter presente que a sustentação de posições jurídicas, porventura desconformes com a correcta interpretação da lei, não implica, em regra, por si só, a litigância de má fé na espécie de lide dolosa ou de lide temerária.
Não há um claro limite, no que concerne à interpretação da lei e na sua aplicação aos factos, entre o que é razoável e o que é absolutamente inverosímil ou desrazoável, certo que, pela própria natureza das coisas, a certeza jurídica é meramente tendencial.
Improcede a condenação como litigante de má fé da apelante.
Concluindo
1. Matérias como a das remunerações: em regra, a fixação destas é feita por deliberação dos sócios (art. 192/5,255/1e 399/1).
2. A fixação de remuneração compete à assembleia-geral ou a uma comissão por ela nomeada, tendo em conta as funções desempenhadas e a situação económica da sociedade (art. 399/1).
3. – A sanção de nulidade apenas se aplica quando houver uma omissão total de fundamentação de facto ou de direito, e não se preenche com uma fundamentação meramente deficiente ou incompleta. Neste último caso, haverá apenas uma decisão menos feliz, que afecta o seu valor doutrinal, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas tal deficiência não produz a nulidade da mesma
4. A sustentação de posições jurídicas, porventura desconformes com a correcta interpretação da lei, não implica, em regra, por si só, a litigância de má fé na espécie de lide dolosa ou de lide temerária.

III- Decisão: em face do exposto, julga-se improcedente a apelação, mantendo-se a decisão impugnada.
Custas pela apelante da apelação

Lisboa, 3 de Fevereiro de 2012

Maria Catarina Manso
Maria Alexandrina Branquinho
Ana Luísa Geraldes