Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
221/10.8TTBRR.L1-4
Relator: JOSÉ EDUARDO SAPATEIRO
Descritores: MOBILIDADE GEOGRÁFICA
LIQUIDAÇÃO EM EXECUÇÃO DE SENTENÇA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/25/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA A DECISÃO
Sumário: I – O Autor, ao radicar o seu pedido, supervenientemente, na Regulamentação Colectiva Aplicável necessitava de alegar factos que, relativamente aos trabalhadores que representa e patrocina, justificassem, de pleno direito, a aplicação ao pleito dos autos do Acordo de Empresa que referiu.
II – O número 1 do artigo 315.º do Código do Trabalho de 2003 consente um quadro muito restrito de alterações convencionais ou contratuais ao seu regime regra, quando estão em causa transferências colectivas de local de trabalho por mudança de estabelecimento.
III – O carácter imperativo dos números 4 e 5 do artigo 315.º do Código do Trabalho de 2003 fere de nulidade, nos termos do artigo 14.º da Lei n.º 99/2003, de 27/08, as disposições constantes de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho que disponham de modo contrário ao aí estipulado e não tenham sido alteradas no prazo de 12 meses a partir da entrada em vigor daquele diploma.
IV – Em casos de mudança colectiva de local de trabalho, têm-se como ilegítimas, porque abusivas, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 334.º do Código Civil, as regras da regulamentação colectiva que exijam a não mudança de local de trabalho para lugar que diste mais de 2 km da residência permanente do empregado, a obrigatoriedade de abertura de novo estabelecimento dentro da mesma localidade ou a exigência de prévio acordo escrito por parte dos trabalhadores transferidos.
V – A noção de “despesas”, conforme enunciada no número 5 do artigo 315.º, não se traduz no pagamento da remuneração correspondente ao tempo a mais dispendido em deslocações.
VI – As formas de compensação directa e indirecta, fornecidas ou custeadas pela Ré, e traduzidas, em síntese, em transporte gratuito para os trabalhadores e seus familiares, nos seus próprios autocarros ou noutros, constituem um cumprimento legítimo e suficiente do número 5 do artigo 315.º do Código do Trabalho.
VII – O instituto da liquidação de sentença é complementar da acção declarativa e respectiva sentença condenatória, visando fixar ou definir o objecto ou a quantidade devida, quando não haja elementos para o fazer no momento da condenação na correspondente pretensão, já aí determinada, qualitativa e juridicamente, não se podendo discutir no âmbito desse incidente, de novo e com idêntica amplitude, matéria essencial e constitutiva dos direitos a liquidar.
VIII – Não tendo o Autor logrado provar factos essenciais e constitutivos do seu direito, tal cenário processual não pode ser meramente reconduzido ao regime constante do artigo 661.º, número 2 do Código de Processo Civil, antes implicando a absolvição da Ré.
(Elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:ACORDAM NESTE TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:

I – RELATÓRIO

STRUP – SINDICATO DOS TRABALHADORES DE TRANSPORTES RODOVIÁRIOS E URBANOS DE PORTUGAL, pessoa colectiva n.º ..., com sede na Av. António José de Almeida, 22, 1049-009 Lisboa, veio instaurar, em 12/04/2010, a presente acção declarativa de condenação com processo comum laboral contra TST - TRANSPORTES SUL DO TEJO, SA, NIF ..., com sede na Rua Marcos Portugal n.º 10, Laranjeiro, 2810-260 Almada, pedindo, em síntese e a título principal, a condenação da Ré a pagar aos trabalhadores identificados na Petição Inicial, em representação e substituição dos quais, ao abrigo do artigo 5.º, número 2, do Código do Processo do Trabalho, o Sindicato propôs a presente acção, o acréscimo de custos decorrentes das deslocações para o novo local de trabalho, nos termos do disposto no art.º 194.º, n.º 4, do Código do Trabalho, no valor semanal de € 30,60, a cada trabalhador residente nas áreas do Barreiro e de Alcochete, e no valor semanal de € 15,30, a cada trabalhador residente na área do Montijo.
Como pedido subsidiário, requereu a condenação da Ré a pagar aos referidos trabalhadores o valor das despesas efectivamente suportadas com transportes públicos ou utilização de viatura própria, na inexistência daqueles, em quantia a liquidar em execução de sentença.
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Para tal alega, em síntese, que os trabalhadores por si representados e devidamente identificados nos autos, trabalhadores da Ré, prestavam serviço para a Ré nas suas instalações, uns nas do Barreiro e outros nas do Montijo, passando a desempenhá-las, todos eles, posteriormente, por ordens da Ré., numas novas instalações da Ré sitas no sítio da Broega, concelho da Moita, o que lhes causou prejuízos.
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Foi agendada data para a realização da Audiência de partes, tendo a Ré sido citada para o efeito, por carta registada com Aviso de Recepção, como resulta de fls. 44.
Mostrando-se inviável a conciliação das partes, foi a Ré notificada para, no prazo e sob a cominação legal contestar, o que a Ré fez, em tempo devido, e nos termos constantes de fls. 63 e seguintes alegando, em síntese, que a Ré fornece gratuitamente aos trabalhadores o passe para se deslocarem nas suas carreiras e tem-nas organizadas de modo a assegurar o transporte de todos eles de e para o local de trabalho. Com tais fundamentos, requereu a sua absolvição.
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Foi proferido despacho no qual foi dispensada a elaboração do despacho que fixa a matéria de facto assente e a base instrutória.
Procedeu-se ao julgamento com observância de todas as formalidades legais, como resulta das respectivas actas (Fls. 117 a 121 e 190 a 194).
A matéria de facto foi decidida por despacho proferido a fls. 195 a 198 que não suscitou quaisquer reparos pelas partes presentes (cf. fls. 199 e 200) mas que veio a ser rectificado nos termos do despacho judicial de fls. 201 e 202.
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Foi então proferida a fls. 203 a 214 e com data de 29/06/2011, sentença que, em síntese, decidiu o litígio nos termos seguintes:
“Nestes termos, julgo a presente acção procedente e, em consequência, condeno a Ré TST – TRANSPORTES SUL DO TEJO, S.A. a pagar aos seus trabalhadores AA, BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, II, JJ, KK, LL, MM, NN, OO, PP, QQ, RR, SS, TT, UU, VV e XX, como tempo de trabalho, a diferença entre o tempo que utilizavam desde e para a sua residência, até e desde o seu local de trabalho, antes da alteração do estabelecimento da Ré para a localidade da Broega, e o tempo necessário para se deslocarem desde e para a sua residência, para e desde o estabelecimento da Ré sito na localidade da Broega, contado desde 9 de Setembro de 2007, a liquidar em execução de sentença.
Valor da acção: € 14.273,20 (catorze mil duzentos e setenta e três euros e vinte cêntimos).
Custas a cargo da Ré.
Registe e notifique.”
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A Ré TST - TRANSPORTES SUL DO TEJO, SA, inconformada com tal sentença, veio, a fls. 219 e seguintes, interpor recurso da mesma, que foi admitido a fls. 287 dos autos, como de Apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo, atenta a prestação de caução por parte da recorrente.
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A Apelante apresentou, a fls. 220 e seguintes, alegações de recurso e formulou as seguintes conclusões, que só pecam pela sua excessiva extensão:
(…)
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O Autor apresentou contra-alegações dentro do prazo legal, na sequência da respectiva notificação, tendo, muito embora sem apresentar formalmente conclusões, se limitar a sustentar o seguinte:
(…)
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O ilustre magistrado do Ministério Público deu parecer no sentido da improcedência do recurso de Apelação.
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Tendo os autos ido aos vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – OS FACTOS

1. - O Sindicato, ora Autor, é uma associação sindical constituída pelos trabalhadores nele filiados que exercem a sua actividade profissional no sector de transportes rodoviários e urbanos, com sede em Setúbal e com o âmbito geográfico correspondente aos distritos de Beja, Évora, Faro, Portalegre e Setúbal, conforme se alcança dos artigos 1.º, 2.º e 3.º dos respectivos estatutos, publicados a fls. 3785 a 3802, do BTE, 1.º Série, n.º 32, de 29/08/2006. (art.º 1.º da petição inicial)
2.º - A Ré é uma sociedade anónima que se dedica à actividade de transportes colectivo de passageiros, o que faz de forma regular e habitual e com fim lucrativo. (art.º 2.º da petição inicial)
3.º - O Autor representa e substitui, nos termos e com o alcance previsto no artigo 5.º, n.º 2 do Código do Processo do Trabalho, os trabalhadores a seguir identificados:
A) AA, divorciado, motorista, (…), residente na Baixa da Jardia, (…), 2870 Montijo;
B) BB, casado, motorista, (…), residente (…), 2890-152 Alcochete;
C) CC, casado, motorista, (…), residente (…), 2870-289 Montijo;
D) DD, casado, motorista, (…), residente (…), 2890-064 Alcochete;
E) EE, casado, motorista, (…), residente (…), 2870-020 Montijo;
F) FF, casado, motorista, (…), residente (…), 2890-103 Alcochete;
G) GG, casado, motorista, (…), residente (…), 2870-414 Montijo;
H) HH, casado, motorista, (…), residente (…), 2870-867 Montijo;
I) II, casado, motorista, (…), residente (…), 2890-212 Montijo;
J) JJ, casado, motorista, (…), residente (…), 2870-507 Lançada – Montijo;
K) KK, casado, motorista, (…), residente (…), 2830-072 Barreiro;
L) LL, casada, motorista, (…), residente (…), 2830-072 Barreiro;
M) MM, solteiro, motorista, (…), residente (…), 2830-120 Barreiro;
N) NN, solteiro, motorista, residente (…), 2830-090 Barreiro;
O) OO, casado, mecânico, (…), residente (…), 2965 Lagameças - Poceirão;
P) PP, casado, Operador estaciona de serviço, casado, (…), residente (…), 2830-445 Palhais – Barreiro;
Q) QQ, casado, Lubrificador, (…), residente (…), 2955-190 Pinhal Novo;
R) RR, casado, mecânico, (…), residente (…), 2870 Montijo;
S) SS, divorciado, mecânico, residente (…), 2871 Baixa da Banheira;
T) TT, casado, electricista, (…), residente (…), 2870 Montijo;
U) UU; solteiro, mecânico, (…), residente (…), 2985-202 Pegões;
V) VV, solteiro, mecânico, (…), residente (…), 2860-045 Alhos Vedros;
W) XX, casado, motorista, (…), residente (…), Montijo. (art.º 3.º da petição inicial)
4.º - Todos os trabalhadores acima referidos subscreveram, individualmente, uma declaração, de conteúdo igual, que diz, designadamente «declaro que autorizo o meu referido Sindicato, em minha representação e substituição, a exercer o direito de acção contra a minha Entidade Empregadora – T.S.T. – Transportes Sul do Tejo, S.A., no sentido de ser exigida a esta os meus direitos decorrentes da transferência para as novas instalações da Moita (Broega) designadamente no que respeita ao agravamento dos tempos de serviço e transportes de e para o local de início e finalização dos serviços.» (art.º 4.º da petição inicial)
5.º - Todos os trabalhadores se encontram ao serviço da Ré, ao abrigo de contrato individual de trabalho por tempo indeterminado, prestando a respectiva actividade no sector de Montijo e Barreiro. (art.º 5.º da petição inicial)
6.º - As instalações da Ré desde que os Autores iniciaram a sua actividade por conta desta, situavam-se no Barreiro e no Montijo, locais onde os Autores iniciavam a respectiva prestação de trabalho. (art.º 6.º da petição inicial)
7.º - No dia 9 de Setembro de 2007, a Ré transferiu, por sua iniciativa e no seu interesse, definitivamente, as anteriores instalações do Montijo e do Barreiro para o concelho da Moita, sítio de Broega. (art.º 7.º da petição inicial)
8.º - Alguns trabalhadores não têm transportes de ligação coincidentes com o seu horário de trabalho. (art.º 9.º da petição inicial)
9.º - Alguns trabalhadores, para além de terem de sair de casa mais cedo para iniciarem o trabalho na hora estipulado, chegam igualmente mais tarde, no regresso, com a consequente redução do tempo de descanso e de integração no seio familiar. (art.º 10.º da petição inicial)
10.º - Alguns trabalhadores, para obviar às consequências dos factos descritos em 9.º e 10.º, optam por utilizar viatura própria, o que lhes acarreta custos acrescidos. (art.º 11.º da petição inicial)
11.º - A Ré não está a custear quaisquer despesas daí decorrentes, pelo que a Autoridade para as Condições do Trabalho, instaurou processo de contra-ordenação. (art.º 13.º da petição inicial)
12.º - Os trabalhadores supra identificados têm um horário de trabalho com a duração semanal de 40 horas, distribuídos por cinco dias de cada semana, o qual se mantém após a transferência do local de trabalho. (art.º 14.º da petição inicial)
13.º - A deslocação entre o Barreiro e o sítio da Broega demora cerca de 45 minutos. (art.º 15.º da petição inicial)
14.º - A deslocação entre o Montijo e o sítio da Broega demora cerca de 15 minutos. (art.º 16.º da petição inicial)
15.º - A Ré paga aos seus trabalhadores nos termos dos valores constantes dos documentos de fls. 87 a 90, os quais se dão aqui por integralmente reproduzidos. (art.º 17.º da petição inicial)
16.º - A Ré em 9 de Setembro de 2007, concretizou a transferência para as novas instalações da Moita, substituindo as existentes no Barreiro e no Montijo, possibilitando concentrar numa única infra-estrutura as áreas operacionais, de manutenção e administrativa. (art.º 3.º da contestação)
17.º - A Ré entendeu que «(….) as infra-estruturas do Barreiro e do Montijo não apresentavam condições adequadas de funcionamento pelas mais diversas razões, como sejam, parqueamento, abastecimento, acesso, intervenção em viaturas articuladas, condições de trabalho, espaço, etc.». (art.º 4.º da contestação)
18.º - Este processo foi comunicado oficialmente aos colaboradores da TST em 23 de Julho de 2007. (art.º 5.º da contestação)
19.º - Do teor dessa missiva resulta uma explanação elaborada pelo Conselho de Administração onde se informaram todos os trabalhadores que a Ré conseguiu «(…) encontrar um terreno, localizado no coração da rede do Sector, que permitiu construir de raiz uma infra-estrutura mais funcional que trará benefícios a todos os trabalhadores do Sector, nomeadamente no que respeita à melhoria das condições gerais de trabalho» (art.º 6.º da contestação)
20.º - Do teor dessa carta resulta desde logo uma informação aos trabalhadores visados que «O transporte de pessoal para as novas instalações está devidamente assegurado, quer do Montijo, quer do Barreiro, através da carreira 410 que tem uma frequência de 20 em 20 minutos, sendo que para os primeiros e últimos serviços serão criadas circulações específicas para o transporte de pessoal.». (art.º 7.º da contestação)
21.º - Em 17.09.2009, a Direcção de Recurso Humanos, nomeadamente, a Dr.ª ZZ, enviou um fax para o STRUP, ora Autor, dando conhecimento a este Sindicato da Comunicação Interna que a empresa dirigiu a todos os trabalhadores, da qual resulta nomeadamente o seguinte: «( …) Assim, e no respeita ao pessoal oficinal e dos escritórios o acesso às novas instalações é assegurado através da carreira 410 que, aos dias úteis, nos períodos horários de entrada e saída de serviço, tem uma frequência de 20 minutos. Quanto aos motoristas, as chapas de serviço estão organizadas de modo a que todos tenham necessidade de se deslocar de e para as novas instalações tenham garantia de transporte fornecido pela Empresa, ou através da já referida carreira 410, ou através de transporte de pessoal em períodos horários não abrangidos pela carreira, ou ainda por aproveitamento de vazios que ocorram de e para a Moita. Por outro lado, é garantida a inclusão, em todas as chapas de serviço em que se aplique, do tempo de percurso em vazio necessário para levar a viatura da Moita até ao início do serviço, ou do regresso à Moita, após o final do serviço.». (art.º 8.º da contestação)
22.º - Em 25 de Setembro de 2007, a Ré enviou para STRUP um fax, justificando que a (…) «empresa no processo de transferência ia cumprir a lei e o AE, (…) garantindo transporte a todos os trabalhadores e considerava como tempo de trabalho o período estimado como adequado para a deslocação em vazio e/ou para as instalações da Moita (…)». (art.º 9.º da contestação)
23.º - Em 4 de Outubro de 2007, a Ré enviou nova carta a todos os colaboradores a informar que já se encontravam em funcionamento as novas instalações da Moita «(…) Estas novas instalações representaram, um investimento de cerca de 2 milhões de euros, esforço financeiro que se mostra compensado pela melhoria significativa das condições de trabalho e da imagem da empresa na sua área de actuação. (…) foram ainda contemplados um conjunto de equipamentos, amigos do ambiente, que irão permitir o reaproveitamento da quase totalidade da água consumida nas lavagens das viaturas, assim como, o aproveitamento da energia solar para aquecimento de águas. (…) Em todo este processo, a Administração cumpriu e cumprirá escrupulosamente as suas obrigações que decorrem do disposto na Lei e no AE em vigor na Empresa. Efectivamente, encontram-se garantidos, para todo os trabalhadores, transporte gratuito de e para as novas instalações, estando ainda incluídas nas respectivas chapas de serviço, e como tal considerados tempo de trabalho, os períodos de tempo que os motoristas despendem nas deslocações em vazio de e/ou para as novas instalações da Moita.» (art.º 10.º da contestação)
24.º - A Ré fez operar a mudança das instalações antigas, sitas no Barreiro e no Montijo, por se encontrarem desadequadas às necessidades dos serviços, por isso, comprou um novo espaço onde construiu de raiz uma nova unidade oficinal e administrativa sita na Rua das Giestas, lugar da Broega na Moita. (art.º 11.º da contestação)
25.º - A Ré desde a mudança dos referidos estabelecimentos do Barreiro e do Montijo para a Moita que assegura todas as despesas com as deslocações dos trabalhadores, pois que, dispõe de diversas viaturas pesadas de passageiros que circulam nas mais variadas horas do dia e da noite e transportam os trabalhadores do Montijo para e Barreiro para a Moita e vice-versa. (art.º 14.º da contestação)
26.º - O transporte dos trabalhadores está assegurado, quer do Montijo, quer do Barreiro, através da carreira 410, a qual tinha uma frequência de 20 em 20 minutos e, desde o início do ano de 2011, tem uma frequência de 30 em 30 minutos, isto até cerca das 20h30m, passando então a uma frequência de 45 em 45 minutos, sendo que para os primeiros turnos foram criadas circulações específicas para o transporte de pessoal. (art.º 15.º da contestação)
27.º - Quanto aos motoristas, foi assegurado que as chapas de serviço estão organizadas de modo a que todos os que necessitem de se deslocar de e para as novas instalações, tenham garantia de transporte fornecido pela empresa, ou através da carreira 410, ou através de transporte pessoal em períodos horários não abrangidos pela carreira, ou ainda por aproveitamento de “vazios” que ocorram de e para a Moita. (art.º 16.º da contestação)
28.º - Foi garantida a inclusão em todas as chapas de serviço em que se aplique, do tempo de percurso em vazio necessário para levar a viatura da Moita até ao início do serviço, ou do regresso à Moita, após o final do serviço. (art.º 17.º da contestação)
29.º - A TST fornece mensalmente o passe social a todos os seus trabalhadores e familiares direitos (mulheres /maridos e filhos), pelo que, o transporte público é gratuito para todos os trabalhadores da TST. (art.º 18.º da contestação)
30.º - A retribuição base ilíquida mensal difere consoante a categoria profissional dos trabalhadores visados, ou seja, um motorista tem uma retribuição base ilíquida diferente do lubrificador, do mecânico, etc. (art.º 25.º da contestação)
31.º - Assim, a título meramente exemplificativo, em Fevereiro de 2010, um motorista auferiu, EUR. 601.79, um operador da estação de serviço 2 recebeu EUR. 592,84, um electricista oficial principal recebeu a quantia de EUR. 674,85, um mecânico auto recebeu EUR. 640,23. (art.º 26.º da contestação)
32.º - Na sequência da resposta apresentada pela Ré em 2008.11.10, a ACT – Autoridade para as Condições de Trabalho do Barreiro, na data da contestação, ainda não se havia pronunciado, tendo-se entretanto pronunciado nos termos da decisão que consta de fls. 180 a 189 dos autos, não transitada em julgado, a qual se dá aqui por integralmente reproduzida. (art.º 31.º da contestação)

Factos não provados:

Da Decisão sobre a matéria de facto pode ler-se:
Petição Inicial - fls. 4 a 11
(…)
Artigos 8.º, 12.º e 18.º até final: Não se responde porque irrelevantes, repetitivos, conclusivos e/ou matéria de Direito.
Contestação - fls. 65 a 75
(…)
Artigos 1.º, 2.º, 12.º, 13.º, 19.º a 24.º, 27.º a 30.º e 32.º: Não se responde porque impugnação, irrelevantes, repetitivos, conclusivos e/ou matéria de Direito.”

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III – OS FACTOS E O DIREITO

É pelas conclusões do recurso que se delimita o seu âmbito de cognição, nos termos do disposto nos artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e 685.º-A e 684.º n.º 3, ambos do Código de Processo Civil, salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 660.º n.º 2 do Código de Processo Civil).
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A – REGIME ADJECTIVO E SUBSTANTIVO APLICÁVEIS

Importa, antes de mais, definir o regime processual aplicável aos presentes autos, atendendo à circunstância da presente acção ter dado entrada em tribunal em 12/04/2010, ou seja, depois da entrada em vigor das alterações introduzidas no Código do Processo do Trabalho pelo Decreto-Lei n.º 295/2009, de 13/10, que segundo o seu artigo 6.º, só se aplicam às acções que se iniciem após a sua entrada em vigor, tendo tal acontecido, de acordo com o artigo 9.º do mesmo diploma legal, somente em 1/01/2010.
Esta acção, para efeitos de aplicação supletiva do regime adjectivo comum, foi instaurada depois da entrada em vigor (que ocorreu no dia 1/1/2008) das alterações introduzidas no Código de Processo Civil pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24/08, e que só se aplicaram aos processos instaurados a partir de 01/1/2008 (artigos 12.º e 11.º do aludido diploma legal) bem como depois da produção de efeitos das mais recentes alterações trazidas a público pelo Decreto-Lei n.º 226/2008, de 20/11 e parcialmente em vigor desde 31/03/2009, com algumas excepções que não tem relevância na economia dos presentes autos (artigos 22.º e 23.º desse texto legal) – cf., quanto ao complexo regime decorrente das normas de direito transitório constantes do último diploma legal indicado, Eduardo Paiva e Helena Cabrita, “O processo executivo e o agente de execução”, 2.ª Edição, Abril de 2010, Edição conjunta de Wolsters Kluwer Portugal e Coimbra Editora, páginas 19 e seguintes -, mas esse regime, centrado, essencialmente, na acção executiva, pouca ou nenhuma relevância tem para a economia deste processo judicial.
Será, portanto, de acordo com o regime legal decorrente do actual Código do Processo do Trabalho e da reforma do processo civil de 2007 e dos diplomas entretanto publicados e com produção de efeitos até ao dia da instauração dos presentes autos, que iremos apreciar as diversas questões suscitadas neste recurso de apelação.
Também se irá considerar, em termos de custas devidas no processo, o Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26/02, rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 22/2008, de 24 de Abril e alterado pelas Lei n.º 43/2008, de 27-08, Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28-08, Lei n.º 64-A/2008, de 31-12 e Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, que entrou em vigor no dia 20 de Abril de 2009 e aplica-se a processos instaurados após essa data.
Importa, finalmente, atentar na circunstância de os factos que se discutem no quadro destes autos terem ocorrido, quer na vigência do Código do Trabalho de 2003, quer na do actual Código do Trabalho de 2009, que entrou em vigor em 17/02/2009, sendo, portanto, em função da factualidade analisada e do regime aplicável à mesma que iremos abordar juridicamente as questões suscitadas neste recurso de Apelação (sem prejuízo da questão da regulamentação colectiva de trabalho aplicável poder ter de ser equacionada juridicamente à luz da legislação anterior ao Código do Trabalho de 2003).

B – NULIDADE DE SENTENÇA

A Apelante TST – TRANSPORTES SUL DO TEJO, SA, logo após o requerimento de interposição de recurso de fls. 220 e em termos formal e materialmente autónomos, com referência às alegações de recurso propriamente ditas (fls. 223 e seguintes - muito embora aludindo a tal nulidade nas conclusões da Apelação) suscita a nulidade da sentença recorrida que se mostra vertida no número 1, alínea c) do Código de Processo Civil (““É nula a sentença: c) Quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão.”) estipulando ainda o artigo 659.º, número 2, desse mesmo diploma legal, a propósito da estrutura da sentença, que “…seguem-se os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes concluindo pela decisão final”.
A recorrente justifica a invocação desta nulidade da sentença nos seguintes moldes:
“1. Resulta da sentença ora em crise, que foi decidido condenar a R. no pagamento de quantias, a liquidar em execução de sentença.
2. Com o devido respeito por opinião contrária, afigura-se à Ré que só nos casos em que, no momento da formulação do pedido ou da prolação da sentença, não haja elementos para fixar o objecto ou a quantidade do pedido, pode aplicar-se a norma do n.º 2 do art. 661.º do CPC, ou seja, relegar-se para ulterior liquidação o apuramento do crédito.
3. A remissão para ulterior liquidação não pode fazer-se em razão da falta de prova de factos, mas tão-somente por inexistência de factos provados, por estes não serem conhecidos ou por estarem em evolução no momento em que foi instaurada a acção ou na data em que foi proferida a decisão que dirimiu a matéria de facto controvertida.
4. Repare-se que o referido preceito refere como fundamento para o non liquet quantitativo, apenas a “falta de elementos”, e não a falta de prova de elementos, pelo que afigura-se correcto o entendimento jurisprudencial, que só deve relegar-se o apuramento do crédito ou do quantitativo da condenação para liquidação de sentença, quando estivermos perante uma falta de elementos de facto a provar e não quando estivermos perante o fracasso da prova produzida sobre esses factos.
5. De modo algum se poderá considerar que a ratio legis do art. 661.º, n.º 2 do CPC permita defender teleologicamente uma repetição da realização da instância probatória quanto a factos já produzidos e conhecidos à data da propositura da acção. O incidente de liquidação de sentença não admite a renovação da prova que não se logrou produzir naquela sede.
6. Não é legítimo, por isso, o recurso a tal figura quando o quantum se não determinou devido ao fracasso da prova (Cfr. Ac. da RP de 12/6/00, in www.dgsi.pt.).
7. Consentir-se o apuramento do crédito em incidente de liquidação de sentença, por fracasso da prova produzida na acção declarativa, quando todos os elementos de facto constitutivos do direito já se tinham verificado e eram conhecidos do autor, no momento da propositura da acção, seria o mesmo que conceder-lhe uma segunda oportunidade para alegar e provar os factos que não conseguiu provar na fase declarativa da acção, com total desrespeito pelos princípios gerais da repartição do ónus da prova, bem como das regras que estabelecem as diferentes fases processuais e os objectivos de cada uma dessas fases (vide, neste sentido, Acs. do STJ, de 17/1/95, BMJ 443º, 395; de 13/1/00, Sumários, 37º-34; de 24/2/00, Sumários, 38º-45.)
8. O legislador ciente disso, teve o cuidado de estabelecer, no art. 75.º do Código de Processo de Trabalho (CPT), que “sempre que a acção tenha por objecto o cumprimento de obrigação pecuniária, o juiz deve orientá-la por forma a que a sentença, quando for condenatória, possa fixar em quantia certa a importância devida.
9. Atento quanto antecede, conclui-se que a sentença se afigura nula, nos termos do artigo 668.º, nº 1 alínea c) do Código de Processo Civil.”
Os Autores, nas suas contra-alegações, vêm sustentar o incumprimento por parte da recorrente da norma especial contida no artigo 77.º, número 1, do Código do Processo do Trabalho, o que constitui fundamento para o não conhecimento por parte deste Tribunal da Relação de Lisboa da nulidade em questão.
Impõe-se, desde logo e antes de mais, atentar nessa regra especial, de índole formal, que, no quadro do direito processual laboralista, vigora nesta matéria e que se acha contida no número 1 do artigo 77.º do Código de Processo de Trabalho:

Artigo 77.º
Arguição de nulidades da sentença
1 – A arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso.
2 – (…)

Ora, compulsando a peça processual que suporta as alegações de recurso, verifica-se que a Ré deu claro e óbvio cumprimento nos autos a tal dispositivo legal, pois veio suscitar, com autonomia formal e substantiva, a nulidade de sentença em análise, o que legitima processualmente a sua apreciação por este tribunal de recurso.
Entrando na análise da nulidade invocada, convirá ouvir Fernando Amâncio Ferreira, em “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 6.ª Edição, Almedina, páginas 53 e 54, quando afirma o seguinte: “Na alínea c) do número 1 do artigo 668.º, a lei refere-se à contradição real entre os fundamentos e a decisão: a construção da sentença é viciosa, uma vez que os fundamentos referidos pelo juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente. Diversa desta situação, por não respeitar a um vício lógico na construção da sentença, mas a uma contradição aparente é a que deriva de simples erro material, quer na fundamentação, quer na decisão, que se elimina por simples despacho, de harmonia com o disposto no artigo 667.º
(…) Registe-se que a oposição entre os fundamentos e a decisão não se reconduz a uma errada subsunção dos factos à norma jurídica nem, tão-pouco, a uma errada interpretação dela. Situações destas configuram-se como erro de julgamento”.
Ainda a respeito da irregularidade contemplada no artigo 668.º, número 1, alínea c) do Código de Processo Civil, Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora no seu “Manual de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1984, págs. 668 a 671, afirmam o seguinte:
“A segunda categoria de deficiências da sentença, que podem determinar a intervenção do juiz depois de ela ter sido proferida, é a das nulidades da decisão.
Da enumeração taxativa das causas de nulidade sujeitas, aliás em termos muito limitados, ao processo de rectificação regulado no artigo 670.º, duas conclusões ressaltam imediatamente:
a) A de que não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário, ao contrário do que sucedia no Código de 1876 (art. 1159.º, & 2.º); (…)
A lei refere-se, na alínea c) do n.º 1 do artigo 668.º, à contradição real entre os fundamentos e a decisão e não às hipóteses de contradição aparente, resultantes de simples erro material, seja na fundamentação, seja na decisão. Neste caso, efectuada por despacho a correcção adequada, nos termos do artigo 667.º, a contradição fica eliminada.
Nos casos abrangidos pelo artigo 668.º, número 1, alínea c), há um vício real no raciocínio do julgador (e não um simples lapsus calami do autor da sentença): a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente”.
Como ensina o Prof. Alberto dos Reis, em “Código de Processo Civil Anotado”, volume V, Coimbra Editora, 1981, página 141, tal nulidade da alínea c) do artigo 668.º, número 1 do Código de Processo Civil ocorre quando «(…) a sentença enferma de vício lógico que a compromete (…), quando a construção da sentença é viciosa, pois os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas ao resultado oposto (…)».
Por seu turno, José Lebre de Freitas, em “Código de Processo Civil Anotado”, volume 2.º, Coimbra Editora, pág. 670, diz que «(…) entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade. A oposição entre os fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na contradição entre o pedido e a causa de pedir, geradora da ineptidão da petição inicial (…)».
Tendo em atenção a doutrina expressa nos excertos acima transcritos e com a qual concordamos, é manifesto que não nos achamos perante um caso de oposição ou contradição manifesta entre a fundamentação e a decisão tomada (pode-se achar que a sentença em questão extraiu consequências jurídicas não consentidas pela realidade factual e jurídica existente, mas toda ela se mostra, lógica e claramente, encaminhada no sentido nela propugnado).
Logo, por as questões suscitadas não configurarem, verdadeiramente, a nulidade de sentença arguida pela Ré nas suas alegações e prevista no artigo 668.º, número 1, alínea c) do Código de Processo Civil, vai a mesma indeferida, tendo, nesta parte (nulidade da sentença), o presente recurso de apelação de improceder.

C – DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO

Realce-se que a Recorrente não impugnou a decisão sobre a matéria de facto, nos termos e para os efeitos dos artigos 80.º do Código do Processo do Trabalho e 690.º-A e 712.º do Código de Processo Civil, não tendo, por seu turno, os recorridos requerido a ampliação subordinada do recurso nos termos dos artigos 81.º do Código do Processo do Trabalho e 684.º-A do segundo diploma legal referenciado, o que implica que, sem prejuízo dos poderes oficiosos que são conferidos a este Tribunal da Relação pelo artigo 712.º do Código de Processo Civil, temos de encarar a atitude processual das partes como de aceitação e conformação com os factos dados como assentes pelo tribunal da 1.ª instância.

D – OBJECTO DO RECURSO

Uma questão prévia se coloca relativamente ao objecto ou âmbito do presente recurso de Apelação, atendendo a que o Autor, em representação dos trabalhadores nele filiados, formulou um pedido principal e um pedido subsidiário, tendo o tribunal da 1.ª instância se pronunciado unicamente sobre o primeiro, o que, natural e logicamente, o dispensou de analisar e julgar o segundo.
Caso este tribunal de recurso considere procedente o recurso de Apelação interposto pela Ré, irá apreciar a causa de pedir e pretensão formuladas em segundo lugar, nos termos do disposto no artigo 715.º, números 2 e 3 do Código de Processo Civil, não nos encontrando nós perante a hipótese previstas no artigo 684.º-A, número 1, do mesmo diploma legal (decaimento por parte do Autor de um dos fundamentos da acção).
Tornou-se desnecessário dar cumprimento ao disposto no número 3 do artigo 715.º do Código de Processo Civil, dado as partes já se terem pronunciado nas suas alegações sobre tal problemática.

D1 – APLICAÇÃO DA REGULAMENTAÇÃO COLECTIVA CONSIDERADA PELA SENTENÇA

A Ré, nas suas conclusões, vem alegar o seguinte, acerca de tal matéria:
“2. Com efeito, nenhum dos AE em que se estriba a decisão revidenda se afiguram, antes de mais, aplicáveis ao caso sub judice, devendo o julgador ter tido antes o cuidado de averiguar se o quanto peticionado pelo sindicato Apelado, teria, ou não, fundamentação legal.
3. Com efeito, o AE celebrado entre a Rodoviária Nacional e a FESTRU, publicado no BTE n.º 45 de 08.12.1983, e invocado posteriormente pelo Apelado, só seria objecto de aplicação, caso se concluísse que os trabalhadores representados pelo sindicato ora Apelado tivessem todos eles sido trabalhadores da extinta Rodoviária Nacional e, por outro lado, o dito Sindicato fizesse parte da FESTRU.
4. A verdade é que nenhum dos dois requisitos supra referidos, resultaram dos autos alegados e muito menos verificados, mesmo que por via instrumental ou acessória, nem sequer se percepciona como o seu preenchimento poderá alguma vez ser relegado para um subsequente momento processual – a execução de sentença.
5. No que concerne ao AE outorgado com o SITRA, a que aderiu o Sindicato Nacional dos Motoristas, publicado no BTE, n.º 18, de 15.05.1992, levantar-se-á o mesmo problema, visto que o dito instrumento negocial apenas vinculará os trabalhadores representados por tal sindicato (SITRA), como se afigura até ser defendido pelo Apelado, atenta a circunstância de inexistir, tanto quanto se sabe, qualquer portaria de extensão ou a adesão do sindicato Apelado a tal AE”.
Importa realçar um aspecto que a Apelante já havia suscitado nos autos a fls. 123 a 125 e que foi desconsiderado pelo tribunal recorrido (Despacho de fls. 131, 1.ª parte), voltando a mesma a referi-lo, ainda que numa perspectiva algo diferente, que se prende com a divergência existente entre as partes no que respeita à Regulamentação Colectiva Aplicável ao litígio em análise.
Se lermos a petição inicial do Autor, verificamos que o mesmo radica, em termos de direito, a pretensão dos trabalhadores que representa e patrocina, no disposto no artigo 194.º, número 4, do Código do Processo do Trabalho de 2009, omitindo qualquer referência à Regulamentação Colectiva aplicável (posição que, aliás, reitera nas suas alegações de recurso), sendo a Ré a defender no artigo 2.º da sua contestação a vigência de dois Acordos Colectivos de Trabalho (“às relações contratuais entre Autor e Ré aplicam-se os BTE e as disposições de aplicação geral dos Acordos Colectivos de Trabalho celebrado entre a ANTROP e o SITRA e entre a ANTROP e a FESTRU, publicados, respectivamente, no BTE, 1.ª Série, n.º 20, de 29/05/1987, com as alterações publicadas nos BTE’s, 1.ª Série, n.ºs 20/1988, 20/1989, 19/1990, 15/1991, 20/1992, 21/1993, 20/1999 e 27/2001 e no BTE, 1.ª Série, n.º 8, de 29/02/1980, com as alterações publicadas nos BTE’s, 1.ª Série, n.ºs 14/1981, 14/1982, 14/1983, 10/1985, 15/1986, 15/1987, 23/1988, 15/1990 e 20/1999”) que o Sindicato Autor, no início da Audiência de Discussão e Julgamento e ao abrigo dos artigos 266.º, 266.º-A e 266.º-B do Código de Processo Civil, veio impugnar, alegando, em síntese, que ao invés daqueles Instrumentos de Regulamentação Colectiva indicados pela Ré, é o Acordo de Empresa (de que juntou cópia, tão somente, das Cláusulas 17.ª e 18.ª) publicado no BTE n.º 45, de 08/12/1983, com alterações publicadas nos BTE's n.ºs 12 de 29/93/1985 e 29/03/1986.
A Ré, na sequência de convite formulado nesse sentido pelo juiz do Tribunal do Trabalho do Barreiro, veio juntar a fls. 13 e seguintes um Acordo de Empresa celebrado entre ela e o SITRA – Sindicato dos Trabalhadores dos Transportes Rodoviários e Afins, publicado no BTE, 1.ª Série, n.º 18, de 15/05/1992 e alterações publicadas nos BTE's n.º 39, de 22/01/1995, n.º 2, de 15/01/1997, n.º 22, de 15/06/1999, n.º 23, de 22/06/2000, n.º 22, de 15/06/2001 e n.º 29, de 8/08/2002.
A sentença recorrida, no que concerne a tal matéria, decidiu o seguinte: “Desde logo, está em causa saber se é aplicável in casu, como alega o Autor, o A.E. celebrado entre a RN e a FESTRU, publicado no BTE n.º 45, de 8 de Dezembro de 1983 (fls. 101), ou, como defende a Ré, o A.E. outorgado com o SITRA, a que aderiu o Sindicato Nacional dos Motoristas, publicado no BTE n.º 18, de 15 de Maio de 1992 (fls. 133 e segs.).
A este propósito, diz-nos o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28 de Abril de 2010, processo 1773/04.7TTLSB.L1-4, www.dgsi.pt, que: “Conforme resulta do Dec.-Lei nº 12/90 de 6 de Janeiro de 1990, a Ré foi constituída em 31 de Janeiro de 1991, por cisão da Rodoviária Nacional, sucedendo nas relações laborais, quer de natureza individual, quer de natureza colectiva, existentes entre a mesma e os trabalhadores ligados aos estabelecimentos que lhe foram transmitidos, nos termos previstos no art.º 9.º do DL 519-C/79 de 29.12, que estabelecia: “em caso de cessão, total ou parcial, de uma empresa ou estabelecimento, a entidade patronal ficará obrigada a observar, até ao termo do respectivo prazo de vigência, o instrumento de regulamentação colectiva que vincula a entidade patronal cedente”.
Assim, conclui-se que será de aplicar o primeiro dos supra referidos A.E. aos trabalhadores que transitaram da RN e o segundo aos contratados posteriormente.
Desconhecemos qual a situação dos trabalhadores em causa nos presentes autos.
Chegados aqui e tendo em atenção o quadro fáctico e jurídico que se deixou exposto e a noção jurídica de causa de pedir (cf., entre outros, os artigos 28.º do Código do Processo do Trabalho e 264.º, 268.º, 272.º, 273.º, 467.º, 663.º e 664.º do Código de Processo Civil e, por todos, Manuel de Andrade, “Noções Elementares de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1976, página 111), facilmente se constata, por parte do Sindicato Autor, uma alteração, na sua vertente fáctica e jurídica, da causa de pedir (cf. os artigos 272.º, 273.º do Código de Processo Civil) em que fundou a sua pretensão, dado radicar a mesma unicamente no regime geral de natureza laboral (194.º, número 4, do Código do Processo do Trabalho de 2009), vindo depois, face à contestação da Ré, introduzir, de uma forma sub-reptícia e ilegítima, quer em termos formais – por o não ter feito através de um articulado superveniente (artigo 506.º do Código de Processo Civil) – como materiais, a Regulamentação Colectiva que em seu entender era aplicável.
O tribunal, na sequência do defendido pelo Autor, veio considerar que se estava face à mera invocação de uma fonte de direito (CTT), que pode ser referenciada e/ou junta em qualquer momento (logo, não encarou tal matéria como uma situação de alteração superveniente da causa de pedir, não se podendo falar, portanto, em caso julgado formal quanto a tal questão), mas não só tal fonte de direito não foi junta na íntegra como reclama mais do que o simples conhecimento da sua publicação, face ao estatuído nos artigos 1.º, número 1, 2.º, 3.º, 5.º, 7.º, 8.º, 9.º, 14.º e 27.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29/12 (normas em vigor à data de qualquer um dos instrumentos de regulamentação colectiva indicados pelas partes - cf., nos Código do Trabalho de 2003 e 2009, respectivamente, os artigos 531.º e seguintes e 476.º e seguintes e à consagração do princípio da liberdade, pluralidade e filiação sindical, sem esquecer as controversas normas transitórias constantes dos artigos 13.º, 14.º e 15.º da Lei n.º 99/2003, de 27/08 e 7.º e 10.º da Lei n.º 7/2009, de 12/02).
O Autor, ao procurar radicar também, em termos supervenientes, o seu pedido na Regulamentação Colectiva Aplicável necessitava de alegar factos que, relativamente aos trabalhadores que representa e patrocina, justificassem, de pleno direito e sem margem para dúvida, a aplicação do Acordo de Empresa que referiu ao pleito dos autos, o que não foi o caso, sendo manifestamente insuficiente a alegação que fez quanto a tais aspectos.
Este tribunal de recurso tentou perceber, por exemplo, a razão da aplicação do Acordo de Empresa entre a Ré e o SITRA a trabalhadores filiados no Sindicato Autor, criado em 2006, por fusão de vários sindicatos sectoriais, em termos geográficos (Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos do Centro - STTRUC; Sindicato dos Transportes Rodoviários do Distrito de Faro; Sindicato dos Trabalhadores dos Transportes Colectivos do Distrito de Lisboa - TUL; Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários do Sul; Sindicato dos Transportes Rodoviários do Distrito de Vila Real - cf. artigo 90.º, número1 dos respectivos Estatutos publicados no BTE n.º 32, de 30/08/2006), mas não conseguiu descortinar a ligação entre uns e outros, nem a existência de um qualquer Acordo de Adesão por parte do STRUP relativamente aquele AE, o mesmo se podendo dizer relativamente ao AE celebrado entre a RN e a FESTRU, pois embora o Apelado esteja inscrito na FESTRU, tal instrumento de regulamentação colectiva é muito anterior à sua constituição, ignorando-se quando e em que moldes os trabalhadores representados pelo Autor começaram a laborar para a Ré, desconhecendo-se, designadamente, se já prestavam anteriormente serviço para a Rodoviária Nacional (cf., a este propósito, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28/04/2010, processo n.º 1773/04.7TTLDB.L1-4, publicado em www.dgsi.pt).
Não se conhece, por outro lado, o processo de eventual sucessão da Ré na posição, ainda que parcial, da Rodoviária Nacional, fazendo a sentença impugnada, a este respeito, uma alusão indirecta ao Decreto-Lei n.º 12/90, de 6/01, que depois foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 47/91, de 24/01, mas, da consulta de tais diplomas, não ressalta, em concreto, quer a constituição da Ré por cisão da RN, quer o momento em que tal aconteceu, quer, finalmente, os termos, condições e circunstâncias em que a Apelante nasceu para o mundo do direito.
Não deixa de ser curioso assinalar, por outro lado, que a Recorrente também incorre numa manifesta contradição entre a alegação que faz no artigo 2.º da sua contestação e o Instrumento de Regulamentação Colectiva que acaba por apresentar nos autos (fls. 133 e seguintes), o que mais faz realçar não só as divergências como as dúvidas existentes quanto ao instrumento contratual de índole colectiva que é concretamente aplicável às múltiplas relações laborais de cariz individual que integram a aludida causa de pedir.
Temos para nós, portanto, que o tribunal recorrido não estava em condições, quer adjectivas - por omissão da via processual própria -, como substantivas, por insuficiência de factos tendentes a permitir-lhe a opção por um ou mais instrumentos de Regulamentação Colectiva em detrimentos de outros, de escolher e aplicar os Acordos de Empresa que menciona na sua sentença (não deixa de ser sintomático do que acabámos de defender, a afirmação final de tal decisão que deixámos acima transcrita - “Desconhecemos qual a situação dos trabalhadores em causa nos presentes autos” - que se revela mesmo contraditório com tal escolha e aplicação.
Logo, afigura-se-nos que a recorrente tem razão no que concerne à impossibilidade de aplicação dos aludidos instrumentos de regulamentação colectiva ao litígio dos autos, julgando-se procedente, nessa parte, o presente recurso de Apelação.

D2 – LOCAL DE TRABALHO – TRANSFERÊNCIA DO LOCAL DE TRABALHO

Alguma da nossa doutrina (v. g., Maria do Rosário Palma Ramalho, “Direito do Trabalho - Parte II - Situações laborais individuais”, Almedina, Julho de 2006, páginas 405 e seguintes) no que concerne ao local de trabalho (que no caso dos autos e para António Monteiro Fernandes, “Direito do Trabalho”, 13.ª Edição, Almedina, Janeiro de 2006, página 421, se reconduz “às áreas percorridas na prestação de trabalho”), ao princípio da inamovibilidade do trabalhador (artigos 122.º, alínea f) e 154.º, número 1, do Código do Trabalho de 2003) e à possibilidade da sua modificação unilateral (se houver um efectivo acordo entre trabalhador e empregador acerca de tal mudança, tal alteração ao contrato de trabalho, de índole consensual, sobrepor-se-á ao que anteriormente estava combinado entre as partes a esse mesmo respeito) faz uma distinção entre a modificação do local de trabalho de um trabalhador determinado (regulada nos artigos 315.º e 316.º do Código do Trabalho de 2003) e a mudança (total ou parcial) de estabelecimento, que acarreta a modificação do local de trabalho de todos ou, pelo menos, de alguns dos trabalhadores que aí desenvolvem a sua actividade, ou seja, uma mudança colectiva (regulada no artigo 315.º do mesmo texto legal).
Se atentarmos na factualidade dada como provada, facilmente concluímos, a partir dos Pontos 6.º e 7.º da mesma, que nos achamos face à segunda situação, de mudança ou transferência colectiva (e definitiva):
“6.º - As instalações da Ré desde que os Autores iniciaram a sua actividade por conta desta, situavam-se no Barreiro e no Montijo, locais onde os Autores iniciavam a respectiva prestação de trabalho. (art.º 6.º da petição inicial)
7.º - No dia 9 de Setembro de 2007, a Ré transferiu, por sua iniciativa e no seu interesse, definitivamente, as anteriores instalações do Montijo e do Barreiro para o concelho da Moita, sítio de Broega. (art.º 7.º da petição inicial) ”
Chegados aqui, reproduzamos então tal disposição legal, que regulamenta a segunda hipótese em presença, bem como o artigo 317.º, que define os procedimentos a adoptar pela entidade empregadora em todos os casos de mudança de local de trabalho previstos nos artigos 315.º e 316.º (hoje artigos 194.º e 196.º):

Artigo 315.º
Mobilidade geográfica
1 - O empregador pode, quando o interesse da empresa o exija, transferir o trabalhador para outro local de trabalho se essa transferência não implicar prejuízo sério para o trabalhador.
2 - O empregador pode transferir o trabalhador para outro local de trabalho se a alteração resultar da mudança, total ou parcial, do estabelecimento onde aquele presta serviço.
3 - Por estipulação contratual as partes podem alargar ou restringir a faculdade conferida nos números anteriores.
4 - No caso previsto no n.º 2, o trabalhador pode resolver o contrato se houver prejuízo sério, tendo nesse caso direito à indemnização prevista no n.º 1 do artigo 443.º.
5 - O empregador deve custear as despesas do trabalhador impostas pela transferência decorrentes do acréscimo dos custos de deslocação e resultantes da mudança de residência.
(…)
Artigo 317.º
Procedimento
Salvo motivo imprevisível, a decisão de transferência de local de trabalho tem de ser comunicada ao trabalhador, devidamente fundamentada e por escrito, com 30 dias de antecedência, nos casos previstos no artigo 315.º, ou com 8 dias de antecedência, nos casos previstos no artigo 316.º.

A Professora Maria Rosário Palma Ramalho, acerca desta segunda modalidade do instituto (transferência colectiva dos trabalhadores), sustenta o seguinte:
“O regime da mudança do estabelecimento tem pontos comuns com o regime da mudança individual do local de trabalho, mas apresenta também diferenças significativas. Os traços mais importantes da figura são os seguintes:
i) A modificação do local de trabalho decorre da mudança do esta­belecimento, mas, para efeitos desta norma, o termo «estabelecimento» deve ser interpretado em sentido amplo: a mudança do estabelecimento pode respeitar a um dos estabelecimentos do empregador ou apenas a uma parcela desse estabelecimento, bem como à mudança de uma secção da empresa, e à mudança do conjunto ou de parte das suas instalações (art. 315.º, n.º 2 do CT); por outro lado, a norma é extensível aos contratos de traba­lho não empresariais, relativamente aos quais não é adequado o termo «estabelecimento» (a mudança de residência do empre­gador num contrato de trabalho doméstico, por exemplo).
ii) Ao contrário do que sucede com a modificação individual do local de trabalho, a transferência do trabalhador por força da mudança do estabelecimento não depende do interesse da em­presa nem da ausência de prejuízo sério para o trabalhador (art.º 315.º n.º 2), o que se justifica por um motivo de praticabilidade do próprio regime: na verdade, o interesse da empresa é suben­tendido numa decisão de gestão sobre a deslocação de um esta­belecimento ou de um serviço, mas não faz sentido questionar tal decisão, já que ela manifesta o direito de iniciativa económica e de livre gestão dos empresários e não o seu poder directivo: de outra parte, não seria praticável nem admissível obstar à mudança do estabelecimento com fundamento no prejuízo que possa decor­rer dessa mudança para um ou mais trabalhadores determinados. Em suma, a mudança colectiva do local de trabalho é incondicio­nada, porque se reconduz a uma projecção de uma decisão de gestão que ultrapassa a dimensão do próprio contrato de traba­lho, mas que se impõe ao acordo contratual, em nome do princípio da prevalência dos interesses de gestão.
iii) Tal como vimos suceder no caso da mudança individual, também na mudança colectiva a lei prevê que as partes possam alargar ou restringir a faculdade de transferência do trabalhador, em sede do contrato de trabalho (art. 315.° n.° 3). Contudo, não sendo esta mudança colectiva condicionada pelos requisitos da mudança individual, a convenção das partes sobre esta matéria é de reduzido alcance e utilidade - ela apenas poderá ir no sentido de excluir a transferência do trabalhador, mas mesmo uma convenção deste tipo só faz sentido no caso de transferência parcial do estabelecimento.
iv) Não se sujeitando a mudança colectiva aos requisitos da mudança individual, não se coloca a possibilidade de recusa da modificação do local de trabalho pelo trabalhador. Em conse­quência, se o trabalhador não aceitar a novo local de trabalho, a lei atribui-lhe o direito de resolver a contrato se a mudança lhe causar prejuízo sério e com direito à indemnização prevista no art.º 443.° n.° 1 do CT (é o regime estabelecido pelo art. 315.° n.° 4). Decorre pois claramente deste regime que o requisito do prejuízo sério é um requisito para a resolução do contrato pelo trabalhador (que configura a respectiva justa causa) e não um requisito da modificação do local de trabalho. Tal como se refe­riu em apreciação deste requisito no caso da modificação indivi­dual do local de trabalho, o prejuízo sério não pode ser confun­dido com uma mera inconveniência pessoal do trabalhador e deve ser provado por ele, de acordo com as regras gerais do ónus da prova. Evidentemente, mesmo na ausência de prejuízo sério, o regime geral da denúncia do contrato de trabalho pelo trabalhador (arts. 447.º e segs. do CT) permite-lhe sempre fazer cessar o contrato, no caso de não querer acompanhar o estabelecimento; neste caso, o trabalhador terá apenas que respeitar o aviso prévio e não tem direito a qualquer compensação.
Nos restantes aspectos, o regime da mudança colectiva do local de trabalho é idêntico ao regime da mudança individual definitiva. Assim, o empregador deve custear as despesas do trabalhador que resultem da mudança de residência, bem como as que decorram do acréscimo dos custos de deslocação (art. 315.º, n.º 5). Por outro lado, a decisão de transferência deve ser comunicada por escrito a cada trabalhador envolvido, com a antecedência de 30 dias sobre a sua efectivação e com indicação do res­pectivo fundamento (art. 317.º), sendo que, neste caso, o fundamento cor­responde simplesmente a mudança do estabelecimento, ou de parte dele, não sendo, quanto a nós, exigível uma justificação adicional” (sublinhado nosso - cf. a jurisprudência e doutrina referidas por essa mesma autora, bem como, em sentido próximo da dicotomia por ela defendida, em “VII Congresso Nacional do Direito do Trabalho”, Memórias - Coordenação do Prof. Doutor António Moreira, Novembro de 2004, Almedina, as intervenções do Dr. Albino Mendes Batista e de Catarina Carvalho, intituladas, respectivamente, de “Notas sobre a Mobilidade Geográfica dos Trabalhadores”, a páginas 25 a 40, e “A mobilidade geográfica dos trabalhadores no Código do Trabalho”, a páginas 43 a 80, António Monteiro Fernandes, “Direito do Trabalho”, 13.ª Edição, Almedina, Janeiro de 2006, páginas 491 e seguintes; finalmente, Júlio Manuel Vieira Gomes, “Direito do Trabalho - Relações Individuais de Trabalho”, Volume I, Março de 2007, Coimbra Editora, páginas 636 e seguintes).

D3 – REGULAMENTAÇÃO COLECTIVA E CÓDIGO DO TRABALHO

Abordando a matéria numa outra perspectiva, chamemos à colação o disposto nos artigos 13.º a 15.º da Lei n.º 99/2003, de 27/08 (quanto ao artigo 13.º, confrontar ainda o artigo 492.º da Lei n.º 35/2004, de 29/07 – Regulamentação do CR de 2003 – e 1.º, número 4, da Lei n.º 9/2006, de 20/03) para dizer que também aqui se suscitam dúvidas pertinentes quanto à vigência dos referidos Acordos de Empresa.
Olhando para o artigo 315.º do Código do Trabalho de 2003 (e que se mostra acima transcrito), verifica-se que o seu número 3 admite que “Por estipulação contratual as partes podem alargar ou restringir a faculdade conferida nos números anteriores.”
O Professor João Leal Amado no seu “Contrato de Trabalho”, 2.ª Edição, Janeiro de 2010, publicação conjunta de Wolters Kluwer e Coimbra Editora, páginas 249 e seguintes, acerca do quadro legal derivado do actual Código do Trabalho (artigos 193.º a 196.º), sustenta o seguinte:
“Por seu turno, o n.º 4 do artigo 194.º prescreve que «o empregador deve custear as despesas do trabalhador decorrentes do acréscimo dos custos de deslocação e da mudança de residência ou, em caso de transferência temporária, de alojamento». Note-se que, tendo em conta o disposto nos n.ºs 2 e 6 deste artigo, o regime constante do n.º 4 parece possuir um carácter «colectivo-dispositivo», vale dizer, poderá ser livremente afastado por IRCT, mas já não pode ser afastado, em sentido menos favorável para o trabalhador, através de contrato individual de trabalho (338).
(338) Com efeito, o carácter supletivo da norma cinge-se ao seu n.º 1 (cujo regime poderá ser afastado mediante contrato de trabalho, ao abrigo do n.º 2), mas quanto ao disposto no n.º 4 do artigo 194.º vale a directriz fundamental consagrada no artigo 3.º, n.º 4, do CT: as normas legais reguladoras do contrato de trabalho só podem ser afastadas por contrato individual que estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador (…)
A utilidade do excerto doutrinário antes reproduzido radica na circunstância de inexistir no artigo 315.º do Código de Trabalho de 2003 uma norma correspondente ao número 6 do artigo 194.º (“o disposto nos números anteriores pode ser afastado por instrumento de regulamentação colectiva do trabalho”) e no facto de parecer vir confirmar o entendimento da nossa doutrina de que, no âmbito do anterior regime, não existia a possibilidade dos números 4 e 5 do artigo 315.º poderem ser modificados, em termos colectivos ou individuais (cf. os autores, obras e locais assinalados no final do ponto anterior).
António Monteiro Fernandes, obra citada, páginas 433 e 434, sustenta, a este respeito, o seguinte:
“A mencionada possibilidade de alargamento ou restrição da faculdade de transferência, por estipulação contratual, diz naturalmente respeito à faculdade em si – ao espaço de decisão unilateral que é reconhecido ao empregador – e não a todos os aspectos do regime do artigo 315.º CT.
Desde logo, porque está em causa a “amplitude” da referida faculdade, os meios de reacção desenhados no artigo 315.º/4, para a transferência colectiva, mantêm-se utilizáveis em qualquer caso. E o mesmo se dirá da importante disposição que se contém no artigo 315.º/5, acerca do custeio das despesas inerentes à transferência. A norma especifica, com efeito, que se trata de lançar sobre o empregador uma parte das despesas correntes do trabalhador, na situação em que ficará após a mudança – e não só as despesas “directamente impostas pela transferência”, como exigia o direito anterior. A nova regra impõe-se independentemente da latitude com que a mobilidade geográfica seja contratualmente estabelecida.
Também não são alteráveis as exigências procedimentais do artigo 317.º, que constituem inovação do Código: a de comunicação escrita do empregador ao trabalhador anunciando a mudança e os seus fundamentos, com antecedência significativa em relação à data em que deverá ocorrer”. (sublinhados nossos)
Impõe-se também dizer que a mencionada doutrina – sendo claro exemplo de tal tese, a transcrição assinalada acima e atribuída à Professora Maria do Rosário Palma Ramalho –, mesmo quanto o ao número 1 do mesmo dispositivo legal, perspectiva um quadro muito restrito de alterações convencionais ou contratuais ao regime regra do artigo 315.º, quando estão em causa transferências colectivas de local de trabalho por mudança de estabelecimento.
Ora, a ser assim e pelo menos no que respeita ao carácter imperativo dos referidos números 4 e 5 do artigo 315.º do Código do Trabalho de 2003, importa atentar no artigo 14.º da Lei n.º 99/2003, de 27/08, que fere de nulidade as disposições constantes de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho que disponham de modo contrário às normas imperativas do Código do Trabalho e que não tenham sido alteradas no prazo de 12 meses a partir da entrada em vigor de tal diploma (1/12/2003).
Logo, o Anexo VI do AE do SITRA, em tudo o que contrarie o artigo 315.º, números 4 e 5, do Código do Trabalho de 2003, é nulo (verdadeira grandeza, o seu ponto 5.º).

D4 – INTERPRETAÇÃO DAS CLÁUSULAS 17.ª E 18.ª DO AE CELEBRADO ENTRE A RODOVIÁRIA NACIONAL E A FRESTRU E 17.ª E ANEXO VI DO AE CELEBRADO COM O SITRA

Tendo este cenário fáctico e jurídico como pano de fundo e muito embora tenhamos entendido que a Regulamentação Colectiva em causa não pode ser aplicada aos autos, diremos, ainda que de uma forma muito sintética, que não nos parece curial a interpretação que quer o Autor, como a ACT e o tribunal recorrido fazem de, pelo menos, algumas das cláusulas contratuais acima identificadas e que têm a seguinte redacção:

Cláusula 17.ª
(Local de Trabalho)
1. Considera-se local de trabalho aquele para onde o trabalhador foi contratado.
2. O local de trabalho pode ser alterado para outro que não diste mais de 2 kms da residência permanente do trabalhador.
3. A empresa poderá ainda alterar o local de trabalho, dentro da mesma localidade, quando do encerramento ou mudança total ou parcial do estabelecimento onde o trabalhador presta serviço.

Cláusula 18.ª
(Transferência do Local de Trabalho)
A empresa só pode transferir o trabalhador para outro local de trabalho, desde que este dê o seu acordo por escrito, em documento donde constem as condições ou termos dessa transferência.

Por seu turno, dispõem as Cláusulas 16.ª e 17.ª e o Anexo VI ao A.E. outorgado com o SITRA, a que aderiu o Sindicato Nacional dos Motoristas, publicado no BTE n.º 18, de 15 de Maio de 1992, o seguinte:

Cláusula 16.ª
(Local de Trabalho)
1. Considera-se local de trabalho aquele para onde o trabalhador foi contratado.
2. O local de trabalho pode ser alterado pela Empresa para outro que não diste mais de 2 km da residência permanente do trabalhador.
3. A transferência de local de trabalho é regulada pela cláusula seguinte e pelo Anexo VI.

Cláusula 17.ª
(Transferência do Local de Trabalho)
1. A empresa só poderá transferir o trabalhador, para outro local de trabalho se essa transferência não causar prejuízo sério ao trabalhador ou se resultar de mudança total ou parcial do estabelecimento onde presta serviço.
2. Poderá igualmente ser transferido o trabalhador sempre que dê o seu acordo por escrito à Empresa, em documento donde constem os termos dessa transferência.
3. A Empresa custeará sempre as despesas feitas pelo trabalhador directamente impostas pela transferência, sempre que a mesma se tenha operado nos termos do número 1 desta cláusula.
ANEXO VI
TRANSFERÊNCIA DO LOCAL DE TRABALHO
1.º Sem prejuízo do disposto na Cláusula 17.ª (Transferência do Local de Trabalho) e do livre acordo entre a Empresa e o trabalhador, a Empresa só pode transferir o trabalhador para outro local de trabalho em caso de encerramento total ou parcial do estabelecimento e desde que lhe garanta colocação nas instalações mais próximas, num raio máximo de 20 km, em funções iguais ou compatíveis com as suas aptidões profissionais.
2.º O trabalhador poderá sempre optar pela rescisão do contrato de trabalho, com direito à indemnização de antiguidade.
3.º A empresa garantirá com recurso aos seus meios e termos normais o transporte de e para o novo local de trabalho.
4.º A Empresa obriga-se a compatibilizar, na medida do possível, os horários de trabalho dos trabalhadores transferidos com os horários dos transportes públicos.
5.º Em caso de transferência referida no n.º 1, ao trabalhador será pago o acréscimo de tempo gasto no trajecto e espera de e para o local de trabalho.
6.º Entende-se por estabelecimento todo o local onde a Transportes Sul do Tejo, SA tenha representação directa através de um corpo funcional e hierárquico dividido sectorialmente ou não.

Olhando para as regras jurídicas constantes de tais Acordos de Empresa, facilmente se depreende que as constantes do primeiro instrumento de regulamentação colectiva não estão equacionadas para uma situação como a dos autos, em que o empregador muda, em termos definitivos, de instalações, concentrando num só local (como parece ser a hipótese dos autos), com o subsequente “abandono” das anteriores, o funcionamento da sua estrutura e organização e o desenvolvimento da sua actividade económica naquela área geográfica, com a inerente transferência colectiva de todos os seus trabalhadores.
Não é concebível que os trabalhadores, individual ou conjuntamente, possam obstar a tal mudança (desde que séria, porque radicada em critérios empresariais lógicos e razoáveis) através da não concessão de acordo escrito à mesma ou que a empresa esteja limitada a efectuar tal transferência de instalações para um lugar que não diste mais de 2 km da residência permanente dos trabalhadores (objectivo só por si materialmente impossível para entidades empregadoras com mais de um ou dois empregados, como é o caso da Ré) ou situado dentro da mesma localidade.
Muito embora sejamos tentados a concordar com a Apelante, quando pretende circunscrever tais normas a hipóteses de transferências individuais de trabalhadores, certo é que aí se alude também a “encerramento ou mudança total ou parcial do estabelecimento”, logo, a potenciais situações de transferência colectiva, que, pelo menos em teoria, podem afectar todo o quadro de pessoal.
Poder-se-á argumentar que, mesmo assim, só se tem em vista a mudança de local de trabalho, encarada em termos individuais, para cada um dos trabalhadores visados e perante a existência simultânea - ainda que sucessiva - de diversos estabelecimentos explorados pela entidade patronal.
De qualquer maneira, independentemente da interpretação mais lata ou restrita que se faça do regime constante dessas duas cláusulas, não podemos deixar, pelo menos em casos como o dos autos (mudança colectiva de local de trabalho), de considerar – senão inconstitucionais, por violação do disposto nos artigos 61.º, 82.º e 86.º da Constituição da República Portuguesa –, pelo menos, ilegítimas, porque abusivas, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 334.º do Código Civil, as exigências de não mudança de local de trabalho para lugar que diste mais de 2 km da residência permanente do empregado, a obrigatoriedade de abertura de novo estabelecimento dentro da mesma localidade ou a exigência de prévio acordo escrito por parte dos trabalhadores transferidos.
Olhando agora para as cláusulas e anexo do segundo Acordo de Empresa, que regulam quer a mudança individual de local de trabalho como a colectiva, nos moldes já acima referenciados, afigura-se-nos que as normas constantes da cláusula 16.ª, número 2 e 17.ª, número 1, 1.ª parte e 2 estão direccionadas para situações de mudança de local de trabalho configuráveis como transferências individuais (afectem um ou mais trabalhadores).
A cláusula 17.ª, número 2.ª parte e o Anexo (apesar da sua difícil conciliação, senão mesmo efectiva contradição) parecem contemplar, exclusiva ou cumulativamente, hipóteses de transferência colectiva e definitiva de todos ou grande parte dos trabalhadores, como a que temos presente nesta acção, conforme decorre das expressões mudança total ou parcial do estabelecimento onde presta serviço (preâmbulo do Anexo) ou encerramento total ou parcial do estabelecimento (cláusula 17.ª), pretendendo-se quantificar ou definir no segundo texto o prejuízo sério para efeitos de resolução do contrato de trabalho (distância máxima de 20 km do estabelecimento encerrado ou mudado).
Logo, face à análise dos Acordos de Empresa considerados pela sentença recorrida, que acima deixámos concretizada e ainda que os mesmos fossem aplicáveis ao pleito em presença, nunca poderíamos estar de acordo com aquela decisão quando, para qualificar como ilícita a transferência dos autos, estriba o seu juízo nas aludidas cláusulas 17.ª e 18.º do AE entre a RN e a FESTRU (“Ora, situando-se o estabelecimento fora da mesma localidade e não havendo acordo do trabalhador, não resta senão concluir pela ilicitude da sua transferência e, nos termos do disposto no art.º 155.º, do Código do Trabalho 2003, ter-se como tempo de trabalho, o tempo acrescido na deslocações, e assim o remunerar.”), nem mesmo quanto à consideração da referida distância de 20 km, que não pode ser impeditiva da mudança, total ou parcial, de estabelecimento (pelos motivos já acima referidos quanto ao primeiro instrumento de regulamentação colectiva), mas serve apenas como medida limite aferidora do prejuízo sério que é reclamado pela resolução do contrato de trabalho com justa causa.

D5 – ARTIGO 155.º DO CÓDIGO DO TRABALHO

Analisemos agora o exacto sentido e alcance do artigo 155.º do Código do Trabalho de 2003 (o aplicável à data da mudança de instalações ocorrida no ano de 2007), atendendo ao teor do pedido principal formulado pelo Autor e à decisão tomada pelo Tribunal do Trabalho do Barreiro:

Artigo 155.º
Tempo de trabalho
Considera-se tempo de trabalho qualquer período durante o qual o trabalhador está a desempenhar a actividade ou permanece adstrito à realização da prestação, bem como as interrupções e os intervalos previstos no artigo seguinte.

Será que do cruzamento dessa disposição com o estatuído no artigo 315.º do mesmo diploma legal (com especial relevância para o seu número 5, que reza que “O empregador deve custear as despesas do trabalhador impostas pela transferência decorrentes do acréscimo dos custos de deslocação e resultantes da mudança de residência”), se poderá efectivamente concluir pela obrigação da Ré em pagar o tempo de deslocação entre as suas novas instalações e as residências dos seus trabalhadores como se de efectivo tempo de trabalho se tratasse?
Salvo melhor opinião (e à falta de uma regra convencional que o determine, como o ponto 5 do aludido Anexo V), afigura-se-nos que não é possível extrair tal interpretação de qualquer uma das normas, ainda que conjugadas entre si.
Acerca do estatuído no artigo 315.º, número 5 do Código do Trabalho de 2003 (hoje, o artigo 194.º, número 4), diz Albino Batista, na obra e local citados, página 35, que “estão assim incluídas, agora mais claramente, nos casos em que não há mudança de residência, as despesas decorrentes do agravamento do custo dos transportes quando o trabalhador prefira manter a sua antiga residência ou não consiga habitação tão próxima do local de trabalho como a anterior.
O legislador quis, segundo julgo, restringir as despesas a suportar pelo empregador ao acréscimo do preço dos transportes ou às maiores despesas derivadas da utilização de viatura própria”.
Júlio Gomes, obra e local citados, página 646, defende, por seu turno, que “o preceito tem o inegável mérito de não deixar dúvidas, quanto a nós, de que o empregador deverá pagar o aumento de despesas de transporte resultante da transferência, regime que já defendíamos face à lei anterior, mas que era questionado por alguns. Parece-nos, de facto, da mais elementar justiça que seja o empregador a suportar esses custos, já que a mudança de lugar de trabalho foi da sua iniciativa – ou melhor, foi imposta por ele - e no seu interesse, não se vislumbrando qualquer razão para que o empregado deva suportá-los do seu bolso”. (cf., em sentido divergente, Maria do Rosário Palma Ramalho, obra e local citados, Nota 418, a página 417)
Catarina Carvalho, na obra e local citados, página 67, refere a propósito das despesas que o empregador deve suportar em função da transferência do local de trabalho: “Parece decorrer da norma que não está abrangido pelo conceito de despesa o acréscimo de tempo dispendido pelo trabalhador para chegar ao seu local de trabalho, nem diferença de preço das refeições, da escola dos filhos, etc.” (esta autora indica como professando a mesma posição, Pedro Madeira de Brito, AAVV, “Código do Trabalho Anotado”, 2.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2004, página 483).
Logo, não é possível reconduzir à noção de “despesas”, conforme enunciadas no número 5 do artigo 315.º, o pagamento da remuneração correspondente ao tempo a mais dispendido em deslocações, como parece ressaltar dos pontos 9.º, 13.º e 14.º da factualidade dada como provada (muito embora não se saiba ao certo qual a exacta diferença, para cada um dos trabalhadores representados pelo STRUP, entre o tempo que gastavam na deslocação para o seu anterior local de trabalho, sito no Montijo ou no Barreiro e o tempo que agora levam a chegar ao seu novo local de trabalho, situado na Broega, Moita).
Sendo assim, a pretensão formulada pelo Autor e acolhida pela sentença recorrida não tem cobertura legal, sem prejuízo de algumas concessões que, nessa matéria, a Ré fez, como resulta dos factos dados como assentes nos pontos 22.º, 23.º, 27.º e 28.º (circulação em vazio e inclusão nas chapas de serviço).
O presente recurso de Apelação tem de ser, nessa medida, julgado procedente com a revogação da sentença, que incidiu só sobre tal matéria.

D6 – DESPESAS DE DESLOCAÇÃO

A revogação da sentença no que toca à procedência do pedido principal deduzido pelo Autor, impõe, como já referimos noutra parte deste Aresto, a análise do pedido subsidiário, à luz do regime legal acima reproduzido e da interpretação que a nossa melhor doutrina dele faz.
Os factos provados com interesse imediato para esta questão são os seguintes (a documentação junta pouco ou nada releva para aqui):
8.º - Alguns trabalhadores não têm transportes de ligação coincidentes com o seu horário de trabalho. (art.º 9.º da petição inicial)
9.º - Alguns trabalhadores, para além de terem de sair de casa mais cedo para iniciarem o trabalho na hora estipulado, chegam igualmente mais tarde, no regresso, com a consequente redução do tempo de descanso e de integração no seio familiar. (art.º 10.º da petição inicial)
10.º - Alguns trabalhadores, para obviar às consequências dos factos descritos em 9.º e 10.º, optam por utilizar viatura própria, o que lhes acarreta custos acrescidos. (art.º 11.º da petição inicial)
11.º - A Ré não está a custear quaisquer despesas daí decorrentes, pelo que a Autoridade para as Condições do Trabalho, instaurou processo de contra-ordenação. (art.º 13.º da petição inicial)
12.º - Os trabalhadores supra identificados têm um horário de trabalho com a duração semanal de 40 horas, distribuídos por cinco dias de cada semana, o qual se mantém após a transferência do local de trabalho. (art.º 14.º da petição inicial)
13.º - A deslocação entre o Barreiro e o sítio da Broega demora cerca de 45 minutos. (art.º 15.º da petição inicial)
14.º - A deslocação entre o Montijo e o sítio da Broega demora cerca de 15 minutos. (art.º 16.º da petição inicial).
A decisão recorrida entendeu, a partir do regime jurídico convencional que aplicou, que as despesas de deslocação (na vertente do acréscimo de período de trabalho, correspondente ao trajecto mais demorado entre a residência e o local de trabalho e vice-versa) não podiam ser compensadas pela Ré por outra forma que não fosse através da entrega a cada um deles das correspondentes quantias pecuniárias.
Ora, no que concerne a este segundo aspecto, ficaram igualmente demonstrados os seguintes factos:
25.º - A Ré desde a mudança dos referidos estabelecimentos do Barreiro e do Montijo para a Moita que assegura todas as despesas com as deslocações dos trabalhadores, pois que, dispõe de diversas viaturas pesadas de passageiros que circulam nas mais variadas horas do dia e da noite e transportam os trabalhadores do Montijo para o Barreiro e para a Moita e vice-versa. (art.º 14.º da contestação)
26.º - O transporte dos trabalhadores está assegurado, quer do Montijo, quer do Barreiro, através da carreira 410, a qual tinha uma frequência de 20 em 20 minutos e, desde o início do ano de 2011, tem uma frequência de 30 em 30 minutos, isto até cerca das 20h30m, passando então a uma frequência de 45 em 45 minutos, sendo que para os primeiros turnos foram criadas circulações específicas para o transporte de pessoal. (art.º 15.º da contestação)
27.º - Quanto aos motoristas, foi assegurado que as chapas de serviço estão organizadas de modo a que todos os que necessitem de se deslocar de e para as novas instalações, tenham garantia de transporte fornecido pela empresa, ou através da carreira 410, ou através de transporte pessoal em períodos horários não abrangidos pela carreira, ou ainda por aproveitamento de “vazios” que ocorram de e para a Moita. (art.º 16.º da contestação)
28.º - Foi garantida a inclusão em todas as chapas de serviço em que se aplique, do tempo de percurso em vazio necessário para levar a viatura da Moita até ao início do serviço, ou do regresso à Moita, após o final do serviço. (art.º 17.º da contestação)
29.º - A TST fornece mensalmente o passe social a todos os seus trabalhadores e familiares directos (mulheres /maridos e filhos), pelo que, o transporte público é gratuito para todos os trabalhadores da TST. (art.º 18.º da contestação)
Não vemos fundamento legal - até porque o Anexo V referido pela sentença não se aplica ao caso dos autos - para não considerar tais formas de compensação directa e indirecta, fornecidas ou custeadas pela Ré, e traduzidas, em síntese, em transporte gratuito para os trabalhadores e seus familiares, nos seus próprios autocarros ou noutros (carreira 410) como um cumprimento legítimo e suficiente para todos os trabalhadores que não se viram na contingência de utilizar viatura própria.
Logo, com excepção deste último grupo de trabalhadores, que passaram a usar o seu carro para se deslocar de casa para o trabalho e vice-versa, julgamos que a Ré deu manifesta satisfação às exigências compensatórias do número 5 do artigo 315.º do Código do Trabalho de 2003.
Mas ainda que não se concorde com tal posição, certo é que o quadro fáctico que ressalta dos pontos 8.º a 14.º, peca por ser excessivamente vago e impreciso (alguns trabalhadores….custos acrescidos…mais cedo…mais tarde...), permitindo unicamente presumir, com base nas regras da experiência e senso comuns, um efectivo agravamento de cariz económico relativamente aqueles trabalhadores que passaram a usar viatura própria em vez de transportes públicos, o que já não acontece com referência aos restantes, que nada demonstraram a respeito de um efectivo acréscimo de despesas derivado da transferência definitiva da Ré para novas instalações (o facto de saírem no início do dia mais cedo e chegarem a casa mais tarde, no fim da jornada do trabalho, para além do tempo que demoram nas referidas deslocações, nada nos diz quanto a tal aumento de custos).
Sendo assim, quanto a estes últimos trabalhadores, os factos acima reproduzidos não sustentam mínima e suficientemente a condenação da Ré no pagamento de qualquer montante a título de acréscimo de despesas, tendo, portanto, a Apelante de ser absolvida nessa parte (cf. artigos 342.º do Código Civil e 516.º do Código de Processo Civil).
Mas que parte é essa em que não pode haver condenação, por contraponto à outra, que ainda está aqui pendente de apreciação? Formulando a pergunta de uma outra maneira, qual é a identidade daqueles abrangidos por tal absolvição, de forma a distingui-los dos demais que poderão, eventualmente ter direito ao ressarcimento do acréscimo de encargos que os afectou?
Não sabemos em rigor quem pertence a um e outro grupo e qual o número que se acha abrangido ou não pela referida absolvição, bem como ignoramos que distâncias é que cada um daqueles que se deslocam de carro percorrem diariamente (se é que o fazem com essa periodicidade), quantas vezes por semana, qual a diferença relativamente ao que acontecia, com referência a cada um deles, antes da mudança, montantes dispendidos semanal ou mensalmente em termos de acréscimo, etc.
Será que, ainda assim, estamos perante uma situação de natureza adjectiva que consente, como veio a ser decidido pelo tribunal recorrido, que a quantificação das aludidas despesas seja feita numa fase posterior, em liquidação de sentença, ao abrigo do artigo 661.º, número 2 e 378.º e seguintes do Código de Processo Civil?

D7 – LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA – SUA LEGALIDADE

A Ré, a este propósito, suscita, nas suas alegações e conclusões, a seguinte problemática:
“48. Por outro lado, resulta da sentença ora em crise, que o Tribunal a quo decidiu condenar a Apelante no pagamento de quantias, a liquidar em execução de sentença.
49. Com o devido respeito por opinião contrária, afigura-se à Apelante que só nos casos em que, no momento da formulação do pedido ou da prolação da sentença, não haja elementos para fixar o objecto ou a quantidade do pedido, pode aplicar-se a norma do n.º 2 do art. 661.º do CPC, ou seja, relegar-se para ulterior liquidação o apuramento do crédito.
50. A remissão para ulterior liquidação não pode fazer-se em razão da falta de prova de factos, mas tão-somente por inexistência de factos provados, por estes não serem conhecidos ou por estarem em evolução no momento em que foi instaurada a acção ou na data em que foi proferida a decisão que dirimiu a matéria de facto controvertida.
51. Repare-se que o referido preceito refere como fundamento para o non liquet quantitativo, apenas a “falta de elementos”, e não a falta de prova de elementos, pelo que afigura-se correcto o entendimento jurisprudencial, que só deve relegar-se o apuramento do crédito ou do quantitativo da condenação para liquidação de sentença, quando estivermos perante uma falta de elementos de facto a provar e não quando estivermos perante o fracasso da prova produzida sobre esses factos.
52. De modo algum se poderá considerar que a ratio legis do art.º 661.º, n.º 2 do CPC permite defender teleologicamente uma repetição da realização da instância probatória quanto a factos já produzidos e conhecidos à data da propositura da acção. O incidente de liquidação de sentença não admite a renovação da prova que não se logrou produzir naquela sede.
53. Não é legítimo, por isso, o recurso a tal figura quando o quantum se não determinou devido ao fracasso da prova (Cfr. Ac. da RP de 12/6/00, in www.dgsi.pt.).
54. Consentir-se o apuramento do crédito em incidente de liquidação de sentença, por fracasso da prova produzida na acção declarativa, quando todos os elementos de facto constitutivos do direito já se tinham verificado e eram conhecidos do autor, no momento da propositura da acção, seria o mesmo que conceder-lhe uma segunda oportunidade para alegar e provar os factos que não conseguiu provar na fase declarativa da acção, com total desrespeito pelos princípios gerais da repartição do ónus da prova, bem como das regras que estabelecem as diferentes fases processuais e os objectivos de cada uma dessas fases (vide, neste sentido, Acs. do STJ, de 17/1/95, BMJ 443º, 395; de 13/1/00, Sumários, 37º-34; de 24/2/00, Sumários, 38º-45.)
55. O legislador ciente disso, teve o cuidado de estabelecer, no art. 75.º do Código de Processo de Trabalho (CPT), que “sempre que a acção tenha por objecto o cumprimento de obrigação pecuniária, o juiz deve orientá-la por forma a que a sentença, quando for condenatória, possa fixar em quantia certa a importância devida.”
56. Regressando aos autos, constata-se que não logrou o Apelado provar, como devia, da residência de cada trabalhador visado, de molde a permitir separar os trabalhadores que residem num ou noutro local.
57. Por outro lado, ficou de igual modo por alegar e provar as datas de entrada dos trabalhadores representados na entidade patronal, de molde a aferir concretamente a quais os trabalhadores é aplicável um ou outro AE, em que se alicerçou a decisão em crise.
58. Também não ficou provado o salário base auferido por cada um dos trabalhadores representado pelo Sindicato ora Apelado, pois o tribunal a quo fixou o valor semanal de €30,00, (a cada trabalhador nas áreas do Barreiro e de Alcochete), e o valor semanal de €15,30, (a cada trabalhador residente no Montijo), com base no salário médio de 600,00, quando efectivamente deveria ter sido alegado e provado a categoria profissional de cada trabalhador e consequentemente o salário mensal de cada trabalhador visado, não podendo, por obvio, tal matéria não alegada e/ou provada ser susceptível de ser relegada para execução de sentença.”
Importa dizer que se trata de uma questão nova, só levantada nos autos em sede de alegações/conclusões (a Ré na sua contestação não vem insurgir-se contra a natureza genérica, ilícita e insuficiente do pedido subsidiário formulado pelo Autor, face às restrições que a esse respeito, são impostas pelo artigo 471.º do Código de Processo Civil - cf. António Santos Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil - 1 - Princípios Fundamentais; 2 - Fase Inicial do Processo Declarativo”, I Volume, 2.ª Edição Revista e Ampliada, Janeiro de 2003, páginas 163 e seguintes), mas a mesma (na dupla vertente da formulação do referido pedido genérico e da quantificação do mesmo em sede de liquidação de sentença), em rigor, não só configura uma excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso (cf., a este respeito, o artigo 495.º do Código de Processo Civil e Castro Mendes, “Direito Processual Civil”, II Volume, 1980, AAFDL, página 330) como só poderia ser suscitada, na faceta impugnada no recurso, após a proferição da sentença, pois só aí é que se conhece a decisão do tribunal quanto a tal matéria: condenação em montante certo ou no que se vier a liquidar mais tarde (cf., quanto à apreciação de questões novas, desde que de conhecimento oficioso, pelo tribunal de recurso, Fernando Amâncio Ferreira, “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 6.ª Edição, Setembro de 2005, Almedina, página 151 e António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos em Processo Civil - Novo Regime”, Dezembro de 2007, Almedina, página 88).
Considerando o que estatuem os artigos 47.º, número 5, 378.º, 379.º, 471.º e 661.º do Código de Processo Civil, bem como o artigo 75.º do Código do Processo do Trabalho e atendendo à circunstância de estarmos perante uma acção em que a respectiva causa de pedir está antecipada e perfeitamente definida (acréscimo de tempo de trabalho e de despesas devido à mudança definitiva de instalações, ocorrida em 9 de Setembro de 2007), temos para nós que, apesar de materialmente trabalhoso, poderia e deveria o Autor ter procedido à inequívoca formulação de um pedido líquido de aumento de despesas sofrido por cada um dos trabalhadores que aqui representa e patrocina.
O instituto da liquidação de sentença, previsto nos artigos acima referidos, não pode ter uma abrangência tal que, apesar da sua índole declarativa, se permita discutir, de novo e com idêntica amplitude, matéria essencial e constitutiva de direitos, que deveria ter sido debatida e demonstrada na acção declarativa propriamente dita e não foi.
O incidente de liquidação é, como ressalta daquelas normas, complementar dessa acção e respectiva sentença condenatória, visando fixar ou definir o objecto ou a quantidade devida, quando não haja elementos para o fazer no momento da condenação na correspondente pretensão, já aí determinada, qualitativa e juridicamente.
Não se desconhece que os nossos tribunais têm interpretado o regime constante do número 2 do artigo 661.º do Código de Processo Civil com uma grande amplitude (talvez excessiva), abrindo, nessa perspectiva, uma segunda frente de discussão de aspectos fundamentais, já alegados e que teriam de ser alvo de prova na acção original, mas que o demandante não conseguiu demonstrar.
Sem ignorar esse panorama jurisprudencial, entendemos, apesar de tudo, que o incidente de liquidação não pode ser transformado numa segunda acção declarativa onde as partes podem discutir matéria específica e própria da acção declarativa (verdadeira grandeza, factos fulcrais e constitutivos do direito do Autor ou do Réu reconvinte) – cf., apesar de tudo, o que, no sentido acima defendido, diz António Santos Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil”, págs. 182 e seguintes, citando alguma jurisprudência, como é o caso dos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 17/1/1995, publicado em “Novos Estilos”, 1995, n.º 1, página 24 e de 27/02/1996, inédito, proferido no processo n.º 88 221 e em que foi relator o Juiz-Conselheiro Cardona Ferreira, dizendo este último o seguinte:”a fase preliminar de liquidação em execução de sentença nunca pode servir para o apuramento ou averiguação sobre a existência de danos. Só pode servir para quantificar danos quando, na acção declarativa, tenha ficado demonstrada a sua existência, embora ilíquida”)
Ora, como já vimos, o Autor não conseguiu provar uma série de factos absolutamente essenciais à definição da pretensão subsidiária por ele deduzida, tendo tal cenário processual consequências jurídicas bastante mais gravosas do que as extraídas pelo tribunal recorrido, dado não poder ser meramente reconduzido ao regime constante do artigo 661.º, número 2 do Código de Processo Civil mas antes devendo ser encarado na perspectiva da absolvição da Ré, por o STRUP não ter logrado fazer a prova de alguns dos factos constitutivos do seu direito, nos termos e para os efeitos dos artigos 342.º do Código Civil e 516.º do Código de Processo Civil.
Sendo assim, tem este recurso de Apelação de ser julgado procedente também nesta parte, o que, no seu conjunto, implica a revogação da sentença impugnada e a sua substituição por uma decisão que absolva a Ré dos pedidos contra ela formulados pelo Autor.

Sumário

IV – DECISÃO

Por todo o exposto, nos termos dos artigos 87.º, número 1, do Código do Processo do Trabalho e 712.º e 713.º, número 6 do Código de Processo Civil, acorda-se, neste Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar procedente o presente recurso de apelação interposto por TST – TRANSPORTES SUL DO TEJO, SA, nessa medida se revogando a sentença recorrida e decidindo-se, em sua substituição, pela absolvição da Ré de todos os pedidos contra ela deduzidos pelo Autor.

Custas da acção e do presente recurso a cargo do Apelado.

Registe e notifique.

Lisboa, 25 de Janeiro de 2012

José Eduardo Sapateiro
Maria José Costa Pinto
Seara Paixão
Decisão Texto Integral: