Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
159/09.1TCGMR.L1-7
Relator: ANA RESENDE
Descritores: CONTRATO DE PATROCÍNIO
DESPORTO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/20/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I - No contrato de patrocínio celebrado no âmbito desportivo, dirigido assim ao patrocínio de equipas profissionais de clubes desportivos, o patrocinado obriga-se a veicular a imagem do patrocinador no desenvolvimento da sua atividade desportiva, mas também social, com a aposição do respetivo logótipo, marca ou nome da empresa, nos materiais utilizados pelos desportistas e técnicos, nas atividades com repercussões mediáticas, bem como assegurando determinados espaços de publicidade estática.
II - Em contrapartida de tais prestações, o patrocinador obriga-se ao pagamento de uma quantia em dinheiro, fixada em termos globais para toda a época desportiva, sendo frequente prever-se uma segunda prestação, também pecuniária, eventual, designada por prémio, determinada em função das classificações que a equipa patrocinada tenha alcançado no campeonato em que participou, assim como, nos torneios e taças, nacionais ou internacionais, que tenha disputado.
III - Numa atividade tão mediatizada como o futebol, não é irrelevante uma equipa ter um desempenho de fim de tabela, ou já mediano, ou mais ainda, mostrar uma combatividade que o leva aos lugares cimeiros, numa manifesta visibilidade, junto e na comparação com os designados “grandes”, num ano até, que o terceiro lugar dava lugar ao acesso à Liga dos Campeões, verificando-se assim a promoção da imagem ou nome do patrocinador, com a obtenção do pretendido “retorno publicitário”, que constitui a ratio da atribuição patrimonial, como prémio, face aos objetivos alcançados pela equipa.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM NA 7ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
           
I - Relatório
            1. A, Agremiação Desportiva de Utilidade Pública demandou COMPANHIA DE SEGUROS …SA, pedindo que a R. seja condenada a pagar-lhe a quantia no valor de 28.750,00€, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, desde 30.06.2008, até efetivo pagamento.
2. Alega para tanto que no exercício da sua atividade desportiva participa com a sua equipa de futebol profissional em competições profissionais, nomeadamente nas organizadas pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional, celebrando acessoriamente com terceiros contratos de publicidade que pretendem ver divulgados os seus produtos e marcas através de publicidade estática e outros meios de divulgação.
No exercício desta última atividade celebrou, em 29 de julho de 2007, um contrato denominado de “Contrato patrocínio patrocinador principal das camisolas oficiais do A…, obrigando-se a inserir a referência à marca registada Seguros da R. e respetivo logótipo nos equipamentos da equipa de futebol profissional sénior, contrato esse celebrado por três épocas desportivas.
Para além dos valores contratados, a R. obrigou-se ainda a pagar ao A., consoante a classificação, prémios durante o período da duração do contrato, a saber 25.000,00€, pelo primeiro, segundo e terceiro classificado, este último desde que apurado para a Liga dos Campeões.
O A. denunciou o contrato em 5 de junho de 2008, não tendo a R. satisfeito a verba de 25.000,00€ mais IVA, no montante de 3.750,00€, uma vez que aquele ficou classificado no campeonato em 3.º lugar com acesso à Liga dos Campeões.
3. Citada veio da R. contestar.
4. Realizado julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente condenando a R. a pagar ao A. a quantia de 28.750,00€, acrescida de juros de mora à taxa aplicável aos créditos de empresas comerciais, vencidos desde 24/7/2008 até integral pagamento, absolvendo do mais pedido a R., nomeadamente do pedido dos juros desde 30.06.2008 até 24.07.2008.
5. Inconformada veio a R. interpor recurso de apelação, formulando, nas suas alegações as seguintes conclusões:
·  À data da celebração do contrato, 29.06.2007 (um dia antes do início da época desportiva) Autor e Ré já sabiam que, no caso da Liga Portuguesa, o primeiro e segundo classificados do campeonato nacional organizado pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional teriam acesso direto (leia-se apuramento) à Liga dos Campeões, e ainda que o terceiro classificado teria que disputar as pré-eliminatórias para assegurar o apuramento para a Liga dos Campeões.  
·   Não subsistem dúvidas que foi por essa razão que se introduziu a referência no n.º 2 da cláusula 12.ª do contrato que o pagamento do prémio ao terceiro classificado apenas seria efetuado se este fosse “apurado para a Liga dos Campeões”, o que manifestamente não sucede, nem pode ser confundido, com a mera participação nas pré-eliminatórias da referida competição.
·   Efetivamente o Autor e a Ré, na data da celebração do contrato, conheciam o único motivo pelo qual foi introduzida a ressalva, quanto ao terceiro classificado, de que o prémio só seria atribuído se este último fosse apurado para a Liga dos Campeões.
·   Assim resulta claro do contrato em apreço que tal prémio tem caráter eventual e apenas seria devido se a equipa de futebol do Autor tivesse garantido o acesso, após a pré-eliminatória, à Liga dos Campeões, o que não aconteceu.
·   Aliás, a própria denominação pré-eliminatórias denuncia que são um momento prévio à própria competição, condição para que uma equipa seja efetivamente apurada.
·  Após a 1.ª e 2.ª mãos da pré-eliminatória, a equipa de futebol da A. não logrou apurar para a “Champions League” ou Liga dos Campeões (tendo sido, a final, apurada a equipa .…).
·  Foi esta, aliás, a convicção legítima da Ré seguradora aquando da estipulação do prémio previsto no n.º 2 da Cláusula 12.ª do "Contrato de Patrocínio" celebrado entre o Autor e a Ré, conforme o referiu inequivocamente a testemunha M, Diretor Técnico dos Serviços Jurídicos da Ré seguradora ao tempo dos factos e que deu o seu parecer sobre os aspetos legais daquele, cujo depoimento foi prestado na sessão de julgamento de 03.03.2011 e ficou registado digitalmente (vide Ata de Audiência de Julgamento respetiva – Ref.ª 16366781).
·  Aliás, o julgar-se tal facto como provado como o fez o tribunal a quo mostra-se – cremos -totalmente contraditório com o facto igualmente dado como provado de que  «Os jogos da 1.ª e 2.ª mãos da pré-eliminatória, que opuseram a equipa suíça “B” ao “V”, realizaram-se nos dias 13/08/2008 e 27/08/2008, sendo que a equipa de futebol do A. não se logrou apurar para a “Champions League” ou Liga dos Campeões, tendo sido, a final, apurada a equipa “B”» (vide alínea T) dos factos dados por assentes).
·  Acresce que, na argumentação plasmada na douta sentença de que ora se recorre, o Tribunal a quo, atendeu a um argumento utilizado pelo Autor segundo o qual o prémio estabelecido pelas partes pretendia promover e incentivar a classificação final em 3.º lugar, uma vez que esta classificação final só por si teria como consequência uma maior visibilidade da equipa e consequentemente do logótipo da Recorrente.
·  Ora, este argumento não deve ser atendido uma vez que tal importaria concluir, com o devido respeito por este tribunal, que é muito, e salvo melhor opinião, ad absurdum, do mesmo modo relativamente ao quarto, quinto e até sexto lugar, uma vez que a cláusula em apreço refere “ (..)Primeiro, segundo e terceiro classificado (este último desde que apurado para a liga dos campeões) - €25.000,00 (vinte e cinco mil euros); Quarto, quinto e sexto classificado (este último desde que apurado para a Taça UEFA) - €15.000,00 (quinze mil euros). (..)”.
·  Admitindo-se, meramente a benefício de raciocínio, que o terceiro lugar fosse ainda eventualmente passível de aumentar a notoriedade e consequente visibilidade da equipa e do patrocinador, encontrando-se justificada a atribuição do prémio, o mesmo não se pode manifestamente admitir relativamente aos lugares subsequentes.
·  O tribunal a quo fez, assim, uma incorreta apreciação da prova no que concerne à matéria referente à interpretação, devendo considerar-se não provada a matéria constante do artigos 2.º da douta base instrutória, com a seguinte redação: 2.º A pré-eliminatória já é parte integrante da competição da Liga dos campeões Europeus?
·  Resultou provado que, no dia 29.06.2007 a Autora e a Ré celebraram um contrato designado “Contrato de Patrocínio Patrocinador Principal das Camisolas Oficiais do A…”.
·  O Autor, fazendo uso da faculdade que lhe era conferida pela cláusula 11.ª do contrato, procedeu à denúncia do mesmo, por carta remetida à ora Recorrente, com data de 05.06.2008, a qual, nos termos contratuais, produziu os seus efeitos no dia 01.07.2008.
·  Nos termos do n.º 2 da cláusula 12.ª do contrato estabelecia-se que “Para além destes valores e consoante a classificação final da segunda outorgante, a primeira outorgante  compromete-se a efetuar os pagamentos dos seguintes prémios durante o período de duração do contrato: · Primeiro, segundo e terceiro classificado (este último desde que apurado para a liga dos campeões) - €25.000,00 (vinte e cinco mil euros); · Quarto, quinto e sexto classificado (este último desde que apurado para a Taça UEFA) - €15.000,00 (quinze mil euros).”
·  Esta cláusula sujeitava a atribuição do prémio a uma condição suspensiva e, no caso concreto em apreço (terceiro classificado), a duas condições suspensivas – terminar o campeonato como terceiro classificado e ser apurado para a Liga dos Campeões.
·  Dispõe o artigo 270.º do Código Civil: “As partes podem subordinar a um acontecimento futuro e incerto a produção dos efeitos do negócio jurídico ou a sua resolução: no primeiro caso diz-se suspensiva a condição; no segundo, resolutiva”.
·  Ora, resulta da prova produzida em primeira instância que “ Os jogos da 1.ª e 2.ª mãos da pré-eliminatória, que opuseram a equipa “B” ao “A”, realizaram-se nos dias 13/08/2008 e 27/08/2008, sendo que a equipa de futebol do A. não se logrou apurar para a “Champions League” ou Liga dos Campeões, tendo sido, a final, apurada a equipa “”B” – (Al.T) dos factos dados por assentes);” (ponto 20) do segundo capitulo - II Matéria de facto).
·  Pelo que a segunda condição resolutiva estabelecida na cláusula 12.ª do contrato, para pagamento do prémio em caso da Autora obter a terceira classificação, não se encontra verificada “(…)e terceiro classificado (este último desde que apurado para a Liga dos campeões) - €25.000,00 (vinte e cinco mil euros)(…)”.
·  Não se tendo verificado esse evento futuro e incerto, o apuramento, nada seria devido à Recorrida na qualidade de prémio.
·  O artigo 236.º n.º1 do Código Civil dispõe que “a declaração vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante”.
·  Aqui prevalece o entendimento que um declaratário diligente, sagaz e experiente, colocado na posição do contraente deva deduzir do comportamento do declarante.
·  Pelo que não se concede que com a expressão “apuramento” os contraentes se bastassem com a simples disputa dos jogos da 1.ª e 2.ª mãos da pré-eliminatória e, menos ainda, que a disputa dos jogos da 1.ª e 2.ª mãos da pré-eliminatória ocorressem sem fazer a publicidade à Ré, principal prestação a que o Autor se comprometeu nos termos do contrato.
·  Ainda assim, o Autor disputou a pré-eliminatória da Liga dos Campeões após a denúncia do contrato, pelo que nas datas de realização dos jogos da 1.ª e 2.ª mão que opuseram a equipa … ao A…, o contrato já havia cessado, uma vez que a denúncia efetuada pela Recorrida produziu os seus efeitos no dia 01.07.2008.
·  Pelo que o prémio de €25.000,00 só seria devido se o Autor, na época que se iniciou em 01.07.2007 e terminou em 30.06.2008, tivesse disputado a Liga dos Campeões. Tal não aconteceu.
·  A pagar-se qualquer prémio, o que não se concede, este seria devido apenas durante o “período de duração de contrato” e não já após a cessação deste.
·  Ainda assim, de acordo com a velha máxima “falsa demonstratio non nocet”, o n.º 2 o artigo 236.º estabelece que sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida.
·  Admitindo a Ré, ora Recorrente, meramente a benefício de raciocínio, que o termo utilizado para definir a condição suspensiva a que o pagamento do prémio ora em apreço, “apuramento”, é ambíguo, resulta da norma supra referida que a ambiguidade objetiva, ou até a inexatidão, da expressão utilizada não impedem a relevância da vontade real, se o destinatário a conheceu, uma vez que existirá uma coincidência de sentidos (o querido e o compreendido), sendo este o sentido decisivo.
·  Assim, o Autor, atendendo ao tipo de pessoa coletiva que é e à sua longa experiência nesta área, era, no mínimo, conhecedora do sentido (e da vontade) com que a Ré acordou o pagamento do prémio – o efetivo apuramento e não a mera disputa das pré-eliminatórias.
·  Assiste razão à douta sentença recorrida quando refere “ (..) em caso de dúvida sobre o sentido da declaração, deve prevalecer, nos negócios onerosos, o que conduzir ao maior equilíbrio das prestações (Art.º 237.º , 2.ª parte, do C.C. )(..)”. Chega, porém, a uma conclusão, salvo o devido respeito, errónea. Esse equilíbrio não foi assegurado quando o Autor denunciou o contrato, não assegurando a manutenção da publicidade nos jogos através da utilização do logótipo da Ré no equipamento assim como através dos demais meios acordados.
·  O Autor apenas teria legitimidade para reclamar o prémio que ora se discute, caso tivesse assegurado a publicidade à Ré na disputa dos jogos na pré-eliminatória, o que não ocorreu.
· Na verdade, ao invés, acabou por denunciar o contrato e celebrar com outro patrocinador um novo contrato, envergando o logótipo deste novo patrocinador na disputa dos jogos das pré-eliminatórias, tudo legitimamente do ponto de vista da ordem jurídica e apenas passível de ser censurado da perspetiva moralista.
·  Contudo, ao adotar esta conduta, o Autor passou a carecer de legitimidade para reclamar qualquer prémio.
·  Sendo certo que o elemento literal de um contrato constitui um limite à interpretação que se pode fazer do mesmo, não é possível validar - como o fez o tribunal a quo – a interpretação do Autor, ora Recorrido, do n.º 2 da cláusula 12.ª do contrato em causa
·  Ainda assim, e admitindo, uma vez mais, meramente a benefício de raciocínio, que a Ré se bastava com a mera disputa da pré-eliminatória, essa disputa teria que ocorrer ainda durante a vigência do contrato, estando o Autor obrigada à sua contraprestação – publicitar a Ré. Caso assim não fosse, não se vislumbra a ratio de tal prémio.
· Na verdade o que a Ré, ora Recorrente, pretendeu estimular ao acordar o prémio foi o apuramento para a Liga dos Campeões, para que a disputa desses jogos ocorresse com o logótipo da Ré inserido no equipamento, aumentando a sua visibilidade a uma escala internacional, pelo que carecia de qualquer sentido a Ré estar obrigada a pagar o prémio em apreço sem ter nenhuma contrapartida, direta ou indireta.
·  Repare-se que a cláusula em apreço incluía a atribuição de um prémio mesmo que a Recorrida terminasse o campeonato classificado no 6.º lugar.
·  Acresce que, no próprio dia em que produziu efeitos a denúncia do contrato, o Autor celebrou com a “F” um novo contrato de patrocínio, tendo disputado a 1.ª e 2.ª mão das pré-eliminatórias já com o respetivo logótipo.
·  Ao adotar esta conduta, o Autor passou a carecer de legitimidade para reclamar qualquer prémio, sendo certo que tal intenção aliada à conduta supra descrita se mostra altamente reprovável e contraria o princípio da boa-fé, cuja extrema importância no âmbito dos contratos é bem conhecida.
·  Ainda assim, e admitindo, uma vez mais, meramente a benefício de raciocínio, que a Ré se bastava com a mera disputa da pré-eliminatória, essa disputa teria que ocorrer ainda durante a vigência do contrato, estando o Autor obrigado à sua contraprestação – publicitar a Ré. Caso assim não fosse, não se vislumbra a ratio de tal prémio.
·  Na verdade, o que a Ré, ora Recorrente, pretendeu estimular ao acordar o prémio foi o apuramento para a Liga dos Campeões, para que a disputa desses jogos ocorresse com o logótipo da Ré inserido no equipamento, aumentando a sua visibilidade a uma escala internacional, pelo que carecia de qualquer sentido a Ré estar obrigada a pagar o prémio em apreço sem ter nenhuma contrapartida, direta ou indireta.
·  Repita-se que a cláusula em apreço incluía a atribuição de um prémio mesmo que o Autor terminasse o campeonato classificado no 6.º lugar.
·  Pelo que, além de não ter sido efetivamente apurado para a Liga dos Campeões, condição suspensiva para que fosse pago o prémio, o Autor nem se dignou publicitar a Ré nos jogos disputados na pré-eliminatória, não se concedendo de modo algum, mesmo em teoria, que o prémio em apreço pudesse ser devido sem que se verificasse esta publicidade.
·  Tal entendimento colidiria frontalmente com o princípio da boa-fé no cumprimento das obrigações emergentes do contrato (cfr. art.º 762.º, n.º 2 e também o art.º 334.º, ambos do Código Civil).
·  A douta sentença ora recorrida violou o disposto nos art.os 236.º, n.os 1 e 2, 237.º, "parte segunda", 270.º, 334.º e 762.º, n.º 2, todos do Código Civil Nos termos expostos e no mais que o douto suprimento de V. Exas. sugerir, deve revogar-se a decisão proferida em primeira instância que recaiu sobre a matéria de facto ora impugnada nos termos do artigo 712.º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Civil e, consequentemente, alterada de igual modo, de direito, dando-se provimento à presente apelação nos estritos termos supra requeridos. E assim se fará JUSTIÇA.
6. Nas contra-alegações o A. pronunciou-se no sentido da manutenção do decidido.
7. Cumpre apreciar e decidir.
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            II – Os factos
            Nos presentes autos foram considerados provados os seguintes factos:
1. O A. é uma associação desportiva, cultural, recreativa, de utilidade pública, reconhecida por despacho ministerial, publicado no D.R. II Série,(cfr. doc. de fls 7) - (Al. A) dos factos dados por assentes);
2. No exercício da sua atividade desportiva, o A. participa com a sua equipa de futebol profissional em competições desportivas profissionais, nomeadamente, nas competições desportivas de futebol profissional organizadas pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional (cfr. doc. de fls 8) - (Al. B) dos factos dados por assentes);
3.  O A. explora, acessoriamente a essa atividade desportiva e de forma comercial, um conjunto de bens, nomeadamente, celebrando contratos de publicidade com terceiros que pretendem ver divulgados os seus produtos e marcas através de publicidade estática e outros meios de divulgação - (Al. C) dos factos dados por assentes);
4. No exercício dessa atividade o A. celebrou com a R., em 29 de junho de 2007, um acordo escrito denominado “Contrato de Patrocínio – Patrocinador Principal das Camisolas Oficiais do A..”, cfr. doc. de fls 9 a 14, cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais, adiante abreviadamente designado apenas por contrato - (Al. D) dos factos dados por assentes);
5. Nos termos desse acordo o A. obrigou-se a fazer inserir a referência à marca registada “…. Seguros”, da R. e respetivo logótipo nos equipamentos desportivos da sua equipa de futebol profissional (Sénior), conforme resulta da cláusula Primeira daquele contrato (cfr. cit. doc. a fls 9) - (Al. E) dos factos dados por assentes);
6. Na cláusula 2ª desse acordo as partes estabeleceram que: «A aludida publicidade será feita em regime de exclusividade, na parte da frente das Camisolas Oficiais de Jogo da Equipa, conforme o anexo (A) que é parte integrante deste contrato, bem como nos Equipamentos Técnicos (Treinadores, Departamento Médico, Auxiliares), em todos os jogos em que participe, em Portugal e no Estrangeiro, salvo se por questões de regulamentos de Competição o mesmo não for possível” (cfr. cit. doc. a fls 9) - (Al. F) dos factos dados por assentes);
7. Ainda por força do mesmo contrato, a publicidade à marca da R. seria feita no Estádio … e complexo desportivo do A., nos termos descritos na sua cláusula terceira (cfr. cit. doc. a fls 10) - (Al. G) dos factos dados por assentes);
8. Nas cláusulas quarta a nona, inclusive, do contrato eram, ainda previstas outras formas de publicidade à marca da R., incluindo o direito de esta utilizar lugares para assistência aos jogos do A. e o direito de promover ações de promoção com jogadores do A. - (Al. H) dos factos dados por assentes);
9. Nos termos da cláusula 11ª desse contrato, o mesmo foi celebrado por três épocas desportivas, com início em 1 de julho de 2007 e término em 30 de junho de 2010 (cfr. cit. doc. a fls 12) - (Al. I) dos factos dados por assentes);
10. Ficou igualmente estabelecido na cláusula 11ª desse contrato o direito de qualquer das partes pôr termo ao contrato, por denúncia, bastando, para tanto, a comunicação, por carta registada com aviso de receção, para a sede da outra contraente, entre 1 de junho e 15 de junho anterior à época desportiva (cfr. cit. doc. a fls 12) - (Al. J) dos factos dados por assentes);
11. Nos termos da parte final da cláusula 11ª do denominado “Contrato de Patrocínio” constava como tendo sido acordado que em caso de denúncia desse contrato entre 1 e 15 de junho anterior à época desportiva, não havia lugar a qualquer indemnização bem como ao pagamento de quaisquer prestações com vencimento posterior (cfr. cit. doc. a fls 12) – (Resposta ao 5º da base instrutória);
12. Como contrapartida financeira do contrato ficou estabelecido o seguinte na cláusula 12ª do contrato: «Pelo presente contrato a primeira outorgante (a aqui R.) compromete-se a efetuar o pagamento no montante de €250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros) para a época 2007/2008, €250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros) para a época 2008/2009 e €300.000,00 (trezentos mil euros) para a época 2009/2010. Aos referidos valores acresce IVA à taxa legal. «Para além destes valores e consoante a classificação final da segunda outorgante, a primeira outorgante compromete-se a efetuar os pagamentos dos seguintes prémios durante o período de duração do contrato: «-Primeiro, segundo e terceiro classificado (este último desde que apurado para a liga dos campeões) - €25.000,00 (vinte e cinco mil euros); «-Quarto, quinto e sexto classificado (este último desde que apurado para a Taça UEFA) - €15.000,00 (quinze mil euros).» (cfr. cit. doc. a fls 12) - (Al. L) dos factos dados por assentes e resposta ao 1º, 3º e 4º da base instrutória);
13. À data da celebração desse contrato, isto é 29/06/2007 (um dia antes do início da época desportiva) A. e R. já sabiam que, no caso da liga Portuguesa, o primeiro e segundo classificados do campeonato nacional organizado pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional teriam acesso direto à Liga dos Campeões, sabendo, igualmente, que o terceiro classificado teria que disputar as pré-eliminatórias para assegurar o apuramento para a Liga dos Campeões - (Al. M) dos factos dados por assentes);
14. Por carta remetida à R., com data de 5 de junho de 2008, o A., fazendo uso da faculdade que lhe é conferida pela cláusula 11ª do contrato, procedeu à denúncia do mesmo (cfr. doc. de fls 15), a qual, nos termos contratuais, produziu os seus efeitos no dia 1/7/2008, uma vez que a época desportiva então em curso terminou na véspera, ou seja, em 30/6/2008 - (Al. N) dos factos dados por assentes);
15. Na época de 2007/2008, finda em 30 de junho de 2008, o A. ficou classificado em terceiro lugar do campeonato - (Al. O) dos factos dados por assentes);
16. Pelo menos até ao dia 30/06/2008, o A. efetuou a referida publicidade e tinha tido disponível os lugares da R. - (Al. P) dos factos dados por assentes);
17. A R. nunca reclamou ao A. qualquer problema relativo aos serviços prestados - (Al. Q) dos factos dados por assentes);
18. A R. não pagou ao A. a quantia resultante do estipulado no n.º 2 da cláusula 12ª do contrato, no montante de €25.000,00, acrescida de I.V.A. a 21%, apesar de instada a fazê-lo pela remessa à R. da correspondente fatura, da qual constava que tinha data de vencimento na data da sua emissão, ou seja, 30/06/2008 (cfr. doc. de fls 16) - (Al. R) dos factos dados por assentes);
19. A época desportiva tem início no mês de julho de cada ano e terminando no mês de junho do ano seguinte - (Al. S) dos factos dados por assentes);
20. Os jogos da 1ª e 2ª mãos da pré-eliminatória, que opuseram a equipa suíça “B” ao “A…”, realizaram-se nos dias 13/08/2008 e 27/08/2008, sendo que a equipa de futebol do A. não se logrou apurar para a “Champions League” ou Liga dos Campeões, “fase de grupos”[1], tendo sido, a final, apurada a equipa … “B…” - (Al. T) dos factos dados por assentes);
21. A pré-eliminatória já é parte integrante da competição da Liga dos Campeões Europeus - (Resposta ao 2º da base instrutória);
22. O A. disputou as duas mãos da pré-eliminatória da Liga dos Campeões já após a denúncia do contrato dos autos, que produziu os seus efeitos no dia 01/07/2008 - (Al. U) dos factos dados por assentes);
23. A R. deu a conhecer ao A. a sua oposição sobre a interpretação da cláusula 12ª n.º 2 do contrato por meio de carta registada com aviso de receção datada de 24/07/2008, com a qual devolveu as faturas emitidas pelo A. (cfr. doc. de fls 56 a 60 cujo teor se dá por reproduzido para todos os efeitos legais) - (Al. V) dos factos dados por assentes);
24. A referida carta, por enfermar de alguns lapsos, foi ainda objeto de retificação pela R., retificação essa enviada ao A., por fax, em 04/08/2008 (cfr. doc. de fls 61 e 62 cujo teor se dá por reproduzido para todos os efeitos legais) - (Al. X) dos factos dados por assentes);
25. No próprio dia em que produziu efeitos a denúncia do contrato, o A. celebrou com a “F” um novo contrato de patrocínio por duas épocas e, alegadamente, por um valor de €650.000,00, o que foi veiculado por diversos órgãos de comunicação social (cfr. doc.s de fls 63 e 64) - (Al. Z) dos factos dados por assentes);
26. Durante os jogos da primeira e segunda mãos da pré-eliminatória para a Liga dos Campeões disputada pelo B e pelo A…, as camisolas do equipamento dos jogadores do A… já faziam publicidade ao “F”, conforme é visível das fotografias do jogo constantes de fls 65 e 66 - (Al. AA) dos factos dados por assentes).
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III – O Direito
Como se sabe o objeto do recurso é definido pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, importando em conformidade decidir as questões nelas colocadas, artigos 684.º, n.º 3, 660.º, n.º 2, e 713.º, todos do CPC, tendo em conta que o Tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos ou fundamentos que as partes indiquem para fazer valer o seu ponto de vista, sendo que, quanto ao enquadramento legal, não está o mesmo sujeito às razões jurídicas invocadas também pelas partes, pois o julgador é livre na interpretação e aplicação do direito, art.º 664, do mesmo diploma legal.
Nesse necessário atendimento, discorda a Apelante da decisão em termos da matéria de facto, bem como da subsunção jurídica realizada.
No concerne à impugnação da decisão sobre a matéria de facto, pretende a Recorrente que deveria ter sido dada resposta negativa ao artigo 2.º da base instrutória, no qual se perguntava: A pré-eliminatória já é parte integrante da competição da Liga dos Campeões Europeus? Que mereceu a resposta de Provado.
Alega para tanto, que a denominação denuncia que se está perante um momento prévio à própria competição, como condição para que uma equipa seja apurada, referenciando ser essa a convicção da Apelante aquando da estipulação do prémio no n.º 2 da cláusula 12.ª do contrato de patrocínio, como foi mencionado pela testemunha M, que deu o seu parecer sob os aspetos legais do acordo, sendo que ao dar-se como provado o facto, como o fez o Tribunal a quo, mostra-se totalmente contraditório com o igualmente dado como provado – Os jogos da 1.ª e 2.ª mãos da pré-eliminatória, que opuseram a equipa suíça “B” ao “V”, realizaram-se nos dias 13.8.2008 e 27.08.2008, sendo que a equipa de futebol do A. não se logrou apurar para a “Champions League” ou Liga dos Campeões, tendo sido, a final, apurada a equipa “B” (vide alínea T) dos factos dados como assentes).
No despacho de fls. 173, que fundamentou a decisão sobre a matéria de facto consignou-se:
Quanto ao ponto 2.º da base instrutória resulta do documento de fls. 80 a 83 e dos conhecimentos gerais sobre os Regulamentos da UEFA demonstrados pelas testemunhas J, funcionário do A., S, jurista e estudiosa de matérias relacionadas com “Contratos de Patrocínio”; e R, que trabalha na área dos contratos de patrocínio há mais de 30 anos, inicialmente para a “A” e agora para a “R”. Estes depoimentos, no seu essencial, não foram divergentes sobre a conclusão de as pré-eliminatórias se integravam no regulamento da UEFA relativo a esta competição. No que houve divergência foi apenas sobre o facto de, segundo as duas últimas mencionadas testemunhas, para efeitos de “patrocínios” é completamente diferente a participação numa pré-eliminatória da participação na “fase de grupos”. Mas, não havendo convergência testemunhal sobre este último facto, pelo menos no que ao contrato dos autos se refere, a resposta dada ao ponto 2.º da base instrutória limita-se a reconhecer que o facto é verdadeiro em face dos Regulamentos da UEFA.
Apreciando, não se questiona que a decisão sobre a matéria de facto proferida pela 1.ª instância pode ser alterada nas hipóteses previstas no art.º 712, do CPC[2], sendo que na reapreciação a executar, com a realização do necessário exame crítico dos elementos probatórios postos à consideração deste Tribunal, não sendo despicienda a exigência que os meios de prova indicados pela Recorrente sejam inequívocos quanto ao sentido pretendido por quem recorre, não deverá ser desprezada a limitação que a inexistência da imediação de forma necessária acarreta, numa presumível sindicância de erro manifesto na livre apreciação da prova, na exigência, contudo, de uma prudente convicção acerca de cada facto.
Assim, na formação da sua convicção, deverá este Tribunal conduzir-se com uma acrescida prudência, tendo em conta a apontada falta da imediação, bem como da oralidade, das quais, em princípio, não pode usufruir na formulação do seu juízo, quanto aos factos impugnados.
Se atentarmos ao invocado pela Recorrente, verifica-se que em causa está, sobretudo, a convicção que a mesma alega ter sido a sua, vertida em sede do contrato celebrado, no concerne ao factualismo em causa, e que terá sido explanada no depoimento prestado da testemunha indicada, que desempenha para ela as funções de Diretor dos Serviços Jurídicos, atendo-se também a considerações várias, em termos da natureza da atribuição patrimonial em questão nos autos na economia do contrato celebrado, cuja relevância se compreenderá em momento posterior no que à subsunção jurídica respeita, apontando, como se referiu, para a própria denominação utilizada.
Ora, não sendo despiciendo o teor literal, no caso a denominação “pré-eliminatória”, certo é que havendo que lançar mão a critérios interpretativos, necessário se torna a procura do sentido lógico, na devida consideração da unidade do sistema e na prossecução das finalidades visadas.
Por outro lado, configura-se que mais do que qualquer leitura que as partes possam agora vir fazer do factualismo em causa, importa analisar qual a sua eftiva dimensão na realidade existente, tendo em conta que se reporta a uma atividade, de cariz desportivo, internacional, sujeita a regulamentação específica, e tutelada por uma entidade independente.
Na verdade, encontra-se junto aos autos, a fls. 71[3], um documento datado de 11.8.2008, remetido pela UEFA, à Recorrida, que sob a designação “Admissão para a Liga dos Campeões da UEFA 2008/2009”,  consigna “(…) verificamos que o vosso clube preenche todos os requisitos necessários constantes do art.º 1.04 do Regulamento Liga dos Campeões da UEFA 2008/2009. Em concordância com o artigo 1.05 do regulamento supre referenciado, como tal temos o prazer de informar que o vosso clube foi admitido para a liga dos Campeões da UEFA da época 2008/2009 (…).
Com efeito, no Regulamento da Liga dos Campeões da UEFA de 2008/2009 (bem como o de 2007/2008)[4]  são estipulados no ponto 1.04 os critérios de admissão a cumprir pelo participante na competição, sendo o clube informado por escrito da sua admissão, caso os satisfaça, ponto 1.05., referenciando-se no art.º 6, o sistema de competição, descrevendo-o no ponto 6.01, como a fase de qualificação para a Liga dos Campeões, e a Liga dos Campeões, nesta última incluindo para além da fase de grupos, os quartos, semifinais e finais, correspondendo ao anexo IB, e calendário das competições, na qual se inclui a dos jogos da equipa da Recorrida.
Configura-se assim, que a competição da Liga dos Campeões, se quisermos para melhor compreensão, em sentido amplo, desenvolve-se em várias fases, uma das quais sendo aquela a que o Clube da Apelada acedeu, e uma fase em sentido estrito, que abrange a fase de grupos e as fases finais, estando contudo sujeitas às regras estipuladas, sem prejuízo de um maior rigor, maxime em termos organizativos, no que respeita às fases finais[5].
Também no sentido que já se estava no âmbito da competição, Liga dos Campeões, pronunciou-se a testemunha J, funcionário da Recorrida, responsável em termos de marketing, afirmando a necessidade de preencher todos os requisitos exigidos pela UEFA no que respeitava à organização do evento, nomeadamente, observando as determinações quanto a hino, bandeiras e restrições de publicidade.
Diga-se que o depoimento da testemunha S, que não tendo tido participação na elaboração no contrato, foi solicitada, devido aos seus conhecimentos académicos nas áreas do Direito ora em discussão a debruçar-se sobre o mesmo, não contraria de forma frontal o já explanado, pois no mesmo referenciou-se a existência de um regulamento da UEFA que, anualmente, rege a competição, fazendo a depoente uma distinção entre a fase de pré-qualificação e a de grupos, crescendo nesta última as obrigações, verificando-se uma maior exigência, à medida que a competição avança, o que aliás resulta do já acima mencionado.
Parecendo emanar do depoimento da também já referida testemunha M, uma ideia restrita de Liga de Campeões, limitada à fase de grupos, que não se configura que seja a decorrente da regulamentação da competição, globalmente falando, não se evidencia que exista fundamento para deferir a pretensão da Apelante, quanto à alteração pretendida.
Importa, contudo, aferir da possibilidade da invocada existência contradição entre o facto apurado no art.º 2 da base instrutória e a alínea T) dos factos assentes, acima explicitada.
Sabe-se que existe contradição entre os factos provados, quando sejam absolutamente incompatíveis entre si, de forma que uns não possam coexistir com os outros, resultando uma impossibilidade de saber onde está a realidade a considerar.
 Ora, conforme resulta do já exposto, inexiste qualquer contradição, no atendimento do desenvolvimento da competição nas fases apontadas, e decorrentemente na aceção ampla e estrita, assinaladas. No entanto, no âmbito da reapreciação da matéria de facto, suscitada aliás que foi pela Recorrente, nada obsta, que para uma melhor clarificação, tendo em conta o sistema de competição da Liga Europa, no sentido amplo do termo, tal como resulta da respetiva regulamentação, considerando que a equipa da Recorrida não ultrapassou a fase a que foi admitida, seja consignado que a mesma não se logrou apurar para a “Champions League ou Liga dos Campeões, “fase de grupos”, fazendo o respetivo aditamento no ponto n.º 20 dos factos provados.
Passando para a subsunção jurídica, discorda a Recorrente do decidido pondo em causa o entendimento no que respeita ao n.º 2 da cláusula 12.ª do contrato de patrocínio celebrado, e que estipulava: Para além destes valores[6] e consoante a classificação final da segunda outorgante, a primeira outorgante compromete-se a efetuar os pagamentos dos seguintes prémios durante o período da duração do contrato: - Primeiro, segundo e terceiro classificado (este último desde que apurado para a Liga dos Campeões) – 25.000,00€.
Diz a Apelante que esta cláusula sujeitava a atribuição do prémio, no caso concreto, a duas condições suspensivas, terminar o campeonato como terceiro classificado e ser classificado para a Liga dos Campeões, não se tendo verificado esta última. Mais invoca que não bastava um simples apuramento, sendo até que os jogos foram disputados após a denúncia do contrato, pelo que o prémio só seria devido se a equipa da Recorrida, na época que se iniciou em 1.07.2007 e terminou em 30.06.2008, tivesse disputado a Liga dos Campeões, o que não aconteceu.
Refere também na equivocidade do sentido da declaração, que o equilíbrio das prestações não foi assegurado porque quando a Recorrida denunciou o contrato, não assegurou a manutenção da publicidade, sendo que mesmo a entender-se que bastava a mera disputa da pré-eliminatória, teria esta de ocorrer ainda durante a vigência do contrato, não estando obrigada, doutra forma, à contraprestação, só assim se compreendendo a ratio da atribuição do prémio
Apreciando, não surge controvertido que no caso sob análise as partes celebraram um contrato de patrocínio, definido como o acordo pelo qual uma pessoa, o patrocinado, se obriga a garantir, pela sua participação num evento, a presença neste da marca ou demais sinais distintivos de uma outra pessoa, chamado patrocinador, com vista à sua difusão junto do público, imediato e mediato, deste acontecimento, mediante assistência financeira e/ou material fornecida pelo patrocinador[7].
Afastando-se a existência de uma única figura contratual, tendo até em conta a diversidade de manifestações abrangidas[8], relevam para o caso sob análise, os celebrados no âmbito desportivo, dirigido ao patrocínio de equipas profissionais de clubes desportivos, em que o patrocinado se obriga a veicular a imagem do patrocinador no desenvolvimento da sua atividade desportiva, mas também social, com a aposição do respetivo logótipo, marca ou nome da empresa, nos materiais utilizados pelos desportistas e técnicos, nas atividades com repercussões mediáticas, bem como assegurando determinados espaços de publicidade estática.
Em contrapartida de tais prestações, geralmente, o patrocinador obriga-se ao pagamento de uma quantia em dinheiro, fixada em termos globais para toda a época desportiva, referenciando-se ser frequente, prever-se, uma segunda prestação, também pecuniária, eventual, designada por prémio, determinada em função das classificações que a equipa patrocinada tenha alcançado no campeonato em que participou, assim como, nos torneios e taças, nacionais ou internacionais, que tenha disputado[9].
Consubstanciando-se sobretudo num instrumento de promoção da imagem empresarial do patrocinador[10], resulta que o patrocinado vincula-se a uma prestação enquanto meio de implementar um certo programa negocial, através do qual o patrocinador vida realizar o objetivo do retorno publicitário[11], e dessa forma quanto ao efeito publicitário visado pelo patrocinador, o patrocinado assume não uma obrigação de resultado, mas sim de meios, não estando adstrito a produzir o resultado subsequente que o credor quer extrair da sua prestação, embora não seja tal resultado irrelevante, no atendimento do projeto estabelecido, nomeadamente na possibilidade de acréscimo de notoriedade e reforço da imagem do patrocinador.
Divisando-se de forma necessária uma margem de aleatoriedade, aponta-se[12] como instrumentos da redução da mesma, a aposição das designadas cláusulas de valorização, como as mencionadas, segundo o qual o montante do patrocínio é determinado em função dos resultados alcançados, pois destes depende a repercussão mediática do patrocínio. Já por parte do patrocinado, e na medida em que este não poderá garantir os resultados do almejado retorno publicitário, a  redução da álea do negócio, passará pela imposição de um conjunto concretizado de obrigações de facere, nas também de não facere, bem como de autorizar que o patrocinador utilize espaços ou mesmo a sua imagem, conforme acima já se apontou.
Patenteando-se a forte ligação à atividade publicitária, encontra-se prevista no Código da Publicidade[13], no art.º 24, o patrocínio audiovisual, estabelecendo-se as respetivas regras, sendo que, numa maior abrangência, e para além da sujeição ao direito da publicidade, ficarão sujeitos às regras gerais do direito dos contratos.
Aqui chegados, temos que a discordância nos presente autos prende-se com a interpretação a dar à cláusula acima enunciada, e decorrentemente da existência da obrigação de pagamento, sendo que conforme foi evidenciado em sede da decisão sob recurso, não resultou apurada a vontade real das partes, vertida em sede da base instrutória, necessário se mostrando o recurso aos critérios legais interpretativos, constantes dos artigos 236 e seguintes do CC.
Em tal âmbito, considerou-se na decisão sob recurso: (…) A interpretação que deve prevalecer do contrato, em face do seu equilíbrio económico e dos fins por ele pretendidos prosseguir, levam-nos a considerar que os 25.000,00€, mais IVA, eram devidos por referência à época desportiva de 2007/2008, porque ficou convencionado que essa quantia correspondia à valorização da prestação do A. por ter alcançado o 3.º lugar no campeonato nacional, que nesse ano dava acesso à “Liga dos Campeões”, ficando a R. associado a esse facto, com a consequente maior projeção publicitária da sua marca e logótipo, como era por si certamente pretendido alcançar. (…)
Apreciando, tendo presentes os critérios interpretativos enunciados nos art.º 236 a 238, do CC, retenha-se desde logo, e como regra nos negócios jurídicos em geral, que a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, tido por alguém medianamente sagaz, diligente e prudente[14], colocado na posição do real declaratário – no sentido de não só em face aos próprios termos da declaração, mas também na consideração das circunstâncias concomitantes, anteriores e posteriores relacionadas, e ainda perante os interesses em jogo, o seu razoável tratamento, as finalidades prosseguidas pelo declarante, usos, práticas e normativos aplicáveis[15] – pode deduzir do comportamento, a não ser que não seja razoável imputar ao declarante aquele sentido, ou o declaratário conheça a vontade real do declarante, art.º 236, conhecendo-se, igualmente, quanto aos negócios formais, o limite da declaração não poder valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência com o texto do documento, ainda que expresso de modo imperfeito, 238, n.º1.
Também se salienta[16] que a interpretação do negócio jurídico deve ser encarada de forma essencialmente objetiva, não tendo como incidência a vontade interior dos contraentes, mas sim um comportamento significativo, como uma operação concreta, tendo em conta o conjunto do negócio, sem deixar de ser temperado com o princípio da tutela da confiança.
Atente-se ainda ao disposto no art.º 237, do CC[17], confinado aos casos duvidosos, não prevalecendo sobre as regras do art.º 236, do mesmo diploma, aplicando-se apenas se estas últimas não puderem definir o sentido da declaração[18].
Reportando-nos aos presente autos, e afastado que foi o entendimento restrito defendido pela Recorrente no concerne à Liga dos Campeões, resulta inquestionável que verificado se mostra que a Apelada satisfez as premissas relativas à obtenção do 3.º lugar no campeonato nacional, bem como o apuramento para a liga dos campeões, de que dependeria a atribuição patrimonial de 25.000,00€, sendo que, o “apuramento” face ao já referenciado, e tendo em conta as várias fases da competição, não inculca a ideia, que a Recorrente defende, da disputa de um determinado número de jogos, ou o alcançar de uma fase específica da mesma competição.
Por sua vez, no concerne à designação da referida atribuição patrimonial, a mesma vem efetivamente mencionada como “prémio”, não estranha a este tipo de contratos no âmbito desportivo, como já se referiu, o que em termos literais incute a ideia de que se está perante uma prestação de cariz não estritamente remuneratório, idêntico às demais prestações com tal natureza fixadas no contrato. 
E nesse sentido milita igualmente o facto que a prestação dever corresponder a um período de duração do contrato, estimada para três épocas desportivas, mas com possibilidade de qualquer das partes o denunciar, desde que o comunicasse por carta registada aviso de receção, entre 1 de junho e 15 de junho anterior à época desportiva.
Com efeito, se reportado para desempenho posterior, como seria o caso da participação do clube da Recorrida em jogos, em fases da Liga dos Campeões, poderia ficar por satisfazer a prestação, na última temporada, ou se uma das partes fizesse cessar o contrato, maxime a Recorrente, assim se desonerando da sua obrigação, em termos que não se coadunariam com a tutela da boa fé.
Por outro lado e quanto à falta da ratio da atribuição patrimonial como prémio face aos objetivos alcançados pela equipa da Recorrida, configura-se que a mesma existe, pois, tendo em conta o tipo de contrato em causa, em que  sobretudo se visa a promoção da imagem ou nome do patrocinador, obtendo o pretendido “retorno publicitário”, é do conhecimento normal, que numa atividade tão mediatizada como o futebol, não é  irrelevante uma equipa ter um desempenho de fim de tabela, ou já mediano, ou mais ainda mostrar uma combatividade que o leva aos lugares cimeiros, que importa num conjunto de vitórias, numa manifesta visibilidade, junto e na comparação com os designados “grandes”,  num ano até, que o terceiro lugar dava lugar ao acesso à liga dos campeões.
Verifica-se desse modo e necessariamente, um acréscimo positivo de notoriedade e um reforço da imagem do patrocinado, que resultando de fatores aleatórios, é premiada com satisfação de uma prestação monetária, como a acordada.
Diga-se, por último, e não menos relevantemente, que o entendimento perfilhado, balizado nos termos estritos do contratado, na medida a que se reporta a atividade desenvolvida durante a respetiva duração, não gera um desequilíbrio entre prestações, contrariando as regras da boa fé, pois como vimos, não pode deixar de considerar-se que a Recorrente teve um retorno decorrente do alcançado em termos desportivos pela Recorrida, mais se podendo dizer, ex abundantis, que, sendo a Liga dos Campeões, designada nos “media” pela “liga milionária”, mostrar-se-ia escassa a contrapartida devida pela participação nos jogos da mesma, comparada com os montantes já estipulados e reportados, no essencial a provas com relevo nacional, o que não se configura como sendo o mais conforme com a realidade das coisas.
Falecem, assim, e na totalidade, as conclusões formuladas pela Recorrente.   
*
IV – DECISÃO
Nestes termos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação, em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
           Custas pela Apelante.
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Lisboa, 20 de Março de 2012

Ana Resende
Dina Monteiro
Luís Espírito Santo
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[1] Aditado, como à frente se verá.
[2] Não se acolhendo a ideia de uma impugnação generalizada da matéria de facto, no sentido de um novo e integral julgamento.
[3] Traduzido a fls. 81.
[4] A que se pode aceder através do website oficial, www.uefa.com/
[5] Veja-se no art.º 12, o caso da categoria dos Estádios, que serão de 2.ª (segundo a regulamentação de infraestruturas da UEFA) para a 1.ª e 2.ª qualificativa, mas de 3.ª categoria para 3.ª qualificativa até à semifinal e de elite para a final.
[6] Como contrapartida financeira do contrato ficou estabelecido o seguinte na cláusula 12ª. – Pelo presente contrato a primeira outorgante ( a R.) compromete-se a efetuar o pagamento no montante de 250.000,00€, para a época 2007/2008, 250.000,00€, para a época 2008/2009 e 300.000,00€ para a época 2009/2010. Aos referidos valores acresce IVA à taxa legal.
[7] Cfr. Alexandre Libório Dias Pereira, Contratos de Patrocínio Publicitário (Sponsoring), in R.O.A, ano 58, pag. 324.
[8] De caráter desportivo, cultural, filantrópico, artístico.
[9] Cfr. António Payan Martins, in O Contrato de Patrocínio – Subsídios para o estudo de um novo tipo contratual, Direito e Justiça, Revista da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, vol. XII, tomo 2. pag. 198
[10] Cfr. Alexandre Libório Dias Pereira, obra referida a fls, 333, citando António Pinto Monteiro in Contratos de Agência, Concessão e Franquia, Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra.
[11] Crf. António Payan Martins, obra referida a fls. 242,
[12] Cfr. Alexandre Libório Dias Pereira, obra referida a fls. 330.
[13] DL 330/90, de 23 de outubro, com as alterações do DL 275/98, de 9 de setembro e da Lei 37/2007, de 14 de agosto, em termos de aplicabilidade aos presentes autos.
[14] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, I, vol. 222 e segs.
[15] Cfr. Ac. STJ de 13.1.2009, in www.dgsi.pt.
[16] Cfr. Menezes Cordeiro, in Tratado do Direito Civil Português, I, Parte Geral, Tomo I, 1999, pag. 478.
[17] Em caso de dúvida sobre o sentido da declaração, prevalece nos negócios gratuitos, o menos gravoso para o disponente e, nos onerosos, o que conduzir ao maior equilíbrio das prestações.
[18] Cr. Pires de Lima e Antunes Varela, obra citada, referindo a aplicação para os casos em que a interpretação com base nos critérios previstos no art.º 236, comporta dois ou mais sentidos, com razões de igual força.