Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
18915/10.6YYLSB.L1-8
Relator: AMÉLIA AMEIXOEIRA
Descritores: TÍTULO EXECUTIVO
FACTURA
AUTARQUIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/21/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I - Nos termos do disposto na alínea c) do artigo 46º do Código de Processo Civil são títulos executivos, os “documentos particulares, assinados pelo devedor, que importem constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável, ou de obrigação de entrega de coisa ou de prestação de facto”.
II - É assim exigível que os documentos sejam assinados pelo devedor, o que significa que, no caso de pessoas colectivas, o subscritor terá de ter poderes bastantes para obrigar a entidade que administra ou representa.
III – Sendo a executada uma autarquia local, está a formação e a manifestação da sua vontade, bem como os poderes e competências dos seus órgãos, expressamente regulada por normas de direito público.
IV - É ao Presidente da Junta de Freguesia que cabe representá-la em juízo e fora dele bem como assinar toda a correspondência (Lei nº 169/99, de 18 de Setembro, artº 38º, nº 1, al. a) e n)).
V - É à Junta de Freguesia, por sua vez, que compete adquirir e alienar bens e celebrar contratos (art.º 34º do mesmo diploma legal), cabendo também por isso à Junta, por maioria de razão, confessar e reconhecer dívidas.
(ISM)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 8ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

RELATÓRIO:
A…, Lda, veio propor acção executiva, para pagamento de quantia certa, contra a Freguesia de B…, para desta haver a quantia de 669.034,23, juntando como títulos executivos 6 facturas emitidas pela exequente em nome da executada, ao abrigo do art. 46º c), do CPC.
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Em sede liminar, foi proferido o seguinte despacho:
A questão que se põe é a de saber se o requerimento executivo deve ou não ser liminarmente indeferido.
A acção executiva, que visa a realização efectiva, por meios coercivos, do direito violado, tem por suporte um título que constitui a matriz ou limite quantitativo e qualitativo da prestação a que se reporta (art. 45º, nº1, do CPC).
O título executivo é, em termos substanciais, um instrumento legal de demonstração da existência do direito exequendo e a sua exequibilidade resulta da relativa certeza ou da suficiência da probabilidade da existência da obrigação nele consubstanciada (C. Mendes, Lições de Processo Civil, 69/70 e Manuel de Andrade, Noções Elementares, pág. 60).
Nos presentes autos os títulos executivos apresentados são facturas que a exequente entende serem títulos executivos. Analisadas as facturas em causa verifica-se que em nenhuma delas se encontra aposta qualquer assinatura, nem da exequente, nem da executada.
Do exposto resulta que não constando das facturas assinatura de alguém que vincule a executada, não pode ter-se a mesma como documento enquadrável no âmbito do art. 46º c), do CPC, pois nos termos deste preceito legal, apenas são títulos executivos os documentos particulares, assinados pelo devedor, que importem constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias.
Assim sendo, temos que concluir que a exequente não dispõe de título executivo pelo que a execução deverá ser liminarmente indeferida art. 812º-E, n.º1,a), do CPC.
A exequente suportará, porque decaiu liminarmente na execução, as custas respectivas (art. 446º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
Pelo exposto, indefiro liminarmente a execução apresentada por A... ..., Lda
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Inconformada com o teor da decisão, dela veio interpor recurso a Exequente, concluindo da forma seguinte:
1) O presente recurso foi interposto pela Exequente A… Lda, da douta Sentença, proferida em 12 de Abril de 2011, que indeferiu liminarmente, por falta de título executivo, o requerimento executivo que deu origem ao processo supra identificado, condenando, em consequência, a ora Apelante no pagamento das custas judiciais devidas;
2) Na óptica da ora Apelante, o recurso merece inteiro provimento. Na verdade, a decisão que se contesta, não foi a mais acertada, nem a mais correcta, relativamente às questões de direito analisadas e que sustentam o desfecho promovido pelos Juízos de Execução de Lisboa;
3) No requerimento executivo, a Exequente alega e prova que, a pedido da Executada, foram fornecidos equipamentos e prestados serviços que originaram a emissão de 6 facturas, vencidas e não pagas, emitidas pelo valor total de 570.735,25 € (quinhentos e setenta mil, setecentos e trinta e cinco euros e vinte e cinco cêntimos);
4) No mesmo libelo inicial, a Exequente junta dois documentos, emitidos pela Executada, em que esta se reconhece devedora dos valores titulados por aquelas 6 facturas;
5) Os documentos que servem de base à execução então promovida são duas declarações, enviadas pela Junta de Freguesia de … ao Banco … e nas quais, a primeira se reconhece devedora (importando a constituição de uma obrigação pecuniária) da sociedade ora Apelante.
6) Do exposto resulta já e sem mais que a sociedade Exequente dispõe de título executivo bastante uma vez que as declarações em questão são “documentos particulares, assinados pelo devedor, que importem constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável, ou de obrigação de entrega de coisa ou de prestação de facto”.
7) Na sentença ora posta em crise, o Tribunal a quo afirma que “Nos presentes autos os títulos executivos apresentados são facturas que a exequente entende serem títulos executivos”.
8) Nada de mais errado, pois que, tal como já tivemos oportunidade de referir, não são as facturas vencidas e não pagas que constituem títulos executivos bastantes que habilitam a sociedade Exequente a recorrer ao processo executivo, mas antes as declarações emitidas pela Junta de Freguesia de ….
9) Foi precisamente porque dispunha de reconhecimentos de dívida (declarações emitidas pela Junta de Freguesia de …) e atenta a impossibilidade de recuperação extrajudicial do seu crédito, que a ora Apelante se viu forçada a recorrer aos Tribunais, instaurando o competente processo executivo.
10) Nos termos da Lei, “Toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva.” Por seu turno, o artigo 46º do mesmo diploma legal, que prevê actualmente as espécies de títulos executivos, tem sido objecto de várias alterações legislativas, sempre no sentido de obter o alargamento do leque dos documentos a que a Lei atribui força executiva.
11) No presente caso importa apenas atender à alínea d) deste preceito, nos termos da qual podem servir de base à execução os documentos particulares, assinados pelo devedor, que importem reconhecimento de obrigações pecuniárias cujo montante seja determinado.
12) As declarações emitidas pela Executada e juntas aos autos contêm um inequívoco reconhecimento da existência das dívidas, dos seus montantes e prazos de pagamento, pelo que, nos termos da Lei, preenchem integralmente os requisitos constantes desta alínea d) do artigo 46º do Código de Processo Civil.
13) Sendo por isso forçoso concluir que estamos na presença de títulos executivos.
14) Isto porque, são duas declarações impressas em papel timbrado da Executada, datadas de 18 de Julho de 2008, carimbadas e assinadas, dirigidas ao Banco… com o seguinte assunto:
Confirmação de Créditos e pagamento. Mais referem o seguinte: “Vimos por este meio confirmar que tomámos conhecimento da cessão pela A… Lda a V. Exas. dos créditos abaixo relacionados e assumir a obrigação de pagar integralmente os mesmos créditos nas suas datas de vencimento, renunciando, nomeadamente a invocar perante V. Exas. quaisquer direitos nossos sobre a empresa cedente que pudessem levar a que tais créditos não fossem total ou parcialmente devidos. Assim sendo, procederemos ao pagamento dos créditos em causa por meio de depósito ou transferência bancária para a conta NIB …, de que o Banco … é titular, ou ainda por meio de cheque à sua ordem, a entregar na Av. …, n.º …, .º Andar, 0000-000 …”.
15) São, cremos, documentos de tal forma claros, inequívocos e eloquentes que é ilegítimo não considerá-los como títulos executivos.
16) Ora, em face do exposto, dúvidas não restam sobre a procedência do presente recurso.
Conclui no sentido de ser dado inteiro provimento ao recurso de apelação, revogando-se, em consequência, a decisão recorrida, sendo a mesma substituída por outra em que se acolham as razões invocadas pelo apelante e se ordene o prosseguimento da execução requerida pela sociedade exequente.
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A executada apresentou contra-alegações, concluindo da forma seguinte:
1ª- A executada, recorrida nestes autos, é uma autarquia local, estando a formação e a manifestação da sua vontade, bem como os poderes e competências dos seus órgãos, regulada por normas de direito público.
2ª- É ao Presidente da Junta de Freguesia que cabe representá-la em juízo e fora dele bem como assinar toda a correspondência (Lei nº 169/99, de 18 de Setembro, art.º 38º, nº 1, al. a) e n)).
3ª- Compete, por sua vez, à Junta de Freguesia adquirir e alienar bens e celebrar contratos (art.º 34º do mesmo diploma legal), cabendo também por isso à Junta, por maioria de razão, confessar e reconhecer dívidas.
4ª- Uma aquisição no valor de € 570.735,25 não poderia, por imposição legal, ser decidida senão pela junta de freguesia, nunca pelo seu presidente ou pelo seu substituto, mesmo autorizados por uma delegação de poderes, e muito menos o podia ser por qualquer vogal (art. 29º, nº 2 do Decreto-lei nº 197/99).
5ª- Assim sendo, não pode ser tida por confessória uma declaração assinada por quem, de toda a evidência, não detém, nem invoca, qualidade legal ou poderes que lhe permitam subscrevê-la e que não menciona sequer a deliberação do órgão competente que sustenta essa declaração.
6ª- Não se pode, por isso, dizer, como pretende a apelante, que esses documentos estão assinados pelo devedor.
7ª- As declarações em causa não reúnem, deste modo, os requisitos para que possam constituir títulos executivos.
Termos em que, nos melhores de direito e sempre com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser julgado improcedente e mantida a douta decisão recorrida
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:
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QUESTÃO A DECIDIR:
Saber se as duas declarações impressas em papel timbrado da Executada, datadas de 18 de Julho de 2008, carimbadas e assinadas, dirigidas ao BANCO…, constituem título executivo.
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DE DIREITO:
Para «que possa ter lugar a realização coactiva duma prestação devida (ou do seu equivalente), há que satisfazer dois tipos de condição, dos quais depende a exequibilidade do direito à prestação:
O dever de prestar deve constar dum título: o titulo executivo.
A prestação deve mostrar-se certa, exigível e líquida», os quais «como pressupostos processuais (e.) são requisitos de admissibilidade da acção executiva» (Lebre de Freitas, A Acção Executiva Depois da Reforma, 4° Edição, pág. 29).
O título executivo faz presumir ou indiciar, com o grau de probabilidade exigido na lei processual (art.45°, do Cód. de Proc. Civil), a existência do direito a uma prestação, sendo dever do exequente, tão só, juntar ao requerimento inicial da execução o título executivo. Todavia, dado que a acção executiva pressupõe o incumprimento e, por isso, a violação actual e efectiva da prestação, há, por vezes, que verificar ou acertar autonomamente a existência de determinadas características de que se deve revestir a obrigação exequenda, que são a certeza, a exigibilidade e a liquidez da obrigação (Remédio Marques, Curso de Processo Executivo à Face do Código Revisto, Almedina, págs. 85/86).
E incerta a obrigação que não se mostra qualitativamente determinada, podendo a incerteza verificar-se quanto ao objecto da obrigação (obrigações alternativas) ou quanto ao género (obrigações genéricas).
Por seu turno, é exigível a prestação sempre que a obrigação se encontrar vencida ou o seu vencimento estiver dependente de simples interpelação ao devedor, sendo ilíquidas as obrigações que têm por objecto uma prestação cujo quantitativo não está ainda apurado.
Por definição, o título executivo é o documento que pode segundo a lei, servir de base à execução de uma prestação, já que ele oferece a demonstração legalmente bastante do direito correspondente (cfr. Castro Mendes, Lições de Direito Civil, 1969, pág. 143).
Do ponto de vista formal, o título é o documento em si próprio e, do ponto de vista material, é a demonstração legal do direito a uma prestação (cfr. o mesmo Autor, A causa de Pedir na Acção Executiva – Rev. Fac. Direito da Universidade de Lisboa, vol. XVIII, págs. 189 e segs).
Como se sabe, o Processo Executivo visa realizar coercivamente um direito já afirmado.
Ora, como “toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva” – artº.45º, nº 1 do CPC – facilmente se percebe que aquela afirmação deve necessariamente constar do título executivo.
E também só essa prévia afirmação do direito permitirá entender o comando do art. 55º, nº 1 do mesmo Código: “A execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figura como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tinha a posição de devedor”.
Como se vê, “... pela análise do título se há-de determinar a espécie de prestação e da execução que lhe corresponde (entrega de coisa, prestação de facto, dívida pecuniária), se determinará o quantum da prestação e se fixará a legitimidade activa e passiva para a acção” (Anselmo de Castro, A Acção Executiva Singular, Comum e Especial, pág. 11).
Conforme já salientava Alberto dos Reis, “...desde que a execução não é conforme ao título, na parte em que existe divergência, tudo se passa como se não houvesse título: nessa parte a execução não encontra apoio no título” (Código do Processo Civil Explicado, pág. 26).
E, sempre que isso aconteça, ou seja, “... se a discordância entre o pedido e o título consistir em excesso de execução, isto é, em se pedir mais do que o autorizado pelo título”, cabe ao juiz indeferir liminarmente o requerimento executivo na parte em que exceda o conteúdo do título, mandando prosseguir a execução pela parte que efectivamente lhe corresponda” (Lopes Cardoso, Manual da Acção Executiva, pág. 29).
Se a discordância entre o pedido e o título for absoluta, o indeferimento será, naturalmente, total.
Quanto à causa de pedir em acção executiva, há quem entenda que ela se reconduz ao próprio título accionado (cfr. Alberto dos Reis, Comentário, I, pág. 98, Lopes Cardoso, ob. cit., págs. 23 e 29 e Ac. do STJ de 24-11-83, BMJ 331/469), enquanto outros sustentam que ela é antes constituída pela factualidade essencial de onde emerge o direito, reflectida embora no próprio título (cfr. Castro Mendes, A Causa de Pedir..., págs. 189 e sgs., Lebre de Freitas, Acção Executiva , 2ª ed.. págs. 64 e 65, A. Varela, RLJ, 121º/148 e sgs e Ac. do STJ de 27-1-98, CJ, STJ, I, pág. 40).
Como quer que seja, os próprios defensores da 2ª teoria não retiram qualquer relevo ao título executivo, limitando-se a enquadrá-lo no seu meio próprio, que é o processual, do mesmo passo que enquadram a factualidade causal no seu meio próprio, que é o substantivo (cfr. Ac. do STJ de 27-7-94, CJ, STJ, III, pág. 70).
Tecidas estas considerações teóricas, vejamos o caso dos autos.
O requerimento executivo foi indeferido, por se entender que as facturas juntas aos autos não constituíam título executivo.
Insurge-se a exequente, alegando que os documentos que servem de base à execução são duas declarações, enviadas pela Junta de Freguesia de … ao Banco …e nas quais a executada se reconhece devedora importando o reconhecimento de uma obrigação pecuniária da sociedade ora apelante.
Reconhece a recorrente que as facturas juntas aos autos não constituem título executivo, mas são-no os reconhecimentos de dívida (declarações emitidas pela Junta de Freguesia de …)
Estão em causa duas declarações impressas em papel timbrado da Executada, datadas de 18 de Julho de 2008, carimbadas e assinadas, dirigidas ao BANCO… com o seguinte assunto:
Confirmação de Créditos e pagamento.
Mais referem o seguinte: “Vimos por este meio confirmar que tomámos conhecimento da cessão pela A…, Lda a V. Exas. dos créditos abaixo relacionados e assumir a obrigação de pagar integralmente os mesmos créditos nas suas datas de vencimento, renunciando, nomeadamente a invocar perante V. Exas. quaisquer direitos nossos sobre a empresa cedente que pudessem levar a que tais créditos não fossem total ou parcialmente devidos. Assim sendo, procederemos ao pagamento dos créditos em causa por meio de depósito ou transferência bancária para a conta NIB …, de que o Banco … é titular, ou ainda por meio de cheque à sua ordem, a entregar na Av. …, n.º …, …º Andar, …”.
É certo que nos termos do disposto na alínea c) do artigo 46º do Código de Processo Civil são títulos executivos, os “documentos particulares, assinados pelo devedor, que importem constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável, ou de obrigação de entrega de coisa ou de prestação de facto”.
É assim exigível que os documentos sejam assinados pelo devedor, o que significa que, no caso de pessoas colectivas, o subscritor terá de ter poderes bastantes para obrigar a entidade que administra ou representa.
Porém, como bem salienta a executada nas contra-alegações de recurso, a executada e recorrida, é uma autarquia local, estando a formação e a manifestação da sua vontade, bem como os poderes e competências dos seus órgãos, expressamente regulada por normas de direito público. É ao Presidente da Junta de Freguesia que cabe representá-la em juízo e fora dele bem como assinar toda a correspondência (Lei nº 169/99, de 18 de Setembro, art.º 38º, nº 1, al. a) e n)). É à Junta de Freguesia, por sua vez, que compete adquirir e alienar bens e celebrar contratos (art.º 34º do mesmo diploma legal), cabendo também por isso à Junta, por maioria de razão, confessar e reconhecer dívidas. É certo que pode ser delegada no Presidente da Junta a competência para autorizar aquisições até ao montante de € 99.759,58 (correspondentes a 20.000 contos, art. 29º, nº 2 do Decreto-lei nº 197/99), mas essa quantia é muito inferior à que a exequente, ora apelada, sustenta que lhe é devida, pelo que nem o próprio Presidente da Junta poderia legalmente assumir um compromisso dessa magnitude. Ora, quem não tem competência para autorizar essa suposta aquisição, também não tem competência para confessar a dívida dela recorrente, o mesmo acontecendo, obviamente, com quem quer que o estivesse a substituir nas suas faltas e impedimentos ou no uso de poderes delegados.
O subscritor das declarações não invocou qualidade alguma que permita concluir que tinha poderes para o acto.
Alega a recorrida que a assinatura não era do presidente da junta de freguesia, o órgão a quem compete a representação da recorrida. Era apenas o seu vogal tesoureiro, como demonstram as actas de tomada de posse juntas como documento nº 2 com a oposição à presente execução.
Tais documentos não estão juntos a estes autos de recurso, tanto mais que incide sobre o despacho de indeferimento liminar. Em qualquer caso, porque os documentos nada dizem quanto à qualidade da pessoa que os assina, não pode este tribunal aquilatar se tal pessoa tinha poderes, ou não, para representar a Junta de Freguesia e confessar dívidas.
Em todo o caso, conforme já referido, só a Junta de Freguesia podia legalmente deliberar assumir compromissos daquele montante (€ 570.735,25). Não se pode, por isso, dizer, como sustenta a apelante, que esses documentos estão assinados pelo devedor.
A Freguesia não pode ser vinculada por quem não tem poderes para a obrigar, da mesma forma que uma sociedade não pode ser obrigada por uma confissão de dívida feita por um seu empregado, por muito categorizado que seja, se este não tiver a qualidade de seu administrador, gerente ou representante legal com poderes bastantes, ainda que a faça em papel timbrado e lhe aponha o carimbo da sociedade.
Resulta do exposto, que as declarações confessórias em causa só seriam válidas e aptas a servir de título executivo se partissem do órgão legalmente competente, a Junta de Freguesia; revestissem a forma de deliberação, que as declarações confessórias expressamente teriam de invocar, bem como a qualidade ou os poderes que habilitassem o seu subscritor a assiná-las. Ora, ignora-se e não foi alegado se existiu ou não tal deliberação nem se o subscritor detinha, ou não, qualidade ou poderes para o acto.
As declarações em causa não reúnem, deste modo, os requisitos para que possam constituir títulos executivos.
Consequentemente, embora por diferente fundamento, entende-se ser de manter a decisão de indeferimento liminar da execução, com a consequente improcedência do recurso, o que se decide.

DECISÃO
Nos termos expostos, Acordam os Juízes da 8ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente a apelação, mantendo, embora com diferente fundamento, a decisão objecto de recurso.
Custas a cargo da apelante.

Lisboa, 21 de Março de 2012

Maria Amélia Ameixoeira
Ferreira de Almeida
Silva Santos