Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
26010/09.4T2SNT.1.L1-4
Relator: SÉRGIO ALMEIDA
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
SUBSÍDIO PARA SITUAÇÕES DE ELEVADA INCAPACIDADE PERMANENTE
INCAPACIDADE PERMANENTE ABSOLUTA PARA O TRABALHO HABITUAL
REVISÃO DE PENSÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/24/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A SENTENÇA
Sumário: 1. No domínio da Lei n.º 100/97 para apurar o subsídio para situações de elevada incapacidade permanente por IPATH não há qualquer ponderação a fazer em função da IPP residual atribuída pois trata-se, como a IPA, de uma incapacidade absoluta, não mensurada nesses termos.

2.Tendo sido atribuída ao sinistrado uma pensão obrigatoriamente remível, e fixando-se posteriormente, no âmbito de um incidente de revisão, uma incapacidade a que corresponde pensão não remível, deverá fixar-se uma nova pensão a cujo valor anual se deduzirá o valor anual da pensão anteriormente remida.

(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa.


RELATÓRIO:


Sinistrado: AAA.

Responsável civil e recorrente (adiante designado por R.): BBB, SA.

Requerida a revisão por ter havido agravamento das lesões, efectuados exames, o Tribunal decidiu que o sinistrado padece “da IPP de 26,4 %, com IPATH, desde o pedido de revisão feito em 09-06-2016 e condeno a seguradora a pagar-lhe a pensão anual e vitalícia de € 7.242,21, calculada com referência àquela data, acrescida de subsídio por incapacidade absoluta no montante de € 4.311,85. O pagamento da pensão fica suspenso até ser atingido o valor do capital de remição já pago”.
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A requerente insurge-se contra esta decisão, formulando estas conclusões:
1. O valor do subsídio por situações de elevada incapacidade permanente no montante de 4.311,85€ está errado.
2. Com efeito, o seu valor é de 4.207,68, o qual, nos termos do art.º 23º da Lei 100/97 aplicável ao caso em apreço, deve ser calculado do seguinte modo:
Salário Mínimo Nacional em 2009 = 450,00€
450,00€ x 12 = 5.400,00 €
5.400,00 € x 70% = 3.780,00€
5.400,00 € – 3.780,00 € = 1.620,00
1.620,00 € x 26,4% =427,68€
3.780,00 € + 427,68 € = 4.207,68 €
3.O pagamento da pensão não pode ficar suspenso até ser atingido o valor do capital de remição já pago.
4.Com efeito, de acordo com o ensinamento que se colhe da jurisprudência é que o valor da pensão que serviu de base ao cálculo do capital de remição já pago, deve ser abatido ao valor da pensão agora fixada.
5.O sinistrado já foi indemnizado pelas pensões que teria direito até ao final da vida decorrente da IPP inicialmente fixada de 8,86%, através da entrega do capital de remição, sendo esta remição o resgate da pensão que receberia até ao final da vida, através da entrega imediata de uma quantia.
6.Estando resgatada a pensão devida ao sinistrado até ao fim da vida correspondente à IPP de 8,86% inicialmente fixada, não podia a Mmª Juíza a quo deixar de proceder à dedução no valor da nova pensão o valor da pensão já remida.
7.Ao invés ordenou a suspensão do pagamento da pensão até ser atingido o valor do capital de remição já pago, o que não é a mesma coisa e conduz a resultados diferentes.
8.Como o sinistrado é, atualmente, portador da IPP de 26,4% com IPATH, corresponde-lhe uma pensão anual e vitalícia de 7.242,21€.
9.Mas, como já foi remida a pensão de 838,47€, correspondente à IPP de 8,86%, à pensão anual e vitalícia de 7.242,21€, haverá que descontar a pensão já remida de 838,47€, resultando, assim, que a pensão anual e vitalícia devida ao sinistrado é de 6.403,74€.
10.A douta sentença sob recurso viola a lógica do sistema reparatório explanado na LAT, os princípios gerais de direito, a noção e o sentido da remição, o princípio da justa reparação dos acidentes de trabalho estabelecido no art.º 59 n.º 1 alínea f) da CRP, o disposto nos artigos 1º n.º 1, 23º e 25º da lei 100/97 de 13/09.
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Não houve contra-alegações.

O MºPº teve vista e pronunciou-se pela improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
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FUNDAMENTAÇÃO
O objecto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, e exceptuando aquelas cuja decisão fique prejudicada pela decisão dada a outras, art.º 635/4, 639/1 e 2, e 663, todos do Código de Processo Civil.
Está em causa saber se o valor do subsídio por situações de elevada incapacidade permanente foi bem calculado e se deve haver dedução no valor da nova pensão do valor da pensão já remida.
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Factos Provados.
Estão provados, para efeito de apreciação do recurso, os factos descritos no relatório, destacando-se:
o sinistrado, foi vítima de um acidente de trabalho em 05.03.2009, ao ser atingido por um objecto quando prestava a atividade de montador de cofragens;
auferia a retribuição de 607,08 € (salário base) x 14 + 418,00 € (sub. refeição) x 11;
em 11.11.2009, por acordo homologado, ficou assente que, face à IPP de 8,86% a partir de 21.09.2009, receberia o capital de remição de uma pensão anual e vitalícia de 838,47 €;
o capital de remição (14.658,10 €) foi-lhe entregue em 07.12.2009;
em sede de revisão da incapacidade foi-lhe atribuída a IPP de 26,4% com IPATH desde 09.06.2016, data do pedido de revisão.
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De Direito
a)Do valor do subsídio por situações de elevada incapacidade permanente (SSEIP)
O Tribunal a quo equacionou o caso dos autos tendo em conta o disposto na actual lei dos acidentes de trabalho (LAT), aprovado pela Lei n.º 98/2009, de 4.9.
Dispõe o art.º 187/1 que este regime aplica-se a acidentes de trabalho ocorridos após a entrada em vigor da dita LAT, a qual, nos termos do art.º 188, ocorreu em 01.01.2010.
O acidente dos autos ocorreu em 05.03.2009.
É, pois, aplicável a LAT anterior (Lei n.º 100/97, de 13.09, e o seu regulamento, DL. 143/99, de 30.09, RLAT).
Dispõe o artigo 23.º da Lei 100/97, sob a epígrafe “subsídio por situações de elevada incapacidade permanente”, que “a incapacidade permanente absoluta ou a incapacidade permanente parcial igual ou superior a 70% confere direito a um subsídio igual a 12 vezes a remuneração mínima mensal garantida à data do acidente, ponderado pelo grau de incapacidade fixado, sendo pago de uma só vez aos sinistrados nessas situações”.

Por seu turno, artigo 17º, n.º 1, alíneas a), b) e c), estipulou que:

"1 Se do acidente resultar redução na capacidade de trabalho este terá direito às seguintes prestações:ou ganho do sinistrado,
a)Na incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho: pensão anual e vitalícia igual a 80% da retribuição, acrescida de 10% por cada familiar a cargo, conceito a definir em regulamentação ulterior, até ao limite da retribuição e subsídio por situações de elevada incapacidade permanente;
b)Na incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual: pensão anual e vitalícia compreendida entre 50% e 70% da retribuição, conforme a maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível e subsídio por situações de elevada incapacidade permanente;
c)Na incapacidade permanente parcial igualou superior a 30%: pensão anual e vitalícia correspondente a 70% da redução sofrida na capacidade geral de ganho e subsídio por situações de elevada incapacidade permanente, em caso de incapacidade permanente parcial igual ou superior a 70%".

Sendo estes os preceitos a ter em conta pergunta-se: decorre daqui a razão da recorrente?
Entendemos que não. Com efeito, discutiu-se a forma de cálculo do valor do SSEIP, nomeadamente se cumpria descontar a incapacidade, como pretende a recorrente, ou não, tendo-se tornado dominante o, com o devido respeito, melhor entendimento, sufragado nomeadamente pelo Supremo Tribunal de Justiça no acórdão de 02.02.2006, que considerou não haver lugar a reduções decorrentes do grau de IPP que a acompanha, tendo em atenção que a IPATH é uma incapacidade absoluta.
Exarou aí o mais alto Tribunal que:

“A sentença de primeira instância fixou esse subsídio no montante correspondente a 12 vezes a remuneração mínima nacional, sem qualquer tipo de ponderação da incapacidade para o trabalho efectivamente existente [€ 348,01 x 12 = € 4176,12]. A Relação considerou necessário ponderar o grau de incapacidade e distinguir entre as diversas situações de incapacidade, pelo que, no caso dos autos, em que se configura uma situação de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual e de incapacidade permanente parcial, o montante remuneratório a considerar ficaria reduzido a 70% [70% x 12 vezes a remuneração mínima nacional] que seria depois acrescido do produto resultante da aplicação do coeficiente de incapacidade parcial permanente sobre a diferença entre 100% e 70% do salário mínimo anual [€ 4176,12 x 70% = € 2923,28; € 4176,12 - € 2923,28 = € 1252,84; € 1252,84 x 31,6 % = € 395,90; € 2923,28 + € 395,90 = € 3319,18].
(…) (O art.º 23) faz corresponder o subsídio em causa a um determinado montante remuneratório (12 vezes a remuneração mínima mensal), mas que deve ser ponderado pelo grau de incapacidade fixado; o que parece significar que se deve fazer intervir no cálculo o coeficiente de incapacidade concretamente atribuído ao sinistrado. No entanto, o art.º 17º prevê a atribuição do subsídio não apenas para os casos de incapacidade permanente parcial (contemplando apenas as que sejam superiores a 70%), mas também para os casos de incapacidade permanente absoluta, que, como resulta das citadas alíneas a) e b) do seu n.º 1, compreende duas diferentes situações: incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho e incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual. (…) O art.º 23º da Lei n.º 100/97 apenas exige que o montante remuneratório seja ponderado pelo grau de incapacidade fixado; e, quando se trate de casos de incapacidade absoluta, não distingue entre a incapacidade para todo e qualquer trabalho e a IPATH. Por outro lado, a efectiva diferenciação que ocorre entre estas duas situações (…) já foi tida em devida conta no quadro de definição das prestações devidas a título principal, visto que, no primeiro caso, a pensão anual e vitalícia é igual a 80% da retribuição, acrescida de 10% por cada familiar a cargo, ao passo que, no segundo caso, a pensão anual e vitalícia é estabelecida entre 50% e 70% da retribuição.
No entanto, embora a lei tenha diferenciado a esse título as prestações a atribuir, já se absteve de efectuar qualquer distinção no tocante ao SSEIP, limitando-se a referir que às pensões previstas, para qualquer dos casos, acresce o referido subsídio. (…) Teve como suficiente para assegurar o princípio da igualdade a diferença de valor instituída no tocante ao montante da pensão a atribuir, sendo que o facto de o sinistrado com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual vir a auferir um pensão de menor valor monetário pressupõe já a eventual compensação que poderá obter através da sua capacidade residual de ganho, e que resulta de ter ficado afectado para o exercício da sua normal actividade profissional, mas não para toda e qualquer actividade profissional. A circunstância de a lei não ter efectuado a distinção entre as duas situações no tocante ao cálculo do SSEIP tem a sua razão de ser na teleologia da prestação pecuniária em causa. A pensão anual e vitalícia por incapacidade destina-se a compensar o sinistrado pela desvalorização funcional de carácter permanente que resultou do acidente, e assim se compreende que o valor dessa pensão acompanhe, durante a sobrevida do interessado, a proporção da perda da capacidade de trabalho que o afecta. Ao contrário, o subsídio, com um valor pré-determinado e que é pago numa única vez, destina-se a facilitar a adaptação do sinistrado à sua situação de desvalorização funcional com perda de capacidade de ganho, permitindo-lhe porventura efectuar uma aplicação económica que lhe proporcione outros proventos ou reorientar a sua vida profissional para outro tipo de actividade. E, sendo essa a finalidade da lei não se descortina motivo bastante, do ponto de vista de política legislativa, para distinguir, entre a incapacidade permanente para todo e qualquer trabalho e a IPATH, quando é certo que, mesmo nesta última situação, o sinistrado fica imediatamente impedido de exercer as tarefas para que se encontra profissionalmente habilitado e o aproveitamento da sua capacidade residual de trabalho está necessariamente dependente de uma reabilitação profissional que não só envolve encargos como poderá exigir uma demorada fase de preparação e adaptação.
(…) As incapacidades permanentes são apenas de três tipos: parciais, absolutas para o trabalho habitual e absolutas para todo e qualquer trabalho. A determinação da incapacidade é efectuada, no processo emergente de acidente de trabalho, ou através de exame médico na fase conciliatória ou através de exame por junta médica quando houver desacordo quanto ao resultado da perícia efectuada naquela fase, sendo que a natureza e o grau de incapacidade atribuída é objecto de decisão judicial que, consoante os casos, ou se traduz numa homologação do acordo obtido pelos interessados na fase de conciliação ou numa decisão judicial que a fixe quando o processo prossiga para a fase contenciosa (artigos 105º, 114º, 138º e 140º do Código de Processo de Trabalho). Nestes termos, o resultado da perícia médica apenas pode ser reconduzido a qualquer das situações típicas descritas no citado art.º 9º do Decreto-Lei n.º 143/99, especificando, no caso das incapacidades permanentes, se se trata de uma incapacidade parcial ou absoluta, e, nesta última hipótese, se é uma incapacidade absoluta para todo e qualquer trabalho ou apenas para o trabalho habitual. Acresce que é esse resultado que é objecto de escrutínio judicial, fixando o juiz em definitivo o tipo de incapacidade que se verifica e o grau de desvalorização aplicável, quando se trate de incapacidade permanente parcial.
(…) O legislador, quando faz intervir como elemento de ponderação, para efeito do cálculo do SSEIP, "o grau de incapacidade fixado", apenas pode ter em vista as situações de incapacidade tal como se encontram tipificadas na lei. Ou seja, o que é susceptível de ponderação é o tipo de incapacidade que foi judicialmente fixado no processo, não havendo que atender a quaisquer considerações, factores ou pressupostos que serviram de base aos peritos e ao tribunal para fixar um certo tipo de incapacidade. Sendo assim, a expressão "incapacidade permanente absoluta", utilizada no segmento inicial do art.º 23º, não pode deixar de representar as realidades que estão subjacentes na previsão do art.º 9º do Decreto-Lei n.º 143/99, abarcando quer a situação de incapacidade permanente para todo e qualquer trabalho, quer a situação de incapacidade permanente para o trabalho habitual. Por outro lado, quando tenha sido atribuída uma IPATH, não tem qualquer relevo prático o grau de desvalorização funcional que tenha sido efectivamente considerado para esse efeito. Primeiro porque o que releva, nesse caso, é que a sequela resultante do acidente de trabalho (independentemente do grau de desvalorização que esteja em causa) tenha sido determinante da perda ou diminuição da função inerente ou imprescindível ao desempenho do posto de trabalho. Segundo, porque o prejuízo funcional efectivamente detectado (ainda que seja inferior à unidade) se diluiu na definição da natureza da incapacidade, passando a implicar para todos os efeitos uma incapacidade absoluta.

A aplicação do coeficiente de 70% (que apenas releva para as incapacidades parciais), bem como a repristinação do grau de desvalorização funcional de 31, 5% (que constitui um mero factor interno de avaliação do tipo de incapacidade), não têm, pois, na situação dos autos, qualquer cabimento, baseando-se numa mera ficção jurídica que não tem qualquer apoio na letra da lei nem se mostra justificada à luz de uma interpretação lógica do preceito. O subsídio por situações de elevada incapacidade deve, pois, ser calculado com base na existência de uma incapacidade absoluta, já que o sinistrado, para além de ter ficado afectado por uma parcial desvalorização funcional, se encontra também permanentemente impossibilitado de exercer o seu trabalho habitual”.

Este entendimento foi depois seguido pela restante jurisprudência (cfr. por todos o acórdão da RL de 08.02.2012: “numa situação de IPATH e com referência ao subsídio de elevada incapacidade permanente (artigo 23.º da LAT), não há qualquer ponderação a fazer em função da IPP residual atribuída, pois trata-se, como a IPA, de uma incapacidade absoluta, não mensurada nesses termos”.

Foi este o entendimento que seguimos ao abrigo da LAT anterior, e não se vê razão para, ponderando esse regime, o alterar, atentas as razões referidas.

Ora, o valor achado pelo Tribunal a quo ao abrigo das normas atuais não é superior àquele a que chegaríamos desta sorte (5.400,00 €).

Não merece, pois, acolhimento a pretensão da R..
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b)Da suspensão do pagamento da pensão
Ao sinistrado foi fixada, a partir de 21.09.2009, 8,86% de IPP, a que corresponde a pensão anual e vitalícia de 838,47 €, remitida pelo montante de 14.658,10 €. Mais adiante, foi revista a incapacidade, fixada a partir de 09.06.2016 em 26,4 % de IPP, acrescida de IPATH, a que corresponde a pensão anual e vitalícia, não remível, de 7.242,21 €.

A sentença recorrida decretou a suspensão do pagamento da pensão até ser atingido o valor do capital de remição já pago.
Insurge-se a R. defendendo que o valor da pensão que serviu de base ao cálculo do capital de remição já pago deve ser abatido ao valor da pensão agora fixada. Visto que o sinistrado já foi indemnizado pelas pensões a que teria direito até ao final da vida, decorrentes da IPP fixada inicialmente de 8,86%, através da entrega do capital de remição, sendo esta remição o resgate da pensão que receberia até ao final da vida, através da entrega imediata de uma quantia, não podia o Tribunal a quo deixar de proceder à dedução no valor da nova pensão do valor da pensão já remida. A ordenada suspensão do pagamento da pensão até ser atingido o valor do capital de remição já pago não é a mesma coisa e conduz a resultados diferentes. Como o sinistrado é atualmente, portador da IPP de 26,4% com IPATH, corresponde-lhe uma pensão anual e vitalícia de 7.242,21 €; mas, como já foi remida a pensão de 838,47 €, correspondente à IPP de 8,86 %, à pensão anual e vitalícia de 7.242,21 €, haverá que descontar a pensão já remida de 838,47 €, resultando, assim, que a pensão anual e vitalícia devida ao sinistrado é de 6.403,74 €.

Cremos que a R. tem razão.

A entrega do capital de remição corresponde a uma forma de cumprimento da obrigação do pagamento de uma pensão anual e vitalícia ao sinistrado, que tem lugar obrigatoriamente em determinadas circunstâncias (art.º 17/1/d da Lei n.º 100/97; convergindo, por todos, cfr. por todos o ac. da RP. de 02.05.2016).
Outros casos há, porém, em que tal remição não pode ter lugar, permanecendo a obrigação do pagamento de prestações anuais, de modo a garantir ao sinistrado que fruirá um capital ao longo da sua vida.

O problema que se põe consiste em saber em como compatibilizar formas diferentes de pagamento da pensão quando houve uma remição e depois, em resultado da revisão da incapacidade, há lugar ao pagamento de prestações anuais.

Não impondo a lei um critério, tem-se entendido sem contestação que ao valor anual da nova pensão decorrente da atualização deverá ser abatido o valor anual da pensão remida (por todos cfr. os ac. da RL de 9 de maio de 2007: “se, por virtude do incidente de revisão, veio a ser fixada uma IPP superior a 30%, estando já entregue o capital de remição correspondente a IPP inferior a 30% já anteriormente fixada, o sinistrado apenas tem direito ao pagamento da pensão vitalícia correspondente à diferença entre o montante da pensão que serviu de base de cálculo ao capital de remição - já entregue - e o montante da pensão devida pela IPP de que o sinistrado sofre actualmente; de 27.06.2012, proc. 436/03.5TTFUN.L1-4 [a R. cita-o, por mero lapso de escrita, como de 2016]: “tendo sido atribuída ao sinistrado uma pensão obrigatoriamente remível, e fixando-se uma pensão superior no quadro de um incidente de revisão, deverá fixar-se uma nova pensão a cujo valor anual se deduzirá o valor anual da pensão anteriormente remida”, o qual acrescenta na fundamentação:

“Deve ter-se presente, contudo, que a entrega do capital da remição extingue o direito à pensão devida para reparar a incapacidade laboral com base na qual foi calculada. Assim, estando o direito aquela pensão extinto em consequência da remição e tendo sido aumentado o valor global da pensão em virtude da revisão da incapacidade, o que é devido ao sinistrado deverá corresponder à diferença entre o valor da pensão anual inicial e o valor da pensão correspondente à incapacidade laboral que resulta da revisão. Tem sido esta a fórmula seguida pelos Tribunais do Trabalho para cálculo das pensões resultantes de agravamentos de IPP's no âmbito das revisões de incapacidade. E é, igualmente, a mais consentânea com a natureza jurídica da remição das pensões, bem como com a solução legal prescrita, designadamente, na alínea d), do artigo 58° do Decreto-Lei n.º 143/99, nos termos da qual a remição não prejudica a “actualização da pensão remanescente no caso de remição parcial ou resultante de revisão de pensão, nos termos da lei”. Impõe-se assim deduzir a importância de € 990,05 à quantia acima encontrada e que corresponde à pensão global devida a partir de 16 de Janeiro de 2012, conforme sustentado, entre outros, pelos Acórdãos da Relação de Lisboa de 8 de Fevereiro de 2012 (processo n.º 270/03.2TTVFX.L1-4) e de 9 de Maio de 2007 (processo n.º 2229/2007-4, in www.dgsi.pt)”; e da R. do Porto de 5.1.2015).

Concordamos com este critério, que se afigura o mais curial quer para garantir os interesses do sinistrado quer os do responsável civil e da própria sociedade no funcionamento adequado dos mecanismos de ressarcimento dos infortúnios laborais, destacando-se que o sinistrado em nada é prejudicado: tem, por um lado a gestão da quantia já remida, e por outro mantém o direito à perceção das pensões anuais pelo remanescente não ressarcido. Por outro lado, a simples suspensão do pagamento converte a remição anterior numa forma de pagamento parcial das pensões anuais não remíveis, mas de forma artificial, já que repristina uma obrigação extinta precisamente com a entrega do capital.

Destarte, considerando que a pensão anual e vitalícia foi ora fixada em 7.242,21 € e que a pensão 838,47 € já foi remida, a pensão anual e vitalícia devida ao sinistrado a partir de 09.06.2016 é de 6.403,74 €, procedendo nesta parte o recurso. 
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DECISÃO
Pelo exposto, o Tribunal julga o recurso parcialmente procedente, altera a decisão recorrida e, destarte, julga o sinistrado afectado pela IPP de 26,4 %, com IPATH, desde o pedido de revisão feito em 09-06-2016, a que corresponde a pensão anual e vitalícia de € 7.242,21, a que se cabe deduzir a pensão remível anteriormente fixada de 838,47 €, cujo capital já foi entregue, ficando então o sinistrado com uma pensão residual e final de 6.403,74 €, calculada com referência àquela data, e que se condena a R. seguradora a pagar-lhe, bem como o subsídio por situações de elevada incapacidade permanente no montante de € 4.311,85.
Custas pela recorrente na parte em que ficou vencida.

Lisboa, 24 de janeiro de 2018

Sérgio Almeida
Francisca Mendes
Celina Nóbrega