Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
10163/14.2T2SNT-A.L1-8
Relator: TERESA PRAZERES PAIS
Descritores: INSOLVÊNCIA
CREDITOS RECONHECIDOS
PRIVILÉGIO IMOBILIÁRIO ESPECIAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/07/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: - A recusa de homologação da lista de créditos reconhecidos elaborada pelo administrador da massa insolvente pode ter lugar por erro manifesto, nos termos do art. 130.º, n.º 3 do CIRE.
- Este erro manifesto permite e impõe ao julgador que afira da bondade formal e substancial dos créditos constantes da lista, não se limitando aos meros erros formais, podendo e devendo abranger razões ligadas à substância dos créditos em apreço que podem ser objecto de censura pelo julgador, mesmo na ausência de qualquer impugnação.
- Constando daquela lista de créditos não impugnada créditos de trabalhadores da insolvente, como beneficiando de privilégio imobiliário especial, mas sem especificar sobre que imóvel versa esse privilégio, não pode o julgador, sem mais, fazer incidir esse privilégio sobre os imóveis apreendidos para a massa insolvente.
(sumário elaborado pela relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

Decretada a insolvência de Transportes …, Lda.", conforme decisão dos autos principais, foi aberto o concurso de credores, fixando-se o prazo de reclamação dos respetivos créditos em 30 dias.
O Sr. administrador de insolvência apresentou a relação a que se refere o art. 129°, do C.I.R.E., cfr. fls., cujo teor se dá por reproduzido, a qual não mereceu impugnação.
O FGS invocou sub-rogação, na sequência do pagamento do montante global de € 8.164,60 a trabalhador –
Na lista apresentada , a que se refere o artº 129 do CIRE , não está indicado se o local de trabalho dos trabalhadores ,cujos créditos foram graduados , corresponde ao imóvel apreendido
Estão apreendidos os bens/direitos descritos no apenso B
Foi homologada a lista dos créditos reclamados apresentada pelo Sr. administrador de insolvência, constante destes autos.
Factos com interesse para a decisão do recurso.
Os que constam do relatório
Foi efectuada a graduação de créditos nestes termos:
“… De acordo com o disposto no art. 140°, nº3, do C.I.R.E., na graduação de créditos não é atendida a preferência resultante de hipoteca judicial nem a proveniente de penhora, sendo que as custas pagas pelo A. ou exequente constituem dívidas da massa insolvente.
--- Também os privilégios creditórios gerais que forem acessórios de créditos sobre a insolvência de que forem titulares o Estado, as autarquias locais e as instituições de Segurança Social, constituídos mais de 12 meses antes da data do início do processo de insolvência, e ainda os privilégios creditórios especiais que forem acessórios de créditos sobre a insolvência de que forem titulares o Estado, as autarquias locais e as instituições de Segurança Social, vencidos mais de 12 meses antes da data do início do processo de insolvência, se extinguiram com a declaração de insolvência, passando por isso a ser considerados créditos comuns - art. 97°, nº l , a) e b), do C.I.R.E.
--- O "M…", possui como garantia hipoteca registada sobre o prédio descrito no auto de apreensão.
--- A hipoteca, nos termos do preceituado no art. 686°, n' 1, e 687", ambos do Cód. Civil, confere ao credor o direito de se pagar do seu crédito, com preferência sobre os demais credores, que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo, pelo valor de certas coisas imóveis ou a estas equiparadas, pertencentes ao devedor ou a terceiros, sendo que a sua eficácia depende do registo, mesmo entre as partes.
--- No caso presente, estamos perante hipoteca voluntária, estabelecida através de contrato, conforme o disposto no art. 712 do Cód. Civil, devendo o seu crédito ser graduado de acordo com a posição de prioridade proveniente da antiguidade do registo , revestindo a natureza de crédito garantido - art. 47°, nº4, al, a), do CIRE
--- O crédito da Fazenda Nacional relativo ao imposto municipal sobre imóveis, e respectivos juros referentes a s dois últimos anos, beneficiam de privilégio creditório imobiliário especial nos termos dos arts. 744°, 1, e 75I do Cód. Civil, e 10° do Dec.- Lei nº 49.168 de 05-08-1969.
--- O restante crédito da Fazenda Nacional deve ser qualificado como privilegiado até aos montantes indicados pelo AI. O remanescente possui natureza comum.
--- Os créditos não subordinados do requerente da insolvência possuem privilégio mobiliário geral sobre os móveis apreendidos, até 1/4 do respetivo montante, num máximo equivalente a 500 UC –artº 98 do CIRE
--Os créditos reclamados pelos trabalhadores gozam de privilégio mobiliário geral previsto no artº 333 nº 1 al . a), do Código do Trabalho, devendo ser graduados antes dos créditos referidos no nº 1 do artº 747° do Código Civil (n.º 2, al, a) do artº 333° do Código do Trabalho).
-- Todos os restantes créditos possuem a natureza de créditos comuns.
--- Nos termos do disposto no art.° 336° do Código do Trabalho (aprovado pela Lei n.º 7/2009), de 12.02, "O pagamento de créditos de trabalhador emergentes de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação, que não possam ser pagos pelo empregador por motivo de insolvência ou de situação económica difícil, é assegurado pelo Fundo de Garantia Salarial, nos termos previstos em legislação específica".
E, de acordo com o preceituado no artº 322 da Lei n.º 35/2004, de 29.07 (que se mantém em vigor até que esta matéria seja objeto de nova regulamentação, nos termos constantes da al. o) do nº 6 do artº 120 da Lei nº 7/2009, de 12.02) "o Fundo de Garantia Salarial fica sub-rogado nos direitos de crédito e respetivas garantias, nomeadamente privilégios creditórios dos trabalhadores, na medida dos pagamentos efetuados acrescidos dos juros de mora vincendos".
Assim, atento os pagamentos efetuados pelo Fundo de Garantia Salarial aos trabalhadores, verificados os pressupostos da sub-rogação, os créditos deles decorrentes serão graduados a par dos créditos dos trabalhadores (sublinhando-se que os créditos reconhecidos aos trabalhadores serão reduzidos na proporção do que efetivamente receberam do FGS, caso a reclamações apresentadas não tenham contemplado tal realidade) .
Nestes termos, e face a todo o exposto:
A) Julgo verificados os créditos nos termos descritos sob o item III supra;
B) graduo os mesmos créditos da seguinte forma
Relativamente ao produto resultante da venda do bem imóvel apreendido – descrição 53-A.----
---1 ° Os créditos privilegiados respeitantes a IMI, no valor reconhecido
---2° Os créditos privilegiados, reclamados pelo FGS ( sub-rogação) e pelo trabalhador
---3° O crédito garantido por hipoteca r clamado pela "CEMG", de acordo com a prioridade de inscrição e até aos limites garantidos e reconhecidos.
---4° Os créditos privilegiados respeitantes a IRS/IV A/IRC, apenas no valor reconhecido
---5° Todos os demais créditos comuns ,na respectiva proporção ,caso não obtenham satisfação integral
---6° Os créditos subordinados.
Relativamente ao produto resultante da venda dos bens móveis/ direitos
---1° Os créditos privilegiados, reclamados pelo FGS (sub-rogação) e pelos trabalhadores. ---
---2° O crédito da L..., garantido por penhor, até ao montante reconhecido .
---3° Todos os demais créditos, na respectiva proporção caso não obtenham satisfação integral.
--- Custas a cargo da massa insolvente.
--- Registe e notifique. -----
--- Comunique ao Sr. Administrador de insolvência. “-
É esta decisão que o credor C…. ( CEMG) impugna, formulando estas conclusões:
A) A douta sentença de verificação e graduação de créditos, proferida pelo Tribunal “a quo” graduou (salvo devido respeito, erradamente) pelo produto da venda do bem imóvel apreendido - (descrição 53-A), os créditos privilegiados reclamados pelo Fundo de Garantia Salarial (em sub-rogação) e pelo trabalhador com preferência relativamente aos créditos de natureza garantida da ora Apelante, C...
B) Na lista definitiva de créditos elaborada pela Exma. Senhora Administradora de Insolvência nos termos do Art. 129º do CIRE, foi reconhecido à ora apelante, entre outros, um crédito no montante de € 42.741,72, de natureza garantida, atendendo à hipoteca, constituída sobre a Fracção Autónoma designada pelas letras “A”, correspondente ao rés-do-chão esquerdo - loja, do Prédio urbano sito na Rua D. Filipa de Lencastre, nº dois a dois 8, freguesia de Venteira e concelho da Amadora, descrito na C. R. P. da Amadora sob o n.º 53-A, da dita freguesia, e inscrito na matriz urbana sob o artigo 1203, da titularidade da insolvente.
C) É do entendimento da ora Apelante que o seu crédito garantido por hipoteca sobre o imóvel apreendido a favor da massa insolvente, deverá ser graduado com prioridade aos créditos reclamados e reconhecidos ao Fundo de Garantia Salarial (em sub-rogação) e ao trabalhador V....
C) A referida hipoteca encontra-se definitivamente registada na CRP da Amadora pela AP. 3394 de 2012/02/29 e confere à Apelante o direito do seu crédito ser graduado preferencialmente sobre o produto obtido com a venda do respectivo imóvel, nos termos do disposto no n.º 1, do artigo 686.º, do Código Civil.
D) Por sua vez, os créditos laborais reconhecidos ao trabalhador na relação definitiva de créditos, emergindo os mesmos de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação, gozam apenas de privilégio mobiliário geral, nos termos do artigo 333.º, alínea a) do Código de Trabalho.
E) De facto, tais créditos laborais não podem beneficiar de privilégio imobiliário especial sobre o supra referido imóvel, consagrado na alínea b) do nº 1, do artigo 333.º do Código do Trabalho, uma vez que o respectivo credor trabalhador não alegou nem logrou fazer prova nos autos, que exercia a sua actividade laboral no imóvel melhor identificado supra, o que lhe competia nos termos do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil. Neste sentido, vide o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proc. 08B974, n.º JSTJOOO de 19/06/2008, disponível para consulta em www.dgsi.pt.
F) Pelo exposto, e face à ausência de prova, relativamente ao imóvel em apreço e sobre o qual o Banco Recorrente detém hipoteca, os créditos laborais (e consequentemente, em sub-rogação, o Fundo Garantia Salarial), beneficiam apenas de privilégio mobiliário geral, não tendo preferência sobre o crédito da ora Apelante garantido por hipoteca, só podendo os mesmos ser graduados após o crédito hipotecário da ora reclamante (cfr. disposto no artigo 749.º, do Código Civil)
G) O Meritíssimo Juiz a quo fez, assim, uma errónea interpretação e incorrecta aplicação das disposições jurídicas vertidas nos artigos 686.º, n.º 1, 735.º, n.º 3 e 749.º, todos do Código Civil, bem como do artigo 333.º, do Código do Trabalho, e artigo 47.º, n.º 4, alínea a), do ClRE.
Ademais,
H) Não se encontrando a lista definitiva de créditos devidamente elencada no que concerne ao crédito reclamado pelo trabalhador, apenas identificando o respectivo crédito como "privilegiado", e não fazendo assim menção a nenhum privilégio imobiliário especial (cfr. doe. nº 2 já junto), deveria o Meritíssimo Juiz a quo diligenciar, em momento prévio à prolação da sentença, de modo a obter os elementos pertinentes a essa aferição.
I) Padecendo a referida lista de um erro manifesto, conforme supra exposto, o Meritíssimo Juiz a quo deveria abster-se de homologar e de proferir sentença de graduação de créditos de acordo com as informações constantes da lista (cfr. resulta do Artº 130 nº 3 do ClRE).
J) E não estando vinculado à relação de créditos apresentada pela Exma. Senhora Administradora, cabendo-lhe fiscalizar a sua actividade, conforme dispõe o arts 58 do ClRE, deveria o Meritíssimo Juiz a quo ter determinado a elaboração de uma nova lista, rectificada com base em tais elementos em falta.
l) Pelo que outro entendimento não se possa ter senão ser revogada a decisão recorrida substituindo-se por outra que, relativamente ao produto de venda da Fracção Autónoma designada pelas letras “A", correspondente ao rés-do-chão esquerdo - loja, do Prédio urbano sito na Rua D. Filipa de Lencastre, nº dois a dois B, freguesia de Venteira e concelho da Amadora, descrito na C. R. P. da Amadora sob o n.º 53-A, da dita freguesia, e inscrito na matriz urbana sob o artigo 1203, gradue o crédito garantido da ora Apelante C... à frente dos créditos laborais e do Fundo de Garantia Salarial, em sub-rogação.
Não foram juntas contra-alegações
Tendo em conta o teor das conclusões, as questões a resolver prendem-se com a verificação da prevalência do crédito reclamado pelo FSG e respectivo trabalhador sobre o do apelante, analisando os poderes do Sr. Juiz ao analisar a lista a que alude o artº 129 do CIRE.
Vejamos ….
Seguindo a orientação expressa nos Acórdãos do STJ de 10-12-2015 e de 25-11-2008 ( in DGSI ):
“….Perante a lista de credores apresentada pelo administrador da insolvência, e mesmo que dela não haja impugnações, o Juiz não pode abster-se de verificar a conformidade substancial e formal dos títulos dos créditos constantes dessa lista, nem dos documentos e demais elementos de que disponha, com a inclusão, montante, ou qualificação desses créditos, a fim de evitar violação da lei substantiva.
1I – Detectando a existência, nessa lista, de erro manifesto, se este for de natureza meramente formal, sendo a sua rectificação insusceptível de influir nos direitos das partes, nada se vê que obste a que desde logo proceda a tal rectificação e a que elabore logo de seguida sentença de homologação e graduação.
III – Mas, se se tratar de erro de natureza substancial, cuja rectificação implique ficarem afectados direitos das partes, os princípios do contraditório e da igualdade substancial das partes implicam a impossibilidade de imediata elaboração de tal sentença, uma vez que a alteração que, com o fim de rectificação desse erro, seja efectuada, origina que a lista de credores passe a ser distinta.
1V – Nessa hipótese, deve o Juiz determinar a elaboração de nova lista de credores, rectificada nos termos que indique, pelo administrador de insolvência, abrindo-se novo prazo para impugnações.
V – A falta de elaboração dessa nova lista constitui nulidade essencial”.

Na verdade, não podemos omitir a natureza desjudicializada do CIRE ,a fim de permitir uma atempada e global cobertura de situações reais muito específicas e mutáveis; daí que o artº 129 nos seus nºs 1, 2 e 3, indique , pormenorizadamente , os elementos que devem constar na lista de credores que o A.I. deve elaborar.
As menções sobre a natureza dos créditos, sejam reconhecidos ou não, a identificação do credor, o montante do capital e juros, as garantias pessoais e reais, os privilégios, as eventuais condições que sobre eles existam, são elementos cruciais para que o julgador possa, sem o trabalho burocrático que foi propósito da desjudicialização liberá-lo, dispor de elementos que facilmente possibilitem, em função desse relatório, aferir se existem ou não erros na listagem, mormente, quanto ao aspecto essencial da existência de garantias ou privilégios que influem decisivamente na graduação.
Esta lista está sujeita a impugnação, nos termos do nº1 do art. 130º, tendo legitimidade para tal impugnação “qualquer interessado”; havendo impugnação, o Juiz decide.
Não havendo impugnações, é de imediato proferida sentença de verificação e graduação de créditos, homologando a lista de credores apresentada pelo AI., só assim não será se existir “erro manifesto”.
E, se existe “erro manifesto”?
Do preceituado no artº 130 nº 3 do CIRE colhe-se que a ausência de impugnação de créditos constantes da lista apresentada pelo AI, nos termos do art. 129º do CIRE, não impede o Juiz de exercer um controle sobre a respectiva legalidade, não apenas formal mas substantiva: os requisitos da elaboração da lista contêm normas procedimentais e juízos de qualificação jurídica (por exemplo, quanto se considera que o crédito X ou Y dispõe de garantia real ou é um crédito privilegiado). Ademais, a natureza do processo insolvencial de execução patrimonial universal e concursal e do princípio da igualdade, consagrado no art. 194º do CIRE, (de alcance limitado, pois que só vale dentro de classes de créditos), impõe decisões justas e equitativas que não se compadecem com o total afastamento do controle judicial como se o Juiz se limitasse a chancelar a lista elaborada, fora e sem a prévia intervenção judicial.
Por isso, a ausência de impugnação da lista apresentada não a torna inatacável.
Esse controle, para evitar que “erros manifestos” inquinem a homologação, permite ao Juiz latos poderes de controle dos requerimentos dos credores reclamantes, de modo a verificar se foram alegados os requisitos a que se aludiu, pois só ante eles o julgador, atenta a natureza do crédito, as suas garantias e demais elementos que a lei impõe que sejam mencionados, poderá proceder a uma correcta graduação.
No mesmo sentido, cf Carvalho Fernandes e João Labareda, in “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado” – 2ª edição, – em comentário ao art. 130º, pág. 555
Por isso, defendemos que deve interpretar-se em termos amplos o conceito de erro manifesto, não podendo o juiz abster-se de verificar a conformidade substancial e formal dos títulos dos créditos constantes da lista que vai homologar para o que pode solicitar ao administrador os elementos de que necessite (cfr. João Labareda, O Novo Código da Insolvência, loc. cit., págs. 46 e 47; vd, também, Fátima Reis Silva, Algumas Questões Processuais no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, ibidem, págs. 76-77).
Nos termos do art. art. 333º do Código do Trabalho:
“1 – Os créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, pertencentes ao trabalhador, gozam dosseguintes privilégios creditórios;
a) Privilégio mobiliário geral;
b) Privilégio imobiliário especial sobre os bens imóveis do empregador nos quais o trabalhador preste a sua actividade.
2- A graduação dos créditos faz-se pela ordem seguinte:
a) O crédito com privilégio mobiliário geral é graduado antes dos créditos referidos no n° 1 do artigo 747.° do Código Civil;
b) O crédito com privilégio imobiliário especial é graduado antes dos créditos referidos no artigo 748.° do Código Civil e ainda dos créditos de contribuições devidas à segurança social.”.
A lei confere privilégio imobiliário especial aos créditos laborais dos trabalhadores que, ao tempo da declaração de insolvência, exerciam a sua actividade nos imóveis do empregador.
No requerimento de reclamação de créditos dirigido ao administrador da insolvência, os credores devem mencionar, além do mais, a proveniência do seu crédito, a sua natureza, a existência de garantias e a taxa de juros – art. 128º, nº1, als. a) a e) do CIRE.
Ora, o que sucedeu é que desconhecendo se no imóvel os trabalhadores exerciam a sua atividade , o crédito foi graduado como sendo garantido por um privilégio imobiliário especial .E mesmo sem esse pressuposto , procedeu-se à sua graduação.
Significa que não existem factos que atribuam ao crédito a garantia .E esses factos podem ser carreados para os autos ,por ser tarefa do Sr. AI essa mesma actividade.
Assim sendo , existe um erro manifesto a ser suprido.
Importa ,pois, anular o processado, por erro manifesto constante da lista apresentada pelo Senhor Administrador da insolvência, por dela não constar a correcta indicação da natureza dos créditos privilegiados e garantidos, no que respeita aos créditos laborais, devendo o Ex.mo Juiz na 1ª Instância convidar o A.I. a apresentar nova listagem, abrindo-se a fase da impugnação, para posteriormente ser cumprido o disposto no art. 130º do CIRE.
Conclusão: A recusa de homologação da lista de créditos reconhecidos elaborada pelo administrador da massa insolvente pode ter lugar por erro manifesto, nos termos do art. 130.º, n.º 3 do CIRE.
Este erro manifesto permite e impõe ao julgador que afira da bondade formal e substancial dos créditos constantes da lista, não se limitando aos meros erros formais, podendo e devendo abranger razões ligadas à substância dos créditos em apreço que podem ser objecto de censura pelo julgador, mesmo na ausência de qualquer impugnação.
Constando daquela lista de créditos não impugnada créditos de trabalhadores da insolvente, como beneficiando de privilégio imobiliário especial, mas sem especificar sobre que imóvel versa esse privilégio, não pode o julgador, sem mais, fazer incidir esse privilégio sobre os imóveis apreendidos para a massa insolvente.

Pelo exposto, julga-se a apelação procedente nos seguintes termos:
- anula-se a decisão impugnada, bem como o processado posterior ao cometimento do “erro manifesto” que se assinalou, devendo ser dado cumprimento ao artº 129 nº1 e 3 CIRE e subsequente tramitação nos termos do art. 130º .Após tal será proferida sentença de verificação e graduação de créditos .
Custas a suportar pela massa insolvente

Lisboa, 7/7/2016

Teresa Prazeres Pais

Carla Mendes

Octávia Viegas