Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
12529/18.0T8SNT.L1-7
Relator: LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA
Descritores: CONDOMÍNIO
ADMINISTRADOR
SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/04/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: · O Condomínio é um sujeito de direito, constituindo um centro autónomo de imputação de relações jurídicas, dotado de personalidade judiciária, sendo representado em juízo pelo administrador.
· O administrador, quando demanda ou é demandado nos termos do Artigo 1437º do Código Civil, atua como parte e não como representante do condomínio, consagrando-se aí uma hipótese de substituição processual em que a parte demandante ou demandada não coincide com o titular do direito defendido em juízo.
· O ato praticado pelo órgão (administrador) é imputado juridicamente ao condomínio, à semelhança do que ocorre com a prática de um ato por um órgão societário sendo este imputado à sociedade.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
RELATÓRIO
 A. intentou  acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra a “B.” cuja sede era Praceta da F.U., N° 1, 0000-000, A. C., nas pessoas de:
- C., anterior Administradora,  residente na Praceta da F.U., N° 1, 4° Esq°., 0000-000, A.C.;
- D., anterior Administrador, residente na Praceta da F.U., N° 1, 1° Esq°., 0000-000, A.C.”, pedindo:
“(...) deve a presente acção ser julgada totalmente procedente por provada e em consequência serem os RR. solidariamente condenados a pagar à Autora a quantia de € 30000,00 (trinta mil euros), por danos não patrimoniais que lhe causaram, acrescida de juros de mora, à taxa legal em vigor, desde a citação até efectivo e integral pagamento. (...)”.
Para tanto, alegou, em síntese, que é cônjuge de A.G., que é proprietário da fracção autónoma designada pela letra “M”, correspondente ao 5º Dtº., do prédio sito na Praceta da F.U. N° 1, 0000-000, A.C., e que o condomínio desse edifício foi administrado por C. e D.., de 12.02.2015 a 20.02.2018.
Mais alegou que, a partir de 01.03.2015, a Sr.ª C. começou a dizer aos diversos condóminos que o seu marido era um ladrão e que tinha roubado determinada quantia durante a sua administração; que depois do dia 12.02.2015 a administração do condomínio afixou no hall de entrada do prédio uma listagem onde identificava os valores das quotas de condomínio em dívida e o valor correspondente a cada fracção; que, em Abril de 2015, foi realizada uma assembleia de condóminos, tendo-se apurado posteriormente que a ata elaborada pela Sr.ª C. tinha sido falseada; que o marido foi acusado do crime de abuso de confiança, o que causou muito stress na família; que a Autora sofreu muita pressão e calúnias da Sr.ª C., do Sr. D. e da Sr.ª E., em como eram todos uma família de ladrões, tendo sido, inclusive, atacada por esta última; que durante os meses de Abril e Maio foram colocadas novas listagens, tendo a última sido afixada em 30.06.2015 e que esta situação lhe determinou noites sem dormir, angústia, ansiedade, revolta, stress, nervos problemas de saúde e que deixassem de receber visitas de familiares e amigos, danos não patrimoniais cujo ressarcimento ora reclama.
Na sequência de despacho, veio a Autora informar “que a Ré é apenas a: “anterior Administração do Condominio do prédio urbano sito na Praceta da F.U. “ nº 1, A. C., cuja sede era Praceta da F.U., Nº 1, 0000-000,  A.C. (...)”,  informação que reiterou nos requerimentos com a ref.ª 13406763 e 13556859, este último apresentado na sequência de despacho que facultou o contraditório quanto à eventual ilegitimidade passiva dessa Ré, atenta a causa de pedir invocada.
Em 14.12.2018, foi proferido despacho que indeferiu liminarmente a petição inicial por ilegitimidade passiva da Ré.
*
Não se conformando com a decisão, dela apelou a requerente, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem:
· «Entendeu a Mma. Juíza que a Autora não tinha legitimidade para mover a ação cível contra a Administração do Condomínio pois, segundo aquele entendimento, a referida Administração não tinha interesse em contradizer.
· O que a Autora não concorda até porque numa ação igual à sua e com os mesmos fundamentos, existe entendimento diverso no âmbito de outro processo que identifica e junta comprovativo.
· Em conclusão, entende-se que a Autora tinha legitimidade para propor a ação bem como a Ré tinha interesse em contradizer pois os factos lesantes do direito da autora resultaram da atuação lesante da Ré e, em situação da mesma natureza, o tribunal noutro processo pronunciou-se em sentido concernente ao pretendido pela Autora.
· Pelos motivos explanados, entendemos existir uma decisão violadora do artigo 30º do Código de Processo Civil.
Entende-se, assim, que deverá ser revogada a decisão que indeferiu liminarmente a petição inicial, por ilegitimidade passiva da Ré, substituindo-se a mesma por outra que legitime passivamente a referida Ré e dê continuidade à ação.»
Não foram apresentadas contra-alegações.
QUESTÕES A DECIDIR
Nos termos dos Artigos 635º, nº4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo um função semelhante à do pedido na petição inicial. Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.
Nestes termos, a questão a decidir consiste em determinar se ocorre ilegitimidade passiva insuprível.
Corridos que se mostram os vistos, cumpre decidir.
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A matéria relevante para a apreciação de mérito é a que consta do relatório, cujo teor se dá por reproduzido.
FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
O tribunal a quo indeferiu liminarmente a petição inicial por ilegitimidade passiva da Ré.
A fundamentação utilizada foi a seguinte:
«Dessa análise resulta que a Autora pretende obter a reparação dos danos não patrimoniais alegadamente emergentes da prática, pela Ré Administração, de factos ilícitos.
Ora, o art. 1437.º do Código Civil, sob a epígrafe “legitimidade do administrador”, prevê no seu número 2 o seguinte: “o administrador pode também ser demandado nas acções respeitantes às partes comuns do edifício.”
A propósito de tal artigo, defende o Prof. Miguel Teixeira de Sousa5: “(...) - o administrador tem legitimidade para ser demandado por qualquer condómino ou por um terceiro numa acção respeitante às partes comuns do edifício.
Logo a linguagem do preceito – que fala sempre de legitimidade, e nunca de representação – permite duvidar de que o mesmo estabeleça qualquer regra de representação do condomínio pelo administrador. A diferença entre a legitimidade e a representação reside no seguinte:
– Aquele que tem legitimidade para demandar ou ser demandado é parte, activa ou passiva, no processo; é ele o dominus litis, dado que quem tem legitimidade processual actua sempre em nome próprio;
– Aquele que actua como representante de alguém não é parte no processo: a parte é o representado (já assim Endemann, Das deutsche Civilprozeβrecht I (1868), 320); é, aliás, em relação ao representado que se afere a legitimidade processual, dado que é ele o dominus litis, pelo que quem pode ser parte legítima ou ilegítima é apenas o representado.
Do estabelecido no art. 1437.°, n.° 1 e 2, CC resulta que é o próprio administrador do condomínio que demanda ou é demandado: isto significa que o administrador actua como parte, e não como representante do condomínio. Sendo assim, o que se encontra consagrado no art. 1437.° CC é uma hipótese de substituição processual, ou seja, uma hipótese em que a parte demandante ou demandada não coincide com a titular do direito defendido em juízo. No caso regulado no art. 1437.° CC, o administrador é a parte substituta – é ele que demanda, em nome próprio, mas procurando tutelar os interesses do condomínio, ou é demandado, também em nome próprio, mas defendendo as partes comuns do edifício – e o condomínio é a parte substituída – é ele o titular dos interesses que o administrador vai procurar defender em juízo.
(...)A consagração da Amtstheorie no art. 1437.0 CC não pode fazer esquecer que o administrador do condomínio actua na defesa dos interesses e na qualidade de órgão do condomínio.
(...)Assente a interpretação do disposto no art. 1437.0 CC, o passo seguinte consiste em harmonizar o regime que resulta deste preceito com o estabelecido no art. 12.0, al. e), CPC quanto à atribuição de personalidade judiciária ao “condomínio resultante da propriedade horizontal, relativamente a acções que se inserem no âmbito dos poderes do administrador”.
Uma primeira nota é a de que a atribuição de personalidade judiciária ao condomínio não contende com a substituição processual estabelecida no art. 1437.0 CC. Se se verifica uma situação de substituição processual, há uma parte substituta (que está presente em juízo como parte activa ou passiva) e uma parte substituída (que é a titular do direito que constitui o objecto do processo). Não só nada impede que esta parte substituída tenha personalidade judiciária, como é essa precisamente a regra: o normal é que a parte substituída tenha personalidade judiciária (nomeadamente, porque tem personalidade jurídica: cf. art. 11.0, n.0 2, CPC).
Num plano puramente doutrinário, até se poderia argumentar que a atribuição de personalidade judiciária ao condomínio é um pressuposto necessário da substituição processual estabelecida no art. 1437.0 CC. Só podendo haver substituição processual se houver parte substituída, pode argumentar-se que a substituição processual que se encontra no art. 1437.0 CC exige que o condomínio tenha personalidade judiciária (isto é, possa ser realmente uma parte substituída). Nesta leitura, seria a situação de substituição processual do art. 1437.0 CC a requerer a atribuição de personalidade judiciária ao condomínio.
Abstraindo desta última observação, o problema que importa resolver é o da utilidade de concessão de personalidade judiciária ao condomínio. Se o art. 1437.0 CC atribui legitimidade processual ao administrador para intentar acções ou ser demandado em acções relativas ao condomínio, qual a vantagem de conceder personalidade judiciária ao condomínio, ou seja, qual a utilidade que decorre de também se permitir que o condomínio possa demandar e ser demandado?
Novamente abstraindo da referida observação doutrinária, a resposta àquela questão não é evidente. A única coisa que se pode fazer é reconhecer que o regime legal admite duas vias quanto a acções relativas ao condomínio:
– A propositura da acção pelo ou contra o administrador, no regime de substituição processual: é o que se encontra estabelecido no art. 1437.0 CC;
– A propositura da acção pelo ou contra o condomínio: é o que se pode retirar do disposto no art. 12.º, al. e), CPC. (...)”.
Acolhe-se o entendimento supra transcrito, por se concordar com os respectivos fundamentos, tendo ainda presente que a solução prevista no n.º 2 do art. 1437.º do Cód. Civil visou “(...) simplificar as relações entre o condomínio e terceiros”6.
Voltando ao caso sub judice, verifica-se que a administração do Condomínio apenas poderia ser demandada nas acções respeitantes às partes comuns do edifício (cfr. n.º 2 do artigo 1437.º do Código Civil), mas não é esse o objecto da presente acção, que se prende, isso sim, com a alegada ofensa de direitos de personalidade da Autora resultante da alegada prática de actos que extravasam o âmbito dos poderes da Administração relativos à conservação de uma parte comum do edifício (que não se confunde com a prática de actos pelas pessoas singulares que integraram a administração).
Conclui-se, assim, que a acção não poderia ter sido proposta contra a administração, no regime de substituição processual, previsto no n.º 2 do art. 1437.º do Cód. Civil.
Consequentemente, é manifesta a ilegitimidade da Ré, uma vez que, tal como configurada a presente acção, a mesma não tem qualquer interesse em contradizer (cfr. n.º 2 do art. 30.º do NCPC).»
A Autora insurge-se contra a decisão, argumentando que houve uma atuação da Ré lesante da Autora, sendo que ocorreu decisão noutro processo que se pronunciou no sentido pretendido pela Autora.
A Autora reporta-se ao Processo nº 8641/17, em que foi autor o marido  e Réu o Condomínio do Prédio sito na Rua da Praceta da F.U., nº1, em A.C., tendo sido este condenado a pagar indemnização ao aí autor com fundamento na fixação na entrada do prédio de uma listagem das quotas de condomínio  em dívida, incluindo a do autor (fls. 48-55). Logo aqui se divisa que a parte passiva nas duas ações não é rigorosamente a mesma, ao contrário do que afirma a autora/apelante.
Sobre a questão da relevância e efeitos da fixação deste tipo de listagens, pronunciou-se a CNPD na sua deliberação nº 49/2004, nestes termos:
«1.1 – Foi solicitada a intervenção da CNPD por a administração de um condomínio de um prédio estar a divulgar “publicamente alguns dos seus dados pessoais”.
Efectivamente, no hall de entrada do prédio era afixada “uma listagem onde consta o nome completo, a morada e o estado de pagamento das quotas do condomínio”.
1.2 – Foi alegado pelo titular que nunca foi autorizado que os seus dados fossem publicados em local público, tendo solicitado a cessação de tal procedimento de afixação, no referido local.
1.3 – Quer haja a divulgação do nome ou, tão só, da fracção, estamos perante dados pessoais na medida em que – à luz do artigo 3.º alínea a) da Lei 67/98 – integra-se no conceito de dados pessoais “qualquer informação relativa a pessoa identificada ou identificável”. Será “identificável” a pessoa que possa ser identificada. Ora, através da identificação da fracção é facilmente identificável o respectivo proprietário, ainda que tenha que se recorrer à informação constante do registo predial (a qual é facilmente acessível).
1.4 – Encontrando-se a informação estruturada numa listagem (cf. artigo 3.º alínea c) da Lei 67/98) e por aplicação das disposições precedentes, estamos perante um tratamento ao qual é aplicável a Lei 67/98.
Não há dúvida que a informação tratada é necessária, adequada e não excessiva à finalidade da administração e gestão da actividade do condomínio (cf. artigo 5.º n.º 1 alínea c) da Lei 67/98, de 26 de Outubro). A grande dúvida que se coloca é a de saber se é legítimo o tratamento – na vertente de “divulgação” ou “difusão” – das quotas dos condóminos.
1.5 – Deve salientar-se, em primeiro lugar, que a afixação de dados no hall de entrada não consubstancia uma difusão em “local privado”, no sentido de ser acessível apenas aos condóminos.
Em matéria de legitimidade o artigo 6.º da Lei 67/98 admitirá a difusão de dados, nomeadamente, quando houver consentimento dos titulares (corpo do preceito), quando tal difusão resultar de disposição legal (alínea b) ou quando essa difusão decorrer de “interesses legítimos do responsável pelo tratamento ou de terceiros a quem os dados sejam comunicados, desde que não devam prevalecer os interesses ou os direitos, liberdades e garantias do titular dos dados” (alínea e).
1.6 – Verifica-se que, já depois da queixa, a assembleia de condóminos se pronunciou sobre a possibilidade de divulgação de dados dos devedores de quotas – com indicação da fracção – sem que tal assunto constasse da ordem de trabalhos. Efectivamente, tal assunto foi tratado na rubrica “assuntos de interesse”. Será, por isso, de duvidosa legalidade e força vinculativa tal decisão.
1.7 – Mas, independentemente da utilização do mecanismo de impugnação de deliberações, será que a CNPD pode intervir em matéria de divulgação destes dados?
Em termos de “legitimidade do tratamento” as respectivas condições (aí se incluindo a difusão  de dados) só podem, no caso concreto, decorrer de consentimento ou de disposição legal, já que não parece à CNPD que o interesse na divulgação se possa sobrepor aos direitos dos titulares dos dados (os devedores de quotas do condomínio).
1.8 – A CNPD entende que é violadora do direito à privacidade e do bom nome a decisão dos condóminos que, em violação dos princípios de protecção de dados, consideraram que os dados pessoais dos devedores de quotas devem ser afixados no hall do prédio (26). A recolha de dados por parte da administração não foi feita com esta finalidade e qualquer desvio da finalidade carece da autorização da CNPD (cf. artigo 23.º alínea c) da Lei 67/98). Neste contexto, o direito de oposição dos titulares dos dados é legítimo (cf. artigo 12.º alínea a) da Lei 67/98).
1.9 – Entendeu a CNPD que o condomínio deve, depois de assegurar o direito de informação dos titulares dos dados (cf. artigo 10.º da Lei 67/98), omitir da listagem as fracções que exercerem o direito de oposição em relação a este procedimento» (Relatório de Atividades de 2003/2004, pp. 167-169).
Assim, conjugando este enquadramento legal, bem como o regime geral dos Artigos 483º e 496º do Código Civil, com a factualidade alegada pela Autora, inferimos que não é de arredar – em abstrato e dependendo da prova que viesse a ser produzida-  a possibilidade da Autora ser ressarcida por danos não patrimoniais.
A questão essencial reside, então, em saber se a Autora demandou corretamente a Anterior Administração do Condomínio do prédio urbano sito na Praceta da F.U., nº1, A.C.
O Condomínio é um sujeito de direito, constituindo um centro autónomo de imputação de relações jurídicas, sendo dotado de personalidade judiciária (Artigo 12º, al. a), do Código de Processo Civil). Conforme refere Sandra Passinhas, A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, 2000, p. 176, «O condomínio é um centro de imputação de relações jurídicas autónomas, enquanto portador de uma vontade própria e de meios patrimoniais (ainda que mínimos).» O Artigo 6º, nº1, do Decreto-lei nº 268/94, de 25.10, reporta-se às dívidas devidas pelos condóminos ao condomínio, sendo este titular de créditos e de débitos. Quando é demandado, o condomínio é representado em juízo pelo administrador, nos termos do Artigo 26º do Código de Processo Civil.
Por sua vez, o administrador é um órgão do condomínio (cf. Artigo 1430º, nº1, do Código Civil), a quem são atribuídas funções de gestão e de representação do condomínio, estando tais funções interligadas (cf. Sandra Passinhas, Op. Cit., pp. 185-191). Consoante refere o Prof. Teixeira de Sousa no texto citado na decisão impugnada, o administrador, quando demanda ou é demandado nos termos do Artigo 1437º do Código Civil, atua como parte e não como representante do condomínio, consagrando-se aí uma hipótese de substituição processual em que a parte demandante ou demandada não coincide com o titular do direito defendido em juízo (“O que significa o disposto no art. 1437º CC?”, https://blogippc.blogspot.com/search?q=o+que+significa+o+disposto+no+art.+1437.%C2%BA).
Ora, o ato praticado pelo órgão (administrador), desde que praticado no exercício das funções para que foi confiado,  é imputado juridicamente ao condomínio, à semelhança do que ocorre com a prática de um ato por um órgão societário sendo este imputado à sociedade (cf. Soveral Martins, Os Poderes de Representação dos Administradores de Sociedades Anónimas, BFDUC, Studia Juridica, 34, 1998, p. 48-48, apud Sandra Passinhas, Op. Cit., p. 180, nota 442). É aplicável nesta sede, analogicamente, o disposto no Artigo 165º do Código Civil, segundo o qual «As pessoas coletivas respondem civilmente pelos atos ou omissões dos seus representantes, agentes ou mandatários nos mesmos termos em que os comitentes respondem pelos atos ou omissões dos seus comissários» (neste sentido, Sandra Passinhas, Op. Cit., pp. 178, 340-341). Ou seja, para efeitos de responsabilidade civil aquiliana, o condomínio é um comitente e o seu órgão (administrador) é um comissário, colhendo aplicação o disposto no Artigo 500º do Código Civil (cf. Antunes Varela e Pires de Lima, Código Civil Anotado, I Vol., 4ª ed., pp. 167-168; Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, I, 5ª ed., p. 606; Abílio Neto, Manual da Propriedade Horizontal, 4º ed., p. 660).
A propósito do regime do Artigo 165º, refere-se em Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Editora, 2014, p. 361, que: «Ao conter uma remissão para o artigo 500º do CC, o artigo 165º consagra um regime de responsabilidade objetiva, i.e., independente da culpa da pessoa coletiva. Mas em qualquer caso, a pessoa coletiva só será responsável se estiverem preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil daquele que atua materialmente – facto ilícito (por ação ou omissão), culpa, dano e nexo de causalidade – acrescida dos elementos constantes do artigo 500º nº2: o facto danoso terá de ser praticado no exercício das funções para que foi confiado (ou em circunstâncias que fizessem crer que agia nessa qualidade, não sendo suficiente uma mera ligação temporal ou local com o exerício das funções).» 
Na dinâmica da relação de comissão, em abstrato, são divisíveis três situações:  (i) culpa exclusiva do comissário, caso em que o comitente que indemnize o terceiro tem direito de exigir do comissário o que pagou (artigo 500º, nº3, do CC); (ii) culpa exclusiva do comitente, eventualidade em que lhe cabe ressarcir os danos ; (iii) culpa concorrente do comitente e do comissário, eventualidade em que ambos respondem solidariamente  para com o lesado, regendo-se as relações internas entre eles nos termos dos Artigos 500º, nº3 e 497º, nº2, do Código Civil.
Posto isto, há que efetuar a subsunção fáctica pertinente.
Os atos lesivos alegados pela Autora atinentes à publicitação das listagens de devedores foram alegamente praticados por C. e D., atuando nas vestes de administradores do condomínio, razão pela qual tais atos são imputados juridicamente ao condomínio (cf. supra). Todavia, conforme resulta da própria alegação da autora (artigo 7.1º) da petição), nessas listagens não consta o nome da Autora (que não é condómina), sendo que é a própria autora a afirmar que a fração em causa é propriedade do marido. Assim, a haver um dano não patrimonial da Autora, o mesmo é meramente reflexo.
Assentando a causa de pedir essencialmente na pressão, calúnias e ataque que visaram a Autora («a Autora sofreu muita pressão e calúnias da Sr.ª C., do Sr. D. e da Sr.ª E., em como eram todos uma família de ladrões, tendo sido, inclusive, atacada por esta última»), face a tal causa de pedir, quem deve ser demandado são as pessoas singulares, alegados autores de tais factos. A demanda do condomínio só se justificaria mediante a alegação circunstanciada de que tais factos foram ainda praticados no âmbito do exercício precípuo das funções de administradores por parte de tais pessoas singulares, o que não está suficientemente expresso na petição.
Todavia, a Autora optou por demandar a Anterior Administração do Condomínio do prédio urbano sito na Praceta da F.U., nº1, A.C..
Ora, o administrador pode ser diretamente demandado nas ações respeitantes às partes comuns do edifício (Artigo 1437º, nº2, do Código Civil), que são as enunciadas no Artigo 1421º do Código Civil. É por demais evidente que a causa de pedir invocada pela autora não respeita a qualquer litígio quanto à definição, reparação, posse ou detenção das partes comuns do prédio ou situação similar.
Nesta medida, há, de facto, ilegitimidade passiva da Ré.
A ilegitimidade singular constitui uma exceção dilatória insuprível – cf. Geraldes, Abrantes/Pimenta, Paulo/Sousa, Luís Filipe, Código de Processo Civil Anotado, I Vol., 2018, Almedina, p. 32.
Termos em que, sendo desnecessárias outras considerações, improcede a apelação.

DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pela apelante na vertente de custas de parte (Artigos 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº6 e 663º, nº2, do Código de Processo Civil).

Lisboa, 4.6.2019

Luís Filipe Sousa
Carla Câmara
Higina Castelo