Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2165/17.3T8CSC.L1.L1-2
Relator: PEDRO MARTINS
Descritores: DESERÇÃO DA INSTÂNCIA
DEVER DE PREVENÇÃO
DEVER DE AUDIÇÃO PRÉVIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/24/2019
Votação: MAIORIA COM * DEC VOT E * VOT VENC
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I– Para além dos casos em que tal decorre por força de um despacho judicial, há casos, excepcionais, em que a lei impõe às partes o ónus de um impulso processual. Um desses, poucos, casos é o da habilitação dos sucessores da parte falecida. Se a parte onerada com a necessidade de requerer a habilitação não o fizer, por negligência, durante um período de 6 meses, a instância será declarada deserta (art. 281/1 do CPC).

II– Salvo casos excepcionais, o tribunal deverá alertar a parte para a consequência da deserção da instância por negligência no cumprimento daquele ónus durante aquele período de tempo, o que normalmente será feito com a referência expressa a essa possibilidade, ou com a menção de que o processo fica à espera da prática do acto sem prejuízo do decurso do prazo do art. 281/1 do CPC.

III– Se a parte onerada com esse ónus nada fizer nesse prazo, nem vier ao processo, no decurso do prazo, justificar o facto, tal será suficiente para se concluir pela sua negligência e, por isso, o tribunal poderá declarar a deserção sem ter que ouvir as partes sobre isso.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados:


A-SA, intentou uma acção com processo comum contra B.

Este réu foi citado e contestou.

A 02/10/2018, a Sr.ª advogada deste réu deu conhecimento aos autos e notificou a autora de que o réu faleceu a 11/08/2018, conforme certidão de óbito que juntou em anexo.

A 18/10/2018, foi proferido o seguinte despacho:
“Requerimento com refª 30261989:
Junta cópia do assento de óbito do réu determino a suspensão da instância, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 270º, nº 1, alínea a) e 276º, nº 1, al. a), sem prejuízo do disposto no art. 281º, todos do CPC.
Notifique”

A autora foi notificada deste despacho por carta elaborada na mesma data.

(A 09/11/2018, a autora fez um requerimento dirigido ao Senhor Escrivão de Direito, dizendo que: Vimos por meio e após contacto telefónico com o Tribunal, solicitar a indicação da identificação completa - Juízo e Juiz - para envio no sistema citius de um pedido de certidão dos processos: - Processo nº 4421/08.2TBCSC (antigo 1º Juízo Cível) - Processo nº 380/2002. A fim de dar cumprimento ao despacho que se junta e proferido no proc. nº. 2165/17.3T8CSC – Juízo Central Cível de Cascais – Juiz 2.

O despacho a que a autora faz referência é um despacho de 24/09/2018, em que o tribunal determinava que se notificasse a autora para, em 10 dias, juntar aos autos cópia dos articulados apresentados pelas partes naqueles processos, respectiva sentença, com o trânsito em julgado certificado.

A secção de processos satisfez o pedido da autora naquele mesmo dia 09/11/2018, identificando os dois processos)

Depois disso nada mais foi feito nos autos, pelo que no dia 29/04/2019, foi, numa conclusão desse mesmo dia, proferido o seguinte despacho:

Por despacho de 18/10/2018, notificado às partes em 21/10/2018, foi decretada a suspensão da instância por óbito do réu, nos termos do disposto nos artºs 270/1-a e 276/1-a do CPC, sem prejuízo do disposto no art. 281 do CPC.
De harmonia com o disposto no art. 276/1-a do CPC, a referida suspensão cessa quando for notificada a decisão que considere habilitado o sucessor da pessoa falecida.
A autora não deduziu o competente incidente de habilitação de herdeiros, nem justificou a sua inércia em promover o andamento regular do processo.
Verifica-se que a instância se encontra suspensa há mais de 6 meses por falta de impulso processual da autora, concretamente por não ter deduzido o incidente de habilitação de herdeiros, sendo que foi notificada da legal cominação, o que evidencia uma conduta processual negligente.
Assim, face ao decurso do prazo de 6 meses sem que a autora tenha impulsionado os autos, ao abrigo do disposto nos artºs 277/-c e 281, n.ºs 1 e 4, do CPC, julga-se extinta, por deserção, a presente instância.
Custas a cargo da autora.
Em conformidade com o disposto no artigo 306/2 do CPC fixa-se à causa o valor de € 120.000.
Registe e notifique.”

Esta decisão foi notificada à autora por carta elaborada no dia 30/04/2019.

A autora recorreu deste despacho a 14/05/2019para que, por nulidade, seja revogado e substituído por outro que alerte as partes para o risco da extinção da instância, fixando-lhes um prazo de 30 dias para darem andamento aos autos ou requererem o que tivessem por conveniente, ou para que, por nulidade decorrente da falta de fundamentação, seja revogado e se notifique as partes para que, ultrapassado que está o prazo de 6 meses, se pronunciem sobre a falta de impulso processual, fixando-lhe um prazo de 30 dias para darem andamento aos autos ou requererem o que tivessem por conveniente -, terminando as suas alegações com 32 conclusões em 7 páginas que aqui se sintetizam assim:

Verifica-se a nulidade da decisão por violação do princípio da proibição das decisões surpresa, do princípio do contraditório e do dever da gestão processual;

A deserção não ocorre pelo simples decurso do prazo. Para que a instância se julgue deserta importa ainda que a falta de impulso processual se deva a negligência das partes. Significa, portanto, que antes de julgar deserta a instância o juiz tem de fazer valorização do comportamento das partes por forma a concluir se a falta de impulso resulta, efectivamente, de negligência de alguma delas, ou de ambas, em promover o seu andamento. E para fazer essa valorização, deve sempre ouvi-las para melhor aquilatar da sua decisão.

Ora, as partes não foram notificadas para se pronunciarem sobre a verificação da negligência.

O que se impunha, conforme foi recentemente decidido pelo ac. do TRL de 09/09/2014 [proc. 211/09.3TBLNH-J.L1-7], também tendo em conta a profundidade da alteração dos institutos em causa, os efeitos graves resultantes da mesma (extinção da instância) e o evidente propósito do legislador em obstar que possa ocorrer grave prejuízo dos direitos das partes resultantes da aplicação do NCPC.

Dada a grande diferença de tratamento entre o antigo e o novo CPC justificava-se pelo menos que o tribunal facultasse às partes que algo requeressem com vista à prossecução dos autos, sob pena de aplicação do novo regime de deserção – cfr. nesse sentido, o ac. do TRL de 15/01/2015 [proc. 2998/03.8TCSNT.L1-6].

No mesmo sentido se pronunciou o TRP [de 02/02/2015, proc. 4178/12.2TBGDM.P1] que interpretando extensivamente o disposto no art. 3 da Lei 41/2013, de 26/06 - que, em certos casos, impõe, um dever de correcção e de prevenção do Juiz do processo - entendeu que, antes de dar (por despacho) a instância como deserta (cf. art. 281/4 do CPC), havia que alertar as partes para a extinção da instância.

Não foi por negligência da autora que esta não requereu o prosseguiu com os autos, porque ainda se encontrava a indagar sobre os sucessores do réu falecido para prosseguir com o incidente de habilitação.

Sem prescindir, verifica-se ainda a nulidade da decisão por falta de fundamentação.
*

Questão a decidir: se se verificam as nulidades invocadas; se a instância não devia ter sido declarada deserta.
*

Os factos que importam para a decisão das questões que antecedem são os que constam acima.
*

Diz o art. 281 do CPC, na parte que importa, que: 1: […] considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses. Acrescenta o n.º 4: A deserção é julgada no tribunal onde se verifique a falta, por simples despacho do juiz ou do relator.

Por regra, o impulso processual, no decorrer do processo, não incumbe às partes, como decorre do art. 6/1 do CPC, pois que, para que lhes incumba, terá de haver alguma norma – ou despacho judicial acrescente-se - que o imponha.

Isto é, como dizem Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, CPC anotado, Coimbra Editora, 3ª edição, 2014, pág. 22, só excepcionalmente cabe às partes o ónus de impulso processual subsequente. O autor não tem constantemente de impulsionar o desenvolvimento do processo, ideia contrária à anteriormente defendida na prática dos tribunais.

Por isso, é normalmente ao juiz que cumpre dirigir activamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da acção.

Há casos, no entanto, em que a lei impõe esse impulso às partes. É o que acontece no precisamente caso da habilitação de partes falecidas no decurso do processo.

Segundo o art. 269/1-a do CPC, a instância suspende-se quando falecer ou se extinguir alguma das partes […]. Segundo o art. 270/1 do CPC, junto ao processo documento que prove o falecimento ou a extinção de qualquer das partes, suspende-se imediatamente a instância, salvo hipóteses que não interessam ao caso dos autos. Segundo o art. 276/1-a do CPC, a suspensão por uma das causas previstas no n.º 1 do artigo 269 cessa: no caso da alínea a), quando for notificada a decisão que considere habilitado o sucessor da pessoa falecida ou extinta; Segundo o art. 351/1 do CPC, a habilitação dos sucessores da parte falecida na pendência da causa, para com eles prosseguirem os termos da demanda, pode ser promovida tanto por qualquer das partes que sobreviverem como por qualquer dos sucessores […]

Destas normas decorre, pois, o ónus, para a autora, de promover a habilitação dos sucessores do réu falecido, se quiser que o processo prossiga, pois que os sucessores do réu não fazem ainda parte do processo ou podem nem sequer existir, nem naturalmente terão interesse no seu prosseguimento.

Ónus que não pode ser suprido pelo tribunal, porque não pode ser este a decidir pela autora o prosseguimento do processo contra os sucessores.           
*

Assim sendo, cabia à autora requerer a habilitação dos sucessores do réu, se quisesse que o processo prosseguisse, deixando de estar suspenso. E estando a autora representada por advogado ela não podia deixar de saber que assim era.
Ora, durante mais de 6 meses, a autora nada fez nesse sentido.
*

O requerimento que ela fez ao Sr. escrivão de direito, depois da suspensão, não tem relevo para afastar esta conclusão. Pois que esse requerimento não teve como finalidade nada relacionado com a prática do acto que se lhe impunha: requerer a habilitação dos sucessores do réu falecido. Aliás, ela nem podia requerer nada no processo que não fosse com esse fim, salvo urgência do requerido, o que não era o caso, pois que o processo estava suspenso e o acto que praticasse no seu decurso seria nulo, como por exemplo, a junção de certidões a que o réu não podia responder por não existir (art. 270/3 do CPC: São nulos os actos praticados no processo posteriormente à data em que ocorreu o falecimento ou extinção que, nos termos do n.º 1, devia determinar a suspensão da instância, em relação aos quais fosse admissível o exercício do contraditório pela parte que faleceu ou se extinguiu. Art. 275/1 do CPC: enquanto durar a suspensão só podem praticar-se validamente os actos urgentes destinados a evitar dano irreparável; […] 2: Os prazos judiciais não correm enquanto durar a suspensão; […]). Falou-se naquele requerimento apenas porque o relatório deste acórdão teve que fazer referência ao que a autora tinha feito no processo; mas a própria autora não o invocou. Assim, repete-se, o requerimento em causa não foi prática de acto relevante para cumprimento do impulso processual que a autora tinha o ónus de praticar.
*

Estando a autora representada por advogado e tendo omitido, durante 6 meses, a prática do ónus processual que lhe era imposto sob pena de deserção da instância, e nem sequer tendo vindo aos autos, antes dos 6 meses, esclarecer porque é que não o fazia, não pode deixar de ser entender que ela actuou com negligência.

Neste sentido, o ac. do TRP de 27/09/2018 citado abaixo, lembra que Lebre de Freitas diz, a propósito do princípio da auto-responsabilização das partes que vigora no processo civil e que surge associado ao princípio da preclusão: “A omissão continuada da actividade da parte, quando a esta cabe um ónus de impulso processual subsequente, tem efeitos cominatórios, que podem consistir, designadamente, na deserção da instância.”

E Miguel Teixeira de Sousa, no comentário ao ac. do TRP de 02/02/2015, publicado em 10/02/2015 sob jurisprudência 75 no blog do IPPC, lembra que “a falta de impulso pode[…] ser, ela mesma, sinónima de negligência da parte.”

Tanto mais que, no caso, o juiz tinha expressamente advertido a autora das consequências da sua inacção, ao fazer referência ao art. 281/1 do CPC, pelo que não há violação do dever de prevenção, nem por isso pode ter havido qualquer surpresa da autora devido ao despacho a julgar deserta a deserção.

Estão, assim, preenchidos os pressupostos da deserção da instância por negligência da autora, como foi dito e explicado no despachado recorrido, não havendo, por isso, qualquer falta de fundamentação do mesmo que pudesse provocar a sua nulidade (arts. 615/1-b e 613/3, ambos do CPC).
*

Os acórdãos que a autora invoca foram proferidos até Fev2015 e foram justificados pela novidade do regime da deserção. No caso dos autos já se passaram mais de 5 anos de vigência do novo regime, o qual já entrou na rotina dos tribunais e dos advogados. Aliás, a norma transitória que aqueles acórdãos invocavam – art. 3/1 da Lei 41/2013, de 26/06 - aponta nesse sentido: ela aplicar-se-ia durante um ano. Ora, no caso, já decorreram 5 anos.
*

Do dever de prevenção

Já se disse que, no caso, este dever foi cumprido. Dados os fundamentos do recurso, importa desenvolver o assunto.

Apesar de haver jurisprudência contrária - veja-se o acórdão do ac. do TRP de 28/10/2015, 2248/05.2TBSJM.P2, que entende que a lei não prevê nenhum despacho de alerta – é hoje entendimento quase uniforme que existe tal dever de prevenção e que ele deve ser cumprido através de um despacho de alerta.

Neste sentido, Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, CPC, vol. 1º, Coimbra Editora, págs. 557; e agora, mais desenvolvidamente, Lebre de Freitas, Da nulidade da declaração de deserção da instância sem precedência de advertência à parte, publicado na ROA, 2018, vol. I/II, págs. 191 a 199, onde se sistematizam assim “os sete requisitos que” “a norma do art. 281/1 do CPC tem”, “dos quais seis evidenciados na letra do seu texto e o último decorrente da sua interpretação à luz dos referidos princípios gerais” (págs. 197-198):
 “1.Que lei especial, ou o tribunal por despacho de adequação formal do processo, imponha à parte um ónus de impulso processual subsequente;
2.Que o acto que a parte deva praticar seja por ela omitido;
3.Que o processo fique parado em consequência dessa omissão;
4.Que a omissão se prolongue durante mais de seis meses;
5.Que o processo se mantenha, por isso, parado durante este período de tempo;
6.Que a omissão seja imputável à parte, por dolo ou negligência;
7.Que o juiz alerte a parte onerada para a deserção da instância que ocorrerá se o acto não for praticado (segundo a corrente mais exigente, só a partir da notificação deste despacho de advertência se contando os seis meses).”

Pode, no entanto, haver situações, excepcionais, que levarão a concluir pela desnecessidade ou inutilidade desse acto, tanto mais que, lembre-se, o dever de prevenção com um despacho de alerta, não resulta directamente da lei.

Assim, no caso do acórdão do STJ de 08/03/2018, proc. 225/15.4T8VNG.P1-A.S1:
I.– Não obstante o CPC, na redacção dada pela Lei 41/2013, ter posto em destaque o dever do juiz de dar prevalência, tanto quanto possível, a decisões finais de mérito sobre decisões meramente processuais (art. 278/3), o dever de gestão processual, dirigindo activamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere (art. 6/1), e de cooperação com as partes, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio (art. 7/1), isso não pressupõe que o juiz tenha de se substituir às partes no cumprimento do ónus de promoção do andamento do processo.
II.–Tendo sido notificado às partes, designadamente ao mandatário do autor, o despacho de suspensão da instância para efeitos de o autor proceder ao registo da acção, não impende sobre o tribunal o dever de fazer constar desse despacho a advertência de que a inércia do autor, por mais de 6 meses, determinaria a deserção da instância, porquanto não só se tornou bem claro ser, exclusivo, ónus do autor providenciar pela feitura desse registo como o mesmo não podia deixar de saber, até porque está representado por advogado, que, em face da decretada suspensão da instância com o dito fundamento, teria que demonstrar a realização do referido registo dentro do prazo de 6 meses estabelecido no art. 281/1 do CPC, a fim de impulsionar o andamento dos autos antes de decorrido este mesmo prazo, sem prejuízo de, justificadamente alegar e provar que, não foi possível fazê-lo sem culpa/ negligência.

No mesmo sentido, o ac. do TRL de 10/01/2019, proc. 385/09.3TBVPV-A.L1-2
I.– Se a exequente, representada por advogado, depois de notificada, pela AE, para tomar posição quanto a uma questão necessária para a penhora de um bem, nada diz durante quase 11 meses, pode-se concluir pela existência da negligência da sua parte em permitir o andamento do processo. Tanto mais se, depois disso, foi de novo notificada para vir aos autos requerer o que tivesse por conveniente, sob pena de extinção por falta de impulso processual e, depois de notificada do resultado das diligências inúteis que então requereu, de novo nada disse durante quase outros 6 meses, apesar de ter escrito que o iria fazer, só quebrando a inacção com a interposição do recurso do despacho que julgou a execução extinta por deserção (arts. 277/-c e 281/5, ambos do CPC).
[…]
III– […] nem sempre há um dever de prevenção consubstanciado em dar conhecimento às partes da possibilidade da extinção da instância por deserção; o caso dos autos é exemplo de uma situação em que esse dever não existe, pois que a exequente, representada por advogado, não podia deixar de saber que a AE estava à espera de uma sua tomada de posição para poder dar andamento à execução.

Neste sentido, defendendo a possibilidade mas não a imposição do despacho de prevenção, vão, segundo as citações que são feitas, Ramos de Faria e Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao CPC, I, Almedina, 2013, pág. 250, n.º 1 da anotação ao art. 281.

E Miguel Teixeira de Sousa, em comentário ao ac. do TRP de 02/02/2015, 4178/12.2TBGDM.P1 - acórdão que defende que o dever de prevenção, que tinha apoio legal no art. 3 da Lei 41/2013, pode subsistir após o primeiro ano de vigência da reforma do CPC -, lembra que, como a deserção da instância exige que a falta de impulso decorra da negligência das partes, haverá que avaliar, caso a caso, se se justifica o cumprimento pelo tribunal do dever de prevenção; e continua: “procurando exemplificar, poderá haver razões para o cumprimento desse dever se a parte à qual cabe o impulso não estiver representada por advogado ou se esta mesma parte tiver demonstrado, pelo seu anterior comportamento processual, que está interessada na continuação do processo e se, por isso, for surpreendente a falta de impulso processual.

No entanto, em princípio o dever de prevenção deverá ser cumprido. Esse cumprimento será feito, por norma, precisamente através do tipo de despacho dado nos autos pelo tribunal recorrido: sob pena da extinção da instância por deserção (parece melhor, para sublinhar as consequências desvantajosas, principalmente quando as partes não estiverem representadas por mandatário judicial) ou sem prejuízo do decurso do prazo do disposto no art. 281/1 do CPC.
*

Dada a arguição da nulidade constante do recurso, também a questão do dever de audição prévia tem que ser desenvolvida.

Da nulidade processual

Mas antes, esclareça-se que se esta nulidade – do não cumprimento do dever de audição prévia – se verificar, se trata de uma nulidade processual, não de uma nulidade da decisão recorrida, que, como tal, teria de ser arguida no tribunal recorrido, e não neste recurso (neste sentido, por exemplo, os acórdãos do TRP de 11/04/2019, proc. 10135/05.8TBMAI.P1: IV - De qualquer modo, a inobservância do “princípio do contraditório ” traduz-se numa nulidade secundária a ser arguida pelo interessado em momento próprio e perante o tribunal recorrido (artigos 195/1 e 199/1 do CPC), não podendo ser relegada apenas para o recurso; Tem ela que ser suscitada no tribunal recorrido – no prazo de 10 dias - e será da decisão judicial que recair sobre a reclamação que será admissível o posterior recurso para o tribunal superior, e do TRE de 17/01/2019, proc. 3625/14.3T8LLE.E1). Lebre de Freitas, no artigo já citado, refere – págs. 198-199 - que a nulidade decorrente da omissão do dever de prevenção é uma nulidade processual [necessariamente com um regime diferente do erro de julgamento decorrente da decisão de considerar erradamente verificados qualquer um dos outros 6 requisitos da deserção, e antes – nota 13 da pág. 195 – tinha lembrado o ac. do TRL de 20/12/2016, proc. 3422/15.9T8LSB.L1-7 que só não pôde considerar verificada a nulidade decorrente da omissão desse despacho [no caso, de alerta] por o autor não a ter arguido nos termos dos arts. 195 e ss, limitando-se a invocá-la (directamente) em recurso].

O que, no caso dos autos, ainda poderia ocorrer através da convolação do recurso em arguição de nulidade, a remeter para o tribunal recorrido, já que o recurso foi interposto 11 dias depois de a autora se poder considerar notificada da decisão, ou seja, no 1º dia útil depois dos 10 dias do prazo geral para arguir nulidades processuais (arts. 149 e 139, ambos do CPC).
*

Posto isto,

Do dever de audição prévia

Alguma doutrina e jurisprudência defende a necessidade, mesmo no caso em que se tenha cumprido o dever de prevenção com um despacho de alerta, de o tribunal ouvir sempre as partes sobre a possibilidade da instância ser declarada deserta por negligência da parte onerada em dar o seu impulso processual.   
    
Tal é a posição de Teixeira de Sousa, num comentário ao acórdão do STJ de 08/03/2018 (publicado em 15/11/2018 no blog do IPPC sob jurisprudência 2018 (115)):

O decretamento da deserção da instância pressupõe que a omissão da parte no impulso processual é negligente (art. 281/1 CPC). O mero decurso do tempo sem que o impulso processual seja realizado não faz presumir a negligência da parte, dado que esta não pode deixar de ser aferida pela omissão de um dever de diligência nesse impulso. Por isso, impõe-se a audição prévia da parte. Como é óbvio, nada obsta ao decretamento da deserção da instância se da explicação fornecida pela parte não resultar uma justificação convincente para a omissão do impulso processual.

E é, por exemplo, a posição dos seguintes acórdãos (referem-se os mais recentes):

Ac. do TRC de 06/03/2018, proc. 349/14.5T8LRA.C1:
[…]
II.–Como claramente resulta do preceito do art. 281/1 do CPC, a deserção da instância nela cominada, para que opere ope legis depende: em primeiro lugar, do decurso de um prazo de 6 meses sem impulso processual da parte sobre a qual impende o respectivo ónus; que a falta desse impulso seja imputável a negligência activa ou omissiva da parte assim onerada, em termos de poder concluir-se que a falta de tramitação processual seja imputável a um comportamento da parte dependente da sua vontade.
III.–A “negligência das partes”, segundo a citada previsão legal, pressupõe, quanto a nós, uma efectiva omissão da diligência normal em face das circunstâncias do caso concreto, não podendo, assim, vingar uma qualquer responsabilidade automática/objectiva susceptível de abranger a mera paralisação.
IV–Temos para nós, na esteira do entendimento consagrado nos acs. TRL de 09/09/2014 (proc. 211/09.3TBLNH-J.L1-7) e TRG de 02/02/2015 (proc. 4178/12.1TBGDM.P1), que o tribunal, antes de exarar o despacho a julgar extinta a instância por deserção, deverá, num juízo prudencial, ouvir as partes de forma a melhor avaliar se a falta de impulso processual é imputável ao comportamento negligente de alguma delas, ou de ambas.

Ac. do TRL de 12/04/2018, proc. 19267/13.8T2SNT.L1-8:
Para considerar deserta a instância, nos termos do art. 281/1, do CPC, não deve o tribunal limitar-se a advertir as partes para as consequências da sua inércia processual, sem inquirir, ouvindo-as, se aquela se deveu à negligência respectiva.

Ac. do TRC de 15/05/2018, proc. 109/12.8TBIDN.C1:
1.–A deserção da instância executiva não dispensa que se apure, concretamente, que a falta de impulso processual dos autos se deve a negligência das partes.
2.–Não sendo automática a deserção da instância, pelo decurso do prazo de seis meses, o tribunal, antes de proferir o despacho a que alude o art. 281/4 do CPC, deve ouvir as partes de forma a melhor avaliar se a falta de impulso processual é imputável a comportamento negligente.
3.–Estando o processo a aguardar, há mais de seis meses, a realização de diligências que são da competência do agente de execução, não poderá concluir-se, sem mais, que a falta de movimento processual é imputável a negligência do exequente, sem que exista, pelo menos, uma notificação adrede que transfira, para este, o ónus de reagir e tomar posição sobre a inércia e o incumprimento o agente e execução.
4.–Assim, constatando-se que o processo não apresenta movimento durante um período temporal significativo que seja bastante para concluir que o agente de execução não está a cumprir os deveres inerentes ao cargo, deverá o Tribunal notificar o exequente para requerer o que tiver por conveniente em face desse incumprimento; só a partir desse momento se poderá considerar que o exequente tem a obrigação e o ónus de tomar posição sobre esse incumprimento e que o processo aguarda o seu impulso processual, considerando-se deserta a instância se nada requerer nos seis meses subsequentes.

Ac. do TRG de 30/05/2018, proc. 438/08.5TBVLN.G1 (com um voto de vencido):
IV.–Por forma a se poder decidir se a falta de observância do ónus de impulso processual por mais de 6 meses, da parte que estava onerada com o mesmo, se deve a negligência sua, deverá o tribunal ouvi-la previamente, já que a mera objectividade da paragem do processo por ausência do dito impulso processual não pode ser feita corresponder automaticamente à omissão da diligência normal e exigível em face das circunstâncias do caso concreto (art. 3/3 do CPC).
  
O ac. do TRP de 27/09/2018, proc. 21005/15.1T8PRT.P1:
“Não sendo automática a deserção da instância pelo decurso do prazo de 6 meses, o tribunal, antes de proferir o despacho a que alude art. 281/4 do CPC, deve ouvir as partes de forma a melhor avaliar se a falta de impulso processual é imputável a comportamento negligente. Aliás, tal dever decorre expressamente do art. 3/3 do CPC ao dispor que o juiz deve observar e fazer cumprir o princípio do contraditório ao longo de todo o processo, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.”
Mas note-se que este acórdão constatou que no caso a audição tinha ocorrido e declarou a deserção considerando que se “verificam os pressupostos da deserção da instância nos termos previstos no art. 281/3 do CPC se decorreram mais de 6 meses desde a suspensão da instância em razão do falecimento da autora comprovado nos autos, sem que o seu herdeiro viesse requerer a sua habilitação para prosseguir no processo em seu lugar, não tendo alegado nenhum facto em concreto que pudesse justificar a sua omissão ou demora em promover os termos do processo, pelo que tem de considerar-se a sua conduta negligente.”

Ac. do TRG de 31/10/2018, proc. 590/15.3T8PTL.G1:
I.– O actual sistema de citação tem na regra da oficiosidade das diligências do acto uma das suas traves mestras, traduzindo-se em a secretaria dever dar impulso à citação pessoal, sem necessidade de prévio despacho do juiz, nem de requerimento do autor (arts. 226/1 e 562, ambos do CPC).
II.–Constituem pressupostos da deserção da instância, não só que o processo esteja parado há mais de 6 meses a aguardar o impulso processual da parte com ele onerada, mas também que a omissão desta se deva à respectiva negligência (art. 281/1 do CPC).
III.–Por forma a se poder decidir se a falta de observância do ónus de impulso processual por mais de 6 meses, da parte que estava onerada com o mesmo, se deve a negligência sua, deverá o tribunal ouvi-la previamente, já que a mera objectividade da paragem do processo por ausência do dito impulso processual não pode ser feita corresponder automaticamente à omissão da diligência normal e exigível em face das circunstâncias do caso concreto (art. 3/3 do CPC).
IV.–Tendo o autor indicado interveniente principal - cidadão português - como residente em morada certa em França, vindo devolvida a carta registada com aviso de recepção remetida para sua citação, com indicação de «não reclamado», cabia à secretaria, autónoma e oficiosamente, promover a sua citação por intermédio do consulado português da sua área de residência (arts. 226/1, 239, n.ºs 1 e 3, 319/1 e 562, todos do CPC).
V.–São nulos os despachos de juiz que, perante a omissão de cumprimento pela secretaria de diligência tendente a assegurar a citação, que exclusivamente lhe cabia, determinou que o processo aguardasse por 6 meses o impulso processual do autor, e depois declarou a instância extinta por deserção, face à inércia deste, sem previamente o ouvir sobre as razões da respectiva inacção (art. 195, n.ºs 1 e 2 do CPC).

Ac. do TRG de 16/05/2019, proc. 88/10.6TBVLN.G1:
I.–A extinção da execução por deserção está dependente da ponderação das normas legais e das circunstâncias do processo que permitam enquadrar as concretas atribuições e as condutas processuais de cada um dos intervenientes, pressupostos essenciais para a formulação do juízo inerente aos motivos da inércia processual prolongada;
II.–Revelando o processo que a exequente correspondeu sempre atempadamente às solicitações que lhe foram dirigidas pela AE, e verificando-se que o despacho recorrido declarou extinta a instância, por deserção, depois de notificar a AE para informar os autos das diligências realizadas - sem que esta ou o tribunal tivessem notificado a exequente para que tomasse posição processual no sentido de promover as diligências prévias necessárias à concretização do registo da penhora já efectuada -, não se chegou a transferir para a exequente o ónus que estava a cargo da AE de desencadear as diligências necessárias à efectivação do referido registo da penhora, ao abrigo das atribuições que lhe são conferidas pelo artigo 719/1 do CPC.
III.–Em consequência, não poderá a demora verificada ser imputada à conduta da exequente para efeitos de declaração de deserção.
IV.–O despacho recorrido configura ainda uma decisão-surpresa, posto que tem evidentes implicações sobre o prosseguimento da instância executiva e não foi precedido da audição prévia da exequente, tal como prevista no art. 3/3 do CPC.
*

No entanto, a posição seguida por todos os acórdãos conhecidos do STJ é contrária àquela, tal como o é a da maioria da jurisprudência das relações.

Entende-se que o dever de audição prévia não se impõe como regra geral e muito menos nos casos em que tenha sido cumprido o dever de prevenção (através do despacho a alertar a parte onerada com a necessidade do impulso para que a consequência da sua inacção é a da deserção da instância findo o prazo de 6 meses).

Isto com base no facto de o regime jurídico da deserção não prevê essa audição e por se entender que o art. 3/3 do CPC não pode ser invocado a seu favor, quer porque ele não rege para esta matéria, quer porque, nos termos em que se entende que a deserção pode ser declarada, nunca a decisão em causa poderá ser uma decisão surpresa.

Ou seja, não haverá violação da norma do art. 3/3 do CPC que é aquela que fala no princípio do contraditório e do da proibição das decisões-surpresa, invocado pela autora nestes autos.

Neste sentido, considera-se que vai a posição de Lebre de Freitas, já que na descrição que faz dos requisitos da decisão da deserção não incluiu qualquer referência à necessidade de audição prévia das partes.

Neste sentido vai também o artigo de Paulo Ramos de Faria, O julgamento da deserção da instância declarativa, publicado na revista Julgar on line – 2015, págs. 18 a 20 [artigo que foi referenciado pela Sr.ª juíza desembargadora, 2.ª adjunta].

E, entre outros, os seguintes acórdãos:
Ac. do STJ de 10/09/2015, na revista n.º 990/14.6T8BRG.G1.S1 - 2.ª Secção [acórdão que foi referenciado pela Sr.ª juíza desembargadora, 2.ª adjunta; os sublinhados foram colocados agora por este TRL]:
[…]

IV.–Decorrendo do circunstancialismo provado que o recorrente – dentro do prazo de deserção – desenvolveu diligências com vista a superar as dificuldades de registo que levaram à recusa do pedido de registo de acção do qual se encontrava dependente o prosseguimento da instância, não se acompanha o acórdão recorrido quando conclui pela negligência dos recorrentes para efeitos de extinção do processo por deserção da instância.
V.–Acresce que, perante o desenvolvimento processual ocorrido à volta do registo da acção, impunha-se confrontar previamente os recorrentes com a questão do impulso processual em obediência ao princípio do contraditório, sem esquecer o procedimento de intervenção oficiosa do juiz no decurso do primeiro ano de vigência do CPC, previsto no art. 3/-b da Lei 41/2013, de 26/06.

Ac. do TRP de 28/10/2015, proc. 2248/05.2TBSJM.P2 [apesar de mais antigo, o ac. tem interesse dadas as anteriores referências ao mesmo]:
No texto do acórdão esclarece-se: “[…] ainda que entendamos […] que a deserção da instância decorre directamente da circunstância de o processo estar parado há mais de 6 meses a aguardar o impulso da parte e o único despacho legalmente previsto é aquele que declara essa deserção, admitimos que, por modo a evitar qualquer decisão surpresa, a correta actuação processual seja, em alguns casos concretos, a que se traduz numa prévia notificação à parte para se poder pronunciar sobre a deserção que se pretende vir a declarar. No caso presente, e como se disse, não vemos que, tudo se passando no domínio do actual CPC, seja defensável que a omissão do contraditório conduza a uma decisão surpresa. O requisito da “negligência das partes” (previsto no art. 281/1 do CPC) também […] não impunha uma pronúncia prévia dos apelantes […] tendo em conta a concreta acção pressuposta como dever de impulso processual, a omissão da mesma, mormente na omissão de qualquer justificação, é necessariamente negligente.”

Ac. do STJ de 20/09/2016, proc. 1742/09.0TBBNV-H.E1.S1:
I.–Limitando-se a Autora a fazer juntar ao processo uma certidão de habilitação notarial dos herdeiros de réu falecido, nada promovendo em termos de incidente de habilitação de sucessores, não cumpre o ónus de impulso processual necessário a fazer cessar a suspensão da instância que havia sido declarada.
II.–Não competia ao tribunal providenciar oficiosamente, com base em tal certidão, pela habilitação judicial dos sucessores.
III.–Não constituindo a dita junção qualquer requerimento inicial, não podia o tribunal convidar ao seu aperfeiçoamento.
IV.–Deixando a Autora de impulsionar o processo, por mais de seis meses, através da dedução do processo incidental de habilitação de sucessores, nem tendo apresentado dentro desse período de tempo qualquer razão impeditiva da não promoção, estamos perante uma omissão de impulso a qualificar necessária e automaticamente como negligente, e que implica a deserção da instância.
V.–A negligência a que se refere o art. 281/1 do CPC não é uma negligência que tenha de ser aferida para além dos elementos que o processo revela, pelo contrário trata-se da negligência ali objectiva e imediatamente espelhada (negligência processual ou aparente).
VI.–Tal negligência só deixa de estar constituída quando a parte onerada tenha mostrado atempadamente estar impossibilitada de dar impulso ao processo.
VII.–Inexiste fundamento legal, nomeadamente à luz do princípio do contraditório, para a prévia audição das partes no contexto da deserção da instância com vista a aquilatar da negligência da parte a quem cabe o ónus do impulso processual.

No texto do acórdão esclarece-se que:
“[…] tratando-se na declaração de deserção simplesmente de fazer actuar um efeito processual que, associado a certo comportamento omissivo da parte, está directamente estabelecido na lei e que em nada se resolve numa questão de facto, numa questão de prova nem numa questão de direito material suscitada pela contraparte, nem tão-pouco numa decisão-surpresa, nada há a contraditar. Isto só não seria assim se acaso a lei determinasse que nenhum despacho relativo aos termos do processo poderia ser proferido sem uma prévia audição das partes. Mas não determina, estando ela própria recheada de hipóteses em que ao silêncio ou inacção das partes se segue imediatamente (isto é, sem prévia audição das partes) a declaração judicial do efeito processual cominatório que lhe está associado.
[…]

Se a parte não promove o andamento do processo e nenhuma justificação apresenta, e se nada existe no processo que inculque a ideia de que a inacção se deve a causas estranhas à vontade da parte, está apoditicamente constituída uma situação de desinteresse, logo de negligência.
De outro lado, em sítio algum estabelece a lei qualquer “audição” das partes (seja ou não a expensas do princípio do contraditório) em ordem à formulação de um juízo sobre essa negligência (aliás, mais do que ouvir as partes ou actuar o contraditório, tratar-se-ia então de um autêntico “incidente”, por isso que, dentro da lógica subjacente, as partes teriam que ser admitidas a demonstrar as razões que as levaram a não promover o andamento do processo, isto é, a sua não negligência). Ao invés, à parte onerada com o impulso processual é que incumbe (aliás à semelhança do que sucede no caso paralelo do justo impedimento, art. 140 do CPC), e ainda como manifestação do princípio da sua autorresponsabilidade processual, vir atempadamente ao processo (isto é, antes de se esgotar o prazo da deserção) informar e mostrar as razões de facto que justificam a ausência do seu impulso processual, contrariando assim a situação de negligência aparente espelhada no processo. E é em função desta actividade da parte que o tribunal poderá formular um juízo de não negligência. O que a lei pretende é que a parte activa no processo não seja penalizada em termos de extinção da instância quando a razão do não andamento da causa lhe não seja imputável. E, repete-se, o art. 3/3 do CPC não importa ao caso, visto que não se trata aqui do direito de influenciar a decisão (em termos de factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objecto dialéctico da causa, nem tão-pouco é configurável uma decisão-surpresa, antes trata-se simplesmente de fazer actuar uma consequência processual directamente associada na lei à omissão negligente da parte tal como retratada objectivamente no processo.”

Ac. do STJ de 14/12/2016, proc. 105/14.0TVLSB.G1.S1:
I.–Suspensa a instância por óbito do autor e decorrido o prazo de seis meses em que o processo se encontra a aguardar impulso processual, o tribunal deve proferir despacho a julgar deserta a instância (artigo 281 do CPC), não impondo a lei que o tribunal, antes de proferir a decisão, ouça as partes ou qualquer dos sucessores tendo em vista determinar as razões da sua inércia.
II.–Impendendo sobre as partes que sobreviveram ou qualquer dos sucessores o ónus do impulso processual, cumpre-lhes levar ao processo as circunstâncias que levam o tribunal a considerar que ocorre situação justificativa de que não se considere verificada inércia negligente.
II.–Ainda assim, e no caso de deserção da instância por não ter sido levado ao conhecimento do Tribunal nenhuma circunstância que afaste o juízo de negligência, a parte ou o seu mandatário podem invocar justo impedimento nos termos do artigo 140 do CPC.
IV.–Considerando que a deserção da instância per se não implica a perda do direito de acção, considerando que o prazo de 6 meses é um prazo suficientemente amplo para que os interessados possam ter conhecimento da acção suspensa e exercer, querendo, os seus direitos processuais, considerando ainda que, mesmo em caso de inércia a impor decisão que declare a deserção da instância, salvo fica sempre o justo impedimento, não se justifica interpretação correctiva da lei no sentido de impor a audição das partes, decorrido o prazo de 6 meses e antes de ser proferida decisão a julgar deserta a instância.

No texto do acórdão esclarece-se que:
28.–O aludido preceito não prescreve que a decisão a considerar deserta a instância seja proferida notificando-se previamente as partes para se pronunciarem sobre se estão efectivamente verificados os pressupostos que a determinam. Há efectivamente casos em que a lei prescreve que a decisão não seja proferida sem prévia audição das partes […]
29.–Fora dos casos em que a lei impõe que o juiz ao proferir decisão ouça as partes independentemente de estas terem suscitado qualquer questão de facto ou de direito, o juiz deve proferir decisão fundamentada à luz das regras de direito aplicáveis, decisão que é sempre passível de impugnação nos termos da lei.
30.–Nos casos apontados, a audição das partes visa evitar decisões oficiosas que implicam um factor de surpresa para as próprias partes, o que não sucede no caso de deserção pelo decurso do prazo de 6 meses, pois é certo que, neste caso, é a própria lei que fixa um prazo, advertindo que ele constitui condição sine qua non de deserção da instância. Da lei resulta que, decorrido esse prazo, sem que nada seja requerido nos autos, o Tribunal não pode deixar de considerar verificada ipso facto uma situação de negligência e isto porque o Tribunal, para proferir a decisão, apenas se pode socorrer dos elementos que estão nos autos (quod non est in actis non est in mundo) e não dos elementos que os interessados podiam ter apresentado no processo que pudessem então viabilizar ao juiz considerar que, não obstante o decurso do prazo de 6 meses, não ocorria situação de negligência.
31.–Perante os termos da lei e notificada a suspensão da instância, não pode deixar de se considerar que a inércia do interessado que nenhuma informação traga ao Tribunal levará necessariamente, decorrido o aludido prazo, à deserção da instância.
32.–Não se vê que este entendimento não seja razoável ou que seja desproporcionado ou que o prazo não seja suficientemente amplo para viabilizar aos interessados o conhecimento de que os autos estão suspensos para poderem levar ao tribunal o conhecimento de situações que justifiquem manter-se a suspensão da instância para além do aludido prazo. Acresce que se a lei aqui não cuidou de impor a prévia audição das partes foi porque considerou que a fixação peremptória da deserção da instância nos termos assinalados a impor, no caso de inércia, a prolação de decisão leva a que esta não possa considerar-se inesperada ou surpreendente.

Ac. do STJ de 04/05/2017, na revista n.º 728/08.7TBSSB.E1.S1 - 1.ª Secção, sumário disponível em www.stj.pt [acórdão que foi referenciado pela Sr.ª juíza desembargadora, 2.ª adjunta]:
Se o tribunal profere despacho a declarar suspensa a instância e a determinar que os autos aguardem a promoção da habilitação dos herdeiros, sob pena de deserção da instância, e, no prazo de seis meses, as partes silenciam, deve ser declarada a deserção sem necessidade de cumprimento prévio do contraditório.

Ac. do STJ de 19/09/2017, na revista n.º 1572/07.4TBCTX.E1.S1 - 6.ª Secção, sumário disponível em www.stj.pt [acórdão que foi referenciado pela Sr.ª juíza desembargadora, 2.ª adjunta]:
I.A deserção da instância e dos recursos prevista no art. 281.º do CPC visa impedir um desperdício de recursos em processos em que o próprio comportamento negligente de uma das partes indicia o seu escasso interesse genuíno no processo em causa.
II.Para que se verifique a deserção da instância não se exige o carácter mais ou menos fundamental do acto omitido, mas apenas que, cabendo à parte o impulso processual este tenha sido omitido com negligência.
III.Mesmo advertida da necessidade de impulso processual da sua parte, a autora/recorrente prolongou a sua inacção por mais de seis meses, pelo que ocorre negligência processual fundamento da deserção da instância devidamente declarada por despacho judicial.
IV.Inexiste fundamento legal para a “audição” das partes (seja ou não a expensas do princípio do contraditório) em ordem à formulação de um juízo sobre essa negligência, a qual se apresentada retratada objectivamente no processo.

Ac. do TRP de 06/02/2018, proc. 17954/16.8T8PRT.P1:
Quando as partes tenham sido alertadas para as consequências da omissão do impulso processual não têm que ser ouvidas previamente ao despacho que decretou a deserção da instância.

Ac. do STJ de 08/03/2018, proc. 225/15.4T8VNG.P1-A.S1:
III.–No contexto da deserção da instância, inexiste fundamento legal, nomeadamente à luz do princípio do contraditório, para a prévia audição das partes com vista a aquilatar da negligência da parte sobre quem recai o ónus do impulso processual.
IV.–A negligência a que se refere o art. 281/1 do CPC, é a negligência retratada objectivamente no processo (negligência processual ou aparente), pelo que a assunção pela parte de uma conduta omissiva que, necessariamente, não permite o andamento do processo, estando a prática do ato omitido apenas dependente da sua vontade, é suficiente para caracterizar a sua negligência.
V.–Estando o autor onerado com o ónus de proceder ao registo da acção e tendo deixado decorrer o prazo de 6 meses estabelecido no art. 281/ do CPC, sem ter comprovado a realização desse registo ou mostrado que não foi possível fazê-lo sem culpa sua, é-lhe imputável, e não ao Tribunal, o efeito cominatório resultante do incumprimento do ónus especial de impulso processual que sobre ele recaía e que, no caso, consiste, na deserção da instância.

Ac. do TRL de 07/06/2018, proc. 1807/12.1TVLSB.L1:
Suspensa a instância por óbito de uma das rés, nos termos do artigo 270/1 do CPC, e sendo a autora devidamente alertada de que lhe incumbe o ónus processual de requerer a habilitação dos sucessores e qual o prazo, não se impõe ouvir as partes antes de declarar extinta a instância por deserção, ao abrigo do disposto no artigo 281/1 do CPC.

Ac. do STJ de 05/07/2018, proc. 5314/05.0TVLSB.L1.S2
I.–Tendo-se indicado, no despacho determinativo da suspensão da instância, o prazo pelo qual aquela perduraria e, bem assim, que, findo o mesmo, os autos aguardariam o impulso processual do autor nos termos do art. 281 do CPC, é de concluir que este ficou ciente de que impendia sobre si o cumprimento do ónus de impulso processual (não cabendo, pois, ao juiz o dever de ordenar o prosseguimento dos termos da causa) e das consequências que adviriam do seu inadimplemento.
II.–O dever de gestão processual (art. 6 do CPC) tem como pressuposto o cumprimento do ónus de impulso processual, ainda que este seja imposto por determinação judicial, tanto mais que a mesma encontra respaldo na lei.
III.–A aferição da negligência da parte, enquanto pressuposto da deserção da instância, deve ser feita em face dos elementos que constam do processo, pelo que inexiste fundamento para a respectiva decisão ser precedida de audiência prévia das partes.

Ac. do TRL de 12/07/2018, proc. 563/14.3YXLSB.L1-7:
Uma vez notificadas as partes no sentido de que os autos aguardem sem prejuízo do disposto no artigo 281 do CPC, a lei não obriga a que as mesmas devam ser ouvidas sobre a consequência da falta de impulso, antes de proferido o despacho de reconhecimento de que a instância está deserta.

Ac. do STJ de 18/09/2018, proc. 2096/14.9T8LOU-D.P1.S1: I
I.–A deserção da instância depende da verificação dos pressupostos previstos no art. 281/1 do CPC: (i) o decurso de um período de tempo superior a 6 meses em que o processo, sem andamento, esteja a aguardar o impulso processual das partes; e (ii) a negligência das partes (na promoção dos seus termos).
II.–Tendo, em 20/06/2016, sido proferido despacho, que foi notificado à recorrente, a declarar a instância suspensa (em virtude do óbito de uma das partes), “sem prejuízo do disposto no artigo 281/5 do CPC” e tendo o processo estado parado até 23/01/2017, mostram-se preenchidos os pressupostos enunciados em I, dado que, sabendo a recorrente que a sua inércia conduziria à deserção da instância, a paragem do processo por período superior a 6 meses decorreu de negligência sua.
III.–Nessas circunstâncias, não cabia ao tribunal ordenar o prosseguimento dos autos através de qualquer diligência, nem lhe era exigível determinar a notificação da recorrente antes de proferir o despacho a declarar extinta a instância.

Ac. do TRL de 19/12/2018, no proc. 546/14.3TYLSB.L1 (que o agora relator subscreveu como 1º adjunto – não publicado):
Decorridos seis meses de inactividade processual, o juiz deverá avaliar se a mesma é imputável a negligência da parte. Esse juízo formar-se-á à luz da realidade espelhada no processo. Se a parte, devidamente esclarecida acerca do ónus que lhe incumbe tendo em vista o andamento do processo (in casu, registo da acção de anulação de deliberações sociais), nada diz ou faz e nenhuma justificação apresenta nem é evidente nos autos, a conclusão a retirar é a de que há negligência do lado da parte. A audição prévia da parte configura, neste contexto, um acto inútil, legalmente vedado (art. 130 do CPC).”   
                           
Ac. do TRL de 10/01/2019, proc. 385/09.3TBVPV-A.L1-2:
I.–Se a exequente, representada por advogado, depois de notificada, pela AE, para tomar posição quanto a uma questão necessária para a penhora de um bem, nada diz durante quase 11 meses, pode-se concluir pela existência da negligência da sua parte em permitir o andamento do processo. Tanto mais se, depois disso, foi de novo notificada para vir aos autos requerer o que tivesse por conveniente, sob pena de extinção por falta de impulso processual e, depois de notificada do resultado das diligências inúteis que então requereu, de novo nada disse durante quase outros 6 meses, apesar de ter escrito que o iria fazer, só quebrando a inacção com a interposição do recurso do despacho que julgou a execução extinta por deserção (arts. 277/-c e 281/5, ambos do CPC).
II.–Nem sempre as partes têm de ser notificadas para se pronunciarem sobre a eventualidade de se considerar que o seu comportamento revela negligência no andamento do processo; de qualquer modo, no caso, a exequente foi-o e nada disse quanto à questão, o que contribui para a qualificação do seu comportamento como negligente.

O ac. do TRE de 17/01/2019, proc. 3625/14.3T8LLE.E1:
II.–Frustradas as diversas diligências tendentes à citação da sociedade executada por parte da agente de execução e tendo o Tribunal reconhecido expressamente que tal acto não havia sido concretizado, foi o exequente notificado para prestar uma informação essencial para esse desiderato.
III.–Apesar da regra da oficiosidade das diligências destinadas à citação – art. 226 do CPC – não pode o exequente deixar de prestar a sua colaboração quando, para a sua efectivação, é convocado a prestar uma informação decisiva para a sua concretização, materializando-se tal dever através da competente notificação (art. 219/2 do CPC);
IV.–Omitida tal informação e perante a ausência de qualquer outra por parte do exequente na sequência da notificação que lhe foi efectuada pode-se afirmar que o mesmo não impulsionou o processo, como lhe competia, ocorrendo deserção da instância executiva volvido o prazo de seis meses a que alude o art. 281/5 do CPC.

Ac. do TRL de 22/01/2019, proc. 17312/16.4T8SNT.L1-7:
I.–À luz do CPC de 2013, considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de 6 meses;
II.–Se, em face dos autos, a situação de negligência for patente e inequivocamente atribuível à parte porque o andamento do processo depende, sem dúvida e por força da lei, da sua iniciativa e disso não pode deixar de considerar-se a parte onerada advertida de forma suficiente, a deserção da instância deve ser logo declarada a partir da mera análise dos elementos constantes do processo, sem necessidade que quaisquer outras indagações ou da audição das partes sobre a questão;
III.–É à parte onerada com o impulso processual que incumbe informar nos autos das razões que justificam a sua inércia, por forma a afastar qualquer situação de negligência aparente;
IV.–Tendo as autoras sido notificadas de que a instância se encontrava suspensa por óbito de um dos réus na acção até à habilitação dos sucessores da parte falecida, o decurso do referido prazo de 6 meses sem qualquer iniciativa processual é bastante para aferir da sua negligência, não se justificando, à luz do princípio do contraditório ou de qualquer outro, a audição prévia das partes sobre o tema.

Ac. do TRE de 31/01/2019, proc. 435/17.0T8ORM.E1:
Este acórdão segue a primeira posição num processo de expropriação, mas adere ao acórdão do STJ de 20/09/2016, citado acima, quando se esteja no âmbito do processo comum. Neste sentido, nas expropriações, já ia o ac. do TRL de 18/01/2018, proc. 2546/16.0T8LSB.L1.

Ac. do TRP de 11/04/2019, proc. 10135/05.8TBMAI.P1:
I.–A deserção da instância prevista no artigo 281/1 do CPC, depende da verificação dos seguintes pressupostos: a) Paragem do processo por mais de seis meses, por ter sido omitida a necessária prática do acto de que dependia o seu prosseguimento (respeitante ao próprio processo, ou a incidente de que dependia o prosseguimento da acção principal); b). Ser essa omissão devida à negligência da parte que tinha o ónus da sua prática, isto é, dever o acto ser praticado por si - e não pela parte contrária, pela secretaria, pelo juiz, ou por terceiro -, e ter a sua omissão um carácter censurável.
II.–A decisão judicial, que culmine com o decretamento da deserção da instância, importa em si mesma um juízo acerca da existência de negligência da parte em termos de impulso processual, em função do que se mostra retratado ou espelhado objectivamente no processo.
III.–Assim, essa decisão não impõe uma prévia audição das partes, designadamente para funcionamento do “princípio do contraditório” ou para evitamento de uma pretensa decisão surpresa.

Ac. do TRE de 30/05/2019, proc. 170/17.9T8SRP.E1
I.–Em sede de direito adjectivo civil, sempre que surge alocada à ideia de paralisação processual por um determinado período de tempo, a expressão negligência tem um conteúdo axiológico-normativo próprio consolidado que reflecte a ideia de inércia e a mesma não tem de ser aferida para além dos elementos que o processo revela.
II.–Para além de estar salvaguardada a prática de actos urgentes, caso surjam dificuldades na instauração do competente incidente de habilitação ou obstáculo diverso susceptível de colocar em causa o interesse no regular andamento da causa, os sujeitos processuais podem solicitar ao tribunal a prorrogação dos prazos necessários para a regularização da instância e explicitar fundamentadamente a razão do não impulso processual. Se não o fizerem correm por sua conta e risco as consequências negativas dessa omissão.
III.–Se as partes já tiverem sido alertadas para a consequência da omissão do impulso pelo prazo de deserção, se não solicitarem a concessão de prazo adicional ou não invocarem o justo impedimento, o julgador não tem de aferir a causa subjacente ao comportamento omitido e pode declarar a deserção da instância sem estar vinculado a um comportamento proactivo no sentido de ultrapassar os obstáculos associados à habilitação de herdeiros.

Ac. do TRL de 06/06/2019, proc. 6241/17.4T8ALM.L1-2:
II.–Se do despacho de 11/6/2018 que declarou suspensa a instância por falecimento de um dos co-réus, não consta qualquer expressão de alerta para as consequências prevenidas no art. 281, porque o art. 351/1 dispõe que a habilitação dos sucessores da parte falecida na pendência da causa para com eles prosseguirem os termos da demanda tanto pode ser promovida por qualquer das partes que sobreviveram como por qualquer dos sucessores e deve ser promovida contra as partes sobrevivas e contra os sucessores do falecido que não sejam os requerentes, tal significa que nos autos não apenas o autor como os restantes réus poderiam promover a habilitação dos sucessores da co-ré, o que tanto basta para se concluir que um correcto julgamento da negligência das partes no prosseguimento do incidente impunha a advertência (que não foi feita) de que a falta de impulso processual importaria a deserção da instância; não se tendo efectuado essa advertência, por forma a aferir da negligência, a decisão de deserção, muito embora fundamentada, constitui uma decisão surpresa porque extingue uma instância judicial com um extenso número de sujeitos processuais muitos deles já citados e que contestaram não se tendo pronunciado sobre a omissão dos actos de habilitação dos herdeiros da co-ré; importa em observância do princípio do contraditório prévio, ouvir as partes (já citadas) sobre esse julgamento.
*

Em suma, não se verifica a nulidade invocada da falta de audição prévia da autora.
*

Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente.
Custas, na vertente de custas de parte, pela autora (que decaiu no recurso).


Lisboa, 24/10/2019


Pedro Martins
Laurinda Gemas
Inês Moura (com a declaração de voto que se segue).


Voto de vencido:
Voto contra a decisão no sentido da desnecessidade de notificação da parte antes de ser proferido o despacho a julgar extinta a instância por deserção
Faço-o por coerência com a posição contrária que já segui em processo em que fui relatora – Acórdão do TRP de 27/09/2018 no proc. 21005/15.1T8PRT.P1 - citado na fundamentação apresentada, no seguimento de entendimento também defendido por parte da jurisprudência e da doutrina, que nos escusamos de evidenciar por estar citada no acórdão.
Considero, tal como ali relatei, que não sendo automática a deserção da instância pelo decurso do prazo de 6 meses, o tribunal, antes de proferir o despacho a que alude art.º 281.º n.º 4 do CPC, deve ouvir as partes de forma a melhor avaliar se a falta de impulso processual é imputável a comportamento negligente, decorrendo ainda tal dever do art.º 3.º n.º do CPC ao dispor que o juiz deve observar e fazer cumprir o princípio do contraditório ao longo de todo o processo.
Não obstante a divergência que se conhece sobre esta questão, esta é a posição com a qual nos identificamos e consideramos também mais em consonância com o princípio da cooperação expresso no art.º 7.º n.º 1 do CPC.

Inês Moura