Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3147/08.1JFLSB.L1-5
Relator: ANA SEBASTIÃO
Descritores: PORNOGRAFIA
BUSCA DOMICILIÁRIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/15/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE
Sumário: 1. Apesar de o arguido, em casa de quem se realizou busca e apreensões de documentos, ser advogado, as prerrogativas dessa qualidade profissional não se aplicavam por o local buscado não ser o escritório onde desempenhava a sua profissão e os documentos apreendidos nada terem a vêr com tal qualidade.
2. E se o Arguido já não desempenhava as funções de Advogado, tinha abandonado o Direito e tinha suspenso a inscrição na Ordem, o quarto buscado não podia funcionar, como na verdade não funcionava, como escritório de advogado, pelo que a busca não tinha de ter sido presidida por um juiz e um representante do Conselho Distrital da Ordem dos Advogados, não se mostrando violado o artigo 177°, n.° 5, do CPP. E nessa medida não teria de constar no auto de busca que o local era também escritório de Advogado, auto que não padece de qualquer inverdade ou falsa declaração quanto ao sucedido.
3. O download de material pornográfico relativo a menores, não se tendo provado a intenção de partilha, constitui a prática de crime de aquisição ou detenção de pornografia de menores previsto e punido pelo artigo 176°, n.° 4al. d), do Código Penal. O download não constitui "importação de pornografia de menores", crime previsto e punido pelo artigo 176°, n. ° 1 alínea c) do CP.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 5.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.
I.1.
No Processo Comum (Tribunal Colectivo) n.º 3147/08.JFLSB.L1, da Comarca de Lisboa - Instância Central – 1.ª Secção Criminal – J18, foi julgado J., tendo sido proferido Acórdão, em 25-06-2015, decidindo condená-lo pela prática de um crime de pornografia de menores, de trato sucessivo, p. e p. pelos artigos 176.º, n.º 1, alíneas c), agravado, nos termos do disposto no artigo 177.º, n.º 6, ambos do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão.Suspender a execução da pena de prisão aplicada ao arguido, por igual período, subordinada ao cumprimento do dever de, no prazo máximo de 6 (seis) meses, a contar do trânsito em julgado da decisão, entregar a uma Instituição de Solidariedade Social à sua escolha, preferencialmente vocacionada para a protecção de crianças e jovens, a quantia de € 1.500 (mil e quinhentos euros), devendo comprová-lo documentalmente nos autos.

2.
O Arguido não se conformou com a decisão, dela interpôs recurso apresentando motivação da qual extraiu as seguintes conclusões:
1. Deve ser dado como provado que o Recorrente se opôs à realização da busca e apreensão dos autos com fundamento da circunstância de ser Advogado e de a diligência ter como alvo o seu escritório. Para tanto deve valorar-se o depoimento da testemunha JM prestou o seu depoimento no dia 25 de Maio pelas 10:48:02 horas. Atente-se sobretudo na passagem do seu depoimento entre os minutos 3:10 min. e 3:46 min, da gravação identificada como "20150525104828_17449475_2871055". Deve, portanto, julgar-se falso o auto de busca e apreensão dos autos.
2. O Recorrente suscitou a falsidade do auto de busca e apreensão dos autos portal auto não relatara circunstância, evidentemente relevante, de o Recorrente se ter oposto à realização da busca e apreensão por ser Advogado e esta ter como alvo o seu escritório. Tal questão não foi
apreciada pelo Tribunal Criminal de Lisboa, pelo que o acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia (artigo 379°, n.° 1, alínea c), do CPP).

3. A busca e apreensão dos autos são nulas por o Recorrente ser Advogado, a diligência ter como alvo o seu escritório e não ter sido presidida por um Juiz e um representante do Conselho Distrital da Ordem dos Advogados (artigo 177°, n.° 5, do CPP).
4. É irrelevante que o Recorrente tivesse a sua inscrição suspensa ou que o escritório estivesse localizado na sua residência.
5. A invalidado da busca e apreensão foi tempestivamente invocada pelo Recorrente no decurso da própria diligência.
6. Por outro lado, o acórdão recorrido é igualmente nulo por condenar o Recorrente por factos diversos dos da Acusação. Na Acusação imputava-se ao Recorrente a partilha de pornografia de menores e a detenção, com intenção de partilha, de pornografia de menores. No Acórdão Recorrido, condena-se o Recorrente por ter importado pornografia de menores, sendo que tal importação seria, nada mais nada menos, do que o próprio acto de download (cf. artigo 379°, n.° 1, al. b), do CPP).
7. O Recorrente fez o download de pornografia infantil. Tal download poderia constituir, quando muito, a prática de crime de aquisição ou detenção de pornografia de menores previsto e punido pelo artigo 176°, n.° 4, do Código Penal. O download não constitui "importação de pornografia de menores", crime previsto e punido pelo artigo 176°, n. ° 1 alínea c) do CP.
Tal importação, como acto integrante da comercialização de pornografia de menores, equivale ao transporte de pornografia de menores de um país para Portugal.

8. Atentos os factos provados nos autos, deveria ter sido aplicada ao Recorrente a mais baixa sanção possível.

Nestes termos e nos mais de Direito, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que declare a falsidade do auto de busca e apreensão dos autos e, em consequência, anule todo o processado posterior e absolva o Recorrente da prática do crime por que foi condenado.
Mesmo que assim não se entenda deve declarar-se a nulidade da sentença por omissão de pronúncia e por conter uma condenação por factos diversos dos da acusação.
Se assim não se entender, deve, em qualquer caso, absolver-se o Recorrente por os factos provados não serem subsumíveis no artigo 176°, n.° 1 al. c), do CP.
Finalmente, e por cautela de patrocínio, o Recorrente mereceria, quando muito, a mais leve sanção admitida por lei e que a mesma fosse suspensa.
Decidindo nesta conformidade V. Ex.as fareis a esperada e costumada
JUSTIÇA!


3.
O recurso foi regularmente admitido.

4.
O Ministério Público respondeu ao recurso defendendo que o download dos materiais pornográficos não se configura como actividade importadora, por maioria de razão quando o legislador a coloca a par de outras como a produção, distribuição e exportação de materiais (neste sentido Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 17 de Março de 2015).
Isto é a importação a que alude a al. c) do n.º l do artigo 176° do Código Penal tem de ser conjugada com as restantes acções aí descritas onde se verifica que foi propósito do legislador se referir a todo o processo de comercialização dos materiais pornográficos, não podendo assim ser entendida como download dos ficheiros para sua visualização como sustenta o arguido, pelo que deve operar a alteração da qualificação jurídica e ser o arguido condenado pela prática do crime previsto no artigo 176°, n.º 4 do Código Penal.
E relativamente à medida da pena, só a pena de prisão se adequa às elevadas necessidades de prevenção geral, que no caso deve ser suspensa na sua execução, mediante a condição já fixada no Acórdão.

5.
Nesta Relação a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta apôs o visto.

6.
Colhidos os vistos realizou-se a conferência.

II –
Da decisão recorrida consta o seguinte:
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1.
MATÉRIA DE FACTO PROVADA
DA ACUSAÇÃO
1.No dia 19 de Março de 2008, o arguido, no interior da sua residência, sita na Avenida Rio de Janeiro, através de um dos seus computadores e utilizando, para o efeito, o endereço de I.P. 81.84.94.234., efectuou o download e partilhou, através do programa P2P, designado 'Emule" dez ficheiros do tipo vídeo, com as denominações e os conteúdos seguintes:
(Pthc) (Ls-Magazine) Lsm09-02-02-10Yo-12Yo Drinks Milk. avi: visualiza-­se crianças do sexo feminino, com idades inferiores a doze anos, nuas, a beberem um líquido branco, que parece leite, deixando-o escorrer pelos corpos nus, em poses sexualizadas, a tocarem no seu próprio corpo e a exibirem as vaginas, simulando orgasmos;
Raygold-02 Sex.avi: visualiza-se uma menor de doze anos a introduzir na sua boca o pénis ereto de um adulto, fazendo movimentos de vaivém; visualiza-se uma criança do sexo feminino, com idade inferior a doze anos, nua, a ser colocada por adulto, do sexo masculino, de pernas abertas, por forma a exibir a vagina; depois o homem adulto abre a vagina da menor, com os dedos; dá instruções à menor, para que abra a vagina com as suas próprias mãos, o que ela faz; após, o homem adulto introduz o seu pénis ereto na vagina da menor, sem penetração total, e faz vários movimentos de vaivém até ejacular na vagina da menor, sendo visível o sémen a escorrer nos lábios da vagina;
Kim 13YoAnd Man Good Quality Preteen Pedo.mpg.: visualiza-se uma menor de catorze anos de idade, a despir-se, ficando apenas com as meias; a menor despe o roupão e as cuecas ao homem adulto, que fica nu; a menor deita-se na cama, de barriga para cima, exibindo a vagina; nas e exibe a vagina; o homem deita-se na cama e dá instruções à menor; seguindo essas instruções, a menor o pénis do homem adulto na sua boca; depois coloca-se sentada em cima da barriga do homem e efetua movimentos masturbatórios, puxando o pénis para cima e para baixo, com as mãos; o homem coloca-se de pé e dá instruções à menor para que o masturbe, o que ela cumpre; com a mão, a menor faz movimentos de vaivém, após o que introduz o perus em ereção, na sua boca; alternadamente, masturba o pénis, com as mãos, e introduz o pénis na boca, até o homem ejacular na sua cara;
Pthc - Family Fun Pedo 28Yo Boys Líttle (Mom Sex Kiddie's.mpg.: visualiza­se criança do sexo masculino, menor de 10 anos de idade, a ser penetrada no ânus, por mulher adulta, que lhe introduz um dedo no ânus; visualiza-se mulher adulta a ser penetrada, na vagina por pénis de criança do sexo masculino, menor de doze anos de idade; visualiza-se homem adulto a masturbar-se, friccionando o pénis, com as mãos e dois rapazes, menores de 12 anos de idade, um de cada vez a urinarem para cima do pénis do referido homem;
Pthc - Hc Tt5 - (re Preteen hc) - (10yrs-14ys girls). Mpg.:Color Climax 1975 Pthc - 2Women & 9Yo Danish Boy A Man & 14YoGirl (Porn SexXxx: visualiza-se criança do sexo feminino menor de 14 anos de idade e homem adulto a abrir-lhe a vagina com os dedos, a friccionar a vagina, externa (nos lábios) e internamente e a introduzir um dedo na vagina da menor; depois é a menor que introduz os seus próprios dedos na vagina; a menor ainda introduz um objeto com a configuração de um pénis adulto na sua vagina, e depois outro objeto, com características idênticas, ao qual previamente aplicou um creme; visualiza-se um homem adulto a friccionar o seu pénis e, após, introduz o mesmo na vagina da menor; visualiza-se ainda uma criança do sexo feminino menor de 14 anos de idade a introduzir na sua vagina objeto com a configuração de um pénis, a aplicar creme no referido objeto e depois a friccionar a vagina com o aludido objeto; visualiza-se criança do sexo feminino menor de 14 anos de idade a efetuar com as mãos movimentos de vaivém no pénis de homem adulto; visualiza-se outra criança do sexo feminino menor de 12 anos de idade a despir-se e depois a friccionar com as mãos o pénis de homem adulto; visualiza-se criança do sexo feminino menor de 12 anos de idade a manusear a vagina e a introduzir os dedos na vagina; visualiza-se outra criança, do sexo feminino, menor de 14 anos, a exibir a vagina, e a abri-Ia com os dedos; visualiza-se criança do sexo feminino, menor de 14 anos, a exibir os seios nus; visualiza-se menor de 16 anos a exibir a vagina, homem adulto a introduzir um dedo na vagina da menor, depois a introduzir dois dedos na vagina, penetrando-a; visualiza-se depois a penetrá-Ia na vagina com o pénis; ainda se visualizam duas menores de 12 anos, do sexo feminino a despirem-se, deitadas na cama, a chuparem os mamilos uma à outra e a tocarem nos órgãos genitais uma da outra;
Colar Climax 1975 Pthc - 2Women & 9Yo Danish Boy A Man & 14YoGirl (Porn SexXxx: visualiza-se uma criança do sexo masculino, com idade inferior a dez anos, deitado, nu, entre uma mulher adulta e uma menor do sexo feminino menor de 16 anos, ambas nuas; visualiza-se uma menor de 12 anos a ser manuseada na vagina por mulher adulta, que lhe fricciona a vagina com a mão, após o que introduz a língua na vagina da menor; visualiza-se ainda o mesmo rapaz numa banheira, com a mesma mulher adulta e com a referida menor de 16 anos, a acariciá-las no corpo; visualiza-se a mesma mulher adulta a introduzir na boca o pénis do menor de 10 anos, em movimentos de vaivém; visualiza-se o referido menor em cima da referida mulher adulta, que abre as pernas; visualiza-se ainda menor de 16 anos, do sexo feminino, a ser penetrada na vagina por pénis de homem adulto, em ereção, em movimentos de vaivém, realizando cópula; a dada altura visualiza-se uma mulher adulta, a acariciar, com as mãos, o corpo da aludida menor e o pénis do mesmo adulto, enquanto realizam a cópula; visualiza-se ainda mulher adulta a colocar o pénis de um menor de 12 anos de idade entre os seus dedos de uma das mãos, efetuando movimentos de vaivém; finalmente, visualiza-se homem adulto a introduzir o seu pénis na vagina de menor de 16 anos de idade;
«(HussyfanHPthc}Vicky 7Yo And 10Yo 69 Lolita,mpg: visualiza-se uma criança, do sexo feminino, com idade inferior a doze anos, a introduzir o pénis em ereção de um homem adulto na sua boca, efetuando movimentos de vaivém, para cima e o para baixo, até o homem ejacular: visualiza-se a mesma menor e o mesmo homem adulto deitados, numa cama, o homem a segurar o pénis e depois a menor a manuseá-lo com a mão direita, para cima e para baixo: visualiza-se uma menor de 12 anos de idade, do sexo feminino com o rabo erguido para cima e as pernas levantadas a abrir o ânus, segurando as nádegas com as duas mãos; um adulto homem calca um dedo na vagina da mesma menor; visualiza-se uma menor de 10 anos, do sexo feminino, junto de um homem adulto de pé, que efetua movimentos de vaivém com o seu pénis em ereção, junto à cara da menor, introduzindo, algumas vezes, a ponta do pénis na boca da menor;
Pedo Webcam (Pthc) Children Kids Hard - 2 New 2006!!!.mpg: visualiza-se uma criança de sexo feminino, com idade inferior a doze anos, a ser massajada na vagina, por cima das cuecas, pela mão de adulto homem, que também a massaja nos seios; o mesmo adulto passa com um vibrador, em formato de pequeno pénis, pelo corpo da menor, principalmente na zona da vagina; noutro momento o adulto, com as mãos, massaja a menor no ânus e na vagina; noutro momento introduz as mãos dentro das cuecas, tira-lhe as cuecas e começa a massajar os lábios da vagina, friccionando com os dedos; depois, abre a vagina da menor com os dedos; a seguir, usa um vibrador, em formato de pequeno pénis e introduz o mesmo na vagina da menor, penetrando-a e fazendo movimentos oscilatórios, por várias vezes 8 (a dada altura verifica-se a mão de outro adulto homem a ajudar na tarefa); noutro momento visualiza-se o aludido vibrador introduzido na vagina da menor, ligado por um fio; noutro momento, o adulto homem introduz vários dedos na vagina da menor e volta a introduzir-lhe o referido vibrador (no que é ajudado pelo segundo adulto presente), volta a introduzir-lhe vários dedos na vagina da menor, abrindo-a; depois, coloca-se em cima da menor e penetra-a com o seu pénis ereto na vagina da menor, efetuando movimentos de vaivém, copulando até ejacular na vagina da menor; depois de retirar o pénis, abre com as mãos a vagina da menor e limpa-a com um lenço de papel; finalmente visualiza-se a vagina da menor, sendo percetível o esperma a escorrer pelas pernas da menor;
((Hussyfan)) (Pthc)-K-K!!!NEW - WetB4ass(marissa) - young girl Lolita pedo fuckbrother.mpg: visualiza-se uma criança de sexo feminino, com idade inferior a dez anos, nua, a introduzir na sua boca e a massajar o pénis erecto de um adulto, fazendo movimentos de vaivém; num segundo momento, a menor está deitada de barriga para baixo, a abrir o ânus segurando com as mãos as nádegas e o adulto esfrega o seu pénis erecto no ânus da menor;
Roygold-PTHC- Hussyfan 11 yo Nelia palays with Dildo.avi: visualiza-se uma criança de sexo feminino, com idade inferior a doze anos, a despir-se, ficando nua, a aplicar óleo corporal pelo seu corpo, incluindo a vagina, no chão duma cozinha; a menor introduz, na boca, um objeto com a configuração de um pénis e introduz outro objeto semelhante na vagina, fazendo movimentos oscilatórias; noutro momento, colocada em cima da bancada da cozinha, com as pernas abertas, introduz um outro objeto, com as mesmas características, na sua vagina, fazendo movimentos oscilatórios, aplica óleo na vagina, retira o objeto e volta a introduzi-lo, por várias vezes, e ainda esfrega a vagina com uma mão; noutro momento, coloca-se de rabo para a câmara e introduz um dos aludidos objetos na vagina, efetuando movimentos oscilatórios; noutro momento, volta a colocar-se de frente com as pernas abertas e introduz o mesmo objeto na vagina;

2.No dia 3 de Setembro de 2008, o arguido detinha, entre outros dispositivos de armazenamento, no interior da sua residência, sita na Ava Rio de Janeiro, nº 58, R/C D, em Lisboa:
- Um computador portátil da marca 'HP', modelo 'Pavilfion', com o nº de série CNF8072F80;
- Um computador de secretária da marca 'Triudus', com o nº 570067441 aposto no verso;
- Um computador portátil da marca 'Toshiba, modelo 'Satelite', com o nº de série 34066760H;
- Um disco rigido da marca 'Fujitsu', com o n.o de série 05264249;
- Um disco externo identificado como 'Elements', com o nº de série WCALW2061487.

3.O arguido detinha, no disco rígido da marca 'Fujitsu', com o nº de série 05264249, duzentos e trinta e sete (237) ficheiros de imagem e nove (9) ficheiros de vídeo contendo abusos sexuais de crianças menores de catorze anos de idade.

4.Tais ficheiros de imagens têm as designações seguintes:
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5. Em tais ficheiros de imagens, visualizam-se, designadamente:
mulheres adultas a introduzirem na boca pénis de menores do sexo masculino, menores de 12 anos, alguns com menos de 5 anos;
crianças do sexo feminino, com idades inferiores a catorze anos, a exibirem o corpo e a vagina e o ânus;
crianças do sexo feminino, menores de catorze anos, em várias divisões de residências, ou em vários ambientes (praia/campo), nuas e sem i-nuas, simulando poses eróticas para a câmara e exibindo os seus corpos;
criança do sexo feminino, menor de dez anos, amarrada, a ser penetrada na vagina por pénis de canídeo;
crianças com idades inferiores a doze anos, nuas, de punhos atados ou amarradas pelo pescoço;
crianças do sexo feminino, com idades inferiores a catorze anos, deitadas em cima de camas e sofás, que se exibem diante da câmara e que se vão despindo;
menores de catorze anos, tendo algumas das crianças idades inferiores a cinco anos, nuas, deitadas em cima de camas, exibindo os seus órgãos genitais;
crianças do sexo masculino, menores de 14 anos, a penetrarem com o pénis o ânus de outro menor, ou a serem penetrados no ânus por outro menor;
crianças do sexo masculino, menores de 14 anos, a introduzirem na boca pénis de outras crianças, também menores de 14 anos, alguns com idade inferior a 10 anos;
crianças de ambos os sexos, de idades inferiores a 14 anos, a praticarem entre eles vários actos sexuais;
crianças do sexo feminino, de idade inferior a catorze anos, algumas com idade inferior a 10 anos, nuas e semi-nuas:
a exibirem, de forma lasciva, os seus órgãos genitais;
deitadas em cima de camas e sofás, com as pernas abertas, a exibirem as vaginas, abertas por mãos de homens adultos, que as friccionam;
deitadas em cima de camas e sofás a manusearem pénis de homem adulto;
nuas, introduzindo os seus dedos e dildos e outros objectos nos seus órgãos genitais;
a introduzirem, na boca, pénis erectos de adultos ou pénis de crianças de idade inferior a doze anos;
a serem penetradas, na vagina e no ânus, por pénis eretos e por dedos de homens adultos;
com esperma no corpo;
a masturbarem-se, a acariciarem-se e a beijarem-se mutuamente, praticando, entre todas, diversos atos sexuais.
- adultos do sexo masculino:
a abrir as vaginas de crianças com idades inferiores a doze anos;
a esfregar, no exterior dos órgãos genitais de crianças do sexo feminino com idades inferiores a doze anos, pénis eretos, fazendo movimentos de vaivém e ejaculando nos corpos dos menores;
a penetrar, na vagina e no ânus, crianças com idades inferiores a doze anos;
a introduzir o pénis no ânus de crianças do sexo feminino, menores de doze anos;
a forçar crianças do sexo feminino, com idades inferiores a doze anos, a introduzir, na boca, os seus pénis erectos e ali ejaculando;
a introduzir os pénis nos órgãos genitais de crianças com idades inferiores a catorze anos, realizando movimentos de vaivém e ejaculando;
a friccionar os órgãos genitais de menores de catorze anos de idade;
a friccionar e a realizar movimentos de vaivém com os seus pénis, até ejacularem, nos órgãos genitais de crianças, de sexo feminino, com idade inferior a catorze anos;

6. Os referidos ficheiros do tipo vídeo tinham as seguintes designações e conteúdos:
~ «hussyfan».pthc.New.-.Mandy.wmv:
Visualiza-se uma menor do sexo feminino, menor de 12 anos de idade, que é mandada despir por um adulto do sexo feminino, a quem a menor chama "pai", primeiro a blusa e depois as cuecas (sendo perceptível que a menor não quer despir­se), ao que a menor obedece; num segundo momento visualiza-se a menor nua, sendo especialmente filmados os seios e os órgãos genitais da menor; visualiza-se a mesma menor de pernas abertas, depois deitada, visualizando-se a vagina e os seus seios.
- Hussyfan) (pthc) (r@ygold) (babyshivid) NEW - Janessa 8Y2.mpg: Visualiza-se uma criança do sexo feminino, menor de 7 anos de idade, amarrada pelo pescoço, que é obrigada a introduzir o pénis de um homem adulto na boca, enquanto o adulto efetua movimentos de vaivém.
- (pthc) - 5 yo Nancy - dick-play.mpg:
Visualiza-se um homem adulto, despido da cintura para baixo, deitado ao lado de uma criança do sexo feminino, de idade inferior a seis anos, enquanto a criança manuseia, com as suas mãos o pénis do homem,
- (pthc)CUM INSIDE -A MUST HAVE- (1.4MB).MPG:
Visualiza-se uma rapariga, de idade inferior a doze anos, a ser penetrada, na vagina, por pénis de homem adulto, em ereção, até este ejacular.
- Family (Pedo Vintage) -Early Teen Rubs Twat Against Mom 4(Real!).mpg:
Visualiza-se uma rapariga menor de catorze anos a friccionar o mamilo do seu seio esquerdo numa vagina.
- Kinder Porno 29sec (lIIegal Preteen Underage LoUta Kiddy Child Incest XXX Porno9.mpg:
Visualiza-se uma rapariga, menor de catorze anos de idade, a ser penetrada, na vagina, por pénis de homem adulto, em ereção, depois de ter friccionado o pénis na vagina da menor,
- PTHC - Girl Sucks A Little Boys Dick.mpg:
Visualiza-se uma criança do sexo feminino, menor de doze anos de idade, a introduzir, na sua boca, o pénis de rapaz menor de dez anos de idade, com movimentos de vaivém,
- Young girl second orgasm pthc.avi:
Visualiza-se um homem adulto a friccionar com os dedos de uma mão, enquanto com a outra segura a menor, a vagina de uma menor do sexo feminino, menor de 12 anos de idade, até lhe provocar orgasmo.
- zadoom pedo boys 10yo and mommy.MPG:
Visualiza-se mulher adulta a friccionar, com as mãos, o pénis de rapaz menor de doze anos de idade, efetuando movimentos oscilatórios.

7. No disco rígido da marca 'Fujitsu', com o n. ° de série 05264249, no interior do computador de secretária da marca 'Triudus' o arguido tinha instalado o programa de partilha de ficheiros do tipo 'P2P' (peer-to-peer) designado 'eMule.
8. O arguido sabia que os ficheiros acima descritos, que guardava nos computadores e nos referidos dispositivos, eram relativos a abusos sexuais cometidos contra menores de catorze anos, bem sabendo que sua a sua aquisição/download /importação, divulgação e detenção eram proibidas.
9. Não obstante, quis agir da forma descrita, descarregando os ficheiros e detendo os mesmos nos termos descritos.
10. Agiu, em todos os momentos, livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

MAIS SE PROVOU
11. O arguido admitiu parcialmente os factos e demonstrou arrependimento.
12. Tem formação académica superior, sendo licenciado em Direito e Filosofia e exerceu a advocacia até 2007, tendo desde então a sua inscrição suspensa.
13. É pessoa estimada, considerada e respeitada pelos seus amigos, familiares e conhecidos.

CONDENAÇÕES AVERBADAS
14. O arguido não tem antecedentes criminais.

PERCURSO DE VIDA/CONDIÇÕES PESSOAIS
15. Do relatório social elaborado pela DGRS, consta:
I - Condições sociais e pessoais
J. é filho único, tendo crescido num ambiente familiar estruturado e com registo de transmissão de valores e de estímulos inteletuais. O pai desenvolvia a atividade de veterinário e a mãe de assistente social o que proporcionava ao agregado uma situação económica de estabilidade.
O arguido regista um percurso escolar normativo, tendo ingressado na Universidade Católica de Lisboa e se licenciado, em Direito.
J. iniciou atividade profissional como advogado, passando por dois escritórios privados, depois nos CTT e durante sete anos na Câmara Municipal de Odivelas. Findo este período optou por mudar de área e, dado o interesse em filosofia, ingressou neste curso na Universidade Nova de Lisboa. No decurso do curso foi convidado para integrar uma bolsa de iniciação à investigação. Desde então, o arguido tem desenvolvido várias atividades na área da investigação que implicam a publicação de textos para revistas de filosofia, tendo ainda publicado dez livros os quais foram publicados pela editora prosa poética. E ainda convidado para diversas conferências ao nível universitário. No momento atual, encontra-se a frequentar o mestrado de filosofia na Universidade Clássica de Lisboa.
No tocante à situação de saúde, o arguido desde os dezasseis anos que, do que referiu, sofre de síndrome de ansiedade generalizada, sendo-lhe prescrita medicação psiquiátrica desde há cerca de dez anos. No ano de 2008, fazendo referência a um quadro de esgotamento psicoemocional, fator ao qual não é alheio a instauração do presente processo, esteve internado no Hospital de Santa Maria.
No campo afetivo, o arguido estabeleceu uma relação de namoro com AA há quinze anos, vivendo o casal em união de facto desde Outubro de 2014. No tocante à sua intimidade, refere que iniciou a sua vida sexual com esta companheira, a qual foi, até ao momento, a sua única parceira sexual. Foi-nos descrita uma dinâmica relacional em todos os domínios, nomeadamente sexual e por ambos os elementos do casal, como satisfatória.
Da avaliação efectuada, com recurso à observação direta do comportamento, o arguido evidenciou um estado generalizado de tensão e níveis de inquietação, apresentado dificuldades em relaxar, sintomas que, aparentemente, se agravam com vivências associadas à presente situação jurídico-penal.
Tendo em conta o teor da acusação, o arguido assume a visualização das imagens de pornografia infantil, referindo que o efetuou somente por interesse cultural e sem avaliar, à data, a gravidade de tal comportamento. Apresenta assim um nível de sentido crítico reduzido face ao bem jurídico em causa e défices no que concerne aos sentimentos das vítimas em termos abstratos.
Ao nível familiar, o processo acarretou repercussões negativas, mostrando-se a companheira e a mãe solidárias com o arguido, para as quais não é de todo expectável que o mesmo tenha adotado um comportamento com a tipologia criminal da qual se encontra acusado.
***

2.2.
MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA
(com interesse para a decisão)
Que, com a prática dos factos descritos, o arguido visasse satisfazer a sua líbido e os seus instintos sexuais.
Que, para além da intenção de importação/download/detenção que resultou provada, o arguido tivesse agido com intenção de partilhar os ficheiros.
***
2.3.
MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO

DA NULIDADE DA BUSCA E APREENSÕES EFECTUADAS
Em audiência de julgamento veio a defesa invocar a nulidade da busca e apreensão efectuadas em 03 de Setembro de 2008, invocando em síntese que, sendo o arguido advogado, ainda que com a inscrição suspensa já à data, a diligência teria de obedecer ao formalismo previsto no artº 177º/5 do CPP. Alega que, no quarto onde foi efectuada a busca funcionava o escritório do arguido, o qual, ainda que com a inscrição suspensa mantinha o dever de confidencialidade em relação aos documentos guardados e que, aquando da diligência, deu conhecimento de tal facto à autoridade policial, o que pretende seja considerado como arguição da mesma.
Cumpre decidir.
O artº 177º do CPP, que regula a busca domiciliária estabelece que:
1 - A busca em casa habitada ou numa sua dependência fechada só pode ser ordenada ou autorizada pelo juiz e efectuada entre as 7 e as 21 horas, sob pena de nulidade.
2 - Entre as 21 e as 7 horas, a busca domiciliária só pode ser realizada nos casos de:
a) Terrorismo ou criminalidade especialmente violenta ou altamente organizada;

b) Consentimento do visado, documentado por qualquer forma;

c) Flagrante delito pela prática de crime punível com pena de prisão superior, no seu máximo, a 3 anos.

3 - As buscas domiciliárias podem também ser ordenadas pelo Ministério Público ou ser efectuadas por órgão de polícia criminal:
a) Nos casos referidos no n.º 5 do artigo 174.º, entre as 7 e as 21 horas;
b) Nos casos referidos nas alíneas b) e c) do número anterior, entre as 21 e as 7 horas.

4 - É correspondentemente aplicável o disposto no n.º 6 do artigo 174.º nos casos em que a busca domiciliária for efectuada por órgão de polícia criminal sem consentimento do visado e fora de flagrante delito.
5 - Tratando-se de busca em escritório de advogado ou em consultório médico, ela é, sob pena de nulidade, presidida pessoalmente pelo juiz, o qual avisa previamente o presidente do conselho local da Ordem dos Advogados ou da Ordem dos Médicos, para que o mesmo, ou um seu delegado, possa estar presente.
6 - Tratando-se de busca em estabelecimento oficial de saúde, o aviso a que se refere o número anterior é feito ao presidente do conselho directivo ou de gestão do estabelecimento ou a quem legalmente o substituir.

Por força das especificidades previstas no nº 5, para a busca efectuada em escritório de advogado, a primeira questão que se coloca é de saber se o local objecto de busca é uma residência ou é um escritório de advogado.
A aptidão funcional essencial de um escritório de advogado é permitir aos profissionais de advocacia cumprirem os deveres deontológicos a que estão adstritos.
De facto, a conformação física e logística do escritório de advocacia não obedece a uma lógica única ou prevalecente de protecção dos interesses dos “consumidores” de serviços jurídicos ou de eficiência do “processo produtivo” mas sim, primordialmente, ao adequado cumprimento dos deveres do advogado plasmados no EOA, deveres esses que compreendem, mas não se esgotam, nos do advogado para com o seu cliente - cfr. n.º 2, do art. 92.º do EOA.
O local de exercício da actividade do advogado deve permitir a este executar adequadamente o patrocínio que o seu cliente lhe confiou, mas não só. Do mesmo passo há-de estar dotado das características adequadas a garantir o cumprimento do complexo de deveres a que o advogado está sujeito, designadamente: para com a Administração da Justiça e a sociedade; para com a Ordem dos Advogados; para com os Colegas e para com todos os seus interlocutores no exercício da profissão - cfr., entre outros, os arts. 83.º, 85.º, 89.º e 90.º todos do EOA. Este aspecto original, próprio de uma profissão que exerce “uma actividade privada mas de interesse público” e cuja dimensão de elemento indispensável à Administração da Justiça está consagrada na Lei e decorre da própria Constituição. (AC RL 23.05.2013, www.dgsi.pt)
Ora, resulta, quanto a nós, evidente que o local da busca em nada se coaduna com um escritório de advogado, antes é uma mera residência privada.
Na verdade, como decorre dos autos, e o próprio arguido declarou, o local é a residência da sua mãe, onde ele habitava também, tendo a diligência sido feita na presença desta (estando o arguido também presente), e a mãe é que assinou o respectivo auto. Acresce que, como resultou provado por declarações do arguido, à data da diligência já tinha a sua inscrição suspensa há cerca de um ano.
Ora, mesmo que se mantenham os deveres de sigilo profissional durante a suspensão da inscrição na Ordem dos Advogados, um compartimento de uma casa de habitação onde, tem um local de trabalho, de estudo, um escritório, não é um escritório de advogado, como as fotos juntas aos autos assim também o evidenciam. E ainda que o arguido ainda ali guardasse documentos sujeitos a sigilo profissional, tal não altera o que fica dito, pois que os autos nada revelam que era naquela residência que tivesse funcionado o seu escritório forense, na abrangência que este comporta. Antes pelo contrário. Como a própria defesa referiu um dos computadores tem registado como utilizador “Dr. J. – & Associados, o que também não tem qualquer relevo para afastar o que ficou dito, uma vez que o arguido tinha a inscrição suspensa e nada resulta que a sede desta sociedade fosse na residência da mãe do arguido.
Por outro lado, a busca ordenada à residência do arguido, visava, como visou, apreensão de material informático para o crime que se investigava de pornografia de menores agravado, e não quaisquer documentos abrangidos pelo sigilo profissional. Acresce que os funcionários intervenientes sempre estariam obrigados a não revelar qualquer segredo de que tivessem tomado conhecimento no exercício das suas funções (art.º 383.º do Código Penal).
Como pode ler-se no AC RP de 30.01.2002, Pº nº 0141239, www.dgsi.pt, num caso semelhante, A mudança de processos para a residência de advogado não a transforma, analógica ou automaticamente, em escritório de advogado, isto é, como o local de trabalho aberto a qualquer cliente. Se os processos tivessem sido levados para uma garagem ou barraco ao fundo de um quintal não se iria concluir, certamente, que, para a validade da busca, seria necessária a presença do juiz e do presidente ou delegado da Ordem dos Advogados! Como bem refere o Ex.mo Procurador-geral Adjunto, a casa de advogado, o seu domicílio, não se confunde com o seu escritório, não constando dos autos que o recorrente tivesse comunicado à Ordem dos Advogados que o seu escritório era em sua casa.
Não tinha pois a busca que ser presidida pessoalmente pelo juiz nem que ser avisado previamente o representante da Ordem dos Advogados, uma vez que se tratava como tratou de uma busca domiciliária, a qual está sujeita aos requisitos legais estabelecidos na lei e que foram cumpridos e não de busca em escritório de advogado.
Entendemos, por isso, que nenhuma nulidade foi cometida quer quanto à busca domiciliária efectuada quer quanto à apreensão efectuada.
De referir ainda que, mesmo se considerasse entendimento diverso e se entendesse o local buscado como “escritório de advogado”, o que não se concede, sempre a invocação ora efectuada seria extemporânea, já que sendo do conhecimento do arguido no próprio dia e momento da realização da busca, não foi arguida no prazo legal, pelo que, a sua eventual existência encontrar-se-ia, por isso, sanada, nos termos do art.º 123.º, n.º 1 do CPP [«1 - Qualquer irregularidade do processo só determina a invalidade do acto a que se refere e dos termos subsequentes que possa afectar quando tiver sido arguida pelos interessados no próprio acto ou, se a este não tiverem assistido, nos três dias seguintes a contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em algum acto nele praticado.»].
Alega a defesa que arguiu no acto, desse facto dando conhecimento aos agentes que efectuaram a busca. Ora, do depoimento das testemunhas não resulta claramente essa alegação, mas que o arguido tentou verbalmente e com várias alegações, entre as quais a referência a que se tratava do seu escritório, obstaculizar à diligência.
Como bem sabia o arguido (note-se que não deixa de ser advogado e portanto conhecedor da lei e dos direitos legais e constitucionais em que a mesma o investe) caso se confrontasse com uma busca ilegal ao seu “escritório de advogado”, teria de reagir com os meios ao dispor – arguição da nulidade com o procedimento adequado, que não uma mera referência verbal ao facto de ter ali documentos dos clientes e a reclamação que o EOA consagra. Aliás, como advogado saberia que não poderia prescindir da presença do juiz ou de representante local da Ordem dos Advogados numa busca de escritório profissional de advogado - direito alienável a que se referem os artigos 70.º e 71.º de Estatuto da OA - a qual só se efectuou nos termos em que o foi, porque em residência.
Acresce que a busca foi efectuada em Setembro de 2008 e nem no acto nem em momento posterior foi arguida qualquer irregularidade quer quanto à diligência de busca e apreensão quer quanto ao auto redigido subsequente à diligência, mas apenas agora, em Junho de 2015 e em sede de audiência de julgamento.
Face a tudo o que fica exposto, não se consideram violadas quaisquer disposições legais, nomeadamente as invocadas pela defesa, pelo que se julga improcedente a arguição das nulidades invocadas.

2.3.1 MEIOS DE PROVA

O Tribunal alicerçou a sua convicção no conjunto da prova produzida e examinada em audiência de julgamento, apreciada criticamente, conjugada entre si e com as regras da experiência e da lógica e a livre convicção dos julgadores, nos termos do preceituado no artº 127º do CPP.
Assim, para o apuramento da matéria de facto, o tribunal valorou:
Prova por Declarações - declarações do arguido, quer quanto aos factos descritos na acusação quer quanto à respectiva situação pessoal, profissional e familiar.
Prova por Documentos
Teor dos documentos de fls. 2-10 (informação das autoridades brasileiras), 13 a 84, 128-129 (informação prestada pela Zon Tv Cabo), 266 a 270 (relato de diligência externa e fotos), auto de busca e apreensão de fls. 263 a 265, e fotos, CDR e pen drive (apenso I), Cd’s (apenso II), CD e documentos (apenso III), exame informático constante do apenso III, imagens e fotogramas que compõe o apenso V e ficheiros de imagens constantes do apenso III, fls. 752 (CRC do arguido), fls. 826 a 828 (relatório social).
Prova Testemunhal
- Teor dos depoimentos das testemunhas RV, LM, V, Inspectores da Polícia Judiciária, que participaram na investigação dos presentes autos, sendo, assim, o seu conhecimento decorrente do exercício funcional. Estas testemunhas depuseram de forma que para o tribunal se aparentou globalmente objectiva e isenta, pois não deram indícios de que estivessem a relatar factos que não correspondessem aquilo de que se lembravam e como se lembrava ter presenciado, diligenciado ou examinado, tendo merecido total credibilidade.
- Teor dos depoimentos das testemunhas AA, AB, AS, MC e IM, que depuseram sobre a personalidade, carácter e postura familiar, pessoal e social do arguido, e teor do depoimento da testemunha LP, médico psiquiatra que acompanha o arguido desde 2006, tendo concretizado o estado psíquico do arguido e quadro depressivo de que padecia, bem como as características gerais da sua personalidade e sentimentos evidenciados pelo arguido após os factos ocorridos.
Os depoimentos destas testemunhas foram objectivos e isentos quanto ao conhecimento que demonstraram, tendo merecido credibilidade.

2.3.2 ANÁLISE CRÍTICA DA PROVA

Nas suas declarações, o arguido admitiu, desde logo e no essencial, os factos relacionados com circunstancialismo de tempo, modo e lugar nos termos apurados, material informático e propriedade do mesmo, bem como não pôs em causa o respectivo conteúdo e o download ou descarga, inerente ao acto de partilha, e detenção ou guarda como foi apurado, ou a idade de muitos menores ali exibidos (o que também se revelou notório e evidente).
Foram também relevantes os depoimentos das testemunhas RV, LM, V, inspectores da Polícia Judiciária que participaram na investigação. Os seus depoimentos foram valorados de forma conjunta, por força da intervenção concreta de cada um e do conhecimento que revelaram e desta prova testemunhal foi possível perceber a aquisição da notícia do crime, as diligências efectuadas e informações obtidas, a forma de funcionamento dos programas em geral que permitem a descarga e a partilha dos ficheiros e, em concreto, do material usado pelo arguido e programas e ficheiros que detinha.
No que respeita à concreta data dos factos que a acusação situava entre 18 e 19 de Março, quanto à descarga e partilha (facto nº1), resultou da conjugação dos depoimentos referidos e dos documentos de fls. 6 e 128 e atendendo à diferença horária entre Portugal e o Brasil que os factos ocorreram concretamente no dia 19 de Março, pelo que assim foi dado como provado.
Quanto ao concreto material informático detido pelo arguido e respectivo conteúdo (que o mesmo também não colocou em causa), foram relevantes, para além dos depoimentos das testemunhas referidas, a conjugação destes com o auto de busca e apreensão de fls. 263ss, e com os apensos elencados, bem como o exame informático constante do apenso III.
No que respeita aos factos atinentes ao elemento subjectivo e à consciência da ilicitude, tal foi apurado pela conjugação da prova produzida entre si e com as regras de experiência comum e da vida.
Vejamos.
O arguido negou, negou ter consciência de que ao fazer a descarga dos ficheiros estava a partilhar os mesmos e que quisesse partilhá-los. Também negou, à data dos factos, ter consciência da ilicitude penal da conduta. Explicou, ainda, os factos num contexto pessoal difícil, de depressão e de curiosidade pela sua formação académica filosófica e pelo contexto mediático em torno do processo “Casa Pia”, negando que a sua actuação visasse a satisfação de qualquer interesse sexual.
Quanto ao elemento subjectivo, “dado que o dolo pertence à vida interior de cada um e é, portanto de natureza subjectiva, insusceptível de directa apreensão, só é possível captar a existência através de factos materiais comuns, de que o mesmo se possa concluir, entre os quais surge, com maior representação, o preenchimento dos elementos integrantes da infracção. Pode, de facto, comprovar-se a verificação do dolo por meio de presunções, ligadas ao princípio da normalidade ou da regra geral da experiência”[cf. Ac. da Relação do Porto de 23.02.1983, BMJ, n.º 324, pág. 620].
A doutrina considera a estrutura do dolo da factualidade típica, ou dolo do tipo, envolvendo necessariamente duas vertentes: o elemento intelectual ou cognoscitivo, que consiste no conhecimento pelo agente de todos os elementos ou circunstâncias que integram o tipo legal, e o elemento volitivo ou emocional, onde se inclui a vontade de adoptar a conduta, o querer adoptar a conduta, não obstante aquele conhecimento, mesmo tendo previsto o resultado criminoso como consequência necessária ou como consequência possível dessa conduta.
Da ponderação de toda a prova referida e, principalmente atendendo à forma e contexto em que surgem os factos, bem como à personalidade e formação do arguido foi apurado, com certeza, a concreta intenção do arguido nos moldes provados.
O próprio arguido admitiu a propriedade do material informático, bem como ter feito o download, e a detenção dos ficheiros, apenas explicando os mesmos com a motivação acima referida e naquele contexto.
Ora, não resultou provado a motivação fosse a de satisfazer qualquer instinto sexual, como lhe era imputado na acusação, uma vez que nenhuma prova foi feita em concreto nesse sentido, o que também não releva aqui, visto que intenção e motivação são realidades distintas.
Apurou-se que o arguido sabia e quis actuar da forma descrita e isto é o que releva para afirmação do elemento subjectivo.
Não resultou provado que tivesse, ainda, uma concreta intenção de partilha dos mesmos, facto que não afasta, todavia o preenchimento do tipo subjectivo, por força das modalidades de acção consagradas.
Também é irrelevante que desconhecesse ser a partilha de ficheiros automática quando o download é efectuada, uma vez que tal também não afasta o tipo subjectivo, pois que a descarga ou download antecedente foi feita com conhecimento do conteúdo e pela sua vontade.
Dos depoimentos das testemunhas de acusação, inspectores da PJ, que explicadamente concretizaram o funcionamento do programa utilizado, resulta que a partilha de ficheiros é automática quando é feito o download ou descarga. Ora, com base nesta prova e conjugada com as declarações do arguido e com o exame informático constante dos autos, bem como ao período de actividade e pelo facto de não resultar a partilha dos demais ficheiros que detinha armazenados, fica, ao menos a dúvida sobre essa (e apenas essa) concreta intenção de partilha e quanto ao conhecimento de que a partilha era automática, dúvida que terá de ser valorada a seu favor.
Assim, foi apurada a sua intenção em descarregar e guardar/deter os ficheiros e já não aquele mais da intenção de “partilha” como lhe era imputado.
No que respeita ao outro aspecto referido pela defesa do arguido e que tem a ver com a falta de consciência do arguido da ilicitude da sua conduta e de falta de conhecimento que a mesma era criminalmente punida, a prova produzida, o contexto dos factos e personalidade e formação do arguido, infirmaram totalmente esta alegação, conforme se verá.
O enquadramento jurídico-penal do circunstancialismo exposto remete-nos para o problema do erro sobre a ilicitude, previsto no artigo 17º do Código Penal, que estabelece: “1. Age sem culpa quem actuar sem consciência da ilicitude do facto, se o erro não lhe for censurável. 2. Se o erro lhe for censurável, o agente é punido com a pena aplicável ao crime doloso respectivo, a qual pode ser especialmente atenuada."
É assim necessário, para que o dolo se afirme, como anteriormente referido, que o agente conheça e represente correctamente ou tenha consciência das circunstâncias do facto que preenche um tipo de ilícito objectivo. Com a consequência de que sempre que o agente represente erradamente, ou não represente, um qualquer dos elementos típicos objectivos, o dolo terá de ser afastado.
Na sua obra “O Problema da Consciência da Ilicitude em Direito Penal”, de 1969, o Professor Figueiredo Dias definiu o critério dos limites de não censurabilidade da falta da consciência da ilicitude, enfatizando a natureza da relação que se pode estabelecer entre o erro ou engano que se exprime no facto, e a personalidade da pessoa que erra ou se engana, escrevendo o seguinte : “ A - Se lograr comprovar-se que a falta de consciência de ilicitude ficou a dever-se, directa e imediatamente, a uma qualidade desvaliosa e jurídico-penalmente relevante da personalidade do agente, aquela deverá sem mais considerar-se censurável. B. Se, pelo contrário, não se logrou tal comprovação, a falta de consciência da ilicitude deverá continuar a reputar-se censurável, salvo se se verificar a manutenção no agente, apesar daquela falta, de uma consciência ético-jurídica, fundada em uma atitude de fidelidade ou correspondência a exigências ou pontos de vista de valor juridicamente relevante (Dias, J. Figueiredo, O Problema da Consciência da Ilicitude em Direito Penal, 4ª edição, 1995, Coimbra Editora, § 17, V, maxime p. 328 a 364). O mesmo Autor, em Direito Penal - Parte Geral”, escreveu que “o erro excluirá o dolo (a nível do tipo) sempre que determine uma falta do conhecimento necessário a uma correcta orientação da consciência ética do agente para o desvalor do ilícito; Por outras palavras (…) estamos perante uma deficiência da própria consciência ética do agente, que lhe não permite apreender correctamente os valores jurídico-penais e que por isso, quando censurável, revela uma atitude de contrariedade ou indiferença perante o dever-ser jurídico-penal e conforma paradigmaticamente o tipo específico da culpa dolosa.” (Dias, J. Figueiredo, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2ª edição, 2007, Coimbra Editora, pag. 544 e 545).
Numa perspectiva não muito distante, Taipa de Carvalho entende que “o erro sobre a ilicitude será censurável, ou não, consoante ele próprio seja, revelador e concretizador de uma personalidade (de uma atitude ética pessoal jurídica) indiferente perante o dever-ser jurídico-penal, i.é, perante o bem jurídico lesado ou posto em perigo pela conduta do agente. Sendo revelador dessa atitude ético-pessoal de indiferença, o agente responderá por crime doloso; não o sendo (caso de condutas cuja licitude ainda não está sedimentada na consciência ético-social – o que é possível sobretudo nos direitos penais especiais ou direito penal secundário), afirmar-se-á a exclusão da culpa e, portanto não haverá responsabilidade penal” (Carvalho, A. Taipa de, Direito Penal, Parte Geral, 2ª edição, 2008, Coimbra Editora, p. 480 a 486 e Direito Penal Parte Geral, II, Teoria Geral do Crime, 2006, Universidade Católica, Porto, p. 321 a 331). No entendimento de Cavaleiro Ferreira, censurável será o erro “invencível”. Nesta ordem de ideias, só uma consciência certa e segura da licitude permite a atenuação da culpa. A questão limita-se assim a saber se naquela situação concreta, o agente tinha a obrigação de suspeitar se aquele acto era realmente ilícito ou licito e, em consequência disso, deveria informar-se e verificar se assim era ou não (Ferreira, M. Cavaleiro de, Lições de Direito Penal, I, Editorial Verbo, 1985, p. 220 a 222) .
Os factos ocorreram em 2008, altura em que a sociedade portuguesa, em consequência de processo de pedofilia anteriormente surgido, estava (se não diariamente, pelo menos todas as semanas) confrontada com notícias na comunicação social sobre pedofilia, casos de abuso de natureza sexual ou exposição de menores.
Para qualquer homem médio, os actos sexuais que envolvam menores são repugnantes e são proibidos.
E aqui estamos face a um tipo de comportamentos que “antes de serem proibidos já o eram”, ou seja, a proibição e censura desses comportamentos é inata ao ser humano, mesmo que nenhuma lei o afirmasse. Prende-se logo com os mais elementares princípios e regras da ética, da educação e da moral. E assim, e pela evidência de que para se descarregar esse tipo de ficheiros e visualizá-los, é porque existem crianças que foram abusadas e filmadas, para qualquer pessoa, estes comportamentos são proibidos.
No presente caso, o arguido era já um homem adulto à data dos factos, assim como era então já pessoa perfeitamente inserida socialmente e com formação académica superior (e até superior à media das pessoas), tendo duas licenciaturas, umas das quais em Direito e até exerceu a advocacia.
Ainda de ponderar a atitude do arguido aquando da busca efectuada, de danificação de um computador, como admitido pelo próprio e confirmado pelas testemunhas de acusação, o que, em termos de regras de experiência e da lógica, também evidencia e bem o seu conhecimento de que teria no mesmo conteúdo que não era permitido.
Socorrendo-nos do que já foi dito pelo Supremo Tribunal de Justiça e que pensamos poder aplicar-se ao caso concreto - embora as situações tratadas no Acórdão que iremos citar, não sejam exactamente iguais às dos presentes autos - “… a consciência diluída do desvalor do acto e da acção, pensando que não era tão gravemente punível o relacionamento sexual com a menor, irreleva porque o carácter proibitivo desse relacionamento é do conhecimento generalizado, e nessa medida esse amolecimento da consciência que veicula – já porém não ignora …- é-lhe censurável, nos termos do artº 17º, nº 1, do C.P, por derivar de uma sua atitude de franca contrariedade e indiferença perante valores de observância inabdicável ( cf. Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código penal, pag. 120), sedimentando uma culpa dolosa…” (cfr. Ac. do STJ, Pº nº 4/10.5GBFAR.E1.S1, in www.dgsi.pt).
Face a tudo o que fica exposto, ponderando a prova produzida, o contexto dos factos, formação e personalidade do arguido, aliado com as regras da vida e da lógica, o Tribunal concluiu, com todo o juízo de certeza, e para além de qualquer dúvida razoável, pela prova do conhecimento da ilicitude da sua conduta e pela verificação de todos os elementos que integram o elemento subjectivo do ilícito que lhe vinha imputado.
Quanto à prova dos factos referentes às condições de natureza pessoal e antecedentes criminais do arguido, foram relevantes as declarações do arguido o relatório social elaborado pela DGRS e CRC, juntos aos autos. A postura pessoal e social do arguido e a estima e consideração que lhe é reconhecida pelos seus amigos, familiares e conhecidos foi apurada com base nos depoimentos das testemunhas atrás elencadas, que abonaram a seu favor.
***
2.4.
ENQUADRAMENTO JURÍDICO-PENAL
O arguido está acusado pela prática de 256 crimes de pornografia de menores agravados, p. e p. pelos artºs 176º/1.c) e d) e 177º/6, do Código Penal.

DO CRIME DE PORNOGRAFIA DE MENORES
Dispõe o artº176º/1 do Código Penal:
«1. Quem:
a) Utilizar menor em espectáculo pornográfico ou o aliciar para esse fim;
b) Utilizar menor em fotografia, filme ou gravação pornográficos, independentemente do seu suporte, ou o aliciar para esse fim;
c) Produzir, distribuir, importar, exportar, divulgar, exibir ou ceder, a qualquer título ou por qualquer meio, os materiais previstos na alínea anterior;
d) Adquirir ou detiver matérias previstos na alínea b) com o propósito de os distribuir, importar, exportar, divulgar, exibir ou ceder;
é punido com pena de prisão de um a cinco anos.

O legislador não nos deu um conceito de pornografia. “… A pornografia, em sentido clássico, tem o significado de acto sexual chocante, aberrante, praticado em condições profundamente dissociadas do que é usual e conhecido, sem que se confunda com o mero erotismo. Elianor Rober Moraes, docente de ética na PUC-S.Paulo, intentando traçar a distinção e sobrelevar na controvérsia, pondera que o erotismo só sugere; a pornografia tudo mostra; do âmbito da pornografia está excluída uma nudez não apelativa presente por exº nas obras de arte pictóricas, de escultura ou gravuras.
O tipo legal visa a protecção, ainda que remotamente, «demasiadamente longínqua» ( na expressão do Prof. Figueiredo Dias…), da autodeterminação sexual, sem embargo de o desenvolvimento sexual da criança poder ser severa e directamente prejudicado com a sua participação em manifestações pornográficas, isto mesmo à margem de « sacrifício na ara de uma qualquer moralidade sexual»…, moralidade à revelia da qual o legislador nacional, do C.Penal, após 1995, se dispôs a construir o direito penal sexual, um pouco de acordo com a filosofia stuartmilliana para o liberalismo económico de que em princípio tudo é permitido; a proibição vem por excepção.
As Nações Unidas definem pornografia infantil como sendo qualquer representação por qualquer meio de uma criança em actividades sexuais explícitas, reais ou simuladas ou qualquer representação das partes sexuais - art.º 2 .º, c), do Protocolo Adicional à Convenção dos Direitos da Criança sobre o Tráfico de Crianças, Prostituição Infantil e Pornografia, de 2002, de onde resulta que o conceito de pornografia infantil é amplo e não deixou de servir de inspiração ao legislador de 2007- lei nº 58/07, de 4/9, ao introduzir o tipo em causa.
Também, acolhendo o que a Decisão-Quadro 2004/68/JAI do Conselho, de 22.12.2003 (in Jornal Oficial de 20.01.2004), relativa à luta contra a exploração sexual de crianças e a pornografia infantil, definiu como pornografia infantil com crianças reais, reportada, segundo o seu art. 1.º, alínea b)/i, a qualquer material que as descreva ou represente visualmente envolvidas em comportamentos sexualmente explícitos ou entregando-se a tais comportamentos, incluindo a exibição lasciva dos seus órgãos genitais ou partes púbicas, o que foi reafirmado pela Directiva 2011/92/EU, de 27.10.2011 (in Jornal Oficial de 17.12.2011), que entretanto veio substituir aquela, definindo pornografia infantil, nos termos do seu art. 2.º, alínea c), como i) materiais que representem visualmente crianças envolvidas em comportamentos sexualmente explícitos, reais ou simulados, ou ii) representações dos órgãos sexuais de crianças para fins predominantemente sexuais, iii) materiais que representem visualmente uma pessoa que aparente ser uma criança envolvida num comportamento sexualmente explícito, real ou simulado, ou representações dos órgãos sexuais de uma pessoa que aparente ser uma criança, para fins predominantemente sexuais, ou iv) imagens realistas de crianças envolvidas em comportamentos sexualmente explícitos ou imagens realistas dos órgãos sexuais de crianças para fins predominantemente sexuais.
Tal como sublinhado por Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do CP, pág. 487, A fonte da disposição (art. 176.º do CP, introduzido pela reforma de 2007) é o Protoloco facultativo de 25.5.2000 à Convenção sobre os direitos da criança, relativo à venda de crianças, à prostituição infantil e à pornografia infantil, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 16/2003, ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 14/2003 (in D.R. I Série-A de 05.03.2003), conferindo à pornografia infantil o significado, segundo o seu art. 2.º, alínea c), de qualquer representação, por qualquer meio, de uma criança no desempenho de actividades sexuais explícitas reais ou simuladas ou qualquer representação dos órgãos sexuais de uma criança para fins predominantemente sexuais, relativamente ao que se deveria garantir abrangência pelo direito criminal ou penal de actos de produção, distribuição, difusão, importação, exportação, oferta, venda ou posse (seu art. 3.º, n.º 1, alínea c)).
O conceito de pornografia surge, ainda assim, desinserido de qualquer referência à moral ou pudores públicos, em contrário do que sucedia com o definido no Decº lei nº 254/76, de 7/4, visando combater uma onda de divulgação de pornografia que se abateu sobre o país. Adquiriu-se, na punição transnacional da pornografia, a consciência de que a pornografia infantil é uma industria milionária, dos mais crescentes na internet através de câmaras digitais e da webcames, tornando-se um negócio fácil e barato, tanto pela distribuição como aquisição pelos utentes da internet…” (cfr. Ac. do STJ, Pº nº 4/10.5GBFAR.E1.S1, in www.dgsi.pt).
O tipo legal de pornografia de menores pode revestir, no que ora releva, qualquer acto que se enquadre nas quatro modalidades caracterizadoras, correspondentes às diferentes alíneas do n.º 1 do artigo 176.º, em que transparece uma escala de valoração, embora punível de forma idêntica, desde a utilização de menor à detenção de materiais pornográficos com propósito legalmente definido (AC RE de 17.03.2015, www.dgsi.pt)
Assim, o crime de pornografia de menores é praticado, designadamente (e quanto ao que aqui importa), por "quem distribuir, importar, exportar, divulgar, exibir ou ceder, a qualquer título ou por qualquer meio, fotografia, filme ou gravação pornográficos que utilizem menor (al. c) do nº 1, do artº 176 do CP), ou por quem "adquirir ou detiver aqueles materiais com o propósito de os distribuir, importar, exportar, divulgar, exibir ou ceder" (al. d) do nº 1, do artº 176 do CP).
Estando em causa nos autos a obtenção, posse e divulgação desses materiais, por via informática, a infracção surge relacionada com os conteúdos respectivos, em sintonia, ainda, com recomendação abrangente expressa na Convenção sobre o Cibercrime, adoptada em Budapeste em 23.11.2001, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 88/2009.
Trata-se de um crime de perigo abstracto (quanto ao grau de lesão do bem jurídico tutelado) e de mera actividade (relativamente à forma de consumação do ataque ao objecto da acção).
Como referido no Acórdão da Relação de Évora citado, o bem jurídico reside mais directamente na protecção da personalidade em desenvolvimento dos menores, entendida tanto numa dimensão interior (psico-física ou moral) como noutra exterior (social ou relacional), embora não deixando de atentar, ainda que remotamente, na sua autodeterminação sexual, opção neocriminalizadora justificada no reforço da tutela das pessoas particularmente indefesas (Pedro Soares de Albergaria/Pedro Mendes Lima, in “O crime de detenção de pseudopornografia infantil – evolução ou involução?” e Maria João Antunes, in “Crimes contra a Liberdade e a Autodeterminação Sexual dos Menores”, na Revista Julgar, Especial, n.º 12, Set./Dez.2010).
Do lado subjectivo, o tipo é doloso, podendo este verificar-se em qualquer das modalidades admitidas na lei penal.
Por seu turno, ao artigo 177.º, n.º 6, do citado diploma legal preceitua que: «as penas previstas nos artigos 163.º, 164.º, 168.º, 175.º e no n.º 1 do artigo 176.º são agravadas de metade, nos seus limites mínimo e máximo, se a vítima for menor de 14 anos.»:
O limite etário dos 14 anos é normalmente entendido como a fronteira entre a infância e a adolescência. Citando Weinberg, Willians e Pryor, referindo que "os tipos de experiências sexuais que uma pessoa tem, especialmente durante a adolescência, são importantes na direção ou reforço do fluxo da sua preferência sexual", sendo por sobremaneira um desenvolvimento adequado da sexualidade, no sentido de proteger a liberdade do menor no futuro, para que decida, em liberdade, o seu comportamento sexual".
O Conselheiro Santos Cabral, em Acórdão do STJ, por si relatado, em 5-9-2007, disponível em www.dgsipt., remata do seguinte modo: “A lei presume que a prática de atos sexuais em menor, com menor ou por menor de certa idade, prejudica o seu desenvolvimento global, e considera este interesse tão importante que coloca as condutas que o lesem ou ponham em perigo sob a tutela da pena criminal. Protege-se, pois, uma vontade individual ainda insuficientemente desenvolvida, e apenas parcialmente autónoma, dos abusos que sobre ela executa um agente, aproveitando-se da imaturidade do jovem para a realização de ações sexuais bilaterais.
O que está em causa não é somente a autodeterminação sexual mas, essencialmente, o direito do menor a um desenvolvimento físico e psíquico harmonioso, presumindo-se que este estará sempre em perigo quando a idade se situe dentro dos limites definidos pela lei.
Em jeito de conclusão, dir-se-ia que o legislador reconheceu o papel da sexualidade no desenvolvimento da personalidade humana e pretende proteger aqueles que, devido à sua imaturidade, ainda não têm capacidade para se autodeterminar nesta vertente.
No presente caso, como ficou provado, o arguido fez download para os seus computadores, partilhou e deteve o material apurado, exibindo, designadamente, menores de 14 anos em actos de pornografia. E como é sabido, "download" significa literalmente "descer carga", descarregar, transferir, portanto, importar dados de um servidor para o seu dispositivo informático.
Fazer download de dados de pornografia de menores, de um servidor para o seu dispositivo informático pessoal, relativos a ficheiros de imagens, integra o conceito de importar previsto na al. c) do nº1 do artº 176º CP. (Acórdão RP de 3 Dez. 2014, Processo 4190/11, www.dgs.pt).
Também se provou que agiu com dolo (apurados os seus elementos intelectual e volitivo), nos termos explicados na motivação de facto.
Assim, não há dúvidas do preenchimento de todos os elementos típicos objectivos e subjectivos do crime previsto no artº 176º/1.c), agravado nos termos do artº 177º/6 do CP pela idade dos menores.
Também se provou que alguns ficheiros foram partilhados pelo arguido, nos termos apurados.
Todavia essa partilha ou difusão está já contida na alínea c) do artº 176º. E não resultou provada a concreta intenção do arguido na partilha ou difusão (tanto que a partilha era automática logo que fosse feito o download), e não se apurou que quanto ao material guardado o fosse com intenção de ser, posteriormente partilhado, exigidas pela alínea d) que também lhe era imputada.
Assim, em relação à alínea d), entendemos que a mesma não se verifica.
É que, se não há qualquer dúvida que o arguido importou tais conteúdos (o que só por si preenche a al. c) do preceito em análise), não podemos afirmar, com toda a certeza, que o arguido guardava as fotos e filmes de pornografia de menores, com o propósito de os divulgar, posteriormente a terceiros, ­uma vez que não se pode excluir a hipótese de tais conteúdos estarem armazenados para sua própria "recreação" e o próprio programa automaticamente faz a partilha, com o download.
Seja como for, o raciocínio exposto, em nada contende com a qualificação jurídica da factualidade em análise, porquanto, como já foi referido, não há qualquer dúvida que os conteúdos referidos foram pelo arguido previamente importados para os seus computadores e, tal actuação, já configura o crime mencionado no artº 176, nº 1, al. c) do CP, punido com a mesma moldura penal que a situação descrita na al. d), do nº 1 do artº 176 do CP.
No caso vertente, face à factualidade dada como provada não restam dúvidas que os factos praticados pelo arguido preenchem os elementos objectivo e subjectivo do tipo legal do crime de pornografia de menores agravado, p. e p. no artº 176º/1.c) e 177º/6 do CP.
A questão que importa, agora, apreciar consiste em saber se a conduta do arguido é subsumível à figura do concurso de crimes (tal como é imputado na acusação), ou do crime continuado, ou se estamos perante um crime único de trato sucessivo.
No que respeita ao concurso de crimes, estabelece o artigo 30.º, n.º 1, do Código Penal que: «O número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente».
No que concerne à figura do crime continuado, o n.º 2, do citado preceito legal do artigo 30.º, estabelece o seguinte: «Constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a conduta do agente».
O nº. 3 deste dispositivo legal, aditado pela Lei nº. 59/2007, de 4 de Setembro, estipulava (antes da redacção que lhe foi dada pela Lei nº. 40/2010, de 3 de Setembro) que: “O disposto no número anterior não abrange os crimes praticados contra bens eminentemente pessoais, salvo tratando-se da mesma vítima”.
Actualmente, com a entrada em vigor da norma do nº. 3 do artigo 30º do Código Penal, na redacção introduzida pela Lei nº. 40/2010, de 3 de Setembro, exclui-se a figura do crime continuado relativamente a crimes desta natureza.
Assim sendo, a realização plúrima do mesmo tipo de crime constituirá, em princípio, um concurso de infracções, mas pode constituir um só crime, se ao longo de toda a realização tiver persistido o dolo ou resolução inicial. E para optar pelo crime continuado, é necessário que, além do mais, a reiteração advenha de uma mesma situação externa que diminua consideravelmente a culpa do agente. (cfr. Acórdão do S.T.J., de 25/06/1986, in BMJ, nº 358, pág. 267, Acórdão do S.T.J., de 05/05/1993, in C.J. e Acórdão do S.T.J., 1993, t. 2, pág. 222).
A doutrina e a jurisprudência – sobretudo a do Supremo Tribunal de Justiça que tem vindo a ser publicada e que cremos maioritária - têm vindo, em alguns casos a entender haver lugar a uma unificação de condutas ilícitas sucessivas, desde que essencialmente homogéneas e temporalmente próximas, quando existe uma só resolução criminosa, desde o início, assumida pelo agente, enquadrando assim as actuações reiteradas na figura do crime único de trato sucessivo.
É essa unidade de resolução, a par da homogeneidade da actuação e da proximidade temporal, que constitui a razão de ser da unificação dos vários actos sucessivos num só crime. O dolo do agente abarca ab initio uma pluralidade de actos sucessivos que ele se dispõe logo a praticar, para tanto preparando as condições da sua realização, estando-se no plano da unidade criminosa. A reiteração, revelando uma resolução determinada e persistente do agente, traduz uma culpa agravada do mesmo, existindo ainda um único dolo a abranger todas as condutas sucessivamente praticadas e essa unidade de resolução, a par da homogeneidade das condutas e da sua proximidade temporal, configura o trato sucessivo (vide neste sentido, designadamente: Ac. do STJ de 02/10/2003, in CJSTJ, 2003, T.3, p.194; Ac. do STJ de 14/06/2007, in CJSTJ, 2007, T. 2, p. 220; Ac. do STJ, de 07/10/2010, in CJSTJ, 2010, T. 1, p. 176; Ac. do STJ, de 29/11/2012, de 13/06/2013, in www.dgsi.pt, entre outros).
Conforme expendido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13.06.2013, com o qual se concorda «A solução do crime de trato sucessivo serve também hipóteses de pluralidade de crimes mas cuja prática conforma uma “actividade”, prolongada no tempo, e em que se torna tarefa muito difícil, se não arbitrária, definir o concreto número de actos parcelares que a integram. No entanto, diferentemente do que é requerido para a afirmação da figura do crime continuado, não se verifica uma situação exterior que diminua sensivelmente a culpa do agente (in www.dgsi.pt).
No caso em apreço, face à matéria de facto considerada provada e supra descrita, não ocorre qualquer circunstancialismo exterior que, de forma considerável, tenha facilitado a repetição da actividade criminosa. Pelo que, se entende que a conduta do arguido não é subsumível à figura do crime continuado.
Todavia, verifica-se a reiteração de condutas essencialmente homogéneas, unificadas por uma mesma resolução criminosa. Acresce que não é possível a identificação das vítimas.
Deste modo, atenta a factualidade apurada nos autos, existiu por parte do arguido um dolo inicial que abarcou os factos que praticou ao longo do período apurado. Ou seja, a conduta do arguido é fruto de uma unidade resolutiva, que abarcou ab inicio as circunstâncias de modo e lugar, sendo que a consumação do crime prolongou-se no tempo.
Conclui-se, assim, que no caso vertente, o arguido não praticou, em concurso real, 256 crimes de pornografia de menores, mas um único crime de pornografia de menores agravado, de trato sucessivo e, consequentemente, proceder-se-á à respectiva convolação.
***
2.5.
MEDIDA CONCRETA DA PENA
O crime de pornografia de menores agravado é punido com pena de prisão de 1 ano e 6 meses a 7 anos e 6 meses (artigo 176.º, n.º 1 e artigo 177.º, n.º 6, ambos do Código Penal).
Segundo o nº 1 do artº 71º do Cód. Penal, «a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção». Por sua vez, dispõem os nºs 1 e 2 do artº 40º do Cód. Penal que «a aplicação de penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade; em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa»
Na deter­minação da medida da pena, o requisito legal de que sejam levadas em conta as exigências de prevenção satisfaz a necessidade comunitária de punir o crime e, consequentemente, de realizar as finalidades da pena; o requisito legal de que seja considerada a culpa do agente satisfaz a exi­gência de que a vertente pessoal do crime, decorrente do respeito pela dignidade da pessoa do agente da prática do crime, limite as exigências de prevenção.
Os fins das penas têm sido equacionados a partir de um objectivo essencial: a redução ou prevenção da criminalidade. Na concretização deste objectivo identificamos a prevenção geral e a prevenção especial. A primeira na perspectiva da intimidação colectiva, a segunda na perspectiva da intimidação individual, isto é, de prevenção da reincidência. Modernamente, da prevenção especial decorre ainda aquilo que se pode designar de reforma e que consiste na ressocialização do delinquente.
Este fim de ressocialização do delinquente vai para além da prevenção da reincidência, tal como esta tem sido classicamente entendida. Pretende-se que o delinquente não reincida não por recear sofrer numa reacção criminal, mas porque não tem necessidade de cometer o crime, uma vez que pode levar uma vida ética e socialmente não reprovável. E é deste quid que emerge o conceito de reinserção social (Relatório do Provedor de Justiça apresentado à Assembleia da República, 2007, pp.20).
Com efeito, tendo em vista o assinalável desajustamento que se verificava entre as finalidades político-criminais subjacentes ao Código Penal de 1982 e a experiência resultante da sua aplicação prática, o legislador, com a revisão operada em 1995 quis afirmar, expressamente, no artigo 40º, então introduzido, como proposições basilares do programa político-criminal: que o direito penal é um direito vinculado à tutela de bens jurídicos; que a culpa é tão-só limite da pena; que a intervenção penal tem como finalidade a "protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade".
Foi reafirmado, igualmente, o princípio da ultima ratio da pena de prisão, valorizando-se o papel da multa como pena principal e alargando-se o âmbito de aplicação das penas de substituição.
A determinação da medida concreta da pena há-de efectuar-se em função da culpa do agente (relevando o ilícito típico, através desta) e das exigências de prevenção, quer a prevenção geral positiva ou de integração (protecção de bens jurídicos), quer a prevenção especial (reintegração do agente na sociedade) - art. 40.º, n.º 1, do CP -, funcionando a culpa como limite máximo que aquela pena não pode ultrapassar (n.º 2 deste art. 40.º). As circunstâncias referidas no n.º 2 do art. 71.º do CP constituem os itens a que deve atender-se para a fixação concreta da pena e actuam dentro dos limites da moldura penal abstracta, sem se partir de qualquer ponto determinado dessa moldura. São essas circunstâncias e outras que tenham igual relevância do ponto de vista da culpa e da prevenção, porque a enumeração legal é exemplificativa, que vão determinar a medida concreta da pena, a qual há-de satisfazer as necessidades de tutela jurídica do bem jurídico violado e as exigências de reinserção social do agente. A medida da tutela dos bens jurídicos, correspondente à finalidade de prevenção geral positiva ou de integração, é referenciada por um ponto óptimo, consentido pela culpa, e por um ponto mínimo que ainda seja suportável pela necessidade comunitária de afirmar a validade da norma ou a valência dos bens jurídicos violados com a prática do crime, entre esses limites se devendo satisfazer, quanto possível, as necessidades de prevenção especial positiva ou de socialização, às quais cabe, em última análise, a função de determinação da medida da pena dentro dos limites assinalados (cf. Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, p. 227 e ss).
Assim e ponderando no caso concreto:
- As exigências de prevenção geral são muito elevadas, atenta a frequência com que o bem jurídico é posto em causa, a dificuldade em denunciar e provar este tipo de criminalidade e a gravidade dos seus efeitos, não apenas nas vítimas, mas sobre familiares e amigos, bem como o próprio sentimento que se gera na sociedade em torno deste tipo de ilícito, sendo certo que a reacção da comunidade aumenta consideravelmente quando estão em causa crimes desta natureza, gerando forte alarme social. A isto acresce que, se adquiriu, na punição transnacional da pornografia, a consciência de que a pornografia infantil é uma indústria milionária, das mais crescentes na internet através de câmaras digitais e da webcames, tornando-se um negócio fácil e barato, tanto pela distribuição como aquisição pelos utentes da internet.
- As exigências de prevenção especial, são medianas. Na verdade, o arguido não tem antecedentes criminais, admitiu no essencial os factos, demonstrando, consciência crítica pelo seu acto e gravidade da sua conduta. De relevar, ainda, a formação académica do arguido, sua inserção familiar, profissional e social. Acresce que a personalidade evidenciada aponta para um acto isolado na sua vida.
- o grau de ilicitude e de culpa é, in casu, mediano, para o tipo em causa, considerando a forma de actuação, modalidades de acção e o período de tempo de actividade.
- o dolo foi directo, tendo o arguido agido com a intenção de descarregar e guardar imagens com conteúdo pornográfico, referentes a menores de 14 anos, com consciência de que violava interesses legalmente protegidos. O arguido, na altura dos factos, não estava em situação de incapacidade de raciocínio, discernimento ou decisão, que levasse a que não se pudesse determinar de outra forma, mais evidenciado pela formação académica que possui, e não resultou indiciada qualquer situação tal que o tivesse impedido de agir de outra forma.
- o seu comportamento anterior e posterior;
- o período relativamente curto de actividade, o lapso de tempo decorrido desde os factos, e o facto de não haver notícia de qualquer outra situação como a dos autos, o que aponta para um acto esporádico na sua vida;
- a idade do arguido, sua postura, condições pessoais;
- a declaração de arrependimento que se afigurou sincera;
Em face do exposto, tudo visto e ponderado, afigura-se necessário, justo, adequado e proporcional, aplicar ao arguido a pena de 2 (dois) anos de prisão, próxima do limite mínimo legal.
***
2.6.
DA SUSPENSÃO DE EXECUÇÃO DA PENA
Nos termos do artº 50º do Código Penal (com as alterações da Lei 59/07, de 04.09), o Tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Atribui-se, assim, ao tribunal o poder-dever de suspender a execução da pena de prisão não superior a cinco anos, sempre que, reportando-se ao momento da decisão, o julgador possa fazer um juízo e prognose favorável relativamente ao comportamento futuro do arguido (cfr. Figueiredo Dias, “Velhas e novas questões sobre a pena de suspensão da execução da pena”, Rev. de Leg. e Jur. ano 124º, pág. 68). Como justamente se salientou no Ac. do S.T.J. de 8-5-1997 (Proc.º n.º 1293/96) “factor essencial à filosofia do instituto da suspensão da execução da pena é a capacidade da medida para apontar ao próprio arguido o rumo certo no domínio da valoração do seu comportamento de acordo com as exigências do direito penal, impondo-se-lhe como factor pedagógico de contestação e auto-responsabilização pelo comportamento posterior; para a sua concessão é necessária a capacidade do arguido de sentir essa ameaça, a exercer sobre si o efeito contentor, em caso de situação parecida, e a capacidade de vencer a vontade de delinquir”.
Importa também atender, nesta sede, o Acórdão do S.T.J. de 24 de Maio de 2001, (in C.J. - A.S.T.J., Ano IX, tomo 2, p. 201) segundo o qual, “o juízo de prognose favorável ao arguido, para o qual conjugadamente concorrem os pressupostos indicados no art. 50º do CP, terá como ponto de partida o momento da decisão, e não a data da prática do crime. Para o efeito, deve ter-se a esperança de que o arguido, em liberdade, adira, sem quaisquer reservas, a um processo de socialização”.
Finalmente, como decidiu o S.T.J. por aresto datado de 9 de Janeiro de 2002, (proferido no Proc. nº 3026/01-3ª; in S.A.S.T.J., nº 57, p. 63), “ a suspensão da pena é uma medida penal de conteúdo pedagógico e reeducativo, que pressupõe relação de confiança entre o tribunal e o arguido condenado. Na base de uma decisão de suspender a execução de uma pena está sempre uma prognose social favorável ao agente, baseada num risco prudencial. Porém, o juízo de prognose que o tribunal faz não tem carácter discricionário, e muito menos arbitrário. O tribunal, ao decretar a medida, terá que reflectir sobre a personalidade do agente, sobre as condições da sua vida, sobre a sua conduta ant et post crimen e sobre o circunstancialismo envolvente da infracção”.
No presente caso, é de ponderar que o arguido não tem antecedentes criminais, admitiu no essencial os factos, demonstrando, consciência crítica pelo seu acto e gravidade da sua conduta e, ainda, a sua formação académica, inserção familiar, profissional e social, e o lapso de tempo decorrido desde os factos.
Ainda de relevar que a análise do caso dos autos permite constatar que o arguido, é, afinal, um homem de trabalho e de família, respeitado na comunidade e respeitador das pessoas com que priva e que a situação ocorrida terá sido um acto esporádico na sua vida. Importa, em nosso entender, por que assim é – e ponderados, essencialmente, os efeitos nefastos das medidas detentivas – que o mesmo beneficie de uma oportunidade de se ressocializar em liberdade.
Assim, entende-se ser de dar uma oportunidade ao arguido, na convicção de que a advertência da pena de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (artº 50º/1 do Código Penal).
*
O artº 51º do CP, sob a epígrafe “Deveres”, estabelece que:
1 - A suspensão da execução da pena de prisão pode ser subordinada ao cumprimento de deveres impostos ao condenado e destinados a reparar o mal do crime, nomeadamente:
a) Pagar dentro de certo prazo, no todo ou na parte que o tribunal considerar possível, a indemnização devida ao lesado, ou garantir o seu pagamento por meio de caução idónea;
b) Dar ao lesado satisfação moral adequada;
c) Entregar a instituições, públicas ou privadas, de solidariedade social ou ao Estado, uma contribuição monetária ou prestação em espécie de valor equivalente.
2 - Os deveres impostos não podem em caso algum representar para o condenado obrigações cujo cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir.
3 - Os deveres impostos podem ser modificados até ao termo do período de suspensão sempre que ocorrerem circunstâncias relevantes supervenientes ou de que o tribunal só posteriormente tiver tido conhecimento.

No presente caso, ponderadas as elevadas exigências ao nível da prevenção geral que se fazem sentir e para dar adequada satisfação às mesmas, bem como com o intuito de sensibilizar o arguido para as normas jurídicas violadas, reforçando o efectivo cumprimento das finalidades que com a aludida suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido se procuram atingir, e porque tal condição se revela razoável em face das condições de vida do arguido, afigura-se adequado subordinar a suspensão da execução da pena de prisão ao cumprimento de uma dever.
Face ao exposto e ao abrigo do estabelecido nos artºs 50º/ 1 e 51º/1.c), do CP será suspensa na sua execução a pena de prisão determinada para o arguido, por igual período, subordinada, porém, ao cumprimento do dever de o arguido entregar a uma Instituição de Solidariedade Social à sua escolha, preferencialmente vocacionada para a protecção de crianças e jovens, a quantia de € 1.500 (mil e quinhentos euros), devendo comprová-lo nos autos no prazo máximo de 6 (seis) meses, a contar do trânsito em julgado da decisão.
***
2.7.
OBJECTOS
Nos termos do artigo 109.º do Código Penal “São declarados perdidos a favor do Estado os objectos que tiverem servido ou estivessem destinados a servir para a prática de um facto ilícito típico, ou que por este tiverem sido produzidos, quando, pela sua natureza ou pelas circunstâncias do caso, puserem em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem públicas, ou oferecerem sério risco de ser utilizados para o cometimento de novos factos ilícitos típicos”.
No caso em apreço, atenta a factualidade provada e supra descrita, cumpre declarar perdidos a favor do Estado, todos os objectos apreendidos nos presentes autos.
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3. DECISÃO
Em conformidade com tudo o que fica exposto, este Tribunal Colectivo:
Operando a convolação legal, condena o arguido J., pela prática de um crime de pornografia de menores, de trato sucessivo, previsto e punido pelos artigos 176.º, n.º 1, alíneas c), agravado, nos termos do disposto no artigo 177.º, n.º 6, ambos do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão.
Suspende a execução da pena de prisão aplicada ao arguido, por igual período, subordinada ao cumprimento do dever de, no prazo máximo de 6 (seis) meses, a contar do trânsito em julgado da decisão, o arguido entregar a uma Instituição de Solidariedade Social à sua escolha, preferencialmente vocacionada para a protecção de crianças e jovens, a quantia de € 1.500 (mil e quinhentos euros), devendo comprová-lo documentalmente nos autos.
Condena o arguido nas custas do processo, fixando em 4 Uc a título de taxa de justiça.
Declara perdidos a favor do Estado todos os objectos apreendidos à ordem dos presentes autos.
*
Notifique e deposite.
Transitado, remeta boletins à DSICC.


III.
APRECIANDO.
São as conclusões, que o recorrente extrai da motivação, onde sintetiza as razões de discordância com o decidido e resume o pedido (art. 412.º, n.º 1, do CPP), que delimitam o objecto do recurso, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – detecção de vícios decisórios ao nível da matéria de facto emergentes da simples leitura do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, referidos no art. 410.º, n.º 2, do CPP – Ac n.º 7/95 do Plenário da Secção Criminal, de 19-10-95, no Proc. n.º 46580, Publicado no DR, I Série - A, n.º 298, de 28-12-95 que fixou jurisprudência obrigatória (é oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no artigo 410º, nº 2, do Código de Processo Penal, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito) e mais recentemente e entre outros, Ac. STJ de 20-12-2006, in Proc.º 06P3661 in www.dgsi.pt..

No presente caso, de acordo com as conclusões da motivação, o objecto do recurso versa:
- As nulidades da busca domiciliária e apreensão efectuadas;
- A nulidade do Acórdão por condenação por factos diversos dos constantes da acusação;
- A qualificação jurídica dos factos;
- A medida da pena.

Da nulidade da busca domiciliária.
Alega o Arguido, em síntese recursiva, que é nula a busca domiciliária e apreensão à sua residência por ser advogado e a diligência não ter sido presidida pelo Juiz de Instrução, nem acompanhada por representante da Ordem dos Advogados.

Compulsado o Acórdão recorrido verifica-se que, em audiência de julgamento a defesa suscitou a nulidade da busca e apreensão efectuadas em 03 de Setembro de 2008, ora em causa, invocando rigorosamente o mesmo, ou seja, sendo advogado, a diligência teria de obedecer ao formalismo previsto no artº 177º/5 do CPP., uma vez que, o quarto onde foi efectuada a busca funcionava como escritório, e que embora estivesse com a inscrição suspensa mantinha o dever de confidencialidade em relação aos documentos guardados e que, aquando da diligência, deu conhecimento de tal facto à autoridade policial.
No Acórdão recorrido apreciou-se a nulidade invocada, como se pode verificar da transcrição que acima se levou a cabo.
Decorre de tal decisão que o local da busca em nada se coaduna com um escritório de advogado, é a residência da mãe do Arguido onde ele habitava também, tendo a diligência sido feita na presença desta (estando o arguido também presente), e a mãe é que assinou o respectivo auto. Acresce que, como resultou provado por declarações do arguido, à data da diligência já tinha a sua inscrição suspensa há cerca de um ano.
Demonstra-se que o quarto em que a busca foi efectuada não é um escritório de advogado, como as fotografias juntas aos autos evidenciam e que ainda que o Arguido ali guardasse documentos sujeitos a sigilo profissional, os autos nada revelam que era naquela residência que tivesse funcionado o seu escritório forense, na abrangência que este comporta. Antes pelo contrário. Como a própria defesa referiu um dos computadores tem registado como utilizador “Dr. J. – & Associados, o que também não tem qualquer relevo para afastar o que ficou dito, uma vez que o arguido tinha a inscrição suspensa e nada resulta que a sede desta sociedade fosse na residência da mãe do arguido.
Por outro lado, a busca ordenada à residência do arguido, visava, como visou, apreensão de material informático para o crime que se investigava de pornografia de menores agravado, e não quaisquer documentos abrangidos pelo sigilo profissional. Acresce que os funcionários intervenientes sempre estariam obrigados a não revelar qualquer segredo de que tivessem tomado conhecimento no exercício das suas funções (art.º 383.º do Código Penal).
E referindo o AC RP de 30.01.2002, Pº nº 0141239, www.dgsi.pt, num caso semelhante, A mudança de processos para a residência de advogado não a transforma, analógica ou automaticamente, em escritório de advogado, isto é, como o local de trabalho aberto a qualquer cliente. Se os processos tivessem sido levados para uma garagem ou barraco ao fundo de um quintal não se iria concluir, certamente, que, para a validade da busca, seria necessária a presença do juiz e do presidente ou delegado da Ordem dos Advogados.
Que a casa de advogado, o seu domicílio, não se confunde com o seu escritório, não constando dos autos que o Recorrente tivesse comunicado à Ordem dos Advogados que o seu escritório era em sua casa.
Não tinha pois a busca que ser presidida pessoalmente pelo juiz nem que ser avisado previamente o representante da Ordem dos Advogados, uma vez que se tratava como tratou de uma busca domiciliária, a qual está sujeita aos requisitos legais estabelecidos na lei e que foram cumpridos e não de busca em escritório de advogado.
Com base em tal argumentação concluiu-se, que nenhuma nulidade foi cometida quer quanto à busca domiciliária efectuada quer quanto à apreensão efectuada.
E que, mesmo que se considerasse entendimento diverso e se entendesse o local buscado como “escritório de advogado”, a invocação seria extemporânea, já que sendo do conhecimento do arguido no próprio dia e momento da realização da busca, não foi arguida no prazo legal, pelo que, a sua eventual existência encontrar-se-ia, por isso, sanada, nos termos do art.º 123.º, n.º 1 do CPP «1 - Qualquer irregularidade do processo só determina a invalidade do acto a que se refere e dos termos subsequentes que possa afectar quando tiver sido arguida pelos interessados no próprio acto ou, se a este não tiverem assistido, nos três dias seguintes a contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em algum acto nele praticado.».
No que concerne à arguição, no acto, desse facto dando conhecimento aos agentes que efectuaram a busca, decidiu-se que, do depoimento das testemunhas não resulta claramente essa alegação, mas que o Arguido tentou verbalmente e com várias alegações, entre as quais a referência a que se tratava do seu escritório, obstaculizar à diligência.
O Arguido tinha obrigação de saber caso se confrontasse com uma busca ilegal ao seu “escritório de advogado”, teria de reagir com os meios ao dispor – arguição da nulidade com o procedimento adequado, que não uma mera referência verbal ao facto de ter ali documentos dos clientes e a reclamação que o EOA consagra. Como advogado saberia que não poderia prescindir da presença do juiz ou de representante local da Ordem dos Advogados numa busca de escritório profissional de advogado - direito alienável a que se referem os artigos 70.º e 71.º de Estatuto da OA - a qual só se efectuou nos termos em que o foi, porque em residência.
E que a busca foi efectuada em Setembro de 2008 e nem no acto nem em momento posterior foi arguida qualquer irregularidade, quer quanto à diligência de busca e apreensão quer quanto ao auto redigido subsequente à diligência, mas apenas agora, em Junho de 2015 e em sede de audiência de julgamento, pelo que se julgou improcedente a arguição das nulidades invocadas de busca e apreensão, por não terem sido violadas quaisquer disposições legais.

O Arguido põe em causa esta decisão, alegando que deve ser dado como provado que ele se opôs à realização da busca e apreensão dos autos com fundamento da circunstância de ser Advogado e de a diligência ter como alvo o seu escritório. Para tanto deve valorar-se o depoimento da testemunha JM prestou o seu depoimento no dia 25 de Maio pelas 10:48:02 horas. Atente-se sobretudo na passagem do seu depoimento entre os minutos 3:10 min. e 3:46 min, da gravação identificada como "20150525104828_17449475_2871055". Deve, portanto, julgar-se falso o auto de busca e apreensão dos autos.
Que suscitou a falsidade do auto de busca e apreensão dos autos, por tal auto não relatar a circunstância, evidentemente relevante, de ele se ter oposto à realização da busca e apreensão por ser Advogado e esta ter como alvo o seu escritório. Tal questão não foi apreciada pelo Tribunal Criminal de Lisboa, pelo que o acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia (artigo 379°, n.° 1, alínea c), do CPP). A invalidado da busca e apreensão foi tempestivamente invocada pelo Recorrente no decurso da própria diligência.
Ora, como decorre da decisão, acerca das nulidades invocadas em audiência de discussão e julgamento, existiu uma referência verbal, ao facto de ter ali documentos dos clientes e ser advogado, pelo que o Tribunal “a quo” não desconsiderou nem as declarações do Arguido nem as do Inspector da Plolícia Judiciária.
Aliás toda a fundamentação da decisão acerca das nulidades assenta na avaliação de que,, embora sendo Advogado as prerrogativas dessa qualidade profissional não se aplicavam por o local buscado não ser o escritório onde desempenhava a sua profissão e os documentos apreendidos nada terem a ver com tal qualidade. Demonstração decorrente daquilo que se viu, um quarto de que as fotografias dão boa nota, e da atitude do Arguido de tentar impedir a diligência agarrando-se a um computador que destruiu atirando-o ao chão.
Não se verifica, pois, a invocada omissão de pronúncia.
Pronúncia que é correcta, pois, ouvida a gravação do depoimento do Inspector da Plolícia Judiciária, LM o mesmo declarou que o Arguido disse que aquele era o quarto dele e também era escritório de Advogado, e o Inspector RV declarou não saber bem se o Arguido disse que era advogado se a inscrição da Ordem estava suspensa. Estes depoimentos têm de conjugar-se com as declarações do próprio Arguido que disse que tinha abandonado o Direito e tinha suspenso a inscrição. É que a prova tem de ser avaliada na sua globalidade de forma concertada, e no caso, ressalta que à data da busca o Arguido já não desempenhava funções de Advogado. O próprio Arguido teve a ombridade de não dizer que desempenhava funções de advogado, apesar de a isso não ser obrigado e não poder ser prejudicado se o não fizesse, ser advogado é uma coisa desempenhar as funções inerentes a essa qualidade é outra.
Assim, se o Arguido já não desempenhava as funções de Advogado, tinha abandonado o Direito e tinha suspenso a inscrição na Ordem, o quarto buscado não podia funcionar, como na verdade não funcionava, como escritório de advogado, pelo que a busca não tinha de ter sido presidida por um juiz e um representante do Conselho Distrital da Ordem dos Advogados, não se mostrando violado o artigo 177°, n.° 5, do CPP.. Nesta medida não teria de constar no auto de busca que o local era também escritório de Advogado, auto que não padece de qualquer inverdade ou falsa declaração quanto ao sucedido.
A decisão recorrida avaliou correctamente os factos relativos às nulidades, cujos fundmentos se subscrevem na totalidade dispensando considerações adicionais, improcedendo, nesta parte, o recurso.

Da nulidade do Acórdão por condenação por factos diversos dos constantes da acusação;

Alega o Arguido que o Acórdão recorrido é igualmente nulo por condenar o Recorrente por factos diversos dos da Acusação.
A acusação imputava-lhe a partilha de pornografia de menores e a detenção, com intenção de partilha, de pornografia de menores. No Acórdão Recorrido, condena-se o Recorrente por ter importado pornografia de menores, sendo que tal importação seria, nada mais nada menos, do que o próprio acto de download (cf. artigo 379°, n.° 1, al. b), do CPP).
Compulsado o texto da acusação e do Acórdão, verifica-se serem semelhantes, tirando os factos não provados são mesmo iguais. O enquadramento jurídico é que é diverso. O Acórdão recorrido considerou que os factos apurados integravam a prática de um único crime p. e p. pelo art.º 176.º, al. c) do Código Penal, por não se ter provado a intenção de partilha, e não de o p. e p. pelo art.º 176.º al. d) do Código Penal de que vinha acusado.

No que concerne ao enquadramento jurídico o Arguido alega que o download de material pornográfico poderia constituir, quando muito, a prática de crime de aquisição ou detenção de pornografia de menores previsto e punido pelo artigo 176°, n.° 4, do Código Penal. O download não constitui "importação de pornografia de menores", crime previsto e punido pelo artigo 176°, n. ° 1 alínea c) do CP. Importação, como acto integrante da comercialização de pornografia de menores, equivale ao transporte de pornografia de menores de um país para Portugal.
Afigura-se-nos que lhe assiste razão.
O artigo 176° do Código Penal inclui quatro crimes distintos: a utilização de menor de 18 anos em espectáculo, fotografia, filme ou gravação pornográficos; a produção, a distribuição, a importação, a exportação, a divulgação, a exibição, a cedência de materiais pornográficos; a aquisição ou detenção de materiais pornográficos com o propósito de os distribuir, importar, exportar, divulgar, exibir ou ceder esses materiais; e, a aquisição ou detenção de materiais pornográficos.
Em qualquer destes crimes, o bem jurídico protegido é, ainda que remotamente, a autodeterminação sexual do menor de 18 anos (mas FIGUEIREDO DIAS, anotação 3.ª ao artigo 172º, in CCCP, 1999, considerando que o bem jurídico está "demasiado longínquo" em relação ao bem jurídico da autodeterminação sexual do menor, e mesmo MOURAZ LOPES, 2008: 157, considerando que se tutela a mera "moral" no caso de representação realista de menor). O legislador decidiu, na reforma do CP de 2007, punir criminalmente o mero "consumidor" do material pedófilo como meio de antecipar a protecção do menor.
4. Em qualquer dos casos previstos na disposição legal, trata-se de um crime de perigo abstracto (quanto ao grau de lesão do bem jurídico protegido) e de mera actividade (quanto à forma de consumação do ataque ao objecto da acção).
(...) A detenção não inclui a mera consulta de material pornográfico, mas inclui o download de material pornográfico, MOURAZ LOPES, 2008: 159), cfr Paulo Pinto de Albuquerque, In Comentário Do Código Penal … 2a Ed., 551
Em síntese, a importação não equivale ao download, porém, a detenção já inclui o download.
No sentido de que o download dos materiais pornográficos não se configura como actividade importadora, se pronunciou o Ac. RE de 17-03-2015.
Revertendo ao caso concreto, considerando que se provou que o Arguido sabia que os ficheiros acima descritos, que guardava nos computadores e nos referidos dispositivos, eram relativos a abusos sexuais cometidos contra menores de catorze anos, bem sabendo que sua a sua aquisição/download /importação, divulgação e detenção eram proibidas (8). Não obstante, quis agir da forma descrita, descarregando os ficheiros e detendo os mesmos nos termos descritos (9).
Em síntese, o Arguido fez download dos materiais pornográficos, detendo os mesmos, o que integra a prática do crime previsto no artigo 176°, n.º 4 do Código Penal, impondo-se a alteração da qualificação jurídica, como pugnado pelo Arguido.
A moldura penal abstracta é de pena de prisão até um ano ou pena de multa.

Da medida da pena.
“ A escolha das penas é determinada apenas por considerações de natureza preventiva uma vez que as “finalidades da punição” são exclusivamente preventivas. O tribunal deve, pois, ponderar, apenas as necessidades de prevenção geral e especial que o caso concreto suscite (já assim, acórdão do STJ, de 21.3.1990, anotado por ANABELA RODRIGUES, 1991: 243, FIGUEIREDO DIAS, 1993: 332, e GERMANO MARQUES DA SILVA, 1999:125). A articulação entre estas necessidades deve ser feita do seguinte modo: em princípio, o tribunal deve optar pela pena alternativa ou de substituição mais conforme com as necessidades de prevenção especial de socialização, salvo se as necessidades de prevenção geral (rectius, a defesa da ordem jurídica) impuserem a aplicação da pena de prisão (concordante, ANABELA RODRIGUES, l988:20, e FIGUEIREDO DIAS, 1993: 333). Por exemplo, a pena curta de prisão tem uma particular eficácia preventiva no seio do direito penal económico (assim, EDUARDO CORREIA, 1977: 306, e FARIA COSTA e COSTA ANDRADE, 1982:360, e SILVA DIAS, 1990: 260). Por outro lado, a pena de multa não tem eficácia preventiva no caso de crimes contra as pessoas graves (acórdão do TEDH Opuz v. Turquia, sobre o caso de um arguido condenado em pena de multa, pelo crime de violência doméstica, por ter ameaçado de morte e esfaqueado por sete vezes a vítima). ( Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código Penal, 2.ª Ed., 266).

“A aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa” art.º 40.º, n.º 1, do C. P.,
A determinação de medida de pena faz-se, dentro dos limites definidos na lei, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção (art. 7l.º do Cód. Penal).
Segundo o Prof. Figueiredo Dias sendo os princípios regulativos da medida da pena, culpa e prevenção, é compreensível que a lei exija que se encontre a medida concreta da pena com base em tais princípios. "Porque através do requisito de que sejam levados em conta as exigências da prevenção, dá-se lugar à necessidade comunitária da punição do caso concreto e, consequentemente, à realização "In casu" das finalidades da pena. Através do requisito de que seja tomada em consideração a culpa do agente, dá-se tradução à exigência de que a vertente pessoal do crime - ligada ao mandamento incondicional de respeito pela eminente dignidade da pessoa do agente - limite de forma inultrapassável as exigências de prevenção" (cfr. . DIREITO PENAL PORTUGUÊS - As consequências Jurídicas do Crime - Notícias editorial - pág. 215).
E nos seus sumários "Direito Penal - Questões Fundamentais – A Doutrina Geral do Crime" pág. 271, entende ser " (...) a culpa dada através de tipos de culpa, devendo inclusivamente distinguir-se nesta acepção (e segundo os diferentes tipos de "atitude interna" manifestados pelo agente de facto), um tipo de culpa doloso e um tipo de culpa negligente, cada um com os seus pressupostos próprios e que não se esgotam nos pressupostos do dolo e da negligência como tipos subjectivos de ilícito, que também são".
Em caso algum, porém, a pena poderá ultrapassar a medida da culpa do agente, concretamente revelada, correspondendo o limite superior da pena ao máximo grau de culpa e o limite mínimo, aquele, abaixo do qual se não respeitam as expectativas da comunidade.
Sendo certo que "... O Código Penal deve constituir o repositório dos valores fundamentais da comunidade. As molduras penais, mais não são, afinal, do que a tradução dessa hierarquia de valores, onde reside a legitimação de direito penal" - ponto 2 do Preambulo do Dec. Lei 48/95 de 15 de Março -.
Mas não pode, somente atender-se à culpa e sua medida, uma vez o legislador consagrou o mandamento de que a determinação concreta da pena seja feita também em função da prevenção.
O que " (...) é absolutamente compreensível e justificável, através do requisito de que sejam levados em conta as exigências de prevenção, dá-se lugar à necessidade comunitária de punição do caso concreto e, consequentemente, à realização "In - casu" das finalidades da pena. Finalidades estas que residem primordialmente na tutela dos bens jurídicos e, na medida possível, na reinserção do agente na comunidade. E dentro dos limites consentidos pela prevenção geral positiva - entre o ponto óptimo e o ponto ainda comunitariamente suportável de medida da tutela dos bens jurídicos -, podem e devem actuar pontos de vista de prevenção especial de socialização, sendo eles que vão determinar, em último termo, a medida da pena" ( ob. Cit. Pág. 215).
Aos factores relativos à culpa e prevenção tem de acrescentar-se, nos termos do n.º 2 do art.º 71.º do CP., a avaliação dos factores relati¬vos à execução do facto (als. a), b), c) e e), parte final), dos factores relativos à personalidade do agente (als. d) e f)), e dos factores relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto (al. e)). Com a ressalva do próprio preceito de que não sejam duplamente valorados os factores que façam já parte do tipo de crime - princípio da proibição da dupla valoração - .

Assim os factores de medida da pena, que deponham a favor ou contra o agente têm de começar por ser identificados como relevantes para efeito da culpa ou da prevenção, em seguida, cada um dos factores tem de ser ponderado em função do seu concreto significado à luz dos princí¬pios regulativos enunciados e por fim todos eles reciprocamente avaliados em função da quantificação da espécie da pena a aplicar.
Dispõe o artigo 70.º do Código Penal que,
«Se forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição».
Temos, pois, que quando haja de se escolher entre uma pena privativa e uma pena não privativa da liberdade, estabelece o artigo 70.º que se dê prevalência à segunda, sempre que esta realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
De acordo com o artigo 40.º n.º 1 do Código Penal essas finalidades consistirão na prevenção geral, ou seja a estabilização das expectativas comunitárias da validade da norma violada, e na prevenção especial, ou seja a necessidade de socialização que o arguido demonstra.
No caso em apreciação, as necessidades de punição aqui exigidas, designadamente ao nível dos bens jurídicos violados e as elevadissimas necessidades de prevenção geral não permitem a aplicação de pena de multa e impõem a aplicação de uma pena de prisão.
Os ingredientes de composição da pena foram devida e minuciosamente sopesados pelo tribunal “a quo” impondo-se apenas a sua acomodação na moldura penal abstracta ora aplicável.
Tudo ponderado considera-se adequada, proporcional e suficiente uma pena de 6 (seis) meses de prisão. Mantendo-se a suspensão da execução da pena, pelo período de um ano, sujeita ao cumprimento do dever de o Arguido entregar a uma Instituição de Solidariedade Social à sua escolha, preferencialmente vocacionada para a protecção de crianças e jovens, a quantia de € 1.500 (mil e quinhentos euros), devendo comprová-lo nos autos no prazo máximo de 6 (seis) meses, a contar do trânsito em julgado da decisão.
Procede, pois, parcialmente o recurso.

DECISÃO.
Por todo o exposto, acordam os juízes em, conceder provimento parcial ao recurso e em consequência:
Operando a convolação legal, condenar o Arguido J., pela prática de um crime, de trato sucessivo, de pornografia de menores, p. e p. pelo art.º 176.º, n.º 4, do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão, cuja execução se suspende pelo período de 1 (um) ano, sujeita ao cumprimento do dever de o Arguido entregar a uma Instituição de Solidariedade Social à sua escolha, preferencialmente vocacionada para a protecção de crianças e jovens, a quantia de € 1.500 (mil e quinhentos euros), devendo comprová-lo nos autos no prazo máximo de 6 (seis) meses, a contar do trânsito em julgado da decisão.
Manter, no mais a decisão recorrida.
Não há lugar ao pagamento de custas.

Lisboa, 15-12-2015.
Ana Sebastião
Simões Carvalho